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FLÁVIO APARECIDO DE ALMEIDA

(Organizador)

ensino de

SOCIOLOGIA
perspectivas,
desafios
e práticas

editora

científica digital
FLÁVIO APARECIDO DE ALMEIDA
(Organizador)

ensino de

SOCIOLOGIA
perspectivas,
desafios
e práticas

1ª EDIÇÃO

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científica digital

2022 - GUARUJÁ - SP
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E59 Ensino de sociologia: perspectivas, desafios e práticas / Flávio Aparecido de Almeida (Organizador). – Guarujá-SP: Científica
Digital, 2022.
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ISBN 978-65-5360-071-3
DOI 10.37885/978-65-5360-071-3
1. Sociologia - Estudo e ensino. I. Almeida, Flávio Aparecido de (Organizador). II. Título.

2022
CDD 300.7

Elaborado por Janaina Ramos – CRB8/9166


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APRESENTAÇÃO

Sabemos dos desafios encontrados no Brasil para se ofertar Educação Básica. Vale a pena salientar que muitas escolas
ainda funcionam de forma precárias, não conseguindo ofertar o básico, que é uma estrutura digna, professores habilitados,
capacitados, bem remunerados e um sistema educacional que de forma efetiva transforme a vida do Educando, devolvendo-lhe
o direito de sonhar e assim possibilitando-lhe tornar-se protagonista de sua própria história. Movimento este que é construído a
partir de reflexões profundas sobre a si mesmos, a sociedade e as estruturas fundantes dela.
O Ensino de Sociologia tem o papel fundamental no processo de emancipação intelectual, favorecendo a crítica, a reflexão,
o questionamento e até mesmo a dúvida do que é posto e incorporado como “pronto” “acabado” “normal” por nossa sociedade.
O Descaso com a disciplina nas Escolas Públicas e no currículo brasileiro, deslumbra um cenário maior, em que construção
ideológica e negação da ciência como instrumento de transformação é a todo momento colocada a “prova”, pois bem sabemos
que quando o sujeito muda, muda-se também à sua maneira de visualizar a vida e os problemas cotidianos e como consequência
da reflexão ele muda a sua atitude/pensamento perante o mundo e as pessoas.
A presente obra, tem por finalidade enaltecer os professores de sociologia que ainda resistem a um sistema que desvaloriza
o pensar e a criticidade, que a todo custo tenta fazer sumir da grade curricular uma disciplina que fomenta a racionalidade e o
protagonismo do sujeito. Você encontrará nesta obra reflexões ímpares e que provocará a sua criticidade.
Desejo a você uma excelente leitura e reflexão.

Flávio Aparecido de Almeida


SUMÁRIO

CAPÍTULO 01
A CONSTRUÇÃO DA SOCIALIZAÇÃO NO COMBATE AO ABUSO SEXUAL
Angélica Ripari

' 10.37885/220207631................................................................................................................................................................................................ 9
CAPÍTULO 02
A PERSPECTIVA RELACIONAL EM PIERRE BOURDIEU
Luiz Eduardo de Souza Pinto; Jorge Alexandre Barbosa

' 10.37885/220207712.............................................................................................................................................................................................. 28
CAPÍTULO 03
ACERCA DAS CONTRIBUIÇÕES DO TEATRO DO OPRIMIDO DE AUGUSTO BOAL PARA O DEBATE DE GÊNERO NO ENSINO
DE SOCIOLOGIA
Rivelino Lourenço Martins; Elaine Regina Botter Okado

' 10.37885/211206894.............................................................................................................................................................................................. 43
CAPÍTULO 04
CONTROLE SOCIAL NA POLÍTICA DE SAÚDE E PROCESSOS DE GESTÃO
Francyely dos Santos Moura; Jailma da Costa Batista; Andressa Cassiano Araújo

' 10.37885/220207879.............................................................................................................................................................................................. 55
CAPÍTULO 05
DESIGUALDADES SOCIAIS: ENSINO E ESCOLA COMO REFLEXOS DA EXCLUSÃO
Flávio Aparecido de Almeida

' 10.37885/211106736...............................................................................................................................................................................................66
CAPÍTULO 06
EDUCAÇÃO PARA INCLUSÃO DIGITAL E A COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO DIGITAL
Lorena Chamone Vita

' 10.37885/220207891............................................................................................................................................................................................... 77
CAPÍTULO 07
FAKE NEWS E DESINFORMAÇÃO EM TEMPOS DE TRANSTORNO DA PERSONALIDADE ANTISSOCIAL
Haroldo da Silva

' 10.37885/220207755.............................................................................................................................................................................................. 92
SUMÁRIO

CAPÍTULO 08
GRAMSCI E ORTEGA Y GASSET: O ADVENTO DO SÉCULO XX SOB UMA PERSPECTIVA SOCIOLÓGICA DA CRISE

Gustavo Martins do Carmo Miranda; Luiz Eduardo de Souza Pinto

' 10.37885/220207711............................................................................................................................................................................................. 107

SOBRE O ORGANIZADOR.................................................................................................................................................. 122

ÍNDICE REMISSIVO............................................................................................................................................................ 123


01
A construção da socialização no combate
ao abuso sexual

Angélica Ripari
UEM

'10.37885/220207631
RESUMO

Este artigo reflete sobre o trabalho da sociologia em sala de aula com o intuito de de-
bater e criar práticas para a reflexão da sociedade e assim espelhar tais nas atividades
elaboradas em sala de aula. A partir dos conceitos de processo de socialização e ins-
tituições sociais, os estudantes foram estimulados a repensar as estruturas e questões
importantes com atenção ao cotidiano obscuro dos jovens. O conceito de processo de
socialização é repensado a partir da teoria de Merton, possibilitando outro viés para a
discussão para além de evidenciar a simples normatização social. A atividade se desen-
volve a partir da criação de práticas de enfrentamento contra o abuso sexual de crianças
e adolescentes, repensando o papel da escola e da família, construindo práticas para
informar e intervir em prol do tema. O debate e a construção da tomada de decisão dos
alunos se tornam central no desenvolvimento da prática em sala de aula. A proposta
enunciada se embasa para que a realidade social discutida seja central ao considerar,
então, o desenvolvimento teórico em segundo plano, como uma forma de compreender
o problema em questão. O debate em torno do abuso de crianças e adolescentes se
torna tema central tanto pela gravidade da discussão, como pela quantidade de casos
apresentados com persistência nos acontecimentos da vida social. Essa questão é posta
em xeque, e a centralidade da instituição familiar como autônoma influencia as atitudes
dos sujeitos. Esta discussão confronta o discurso difundido em nossa sociedade em
Projetos de Lei como o da Escola Sem Partido. A atividade desenvolvida com alunos
dos primeiros anos do ensino médio integrado ao técnico, no Colégio Estadual Alberto
Gomes Veiga, localizado na cidade de Paranaguá, litoral do Paraná. Apresenta-se, neste
artigo, as estratégias utilizadas para o desenvolvimento da atividade, os êxitos obtidos
e as fragilidades da estrutura escolar para debater o tema e a realizar atividades com
alcance para além da sala de aula.

Palavras-chave: Processo de Socialização, Instituições Sociais, Atividades Contra Abuso


Sexual de Crianças e Adolescentes.

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A sociologia como matéria em sala de aula propõe alguns dilemas para o docente. Este
se encontra diante de uma disciplina com grande carga de conteúdos e embates acadêmicos
e tem-se a tarefa de transformar todo este desarranjo em algo compreensível. Algo capaz
de ser refletido e transformável, para um adolescente (que, em grande parcela, tem imensas
fragilidades cognitivas dada as falhas do processo educacional escolar). Este é um desafio
constante, repetidamente falho, pois, mesmo que se reconheça a necessidade urgente de
debates e ações para a realidade dessa juventude, pela linguagem e pela ciência, parece
não ser capaz de se comunicar.
Apresento aqui um projeto elaborado e desenvolvido em uma escola pública do litoral
do Paraná – no Colégio Alberto Gomes Veiga (AGV) de Paranaguá – que representa a
busca de um elo de comunicação desses jovens para a reflexão sociológica dos problemas
que vivenciam. A partir do conceito de processo de socialização e de instituições social
(conceitos estes elencados nos conteúdos estruturais do estado do Paraná e elementares
para a compreensão sociológica), debatem-se e elaboram-se intervenções para o combate
de práticas de abuso sexual contra crianças e adolescentes.
Este processo de elaboração da atividade foi desenvolvido juntamente com os estudan-
tes dos primeiros anos técnicos, com pesquisas e interações. Nesta atividade foi concretizado
um ato de intervenção no colégio e na praça central da cidade com balões e imagens; uma
campanha digital e um mural em uma das paredes internas do colégio.
Em reflexões com o ensino da sociologia, a proposta didática é para que se possa
partir de uma questão real (o abuso de crianças e de adolescentes) para desenvolver os
conteúdos sociológicos. O alcance dos debates atuais e da urgência que a sociologia tem
para fomentar encaminhamentos aos dilemas, tal discussão possibilita um enfrentamento à
pauta que individualiza e responsabiliza a instituição familiar por todas as questões sociais
(tal qual se vê em projetos como a PL Escola sem Partido).

TEORIA

Nesta parte do trabalho, a abordagem possui a intenção em compreender o conceito


de processo de socialização e de instituições sociais. Elas perpassam bases sociológicas
para se perceber que a sociedade é de alguma forma estruturada para além de um tumulto
cotidiano, para além de vidas que seguem com suas pequenas motivações. Por isso, tal se
relaciona com um primeiro atentar para uma reflexão do social.
Neste sentido, Émile Durkheim apresenta a noção de instituições sociais como essa
propositiva organizacional da vida humana. Em suas palavras: “a vida social é uma forma
de vida organizada, e toda organização viva pressupõe algumas regras bem determinadas”
(DURKHEIM, 2017, p. 36). Em suas determinações em como ela deve ser compreendida, o
11
Open Science Research - ISBN 978-65-5360-055-3 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022
sociólogo afirma: “é necessário que as normas estejam estabelecidas, que determinem como
devem ser as relações sociais e que os indivíduos se submetam a essas normas” (idem,
p.37). A socialização, neste sentido, perpassa as instituições, projetando o indivíduo para a
integração e regulação social. Posterior a esta concepção clássica, pautada na condução
e na obediência de regras, considera-se a revisão de Robert Merton para estes conceitos.
Nesta sociedade em conflito criam-se nas instituições regras contrastantes, as quais induzem
o indivíduo ao erro. É uma sociedade capitalista que estimula o consumo constante e que,
ao mesmo tempo, recrimina os endividados. Ou, como exemplifica o autor, uma sociedade,
onde o valor do sucesso é exaltado, mas as normas para se alcançar este alvo não são de
tanta importância e, consequentemente, irá gerar anemia. Neste sentido, a anemia não é
causada pelo indivíduo, e sim por uma sociedade em discordância de suas normas1.
Durkheim é um autor clássico que é de fundamental importância para a sociologia, é
elementar que seja citado e ensinado em sala de aula. Sua teoria é infinitamente mais com-
plexa do que é passível em uma sala de ensino médio, e a redução deste conteúdo pode
trazer alguns problemas. Sem uma devida atenção, é possível que o ensino da sociologia
se torne determinante e normatizador, com questionamentos sobre o qual a função de cada
instituição é um mero reconhecimento estrutural (ponto este criticado pelo próprio Durkheim).
Ainda que seja um teórico menos influente, não sendo necessário citar o seu nome, os
questionamentos apontados por Merton desfocam o funcionamento das normas para propor
uma investigação sobre como a nossa sociedade está em conflito.
O ponto central, independente da teoria, é demonstrar a relevância de uma análise do
social. Tendo, então, os problemas que se encontram na sociedade, podemos questionar, à
luz destas teorias, qual é a fragilidade institucional. O indivíduo vivenciou para agir de uma
forma desviante, qual a falha do processo de socialização que o projetou para socialmente
avaliarmos a sua ação como um erro.

ESCOLHAS PEDAGÓGICAS

A proposta pedagógica que embasa o projeto indica caminhos para dialogar, esta teoria,
que é ao mesmo tempo tão densa e tão cara a compreensão social, com a realidade social
vivida pelos jovens. Tais atividades são embasadas nas teorias do pedagogo Gasparin (2002),
autor que é referência para a formulação dos planos pedagógicos do estado do Paraná.

1 Merton como um dos autores iniciais da Escola de Chicago ao desenvolver esta nova percepção sob o conceito de anomia embasa,

12
posteriormente, os teóricos que estudam o desvio como uma construção social.

Ensino de Sociologia: perspectivas, desafios e práticas - ISBN 978-65-5360-071-3 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022
Segundo o pedagogo, a instituição escolar e sua metodologia deve ser revista para que
o conhecimento escolar não seja mais apenas uma réplica fragmentada. E para esta recons-
trução, é preciso que o ponto de partida seja a realidade social. Os conceitos trabalhados
em cada área devem ser introduzidos aos estudantes a partir desta realidade, e este conhe-
cimento só é validado na medida que ele alcança uma transformação na mesma realidade.
O cotidiano, o fato, o problema vivido é, portanto, o objeto central desta pedagogia,
o qual temos como ponto de partida e ponto de chegada, capacitando os estudantes a se
tornarem sujeitos que refletem, agem, e modificam o seu meio. Esta escolha pedagógica
é dada pela dificuldade encontrada em repassar conceitos clássicos sociológicos. Estes
conceitos (juntamente com uma extensa exposição de autores) deslocados do objeto de
estudo transformam-se em conteúdos enciclopédicos. E, como efeito, formam os estudantes
(quando com sucesso) mais para um acúmulo de conhecimento culto elitizado do que para
uma capacitação de análise e transformação do social.
Na perspectiva aqui apresentada, o projeto em questão trata o conhecimento científico
à maneira projetada por Gasparin. Assim, os conceitos sociológicos do processo de socia-
lização e de instituições sociais são apreendidos a partir da análise de uma questão social
latente. E, ainda, o foco do processo de ensino aprendizagem perpassa a transmissão do
conceito para a capacitação da interação com a sociedade.

O COMBATE AO ABUSO SEXUAL

A seguir, há a descrição sobre a atividade aplicada com os estudantes. A questão do


processo de socialização e a configuração das instituições sociais foram abordadas em
sala de aula a partir do fenômeno do abuso sexual de crianças e adolescentes. Este é um
tema que tem urgência em ser discutido na sociedade, sendo tão recorrente e, ao mes-
mo tempo, um tabu.
Em reportagem da rede internacional de notícias BBC (2018) constatou-se que o pro-
blema é tão complexo que mal sabemos o número de casos. Segundo a reportagem, há
várias fontes que recebem as mais diversas denúncias (como as delegacias de polícia, o
ministério público, os conselhos tutelares, e outros) e não há nenhum órgão que mapeie todas
as delações que chegam aos órgãos do Estado. Mesmo sem um mapeamento concreto, os
dados são alarmantes. Os dados indicados pelo Disque Denúncias do Ministério dos Direitos
Humanos (Disque 100) foram registrados cerca de 9 mil casos, só no primeiro semestre de
2017. É de se atentar que mapear as denúncias apenas sobre casos delatados, há ainda
casos de omissão, ou situações em que as vítimas não se reconhecem como violadas, e
estes casos nem chegam ao conhecimento dos órgãos do Estado. A escassez de dados se
expressa na falta de políticas públicas e na ausência de informações.
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Open Science Research - ISBN 978-65-5360-055-3 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022
Em Paranaguá, especificamente, os casos são alarmantes. É uma cidade de médio
porte com mais de 130 mil habitantes2 e que só em 2016 teve 308 casos de exploração
sexual infantil registrados pelo conselho tutelar3. A cidade já está no estado que está em
terceiro no ranking de exploração infantil em rodovias, e a questão se agrava por sua eco-
nomia que se desenvolve ao entorno do Porto de Paranaguá, local de grande número de
casos de aliciamento.
No Paraná, a Polícia Civil vem realizando com frequência grandes operações de inves-
tigação e apreensão que ganham a atenção da população. Para acompanhar, a Secretaria
do Estado da Educação (SEED) vem orientando os profissionais da educação a trabalhar
este tema em conteúdos nas disciplinas, obrigando a tratar do conteúdo no Dia Nacional
de Combate ao Abuso e à Exploração Infantil (dia dezoito de maio). Ainda assim, é uma
orientação dispersa sem formular um conhecimento da seriedade do caso mais aprofundado
para os profissionais.
O debate está posto e com algum espaço para ser feito, é um problema de reconhe-
cimento sensível à população. Mas, por outro lado, enfrentamos alguns traços culturais
de machismo, de naturalização a algumas práticas de violência (como na cultura do estu-
pro). E ainda, de respaldo à total autoridade dos pais ou de adultos sobre o corpo das crian-
ças. É comum quando abordado o tema uma extrema negativa com respostas que apelam
à violência e ao extremismo. Enquanto, quando os casos acontecem de fato (sabe-se por
histórias dos alunos ou acontecem no ambiente escolar), estes traços culturais reaparecerem.
Com este panorama tão perverso, a Sociologia é um suporte para tratar o debate e
repensar as práticas. No projeto apresentado ao colégio AGV4 foi explorado com a justifica-
tiva da capacidade da disciplina em repensar a socialização dos sujeitos, e como a escola
enquanto instituição tem a sua função central nesse processo. O reforço para a equipe pe-
dagógica e para os estudantes em sala de aula da responsabilização da escola ao repensar
a socialização dos sujeitos vem de encontro a uma individualização das responsabilidades,
tratando o fenômeno como casos esporádicos. Nesta visão, não há uma historicização, ou
contexto social para justificar as frequentes ocorrências, apenas um acúmulo de anomalias
– análise que deflagra a incapacidade analítica de causa efeito dos traços culturais sociais.
Neste sentido, à luz das discussões propostas por Merton, mesmo com todo reconheci-
mento que é uma violência extrema ainda há hoje pessoas violentadas, que não reconhecem

2 Segundo dados do IBGE 2010.


3 Estes dados foram apresentados pelo presidente do conselho tutelar da cidade em reportagem ao jornal local – Folha do Litoral.
4 O Núcleo de Educação de Paranaguá tem exigido do professor a elaboração de um projeto a ser apresentado à equipe pedagógica e
devidamente registrado pela diretoria para qualquer atividade feita com os estudantes que extrapole o previsível de uma sala de aula.
É um formato de projeto simples para justificar e planejar os encaminhamentos da atividade. O projeto apresentado está em anexo

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ao fim do artigo.

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o grau da violência que sofrem. Existem pais, familiares, comunidades em um sentido mais
amplo que acobertam os abusos. Ainda, há violadores que acreditam ser justificáveis seus
atos, isto ocorre, porque temos uma disfunção no processo de socialização.
Assim, como afirmam Inoue e Ristum (2008), enquanto a família é a maior violado-
ra dos direitos das crianças e dos adolescentes, a escola é o espaço onde a criança e o
adolescente mais tempo passam fora de casa, tendo aí uma possibilidade para o reconhe-
cimento e atuação contra a violência. No entanto, o que acontece mais comumente é que
a vítima se retraia reagindo com estratégias de agressividade, tornando o caso hostil da
escola. Esta instituição que não tem um devido preparo, não é capaz de prevenir e intervir
assim como seria devido. Em suma, temos uma instituição com alguma potencialidade para
a reação e a intervenção, não a capacitamos, mas é uma via eficaz, segundo os dados
analisados pelas autoras.
Este embate entre as instituições família e escola tem sido alvo de grandes polêmicas
atualmente. Há um discurso reinante de que “a família educa, a escola ensina”. Discurso este
estimulado, muitas vezes, por profissionais da educação encurralados com a falta de suporte
que tem na atual instituição escolar, tendo uma enorme responsabilidade que é atribuída
em receber todos os problemas psicológicos e assistenciais de uma população vulnerável.
Verifica-se o extremo desta pauta de disputa entre as instituições no recente Projeto
de Lei Federal (com replicações a nível estadual e municipal) denominado comumente por
Escola sem Partido, ou Lei da mordaça. Neste, vemos uma demanda de que as famílias
deveriam ter um total poder sobre o que as crianças e os adolescentes deveriam ter co-
nhecimento ao que se refere a questões políticas e ideológicas (incluindo ainda discussões
sobre gênero e sexualidade). A escola teria apenas o alcance de repassar conhecimentos
consolidados. Neste debate, descaracteriza-se a escola como instituição com potencial para
revisão de práticas sociais, como o abuso sexual infantil que persiste nos meios familiares.
Nestas circunstâncias, como defender a total autonomia da instituição familiar?
Aos estudantes foram questionadas as fragilidades da instituição familiar, e como estas
instituições devem consolidar o diálogo, ambas responsáveis pela formação e desenvolvimen-
to dos indivíduos. Neste entrave entre as potencialidades e as falhas das instituições familiar
e escolar se dá o debate da atividade, propondo novas formas de socialização capazes de
reavaliar o sujeito em ação, reavaliar a própria capacidade dos sujeitos em formação e em
repensar práticas e fragilidades.

A EXPERIÊNCIA

A fim de apresentar o fenômeno para os alunos foi exibido o filme: “A ira de um anjo”,
documentário produzido em 1990, que retrata as consequências psicológicas de um abuso
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sexual infantil. A produção provoca um impacto aos expectadores por mostrar uma criança
de seis anos com aparência ingênua e fala contundente fria de violência. Após se lembrar do
abuso sexual que sofreu com o pai, quando ainda bebê, a menina cometia graves violações
sem a menor demonstração de afeto ou arrependimentos.
A reflexão sobre o filme é acrescida ainda com dados atuais sobre a então menina
retratada. Já no final do documentário é possível ver uma menina amadurecida após um
tratamento em um centro especializado. Ela já é capaz de demonstrar sentimento e se ar-
repende das violências que provocou. Na atualidade, já recuperada, com mais de 30 anos,
ela é enfermeira formada, cria uma clínica especializada similar a que foi atendida, quando
criança, e é autora de um livro que conta a história dela.
Os estudantes foram introduzidos ao debate sobre as condições sociais e individuais
que causam o abuso, tomando como base a história do filme, com disposição para localizar
na sociedade efeitos desse desequilíbrio. Os questionamentos circundaram na avaliação se
o caráter é natural, ou uma construção social. Em sequência, os estudantes realizaram uma
atividade onde deveriam medir se os problemas que encontramos na sociedade não seriam
consequências de uma falha no processo de socialização. E ainda, em debate, projetando
o processo de socialização contínuo e permanente, foi questionado se é possível reverter
estas ausências assim como aconteceu no documentário.
A partir deste questionamento inicial com a apresentação do conceito de processo
de socialização, foi proposto um debate sobre o abuso sexual de crianças e adolescen-
tes. Os questionamentos de uma realidade e tempo distantes foram trazidos para a socie-
dade brasileira. Os estudantes realizaram uma pesquisa inicial com dados estatísticos para
o reconhecimento do fenômeno estudado. A partir destes dados, os alunos relataram casos
e experiências de seus conhecimentos.
Tratar esta questão em sala de aula é sempre uma tarefa que exige uma sensibilidade e
discrição do professor. Relatos são constantes vindos dos mais variados sujeitos – professo-
res, zeladoria. Mas o ofício se torna mais árduo quando histórias mais graves dos estudantes
aparece. É comum algum estudante que se exponha em conversa mais pessoal. Com esta
atividade, um grupo de meninas relatou que um homem bem mais velho as assediou no
shopping da cidade e chegou a passar a mão em uma delas.
Em outra turma, um dos estudantes questionou o porquê de se discutir sobre este
tema, já que, em sua visão, nada adiantaria. Diante de tal situação, tentei argumentar, res-
pondi que as pessoas ali iriam reconhecer as situações de abuso e quando adultos iriam
agir de outra maneira. Contra-argumentos, contando histórias pessoais: o padrasto dela foi
abusivo por anos e a mãe não acreditou quando tentou lhe avisar. A mãe continuou com o

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padrasto, vivendo ainda todos na mesma casa. Nada pôde fazer, disse ao se reprimir em
nome da felicidade da mãe.
Histórias como essa reforçam o papel da educação neste processo de revisão de uma
sociedade. No caso em questão, nada foi possível fazer. O estudante disse já ter resolvido
e não queria que o caso viesse à tona. Foi preciso reconhecer que a experiência traz mais
sapiência do que teorias sociológicas, ponderando sobre a autonomia da vítima.
No entanto, situações como estas fortalecem o processo educativo, pois reforçam
como a socialização por meio do debate, da informação, pode fazer com que estes es-
tudantes, em um futuro, quando com seus filhos, seus enteados possam reagir de forma
a transcender a violência vivida. Tais pais e tais mães, não tiveram este espaço quando
adolescentes, não debateram na escola sobre o tema. A abordagem sobre os casos de
abusos em nossa sociedade é sempre de maneira obscura e distante. Os relatos por si só
não ocasionam as mudanças necessárias, assim, compreende-se que não há uma real
consciência, e, por isso, não há ações concretas para além de ameaças vazias, não há
direcionamentos de como agir. E como cobrar uma postura se a socialização apresentada
não condiz com as realidades?
Posteriormente, foi introduzido ao debate, o conceito de instituições sociais. Após, a
identificação e reconhecimento do que seria uma instituição, os estudantes foram questiona-
dos sobre qual é o papel da família e da escola na construção de uma sociedade equilibrada.
Dessa maneira, projetando a discussão para o caso do abuso em específico. A partir do
debate construído com os estudantes, no qual tivemos consciência do problema abordado e
da urgência de uma reflexão mais ampliada, foi possível refletir quais ações seriam possíveis
para projetar esta discussão para além da sala de aula. Os estudantes, diante disso, então
sugeriram várias propostas.
O projeto foi inicialmente pensado para ser aplicado em três turmas de ensino médio
da manhã do Colégio AGV (duas de ensino técnico e uma de ensino médio). No entanto, a
turma de ensino médio não respondeu com o esperado no entrosamento dos debates, e no
comprometimento com as propostas de ação, sendo então não incluída no desenvolvimento
da atividade. Nas turmas de técnico em Portos e em Comércio Exterior, as atividades se
desenvolveram em cooperação com os estudantes, e em cada turma escolhemos coletiva-
mente qual seria a ação a ser colocada em prática.

MURAL

Uma das turmas definiu como seria possível fazer um mural em uma parede do colégio
chamando a atenção para o tema. A ideia pareceu absurda inicialmente, em um primeiro
diálogo com a direção foi desacreditada. Mas foi possível contatar um professor para realizar
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um trabalho com murais, este ensinou a técnica de desenho a partir de projeções. Com
exemplos concretos de outro colégio foi possível convencer a direção. A proposta ficou mais
palpável, sendo possível realizá-la em uma das paredes internas do colégio.
Pesquisamos alguns desenhos que cumprissem com nossas aspirações. Muitas propos-
tas apareceram – uma menina, uma balança, uma flor, um urso de pelúcia, um balão. Um dos
estudantes desta turma se prontificou para fazer o desenho. O primeiro que fez retratava
uma criança em desespero com uma sombra que a perseguia. Toda a turma apoiou e pre-
cisava apenas articular com a direção para continuar a atividade. Cristian, o desenhista da
turma, decidiu compor uma imagem que contemplasse a maioria das propostas sugeridas
pelos estudantes. No entanto, reavaliamos que um desenho perturbador em um trabalho
permanente poderia causar constrangimentos. A sala debateu novamente qual seria o de-
senho mais adequado.

O desenho foi então pintado na parede já com uma primeira demão, primeiramente
apenas riscado a lápis. Depois foi colorido e composto com uma mensagem e um fundo,
fruto de um processo de discussão com a sala.
Muitas foram as dificuldades para a realização da atividade. O desenho não dava afa-
zeres para os 40 alunos da turma, tendo sempre que se dividir em criar atividades paralelas
e controlar para que os receios do que pode acontecer com o uso de tintas não se tornem
realidade. Muitas posturas desacreditadas por parte de vários sujeitos da comunidade es-
colar acompanharam o trabalho.

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Os textos informativos foram elaborados pelos estudantes para explicar a atividade, com
dados estatísticos e apresentação do processo. No dia de finalização, um dos estudantes
comentou: “e antes era só uma parede cheia de rabiscos”. A atividade foi capaz de ressig-
nificar o espaço, dividindo o debate, construindo em sala com toda comunidade escolar, e
assim a atividade foi concluída com êxito.

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INTERVENÇÃO

Na outra turma do ensino técnico, o processo inicial foi similar, quando os estudantes
propuseram como atuar, apareceram algumas ideias como um filme, campanha digital,
campanha informativa na escola ou na cidade. As propostas foram sendo polidas na medida
do amadurecimento da ideia e com uma avaliação das capacidades do grupo. Algumas es-
tudantes se dispuseram a fazer o material para a campanha digital, a qual foi elaborada em
sala de aula. Os estudantes se dividiram entre selecionar imagens e relatos que poderiam
causar um impacto a quem passasse.

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Confeccionamos os materiais em sala de aula, criando cartazes ilustrativos sobre casos
de abuso e violência contra crianças e adolescentes. Todo processo de escolha das sim-
bologias, de como atingir o público, escolha das imagens, das cores utilizadas, foi definido
em participação com toda a turma.

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Foi marcado um dia para finalizar a atividade, nesse juntamos todos os materiais já
elaborados, enchemos bexigas vermelhas e espalhamos essa amostra, produto de nossas
discussões pelo pátio de entrada da escola, projetando o debate para todos que transitam
por aquele lugar. Animados com a atividade, a turma decidiu que parte deste material poderia
também ser espalhado pela praça da cidade, localizada a duas quadras do Colégio. No mo-
vimento de saída, os estudantes foram à praça e promoveram uma intervenção de aces-
so a toda cidade.

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Com as fotos e os vídeos produzidos durante este processo de montagem da inter-
venção, alguns estudantes editaram um vídeo ilustrativo e informativo com as motivações
do debate. O vídeo foi utilizado como campanha virtual, junto com outros materiais digi-
tais produzidos pela turma. Todos foram incentivados a compartilhar este material e pro-
jetar a discussão.

AVALIAÇÃO

O processo avaliativo foi contínuo, sendo observado o grau de envolvimento de cada


aluno e a capacidade de exposição oral nos debates. No final da atividade, foi realizado
uma autoavaliação, no qual o estudante deveria citar qual foi a sua participação no processo
e relacionar os conceitos de socialização e de instituição social com a atividade realizada.
Nestes textos, foi possível acompanhar o grau de participação e de reflexão dos alunos.
De forma geral, o processo de construção das atividades e debates foi produtivo. Os alu-
nos se envolveram com a discussão e refletiram sobre um problema atual e urgente; puderam
expor suas ideias, colocá-las em prática. A assimilação do conceito não foi atingida assim
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como o esperado, a dificuldade de escrita e de assimilação de teorias com graus de abstra-
ção é permanente, apenas um grupo mais participativo das aulas de sociologia foi capaz de
realmente assimilar os conceitos debatidos e aplicá-los ao fenômeno estudado. No entanto,
mesmo para aqueles que não foram plenamente capacitados a um pensamento sociológico
teórico, foi, ainda assim, capacitado a sensibilização e percepção de problemáticas sociais.
A dificuldade maior para a realização dessas atividades de uma elaboração que foge a
ordem escolar de conteúdo e sala de aula é ainda as barreiras existentes no espaço escolar.
Para que se consiga desenvolver atividades reflexivas é preciso que se façam verdadeiros
malabares com a direção, com agentes responsáveis pela limpeza e com outros professo-
res. Esforços mil que desgastam e produzem grande grau de professores desestimulados.
Para este trabalho foi preciso, durante todo o processo lidar com muita desconfiança junto
aos profissionais.
Por fim ainda, na volta às aulas após o período de férias, o colégio passou por uma
limpeza geral na qual por falta de atenção e total descuido da direção, pintaram o mural,
apagando o desenho. O esforço é para que ele seja refeito agora. No entanto, este apagar
provoca descrença nos estudantes e em toda comunidade escolar de uma efetiva capaci-
dade de ação reflexiva a partir da colaboração institucional, tendo nas realizações, mesmo
tão pequenas, as que são constantemente cortadas.

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ANEXO I – PROJETO APRESENTADO À ESCOLA

Projeto Combate à violência sexual contra crianças e adolescentes

Angélica Ripari

OBJETIVOS

• Elaborar atividades de intervenção que produzam uma reflexão sobre a necessida-


de da discussão sobre a violência contra crianças e adolescentes;
• Informar os dados atuais e os riscos, tal como o procedimento para denúncias;
• Discutir sobre o processo de socialização contínuo e o papel da escola na forma-
ção e desenvolvimento do ser humano no suporte das ausências e carências da
família.

JUSTIFICATIVA

Segundo a Constituição Federal, no artigo 205 temos que a educação é um direito


de todos e um dever do Estado, da família e da sociedade, sem uma sobreposição entre
estes. É com esta responsabilidade do Estado que entra a escola, como dispõe a Lei de
Diretrizes e Bases da educação (LDB), há deveres desta instituição para com o desenvol-
vimento e a formação dos seres humanos.
Quando temos uma questão de tão grave seriedade como as violências sexuais sofri-
das por crianças e adolescentes, esta questão das responsabilidades vem à tona. No Brasil,
e 2016 fora registradas 15.707 denúncias em 2017 (segundo o Ministério dos Direitos
Humanos)5. São dados não possíveis de serem controlados pelas autoridades, presume-se
que tenham mais casos que não chegam aos canais de denúncia. É alarmante a dimensão
de nosso problema e urgente o debate e ações. Neste sentido, a sociologia discute como a
sociedade, enquanto uma coletividade, constrói um processo de socialização, no qual são
transmitidos conhecimentos básicos para se viver em sociedade.
Neste sentido, quando há problemas na sociedade não caberia apenas a responsabi-
lização dos indivíduos. Até porque, se considerarmos apenas a escolha individual sem uma
correlação social, nada podemos fazer diante do triste destino de nossa realidade6.
No entanto, se considerarmos, assim como proposto pelos clássicos da sociologia
Émile Durkheim, ou ainda Max Weber (e atores mais atuais que repensam o processo de

5 MORI, Letícia. Levantamento revela caos no controle de denúncias de violência sexual contra crianças. BBC, São Paulo: 21 fev 2018.

25
6 BOMENY, H., FREIRE-MEDEIROS, B. Tempos Modernos, tempos de sociologia. São Paulo: Editora do Brasil, 2010.

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socialização como Simmel), podemos pensar que, em algum grau, a sociedade forma os
indivíduos, podendo nós, enquanto sociedade, controlar os comportamentos sociais inde-
sejados e reconstruir a formação dos indivíduos.
Assim sendo, para a sociologia, “a autonomia individual passa a ser considerada um
valor cultural, uma modalidade moderna de condução da vida de forma racional e motivada
internamente” (GRIGOROWITSCHS, 2008)7. E ainda, as instituições sociais como os espaços
de repasse do processo de socialização são dimensões a serem propositivas neste aspecto.
Sendo assim, podemos repensar o processo de socialização e a função das instituições
sociais (como a família, a escola, o Estado) nos desandes do combate a violência sexual con-
tra crianças e adolescentes. Propondo reflexões e ações para que estes indivíduos possam
agir de outras maneiras em um futuro, sendo que tais ações servem à: (1) capacitar estes
sujeitos de identificar as violências; como futuro pais, (2) podendo agir em defesa de seus
filhos em prováveis casos; e como indivíduos passíveis de sujeitos violadores, (3) podendo
ser controlados socialmente.

ATIVIDADES

Serão os três primeiros anos do ensino médio, envolvidos nesta atividade, sabendo que
o conteúdo estruturante sobre instituições sociais repensando o papel da família e da escola
na sociedade, assim como o de processo de socialização, serão contemplados nas atividades.

1º A

– Elaboração de informativos, dados estatísticos e ilustrações para produção do mural


sobre o tema.

1º Portos

– Produção de um mural artístico com a temática reforçando a mensagem de proteção


à infância. O desenho o qual será elaborado por um aluno será reproduzido em uma
das paredes da escola.
– Elaboração de material com textos e informativos sobre o tema.

7 GRIGOROWITSCHS, Tamara et al. O conceito” socialização” caiu em desuso? Uma análise dos processos de socialização na infân-

26
cia com base em Georg Simmel e George H. Mead. Educação & Sociedade, v. 29, n. 102, p. 33-54, 2008.

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1º Comércio Exterior

– Elaboração de mídia virtual com informativos sobre o tema.


– Intervenção com bexigas, imagens e relatos que será realizada na saída da escola,
lembrando os casos e propondo reflexão sobre o tema.

REFERÊNCIAS
1. DURKHEIM, É. A educação moral. Petrópolis: Vozes, 2008

2. INOUE, Silvia Regina Viodres; RISTUM, Marilena. Violência sexual: caracterização e análise
de casos revelados na escola. 2008. Estudos de Psicologia I Campinas I 25(1) I 1121 I
janeiro -.març

3. GASPARIN, João Luiz. Uma didática para a pedagogia histórico-crítica. Campinas: Autores
Associados, 2002.

4. MERTON, Robert King. Sociologia: teoria e estrutura. São Paulo: Editora Mestre Jou, 1970.

5. MORI, Letícia. Levantamento revela caos no controle de denúncias de violência sexual


contra crianças. BBC, São Paulo: 21 fev 2018.

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02
A perspectiva relacional em Pierre Bourdieu

Luiz Eduardo de Souza Pinto


UFMG

Jorge Alexandre Barbosa


UFMG

Artigo original publicado em: 2020


Revista de Filosofia - ISSN 2448-3095.
Oferecimento de obra científica e/ou literária com autorização do(s) autor(es) conforme Art. 5, inc. I da Lei de Direitos Autorais - Lei 9610/98

'10.37885/220207712
RESUMO

Pierre Bourdieu é um dos mais influentes cientistas sociais de todos os tempos, sua
produção é uma rigorosa conjugação entre o empírico e a teoria. O método de Bourdieu,
ancorado em um senso prático, se presta à análise dos mecanismos que envolvem as
relações de poder, a produção de idéias e a gênese das condutas. A praxiologia bour-
dieusiana não é um simples instrumento para desvelar a realidade social constituída
pela ação dos agentes e na qual esses constituem uma fração nas disputas que ocorrem
nos diversos campos estruturados na sociedade, é um arranjo e ao mesmo tempo uma
ampliação do horizonte de diversas escolas de pensamento (interacionismo simbólico,
estruturalismo, funcionalismo, marxismo, fenomenologia, etnometodologia e a epistemo-
logia racionalista neokantiana) em um empreendimento que visa demonstrar a relação
entre a ação individual e a estrutura social. A produção de Bourdieu é eminentemente
relacional e o autor promove o esforço de combinar uma síntese teórica dentro de um
quadro analítico integrado através de um engajamento por meio da pesquisa empírica.
Para a compreensão do dinamismo da vida social contemporânea a construção rela-
cional dos estudos de Bourdieu se revela imprescindível. O autor provoca uma ruptura
epistemológica através da análise relacional considerando de forma concomitante que
as estruturas sociais são historicamente reproduzidas por meio das condutas individuais,
como um círculo de interações onde agência e estrutura mutuamente se constroem e
reconstroem. Leva-se em consideração também que a teoria da prática de Bourdieu é
indissociável da prática da teoria, no modelo praxiológico bourdieusiano se articulam dia-
leticamente o agente e a estrutura social, ou seja, é um arquétipo centrado na mediação
entre a agência e a estrutura.

Palavras-chave: Bourdieu, Praxiologia, Ação e Estrutura.

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O pensador francês Pierre Bourdieu é um dos mais influentes cientistas sociais de todos
os tempos, por sua produção, uma rigorosa conjugação entre o empírico e a teoria, gravita em
uma dimensão de reconhecimento acadêmico próxima de Karl Marx, Émile Durkheim e Max
Weber, autores considerados clássicos. A produção bourdieusiana cobre uma significativa
profusão de fenômenos e temáticas como religião, política, poder, trabalho, economia, esta-
do, gênero, direito e educação. Os aparatos teóricos elaborado por Bourdieu são elementos
centrais para estudos em diversas vertentes científicas, seus esquemas analíticos como
habitus, capital, campo, dominação, servem de referência para múltiplas análises sociais.
A trajetória pessoal desse autor é um amálgama com sua criação, pensar princípios
em simbiose com práticas é fundamental para a compreensão das categorias analíticas de
Bourdieu. Nascimento em 1930, em uma província rural no sudoeste francês, originário de
um meio social majoritariamente camponês, produziu uma trajetória que Peters (2018) de-
nomina de miraculé, locução utilizada para designar indivíduos cuja gênese é popular, mas
que em decorrência do processo educacional sofrem acentuada mobilidade social. A traje-
tória miraculosa ocorreu devido ao percurso que “o transportou de um meio sociorregional
dominado e desprestigiado no país ao topo do sistema acadêmico francês” (Peters, 2018, p.
188), da vila de Béarn no interior da França a uma cátedra no Collège de France, em Paris,
Bourdieu se valeu de sua passagem por universos dispares para erigir seu arcabouço inte-
lectual e arquitetar análises sociais acerca das estruturas de perpetuação dos mecanismos
de dominação e de manutenção do poder, mantidos por relações arbitrárias que preservam
desigualdades socialmente construídas, mas naturalizadas. O elemento central que atravessa
a obra de Bourdieu é o desmascaramento da dominação (Burawoy, 2010, p.26), percebido
através do diagnóstico da violência simbólica que se constitui na imposição de um poder
arbitrário como legitimo (Bourdieu, 2011).
A experiência de exercer o serviço militar obrigatório na Argélia, até então sobre o
domínio colonial da França, onde observou a exposição da violência entre seus compa-
triotas e os rebeldes anticoloniais da Frente de Libertação Nacional (FLN), foi marcante na
trajetória de Bourdieu que se viu na obrigação cívica de elaborar “para um público francês
pouco informado um relato tão fidedigno quanto possível da situação social, econômica e
política da Argélia” (Peters, 2018, p. 190). Ao imergir na ação de retratar a organização das
estruturas que compõem a vida social na Argélia o sociólogo francês concebeu a sua teoria
da prática. Os estudos elaborados por de Bourdieu são um choque de realidade, estrutura-
do a partir de observações etnográficas, entrevistas em profundidade, análises estatísticas,
esse autor visa o desvelamento da articulação do social. “Bourdieu concebia uma Ciência
Social unificada como um ‘serviço público’ cuja missão é ‘desnaturalizar’ e ‘desfatalizar’

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o mundo social e ‘requerer condutas’ por meio da descoberta das causas objetivas e das
razões subjetivas que fazem as pessoas fazerem o que fazem” (Wacquant, 2002. p.100).
O método de Bourdieu ancorado em um senso prático se presta à análise dos meca-
nismos que envolvem as relações de poder, a produção de idéias e a gênese das condutas
(Thiry-Cherques, 2006). A praxiologia bourdieusiana não é um simples instrumento para
desvelar a realidade social constituída pela ação dos agentes e na qual esses constituem
uma fração nas disputas que ocorrem nos diversos campos estruturados na sociedade, é um
arranjo e ao mesmo tempo uma ampliação do horizonte de diversas escolas de pensamento
(interacionismo simbólico, estruturalismo, funcionalismo, marxismo, fenomenologia, etno-
metodologia e a epistemologia racionalista neokantiana) em um empreendimento que visa
demonstrar a relação entre a ação individual e a estrutura social. A produção de Bourdieu
é eminentemente relacional e o autor promove o esforço de combinar uma síntese teórica
dentro de um quadro analítico integrado através de um engajamento por meio da pesquisa
empírica. Ao considerar a relação entre ação e estrutura se pode dizer que a perspectiva
de Bourdieu é explicada não apenas a partir da concepção dos agentes, mas por via das
estruturas que em alguns casos escapam às consciências individuais (Vandenberghe, 1999),
pois “é a estrutura das relações que constituem o campo que comanda a forma assumida
pelas relações de interação” (Bourdieu, 1982, p. 42).
A produção científica de Bourdieu sofre influência dos autores clássicos da sociologia
Marx, Durkheim e Weber; do racionalismo de Bachelard; da epistemologia relacional de
Cassier; da fenomenologia de Merleau-Ponty e de Heidegger; do estruturalismo de Lévi-
Strauss, de Mauss e de Saussure. De Marx e Weber herda a concepção sobre o conflito,
concebendo a sociedade como uma arena de relações e forças em competição. A sociologia
de Weber possibilitou a Bourdieu o entendimento de que frente a demanda há concorrên-
cia pelos escassos recursos materiais, assim como também os bens simbólicos são alvo
de disputas o que cria nos diversos campos da vida social uma dimensão de constantes
competições. Do Marxismo, Bourdieu se vale das perspectivas da luta pela dominação e
da consciência de classe e a noção de capital presente em Marx é ampliada pelo soció-
logo francês que considera outros tipos de posses (como o conhecimento ou as relações
interpessoais) capazes de exercer meios eficientes no exercício de poder, nessa condição
os meios econômicos (capital econômico) coexistem com outras formas de capital e não
sendo esses os únicos recursos com potência de produzir e reproduzir distinção social e
privilégios. O capital cultural é um bem eficaz na promoção de um princípio de diferenciação
quase tão eficiente quanto o produzido pelos recursos econômicos, esse capital é obtido pelo
acesso à instrução formal na sua forma institucionalizada, mas também por meio do conta-
to com grupos sociais ou agentes dotados de volume de estoque de capital cultural, e tem
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papel decisivo nos processos de estratificação social. Outras configurações do capital como
o social que se constitui como um “agregado dos recursos eletivos ou potenciais ligados à
posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de conhecimento
ou reconhecimento mútuo” (Bourdieu, 1985, p.248), ou seja, um tipo de capital formado a
partir das teias de relações que podem ser revertidas em vantagens e benefícios e, dessa
forma, capitalizados. Por fim o capital simbólico que está vinculado a honra e ao prestígio.
Cada um dos campos da sociedade é um espaço multidimensional onde agentes ou grupos
estão distribuídos de acordo com o volume de capital (econômico, cultural, social e simbóli-
co) que são possuidores. Campo e capital são centrais nas concepções de Bourdieu e são
elementos vitais para a compreensão das relações de poder e dominação.
De Bachelard (1984) vem a concepção de Bourdieu de que a realidade supera as limita-
ções teóricas presentes nas composições conceituais, da fenomenologia o sociólogo rejeita
o descritivismo, mas considera o rompimento dessa corrente filosófica com o senso comum,
com a doutrinação, com a superação das noções pré-concebidas, segue a ideia de se deve
abandonar a “atitude natural” e assumir uma “atitude fenomenológica”, que entende o objeto
como um todo, parte de um construtivismo fenomenológico, que considera a interação entre
os agentes e as instituições, que atuam em uma estrutura historicizada que se impõe sobre
os pensamentos e as ações dos indivíduos. Bourdieu rechaça o posicionamento de que o
social é unicamente produto das ações individuais e que a lógica das atividades humanas
deve ser observada apenas na racionalidade dos agentes, concebe que a formação das
idéias, o agir e os pensamentos dos agentes se dão sob constrangimentos estruturais, para
isso utiliza diversas correntes para se colocar além dos modelos existentes e para desviar-se
da rigidez de qualquer modelo explicativo da sociedade (Thiry-Cherques, 2006).
Bourdieu combinou elementos teóricos de Weber e Marx com o kantianismo sociológico
forjado por Lévi-Strauss, esse termo ser refere a ideia de que há um elo entre as estruturas
sociais e as estruturas mentais e ao aglutinar elementos da teoria de Marx, Durkheim, Weber
e Mauss, a produção de Bourdieu traça uma relação de cumplicidade ontológica entre estru-
turas objetivas e subjetivas, que legitima as relações de desigualdade e dominação. O pres-
suposto é de que os indivíduos experienciam o universo social por meio de esquemas de
percepção provenientes de seus processos de socialização, dessa forma procedimentos de
dominação cujos arranjos são historicamente e socialmente erigidos são tidos por naturais e
inexoráveis. Essa é a condição para a emergência da violência simbólica, que é imperceptível
ao senso comum. Por isso para Bourdieu um trabalho intelectual tem a atribuição de captar
as relações que não são diretamente observáveis, cabe dessa maneira desvelar as causas
escamoteadas que afetam o curso de ação dos agentes, bem como as estão impregnadas
nas macroestruturas. (Peters, 2018).
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Para a compreensão do dinamismo da vida social contemporânea a construção re-
lacional dos estudos de Bourdieu se revela imprescindível. “O relacionismo metodológico
defendido por esse autor entra em choque com o substancialismo de abordagens que tomam
como reais apenas as entidades e processos possíveis de observação direta” (Peters, 2018,
p.198), essa ruptura epistemológica provocada pela configuração da análise relacional é
que gera a possibilidade de enxergar de forma mais apurada além do senso comum. Como
observa Peters (2018), Bourdieu corrobora com Marx e Durkheim a perspectiva de que
estruturas e processos societários possuem dimensões que transcendem a consciência e
percepção dos agentes individuais, essas estruturas e processos, contudo, são decisivos
para definir o modo de agir e pensar dos agentes. E deve-se levar em consideração que o
ser social é historicamente condicionado, de forma concomitante as estruturas sociais são
historicamente reproduzidas por meio das condutas individuais, é como um círculo de inte-
rações onde agência e estrutura mutuamente se constroem e reconstroem.
As dimensões relacionais, práticas e históricas dos processos societários são obser-
vadas por Bourdieu em seus trabalhos. A realidade é dinâmica, a história é composta por
uma sucessão de fatos que são construídos a partir dos agentes em movimento, as ações
desses agentes não são determinadas de modo puramente mecânico, embora possam ser
inconscientes, são impulsionadas por interesses. No universo social não é possível detectar
atos desinteressados, as vontades e os interesses movem os agentes que estão imersos
em campos de disputas. Esses campos são uma arena onde há permanente competição,
local em que os agentes, de alguma forma, estão em um jogo de interesses, condição que
Bourdieu define como illusio. “A illusio é estar preso ao jogo, preso pelo jogo, acreditar
que o jogo vale a pena ou, para dizê-lo de maneira mais simples, que vale a pena jogar”
(Bourdieu, 2008, p. 139).
Essa condição de estar fincado ao jogo ocorre porque mesmo entre os agentes com
posições opostas há um acordo tácito de que vale a pena se empenhar em prol dos elemen-
tos que são cobiçados no campo. Os agentes são movidos continuamente por interesses
que estão em jogo. Ressalta-se uma questão necessária, há uma distinção entre interesse e
indiferença. Os interessados assim o são devido ao fato de que têm internalizado o sentido
do jogo, ou seja, assimilaram em suas mentes e em seus corpos que o jogo merece ser joga-
do, sabem assim reconhecer os processos de disputas e os alvos a serem atingidos, dessa
forma os jogadores fazem seus investimentos. Essa é uma condição nitidamente relacional,
pois, é capacidade de leitura do campo macroestrutural que induz a ação do agente. Pode-
se ser indiferente por não ser capaz de realizar tais leituras sobre o sentido do jogo devido
ao fato de não se perceber em meio a um processo de disputas, não tendo os princípios
de visão sobre o que se está em disputa não se percebe como um jogador, para sê-lo teria
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que perceber as estruturas presentes no jogo, pois se não as conhece, jogar pode não tem
qualquer sentido, contudo, o indiferente não escapa às consequências das ações ocorridas
no campo em que está envolvido. No entanto, para Bourdieu (2008), pode-se estar inte-
ressado em um jogo (no sentido de não lhe ser indiferente), mas não tendo interesse nele.
Umas das atribuições das áreas do conhecimento que estudam a sociedade é detec-
tar que há uma razão prática para o comportamento e o agir dos agentes. De acordo com
Bourdieu (2008) por trás de qualquer ato que se mostre desinteressado, existe uma dimen-
são oculta, disfarçada, que é geralmente sutil. No entanto, a visão utilitarista não é capaz de
explicar isoladamente o curso da ação dos agentes. Bourdieu rechaça a ideia de que esses
agentes são motivados simplesmente por ações conscientes que objetivam continuamente
maximizar os ganhos e minimizar as perdas, refuta também a perspectiva que os agentes
são reduzidos ao interesse puramente econômico e que almejam de maneira incessante o
lucro material, buscado, de forma consciente, através do cálculo racional. Mas, se as atua-
ções não são desinteressadas e de forma simultânea não são impulsionadas puramente
pelos cálculos racionais e ou pelas vantagens econômicas, como Bourdieu explica a razão
do agir humano? Para Bourdieu, os agentes que assimilam o sentido do jogo incorporam
uma cadeia de esquemas práticos de percepção que lhes fornece indicativos sobre como
funciona a realidade e diante dessa condição não têm a necessidade de constantemente
colocar fins nas suas ações. Esses agentes estão envolvidos no imediato da prática, estão
inscritos no jogo, suas condutas não são permanentemente pensadas com um projeto, o
jogador simplesmente joga porque nele estão internalizados os arranjos que são socialmente
construídos, estão absorvidas as estruturas que são estruturantes estruturadas que foram
instrospectadas e que são capazes de fornecer uma orientação para as atitudes e procedi-
mentos, o que gera uma disposição de agir no mundo e esse agir não é gratuito.
Desta forma um agente que está inserido em um grupo social incorpora não apenas
os valores do grupo ao qual pertence, mas também padrões de comportamentos, condutas,
maneiras, modos, procedimentos e costumes e o que provoca uma idiossincrasia. Os es-
quemas mentais e corporais são lento e permanentemente moldados até conferir uma forma
ao agente e uma vez absorvidas as dimensões do grupo passam a gerar esquemas para a
prática da ação. Quando o agente age é, de certa forma, um agir coletivo por meio do indi-
víduo. Bourdieu sustenta que a maior contribuição da microssociologia como a etnometodo-
logia e a fenomenologia é a de demonstrar que o agir humano se torna exequível graças a
competências cognitivas e práticas partilhadas pelos integrantes da sociedade. Os saberes
coletivamente compartilhados se tornam referências e ferramentas de ação para condutas
e comportamentos no mundo social, ou seja, os saberes adquiridos pelos agentes são

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instrumentos para condução na sociedade e a maior parcela do estoque de conhecimento
não apresenta um caráter consciente, opera de maneira tácita e não reflexiva (Peters, 2018).
Os saberes práticos que afetam o comportamento dos agentes no mundo social impac-
tam inclusive o que Mauss (1974) denominou de técnicas corporais. Essa concepção é uma
ruptura com a interpretação puramente biológica do corpo, considerando que o conjunto de
falas, gestos, posturas, movimentos, são modos socialmente aprendidos e reproduzidos,
dessa maneira, pode-se considerar que as atitudes corporais são moldadas e transmitidas
por cada sociedade. Técnicas corporais relacionam-se aos modos pelos quais os agentes
utilizam seus corpos e “mesmo se existem variações de um indivíduo para outro, é antes
de mais a razão prática coletiva que orienta os comportamentos e molda os gestos” (Rosa,
2019, p.341). Mauss se vale da noção de hexis corporal que diz respeito à motricidade, a
práticas contidas em códigos de conduta, aos esquemas corporais, que são aprendidas atra-
vés das relações sociais, sendo, portanto, simultaneamente singular e sistemática. Ao pro-
jetar os condicionantes sociais sobre os atos corporais, Mauss sustenta que é o corpo é
também um elemento social. O corpo é capaz de transmitir mensagens, também utilizado
em cerimônias e ritos, é a expressão de uma sociedade, de seus valores, de suas crenças,
de seus hábitos e costumes, sendo moldado pelo universo social que o cerca. No corpo se
desenvolvem significações e interações simbólicas, que o configuram como eixo de relação
entre o indivíduo e a sociedade; “antes de qualquer coisa a existência é corporal” (Le Breton,
2017, p. 07). Bourdieu (2012), por sua vez, aponta que o corpo é o elemento biológico mais
socialmente modelado, e, nesse sentido, deve-se ressaltá-lo como uma instância na qual
as desigualdades entre os sexos se apresentam e se materializam na forma de dominação
masculina, sendo esta naturalizada. Afirma o autor que os princípios da visão androcêntri-
ca são naturalizados sob a forma de posições e disposições elementares do corpo, e que
esta perspectiva é percebida como uma expressão normal de tendências naturais. Essa
dominação se manifesta, a partir de uma perspectiva simbólica, sob uma forma particular
de violência, por meio da qual se impõem significações que são difundidas como legítimas,
de forma a dissimular as relações de força entre o masculino e o feminino. A dominação
masculina seria imposta, naturalmente aceita e vivenciada, enquanto a submissão feminina
seria invisível e as próprias vítimas legitimariam tal condição. A perspectiva androcêntrica
seria, assim, intrínseca à violência simbólica que as instituições acabam por legitimar (Lopes,
Meyer &Waldon, 1996).
As categorias analíticas de Bourdieu como dominação, campo, habitus, capital, espaço
social, além de seu trabalho sobre a gênese e a estrutura do campo religioso são substan-
ciais para fundamentar a produção de pesquisas nas mais diversas áreas do conhecimento,
a perspectiva relacional desse autor, que permite transcender as dicotomias objetivismo/
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subjetivismo, agência/estrutura. Na dimensão teórica e metodológica colabora para transpor
a separação entre sujeito e o sistema que o envolve, sendo fundamental para se captar os
mecanismos de funcionamento da vida social que é composta pelos resultados das inte-
rações entre os agentes e com as estruturas, o que envolve o indivíduo, seu corpo, seus
valores, suas crenças, suas ideologias, e ao mesmo tempo as instituições, a comunidade e
os determinantes macrossociais.
A concepção relacional de Bourdieu “no seu sentido mais amplo, investiga a vida social
através do estudo das relações sociais” (Powell e Dépelteau, 2013, p. 1), relações essas
que ocorrem intermediadas por práticas sociais que são produtoras de sentido no mundo,
por isso, “os objetos parecem determinar nossa conduta, mas, primeiramente, nossa prática
determina esses objetos” (Veyne, 1982, p. 159). A perspectiva de que as práticas sociais
são o resultado da conexão entre circunstâncias objetivas e disposições subjetivas é que
torna possível definir a teoria de Bourdieu como praxiológica. (Peters, 2018). Deve-se levar
em consideração também que a Teoria da Prática de Bourdieu é indissociável da prática
da teoria, sendo que “a teoria sem pesquisa empírica é vazia (...) a pesquisa empírica sem
teoria é cega” (Bourdieu & Wacquant, 1992, p.162). E outro fator, tanto os objetos, quanto os
indivíduos, a sociedade e as práticas sociais, estão situados em um tempo histórico, dessa
maneira as práticas também são datados, “o que significa dizer que indivíduos e sociedades
são objetos históricos e, portanto, múltiplos, uma vez que dependem das múltiplas práticas
e relações que podem ser estabelecidas em cada época, cultura, país, cidade, família”
(Escóssia; Kastrup, 2005)1.

AÇÃO E ESTRUTURA

A partir da segunda metade da década de 1950 intensificarem-se no âmbito das teorias


dos estudos sobre a sociedade as tentativas de sintetizar as diversas perspectivas analí-
ticas acerca da vida social, na década de 1970 os movimentos que objetivavam suplantar
a fragmentação teórica se reforçaram (Domingues, 2001), “nesse período o estruturalismo
institucionalizou um ‘megaparadigma’ transdisciplinar, contribuindo para integrar as chamadas
‘humanidades’ e as ciências sociais”, (Andrade, 2006, p.98), a linguagem na vida cultural
era o elemento central dessa integração. Após o contato com o estruturalismo linguístico o
antropólogo estruturalista, Claude Lévi-Strauss, concebe ser possível alcançar a estrutura
inconsciente através do método estrutural e indica que as ciências sociais são capazes de
formular relações entre a estrutura e o signo.

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1 Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S1413-73722005000200017

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O influxo do estruturalismo em Bourdieu vem da produção intelectual de Lévi-Strauss,
porém, o sociólogo aponta outro caminho, segue a tradição do antropólogo ao considerar
as estruturas objetivas independente da consciência dos agentes, contudo, se distingue ao
considerar que as estruturas devem ser analisadas a partir da prática, considera que as dis-
posições socialmente construídas têm o poder de orientar para ação, em sua obra Le sens
pratique demonstra que o agente está inserido na estrutura, mas ao mesmo tempo é força es-
truturante de um campo, portanto, adota uma perspectiva dinâmica e relacional. Em Bourdieu
a estrutura é fruto de relações históricas, é produto e produtora de ações, por isso é con-
dicionada e ao mesmo tempo condicionante, daí o fato da teoria bourdieusiana evidenciar
a mediação entre o agente e a sociedade. Em Lévi-Strauss a estrutura é a-histórica e não
relacional e não considera o agente. O estruturalismo de Bourdieu é alicerçado no desvela-
mento da articulação do social, na observação da prática e o que método que utiliza considera
os mecanismos de dominação, a origem das condutas e a produção de ideias, ou seja, é
sustentado em uma noção de estruturas históricas, contextuais e geradoras.
Para Bourdieu as estruturas são históricas e independem da consciência dos indiví-
duos, contudo, elas possuem a capacidade de influenciar no curso da ação dos agentes, de
influir na percepção dos indivíduos e dos grupos, na maneira de pensar e agir de um agente,
dessa forma, a vida social é constituída por estruturas objetivas que são independentes da
consciência e vontade dos agentes, mas essas estruturas tendem a orientar as suas repre-
sentações, suas ideias e suas práticas. O que não significa que os agentes sejam passivos
diante das estruturas.

“Bourdieu falava então em agentes e não em sujeitos, nos quais a ação não
é simplesmente a execução e obediência a regras. Aos poucos ele percebia
que os indivíduos, tanto nas sociedades arcaicas, como nas complexas, não
são apenas autômatos regulados como relógios, segundo leis mecânicas que
lhes escapam” (Andrade, 2006, p.101)

Embora a forma de agir e de pensar dos agentes não sejam mecânicas, são consti-
tuídas e organizadas a partir das perspectivas do campo em que se inserem, “é no interior
de um estado determinado do campo, definido por certo estado do espaço de possíveis,
em função da posição mais ou menos singular que ele ocupa” (Bourdieu, 2008, p. 72) que
o agente pratica a sua ação. O agir está disposto em uma estrutura estruturada que dita
e determina convenções, prescrições e códigos que são internalizados e aceitos. Assim é
possível considerar que as estruturas exercem um influxo nos procedimentos dos agentes,
sendo essa influição independente de suas consciências, mas há certa autonomia para a
ação desde que se respeitem os limites aceitos e impostos pela estrutura. O agente não é
um ser robotizado, sem desejos, sem intenções, mas também está inserido em um contexto
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que é determinante para provocar os desejos e as intenções. Chegar a esse raciocínio só
é possível por meio do panorama relacional, que considera o nexo entre ação e estrutura
tomando-os não dois pólos distintos, mas complementares.
Aqui se chega a um ponto crucial, na perspectiva de Bourdieu como as estruturas se
renovam e se reproduzem? A resposta é uma construção dialética já apresentada. No mo-
delo praxiológico bourdieusiano se articulam dialeticamente o agente e a estrutura social, ou
seja, é um arquétipo centrado na mediação entre a agência e a estrutura, embora considere
que o mundo social é constituído por estruturas independentes da consciência e vontade
dos agentes, aponta que a vida social é pautada nas relações dialéticas entre as estruturas
e as disposições estruturadas as quais os agentes constantemente atualizam e reprodu-
zem, sendo um processo duplo de interiorização da exterioridade e de exteriorização da
interioridade (Setton, 2002), considerando a junção e a dinâmica dos aspectos objetivos (da
estrutura) e subjetivos (dos agentes) em Bourdieu o que se pode considerar é a construção
de uma teoria da ação.
Uma das reflexões centrais da teoria da ação de Bourdieu se baseia no conceito de
habitus, conforme o sociólogo “o habitus é esse princípio gerador e unificador que retraduz as
características intrínsecas e relacionais de uma posição em um estilo de vida unívoco, isto é,
em conjunto unívoco de escolhas, de bens, de práticas.” (Bourdieu, 2008, p.21-22). O habitus
é o elemento gerador de práticas e tem como ponto de partida a relação entre o agente e a
estrutura, ou seja, pode-se afirmar que o agente e a estrutura se encontram em uma relação
que é dialética entre a interioridade e a exterioridade, entre o subjetivo e o objetivo. Em um
caminho científico o habitus fornece subsídios explicativos sobre como agentes inseridos em
uma estrutura são moldados sem que se dêem conta dessa condição. Bourdieu oferece as
condições para transitar além do senso comum, através da perspectiva do habitus, arquiteta
a seu pensamento reflexivo e crítico que agrega condições de uma compreensão inovadora
sobre as condições sociais. (Souza, 2004).
Outro elemento central para se compreender a estrada epistemológica de Bourdieu é
a teoria sobre campo. Na construção bourdieusiana o campo é marcado pelas formas de
capital já mencionadas (econômico, cultural, social e simbólico), os processos em cada cam-
po são estabelecidos pelo enfrentamento entre os agentes que objetivam manter ou alterar
as relações de força em seu interior, as distribuição das formas de capital são decisivas
para designar os espaços e o posicionamento dos agentes no campo, o que determina as
condutas individuais e coletivas são as posições na estrutura de relações. Em um procedi-
mento dialético o habitus determina as disposições do agente e o conjunto de disposições
determina o habitus, em uma dinâmica relacional. Pode-se afirmar que os agentes que nele
estão inseridos são disponibilizados de acordo o volume de capital de que são possuidores.
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CAMPO E ESPAÇO SOCIAL

Em sua teoria de campo, Bourdieu propõe um modelo geral que possa se enquadrar
em diferentes sociedades ou estruturas, contudo, observa que o cosmo social é constituído
por conjuntos de microcosmos relativamente autônomos. Esses microcosmos por sua vez
são espaços de relações regidas por uma lógica irredutível àquelas que regem os outros
campos, isso significa que os vários campos como o cultural, o religioso, o econômico, o
político, obedecem fundamentos diferenciados, mas que ainda assim correspondem a uma
logicicidade que são próprias aos campos.
Essa teoria nos permite conceber o mundo social constituído a partir de subsistemas
que são adotados de certa autonomia em suas práticas, contudo, essa autonomia não se
configura um isolamento, o campo se relaciona com outros campos sobre os quais exerce
influência e é influenciado (Leander, 2008). Bourdieu projetou suas ideias sobre o campo a
partir de combinações teóricas de diversos autores, particularmente Marx, Durkheim e Weber
(Lahire, 2017, p.64), de Marx se serviu do materialismo e da dominação nas relações de
força, de Durkheim as formas simbólicas e a metodologia holística e de Weber a dimensão
dos princípios estruturantes de poder (Wacquant, 2002). O termo campo foi utilizado pela
primeira vez no artigo Champ Intellectuel et Projet Créateur (1966), e se tornou um dos
elementos centrais das análises bourdieusianas.

“Em termos analíticos, um campo deve ser definido como um network, ou uma
configuração, de relações objetivas entre posições. Tais posições são definidas
objetivamente, na sua existência e na determinação que impõe sobre quem
as ocupa, agentes ou instituições, a partir de suas espécies atuais de poder
(ou capital) cuja posse comanda o acesso aos ganhos específicos que estão
em jogo no campo, bem como a partir de suas relações objetivas com outras
posições (dominação, subordinação, homologia, etc.)” (Bourdieu & Wacquant,
1992, p. 97).

De acordo com Bourdieu (2008), o campo social é um espaço estruturado em que os


agentes ocupam posições distintas em relação uns aos outros, por isso nele há variadas
posições sociais, os eixos estruturantes é que configuram e definem o espaço de posições
que são organizadas de forma relacional, as posições sociais de cada agente são demar-
cadas de acordo com o conjunto de suas relações. Um campo é um sistema ou um espaço
estruturado de posições que são ocupadas por diferentes agentes, é um espaço de disputa
entre as forças, um local de batalhas onde os agentes disputam espaços com vistas a atingir
seus objetivos, para isso adotam estratégias que são antagônicas entre os que almejam a
conservação e os que desejam a subversão das condições existentes. O campo é uma esfera
de lutas, uma arena onde transcorre a competição entre agentes que possuem acúmulos de
capitais distintos e que ocupam diferentes posições, o propósito das lutas é a apropriação do
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capital específico do campo ou a redistribuição desse capital que é desigualmente distribuído
entre os agentes que estão imersos em um estado constante de relações entre as forças
em constante disputa no campo (Lahire, 2017). Como lócus de batalha, agentes objetivam
progredir nas posições existentes no campo a partir da acumulação de capitais (Steinmetz,
2011). Bourdieu emprega a metáfora do jogo para demonstrar a dinâmica da luta no interior
dos campos, as regras do jogo é que estabelecem os mecanismos legítimos de conservação
e aquisição do capital específico em cada campo (Jourdain; Naulin, 2017, p.147), antes de
entrar no jogo é necessário inscrever-se no campo, “é a adesão coletiva ao jogo que é ao
mesmo tempo a causa e o efeito do existir desse jogo”. (Bourdieu, 1992, p.279). No interior
do campo há “os agentes, com meios e fins diferenciados conforme sua posição na estrutura
do campo de forças, contribuindo assim para a conservação ou transformação da estrutura”
(Bourdieu, 2008. P.50). Bourdieu (2008) reconhece que o campo é marcado por diferentes
hierarquias de interesses, sustentado em situações de desigualdade de poder que são ar-
ticuladas por meio de processos históricos.
Os campos são dinâmicos, embora cada um deles “seja relativamente autônomo, dotado
de uma história própria” (Bourdieu, 2008, p. 57), eles não se encontram isolados, herméticos,
vedados da influição de outros campos, se cada campo fosse um sistema totalmente autôno-
mo ficariam “impedidos de dar conta das mudanças que ocorrem nesse universo separado”
(Bourdieu, 2008, p.57), além do mais, o dinamismo existente entre as diversas esferas da
vida social corrobora com a lógica relacional presente em toda a teoria de Bourdieu.
Por fim, conclui-se que o método proposto por Bourdieu considera que uma pesquisa
sobre o universo social deve-se observar a prática da ação dos agentes (que são dotados
de intencionalidades) a partir de suas experiências cotidianas e como essas experiências
se relacionam com as estruturas contidas nos campos. Bourdieu compreende que uma pes-
quisa na área de humanas deve ser empreendida “como um ‘serviço público’ cuja missão é
‘desnaturalizar’ e ‘desfatalizar’ o mundo social e ‘requerer condutas’ por meio da descoberta
das causas objetivas e das razões subjetivas que fazem as pessoas fazerem o que fazem.”
(Wacquant, 2002. p.100). Na dimensão bourdieusiana a produção de uma investigação sobre
a sociedade deve adotar uma posição sistemática e observar o objeto como um conjunto
de relações correntes, cabe ao pesquisador perceber as particularidades a fim de encontrar
características invariáveis e a partir daí compreender como o objeto possui generalidades,
“trata-se de interrogar sistematicamente o caso particular, constituído em ‘caso particular
do possível’, como diria Bachelard, para retirar dele as propriedades gerais ou invariantes
que só se denunciam mediante uma interrogação assim conduzida.” (Bourdieu, 2002, p.32).

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03
Acerca das contribuições do Teatro do
Oprimido de Augusto Boal para o debate
de gênero no Ensino de Sociologia

Rivelino Lourenço Martins

Elaine Regina Botter Okado

'10.37885/211206894
RESUMO

Os motivos que levaram a elaboração do presente trabalho foram os incômodos vividos


como professores do Ensino Médio de Sociologia na Secretaria Estadual de Educação de
São Paulo. Persiste no âmbito escolar uma hostilidade, indiferença no tocante às questões
de gênero. Desde a obrigatoriedade do Ensino de Sociologia para o Ensino Médio foram
muitos os conflitos vividos em sala de aula, em reuniões pedagógicas, em conversas na
sala dos professores ou com a gestão na tentativa de travar um debate científico sobre
o tema. O que torna a disciplina de Sociologia cada vez mais necessária, no sentido da
contribuição para a convivência e o diálogo entre as diversidades de gênero presentes
na escola. Ressaltando-se que a educação é para todos e a escola é um espaço público.
Dessa forma, a proposição deste trabalho é refletir as relações de gênero no ensino de
Sociologia à luz das contribuições de Augusto Boal.

Palavras-chave: Ensino de Sociologia, Teatro do Oprimido, Debate de Gênero.

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INTRODUÇÃO

Os motivos que levaram a elaboração do presente trabalho foram os incômodos vividos


como professores do Ensino Médio de Sociologia na Secretaria Estadual de Educação de
São Paulo. Persiste no âmbito escolar uma hostilidade, indiferença no tocante às questões
de gênero. Desde a obrigatoriedade do Ensino de Sociologia para o Ensino Médio foram
muitos os conflitos vividos em sala de aula, em reuniões pedagógicas, em conversas na
sala dos professores ou com a gestão na tentativa de travar um debate científico sobre o
tema. O que torna a disciplina de Sociologia cada vez mais necessária, no sentido da contri-
buição para a convivência e o diálogo entre as diversidades de gênero presentes na escola.
Ressaltando-se que a educação é para todos e a escola é um espaço público.
No desenvolvimento da disciplina Teorias e práticas do teatro e a sala de aula: recursos
e possibilidades ministrada pela Prof. Dra. Ana Paula Cordeiro, na Universidade Estadual
Paulista, Campus de Marília-SP, pelo PROFSOCIO - Programa Nacional de Mestrado
Profissional de Sociologia - torna-se clara a relação entre o ensino de Sociologia e o Teatro
do Oprimido de Augusto Boal, especialmente com o tema gênero.
Dessa forma, a proposição deste trabalho é refletir as relações de gênero no ensino
de Sociologia à luz das contribuições de Augusto Boal. Para tanto, o trabalho foi dividido
em seis tópicos: Introdução, Em torno da opressão produzida e reproduzida na sociedade
capitalista, A contribuição da sociologia para um debate de gênero no ambiente escolar,
Importância dos jogos teatrais no ensino de sociologia e Conclusão.

EM TORNO DA OPRESSÃO PRODUZIDA E REPRODUZIDA NA SOCIE-


DADE CAPITALISTA.

Boal acredita que alfabetizar não é só através na linguagem escrita, mas, também por
meio da arte. Portanto, o teatro pode ser posto a serviço do povo, dos oprimidos, a fim de
que estes se expressem através da linguagem teatral. A premissa básica de sua obra é que
todo indivíduo é capaz de atuar. Deixando assim, de ser um espectador passivo no teatro
e na vida, torna-se sujeito, ator, transformador. Através do teatro podemos trabalhar as
formas de opressão que sofremos ao longo da vida. Opressões de um sistema social duro,
individualista, severo, que nos desumaniza. Logo, o teatro contribui para a humanização e
conscientização dos educandos.
É evidente que, a escola reproduz os pesares da sociedade capitalista que a circun-
da. Contudo, reside nela um potencial de transformação, de mudança, um espaço dialéti-
co. O Teatro do Oprimido potencializa a capacidade de transformação, ação do indivíduo no
ambiente escolar. Nesse sentido, rompe a lógica elitista do teatro que separa os protagonistas
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das massas, o público é ator. Os espectadores não assistem passivamente, eles atuam,
participam ativamente. Nesse movimento há ação, conscientização, transformação.
Entendemos que enquanto existirem opressores e oprimidos o Teatro do Oprimido
se fará necessário. O contexto atual reforça essa ideia. De acordo com Cardoso e Ferrari,
(2016) desde 2014 presenciamos no Brasil dois projetos distintos de Estado que se opuse-
ram nas ruas e nas urnas. Em 2016 sofremos um golpe empresarial, jurídico, parlamentar
e midiático que busca desconsiderar os esforços, as vitórias, tão importantes de ativistas,
professores, intelectuais e militantes dos movimentos sociais na luta pela igualdade de
condições, reconhecimento de direitos das diversidades e dos direitos humanos. Além das
Reformas do Ensino Médio, Trabalhista,
Previdenciária, PEC 241, que congela os gastos públicos pelos próximos vinte anos,
há um monitoramento cotidiano e ameaçador de professores, alunos, ativistas e militantes
de movimentos sociais, a exemplo da Escola Sem Partido.

A CONTRIBUIÇÃO DA SOCIOLOGIA PARA UM DEBATE DE GÊNERO


NO AMBIENTE ESCOLAR

Discutir gênero na educação não é uma tarefa fácil, é um tema polêmico com diferen-
tes apropriações nas escolas, famílias, religiões, mídias. Já que, todos os indivíduos estão
expostos ao processo de socialização que influencia nos valores, ideias, atitudes e fazeres
comum. Gênero, além de ser um termo importado da gramática, foi utilizado pelas feministas
norte-americanas desde a década de 1970, sendo empregado para contrapor as definições
presas ao determinismo biológico que incide sobre as diferenças sexuais.

O aprendizado dos papéis de gênero é um processo muito complexo que


envolve muito mais do que as interações entre pais e filhos. Ele abrange não
apenas os agentes de socialização primária, desde a mais tenra idade, mas
também figuras de autoridade como professores, orientadores, profissionais,
sacerdotes, entre outras, que procuram impor suas ideias acerca do comporta-
mento de gênero apropriado às crianças. Além disso, a forma como o processo
de socialização se dá no interior das relações familiares e, posteriormente, na
educação escolar, será fundamental para o tipo de identidade de gênero que
a criança desenvolverá em sua vida adulta. (BRASIL, 2010 p.143)

Para Danièle Kergoat (2000) as condições em que vivem homens e mulheres não se
configuram um destino biológico, mas são antes de tudo construções sociais. Eles formam
dois grupos sociais que estão envolvidos em uma relação social específica: as relações
sociais de sexo. De acordo com Kergoat três relações sociais fundamentais se imbricam, e
são transversais: o gênero, a classe e a raça.

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Com esse intuito a autora faz alusão a consubstancialidade, onde a análise de gêne-
ro: gênero, classe social e raça, não pode ser compreendidos de maneira estanque devido
a sua complexidade e dinamicidade das relações. A discussão da autora é muito densa e
complexa. O presente trabalho não tem o intuito de fazê-la. Neste espaço, ressalta-se a
importância do olhar, da formação do docente a partir da perspectiva da autora ao relacionar
os conceitos de raça e classe no trabalho com a questão de gênero.
O crescimento de discursos conservadores notadamente religiosos cristãos, fascistas,
da mídia, da publicidade e do consumismo prejudicam as conquistas de projetos educacionais,
assim como, o debate acerca da questão de gênero. Nas palavras de Guacira Lopes Louro:

Conselhos e palavras de ordem interpelam-nos constantemente, ensinamos


sobre saúde, comportamento, religião, amor, dizem-nos o que preferir e o que
recusar, ajudam-nos a produzir nossos corpos e estilos, nossos modos de ser
e de viver. Algumas orientações provêm de campos consagrados e tradicional-
mente reconhecidos por sua autoridade, como o da medicina ou da ciência, da
família, da justiça ou da religião. Outras parecem surgir dos novos espaços ou
ali ecoar. Não há uniformidade em suas diretrizes. Ainda que normas culturais
de há muito assentadas sejam reiteradas por várias instâncias, é indispensável
observar que, hoje, multiplicaram-se os modos de compreender, de dar sentido
e de viver os gêneros e a sexualidade. (LOPES 2008. p.19)

Apesar da extrema relevância do tema, nas escolas as relações de gênero ganham


pouco destaque entre educadores e educadoras. Para Cláudia Pereira Vianna e Sandra
Unbehaum ainda é preciso ampliar os exames de gênero nas políticas públicas, na formação
docente, no cotidiano escolar. (VIANNA e UNBEHAUM, 2004).

Poucas são as investigações que abordam o impacto da discriminação de


gênero nas políticas públicas educacionais, tais como a persistência da dis-
criminação contra as mulheres expressa em materiais didáticos e currículos,
a limitação ao acesso à educação e permanência na escola, sobretudo das
jovens grávidas, bem como o fracasso escolar que marca de maneira distinta
a trajetória escolar de meninos e meninas. A escassez dessa abordagem espe-
lha-se na raridade de análises densas sobre a discussão acerca da igualdade
entre homens e mulheres prevista na Constituição Federal de 1988. (VIANNA
e UNBEHAUM, 2004. p.2)

Diante do quadro explicitado acima, a escola enquanto instituição e a Sociologia como


ciência que desmistifica o senso comum tem um papel importante na construção de um
ambiente escolar onde as diferenças de gênero possam não somente ser aceitas, mas
também vividas sem nenhuma forma de preconceito e discriminação. Como nos mostra
Guacira Lopes Louro:

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A visibilidade que todos esses novos grupos adquiriram pode ser, eventual-
mente, interpretada como um atestado de sua progressiva aceitação. Contudo,
nem mesmo a exuberância das paradas da diversidade sexual, das feiras mix,
dos festivais de filmes alternativos permite ignorar a longa história de margina-
lização e de repressão que esses grupos enfrentaram e ainda enfrentam. Não
podemos tomar de modo ingênuo essa visibilidade. Se, por um lado, alguns
setores sociais passam a demonstrar uma crescente aceitação da pluralidade
sexual e, até mesmo, passam a consumir alguns de seus produtos culturais,
por outro lado, setores tradicionais renovam (e recrudescem) seus ataques,
realizando desde campanhas de retomada dos valores tradicionais da família
até manifestações de extrema agressão e violência física. (LOPES 2008. p.19)

Através dos recursos metodológicos de desnaturalização (não naturalização das con-


cepções a respeito dos fenômenos sociais) e estranhamento (estranhar aquilo que é fa-
miliar, um olhar estranhado para o cotidiano) da realidade, a Sociologia proporciona aos
educandos um olhar autônomo, independente, crítico da realidade que o cerca. Permitindo
assim, uma desmistificação das relações de gênero no cotidiano escolar como também
para além dele. Assim como ensina a Proposta Curricular do Estado de São Paulo para
a Disciplina de Sociologia “Trata-se, portanto, não de se colocar no lugar do jovem como
porta-voz, mas de aproximar-se dele para estranhar com ele o seu próprio lugar no mundo
que o cerca”. (BRASIL, p.134)

IMPORTÂNCIA DOS JOGOS TEATRAIS NO ENSINO DE SOCIOLOGIA

A apresentação dos jogos teatrais, sistematizados por e Augusto Boal são meios efi-
cientes, propícios à instigar a imersão nos modos de ser e estar da criança e do adolescente
ao surgimento de uma perspectiva plausível, ao nos referirmos à transformação cultural e
social, assim como, a formação de uma sociedade mais coesa. Vendo à luz desses pressu-
postos o teatro como forma de ensino se vê em um terreno fértil, pois ao mesmo tempo em
que se aproxima da realidade por meio das representações sociais, onde a relação entre o
real e o fictício se torna uma “via de mão dupla”, apresenta os dramas sociais da vida real,
tornando-se ferramenta imprescindível para entendermos a realidade e aplicarmos essa
relação ao Ensino de Sociologia.
Erving Goffman (2014) em sua obra “A representação do eu na vida cotidiana” aborda
a temática do teatro das interações. Sua teoria abrange o comportamento humano como um
todo. Ao nos depararmos com suas teorias sobre o comportamento humano, percebemos
que o autor acredita que todo relacionamento social é visto como sendo uma cena de teatro,
em que existem trocas de ações, respostas e proposições apresentadas dramaticamente.
A estes conceitos e relações surge a necessidade e a dúvida quanto ao emprego da
Arte, enquanto expressão cênica, para alunos do Ensino Médio, pois:

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Quando falamos em teatro, geralmente nos vem a i deia de local, de uma casa
de representações onde ocorrerá um espetáculo, uma peça teatral. Neste local,
pessoas muito bem vestidas se sentam nas cadeiras para assistir a um grupo
de atores que lhes apresentará uma história. Ao final do espetáculo, como
manda o bom costume, gostando ou não da peça, as pessoas aplaudem e
vão embora para suas casas. (CORDEIRO 2009, p.96).

Entretanto, com toda essa complexidade, a expressão cênica vem aliar as relações
entre Ensino e Arte no contexto escolar via relações e interações no próprio cotidiano dos
atores envolvidos no processo de aprendizagem. Sobre esses aspectos encontramos uma
relação dicotômica entre o real e o fictício presente na vida escolar do discente, pois ao
mesmo tempo em que o aluno é ator de suas ações enquanto ser social se torna especta-
dor enquanto educando ao observar a realidade a sua volta. Analisando comparativamente
sobre a ótica de Augusto Boal diríamos que:

(...) a invenção do teatro é uma revolução do tipo copernicano: em nossas


vidas cotidianas somos o centro dos nossos universos e vemos fatos e pes-
soas segundo uma perspectiva única: a nossa. Em cena, continuamos a ver o
mundo como sempre o vimos, mas agora também o vemos como o vêem os
outros: nós nos vemos como somos vistos. A nossa própria, acrescentamos
outras perspectivas, como se víssemos a Terra da Terra onde moramos, e
pudéssemos vê-la também da Lua, do Sol, de um satélite ou das estrelas. Na
vida cotidiana vemos a situação; em cena, nós nos vemos a nós e vemos a
situação na qual estamos: nós em situação, vistos por nós mesmos. (BOAL
2002, p.39).

É de fundamental importância ressaltar que ao nos reportarmos para o Brasil a relação


interdisciplinar, neste contexto do ensino de Sociologia/Arte, começa a ter uma contaminação
pedagógica nas ações dos professores com a promulgação da Lei de Diretrizes e Base da
Educação, Brasil (1971).
Sendo assim, para que houvesse o desenvolvimento do Ensino Médio no Brasil, foi
necessário proferir reformulações constitucionais evidenciando as diretrizes para serem em-
pregues pela educação nacional que tendo nas LDB´s de 1961, 1971, assim como de 1996
projetos e propostas de desenvolvimento educacional e social em várias esferas como: traba-
lho, política, cultura, escola e sociedade, educação, entre outros, vistos em processo a partir
de pressupostos políticos, governamentais, assim como da sociedade civil em seus aspectos.
Nesse sentido, é valioso mencionar que desde então, toda a equipe gestora: coorde-
nadores pedagógicos, docentes, professores, assim como pesquisadores não tem medido
esforços, para que a educação seja impulsionada e, que possa configurar em uma ação
múltipla de possibilidades no que se refere à redução da fragmentação do conhecimen-
to sistematizado.

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É sabido que essas fronteiras do conhecimento foram postas devido ao grau de espe-
cialização ao qual a sociedade foi se transformando de forma acelerada, principalmente à
partir dos século XX, onde as transformações tecnológicas inerentes ao mesmo século e,
por conseguinte, deram a passagem para a subsequente aceleração tecnológica, mudanças
e desequilíbrios econômicos. Nesse contexto as máquinas substituíram em parte a mão
de obra da população visualizando mudanças das mentes, assim como, de percepção do
mundo ao qual conheciam até então (SEVCENKO 2001). Segundo o autor:

Para se ter uma ideia da amplitude e densidade dessas mudanças tecnológi-


cas, consideramos alguns dados relativos ao século XX. Se somássemos todas
as descobertas científicas, invenções e inovações técnicas realizadas pelos
seres humanos desde as origens da nossa espécie até hoje, chegaríamos à
espantosa conclusão de que mais de oitenta por cento de todas elas se deram
nos últimos cem anos. (SEVCENKO 2001, p.24).

Apesar de todas as revoluções tecnológicas, principalmente a partir do século XX, a


arte nunca deixou de ser em sua essência e aplicabilidade uma polifonia entre os meios que
são utilizados para produção em massa até então. Dentro deste contexto de mecanização
e reprodução dos corpos, a arte se configura como a capacidade criativa do homem. Sendo
assim, o ensino de sociologia, por meio da arte, pressupõe uma relação criativa que faz com
que os educandos possam participar aprendendo e compreendendo a realidade social por
meio de jogos teatrais ao visualizar os dramas sociais reais na ficção.
Somando-se a isto:

A atual legislação educacional brasileira reconhece a importância da arte na


formação e desenvolvimento de crianças e jovens, incluindo-a como com-
ponente curricular obrigatório da educação básica. No Ensino Fundamental,
a Arte passa a vigorar a partir da implantação dos Parâmetros Curriculares
Nacionais – PCN (Brasil, 1998) enquanto área de conhecimento no currículo
da escola brasileira, através de quatro linguagens artísticas: Artes Visuais,
Dança, Música e Teatro. ( KOUDELA 2001, p.1)

Para Koudela (2002) os PCNs foram elaborados procurando respeitar as diversidades


regionais, culturais e políticas que já existiam no país, considerando também a necessidade
de construir referências nacionais comuns a todo o processo educativo das regiões brasilei-
ras. É sabido, segundo ela, que o contexto educacional brasileiro perpassa por questões de
diferentes naturezas, onde o currículo apresenta vários dilemas, principalmente se levarmos
em consideração a contemporaneidade em um país de proporções como o nosso, visto que
há impasses na escolha metodológica mais adequada a cada região, tendo um tronco único
que contemple a todas.

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O Teatro vem contemplado de forma ampla os PCNs/Arte a partir de sua gênese em
rituais de diferentes culturas, formas de atuação como instrumento de aprendizagem, en-
tretanto, também é contemplado de forma interdisciplinar em sociologia como instrumento
de aprendizagem, assim como, abordando temas da mesma. Portanto:

Nessa perspectiva, os Temas Transversais incorporam as questões da Ética,


da Pluralidade Cultural, do Meio Ambiente, da Saúde, da Orientação Sexual,
do Trabalho e Consumo. Amplos o bastante para traduzir preocupações da
sociedade brasileira de hoje, os Temas Transversais correspondem a ques-
tões importantes, urgentes e presentes sob várias formas na vida cotidiana.
(KOUDELA 2001, p.2)

A prática do teatro na escola proporciona muito mais que uma simples concepção de
prática artística, mas também uma prática que requer relações e interações sociais diárias,
sendo assim, essa relação proporciona muito mais que aprendizagens, também formação
individual para uma ação coletiva dos alunos em sociedade. Vemos então que a:

A sociologia lida com as relações, os processos e as estruturas sociais. Um


tema particularmente importante da reflexão sociológica é a interação social,
momento primordial na gênese e reiteração do social. Todo fato social carac-
teriza-se por ser um nexo de relações sociais. São as relações, desdobran-
do-se em processos e estruturas, que engendram a especificidade do social.
O homem se constitui como ser social no mesmo processo por meio do qual
se constitui a sociabilidade. (Ianni 1996, p.27)

Para Otávio Ianni (1996) a Sociologia lida com os processos sociais de uma forma
completa e complexa, pois trabalha com processos e estruturas sociais promovendo a inte-
ração social. Segundo ele, o homem se constitui enquanto ser social na relação com outros
seres sociais, compartilhando condições e situações, desenvolvendo atividades e reações,
praticando ações e relações que são dependentes entre si se influenciando reciprocamente.
Com base, nesses pressupostos vemos que as interações sociais são dinâmicas, se
assemelham e estão intimamente relacionados com a prática do Ensino de Sociologia por
meio do Teatro, a partir do momento em que se iniciam os dramas sociais fictícios, tendo
como fio condutor e exemplificando o drama real presenciado e experienciado pelos estu-
dantes. O drama da vida real, nesse sentido, está mais do que interligado ao drama fictí-
cio. O cênico enquanto meio de ensino permite o entendimento pelo aluno de uma sociedade
complexa. Visto que:

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As noções de interação, organização, sistema e mudança, entre outras, apre-
sentam- se como possibilidades de pesquisar e explicar a anatomia das rela-
ções, processos e estruturas de dominação política e apropriação econômica
que articulam as desigualdades e os antagonismos sociais, econômicos, po-
líticos e culturais. ( Ianni 1996, p.27).

Fazendo uma análise comparativa com Ianni (1996), podemos chegar ao entendimento
que a utilização do teatro como forma de ajudar o aluno a compreender a realidade social,
em uma sociedade que se apresenta de forma completa e cada vez mais complexa no de-
correr dos tempos se torna questão imprescindível para potencializar a aprendizagem, pois:

A expressividade dramática evidencia a tendência do ser humano para a re-


presentação, experimentando papéis e vivendo situações. A capacidade de
representação dramática está presente tanto nos jogos de faz-de-conta quanto
num espetáculo de teatro representado por atores profissionais, assumindo
diferentes formas que se desenvolvem através de um processo evolutivo e
construtivo, da criança até o artista adulto. Enquanto que o jogo de faz-de-
-conta, em suas formas iniciais, é totalmente improvisado ao sabor da imagi-
nação dramática da criança, o espetáculo teatral, embora também necessite
da espontaneidade, da improvisação e da intuição, resulta de um processo de
criação e construção intencional, exigindo domínio da linguagem específica
que só se completa com a presença do público. (KOUDELA 2001, p.3)

Por meio dos jogos teatrais, os alunos podem entender os dramas sociais através da
representação dramática, ao mesmo tempo em que aprendem a fazer a leitura das cenas
de teatro no plano fictício, que nascem na ação improvisada, fazem uma associação direta
com os dramas sociais reais, através da contínua interação entre seus pares, produzindo
aprendizagens individuais e coletivas.

CONCLUSÃO

Indiscutível a importância da Sociologia como componente curricular obrigatório no


Ensino Médio, tendo em vista as contribuições da mesma como instrumento de mediação
do educando com a sua realidade material, sobretudo para possibilitar que este compreenda
as relações constituídas em nossa sociedade.
Sob uma estrutura patriarcal, a sociedade ocidental perpetuou na história as formas de
opressão sobre a mulher, naturalizando uma relação de violência e dominação em todas as
esferas da vida pública e privada. No âmbito doméstico, as mulheres são ensinadas sobre
seus papéis como mães e esposas exemplares, donas de casa e hábeis com o trabalho
doméstico; enquanto no espaço público, a figura feminina sempre fora vista com descon-
fiança e sinônimo de incapacidade para exercer as atividades comumente denominadas
como “masculinas”.
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Seja no trabalho ou na política, a mulher ainda se encontra como figurantes no cená-
rio majoritariamente preenchido por homens forjados, desde sua infância, numa educação
sexista. Desta forma, o presente trabalho possui a finalidade de demonstrar a relação entre
a escola, propriamente os conceitos inerentes ao conteúdo ministrado pela disciplina de
Sociologia, e a sua capacidade de transformar as estruturas excludentes da nossa sociedade
pautada na dominação de gênero.
O princípio epistemológico da desnaturalização é o recurso, através do qual a Sociologia
ganha enorme destaque como ferramenta de enfrentamento das desigualdades de gênero,
trazendo a tona discussões que possibilitem aos educandos a capacidade de absorver as
contradições inerentes ao discurso hegemônico sobre gênero.
Desenvolver espaços de representatividade feminina e fomentar discussões que cor-
roborem as falas das educandas são exemplos utilizados para que todos os alunos possam
apreender os conceitos sociológicos e, concomitantemente, realizar a mediação com a
realidade concreta.
Para isso, a técnica do Teatro do Oprimido desenvolvido por Augusto Boal, como
já delineado outrora, já demonstrou enorme capacidade de possibilitar tais experiências
no interior da sala de aula. A linguagem do teatro, tratando desta técnica em particular,
deve ser exercida por aqueles inseridos diretamente na contradição social, como exercício
de transcendência.

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04
Controle social na política de saúde e
processos de gestão

Francyely dos Santos Moura


UFRN

Jailma da Costa Batista


UFPB

Andressa Cassiano Araújo


UFRN

'10.37885/220207879
RESUMO

Trata-se de uma Revisão Integrativa da Literatura que analisou artigos científicos sobre os
conselhos municipais de saúde nos processos de gestão dos últimos quinze anos. Foram
pesquisados na Biblioteca Virtual em Saúde, pelos dados: Literatura Latino-Americana
e do Caribe em Ciências da Saúde; Medical Literature Analysis and Retrieval System
Online; e Base de Dados de Enfermagem. Objetivou-se analisar as produções científicas
dos conselhos municipais de saúde nos processos de gestão. Os resultados apontaram
diversos desafios ainda não superados na participação social nos conselhos de saúde.
Conclui-se que os Conselhos veem avançando, porém existem muitos desafios e limites
a serem superados para funcionar de forma efetiva e como espaços de concretização
do SUS e de seus princípios, contribuindo para uma assistência à saúde de qualidade
para comunidade, além identificar as necessidades da população e melhorar os serviços
públicos e as condições de saúde dos mesmos.

Palavras-chave: Conselhos Municipais Saúde, Sistema Único de Saúde, Gestão Pública.

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INTRODUÇÃO

O Sistema Único de Saúde (SUS) é constituído pelo conjunto de ações e serviços


de saúde, prestados por órgãos, instituições públicas (federais, estaduais e municipais da
Administração direta e indireta) e privadas (prestadores de serviço), fundações mantidas pelo
poder público tendo como objetivo o atendimento universal e integral a todos os cidadãos
constituído por uma rede descentralizada, hierarquizada, regionalizada e com a participação
da sociedade (BRASIL, 1990).
Nesse sentido, a Lei 8.142/1990 dispõe sobre a participação da comunidade na gestão
do SUS e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da
saúde e dá outras providências. Desse modo, tem destaque os Conselhos e Conferências
de Saúde como espaços de participação social com representação de vários seguimentos
sociais (BRASIL, 1990).
Cabe ressaltar que os Conselhos de Saúde são órgãos de caráter permanentes e deli-
berativos, ou seja, devem tomam decisões dos assuntos da saúde e estão permanentemente
em funcionamento. Os mesmos são compostos por representantes do governo, prestadores
de serviços, profissionais da saúde e usuários atuando na estratégia e no controle da exe-
cução da política de saúde na instância correspondente (BRASIL, 1990).
A Resolução nº 453/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) aprova as diretrizes
para instituição, reformulação, reestruturação e funcionamento dos Conselhos de Saúde em
todas as esferas de governo. É importante destacar que as ações dos conselhos de saúde
devem ser norteadas pelos princípios e diretrizes do SUS como a universalidade, integrali-
dade, equidade, participação social, descentralização politico-administrativa, regionalização
e hierarquização. Rolim et al. (2013) afirmam que a participação social, apesar do seu apa-
rato legal, é um processo em permanente construção com avanços e desafios dependendo
muitas vezes da mobilização da comunidade na defesa de seus direito ocupando diversos
espaços de participação social.
Vale destacar que a ênfase dada ao Controle Social nesse trabalho diz respeito as
ações do Estado que os cidadãos podem fiscalizar, monitorar, avaliar e intervir, já ao falar
em participação social refere-se a busca pelo diálogo entre a gestão dos serviços públi-
cos e a sociedade.
Sendo assim, o Controle Social no SUS assegura o exercício do direito de cidadania e
contribui para que as políticas públicas sejam mais eficazes, eficientes e tenham uma maior
efetividade para os usuários. Desse modo, Jorge et al., (2012) destaca que a instituição
dos conselhos de saúde é fruto de mobilização de profissionais da saúde e de setores da
sociedade civil ressaltando que nos municípios a implantação resultou de uma política de
indução do Ministério da Saúde (MS).
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Assim a participação nos Conselhos de Saúde deve ser vista como de relevância pú-
blica e seus representantes devem defender a coletividade. Nessa perspectiva, o questio-
namento central deste trabalho é: como a literatura nacional aborda os possíveis desafios
e contribuições dos conselhos de saúde para consolidação do Sistema Único de Saúde e
no seu processo de gestão?
Nesse sentido, o presente artigo tem como objetivo analisar as produções científicas
acerca dos conselhos municipais de saúde nos processos de gestão. Com o intuito de res-
saltar a relevância social e política da participação da sociedade no controle social na gestão
do SUS e despertar um maior interesse da comunidade e gestores para a importância do
tema estudado, contribuindo assim para a consolidação e a democratização da saúde.

MÉTODO

Para elaboração deste trabalho desenvolveu-se uma Revisão Integrativa da Literatura


(RIL) que analisou artigos científicos sobre o tema em questão, publicados nos últimos quin-
ze anos. Os artigos referentes à temática estudada foram pesquisados na Biblioteca Virtual
em Saúde (BVS), utilizando as seguintes bases de dados: Literatura Latino-Americana e do
Caribe em Ciências da Saúde (LILACS); Medical Literature Analysis and Retrieval System
Online (MEDLINE); e Base de Dados de Enfermagem (BDENF).
A revisão integrativa é um método de pesquisa que permite sintetizar as pesquisas
disponíveis a respeito de determinada temática e direcionar a prática fundamentando-se em
conhecimento científico além de ser uma metodologia mais ampla em relação as revisões
bibliográficas proporcionado uma melhor análise do objeto estudado. Vale destacar que esse
método apresenta seis fases no processo da elaboração da revisão integrativa são eles:
elaboração da pergunta norteadora busca ou amostragem na literatura, coleta de dados,
análise crítica dos estudos incluídos, discussão dos resultados e apresentação da revisão
integrativa (SOUZA et al, 2010).
Foram utilizados os seguintes descritores: Conselho Municipal de Saúde; Gestão;
Sistema Único de Saúde, ressaltando que todos os descritores foram consultados nos
Descritores em Ciências da Saúde (DECS) e o conectivo boleando utilizado foi o and. Vale
salientar que os critérios de inclusão foram: textos disponíveis publicados em português,
publicações de artigos realizadas nos últimos dez anos no Brasil.
No que se refere aos critérios de exclusão foram retirados os estudos repetidos e
os que não abordassem a temática proposta. Desse modo, após a leitura dos resultados,
constatou-se que dez ar­tigos eram de interesse do objeto de estudo proposto levando em
consideração os critérios de inclusão previamente estabelecidos. A referida revisão integra-
tiva teve como questão norteadora a seguinte diretriz: Como a literatura nacional aborda os
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possíveis desafios e contribuições dos conselhos municipais de saúde para consolidação
do sistema único de saúde em seu processo de gestão?

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O estudo dos artigos selecionados possibilitou a construção de três categorias de


análise sobre as quais a literatura mostra a respeito: participação nos conselhos de saúde,
desafios e limites nos conselhos de saúde e atuação de conselheiros nos conselhos de saúde.

Participação nos Conselhos de Saúde

No que se refere a participação nos conselhos de saúde o estudo de Martins et. al


(2012) trata de conhecer o posicionamento do enfermeiro sobre sua atuação no Conselho
Local de Saúde (CLS) frente ao princípio organizacional do SUS, a partir do controle social
no planejamento, acompanhamento e avaliação das ações de saúde mostrou que a maioria
dos entrevistados têm consciência da importância da atuação no CLS, porém alguns entre-
vistados ainda acreditam que a participação do enfermeiro no CLS é importante somente
como espaço para divulgar ações e necessidades do serviço de atenção básica à saúde.
Martins et. al (2012) destacam a importância da participação da comunidade e do en-
fermeiro no CLS, e apontam como resultados da pesquisa que a maioria dos enfermeiros
acreditam que o controle social na gestão do SUS pode e deve ser ampliado pela interação
com a comunidade, no qual permitiria identificar suas necessidades e garantir os seus di-
reitos de cidadania.
Conforme resultados da pesquisa realizada por Cotta et.al (2010), que analisou o
formato institucional do Conselho Municipal de Saúde (CMS) de Viçosa (MG), abordando
sua estrutura, dinâmica de funcionamento, regras de composição e competências apontou
que dos 34 membros entrevistados (77,2% dos membros do CMS), 44,2% afirmaram que
as decisões tomadas no CMS não são informadas à população e 35,3% não repassam as
informações sobre as propostas e discussões tomadas para discussão e deliberação por
seus pares. Além de destacar que pela análise documental percebeu-se que a composição
do CMS de Viçosa, na gestão estudada, não estava obedecendo às normas no que se refere
à distribuição de seus membros conforme legislação federal vigente.
Esses mesmos autores observaram também a forma de ingresso no CMS sendo 38,2%
dos conselheiros eleitos por seus pares, 8,8% foram convocados por serem os presidentes
das entidades que representam no CMS e 52,9% foram indicados; dentre estes últimos,
32,4% foram indicados pela diretoria da instituição, 8,8%, pelo titular, 8,8%, pelo prefeito e
2,9%, pela Secretaria Municipal de Saúde. (COTTA et.al, 2010)
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Nesse mesmo sentido, de acordo com pesquisa realizada por Ribeiro e Nascimento
(2011) que objetivou compreender o sentido/significado social dos sujeitos na construção
dos Conselhos Locais de Saúde (CLS), assim como discutir os entraves, conquistas e pos-
sibilidades para a construção/efetivação dos CLS. Os resultados desse estudo sinalizam
que ainda há um grande distanciamento entre a legislação e a prática do controle social no
cotidiano do processo de trabalho das equipes de saúde em Feira de Santana (BA).
Destacam ainda que existe uma grande heterogeneidade de sujeitos na construção
desse processo, com peculiaridades diferenciadas, que envolvem desde questões ideoló-
gicas, socioeconômicas e políticas até questões como consciência sanitária, exercício de
cidadania, participação social em trabalhos comunitários, reconhecimento sobre os seus
direitos e deveres enquanto cidadãos, dentre outras, que podem interferir de forma eficiente
na concretização das mudanças sociais. (RIBEIRO; NASCIMENTO, 2011)
Nessa perspectiva, a Resolução Nº 453, de 10 de maio de 2012 estabelece a composi-
ção dos Conselhos de Saúde devendo ser distribuído da seguinte forma: 50% de entidades e
movimentos representativos de usuários; 25% de entidades representativas dos trabalhado-
res da área de saúde;25% de representação de governo e prestadores de serviços privados
conveniados, ou sem fins lucrativos. Cabe ressaltar que os Conselhos de Saúde devem ser
espaços de transparência nas decisões do poder público e contribuir para a participação
mais efetiva da sociedade na concretização do controle social no SUS.
Pesquisa realizada por Moreira e Escorel (2009) salientou que duas variáveis apresen-
tam resultados positivos em âmbito nacional e nos diversos portes populacionais referem às
reuniões dos CMS, que são mensais em 82% dos CMS e que, nos doze meses anteriores
à pesquisa, não foram canceladas por falta de quórum em 66% dos conselhos.
Nesse contexto, os resultados da pesquisa referem-se à dimensão de acesso aos
Conselhos, uma vez que mais de 80% dos CMS elegem sua composição por meio de pro-
cesso eleitoral aberto, e qualquer cidadão que queira participar das reuniões tem direito
a voz. Porém, o segmento – presidente - tem resultado considerado negativo, pois só em
municípios cujo porte está entre 1.000.001 e 2.000.000 de habitantes, os gestores não são
os presidentes dos CMS. (MOREIRA; ESCOREL, 2009)

Desafios e Limites nos Conselhos de Saúde

Conforme pesquisa realizada por Farias Filho et. al (2013) na qual verificou a atuação
dos conselheiros nos conselhos municipais de saúde da Região Metropolitana de Belém (PA)
os resultados indicam que as ações dos conselhos são marcadas por cooptação de conselhei-
ros, definição de agendas deliberativas por parte de representantes da gestão, predominando
os interesses individuais dos conselheiros sobre os interesses coletivos nas deliberações.
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Dessa forma, é importante destacar que esses resultados são contraditórios em relação
aos princípios do SUS, bem como a finalidade dos conselhos de saúde que tem como premis-
sa defender os interesses coletivos e democratizar as decisões na gestão pública de saúde.
Vale salientar que alguns conselheiros ocupeam este espaço como benefício próprio
enquanto membro dos conselhos de saúde. A busca de interesses individuais foi o que
prevaleceu como comportamento dos conselheiros do segmento usuários, sendo presente
também esse comportamento nos demais conselheiros representantes das outras categorias
na representação paritária. (FARIAS FILHO et. al, 2013)
Nesse contexto, tais comportamentos comprometem a efetivação da participação da
sociedade nos Conselhos de Saúde como instância de participação social para o controle
social da gestão e política de saúde. Entre os resultados apontados por Farias Filho et. al
(2013) no que se refere ao controle social efetivo por parte dos conselheiros destacam-se
alguns fatores como: a dificuldade dos conselheiros em compreender o seu papel nos con-
selhos; baixa frequência nas sessões dos conselhos; poucas ações de caráter deliberativo;
busca por benefícios individuais por parte dos conselheiros.
Nesse sentido, Ribeiro e Nascimento (2011) afirmam que o processo de efetiva parti-
cipação social nos Conselhos de Saúde ainda encontra-se principiante, embora, seja con-
senso de que o processo de participação social deve ser contínuo, correspondendo a uma
importante estratégia para a efetivação do SUS, bem como um espaço democrático de
construção coletiva.
No que se diz respeito à divulgação das decisões tomadas no CMS de Feira de Santana
(BA), 44,2% afirmaram que estas não são informadas à população. Outro ponto refere-se o
repasse das informações pelos conselheiros das propostas e discussões tomadas no CMS
para seus pares, 35,3% dos conselheiros entrevistados disseram que não as repassam.
(COTTA et. al, 2010)
Os resultados apresentados por Moreira e Escorel (2009) demonstram que em relação
aos recursos financeiros destinados aos CMS apenas 265 unidades têm orçamento próprio e
apenas nos municípios com mais de 2 milhões de habitantes constata-se resultado positivo
refentes a aplicabilidade dos recursos; no tocante aos recursos humanos existem equipes
de apoio administrativo em 940 CMS e esta variável é positiva apenas nos municípios com
porte a partir de 500.001 habitantes e à estrutura física em especial à existência de sede,
positivo para apenas 906 CMS.
Outro ponto negativo diz respeito a organização dos Conselhos de Saúde, pois ressal-
ta-se os piores desempenhos registrados referem-se a insuficiência de atividades de capa-
citação de conselheiros, resultando em uma situação sofrível para o ano de 2003 e péssima
para o de 2004; além disso, 90% dos CMS apresentam resposta negativa em relação a
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composição de “comissões permanentes”, o que implica na falta projetos e ações frente as
necessidades da população usuária dos serviços de saúde. (MOREIRA; ESCOREL, 2009)
Guizardi (2015) escreveu uma nota em que buscou analisar alguns dos desafios atuais
relacionados à construção da participação social no Sistema Único de Saúde. Ressalta que,
de acordo com os dados coletados, sobressaiu a avaliação de que o controle social tem se
restringido ao conselho e que alguns conselheiros afirmam que a prática e o alcance real
mostram-se afastado das propostas do SUS.
A representatividade no conselho de saúde é considerada por muitos estudos um limite
a ser superado nesses espaços democráticos, para que funcionem com visibilidade, am-
pliação e participação das representações sociais, como também na defesa do SUS. Desse
modo, o potencial democrático dos conselhos e das conferências precisa ser reposicionado,
não mais na conformação fechada destes dispositivos, mas, nas articulações e mediações
sociais necessárias para fortalecer os espaços públicos, porosos e plurais. (GUIZARDI; 2015)
Ogata e Zambon (2013) na sua pesquisa objetivou analisar o controle social na pers-
pectiva dos conselheiros municipais de saúde, enfatizam que alguns conselheiros não re-
conhecem a participação social como diretriz do Sistema Único de Saúde e identificaram
dificuldades como a centralização das decisões na gestão, a valorização do saber técnico
e a não realização de conferências de saúde. Existem também limitações no exercício do
papel de conselheiro, dificuldade de interlocução com as bases de representação e de
acesso a informações.

Atuação de Conselheiros nos Conselho de Saúde

Diante do exposto até aqui é possível identificar que os conselheiros de saúde apre-
sentam distintas concepções no que se refere a efetivação do controle social, alguns tem
domínio do conceito atribuído pela saúde, mas, outros não tem clareza quanto a importância
dessa atuação. Esse desconhecimento pode comprometer sobremaneira o exercício do papel
dos conselheiros, pois, estão incluídos neste grupo alguns que exercem a presidência do
Conselho de Saúde e Gestão da Saúde. (OGATA; ZAMBON, 2013)
Nesse sentido, os referidos autores destacam que, conforme relatos dos conselheiros,
estes não conheciam outras instâncias de controle social no município visto que a participa-
ção social não se limita apenas aos conselhos e conferências de saúde sendo garantida por
meio de diversos espaços representativos. Destacam ainda que muitos conselheiros ingres-
sam nos conselhos de saúde através de convites de pessoas com influência no processo
decisório sendo uma prática em desacordo com a legislação vigente da organização dos
conselhos de saúde, pois limita a autonomia desses atores e implica conflitos de interesses.
(OGATA; ZAMBON, 2013)
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No que diz respeito à importância do Controle Social, do papel do CLS e seus conse-
lheiros, dos reflexos da atuação do CLS na comunidade e no serviço da Unidade Básica de
Saúde (UBS) os resultados da pesquisa verificou a tendência de se acreditar que a atuação
no CLS é boa somente quando estes apoiam propostas e ações promovidas pela Unidade
Básica de Saúde. (MARTINS et.al, 2012)
Dessa forma, a falta de informação por parte dos conselheiros a respeito do controle so-
cial é identificada nos artigos, com isso, é de suma importância ampliar a visibilidade do con-
trole social no SUS e fortalecer a formação dos conselheiros, com discussões, trocas de ex-
periências e capacitações a fim de garantir uma participação efetiva nos Conselhos de Saúde.

CONCLUSÃO

A literatura mostrou alguns desafios que ainda não foram superados na participação
social nos conselhos de saúde com destaque para: composição dos membros dos conselhos;
prevalência de interesses individuais; falta de conhecimento por parte dos conselheiros a
respeito do papel dos conselhos de saúde; ausência de capacitações para os conselheiros;
centralização das decisões na gestão; divulgação das ações realizadas pelos conselhos;
acesso a informação; falta de articulação com movimentos sociais e entre redes.
Nesse sentido, esses problemas dificultam a participação da sociedade nos conselhos
de saúde e na construção da gestão democrática dos serviços públicos de saúde. Assim,
alguns dos limites apontados estão em desacordo com os princípios do SUS, bem como
com as legislações que regulamentam os conselhos de saúde e seu funcionamento, além
de, fragilizar as ações desses dispositivos de participação social.
Destarte, os dispositivos de participação social na saúde precisam de estratégias para
fortalecer e qualificar os espaços de controle social e melhorar seu funcionamento e orga-
nização evitando com isso novos problemas, buscando estimular mais a participação social
e aproximando as discussões da participação social na saúde das pessoas e dos serviços
públicos de saúde.
Assim sendo, a divulgação das ações e reuniões dos Conselhos de Saúde, assim como
aproximar as discussões do Controle Social para o território onde as pessoas vivem devem
ser colocados em destaque nos Conselhos de Saúde para que a sociedade possa contribuir
para o fortalecimento do Sistema Único de Saúde.
Com a realização dessa pesquisa foi possível perceber que a participação social na
saúde é de suma importância na gestão dos serviços públicos, mas, ainda precisa muito
avançar no controle social e nas estratégias para a consolidação do SUS e efetivação da
participação integrativa de diversas representações nas instâncias de democratização das
políticas de saúde.
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Espera-se que esse estudo estimule a discussão entre usuários do SUS, gestores,
profissionais da saúde, bem como os representantes dos movimentos sociais para a im-
plementação do controle social na saúde a fim de possibilitar melhoria na qualidade dos
serviços ofertados a população e na formulação de políticas de saúde.

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05
Desigualdades sociais: ensino e escola
como reflexos da exclusão

Flávio Aparecido de Almeida

'10.37885/211106736
RESUMO

O objetivo é analisar o fenômeno da desigualdade social a partir das categorias de exclu-


são ao ensino e a escola. Para atingi-lo, faz-se necessário analisar a percepção teórica
sobre o fenômeno em relação com a sua dimensão racial; identificar na bibliografia os
fatores que contribuem para a distorção série-idade; compreender as narrativas dos
alunos negros sobre as desigualdades educacionais; e analisar referentes bibliográficos
sob à correlação entre a distorção e as questões de raça. Justifica-se a criação de textos
que possam mostrar como ocorre, e sua importância diante dos estudos de formação
profissional, além de possibilitar maiores discussões sobre esse assunto. Assim, através
de uma breve revisão da literatura, estuda-se sobre tal temática, incutindo-a aos pen-
samentos do contexto contemporâneo que o atualizam em respostas a nossas maiores
curiosidades sobre tal ocorrência.

Palavras-chave: Desigualdades, Exclusão, Educação.

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INTRODUÇÃO

É necessário destacar, nesse sentido, a relevância da extensa produção bibliográfi-


ca sobre o fracasso escolar no Brasil e, especificamente, sobre o fenômeno da distorção
série-idade no país. Essas produções, ancoradas em perspectivas teóricas focadas para a
dimensão de classe, interpretavam as dinâmicas desta desigualdade como sendo fruto das di-
ferenças de classe, com foco em como a pobreza impede a ascensão escolar desses alunos.
A contribuição de Bourdieu e Passeron (1975) a partir da teoria da reprodução influen-
ciou uma geração de pesquisadores que percebiam o ambiente escolar como um retrato
da sociedade. Essas contribuições, apesar de relevantes, não consideravam a raça como
uma categoria de análise importante para o fracasso escolar, sobretudo se considerarmos
o Brasil, onde a raça é elemento estrutural das opressões.
O tema delimita-se a explicar a desigualdade social a partir do recorte da educação e
suas políticas, e nesse sentido, questiona-se como as desigualdades podem ser percebidas
a partir dessa política?
É possível que se trabalha para excluir da informação, que Karl Marx esteja correto
quando explicou a alienação e a manutenção do estado de dominação do estado capitalista
através da negação de direitos como educação por medo de o trabalhador desenvolver a
chamada consciência de classe.
Por conseguinte, o objetivo é perceber a desigualdade tendo como recorte a educação
e suas políticas em função da exclusão de parcela da população ao crescimento intelectual
e melhores postos de trabalho.
A justificativa é de que haja importância na edificação de estudos que versem sobre
essa temática enquanto exigências de uma fonte de novos conhecimentos, pois se rebuscam
conteúdos que podem interagir com nossas mais amplas curiosidades a seu respeito e com
alto grau de teor informativo.
A pesquisa bibliográfica foi adotada nesse trabalho. As abordagens qualitativas de pes-
quisa se fundamentam numa perspectiva que concebe o conhecimento como um processo
socialmente construído pelos sujeitos nas suas interações cotidianas.
O trabalho foi dividido em dois eixos, para fins de organização. A função não é separar
a teoria do método, pois compreendo que ambos os eixos são faces indissociáveis da fun-
damentação. No entanto, apresento os diálogos realizados com a teoria e as perspectivas
teóricas utilizadas para fins deste trabalho, assim como uma associação entre os conceitos
mais caros à realização desta pesquisa de forma breve. Em seguida, aponto os instrumentos
técnicos utilizados e as contribuições metodológicas que, associadas, permitirão construir o
caminho para responder as problemáticas elencadas anteriormente.

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DESENVOLVIMENTO

Desigualdades sociais na educação indicam um movimento gradual para considerar


a raça e as condições econômicas como determinantes dessa desigualdade educacional,
ainda na década de 80, sendo a obra de Patto (1999) um marco importante da demarcação
da raça como produtora de desigualdades no ambiente escolar, assim como a coletânea
organizada por Fulvia e Pinto (1987) que reunia uma série de contribuições teóricas de auto-
res que visavam revisar a raça e a educação no país e apresentar elementos que pareciam
irrelevantes – ou até mesmo inexistentes – para outros autores.
Henriques (2002) não abandonou a pobreza como um fator do fracasso escolar, mas
identificou os componentes raciais da pobreza, para defender que falar de classe no Brasil é,
até certo ponto, falar de raça também. Esta pesquisa visa contribuir com essa perspectiva e
avançar no que diz respeito à interseccionalidade, como conceituado por Crenshaw (1991),
das categorias para o fenômeno.
As questões que motivaram esta pesquisa são, em certa medida, de caráter pes-
soal. Por isso, é fundamental apontar como cheguei a este tema. Os nossos interesses de
pesquisa são resultados de processos que vivemos que, posteriormente, se transformam
em questões de pesquisa à medida que adquirimos maturidade para indagar o tema com
mais profundidade.
A contribuição teórica de Vargas (2016) sobre a incompatibilidade do sujeito negro com
o Estado-nação brasileiro sintetiza a percepção que tive, durante grande parte da vida, da
impossibilidade da dignidade plena para os negros no Brasil.
No entanto, essa percepção tinha contornos infantis, pela incapacidade de explicar o
porquê de os negros ocuparem sempre posições subalternas, seja nas novelas, como aponta
Araújo (2008), nos cinemas, como descreve Alves (2016), em papéis de subserviência e
vivendo uma série de violências em diferentes âmbitos da vida. Essa questão ganha outras
acepções à medida que os conflitos em relação à juventude negra passam a ser considerado,
pela literatura adequada, como genocídio, dadas as proporções alarmantes (GOES, 2008;
GOMES; LABORNE, 2018).
Parte da bibliografia sobre o tema aborda a Escola como um espaço de cooperação
desta política de extermínio, no sentido simbólico, mas apesar deste ter sido o ponto de
partida, essa não é a implicação teórica deste trabalho.
A Escola é um importante espaço de formação e de socialização, que têm a grande
possibilidade de ser um espaço de transformação promissor, sobretudo para estudantes
negros, que são marcados por inúmeros processos de subalternização na vida cotidiana.
Estudar este fenômeno aparece como uma tentativa de responder as situações que
presenciei durante toda a minha vida de alunos negros e pobres que evadiram. Antes
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da evasão, no entanto, há uma dinâmica instaurada que, aos poucos, expulsa os jovens
negros da escola.
Outra implicação fundamental do fenômeno é a distorção série-idade como o caráter de
gênero que apresenta. O panorama da distorção série-idade no Brasil (2018) aponta que os
índices são maiores em relação aos homens, assim como nas análises de Carvalho (2004)
sobre o desempenho escolar de meninos negros também estar abaixo do desempenho
de outros alunos, questão à qual a autora apresenta diversas reflexões sobre os padrões
de masculinidade, o estigma da raça na trajetória escolar desses jovens e uma série de
fatores para tal.
A perspectiva de análise através da raça como categoria e sua influência no âmbito
escolar se faz necessária devido à exposição direta de crianças e jovens dentro do processo
de socialização na escola, sendo um dos primeiros espaços de formação dos indivíduos.
Dessa forma, é imprescindível se compreender como as violências simbólicas são
vivenciadas no espaço escolar, quais as percepções dos agentes que atuam na educação
sobre isto e para entender as narrativas dos próprios sujeitos sobre este fenômeno, que
vivenciam uma tradição histórica de ter a sua voz emudecida pela interpretação dos sujeitos
dominantes (SPIVAK, 2014).
O Brasil tem faces do racismo que utilizam uma atuação silenciosa e dissimulada para
marginalizar os pobres e negros, que não aparece de forma escancarada e que procura
abafar as implicações raciais da dinâmica histórica de exclusão dos negros que se estabe-
leceu neste país (GUIMARÃES, 1999; MUNANGA, 1999).
Essa característica tem forte ligação com o mito da democracia racial, através do qual a
identidade negra foi dissolvida como símbolo da identidade nacional e tem como consequên-
cia a incapacidade de, ainda hoje, assumir os mecanismos elaborados por uma sociedade
fundada tendo a escravização de pessoas negras como base.
Por isso, compreender a implicação do racismo e da raça no desequilíbrio educacio-
nal que os alunos negros vivenciam significa aprofundar as dimensões de análise sobre o
fenômeno e compreender a partir da visão destes alunos e dos atores sociais que estão
implicados no cotidiano escolar e que contribuem – mesmo que inconscientemente – para
a reprodução das práticas ou que, por outro lado, podem trabalhar a partir de tentativas de
sanar gradativamente este problema. Por isso, as análises desta pesquisa envolvem dife-
rentes sujeitos que compõem essa cena na escola, para entender o horizonte de possíveis
que estão disponíveis e que podem ser construídos a partir de diálogos horizontais.
Levando em conta as características do racismo à brasileira brevemente apontadas
acima, parto do pressuposto de que nem todos os profissionais que trabalham na educação
compreendem a importância da raça para este fenômeno, portanto, esta pesquisa pode
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contribuir para a reflexão e motivar a criação de abordagens pedagógicas que possibilitem
à escola modificar as práticas gradativamente.
A história de negros e pobres no Brasil conta com uma ampla revisão da historiografia,
destacam-se brevemente os diálogos com a bibliografia pertinente para esta pesquisa, que
contribuíram analisando diferentes períodos fundamentais para a compreensão da presença
negra no país. Reis (1988) aponta a intenção da elite brasileira em fazer do negro um pro-
blema social a ser resolvido, desde o pós abolição, o que contou com ampla contribuição
dos intelectuais racialistas da época, já adequamento destacados pelo autor e por outras
contribuições críticas sobre o período.
Na mesma linha, o autor procura demarcar a rebeldia como algo fundamental da história
negra no país, sobretudo na Bahia. A existência de revoltas e movimentos de resistência é
marcante, apesar da tentativa histórica de apagamento do potencial de reação que os ne-
gros escravizados tiveram no país e no estado da Bahia (ALBUQUERQUE; FRAGA FILHO,
2006; REIS, 1988; REIS, 2001).
Albuquerque e Fraga Filho (2006) também dedicaram longas contribuições para des-
tacar as estratégias de sabotagens que os escravizados tinham durante a escravidão e as
diferentes formas de resistência existentes, apontando que, diferente do que é compreendido
no senso comum, onde quer que houvesse presença negra neste país, havia, também, uma
história de resistência de forma sistemática. Reis (2001), por outro lado, contribui com esta
pesquisa no sentido de fornecer material que demonstra a complexidade das relações entre
os escravizados e a existência das famílias escravas de forma que contraria o pressuposto
comum de que os negros não tinham mais raízes.
Essa contribuição é fundamental para que apresentemos a humanização dos sujeitos
negros neste período e avancemos nas discussões conceituais de raça que virão a seguir,
assim como destacando os laços afetivos e as relações comunitárias como vínculo essencial
para a dignidade de pessoas negras em muitos contextos.
Dialogamos, para fins desta pesquisa, com as noções conceituais sobre raça e racismo
apresentadas por Munanga (2004), que demarcam a construção da raça no sentido socio-
lógico e tendo a raça como filha do racismo, não o contrário.
Parte-se, também, em explicar que as contribuições de Guimarães (2009), que for-
necem um panorama histórico sobre as compreensões de raça no Brasil e as influências
do pensamento norte-americano em parte do pensamento social brasileiro, demarcando,
além disso, uma proposição crítica para entender a lógica do racismo brasileiro segundo as
características particulares deste contexto e formação das identidades no Brasil.
É necessário destacar, ainda, a proposição de Fanon (1980) sobre a interconexão
entre a discussão de cultura e de racismo, entendendo a exclusão social e o racismo como
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um elemento da desigualdade social indispensável para a estrutura de alguns sistemas,
portanto, difere de compreensões estáticas sobre as questões raciais, pois o autor defende
que o racismo se atualiza de forma sofisticada à medida que o contexto cultural também se
reconfigura. Essa noção é essencial para entender como o Brasil elegeu inimigos internos
historicamente, questão que discutiremos a seguir.
Um conceito muito caro à compreensão das violências que assolam o povo negro e,
sobretudo, a juventude negra, é a noção de homo saccer proposta por Agamben (2002) que
significa, em linhas gerais, uma vida que é autorizada a ser exterminada sem consequências
e, mais que isso, com o aval da sociedade, por ser passível de execração.
Em consonância com esta perspectiva, os apontamentos de Azevedo (1987) Mbembe
(2018), Pinho (2014), Vargas (2016) são relevantes para a discussão sobre a construção
histórica de um inimigo interno no Brasil e as consequências deste processo na vida de
sujeitos negros.
Levando em conta o perfil mais vitimizado pelo fenômeno da distorção série-idade,
diálogos com as discussões de masculinidades com Kimmel (1998), Faustino (2014), Pinho
(2004), Viveros Vigoya (2009) e outras contribuições importantes revelam a relação entre
raça e gênero na produção de masculinidades subalternas e racializadas, constituídas como
inferiores face ao padrão do homem branco heteronormativo.
Por outro lado, faz-se necessário explorar o campo das análises de gênero de forma
mais ampla, dialogando com a teoria de gênero e conceituação teórica de Scott (1995), e
as implicações materiais das intersecções entre a categoria analítica de gênero e outras
igualmente importantes, como exposto por Azeredo (1994), Carneiro (2011), Davis (2016)
e outras teóricas do campo, importantes para refletirmos, na pesquisa de campo e na pro-
dução escrita da pesquisa, as experiências que perpassam a vida das meninas que serão
nossas colaboradoras e as implicações destas opressões em suas trajetórias educacionais.
Por fim, destacam-se as contribuições e diálogos possíveis com a bibliografia voltada
para o campo da Educação, especificamente, que procura refletir criticamente sobre o papel
da escola e o horizonte de possíveis que podem ser revelados com o rompimento de uma
educação engessada e fechada, que entende o aluno como um receptáculo de informações,
sem capacidade crítica, sendo o currículo a materialização desta política de invisibilização
das experiências dos jovens (MACEDO, 2017).
Além disso, os profissionais da educação também encontram um ambiente infértil para
as tentativas de mudanças, relatando dificuldades e limitações para o trabalho de ensinar nas
brechas dos currículos formais (LOPES, 2017; MOREIRA, 2007). Outros diálogos fundamen-
tais estão em Gomes (2012) e Silva (2016), no sentido de fornecer amplas considerações
sobre as descolonizações dos currículos e as práticas pedagógicas alternativas.
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Entendo o contexto escolar e as experiências partilhadas neste ambiente como flui-
dos, dinâmicos e não como um lócus de pesquisa técnico, pregado na parede como um
quadro. Por isto, as proposições de Oliveira (2007) fornecem uma perspectiva que permite
que a pesquisa seja feita em diálogo, a partir da troca, da observação do cotidiano escolar
e, sobretudo, das narrativas dos atores envolvidos neste processo.

METODOLOGIA

A pesquisa é bibliográfica se inicia pela barra de buscas das bases Scielo.BR; Google
Scholar e na plataforma capes pelos termos “desigualdades sociais” AND “educação” AND
NOT 1“escola” escolhendo os títulos sem levar em consideração ano de publicação ou idioma.
A análise que se faz é comparativa e indutiva, com a leitura dos textos e reescrita
deles a partir do entendimento do próprio autor sobre as características com as quais as
falas se relacionam com o problema dessa pesquisa, e com o pensamento de se defender
um ponto de vista.

CONCLUSÃO

Sobre as desigualdades sociais, percebemos a sua visão sob aspectos conceituais,


cujas analogias se versam com as argumentações ao longo desta pesquisa. Em suma, as
características que o destacam são peculiares ao contexto da realidade estudada.
No que cerne ao atendimento dos objetivos, faz-se promissor o entendimento dos con-
ceitos e de categorias com relação ao estudo, as percebendo como amplamente informativas
e destacadas para a elucidação do problema desta pesquisa.
Em resposta problema que norteou o estudo, considera-se atendido, uma vez que
constatamos a desigualdade social a partir da educação com a exclusão de direitos a edu-
cação de qualidade que tem explicação no materialismo histórico-dialético.
Portanto, considera-se viável que esse estudo indica informações precisa a respeito
do fenômeno estudado e espera-se que novas discussões possam incrementar ainda mais
a ricas informações por este estudo colocadas.

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1 AND e AND NOT, são caracteres booleanos para separar os termos nas bases de pesquisa. É uma regra internacional.

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Educação para inclusão digital e a
competência em informação digital

Lorena Chamone Vita

'10.37885/220207891
RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo discutir acerca da educação e inclusão digital bem
como analisar sua competência no que tange à informação digital. Embora prevaleça
certa ideia de que o acesso aos meios de comunicação e internet seja para todos, o que
percebemos é que uma parcela significativa da população sofre com a ausência desses
recursos. Nesse viés, a pandemia proporcionou a invisibilidade das desigualdades exis-
tentes em nosso país, desmistificando a temática, bem como demonstrando a urgência
de se falar sobre isso, inclusive em diversos meios de comunicação. Sendo assim, este
resumo irá percorrer de forma sistemática através de bibliografia utilizada e parâmetros
de dispostos, bem como dados apresentados em formato de gráfico com escopo de en-
fatizar o tema, assim como elevar o conflito que já existia, a fim de abrandar os efeitos
ora existentes de uma forma ampla e bem peculiar.

Palavras-chave: Sociedade, Desigualdades de Acesso, Internet, Informação Digital.

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INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como eixo norteador à educação como inclusão digital bem como
suas competências em informação digital.
Nesse sentido, a tecnologia vem para aproximar as pessoas, trazer informações e
minimizar o conflito existente que a pandemia da COVID- 19.
Todavia, o que podemos observar é que uma grande parcela ainda não possui acesso
a esses recursos e acabam sendo prejudicados uma vez que as aulas do ensino das esco-
las públicas estão acontecendo de maneira remota e seu desempenho escolar está sendo
avaliado desta forma.
Convém lembrar que em decorrência da pandemia, algumas pessoas acabaram sendo
prejudicadas, uma vez que o isolamento se fez necessário, as pessoas acabaram perdendo
seu emprego, fazendo com que perdessem sua única fonte de renda, que era seu salário,
ocorrendo então uma taxa alarmante de desemprego.
Para tentar sanar essa questão, o governo federal propiciou um auxílio emergencial,
onde disponibilizava através da caixa econômica federal, uma quantia de R$600,00, para
tentar coibir e auxiliar os desempregados de todo o Brasil.
Nesse aspecto, mesmo existindo benefícios e programas sociais para atender a popula-
ção, observou-se que eles não atendem a pessoas que realmente precisam, pois, seu acesso
acaba sendo dificultado e em alguns casos totalmente inacessível a população marginalizada.
Diante disso, é necessário que os entes públicos tomem nota dessa desigualdade
existente e tentem alcançar essa população marginalizada e “invisível”, trazendo consigo
um pouco de dignidade a essas pessoas.

MÉTODO

EDUCAÇÃO COMO UM MÍNIMO EXISTENCIAL

A educação é um direito de todos os partícipes da sociedade. Nessa esfera, o Estado


possui o dever de incentivar e colaborar de forma atividade para a promoção desse direito
social, com a finalidade de proporcionar a todos uma vida digna, bem como incentivar que
tenham nas escolas públicas, aulas de informática, ensinando o básico e assim, levando a
tecnologia onde ela não se faz presente.

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será


promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho. (BRASIL,1988)

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Sob o prisma dessa ótica, a educação é considerada como algo básico para a subsistên-
cia do cidadão partícipe da sociedade, bem como é um direito fundamental, previamente es-
tabelecido no ordenamento jurídico e que deve ser efetivado na atualidade e aplicado em seu
escopo, dentro das escolas públicas, alcançando a todas as classes sociais, etnias e idades.

A educação básica, universal, gratuita e de qualidade é inequivocamente um


mínimo existencial dos direitos sociais, à luz da teoria rawlsiana. (MARTINS,
2019, p. 1310)

Nesse sentido, a educação é um direito básico a todo e qualquer indivíduo e negar


esse direito que inclusive é assegurado no ordenamento jurídico, em nossa Constituição é
negar todo um contexto geral e social, bem como mascarar ainda mais algumas situações
que não deveriam existir, mas existem, além de entender que ela é um direito e não um
privilégio de uma determinada classe social.

Inclusão social

A inclusão social é um direito também intrínseco no ordenamento jurídico cujo objeti-


vo é incluir o cidadão na sociedade através de aparatos que possibilitem a esse individuo
participar ativamente de debates políticos, universidades, em grandes corporações e em
qualquer ambiente que este queira participar.

Nesse ponto, é interessante ressaltar o papel desempenhado por uma edu-


cação de qualidade na completa eficácia dos direitos políticos dos cidadãos,
principalmente no que se refere aos instrumentos de participação direta, como
o referendo e o plebiscito. Isto porque as falhas na formação intelectual da
população inibem sua participação no processo político e impedem o aprofun-
damento da democracia. (MENDES, 2015, p. 652)

Assim, trago uma reflexão de que a meritocracia só é válida se as pessoas possuem as


mesmas condições e oportunidades de lutarem pelos mesmos objetivos em pé de igualdade,
uma vez que sem esses aparatos ela se torna inexistente.
Logo, se faz necessário além da inclusão social, a aplicabilidade da inclusão digital no
seio da sociedade, dentro da educação com o objetivo de democratização desse acesso
a todos que assim queiram assim como incluir e permitir que novas oportunidades surjam
para todos os alunos que desejam ingressar na educação bem como melhorar os quadros
sociais através do meio digital, trazendo assim um pouco de dignidade a todos os partíci-
pes da sociedade.

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Competência em Informação Digital

O ensino regular é um direito previsto no ordenamento jurídico e, diante disso, ele é


de caráter obrigatório e acima de tudo ele acontece de maneira regular e todos os cidadãos
possuem o direito de ter acesso à educação e caso esse acesso não ocorra o Poder Público
pode ser penalizado.

Consagra-se que o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público


subjetivo, que o não oferecimento de ensino obrigatório pelo Poder Público,
ou sua oferta irregular, importará responsabilidade da autoridade competente
e que cabe ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental,
fazendo-lhe a chamada e zelar, junto aos pais, ou responsáveis, pela frequência
à escola. (MENDES, 2015, p.653)

Partindo desse pressuposto, a competência em informação também é responsabilidade


dos entes públicos em trazer informação para a população através de meios eletrônicos, pois
é um direito a eles inerente e que deve ser validado e jamais esquecido, pois uma parcela
da população brasileira ainda carece de maior atenção no que tange aos direitos básicos e
qualidade de vida.
A educação no que tange à competência para legislar fica a cargo dos entes públi-
cos, em virtude de sua importância dentro do ordenamento jurídico, bem como a forma de
oportunizar a todos, apresentando possibilidades de o aluno inclusive ingressar em uma
universidade se assim desejar.

Aos Municípios cabe atuar prioritariamente no ensino fundamental e na edu-


cação infantil, enquanto aos Estados e ao Distrito Federal, nos ensinos funda-
mental e médio. Compete à União organizar o sistema federal de ensino e o
dos Territórios, financiar as instituições de ensino públicas federais e exercer,
em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir
equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade
do ensino mediante assistência técnica e financeira aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios. (MENDES, 2015, p. 652)

Portanto, é fundamental que cada ente através de sua competência promova e atue
na educação com o escopo de validar o que está estabelecido em lei, através de maiores
análises de seus recursos, para onde verbas são necessárias e para onde este valor está
saindo, e professores poderiam juntamente com seus alunos propor o desenvolvimento da
educação, através de projetos e programas a fim de oportunizar aqueles que não têm real-
mente condições de estudar ou qualquer perspectiva de vida, bem como elaborar outras
propostas que se torne viável a participação e colaboração de todos.
Além disso, é necessária a conscientização do voto nas próximas eleições, bem como
informações disponíveis em todos os meios de comunicação, analisando bem os próximos
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governantes, suas propostas para seus Municípios, priorizando a educação, pois através
dela muitas vidas serão modificadas além de vários fatores como criminalidade, ausências
de recursos básicos que são estabelecidos no ordenamento jurídico poderiam ser reduzi-
das e/ou aumentadas respectivamente com a finalidade de um Brasil melhor e com mais
progresso, e também a corrupção que assola nosso país, seria analisada de outra forma e
quem sabe extinta.

TECNOLOGIAS E SUA IMPORTÂNCIA NAS ESCOLAS PÚBLICAS

Atualmente, a tecnologia faz parte do cotidiano, uma vez que a primeira tarefa do dia é
checar suas redes sociais ou qualquer aplicativo do celular. Nesse sentido, ela se faz sem-
pre presente, ainda mais no que tange ao contexto atual em que vivemos como é o caso
da pandemia da COVID-19.
Assim sendo, se fez necessário trazer a tecnologia também para o ambiente escolar,
uma vez que, ficou totalmente inviável a frequência do aluno nesse ambiente. Com isso, a
inovação foi importante, principalmente o reinventar, para solucionar esse conflito vigente e
para atender a necessidade de todos.
Nesse aspecto, além do fato da tecnologia se fazer presente nos dias atuais, obser-
vamos que não basta simplesmente o acesso “facilitado” a esses meios de comunicação
interativa, é necessário que ocorram meios de levar a inclusão até o aluno, pois um número
elevado, ainda não sabe como manusear um computador ou um celular e acabam ficando
mais uma vez prejudicados nessa ótica.

Para ser incluído digitalmente, não basta ter acesso a micros conectados à
Internet. Também é preciso estar preparado para usar estas máquinas, não
somente com capacitação em informática, mas com uma preparação educa-
cional que permita usufruir de seus recursos de maneira plena. (CRUZ apud
MELO, 2006, p. 5).

Dessa maneira, a preparação para atender os alunos no ambiente escolar seja ele um
ambiente físico ou virtual é fundamental até mesmo como forma de inserção deste indivíduo
nos meios digitais, propiciando assim, a inclusão digital e a inclusão social, sendo inclusive
de suma importância que além das matérias estabelecidas nas grades curriculares, adequar
e disponibilizar a disciplina de informática é democratizar o ensino.

A Cultura Digital na atualidade

A cultura digital o que para muitos era algo distante, hoje se tornou uma realidade,
sendo inclusive necessário que as pessoas saibam o básico e busquem se atualizar, uma
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vez que em virtude dos fatos, a internet acabou sendo um dos meios fundamentais dentro
do contexto socioeconômico e tecnológico do país com o escopo de aproximar e informar a
todos sobre a atualidade além de aproximar e trazer a escola para o meio digital.

A “internet” é hoje um dos meios de comunicação social mais necessário dentro


do contexto socioeconômico e tecnológico do País e possibilita, por sua vez,
a participação do cidadão na sociedade moderna, mediante a pluralidade de
serviços e informações, ou seja, a promessa de um mundo sem fronteiras,
permitindo a agilidade das comunicações, dos negócios, das transações eco-
nômicas e da própria circulação de informação. (AGUIAR, 2012, p. 1).

A Constituição Federal em seu art. 218, caput, aborda o acesso à tecnologia e inova-
ção, todavia, o texto se encontra apenas no papel uma vez que seu acesso ainda é limitado,
uma vez que não é adotado nas escolas, aulas que ensinem as crianças e adolescentes a
manusearem o computador ou o smartphone, uma vez que ao contrário do que a maioria
pensa, nem todos da geração Z, têm acesso a esses meios de comunicação ou sabem de
fato manuseá-lo.
Em síntese, é de suma importância que a lei seja aplicável para todos com o escopo
de conscientizar e demonstrar que a tecnologia é para todos e que é uma inovação bem-
-vinda, desmistificando certas condutas previamente estabelecidas dentro da sociedade e
adequando a realidade a todas as classes sociais.
Para que as pessoas possam sentir-se acolhidas e motivadas a realizarem suas ativi-
dades, os ambientes construídos para este fim devem proporcionar conforto ao usuário. É o
que mostra Fresteiro (2010, p. 268) quando se refere ao Design Inclusivo:

O Design Inclusivo pode ser definido como desenvolvimento de produtos e


ambientes que permitam a utilização por pessoas de todas as capacidades.
Tem como principal objetivo contribuir, através da construção do meio, para a
não discriminação e inclusão social de todas as pessoas. (FRESTINO, 2010,
p. 268)

Contudo, é importante salientar que as aulas estão acontecendo de maneira remota e,


com isso, alunos da rede pública por diversos fatores, incluindo a ausência de determinados
recursos, saíram prejudicados, uma vez que, uma grande parcela desses alunos sequer
tem um celular móvel para acesso a essas aulas, prejudicando assim o seu desempenho
escolar e trazendo consigo a questão de que a desigualdade ainda impera e é em muitos
casos cruel e desumano.

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A pandemia e sua adaptabilidade

No que se refere à COVID-19, além de trazer consigo a questão das mortes que infe-
lizmente andam acontecendo e seu número ser bem significativo, trouxe consigo questões
de extrema urgência e importância que não devem ser deixadas de lado.
Uma dessas questões é a miséria que assola nosso país, bem como seus direitos bá-
sicos que são invisíveis e, com isso a questão do aluno as salas de aulas virtuais, uma vez
que, a família desse aluno não tem nem comida em casa, que dirá um aparelho em casa
para conseguir participar do ambiente escolar virtual.

Na educação, a expectativa de estudo para uma criança que entra para o


ensino em idade escolar cresceu 53,5% (5,3 anos). Segundo dados do IBGE/
PNAD, 98,4% das crianças em idade compatível com o ensino fundamental
(6 a 14 anos) estão na escola. Os avanços, portanto, são notáveis. Porém,
alguns dados ainda são muito ruins: o analfabetismo atinge ainda 13 milhões
de pessoas a partir de 15 anos (8,5% da população) e o analfabetismo funcio-
nal (pessoas com menos de 4 anos de estudo) alcança 17,8% da população.
(BARROSO, 2020, p. 427)

Como exemplo desse problema, temos a Figura 01 que ilustra através de um gráfico
as taxas de analfabetismo entre pessoas de 15 ou mais de idade do ano de 2019, trazendo
em seu gráfico dados alarmantes em algumas regiões do Brasil, onde o acesso à educação
acaba se tornando um privilégio de determinado grupo social.

Figura 1. Acesso a um dado disponibilizado pelo IBGE.

Dados referentes a uma pesquisa realizada pelo IBGE sobre a taxa de analfabetismo
entre pessoas de 15 ou mais idade (2019).

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Em vista dos fatos narrados, além dos professores cumprirem seu papel nessas con-
dições impostas pela COVID-19, é necessário que exista essa conscientização e que eles
aprofundem um pouco mais nesse ambiente digamos obscuro do trabalho e relatando essa
questão para as autoridades competentes e, cobrando um posicionamento para que mu-
danças sejam realizadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

IGUALDADE FRENTE À REALIDADE IMPOSTA

A sociedade deve trabalhar no sentido de oferecer oportunidades para que cada cidadão
possa ser respeitado, garantindo-lhe mecanismos para que a mesma consiga a integridade
de sua autonomia, autodeterminada e participativa. (CRUZ, 2003, p. 127)
O princípio da igualdade está elencado no art. 5º da Constituição Federal de 1988, que
prevê igualdade de direitos e oportunidades para todos os cidadãos da sociedade. Nesse
sentido, devem existir não só no ordenamento jurídico, mas no ceio da sociedade, oportuni-
dades previamente estabelecidas para todos, extinguindo assim qualquer tipo de preconceito
ou inferiorização que este cidadão possa vir a sofrer por qualquer que seja o motivo.
Por conseguinte, o doutrinador Mello, elenca o que vêm a ser o princípio da igualdade,
mencionando que ele está descrito no ordenamento jurídico e de que está ligado ao que vem
a ser Estado de Direito, trazendo consigo aparatos de que devem estar ligados no sentido
de assegurar uma maior igualdade a todos com o objetivo de poder desfrutar desses direitos
dentro da nossa sociedade.

O princípio da igualdade está intimamente relacionado com o conceito de lei


inerente ao Estado de Direito, sendo uma das suas bases essenciais, postu-
lando o exercício de um direito igual para todos os cidadãos, o que significa
dizer que a intervenção do Estado deverá ser efetuada na igual medida para
todos. Trata-se, portanto, da igualdade jurídica, que pode ser civil (assegura
a igualdade de aptidão de todos para desfrutar dos direitos) e real (garante a
todos o exercício atual dos referidos direitos). (MELLO, 1997, p.10).

Como observaram os autores Botelho, Esteves e Pinho (2008), também trazem uma
conceituação bastante abrangente sobre o princípio da igualdade, enfatizando que esse
princípio é estruturante do Estado Democrático de Direito e do sistema constitucional, im-
plicando assim em decisões fundamentais para a sociedade como um todo.

Reafirme-se que “o princípio da igualdade se apresenta como igualdade, pe-


rante todos os atos do poder público e não apenas perante a lei”. Consiste
em um “princípio estruturante do Estado de Direito Democrático e do sistema

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constitucional global” e implica que “as decisões administrativas sejam toma-

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das segundo critério objetivos [igualdade objetiva]”, ou seja, “se agiu de uma
forma para um terá de agir da mesma forma para outro, se os elementos de
ponderação de ambos são iguais”, obviamente que processado dentro da
legalidade. Por isso, do princípio da igualdade dimana “um direito subjetivo
em favor do cidadão e uma obrigação poderes públicos”, sempre nos limites
da legalidade. (BOTELHOS, ESTEVES, PINHO, 2002).

Cumpre observar que o princípio da igualdade deve ser amplamente respeitado e que
seus ditames sejam estabelecidos, bem como assegurados a essa população que carece
de visibilidade e reconhecimento dos entes públicos, respeito e integridade frente ao orde-
namento jurídico e a uma realidade imposta.

Constituição Federal e as políticas públicas

Antes de adentrar-se ao tema em questão, há uma conceituação bastante abrangente


do que vem a serem ações afirmativas. A Lei n.º 12.228/2010 elenca o conceito em seu art.
1º, inciso VI, no qual são entendidas como políticas públicas, que tem como pretensão a
correção de desigualdades socioeconômicas procedentes de discriminação, atual ou histó-
rica, sofrida por algum grupo de pessoas.

Assim, as políticas de ação afirmativa buscam, por meio de um tratamento


temporariamente diferenciado, promover a equidade entre os grupos que com-
põem a sociedade. (BERNARDINO, 2002, p.257).

Sob esse prisma, as ações afirmativas é um programa destinado a reparar as distor-


ções e desigualdades sociais existentes, vêm para tentar coibir qualquer prática semelhante,
sendo uma forma de inserção a esses direitos.

As políticas públicas podem aproveitar as novas tecnologias para melhorar


as condições de vida da população e dos mais pobres, mas a luta contra a
exclusão digital visa sobretudo encontrar caminhos que diminuam seu impacto
negativo sobre a distribuição de riqueza e oportunidades. (SORJ; GUEDES,
2005, p. 2)

Contudo, mesmo com sua existência e validade, observamos que na prática a teoria é
bem diferente e que, o ordenamento jurídico deve se adequar a atualidade sendo necessária
uma participação ativa de todos, sociedade e estado caminhando lado a lado em busca de
reparação e inserção de seus direitos.

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Desigualdade e o preconceito

A sociedade impõe em suas variadas vertentes um padrão de beleza, previamente


estabelecido. Assim, quem foge desse padrão acaba sofrendo duramente, acabando se
sentindo insuficiente ou como dizem “fora do padrão”.
Em pleno século XXI, ainda nos deparamos com situações um tanto quanto preconcei-
tuosas, como é o caso do preconceito e da discriminação em virtude da cor de pele, raça,
desigualdade social, orientação sexual, dentre outros fatores.
Podemos observar que as pessoas negras são as que mais sofrem nessa esfera, uma
vez que o racismo acaba sendo algo extrínseco em nossa sociedade, mesmo atualmente.
Por sua vez, SILVA, também menciona que é vedado qualquer tipo de discriminação
ou preconceito com base na origem, raça e cor, conforme enfatizado:

O racismo indica teorias e comportamentos destinados a realizar e justificar


a supremacia de uma raça. O preconceito e discriminação racial são conse-
quências da teoria. A cor só não era elemento bastante, porque dirigida à cor
negra. Nem raça nem cor abrangem certas formas de discriminações com base
na origem, como, por exemplo, discriminações de nordestinos e de pessoas
de origem social humilde. (SILVA, 2015, p.225)

Logo, para tentar minimizar e para que todos possam participar de uma sociedade
igualitária, é necessário conscientização, informação, respeito e empatia para com o outro no
sentido de estabelecer limites e quando nos deparamos com uma situação preconceituosa
ou discriminatória, devemos denunciar esse tipo de conduta e fiscalizar, assim para que a
lei seja efetivamente cumprida.

A grande questão reside em como lidar com a exclusão digital existente no


país, como o Brasil, que conta com altos índices de pobreza e analfabetismo.
É certo que a pobreza e o analfabetismo se constituem como problemas que
precisam ser sanados com urgência. Mesmo assim, não há como pensar a
exclusão digital em segundo plano, visto que o desenvolvimento das tecnolo-
gias se dá cada vez mais rapidamente e o abismo existente entre incluídos e
excluídos tende a aumentar (LEMOS apud ALONSO et al, 2010, p. 16).

Dessa maneira, ressalto que nesse aspecto as mídias sociais vêm para tentar alcançar
e aproximar as pessoas no sentido de trazer informações a todos, bem como conscientizar
sobre o que acontece em nosso país no que tange a situações como essas e para criar
movimentos sociais com o objetivo de colaborar com uma sociedade melhor.
Entretanto, observamos que as taxas de desemprego em decorrência da pandemia da
COVID-19, aumentaram de maneira assustadora no ano de 2020, pois, em virtude do iso-
lamento social, várias pessoas perderam seus empregos, muitas delas, dependiam desses
empregos, sendo sua única fonte de renda.
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Em virtude dos fatos narrados, a figura 02, através de um gráfico, ilustra muito bem
essa questão social em números percentuais a taxa de desemprego que assola nosso país
em decorrência do isolamento ocorrido nos 05 primeiros meses do ano de 2020, alertando
sobre o aumento de 33.1% em algumas localidades.

Figura 2. Dados disponibilizados pelo IBGE 2020.

A figura ilustra os últimos 05 (cinco) meses do ano de 2020, as taxas em números


percentuais de desempregados no Brasil em decorrência do isolamento social.
Toma-se conhecimento que a pandemia da COVID-19, trouxe consequências mons-
truosas a população do Brasil, fomentando ainda mais a questão da desigualdade social e
observando que a classe média de baixa renda, acabou sendo a mais prejudicada, uma vez
que, com a perda do emprego muitos dependiam do salário, sendo inclusive sua única fonte
de renda e acabou se tornando evidente que as questões das desigualdades têm classe e cor.

Auxílio emergencial e a COVID 19

Em tempos de pandemia, várias pessoas saíram prejudicadas em vários setores e o


governo brasileiro ao tentar minimizar os impactos trazidos pela pandemia, lançou em 02
de abril de 2020, o chamado auxílio emergencial com a quantia de R$600,00, com o objeti-
vo de auxiliar a população que sofre com a miserabilidade e o desemprego, em suas mais
variadas facetas.
Contudo, observamos que nem todos que precisam desse auxílio tiveram acesso a
esse benefício e quem realmente não precisa acabou recebendo, como podemos observar
em diversos veículos de comunicação.
Nesse sentido, se faz necessário uma fiscalização rigorosa e ao mesmo tempo com
aparatos para tentar minimizar a situação e tentar ajudar os que precisam de um suporte
maior até ter uma resposta plausível sobre a pandemia da COVID 19.
Mesmo existindo a possibilidade de uma 2ª onda de COVID-19, o governo decretou
que o auxílio iria até meados de dezembro. Assim, como fica as pessoas que precisam
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desse auxílio para inclusive sua subsistência? O ideal seria que ele se prolongasse um
pouco mais, até termos respostas sobre a situação do nosso país, pois estamos vivendo
uma tirania federativa, onde cada político afirma algo, e não sabemos quem seguir e como
seguir, além de estarmos totalmente inerte a situação imposta.
Portanto, em virtude da pandemia da COVID-19, observamos que:

1) As desigualdades aumentaram em virtude do isolamento social previamente esta-


belecido;
2) A taxa de desemprego aumentou consideravelmente;
3) A questão da miserabilidade atingiu limites assustadores;
4) Pessoas que teriam acesso ao auxílio emergencial, acabaram não recebendo, oca-
sionando assim uma inversão de valores, uma vez que quem possui meios de sub-
sistência acabaram recebendo como noticiado em vários meios de comunicação;
5) Alunos das escolas públicas saíram prejudicados uma vez que nem todos possuem
acesso à informação e sequer possuem um dispositivo móvel em suas residências;
6) Nem todos os projetos sociais ou programas de governo acabam sendo para todos,
uma vez que, somente uma classe social dispõe desses benefícios e quem precisa
sequer consegue acesso;
7) A taxa de analfabetismo aumentou consideravelmente em determinadas regiões
entre pessoas de 15 anos ou mais.

CONCLUSÃO

À luz das informações contidas o presente trabalho traz consigo o escopo da vulnera-
bilidade que a pandemia demonstrou no que tange a inclusão digital dos alunos nas escolas
públicas brasileiras, bem como a uma realidade esquecida por muitos e que agora está
refletida no considerado novo normal.
Pode-se observar também que em virtude da pandemia da COVID-19, algumas mu-
danças ocorreram, prejudicando a população mais marginalizada, uma vez que, muitas
pessoas perderam seus empregos, de onde vinha seu próprio sustento, sua única fonte
de renda, bem como prejudicando assim toda uma família, e mesmo com o auxílio emer-
gencial em vigor, este não foi capaz de sanar questões pertinentes e nem atendeu a todos
que dele dependiam.
A corrupção em nosso país é algo eminente, mesmo para aqueles que desconhecem
o ordenamento jurídico. Assim, mesmo que as verbas repassadas para as escolas públicas
cheguem ao seu destino, e que seja entregue e efetivamente estabelecida para cumprir
a demanda, talvez os números de casos de corrupção diminuam e que então minimizem
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os impactos impostos a uma classe social, bem como a pobreza talvez possa ser extinta
e que as pessoas possam então ter as mesmas oportunidades em qualquer esfera que
deseja ingressar.
Nesse sentido, buscou-se trazer dados sobre o conflito atual vigente através de aparatos
e uma nova reflexão bastante abrangente sobre a questão que é a desigualdade existente
no Brasil de uma forma ampla e bem peculiar.

AGRADECIMENTOS E/OU FINANCIAMENTO (SE APLICÁVEL)

Agradeço a Deus pelas bençãos incessantes.


Agradeço imensamente aos meus pais Antônio e Lúcia, minha irmã Bárbara,
bem como ao meu namorado Filipe e sua família pelo apoio necessário e por acredita-
rem em meu sucesso.
A jornada rumo ao sucesso só é aplicável se tivermos pessoas que acreditam em
nossos sonhos e objetivos.
Enfim, agradeço a todas as pessoas que fizeram parte de mais uma etapa fundamen-
tal em minha vida.

REFERÊNCIAS
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e inclusão social: contribuições teóricas e metodológicas. Barbarói, Santa Cruz do Sul,
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em: 12 nov. 2020.

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Fake News e desinformação em tempos de
Transtorno da Personalidade Antissocial

Haroldo da Silva
PUC-SP/Bolsista da CAPES

'10.37885/220207755
RESUMO

Esse artigo busca tratar das conexões entre as Fake News e a Desinformação e os seus
impactos e desafios na contemporaneidade. Por meio da devida conceituação dos temas
inerentes, o artigo pretende lançar luz sobre como a desinformação tem sido utilizada, no
meio político, num contexto de pós-verdade e mesmo de negacionismo. Desde narrativas
inverossímeis, até questões absurdas – do ponto de vista da ciência e do conhecimento
acumulado – têm sido utilizadas por grupos de interesse bem definidos. Por meio de
questões estruturadas que refletem o diagnóstico clínico do Transtorno da Personalidade
Antissocial (TPA), nota-se que há um maior risco ainda sobre os efeitos da desinforma-
ção em um ambiente no qual 4% da população mundial tem algum nível de sociopatia.

Palavras-chave: Fake News, Desinformação.

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INTRODUÇÃO

Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua ‘política geral’


de verdade: isto é, os tipos de discurso que ela acolhe e faz
funcionar como verdadeiros; os mecanismos e as instâncias
que permitem distinguir os enunciados verdadeiros dos falsos,
a maneira como se sanciona uns e outros; as técnicas e os
procedimentos que são valorizados para a obtenção
da verdade; o estatuto daqueles que têm o encargo
de dizer o que funciona como verdadeiro

FOUCAULT, Michael

Não há como deixar de concordar com a declaração do presidente Bolsonaro, em 22 de


junho de 2020, à Bandnews: “Nossa imagem não está muito boa aí fora por desinformação”.
Desinformação tem um aspecto polissêmico. A despeito de estar correto na conclusão, o
mandatário está distorcendo a origem da causa sobre a má imagem que estrangeiros têm,
atualmente, do Brasil.
Ao contrário do que afirma o presidente, a desinformação sobre o Brasil talvez ajude
em não piorar a imagem do País, frente ao mundo. Basta ver que na reunião ministerial – se
é que se pode tratar daquele encontro que mais parecia uma aglomeração de militantes, do
que reunião – que foi juntada aos autos da investigação sobre a intromissão dele na Polícia
Federal, o ministro do Meio Ambiente, opróbrio, declarou que seria o momento de “passar
a boiada”, numa referência ao aniquilamento de normas protetivas e disciplinadoras da ocu-
pação de terras. Assim, se “lá fora” essa informação chegasse, devidamente decodificada, a
todos, o Brasil sofreria ainda mais repúdio na comunidade internacional. Isto é, estaríamos
piores ainda, se não houvesse desinformação, no sentido de ausência de informação, não
no de informação distorcida para prejudicar o seu governo, conforme alega.
Como se vê, não são temas simples de serem tratados. Não é por outra razão que muito
se têm escrito sobre o assunto e discutido. O tema se faz presente até mesmo num grande
debate no Congresso Nacional – e que é acompanhado inclusive no exterior – por meio do
projeto de lei nº 2630/20, que busca instituir a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade
e Transparência na Internet. O debate está acalorado.
Contudo, o que se propõe aqui não é uma longa exposição das mais diferentes polêmi-
cas, mas apenas abordar, do ponto de vista teórico, com apoio da bibliografia apropriada, as
conexões desses temas com a Fake News e a desinformação e seus impactos e desafios na
contemporaneidade. Para atingir esse propósito, esse trabalho tem, afora essa seção, mais
duas, além das considerações. Na primeira delas, buscar-se-á circunscrever os principais
conceitos e de que forma eles se inserem no ambiente político; e, na segunda, o contexto

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da pós-verdade, que amplifica o sucesso das narrativas inverossímeis, até mesmo as mais
absurdas, que estão a serviço de grupos de interesses bem definidos.

INVERDADES E SUAS VARIANTES ATUAIS

Se meus inimigos pararem de dizer mentiras a meu respeito, eu paro de


dizer verdades a respeito deles.

Adlai Ewing Stevenson II.

A teleologia, que é bastante utilizada no direito, pode ajudar, em muito, na análise


daquilo que, hoje, definem como Fake News. Grosso modo, a análise teológica busca o es-
tudo filosófico dos fins, isto é, do propósito, objetivo ou finalidade. A Fake News não é uma
espécie de erro qualquer, tem que haver dolo para que seja assim caracterizada. Caso não
haja a intenção de produzir e espalhar uma notícia falsa, não se pode conceituá-la como
Fake News. Assim, as Fake News não são a barrigada fruto do desleixo do repórter, pois
têm a intenção de enganar, em favor de um lado específico. São, em realidade, a mentira
intencional – que têm enorme capacidade de difusão – a serviço de alguma causa escusa1.

A investigação de Guess et al. (2018) sobre o consumo de fake news nas


eleições dos Estados Unidos apontou que uma em cada quatro pessoas foi
exposta a fake news. Entretanto, essas notícias falsas representaram apenas
2,6% do total. O estudo mostra ainda que 60% das visitas às fake news en-
contradas ficaram restritas a 10% do eleitorado, de viés mais conservador. Os
autores concluem, assim, que o fenômeno ainda é localizado.2

As Fake News não são mero proselitismo, têm um objetivo bem mais amplo. Em muitas
oportunidades, buscam conspurcar algo, alguém, uma ideia ou conceito; disseminar o pânico,
ou encontrar um inimigo imaginário, ou mesmo transformar um adversário em alguém que
deva ser tratado de maneira hostil. Enfim, Fake News só nasce num ambiente de ausência
de boa-fé. É fruto de dolo, não de erro escusável.

Em primeiro lugar é importante diferenciar fake news de desinformação. Grosso


modo, podemos compreender fake news como notícia falsa, e o termo tem
sido usado por grupos poderosos com objetivo de atacar a credibilidade de
conteúdos jornalísticos e informativos. Desinformação é um fenômeno mais
complexo, que pode ser desde informações falsas, inexatas ou deturpadas
e que causam um prejuízo público, muitas vezes podem ser compartilhadas

1 PINHEIRO, Joel. Fake News e o futuro da nossa civilização in BARBOSA, Mariana (org.). Pós-verdade e Fake News: reflexões
sobre a guerra de narrativas. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019, p. 87.
2 DELMAZO, Caroline; VALENTE, Jonas. C. L. Fake News online social media: propagaton and reactions to misinformatio in search

95
of cliks. Universidade de Coimbra: Coimbra, nº 32. Vol. 18, nº 1, 2018, p.8.

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pelas redes sociais por pessoas que não checaram a veracidade da informação
e a compartilharam.3

Complementarmente, para distinguir a Fake News da desinformação, sob outra perspec-


tiva, pode-se recorrer à forma deliberada com que a primeira se mostra e a verossimilhança
em que a segunda se apresenta. No primeiro caso, com algum cuidado fica mais evidente
a constatação do objetivo abjeto, no outro, nem tanto. Requereria, portanto, recorrer ao
pensamento devagar, no sentido de Kahneman [tratado mais adiante], e, com o perdão do
jogo de palavras, num tempo em que não se tem tempo, isto é, em tempos líquidos.

‘Fake news’ is information that has been deliberately fabricated and dissemina-
ted with the intention to deceive and mislead others into believing falsehoods
or doubting verifiable facts; it is disinformation that is presented as, or is likely
to be perceived as, news.4

Claro que essa discussão remete à índole do homem. Mau ou bom, em essência?
Centenas de anos e essa questão permanece sem solução pronta e acabada. “Os homens
são maus: uma triste e contínua experiência dispensa a prova; no entanto, creio ter demons-
trado que o homem é naturalmente bom”.5

Não concluamos com Hobbes, principalmente, que, por não ter nenhuma ideia
da bondade, o homem é naturalmente mau, que é vicioso porque não conhece
a virtude e que recusa sempre a seus semelhantes serviços que julga não lhes
dever; nem concluamos que, em virtude do direito que se atribui com razão
sobre as coisas de que necessita, ele se imagine loucamente ser o único
proprietário de todo o universo.6

Como se pode notar, a questão da bondade ou maldade não está pacificada, como
diriam os juristas, na literatura, ainda que muito tempo depois das discussões filosóficas
entre Rousseau e Hobbes. Assim, também não nos cabe aqui, nesse espaço e com o
objetivo proposto, alongar ainda mais esse debate. Todavia, o que está claro é que num
contexto de Fake News, a intenção principal não está na notícia, mas sim em algo que é
subliminar, embora nem sempre. No ambiente da disputa política e de instituições débeis
isso se acirra ainda mais.

3 SEGURADO, Rosemary; CHICARINO, Tathiana; NETO, João Vieira. Avanços e retrocessos na comunicação e na informação no
Brasil in COSTA, Greiner; POCHMANN, Márcio (org). O Estado como parte da solução: uma análise dos desafios do desenvol-
vimento brasileiro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2020, p. 390.
4 MACGONAGLE, Tarlach. ‘Fake News’: false fears or real concerns? Institute for Information Law: Amsterdam, 2017, p. 1.
5 ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. L&PM Pocket.
Edição do Kindle.

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6 COMTE-SPONVILLE, André. Pequeno tratado das grandes virtudes. São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 213-5.

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[...] a luta partidária assume formas particularmente secundárias, pois é moti-
vada por interesses puramente materiais e pessoais. É possível e necessário
utilizar os meios proporcionados pelo direito criminal para lutar contra os ata-
ques políticos dirigidos contra a honra pessoal e vida particular de um adver-
sário e contra a inescrupulosa disseminação de inverdades sensacionalistas7.

Com a crise de credibilidade das instituições que o mundo assiste, o ambiente de des-
confiança ganha especial contorno. Nesse sentido, com vistas a explorar um pouco melhor
essa questão, vale uma digressão.
Não que seja um marco histórico específico, mas, desde a invasão do Iraque, “pelos
aliados”, a verdade e as instituições, consequentemente, estão em xeque, de forma mais
intensa e agressiva. E é de fundamental importância para o funcionamento adequado de
uma sociedade moderna, instituições críveis. As instituições – fortalecidas – parecem ser
uma boa alternativa, ao atual momento de descrédito. Resultado de pesquisa que levou o
institucionalista Douglass C. North8, a ser laureado com o Prêmio Nobel de Economia em
1993, as Instituições (e as restrições por elas impostas) podem ser a resposta à essa ins-
tabilidade intrínseca à Vida Líquida, no sentido baumaniano do termo, sem que impeçam a
evolução da humanidade. Segundo o premiado pela academia sueca:

Institutions are the humanly devised constraints that structure political, econo-
mic and social interaction. They consist of both informal constraints (sanctions,
taboos, customs, traditions, and codes of conduct), and formal rules (constitu-
tions, laws, property rights). Throughout history, institutions have been devised
by human beings to create order and reduce uncertainty in exchange.9

Note-se que, desde que o país do oriente médio, rico em petróleo foi invadido, sob a
alegação de que possuiria armas de destruição em massa, sobretudo químicas, a verdade
foi relativizada. Senão por ter perdido importância, ao menos pelo fato de que, não cons-
tatada a existência de tais armas, nada ocorreu contra quem usou politicamente da inver-
dade para atingir seus objetivos e de seus patrocinadores que depois ganharam bilhões
na “reconstrução” da terra que eles próprios arrasaram. Enfim, a sequência de fatos e as
constatações que podem ser feitas agora, sob o crivo da história, mostram que a boa-fé
esteve ausente nesse caso.

7 WEBER, Max. Governo parlamentar e democrático. Coleção os Economistas. São Paulo: Editora Nova Cultural Ltda. 1997, p. 101.
8 Em verdade, há uma Escola Institucionalista, cujas origens remontam ao final do século XIX e início do XX. Seu fundador foi Thorstein
Veblen. Outros nomes relevantes também fazem parte desses pensadores institucionalistas como Wesley C. Mitchell, John Com-
mons, Clarence E. Ayres e John K. Galbraith, além de Douglas C. North. A visão institucionalista é sistêmica; holística sobre a socie-
dade. Para eles, política, sociologia, economia, leis, costumes, ideologia, tradição e outras áreas de crença e experiências humanas
devem ser consideradas em prol da prosperidade numa abordagem evolutiva inspirada em Darwin. Para uma análise mais profunda
do tema, ver: BRUE, S. L. História do pensamento econômico. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005, p. 365 e seguintes.

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9 NORTH, D. C. Institutions. Journal of Economic Perspectives- Volume 5, Number 1-Winter I991-Pages 97-112

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Não, claro, que a boa-fé valha como certeza, nem mesmo como verdade (ela
exclui a mentira, não o erro), mas que o homem de boa-fé tanto diz o que
acredita, mesmo que seja enganado, como acredita no que diz. É por isso que
a boa-fé é uma fé, no duplo sentido do termo, isto é, uma crença ao mesmo
tempo que uma fidelidade. É crença fiel, e fidelidade no que se crê. Pelo me-
nos enquanto se cré que seja verdade. Vimos, a propósito da fidelidade, que
ela define muito bem a boa-fé ser de boa-fé não é sempre dizer a verdade,
pois podemos nos enganar, mas é pelo menos dizer a verdade sobre o que
cremos, e essa verdade, ainda que a crença seja falsa, nem por isso seria
menos verdadeira.10

Trazendo um pouco mais para os dias atuais, a política tem se mostrado campo fértil
para todo o tipo de manipulação da verdade, principalmente como “armas” nas mãos de
líderes populistas muito mais preocupados com seus objetivos do que com os meios ou
com a ética. No limite, são contraexemplo do que sugere Weber, ao afirmar que: há, por
fim, o dever da verdade. É também ele incondicional, do ponto de vista da ética absoluta11.
Registros desses contraexemplos são abundantes.

Os defeitos e vícios dos líderes populistas se transformam, aos olhos dos elei-
tores, em qualidades. Sua inexperiência é a prova de que eles não pertencem
ao círculo corrompido das elites. E sua incompetência é vista como garantia
de autenticidade. As tensões que eles produzem em nível internacional
ilustram sua independência, e as fake news que balizam sua propaganda
são a marca de sua liberdade de espírito. No mundo de Donald Trump, de
Boris Johnson e de Jair Bolsonaro, cada novo dia nasce com uma gafe,
uma polêmica, a eclosão de um escândalo12. (Grifamos).

Governos conservadores e populistas encontraram, por meio da internet, meios eficazes


de angariar adeptos aos seus discursos que, em muitas vezes, são simplesmente de ódio
contra grupos considerados inimigos. Aliás, sempre precisam de um inimigo para poderem
prosperar, seja ele real, numa visão idiossincrática, ou imaginário, na realidade. A lista é
grande. Os imigrantes, a imprensa, a velha luta de classes entre os possuidores e despos-
suídos, quer seja dos meios de produção ou mesmo de meios elementares de subsistência,
são encarados como o outro, que precisa ser eliminado, não compreendido, menos ainda
ajudado, ou talvez até mesmo criticado. Só cabe a aniquilação.

Já a emergência dessa onda de governos conservadores, que inundaram a


política contemporânea, não se limita a retornar ao passado, nem funciona
como mera reencarnação dos fascismos e populismos perdidos na história da
primeira metade do século XX. O certo é que se trata de fenômeno tão mo-
derno como complexo. Os populismos de agora abusam das novas formas de

10 HOBBES, Thomas. O Leviatã. Edição do Kindle, p. 1529.


11 WEBER, Max. Ciência e Política - Duas Vocações. Editora Cultrix. Edição do Kindle.

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12 EMPOLI, Giuliano. Os engenheiros do caos. Vestígio Editora. Edição do Kindle, 2019.

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comunicação virtual com a justificativa de que não precisam de intermediários
para se dirigirem ao povo; não têm nenhum escrúpulo em manipular e explo-
rar fake news como se fossem verdades comprovadas; vendem para si uma
imagem de lisura e correção na gestão do governo, tratando de obliterar seus
próprios maus exemplos; acusam os demais de corrupção, não estando eles
distantes dessa prática; se autodenominam como “novos” quando estão faz
tempo na política e vivem dela; abusam de mensagens moralistas apoiando-se
fortemente em conceitos como religião, família e nação13.

Como mencionado anteriormente, não é que inverdades na política sejam novidade.


Não são. Contudo, o que a internet promoveu foi a capacidade exponencial de alcance – e o
barateamento da disseminação e “fabricação” da mentira, travestida com o verniz da verdade.

No sentido da fabricação da realidade, atualmente, acompanha-se o aumento


exponencial da produção de notícias falsas na internet. Apesar de, por um
lado, as redes digitais permitirem acesso e compartilhamento de conteúdo de
variados assuntos, contemplando particularidades de diversos atores sociais,
por outro o meio online também trouxe consigo a facilidade de proliferação
das fake news.14 (Grifamos).

Não se pode negligenciar outro aspecto humano, envolto na forma de construção do


nosso raciocínio e que tem sido alvo de pesquisas intensas, especialmente na área da eco-
nomia. Nossa arquitetura cognitiva nos faz dar ouvidos às fofocas; por quê? Porque é muito
mais fácil, além de ser muito mais prazeroso, identificar e classificar os erros dos outros do
que reconhecer nossos próprios erros15.

Um recente estudo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) demons-


trou que uma falsa informação tem, em média, 70% a mais de probabilidade
de ser compartilhada na internet, pois ela é, geralmente, mais original que uma
notícia verdadeira. Segundo os pesquisadores, nas redes sociais a verdade
consome seis vezes mais tempo que uma fake news para atingir 1.500 pes-
soas. Temos, enfim, a confirmação científica da frase de Mark Twain segundo
a qual “uma mentira pode fazer a volta ao mundo no mesmo tempo em que a
verdade calça seus sapatos”!16

Todavia, se a Fake News prospera tão facilmente e de forma barata, o mesmo não ocor-
reria com a notícia verdadeira e de qualidade jornalística, por quê? Sem dúvida isso passa
por fatores psicológicos, não somente comerciais. Há um certo furor em ler algo chocante,
ainda que inverossímil, não é por outra razão o “sucesso” do terraplanismo. Isso foi muito
bem capturado pelas equipes políticas e pelos algoritmos sofisticados. Brittany Kaiser trata

13 SCHWARCZ, Lilia Moritz. Sobre o autoritarismo brasileiro. Companhia das Letras. Edição do Kindle.
14 CONCEIÇÃO, Desirèe Luíse Lopes. Internet e cidadania: o estímulo ao debate político por meio do jornalismo fact-checking – Um
estudo de caso do projeto “Truco!”. Dissertação – Mestrado em Ciências Sociais. PUC-SP, 2018, p. 146.
15 KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: Duas formas de pensar. Objetiva. Edição do Kindle.

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16 EMPOLI, Giuliano. Os engenheiros do caos. Vestígio Editora. Edição do Kindle, 2019.

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do assunto e expõe as entranhas de uma engenhoca cibernética que fica à disposição para
trabalhar “quase sempre debaixo dos panos” para quem pagar bem. Como contrapartida,
fazer o que for encomendado, independentemente do que venha a causar, não apenas
localmente, mas no mundo, desde que, claro, seja lucrativo.17

PÓS-VERDADE: A ADMISSÃO DAS NARRATIVAS INVEROSSÍMEIS

Claro que ainda há muito academicismo no que tange ao termo “pós-verdade”. Isto é,
a discussão ainda está adstrita aos meios acadêmicos e teóricos. Em outras palavras, não
é possível afirmar que tenha se tornado popular o uso e o debate sobre pós-verdade. Não
ao menos com essa denominação. Todavia, isso parece estar mudando aos poucos. Para
exemplificar o uso do termo, num contexto diferente do meio da pesquisa, o BNDES, com
vistas a esclarecer os mitos que foram criados, com cunho eminentemente político, para
criticar os governos anteriores, especialmente do Partido dos Trabalhadores, usou o seguinte
parágrafo numa publicação destinada a qualquer interessado:

O Livro verde é uma singela contribuição para tornar esse debate o mais am-
plo e bem-informado possível, sem a inconveniente repetição de fantasias
ou “pós-verdades” sobre as atividades do Banco, que não servem senão
para poluir a cristalina história de uma instituição vencedora.18. (Grifamos).

Como se pode notar, a publicação do BNDES não tem caráter acadêmico, mas sim uma
espécie de informativo à sociedade. Mal comparando, trata-se de uma espécie de “Carta
ao Povo Brasileiro”, só que com a mesma conotação: ao mercado financeiro e ao mundo
político. Nesse aspecto o banco de fomento faz questão de dizer, ainda que tardiamente, que
prosperou uma boataria, certamente orquestrada, com a finalidade clara de uso político das
operações financeiras coordenadas por um dos maiores bancos de desenvolvimento eco-
nômico do mundo. Dito de outra maneira: a pós-verdade, nesse caso, serviu para “colar” no
“PT” a pecha da corrupção, desvios e desmandos, sem entrar no mérito de casos específicos
cujo Judiciário já se manifestou de um lado ou de outro, isto é, inocentando e condenando.
O que se depreende, ao final, é que as instituições, quando frágeis, também dão com-
bustível adicional à proliferação de Fake News e de desinformação, diante de interesses
econômicos e políticos amorais, já que alheios à questão moral, como também imorais em

17 KAISER, Brittany. Manipulados: como a Cambridge Analytica e o Facebook invadiram a privacidade de milhões e botaram a
democracia em xeque. Rio de Janeiro: Harper Collins, 2020, p. 203.

100
18 BNDES. Livro verde: nossa história tal como ela é. Rio de Janeiro: BNDES, 2017, p. 2.

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muitas oportunidades. Metaforicamente, a lógica, nesse meio, reiteradamente, é a de separar
o joio do trigo e dar atenção ao joio.

Se o fracasso institucional erodiu a primazia da verdade, também para isso


contribuiu a indústria multibilionária da desinformação, da propaganda enga-
nosa e da falsa ciência que surgiu nos últimos anos. Da mesma forma que a
pós-verdade não é simplesmente outro nome para a mentira, essa indústria não
tem nada a ver com as ações de lobby e as relações corporativas legitimas.19

Não é uma circunstância brasileira o uso da manipulação da verdade com uso político,
como vimos. Como dito anteriormente também, sempre há que se ter um inimigo nessa narra-
tiva que usa a pós-verdade para atingir objetivos cuja ética sequer é vislumbrada. A corrente
conservadora, do ponto de vista político, é recorrente no uso desse recurso.

Na primeira coletiva de imprensa de Trump como presidente eleito dos Estados


Unidos, ele chamou a CNN de “fake news”, referiu-se ao BuzzFeed como “um
monte de lixo”, exclamou “essa é outra”, sobre a BBC, e acusou a imprensa
como um todo de “desonesta”. Em seu primeiro dia efetivo no gabinete, mandou
a porta-voz fazer uma série de pronunciamentos falsos sobre “as reportagens
deliberadamente falsas” da imprensa. Durante os primeiros meses de mandato,
se aperfeiçoou excluindo jornais importantes de um briefing na Casa Branca e
rotulando veículos de comunicação, do New York Times à CNN, de “inimigos
do povo americano”.20

Pena que algo que Mill pensou que já estivesse resolvido tenha que voltar a ser trata-
do. A imprensa livre – mas responsável – está sob ataque.

Já passou o tempo, assim se espera, em que seria necessária uma defesa


da liberdade de imprensa como uma das salvaguardas contra um governo
corrupto ou tirânico21.

Seria impossível prosperar, a Fake News e a desinformação – assim como toda a


mensagem – sem um dos lados elementares da comunicação: um emissor e outro receptor.
Não se trata de algo mais sofisticado ser aqui abordado, apenas aspectos rudimentares, no
que tange à comunicação. Tão importante de dizer o que é, vale frisar, o que não é Fake
News e desinformação.
Nesse sentido, muito diferente da busca apropriada pela comunicação eficaz e que
busca conscientizar, aquela cuja verdade é a matéria-prima, no caso das Fake News, não é
almejado reunir a competência e o desempenho no sentido de Chomsky, de forma a propiciar

19 D’ANCONA, MATTHEW. Pós-verdade: a nova guerra contra os fatos em tempos de Fake News. Ed. Faro Editorial. 2018, p. 4.
20 MOUNK, Yascha. O povo contra a democracia. Companhia das Letras. Edição do Kindle, p. 797.

101
21 MILL, Stuart. Sobre a liberdade. Hedra. Edição do Kindle, p. 534.

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o entendimento correto dos enunciados22. Aliás, as narrativas que têm as Fake News e a
desinformação como objetivo é exatamente o contrário que se busca: confundir, obnubilar.
Adicionalmente, um outro aspecto interessante a ser reforçado é o de que, se a Fake
News e a desinformação, ambas portanto, estão relacionadas à intenção determinada em
distorcer os fatos e/ou dados que, no limite, vão – ou que têm o potencial de prejudicar al-
guém –, elas são, assim, reprováveis, do ponto de vista do comportamento social desejado.
Claro que não há espaço, tampouco esse trabalho se destina a uma investigação
em relação às motivações psíquicas do fato de que, deliberadamente, essas “falsidades”
sejam criadas e replicadas, mas vale lançar, ainda que brevemente, algumas inquietações
acerca desse assunto.
Vale retomar, emissor e receptor são elementos centrais do processo de comunica-
ção. Se esse emissor tem objetivos escusos e encontra troll’s23 à sua disposição, a informa-
ção que chega aos receptores é ainda mais perigosa. Some-se a isso, que o emissor pode
simplesmente ser classificado como um sociopata e sua mensagem ter ainda menos filtros,
circulando por um ambiente aberto, apta a prosperar como verdade em mentes idênticas.
Apenas de forma propedêutica, vale fazer uma breve digressão, sobre esse ponto.
Evidentemente que não se pode concluir que alguém é acometido de um distúrbio psi-
cológico apenas por uma análise superficial clínica. Entretanto, chama a atenção o fato de
que, conforme o Manual de Diagnósticos de Distúrbios Mentais, da Associação Americana
de Psiquiatria, o diagnóstico clínico do Transtorno da Personalidade Antissocial (TPA) pode
ser verificado se, alguém submetido às análises da tabela a seguir, apresentar três das sete
características.

Figura 1. Base do Diagnóstico Clínico do Transtorno da Personalidade Antissocial [TPA].

Características: para o diagnóstico clínico TPA sim não

1 incapacidade de adequação às normas sociais


2 falta de sinceridade e tendência à manipulação
3 impulsividade, incapacidade de planejamento
4 irritabilidade, agressividade
5 permanente negligência com a própria segurança e a dos outros
6 irresponsabilidade persistente
7 ausência de remorso após magoar, maltratar ou roubar outra pessoa
Fonte: STOUT, Martha (2010). Elaboração: Própria.

22 Explica FIORIN, José Luiz. (Org), et. all. Introdução à linguística. São Paulo: Editora Contexto, 2012, p. 15: “Chomsky distingue
competência de desempenho. A competência linguística é a porção do conhecimento do sistema linguístico do falante que lhe permi-
te produzir o conjunto de sentenças de sua língua; é um conjunto de regras que o falante construiu em sua mente pela aplicação de
sua capacidade inata para aquisição da linguagem aos dados linguísticos que ouviu durante a infância. O desempenho corresponde
ao comportamento linguístico, que resulta não somente da competência linguística do falante, mas também de fatores não linguísti-
cos de ordem variada [...] o desempenho pressupõe a competência, ao passo que a competência não pressupõe desempenho”.
23 Troll, na internet, define os usuários que disseminam a discórdia, a fúria e o caos nas redes sociais, com estratégias definidas, sempre

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que há um cunho político envolto.

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Com base na mesma obra, a autora destaca que uma, em cada 25 pessoas, é um
psicopata – sem consciência, sem culpa e, o que é pior, pode ser qualquer um, inclusive
alguém muito próximo. Fica a provocação: veja aqueles políticos que lideram grupos e que
têm sido os principais beneficiados pelas Fake News e pela desinformação, no Brasil e no
mundo. Avalie se a lista, descrita na tabela 1, revela alguma – e se sim quantas – caracterís-
ticas desses agentes políticos. Tem alguém em mente para iniciar o teste? Provavelmente.
Todos – ou quase todos – conhecemos mitômanos.
E a questão que fica é: nas posições de poder eles não estariam? Teríamos políticos
eleitos e no exercício de mandato público com essas propriedades apontadas no diagnós-
tico? Possivelmente sim, até mesmo porque uma das características da personalidade dos
que sofre de TPA é um charme superficial que o torna sedutor para outras pessoas. Isso, de
per si, dá votos. É ele, com frequência, mais interessante do que a maioria dos indivíduos
“normais” à sua volta. Enfim, tem um carisma que é capaz de angariar seguidores e permite
lavá-los a trilhar, todos juntos, empreitadas arriscadas. Não equivale dizer que esses perso-
nagens acometidos pelo distúrbio psíquico não tenham ciência do bem e do mal, mas isso,
isoladamente, não limita suas ações e comportamentos.
Os sociopatas se destacam, afirmam os especialistas, pela superficialidade da emoção.
Como resultado é possível presumir que esses seres têm, em si, ausência da consciência. 24
Assim, considerando que: i) há, entre todos nós, o equivalente a 4% da população
mundial sofrendo de algum tipo de sociopatia e estão do lado da emissão da comunicação
e também da recepção; ii) a internet ampliou a comunicação; iii) a liberdade de expressão
tem servido de manto para o discurso dos troll’s; iv) muitos deles estão a serviço de políticos
e grupos de interesse de matrizes de ultradireita; e v) há que se colocar algum regramento,
sob pena da ruptura constante, ou mesmo permanente, do contrato verdadeiramente social,
no sentido dado por Rousseau25.

24 STOUT, Martha. Meu vizinho é um psicopata. Rio de Janeiro: Sextante, 2010, p. 18.
25 “Assim, para dar um único exemplo, o contrato social e as leis – se forem realizados segundo as regras e exigências que os fazem
rigorosamente um contrato verdadeiramente social e leis que autenticamente o sejam, e não, nos dois casos, suas frequentes con-
trafações – podem sim reconstituir entre os homens um sucedâneo equivalente à igualdade natural.” in ROUSSEAU, Jean-Jacques.

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Discurso sobre a origem e os fundamentos da desigualdade entre os homens. L&PM Pocket. Edição do Kindle.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não é à toa que o projeto de lei que trata do assunto Fake News e desinformação, e
que está no Congresso, suscita tanta discussão. Vários foram os adiamentos de votação,
tendo em vista diferentes pontos de vista de setores distintos da sociedade. Parlamentares
ligados ao governo e representantes das empresas de tecnologia, de um lado, dizem-se
preocupados com a liberdade na rede, enquanto deveriam estar atentos às liberdades subs-
tantivas, o que denotaria liberdade em sentido amplo. De outro, há congressistas que per-
ceberam que limites precisam ser postos às milícias digitais, por meio da transparência e da
rastreabilidade. Embora não sejam necessariamente excludentes, esses pontos de vistas
precisarão serem sopesados, de forma sincrética.
Críticas à parte, legislar sobre o assunto é necessário e urgente, muito embora esteja
longe de ser trivial. Importante lembrar: a lei existe para limitar a liberdade natural dos indiví-
duos, naquilo que possam causar danos uns aos outros. Ainda mais relevante é considerar
isso num mundo hiperconectado, repleto de troll’s e com 4% de sociopatas, cujo sentimento
de culpa ou remorso não lhes afeta, em absoluto.
É necessário o envolvimento de setores organizados da sociedade civil com vistas a
barrar o poder destrutivo ideológico que pesa sobre a real democracia, que corre o risco
de obliterar. Os exemplos recentes do Brexit, das eleições americanas e do gabinete do
ódio reforçam essa tese. Em paralelo, fortalecer as instituições democráticas é algo basilar
para que as liberdades substantivas possam coexistir com os preceitos da dignidade da
pessoa humana, princípio fundante e civilizatório máximo esculpido ao longo do Art. 1º, III,
da Constituição Federal. Eis o busílis.
Com efeito, não se pode negligenciar o fato de que as emoções negativas estão prontas
para serem despertadas e a facilidade com que se pode fazer isso, por meio das redes so-
ciais reveste o tema de seriedade. Basta lembrar, teorias da conspiração ganharam terreno
fértil, tal qual o negacionismo, tão ou mais perigoso do que as mentiras revestidas de verniz,
exatamente por conta da displicência de lideranças pró-democracia e direitos humanos,
como também por lacunas normativas.
Não é prudente analisar o problema da Fake News e da desinformação, sob a possibi-
lidade de aplicação da perspectiva teórica do mal menor. Não é por outra razão que ecoem,
sem constrangimento, no Brasil atual, maus agouros que tangenciam com o período das
trevas, seja no que se refere ao pré-Iluminismo, tanto quanto do ponto de vista político com
pedidos de retorno à ditadura, ainda que sob o manto de Poder Moderador (sic). Há que
se prestar atenção aos acontecimentos, ainda que quase imperceptíveis, pois são eles
que denotam os grandes eventos. Não basta, contudo, só atentar, há que se reagir, com

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veemência a esses arroubos, de forma que permaneçam apenas nas mentes sociopatas e
antidemocráticas, sob pena desse repousar em histerese.
Há que se ter esperança, de outro lado, de que a norma apropriada, que vier a surgir
dos debates no Legislativo, consiga equilibrar os princípios fundamentais à democracia, con-
substanciados na liberdade de expressão e na proteção da dignidade da pessoa humana,
está última ameaçada pelas Fake News e pela desinformação. Grupos ultraconservadores
e, no limite, reacionários, têm usado desta tática nefasta para atingir seus objetivos abjetos
e, desafortunadamente, com sucesso.

REFERÊNCIAS
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08
Gramsci e Ortega y Gasset: o advento do
século XX sob uma perspectiva sociológica
da crise

Gustavo Martins do Carmo Miranda


UFMG

Luiz Eduardo de Souza Pinto


UFMG

'10.37885/220207711
RESUMO

Pensando no desafio de trazer à tona, no âmbito da Sociologia, estudos – bem como


autores – ainda pouco explorados e ensinados na academia, o presente trabalho propôs
analisar o pensamento de dois intelectuais – contemporâneos entre si. Trata-se de José
Ortega y Gasset e Antonio Gramsci. Tomando como base estas duas figuras, o objeti-
vo principal deste trabalho foi explorar como Ortega e Gramsci, inseridos na chamada
sociologia da crise, compreenderam o fenômeno da ascensão das massas, na Europa,
na primeira metade do século XX. A partir de uma abordagem metodológica centrada
no contextualismo linguístico de Quentin Skinner, foi observado que enquanto Ortega,
imbuído de uma perspectiva conservadora, temia a ascensão das massas nos espaços
públicos e a perda de valores tradicionais – o que poderia também estar relacionado à
emergência de regimes totalitários –, Gramsci via na ascensão das massas uma espécie
de renovação no curso da história – principalmente levando-se em conta a politização
da classe trabalhadora através dos partidos políticos.

Palavras- chave: José Or tega y Gasset, Antonio Gramsci, Massas, Sociologia da


Crise, Século XX.

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INTRODUÇÃO

O advento do século XX trouxe, ao continente europeu, um cenário de incertezas,


angústias e modificações acentuadas. Podemos elencar alguns fatores históricos que com-
provam isto. 1) A Rússia, em virtude da revolução iniciada em 1917, presenciou a queda
do regime monárquico czarista; 2) A unificação da Alemanha e Itália, ainda no século XIX,
possibilitou que ambos os países solidificassem e expandissem suas bases territoriais;
3) Em virtude, principalmente, por disputas e hegemonias territoriais, foi deflagrada a Primeiro
Guerra Mundial em 1914; e 4) O desfecho deste conflito, em 1918, acarretou na ascensão,
anos mais tarde, de regimes nazifascistas (MIRANDA, 2011).
Diante deste contexto, dois autores, contemporâneos entre si, se despontavam no
velho continente. Estamos falando de José Ortega y Gasset (1883-1955) e Antonio Gramsci
(1891-1937). Podemos dizer que ambos estão inseridos nas chamadas discussões socioló-
gicas que tratam de reflexões sobre as crises genéricas vivenciadas na sociedade. Isto faz
sentido porque a própria Sociologia seria uma espécie de “ciência da crise”, já que procura
compreender, desde sua fundação, os aspectos anômicos decorrentes da dissolução dos
sistemas sociais tradicionais e, consequentemente, sua relação com o desenvolvimento dos
sistemas modernos (HERCULANO, 1996). Trocando em miúdos, ao falarmos de “crise”, do
ponto de visto do universo sociológico, estamos nos referindo às tensões propiciadas pela
dinamicidade da sociedade, isto é, entre o “choque” do tradicional e moderno. Segundo
Ianni (1989), uma gama de elementos discutidos na Sociologia exemplifica isto: A saber: 1)
Sociedade civil e Estado-Nação; 2) Multidão, massa e povo; 3) Classe social e revolução; 4)
Ordem e Progresso; 5) Normal e Patológico; 6) Racional e Irracional; 7) Anomia e Alienação;
8) Sagrado e Profano; e 9) Comunidade e Sociedade.
Sendo uma “ciência da crise”, a Sociologia oferece uma série de modelos destinados
a analisar o cenário de tensão social. Podemos dizer que Ortega e Gramsci estão circuns-
critos em modelos que buscam compreender: 1) Os sujeitos das transformações sociais – a
partição política em conjunto com a formação de grupos capazes de modificar o cenário de
crise; e 2) Os não sujeitos – as massas inertes, vulneráveis e/ou indiferentes ao contexto de
crise (HERCULANO, 1996). O primeiro modelo aborda a ideia de classe social. Esta é vista
como uma categoria que expressa as diversidades e desigualdades – que se encontram
no núcleo das manifestações em larga escala. Os movimentos sociais, protestos, greves e
revoluções exprimem as desigualdades contra as quais lutam os trabalhadores – do campo
e da cidade. Já a segunda aborda uma perspectiva mais inativa das “massas” Esta é vista
como uma espécie de coletividade que depende de instituições, regras e normas. Isto seria
possível através das “elites”. Estas que teriam o poder de governar, ditar normas e regras
e organizar as massas (IANNI, 1989).
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Pensando neste panorama, o objeto deste trabalho é esmiuçar como Ortega e Gramsci
trabalharam estes dois modelos em seus pensamentos sociológicos. Nossa hipótese é
que Gramsci esteve mais próximo do primeiro, enquanto Ortega manteve afinidades com
o segundo. Ademais, justifica-se a elaboração deste trabalho pela necessidade de, trazer
mais à tona no universo acadêmico, discussões que procuram dar destaque às reflexões
sociológicas empreendidas por Gramsci e Ortega.

MÉTODO

Para a análise dos trabalhos de Ortega y Gasset e Antonio Gramsci, optou-se por uma
abordagem da história das ideias dos intelectuais, voltada ao chamado contextualismo lin-
guístico de Quentin Skinner. Trata-se de um foco metodológico que procura abrir um leque
alternativo entre a abordagem textualista – que privilegiaria somente o texto em si – e a
contextualista – que focaria apenas no cotexto social (SILVA, 2010).
Através do contextualismo linguístico, empreendido por Skinner, o pesquisador conse-
gue situar uma obra do contexto das chamadas convenções linguísticas e sociais em que se
situam as problemáticas das quais os textos estão se referindo. Trocando em miúdos, esta
abordagem procura traçar uma relação entre autor, texto e contexto: os autores dos textos
estão envolvidos com o próprio ato de comunicação quando desenvolvem uma determina-
da obra. Eles buscam, como forma de serem compreendidos pelos leitores, mobilizar os
padrões, ditos convencionais, de comunicação referente aos temas para os quais desejam
explorar com maior ênfase (SILVA, 2010).
Foram utilizadas, como referências, fontes primárias e secundárias – de Ortega y
Gramsci – que englobam a temática aqui proposta.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nascido em Madri, José Ortega y Gasset conviveu desde sua infância com a escrita.
Seu pai jornalista e diretor do jornal El Imparcial – e a família de sua mãe – proprietária
do El Imparcial – contribuíram para despertar o interesse do autor no universo erudito. Ortega
cursou o bacharelado em um colégio jesuítico de Málaga e, posteriormente, continuou seu
estudo na capital espanhola. Em 1904, após receber o titulo de doutor em Filosofia pela
Universidade Central de Madri, realizou uma série de estudos na Alemanha – passando
por Marburgo e Berlim, onde entrou em contato com as ideias sociológicas de Weber e
Simmel. A partir de 1910 – assumiu a cadeira de Metafísica da Universidade de Madri.
Além da vida acadêmica, atuou na colaboração e criação de jornais (fundou em 1920, por

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exemplo, a Revista de Occidente), e na política – foi eleito deputado durante a II República
da Espanha (MIRANDA, 2011; 2013).
Cabe destacar que a geração que o antecedeu foi marcada pela amarga lembrança da
guerra Hispano-Americana e a consequente derrota espanhola pelos Estados Unidos – em
1898. No século XX, a Espanha assistiu a uma crise política sem precedentes. A partir da
década de 30 do século XX – após o período da ditadura de Primo de Rivera – Ortega pre-
senciou a queda da efêmera segunda experiência republicana espanhola, o surgimento de
uma guerra civil – onde, neste período, esteve exilado – e a instauração do regime ditatorial
de Francisco Franco (MIRANDA, 2011).
Em linhas gerais, podemos dizer que Ortega procurou traçar uma compreensão diante
das turbulências vivenciadas em sua volta – através de uma análise concreta do mundo. “A
primeira condição para um melhoramento da situação presente é perceber bem sua enorme
dificuldade” (ORTEGA Y GASSET, 1967, p.46). Enquanto filósofo de formação, ele desco-
nhecia “[...] o falso pudor que impede o filósofo de tocar nos assuntos mais recorrentes da
existência [...]” (PRATA).1
Entender o pensamento de Ortega é, por exemplo, compreender a dinâmica do indivíduo
em torno de sua construção ao longo da história, refletir acerca do tradicional, da importância
de se retornar ao passado para compreender o presente e destacar, no processo histórico,
a participação das chamadas minorias como agentes de transformação e organização da
sociedade como um todo (MIRANDA, 2011).
Quando falamos em tradição, na visão de Ortega y Gasset, devemos sempre levar
em consideração a conexão com o presente. “[...] quem vive com plenitude e a gosto as
formas do presente, tem consciência da relação entre a altura do nosso tempo e a altura das
diversas idades pretéritas” (ORTEGA Y GASSET, 1962, p. 81). O autor refletiu acerca do
passado ao citar a decadência do verdadeiro sentido atribuído às posturas morais e sociais
da modernidade. O pensamento do filósofo espanhol procurou resgatar o que foi perdido
pelo tempo, isto é, o sistema de crenças herdado ao longo da história (CARVALHO, 2012;
MIRANDA, 2011). Segundo ele:

Quando nos começos do Império algum fino provinciano chegava a Roma –


Lucano, por exemplo, ou Sêneca – e via as majestosas construções imperiais,
símbolo de poder definitivo, sentia contrair-se seu coração. Já nada novo podia
haver no mundo. Roma era eterna. E há uma melancolia das ruínas, que se
levanta delas com a evaporação das águas mortas, o provinciano sensível
percebia uma melancolia não menos penosa, ainda que signo inverso: a me-
lancolia dos edifícios eternos (ORTEGA Y GASSET, 1962, p. 87).

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1 Segundo Ortega y Gasset (1961), a filosofia envolveria a capacidade de pensar as verdades.

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Esta visão, quase que saudosista ao passado longínquo, perderia espaço justamente
diante das convicções do homem – única e exclusivamente – ao presente. A confiança cega
na razão – e no progresso – corresponderia, para Ortega y Gasset, em um dos fatores mais
marcantes da modernidade:

O desejo tão latente gestado e, que no século XIX, é o que resumindo, se


denominou a si mesmo “cultura moderna”. Já o nome é inquientante: que um
tempo se chame a si mesmo de “moderno”, quer dizer, definitivo, diante do
qual todos os demais são puros pretéritos, modestas preparações e aspirações
para ele! (ORTEGA Y GASSET, 1962. p. 85-86, grifos do autor).

De acordo com Nisbert (1996), intelectuais – como Ortega y Gasset – partilhavam um


pensamento de que era necessário estabelecer diferenças entre Estado e sociedade, pois
a constante intervenção estatal – na chamada “cultura moderna” apontada, por exemplo,
por Ortega – ameaçava a liberdade do indivíduo e dos grupos sociais. Esta diferença entre
Estado e sociedade seria equivalente à importância, estabelecida pelo autor hispânico, em
traçar uma distinção entre Estado e nação, ou seja, a máquina estatal não poderia se so-
brepor ao conjunto de crenças – construído historicamente pelas nações (MIRANDA, 2011).
Atrelada à ideia de tradição, Ortega argumentava que a sociedade seria composta,
historicamente pela presença de minorias e massas. “A divisão da sociedade em massas
ou minorias excelentes não é, portanto, uma divisão em classes sociais, mas em classes
de homens [...]” (ORTEGA Y GASSET, 1962, p. 64). A chamada divisão, da sociedade, em
classes de “homens” é que diferiria minorias e massas – bem como suas funções:

Ora bem: existem na sociedade operações, atividades, funções da ordem mais


diversa, que são, por sua mesma natureza, especiais, e consequentemente,
não podem ser bem executadas sem dotes também especiais. Por exemplo:
certos prazeres de caráter artístico e luxuoso, ou bem as funções de governo
e juízo político sobre assuntos públicos (ORTEGA Y GASSET, 1962, p. 64).

Desta maneira, as minorias seriam dotadas de qualidades propícias para a dinâmica


da sociedade. Seriam, basicamente falando, indivíduos qualificados para executarem tarefas
específicas – ao contrário das massas (MIRANDA, 2011). Para exemplificar um fato viven-
ciado na Europa, o autor chegou a observar que a história da França e da Inglaterra refletiria
em uma ação contínua de minorias à frente – verdadeiras personalidades, por assim dizer,
que passaram por aqueles países (ORTEGA Y GASSET, 1959).
O processo de solidificação dos grupos seletos, como minorias, se renovaria – ao longo
do tempo (MIRANDA, 2011). Independentemente do regime político adotado, historicamente,
pelos países ao redor do mundo, sempre esteve presente, no seio da sociedade, a divisão
entre minorias e massas:
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La forma jurídica que adopte una sociedad nacional podrá ser todo lo demo-
crática y aun comunista que quepa imaginar; no obstante, su constitución viva,
transjurídica, consistirá siempre en la acción dinámica de una minoría sobre
una masa. Se trata de una ineludible ley natural que representa en la biología
de las sociedades un papel semejante al de la ley de las densidades en física
(ORTEGA Y GASSET, 1959, p. 30).

As massas, ao contrário das minorias, adquiria uma feição quantitativa – relacionada


propriamente a uma multidão. “A massa é o conjunto de pessoas especialmente não qualida-
des” (ORETGA Y GASSET, 1962, p. 61). O “homem médio” e o “homem massa” – também
seriam termos usados pelo autor para se referir às massas. O fato é que estas não poderiam
se organizar sem a presença das minorias ditas qualificadas. Daí que o autor atribuía às
massas, historicamente falando, um certo grau de conformismo em aceitar sua real posição
na sociedade (ORTEGA Y GASSET, 1962).
Para Ortega, um dos principais problemas observados – na metade do século XX –
estava relacionado ao advento dos regimes totalitários – verificados na Europa – e suas
conexões com as massas (MIRANDA, 2011). A chamada ascensão, das massas nos espaços
públicos indicaria uma espécie de “rebelião” ou “império” das massas (ORTEGA Y GASSET,
1962). Daí a relação com o advento do totalitarismo:

Qualquer pessoa pode perceber que na Europa, há alguns anos, começaram a


acontecer ‘coisas esquisitas’. Para dar algum exemplo concreto destas coisas
esquisitas mencionarei certos movimentos políticos [...] como o fascismo [...]
Eis aqui o novo: o direito a não ter razão, a razão sem razão. Eu vejo isso a
manifestação mais papável do novo modo de ser das massas, por haverem
resolvido dirigir a sociedade sem ter capacidade para isso (ORTEGA Y GAS-
SET, 1962, p. 136, grifo do autor).

O totalitarismo emergiria como um sistema totalmente novo, projetando uma ruptura


total com o passado e suas relações – ou seja, com os sistemas de crenças. “La rebelión
de las masas sería por tanto el hecho posibilitador del fascismo” [...] (SÁNCHEZ CUERVO,
2017, p. 70). Daí que, a partir do século XX, as massas, ao assumirem o domínio do espaço
público, passaram a desprezar qualquer tipo de moral – este era o cenário europeu daquele
contexto (ORTEGA Y GASSET, 1962). Talvez fosse este o receio de Ortega perante as
grandes rupturas – proporcionadas por movimentos de cunho político. “O fascismo [...] reve-
lou-se como mais violento que todo o obreirismo junto” (ORTEGA Y GASSET, 1962, p. 280).
A ideologia totalitária pretendia – de certa forma – desapegar-se do curso da história
sugerido por Ortega, ou seja, da divisão entre minorias e massas que “harmonizaria” a so-
ciedade. “En efecto: la ausencia de los «mejores» ha creado en la masa, en el «pueblo», una
secular ceguera para distinguir el hombre mejor del hombre peor [...]” (ORTEGA Y GASSET,
1959, p. 46, grifos do autor”. Este processo pretendia, justamente, reduzir a historicidade
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dos indivíduos – ou mais precisamente falando, a “qualidade” das minorias seletas frente
ao “quantitativismo” do homem médio (MIRANDA, 2011).
Neste sentido, a preocupação de Ortega y Gasset girava em torno das ações – despro-
vidas de racionalidade – do homem médio perante o espaço público – mais precisamente
no ambiente político:

Não há hoje nenhum político que sinta a inevitabilidade de sua política, e quanto
mais frívolo, menos exigido pelo destino. Não há mais vida com raízes próprias,
não há mais vida autóctone que a que se compõem de cenas iniludíveis [...] E
nem os homens sabem bem a que instituições de verdade servir [...] (ORTEGA
Y GASSET, 1962, p. 276).

Parecia – aos olhos de Ortega – que o homem médio estava isento de barreiras e
normais sociais:

El hombre-masa orteguiano no distingue la cultura de la naturaleza, actúa


como si su entorno fuera puramente natural y por eso se alimenta de prejui-
cios, estereotipos y verdades comunes, o emplea los medios técnicos a su
alcance de una manera irreflexiva, olvidando la íntima conexión de la técnica
con la ciencia. Es por todo ello un hombre proclive, aun de manera latente, a
la violencia como “prima ratio” y a la “acción directa” como estrategia social y
política, frente a la “acción indirecta” y civilizadora del liberalismo (SÁNCHEZ
CUERVO, 2017, p. 69, grifos do autor).

Daí que o horizonte promissor da “nova era”, o guiava cegamente – expandindo, assim,
seu sentimento de segurança para a tomada de decisões. “O processo que soma direitos
e subtrai deveres culminou no século XX no tempo das massas” (CARVALHO, 2010, p.
16). A ausência das minorias seletas – primordiais para o desenvolvimento, aos olhos de
Ortega, da democracia liberal europeia desenvolvida antes do século XIX – levaria exata-
mente ao estado de rebelião das massas no espaço público, culminando com a ascensão
do totalitarismo (MIRANDA, 2011). Se primeiro Ortega temia a ascensão das massas aos
movimentos ligados ao proletariado (ORTEGA Y GASSET, 1959), posteriormente, tomando
como base sua Espanha – e, consequentemente a ascensão do franquismo, este pensa-
mento passou a ser direcionado quase que exclusivamente aos regimes totalitários. “Pues
bien: en España vivimos hoy entregados al imperio de las masas. Los miopes no lo creen
así porque, en efecto, no ven motines en las calles ni asaltos a los bancos y ministérios”
(ORTEGA Y GASSET, 1959, p. 31).
Antonio Gramsci, ao contrário de José Ortega y Gasset, nasceu em uma família relati-
vamente simples no norte da Itália (em Sardenha).2 Segundo Coutinho (1992), apesar de ter

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2 Vale lembrar que Gramsci, aos quatro anos de idade, sofreu uma queda. Este acidente o fez ficar corcunda (COUTINHO, 1992).

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concluído, com êxito, os exames de admissão no ginásio em 1903, Gramsci, em virtude das
dificuldades econômicas da família, não pode prosseguir aos estudos – sendo obrigado a
trabalhar durante dois anos. Entre 1904-1908 – com a ajuda da mãe e das irmãs – retornou
aos estudos e concluiu o ginásio.
A dedicação aos estudos, na juventude, propiciou que Gramsci conseguisse uma bol-
sa para cursar faculdade na Universidade de Turim. Diferentemente da situação agrária de
sua terra natal, ele encontrou em Turim uma nascente onda de industrialização, culminando
com a chegada de inúmeros trabalhadores italianos da área rural. Diante deste contexto, as
organizações trabalhistas começaram a surgir, ganhando força e notoriedade pelas suas
atuações em busca de direitos. Este chamado “novo mundo”, o atraiu fortemente. A partir
deste cenário, o jovem sardo, estudante de linguística, começou a se engajar pelas causas
trabalhistas – tal postura seria mantida até a sua morte (COUTINHO, 1992).
Gramsci conquistou, no cenário intelectual, um papel de destaque na história, pelos
seus trabalhos e atuações ao longo de sua curta vida – tendo como uma de suas referências
sociológicas, Karl Marx. Além dos escritos jornalísticos e teóricos, ele também teve uma
densa passagem pelo universo político. Em 1923 filiou-se ao Partido Socialista da Itália,
PSI. Em 1924, participou da fundação do Partido Comunista da Itália, PCI – tornando-se
deputado por este mesmo partido. Em 1926, foi preso pelo governo fascista de Mussolini
– permanecendo encarcerado até seu falecimento. Em linhas gerais, podemos dizer que
Gramsci manteve-se atento à situação política de seu país – bem como do contexto europeu
– buscando uma transformação da ordem vigente:

A reflexão sobre a política ocupa um lugar central na obra de Gramsci. Isso


não causa estranheza. Militante político e participante ativo dos grandes acon-
tecimentos da história italiana no final dos anos 1910 e da década seguinte,
o marxista sardo desenvolveu na prisão temas que foram em grande parte
motivados por essa experiência (BIANCHI, 2007, p. 28).

Se Ortega estava preocupado com uma “nova história” construída na virada do século
XIX, para o XX, somada à ausência de tradição e sentidos do passado, “[...] Gramsci percebia
na formação maciça das modernas democracias e nas irrefreáveis associações da vida civil,
um claro convite a socializar a política e a democratizar o poder [...]” (SEMERARO, 1999,
p. 68). Neste sentido, seu interesse seria o de formar atores políticos engajados no novo
cenário, propiciando uma ruptura com os velhos modelos de ordens vigorados até então.
Seria nesta maneira de avaliar a realidade circunstante, que o autor intelectual discutiu a
questão dos intelectuais:

A perspectiva, de análise da situação histórica da Itália e o compromisso de


militante comunista levaram Gramsci a indicar a necessidade de forjar outro
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tipo intelectual orgânico, este vinculado às classes subalternas, os operários
do Norte e os camponeses do Sul (MARTINS, 2011, p. 138).

A análise desenvolvida por Ortega y Gasset em torno da separação da sociedade em


minorias e massas (pautada na divisão entre classes de homens), não foi evidentemente
seguida por Gramsci. No entanto, o autor italiano não escondeu o fato de situar historica-
mente a presença dos intelectuais ao longo do processo histórico. Porém, sua análise estava
relacionada às classes sociais:

Em seus escritos, além de uma ampla gama de tipos de intelectuais (urbanos,


industriais, rurais, burocráticos, acadêmicos, técnicos, profissionais, peque-
nos, intermediários, grandes, coletivos, democráticos etc.), encontra-se uma
interpretação original das suas funções. Gramsci, de fato, rompe com o lugar
comum que entendia os intelectuais como um grupo em si, solto no ar, “autô-
nomo e independente” (SEMERARO, 2006, p. 376, grifo do autor).

Daí a necessidade de interpretar o papel dos intelectuais – no sentido orgânico, e


não abstrato, do termo.3 Não se tratava, portanto, de uma divisão, seleta, entre classes de
homens – tal como imaginaria o autor hispânico. “Com essa visão, as reflexões de Gramsci
passam longe da concepção de uma ‘intelligentsia’ livremente ‘flutuante’ e acima das partes,
dotada de uma missão especial e de capacidades ‘objetivas’” (SEMERARO, 2006, p. 380,
grifos do autor). Neste sentido, o contexto italiano – bem como suas diferenças regionais –
analisado por Gramsci, exemplificaria exatamente seu diagnóstico. No norte italiano, com o
iminente desenvolvimento do capitalismo, estava se consolidando – no meio das industriais
– o intelectual do tipo burguês – o chamado “organizador técnico”. Este intelectual carregaria
traços relacionados à disciplina intelectual e ordem. Já no sul italiano, predominaria o tipo
tradicional – que emergira do pequeno e médio proprietário de terras. Este exerceria um
papel intermediário entre o camponês e o setor aparato governamental (GRAMSCI, 1977b).
Observando este cenário, Gamsci via a necessidade de se projetar a figura de um in-
telectual que unisse os camponeses sulistas e os proletariados nortistas. Seria uma espécie
de modelo de intelectual engajado nas causas das classes subalternas:

Ora, a nós interessa os intelectuais como massa e não apenas como indivídu-
os. É decerto importante e útil para o proletariado que um ou mais intelectuais
individualmente, adiram ao seu programa e a sua doutrina, se confundam no
proletariado, dele se tornem e se situam parte integrante (GRAMSCI, 1977a,
p. 195).

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3 Intelectuais que fazem parte, por assim dizer, do “organismo vivo” (SEMERARO, 2006).

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Para que este intelectual fosse de fato construído, seria preciso englobá-lo no próprio
contexto das causas defendidas pelas classes subalternas:

Mas é também importante e útil que as massas dos intelectuais se determine


uma fratura de caráter orgânico, historicamente caracterizada: que se forme,
como formação de massa, uma tendência de esquerda, no moderno significado
da palavra, isto é, orientada para o proletariado revolucionário (GRAMSCI,
1977a, p. 196-197).

Neste sentido, os proletariados (por já estarem inseridos no contexto de uma luta


trabalhista no norte), seria, para Gramsci, o melhor exemplo da organização de uma nova
classe de intelectuais – ligados à causa operária por meio do partido político. “Era por meio
do partido político que poderia ter lugar para Gramsci, a criação de uma nova classe política
que expressasse uma nova forma de civilização” (ALIAGA; BIANCHI, 2012, p.336).
No partido político (neste caso, o Partido Comunista da Itália), o intelectual ligado às
classes subalternas teria plenas condições de se desenvolver, por estar inserido na pró-
pria dinâmica da classe social desfavorecida. Porém, ao contrário de Ortega y Gasset que
considerava a existência das minorias seletas e das massas um fato sempre existente na
humanidade, Gramsci procurou trazer esta relação para uma questão de cunho dialético,
procurando demonstrar o embate por traz dos intelectuais enquanto classes sociais. Daí a
possível modificação, através da própria construção dos intelectuais nas classes subalter-
nas. De forma gradual, a tradicional distinção entre governantes e governados, marcada
por uma minoria dirigente à frente, seria substituída, através da organização partidária – do
Partido Comunista Italiano. Mediante o partido bem organizado, os dirigentes seriam “[...]
capazes de respeitar a sua disciplina [...]” (GRAMSCI, 1977b, p. 26).
A distinção sempre presente na humanidade entre as massas e as minorias (enquanto
uma classe de homens), garantiu, ao longo do tempo, uma espécie de equilíbrio na sociedade
– segundo as estimativas de Ortega y Gasset. Com o advento do século XX, esta distinção
pareciam ter se perdido, contribuindo assim para o advento das massas, e consequente-
mente, ao desequilíbrio social. Esta era a preocupação de Ortega (e outros autores ligados
à teoria das elites). A sempre presença entre minorias qualificadas seria imprescindível para
governar as massas. Estas eram vistas quase como um conjunto de indivíduos dependentes
de um grupo de dirigentes capacitados para guia-los em assuntos públicos. Porém, através
do advento do século XX, o aumento das massas nos assuntos de diferentes questões de
ordens públicas, possibilitou justamente o advento de uma desorganização sem igual na
sociedade. “No tempo de Gramsci, não faltava quem, como Ortega y Gasset, vendo na ‘re-
belião das massas’, uma ameaça à ordem social e às tradições ocidentais [...]” (SEMERARO,
1999, p. 67, grifo do autor).
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Grasmsci, por outro lado, não enxergava as massas como um conjunto desqualificado
e desorganizado. As próprias transformações políticas verificadas entre a virada do século
XIX para o XX, já indicavam este caminho. As massas (como classes historicamente subal-
ternas) conseguiriam, através de uma organização política, se emancipar. O interesse de
Gramsci seria relacionar o próprio movimento do Partido Comunista da Itália com as massas:

Um grande trabalho deve ser executado pelo Partido no campo sindical. Sem
grandes organizações sindicais não se sai da democracia parlamentar. Os
reformistas podem querer pequenos sindicatos, só podem tentar formar cor-
porações de operários qualificados. Nós, comunistas, queremos o contrário
dos reformistas e devemos lutar para reorganizar as grandes massas. Decerto
que é preciso pôr o problema concretamente e não só como forma. As massas
abandonaram o sindicato porque a Confederação Geral do Trabalho, embora
tenha uma grande eficiência política (é, nada menos, do que Partido o partido
unitário), não se interessa pelos interesses vitais das massas (GRAMSCI,
1977b, p. 135).

A questão seria incorporar as massas nas organizações partidárias. Só assim seria


possível a transformação almejada. Neste sentido, o proletariado (em relação aos campo-
neses), estaria mais avançado politicamente naquele contexto – em virtude de suas lutas
nas cidades. De qualquer forma, também era tarefa do partido, organizar o campesinato,
para, desta forma, situá-lo – historicamente falando – a respeito da real situação vigente:

Diferentemente da maioria de seus contemporâneos, o pensador italiano estava


convencido de que somente por meio do desenvolvimento de uma consciência
histórica da realidade e de uma ação política voltada a elevar a condição “inte-
lectual e “moral” das massas, se poderia chegar a uma sociedade realmente
“civil”, capaz de humanizar-se plenamente e de autogoverna-se (SEMERARO,
1999, p. 67, grifos do autor).

Não passava pelas concepções do autor desqualificar o movimento das massas na-
quele momento. Para Gramsci não era uma questão de pânico, mas do começo de uma
real transformação de uma classe historicamente dominada. Mas é bom lembrar que ape-
nas organizadas politicamente, estas massas conseguiriam uma façanha positiva. Daí a
importância, sempre presente em Gramsci, de relacionar a organização das massas como
uma espécie de “corpo político”. Ele deixou claro alguns fatores importantes da ocupação
das fábricas das massas trabalhadoras, na Itália, no ano de 1920 – tais como a capacidade
delas se autogovernarem:

Na atividade normal de massa, a classe trabalhadora operária aparece ge-


ralmente como elemento passivo de manobra. Nas agitações, nas greves,
etc, pede-se à massa as seguintes qualidades; solidariedade, disciplina da
organização, confiança nos dirigentes, espírito de resistência e de sacrifício
(GRAMSCI, 1977b, p. 15).
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Mesmo para Gramsci, as massas, sem uma orientação de porte político organizativo,
assumiriam um caráter desprovido de engajamento. Na vida propriamente política, isto se
modificaria por completo. “Politicamente, as grandes massas não existem senão enquadra-
das nos partidos políticos” (GRAMSCI, 1977b, p. 11). A questão seria exatamente atrair as
massas trabalhadoras para o Partido Comunista da Itália – promovendo, assim, sua capaci-
dade de ação no meio social – fato que não havia acontecido em relação ao papel exercido
pelo Partido Socialista da Itália:

Passaram seis anos desde setembro de 1920. Neste período, muitas coisas
mudaram no interior das massas operárias que em setembro de 1920 ocu-
param as fábricas das indústrias metalurgias [...] A ocupação das fábricas
não foi, todavia esquecida pelas massas e não só pelas massas operárias,
mas também pelas massas camponesas. Aquela foi a prova geral da classe
revolucionária italiana, a qual, como classe, demonstrou estar madura, ser
capaz de iniciativa, possuir uma inestimável riqueza de energias criativas e
organizativas; se o movimento faliu, a responsabilidade não pode ser atribuída
à classe operária, como tal, mas ao Partido Socialista que não cumpriu os seus
deveres, que era incapaz e inapto, que estava na cauda da classe operária e
não à cabeça (GRAMSCI, 1977b, p. 149-150).

As massas instruídas politicamente – neste caso pelo Partido Comunista Italiano –


seria a válvula de escape contra o fascismo, pois este regime totalitário, conforme sugeria
(GRAMSCI, 1977b), constituiria um movimento de reação armada que, dentre outras coisas,
propunha justamente desagregar e desestabilizar a classe trabalhadora.

CONCLUSÃO

Neste trabalho procuramos estabelecer um esforço em trazer à tona alguns conceitos


presentes em dois intelectuais contemporâneas, porém divergentes intelectualmente e poli-
ticamente. Espanha e Itália se encontraram neste trabalho, através de duas figuras: Ortega
y Gasset e Antonio Gramsci. Trajetórias de vidas diferentes, perspectivas diferentes e an-
seios diferentes. Apesar disto, alguns temas foram tratados por ambos não com a mesma
postura de ideias ou crenças, mas com o mesmo interesse, isto é, entender e procurar um
caminho para a situação do país de cada um, e até mesmo da Europa. Nisto, os autores
podem se convergir. Assumiram uma tarefa de engajamento em meio a um diálogo com
uma perspectiva sociológica da crise:

Em vários países, em diferentes épocas, desde o século XVI ao XX, a multidão


se manifesta, protesta ou revolta, ao mesmo tempo que atemoriza ou entu-
siasma. Na Revolução Francesa iniciada em 1789, nas revoluções europeias
de 1848-49, na Comuna de Paris, em 1871,em várias situações, a multidão
se transforma em um tema frequente, reiterado, obsessivo do pensamento
sociológico (IANNI, 1989, p. 17).
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O conservadorismo de Ortega temia justamente a ruptura de uma tradição histórica
amparada pela divisão das massas e minorias, enquanto uma divisão de classes de homens
na sociedade. Ortega não interessava perceber nas massas um poderio de força capaz de
se autopromover na nova configuração da sociedade. O que seria necessário estabelecer
era frear essa massa através do resgate das minorias seletas, dos indivíduos capacitados,
enfim dos intelectuais como guias das multidões. O autor espanhol não discutia a divisão
entre massas e minorias do ponto de vista de classe social. Muito polo contrário, o que
estava em questão era uma divisão quase que natural presente em todos os tempos da
humanidade. O equilíbrio social necessitaria desta capacidade de percepção da ordem das
coisas. Era preciso perceber essa separação. Sem isso, o caos seria inevitável.
Em Gramsci, a entrada em cena das grandes massas, seria um fato de extrema im-
portância, justamente por o autor espanhol tratar as minorias e as massas, como algo re-
lacionado às classes sociais. Neste sentido, o que haveria ao longo da historia, seria uma
sobreposição de uma classe sobre outra. Com o advento da onda de movimento de grandes
proporções, a ordem das coisas estaria mudando, e com isso as classes subalternas pode-
riam conquistas um lugar antes inalcançável. O movimento dos intelectuais, assim como a
atuação das massas trabalhistas, conseguiria se estabelecer solidamente através de uma
organização do tipo político. Daí a importância da ação política, em Gramsci, e sua relação
com o Partido Comunista da Itália.
Enquanto Ortega buscava situar novamente os intelectuais tradicionais na socieda-
de, através da realocação das minorias (enquanto classes de homens), a fim de promover
uma valorização do passado para organizar as conturbações do presente, Gramsci frisava
a importância de se formar e organizar uma nova intelectualidade voltada para as classes
subalternas – ou seja, para massas até então oprimidas. Na organização partidária nasceria
esta nova dinâmica, proporcionando a politização das massas.

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SOBRE O ORGANIZADOR
Flávio Aparecido de Almeida
Possui graduação em Psicologia pelo Centro Universitário Faminas(2015), graduação
em Pedagogia pela Faculdade do Noroeste de Minas(2010), graduação em Filosofia
pela Faculdade Entre Rios do Piauí(2015), graduação em História pela Universidade do
Estado de Minas Gerais(2008), especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional
pela Universidade Candido Mendes(2013), especialização em Gestão de Processos
Educativos: Supervisão e Inspeção Escolar pela Universidade do Estado de Minas
Gerais(2009), especialização em Psicologia Comportamental e Cognitiva pela FAVENI-
FACULDADE VENDA NOVA DO IMIGRANTE(2020), especialização em Ensino Religioso
pela Faculdade do Noroeste de Minas(2010), especialização em História do Brasil pela
Universidade Candido Mendes(2012), especialização em Psicologia Existencial Humanista
e Fenomemológica pela FAVENI-FACULDADE VENDA NOVA DO IMIGRANTE(2020),
especialização em Gestão Escolar (Administração, Supervisão, Orientação e Inspeção) pela
FAVENI-FACULDADE VENDA NOVA DO IMIGRANTE(2020), especialização em Psicologia
Escolar e Educacional pela FAVENI-FACULDADE VENDA NOVA DO IMIGRANTE(2020),
especialização em Neuropsicopedagogia pela Universidade Candido Mendes(2015),
especialização em Educação Inclusiva, Especial e Políticas de Inclusão pela Universidade
Candido Mendes(2012), especialização em Psicologia Social pela Faculdade Mantenense
dos Vales Gerais(2017), especialização em Gestão em Saúde Mental pela Universidade
Candido Mendes(2012), especialização em Docência do Ensino Superior pela Universidade
Candido Mendes(2016), especialização em Neuropsicologia pela Universidade Candido
Mendes(2016), especialização em Ética e Filosofia Política pela Faculdade Mantenense dos
Vales Gerais(2017) e mestrado-profissionalizante em Ciências das Religiões pela Faculdade
Unida de Vitória(2020). Atualmente é Psicólogo Clínico do Consultório de Psicologia, Psicólogo
do Abrigo Institucional de Espera Feliz, Membro de comitê assessor do Núcleo de Pesquisa
em Ensino e Tecnologia, Professor de Pós-Graduação do Instituto Superior de Educação
Verde Norte, Membro de corpo editorial da Editora Científica Digital e Inspetor Escolar da
Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Espera Feliz - MG. Tem experiência na área
de Psicologia, com ênfase em Psicologia Social. Atuando principalmente nos seguintes
temas:Ciências das Religiões; Psicologia da Religião, Subjetividade; Experiencia Religiosa,
Coping religioso; Qualidade de vida, Religião, Cultura e Diversidade, Psicologia, Religião e
Psicopatologia e Religião, Educação e Direitos Humanos.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/2192204324890376

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ÍNDICE REMISSIVO

Instituições Sociais: 10, 11, 13, 17, 26


A
Ação e Estrutura: 29, 31, 36, 38 Internet: 78, 82, 83, 94, 98, 99, 102, 103, 105

B
P
Bourdieu: 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37,
38, 39, 40, 41, 42, 68, 74
Pesquisa: 122
D
Debate: 10, 14, 15, 16, 17, 19, 22, 23, 25, 43, Praxiologia: 29, 31
44, 45, 46, 47, 65, 94, 96, 99, 100, 105, 121

Desigualdades: 30, 35, 52, 53, 66, 67, 68, 69,


S
73, 78, 86, 88, 89, 109
Saúde: 41, 47, 51, 55, 56, 57, 58, 59, 60, 61, 62,
Desinformação: 92, 93, 94, 95, 96, 100, 101,
102, 103, 104, 105 63, 64, 65, 74
Direitos: 122
Século xx: 41, 50, 98, 107, 108, 109, 111, 113,
E
114, 117, 121
Educação: 14, 15, 17, 25, 26, 27, 30, 44, 45, 46,
47, 49, 50, 53, 54, 67, 68, 69, 70, 72, 73, 74, 75,
76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 84, 121, 122 Socialização: 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17,

Ensino: 10, 11, 12, 13, 17, 20, 26, 43, 44, 45, 46, 23, 25, 26, 32, 46, 69, 70
48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 66, 67, 74, 75, 79, 81,
82, 84, 122
Sociedade: 10, 11, 12, 13, 16, 17, 25, 26, 29,
Ensino de Sociologia: 43, 44, 45, 48, 49, 50, 51
31, 32, 34, 35, 36, 37, 40, 41, 42, 45, 48, 49, 50,
Exclusão: 58, 66, 67, 68, 70, 71, 73, 76, 86, 87,
91 51, 52, 53, 57, 58, 60, 61, 63, 68, 70, 72, 75, 78,

F 79, 80, 83, 85, 86, 87, 94, 97, 100, 104, 109, 111,

Fake News: 92, 93, 94, 95, 96, 98, 99, 100, 101, 112, 113, 116, 117, 118, 120, 121
102, 103, 104, 105, 106

G Sociologia da Crise: 108


Gênero: 15, 30, 41, 43, 44, 45, 46, 47, 48, 53,
54, 70, 72, 74, 75, 76 T
Gestão Pública: 56, 61
Teatro do Oprimido: 43, 44, 45, 46, 53
I
Informação Digital: 77, 78, 79, 81

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