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Relações entre sujeitos da administração pública

173 : Superintendência

a) Traços gerais da figura da superintendência


A superintendência refere-se a uma situação de supremacia de uma entidade, ou de um órgão, sobre outra
entidade, ou outro órgão.

Conceitos com o qual se relaciona:


§ Direção - compete ao Governo dirigir os serviços e a atividade da Administração direta
§ Tutela - compete ao Governo exercer a tutela sobre a Administração indireta e a Administração autónoma
A superintendência, enquanto poder de supremacia, apresenta-se, por um lado, menos forte ou intrusivo que o
poder de direção e, por outro, mais forte e intenso que o poder de tutela: superintender não significa tanto como
dirigir, mas também não significa tão pouco como controlar ou fiscalizar.

Superintendência: relação jurídica entre duas entidades da AP, na qual uma delas, a entidade principal, detém um
poder de orientação da outra, a entidade instrumental que, em geral, se materializa através da adoção de medidas
de definição das prioridades e objetivos a prosseguir, estratégias a adotar e das metas a atingir, bem como da
emissão de diretrizes e de instruções sobre o modo de realização dos referidos objetivos e metas por parte da
entidade instrumental.

A típica relação de superintendência processa-se, no âmbito da Administração estadual indireta, entre o Estado e os
IP’s dependentes do Governo.
Superintendência é, então, a relação que se processa entre o Governo e os órgãos dirigentes dos IP’s: o membro do
Governo da tutela pode dirigir orientações, emitir diretivas ou solicitar informações aos órgãos dirigentes dos IP’s
sobre os objetivos a atingir na gestão do instituto e sobre as prioridades a adotar na respetiva prossecução.

Os IP’s são entidades dotadas de personalidade jurídica instituídas pelo Estado para a realização, em seu próprio
nome, de finalidades estaduais, integram, então, as pessoas coletivas públicas instrumentais ou secundárias. São
organismos criados para servir o Estado, para atuarem como seus instrumentos que se colocam na dependência do
Governo, adstritos a um ministério, o ministério da tutela.

O facto de estar aqui presente um processo de desconcentração intersubjetiva é o resultado de uma opção
intencional de distanciamento do Governo em relação à gestão da tarefa desconcentrada.

O afastamento dos poderes de direção governamental representa um efeito necessário da desconcentração


intersubjetiva. Assim: superintender é menos do que dirigir.

Não está pressuposto o reconhecimento de interesses públicos fora do Estado, nem qualquer propósito de atribuir à
entidade desconcentrada o poder de autoadministrar interesses públicos não estaduais. Os IP’s não se apresentam
como protagonistas ou titulares de interesses públicos próprios, que possam ter a pretensão de definir.

Atuam para servir interesses próprios do Estado. Os IP’s clássicos (dependentes do Governo) não possuem
legitimidade democrática própria; a sua legitimidade provém do Governo, ao qual cabe designar os seus
dirigentes e perante o qual estes são responsáveis.
Existe controlo análogo quando uma entidade pode exercer uma influência decisiva sobre os objetivos estratégicos
e as decisões relevantes da entidade controlada.

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A aplicação mais importante da relação de superintendência ocorre no âmbito da Administração indireta do Estado
e, de forma exemplar, na relação entre os Estados e os IP’s, entre o Governo e os órgãos dirigentes dos IP’s. Mas a
figura não se esgota nesse âmbito.

A relação de superintendência é uma relação própria do DA: os poderes que a caracterizam são exercidos pela ‘via
administrativa’, com fundamento na lei, em regulamentos ou, porventura, em contrato administrativo celebrado
entre 2 pessoas coletivas.

b) Dimensão externa da relação de superintendência

A configuração da superintendência como relação jurídica que se processa entre 2 pessoas coletivas, como relação
jurídica externa, não determina, porém, que se trate de uma relação justiciável.
Pelo menos no caso das relações de superintendência que se processam entre o Estado e os ‘seus’ IP’s ou as ‘suas’
entidades empresariais, afigura-se-nos que não se verificam os pressupostos para a ocorrência de conflitos cuja
resolução possa ser pedida a tribunais. O caráter claramente instrumental dos institutos públicos e das empresas
públicas em relação ao Estado não se concilia com a invocação de direitos ou de interesses próprios que lhes
cumpra defender no quadro de litígios com o Estado.

O mesmo sucede no plano das relações de superintendência entre os municípios e as empresas locais sob a
respetiva influência dominante.
Na entidade superintendida não radica qualquer interesse próprio que deva ser protegido perante a entidade
principal.
A entidade superintendida é uma peça ou instrumento da entidade principal, instituída para servir esta e que por
esta é controlada.

c) Efetividade do poder de superintendência

Os poderes exercidos no âmbito da relação de superintendência vinculam os destinatários, em regra, os titulares dos
órgãos com funções de dirigir e de administrar a pessoa coletiva instrumental.
Os dirigentes dos IP’s estão enquadrados numa relação de emprego público, assente numa comissão de serviço.

Essa específica relação de emprego público (trabalho em funções públicas) tem ingredientes disciplinares; compete
ao Governo exercer a ação disciplinar sobre os membros dos órgãos dirigentes.

Não será tanto pelo lado do poder disciplinar que se garante a efetividade da superintendência do Governo. Essa
garantia assenta no estabelecimento que o Governo pode determinar a cessação do mandato (destruição) dos
dirigentes dos IP’s pela não comprovação superveniente da capacidade adequada a garantir o cumprimento das
orientações e objetivos superiormente fixados. O Governo tem o poder de determinar a dissolução do conselho
diretivo em caso de falta de prestação de informações ou prestação deficiente das mesmas, do incumprimento
dos objetivos definidos no plano das atividades aprovado ou desvio substancial entre o orçamento e a sua execução
ou, em geral, em caso de incumprimento das orientações, recomendações ou diretivas ministeriais no âmbito do
poder de superintendência.

O incumprimento ou inobservância de determinações superiores baseadas em poderes de superintendência podem


não constituir factos ilícitos disciplinares, mas, em todo o caso trata-se de factos que justificam a destituição de
membros do conselho diretivo ou a dissolução do conselho diretivo de IP’s (‘justa causa’); os referidos factos
justificam medidas repressivas, determinadas na sequência de um juízo de censura sobre o incumprimento de
deveres ( = meios de garantia da efetividade dos poderes de superintendência do Estado sobre os IP’s).

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A relação de superintendência abrange um conjunto limitado de poderes, onde não se inclui, por exemplo, a
emissão de comandos específicos no sentido da prática de um ato ou da adoção de uma medida, tal é ilegal e a
consequência da ilegalidade é a sua ineficácia jurídica: o destinatário não está obrigado a acatá-lo, e não poderá ser
sancionado pelo facto do incumprimento,

174 : Tutela administrativa

A relação jurídica estabelecida por lei entre duas entidades da AP, na qual uma delas dispõe de poderes legais de
fiscalização e de intervenção sem caráter orientador, exercidos no quadro de uma apreciação da legalidade ou do
mérito da gestão administrativa autónoma da entidade tutelada.
A tutela administrativa consiste numa relação intersubjetiva, que se processa entre duas entidades juridicamente
autónomas entre si; uma relação estabelecida por lei, a qual define os específicos poderes suscetíveis de serem
exercidos no âmbito dessa relação.
Princípio da tipicidade legal das medidas de tutela: só existem os poderes de tutela previstos na lei.

Ao conceito de tutela administrativa reconduzem-se quaisquer poderes legais de intervenção ou de ingerência sem
natureza orientadora e, por maioria da razão, sem natureza dirigista ou hierárquica.

Associa-se tutela a fiscalização ou controlo. Todavia, a tutela pode abranger poderes de ingerência e de intervenção
que não cabem no conceito de atividade de controlo ou fiscalização: a aplicação de sanções e medidas restritivas,
ou a adoção de medidas em substituição da entidade tutelada são exemplos de poderes que ultrapassam o âmbito
do controlo ou fiscalização.

Consideramos, então, poderes de tutela, quaisquer poderes de fiscalização e de intervenção não orientadora, a
exercer no âmbito de uma relação de caráter intersubjetivo entre duas entidades da AP.

A relação intersubjetiva de tutela pode conviver com outras relações jurídicas que intercorrem entre as mesmas
entidades, como por ex.: a relação de delegação ou de superintendência.

É sob o modelo da relação de tutela que se desenvolve o relacionamento geral e típico entre o Estado e as
entidades da Administração autónoma – autarquias locais e entidades da Administração corporativa.

174.1. Tutela, Administração autónoma e Administração indireta

A relação de tutela reporta-se a poderes de intervenção externa de uma entidade que atua num plano de realização
do interesse público diferente daquele em que, com autonomia, se desenvolve a ação da entidade tutelada. Supõe-
se que esta entidade dispõe de uma capacidade própria de administrar os seus interesses e de pautar a sua ação
pelos seus próprios critérios, sem a direção ou a orientação de terceiros. Isto explica uma associação íntima entre a
tutela e a AP autónoma ou, pelo menos, a capacidade de autoadministração: em qualquer caso, a ideia que se
sugere é a de que uma certa entidade (autónoma ou com capacidade de autoadministração) desenvolve as suas
atribuições e competências num quadro de autonomia, dentro dos limites da lei, mas de acordo com os seus
critérios, e sem orientação externa; mas esta entidade pode estar sujeita a ações externas de fiscalização e de
intervenção que representam limites ou restrições, mais ou menos extensas, à sua autonomia e capacidade de
autoadministração.

A tutela é então a relação que se processa entre o Estado e as entidades da Administração autónoma.

No âmbito desta aplicação, o conceito de tutela administrativa deixa de pressupor uma lógica de intervenção
externa, no sentido de extrínseca ou exterior, própria de uma entidade alheia ou estranha aos interesses
prosseguidos pela entidade tutelada. A tutela manifesta-se no âmbito de uma relação entre uma entidade principal
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e uma entidade instrumental. A utilização do conceito neste âmbito provoca a sua desnaturação, pois, agora, a
tutela já não se revela como um limite à autonomia pela simples razão de que a entidade tutelada não dispõe de
autonomia, surgindo antes como instrumento da entidade com poderes de tutela, que prossegue os fins desta, de
acordo com orientações e diretrizes que esta define. Neste cenário, a relação de tutela convive com a relação de
superintendência.

A lei pretende associar à tutela todas as formas de intervenção de uma entidade pública na gestão de outra
entidade que não se reconduzam ao conceito de superintendência (orientação). Assim, no plano da relação entre o
Estado e os IP’s, o Governo tem um poder de orientar, mas também dispõe de muitos outros poderes de
intervenção desprovidos de sentido orientador. Na medida em que não têm sentido orientador, estas formas de
intervenção são legalmente qualificadas como tutela administrativa. Há uma diferença substancial relevante entre as
medidas de tutela do Estado sobre as entidades da AP autónoma (ex.: autarquias locais) ou sobre os IP’s autónomos
(ex.: universidades) e as que o mesmo Estado adota sobre os IP’s dependentes do Governo. As primeiras constituem
medidas materialmente externas de condicionamento ou limitação da autonomia (impugnáveis judicialmente para
proteção da autonomia e dos interesses próprios das entidades tuteladas); as segundas correspondem a medidas
formalmente externas de intervenção legitima sobre uma entidade instrumental (não impugnáveis judicialmente por
falta de legitimidade processual ativa dos IP’s, por não disporem de interesses próprios perante o Estado).

174.2. Tutela de legalidade e tutela de mérito

A tutela é sempre definida e balizada por lei. Mas, em si mesma, quanto ao funcionamento das medidas pelas quais
se manifesta, a tutela pode ser de legalidade ou de mérito.

Tutela de legalidade: a que se manifesta através de medidas de controlo e intervenção que têm como finalidade ou
fundamento uma apreciação da legalidade da atuação realizada ou a realizar pela entidade tutelada.

No caso da tutela do Estado sobre as autarquias locais, a Constituição e a lei estabelecem que a tutela consiste na
verificação do cumprimento da lei.

Tutela de mérito: possibilidade de adoção de medidas que têm a finalidade de apreciar o mérito (a oportunidade
ou a conveniência) ou que se fundamentam numa apreciação sobre o mérito das condutas empreendidas ou a
empreender pela entidade tutelada.

O poder de tutela sobre as instituições de ensino superior tem em vista o cumprimento da lei e a defesa do
interesse público. Aqui, o conceito de defesa do interesse público remete para uma intervenção tutelar não situada
exclusivamente no plano da legalidade, e que pode, portanto, dar lugar à adoção de medidas com fundamento em
juízos de mérito.

Em muitos casos, a tutela de legalidade e a tutela de mérito podem materializar-se através do mesmo tipo de
medidas tutelares, por ex.: autorizações ou decisões de homologação. Suponha-se a exigência de autorização tutela
para a contração de empréstimos pela entidade tutelada: no caso de tutela de legalidade, o juízo subjacente à
decisão tutelar sobre autorizar ou não tem de se fundamentar numa apreciação da legalidade; ao passo que, sendo
admitida a tutela de mérito, a decisão de autorizar a contração do empréstimo pode basear-se no juízo que a
entidade tutelar faz sobre a oportunidade ou a conveniência do empréstimo para a finalidade pretendida.

Relações no interior dos sujeitos da administração pública

181 : Hierarquia administrativa

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No plano da organização interna da pessoa coletiva de direito público, a hierarquia administrativa baseia-se na
integração dos respetivos órgãos numa cadeia ou num escalonamento vertical, na qual um ou alguns surgem
ordenados numa posição superior e outro ou outros numa posição inferior ou subalterna. Os órgãos superiores
detêm um poder de supremacia jurídica sobre os órgãos subalternos ou subordinados.

Em razão da sua valia como instrumento ordenador da repartição de funções e de poderes dentro de organizações
humanas e complexas, o modelo hierárquico transformou-se no esquema natural para a estruturação interna das
organizações eclesiásticas ou das organizações militares, bem como numa fase posterior, da AP.

Hierarquia administrativa: sistema de relacionamento entre órgãos administrativos.

181.1. Conceito de hierarquia administrativa enquanto relação entre órgãos

A hierarquia administrativa consiste num processo de relacionamento que se desenvolve num plano interorgânico,
entre órgãos administrativos, enquanto centros institucionalizados de competências externas. A hierarquia
pressupõe, a presença de um órgão administrativo que, embora em posição subalterna em face de outro órgão, se
encontra dotado de uma competência própria para praticar atos jurídicos com relevância externa que, portanto,
produzem efeitos fora da esfera da pessoa coletiva em que se integra.
Segundo a doutrina, a hierarquia reporta-se a uma relação jurídica de caráter interno, intrasubjetivo, que opera entre
órgãos da mesma pessoa pública. Recusa-se, pois, a possibilidade jurídica de relações de hierarquia entre diferentes
pessoas, que se projetem num quadro intersubjetivo.

As relações no interior do sistema administrativo desenvolvem-se sempre entre órgãos. Isto é assim também no caso
das relações intersubjetivas (tutela, superintendência), as quais se distinguem pelo facto de se desenrolarem entre
órgãos de diferentes pessoas coletivas públicas. Entre nós, designadamente no âmbito da Administração indireta do
Estado, a Constituição convoca um modelo de relação (entre o Estado e os IP) baseado na superintendência e não
na hierarquia.

O órgão inferior ou subalterno é, necessariamente, um órgão unipessoal ou singular. Por força do seu modo de
funcionamento (colegial) e do seu processo de ação (discussão de propostas), em que cada membro tem o direito
de decidir o seu sentido de voto, o órgão colegial não pode ter condição de subalterno, e ficar exposto ao poder de
direção hierárquica e ao de um outro órgão.

Esta compreensão clássica pode, contudo, contestar-se.

A hierarquia administrativa externa, é uma relação jurídica entre órgãos administrativos.


Todavia, em algumas das suas dimensões, a essa relação interorgânica associa-se uma relação jurídica entre o órgão
superior e o titular do órgão subalterno.

A hierarquia administrativa (externa) é, então, uma relação entre dois ou mais órgãos administrativos de uma pessoa
coletiva pública posicionados em graus diferentes de uma cadeia ou de um escalonamento vertical em que os
órgãos ordenados em posição superior detêm um poder de supremacia jurídica sobre os órgãos ordenados em
posição inferior.

182 : Delegação de poderes

A delegação de poderes ou de competências administrativas é um instituto do direito da organização administrativa


que, em geral, se associa ao fenómeno da desconcentração administrativa de competências: na verdade, a
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delegação promove a distribuição ou repartição, pela via administrativa, de competências que a lei confia, em
primeira mão, a um certo órgão administrativo.

A delegação põe em marcha um processo de separação entre titularidade e exercício de um determinado poder ou
competência: o órgão delegante não perde a competência que delega, mas o delegado passa a poder exercer a
competência delegada.
No exercício de poderes delegados, o delegado exerce, em nome próprio, uma competência do delegante, uma
competência alheia. Este constitui entendimento mais ou menos generalizado sobre a natureza jurídica da
delegação de poderes, mas há construções dogmáticas com outros contornos.

Numa perspetiva pragmática, indica-se a delegação e a subdelegação de competências como instrumentos


privilegiados de gestão e incentiva-se os titulares dos cargos de direção a promover a sua adoção, enquanto meios
que propiciam a redução de circuitos de decisão e uma gestão mais célere e desburocratizada.
A delegação de poderes, por um lado, assenta num ato da Administração, decorre de uma medida administrativa,
por outro lado, o seu objeto é a transferência do exercício de competências ou poderes administrativos.

182.1. Delegação como figura de aplicação geral no sistema administrativo

Como instituto ou figura de aplicação geral do DA, definimos a delegação de poderes como um ato jurídico,
fundado em expressa permissão legal, pelo qual um órgão administrativo transfere para outro órgão ou agente da
mesma ou de outra pessoa coletiva pública ou para uma entidade particular o exercício de uma competência que
lhe pertence.

a) Ato de delegação

A delegação de poderes pressupõe a existência do poder que vai ser objeto de delegação na esfera de
competências do órgão delegante. Este não pode delegar um poder de que não dispõe.

A delegação de poderes assenta num ato jurídico, o ato de delegação. Pode tratar-se de um ato jurídico unilateral,
ou seja, um ato administrativo ou de um contrato administrativo: conforme os casos, teremos uma delegação
unilateral ou uma delegação contratual.

Ato de delegação: quando resulta de um ato unilateral, a vontade do órgão delegado não tem qualquer influência,
e, na prática, a delegação é-lhe imposta; a delegação comporta um efeito jurídico obrigatório para o delegado, o
qual fica adstrito à obrigação de exercer a competência nele delegada, no quadro dos princípios da
irrenunciabilidade e da inalienabilidade da competência.

Quando a lei estabelece que a delegação repousa num contrato, o delegado detém o poder de aceitar ou recusar a
delegação.

Na perspetiva do órgão delegante, a delegação apresenta-se como um ato facultativo ou livre, embora raros,
existem casos de delegação obrigatória.
Mesmo quando opera nas relações entre órgãos da mesma pessoa coletiva (relações jurídicas internas), o ato de
delegação produz efeitos externos, porquanto habilita o órgão ou agente delegado a atuar num plano externo no
exercício legítimo de competências que a lei não lhe confere. Apesar de, em si mesma, a relação de delegação
poder projetar-se num plano subjetivo puramente interno, o ato jurídico de delegação introduz uma alteração no
esquema legal de distribuição de competências, ao habilitar um órgão ou agente a desenvolver uma
ação com efeitos externos. Neste sentido, o ato de delegação produz um efeito de caráter normativo, comportando-
se, de certo modo, como ‘norma de competência’ em relação ao delegado. Este efeito não infirma, contudo, a
natureza concreta e individual do ato de delegação. Trata-se de um ato jurídico (ato administrativo ou contrato

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administrativo) dotado de um recorte organizativo, que interfere e altera, com fundamento na lei, no modelo legal
originário de distribuição de competências.

b) Habilitação legal (normativa)

A regra da inalienabilidade das competências incorpora também uma regra de indelegabilidade ou de proibição da
delegação.
A delegação de poderes é um ato necessariamente fundado numa lei (ato legislativo). Esta é a regra. Mas o
fundamento da delegação de poderes também pode ser um regulamento administrativo, se e quando o poder ou
competência que é objeto da delegação tiver sido atribuído ao delegante por regulamento administrativo.
A delegação de poderes tem de se encontrar habilitada por uma norma jurídica do
mesmo valor hierárquico da norma que atribui ao órgão delegante os poderes delegados. Assim, um regulamento
não pode permitir a delegação de competências atribuídas pela lei regulamentada.
Um ato de delegação sem fundamento legal deve qualificar-se como ato nulo, por corresponder a uma renúncia ao
exercício da competência.

A norma de habilitação da delegação deve indicar os poderes delegáveis. Mas essa exigência não corresponde a um
imperativo de enumeração taxativa, a norma de habilitação pode identificar como objeto de delegação um
‘conjunto’ ou ‘complexo’ genérico de poderes.

Não se exclui sequer a hipótese de não existir uma indicação precisa dos poderes delegáveis, caso em que deve
entender-se que o órgão delegante se encontra habilitado a delegar qualquer um dos seus poderes ou
competências – habilitação genérica – (ex.: “o presidente da câmara municipal pode delegar ou subdelegar
competências nos vereadores”).
A norma de habilitação não indica sempre os órgãos delegáveis, o que, quando se verifica, não significa que o
delegante possa delegar em quaisquer órgãos ou agentes.

c) Objeto da delegação

A delegação alberga conteúdos muito variados: o ponto de partida é, naturalmente, o conjunto dos poderes ou
competências do órgão delegante.

Órgão delegante: órgão normalmente competente para decidir em determinada matéria.

A delegação permite que o delegado pratique atos administrativos sobre a mesma matéria – delegação de poderes
para a prática de atos administrativos.

Quando se processa entre órgãos de diferentes pessoas coletivas, a delegação de poderes é suscetível de envolver
a vinculação do órgão delegado à prossecução de finalidades públicas – atribuições – da pessoa coletiva a que
pertence o órgão delegante. Mas isso não altera o sentido da delegação, que conserva o perfil de um ato de
transferência do exercício de competências, no qual devem ser especificados os poderes delegados

d) Sujeitos da delegação

A delegação pode processar-se no âmbito de relações:


§ Entre órgãos administrativos da mesma pessoa pública – ex.: delegação de competências da câmara
municipal no presidente da câmara ou delegação de competências do ministro no diretor geral

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§ Entre órgãos administrativos de diferentes pessoas coletivas públicas – ex.: delegação de competências
do ministro da tutela no presidente do conselho diretivo de um IP, ou a delegação de competências dos
órgãos de Estado nos órgãos dos municípios ou das entidades intermunicipais
§ Entre órgãos administrativos e titulares de órgãos administrativos que não dispõem de competências
próprias – ex.: delegação de competências de órgão colegial no respetivo presidente, delegação de
competências do presidente da câmara nos vereadores.
§ Entre órgãos administrativos e agentes de uma pessoa coletiva pública – o conceito genérico de ‘agente’
refere-se aos trabalhadores da AP, agente é aquele que, a qualquer título, exerça funções públicas ao
serviço da pessoa coletiva, em regime de subordinação jurídica; agente é um trabalhador da pessoa coletiva
pública.
§ Entre órgãos administrativos e entidades particulares – delegação privada, em que os primeiros estão na
condição de delegantes e os segundos na condição delegatária.

A lei de habilitação nem sempre indica os destinatários possíveis na delegação, ou seja, os órgãos delegáveis.
Quanto à subdelegação, o subdelegante pode subdelegar as competências que lhe tenham sido subdelegadas, mas
não há qualquer indicação sobre quais os órgãos nos quais pode o subdelegante subdelegar competências.
Na falta de indicação legal do órgão delegável, parece-nos que o órgão delegante (ou subdelegante) apenas pode
delegar (ou subdelegar) em órgãos ou agentes que, em relação a si, estejam em condições de subalternidade ou
subordinação jurídica: órgãos ou agentes inferiores hierárquicos no âmbito da relação de hierarquia.

e) Relação de delegação

A delegação institui uma relação jurídica entre delegante e delegado, que neutraliza ou suspende, no respetivo
âmbito, a eventual relação (ex.: relação hierárquica) existente antes da delegação.

f) Síntese sobre a figura geral da delegação de poderes administrativos

A operação de delegação pressupõe e inclui os seguintes momentos:


o Atribuição normativa de um poder ou competência a um órgão administrativo
o Habilitação normativa conferida a esse órgão para efetuar a delegação de poderes ou competências
específicas que lhe estejam atribuídas
o Prática do ato de delegação ou celebração do contrato de delegação
o Exercício dos poderes delegados pelo órgão delegado

g) Regime jurídico da delegação

A delegação de poderes é uma figura jurídica de origem e com fundamento legal (ou normativo): é a lei que
habilita um determinado órgão a delegar, que indica o objeto da delegação e define a natureza do ato de
delegação e, em regra, é ainda a lei que indica os órgãos delegáveis.

Mas essa base de legalidade presente na figura da delegação não equivale, só por si, à delineação de um regime
jurídico da delegação, que contenha, por ex.: uma disciplina sobre os poderes do delegante ou sobre os termos de
extinção da delegação. Este regime pode ainda estar previsto na lei de habilitação, mas também pode existir fora
dela. Pode até não existir um regime legal definido para uma determinada delegação de poderes.

No atual DA português, descortinamos dois regimes gerais de delegação de poderes administrativos:


§ Um para as delegações que envolvam municípios, quer como delegatários, quer como delegantes
§ Outro, para as delegações de poderes delegados no art44º, nº1 e 3 do CPA

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182.3. Delegação de poderes prevista e regulada no CPA

182.3.1. Delimitação

“Os órgãos administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que
para tal estejam habilitados por lei, permitir, através de um ato de delegação de poderes, que outro órgão ou
agente da mesma pessoa coletiva ou outro órgão de diferente pessoa coletiva pratique atos administrativos sobre a
mesma matéria” – art44º, nº1 CPA

r O CPA não constitui, nem pretende constituir, uma lei geral de habilitação de delegação, tal poderá ocorrer
sempre que para tal (os órgãos administrativos) estejam habilitados por lei, a delegação que o CPA
pressupõe é prevista e delineada fora dele, por uma lei de habilitação.

r O exposto no ponto anterior conhece duas exceções, em que o CPA se assume diretamente como lei de
habilitação de delegações:
≈ Atos de administração ordinária
≈ Subdelegações

r A delegação de poderes que o CPA pressupõe como base de aplicação do regime jurídico nele previsto é
apenas a delegação administrativa, a que promove uma deslocação de competências por iniciativa de um
órgão da Administração.
r Nas situações que constituem a regra, a delegação que o CPA pressupõe não é qualquer delegação de
poderes prevista em lei: o propósito consiste em estabelecer um regime jurídico da delegação para a prática
de atos administrativos.

r O sentido da regulamentação legal reside em abranger as delegações indicadas quando efetuadas por
órgãos administrativos, unilateralmente, em outros órgãos ou agentes da mesma pessoa coletiva ou em
órgãos de outra pessoa coletiva.

A figura específica de delegação que o CPA se propõe regular define-se nos termos seguintes: ato unilateral
praticado, com fundamento na lei, pelo qual um órgão administrativo transfere para outro órgão ou agente da
mesma pessoa coletiva ou para o órgão de outra pessoa coletiva o exercício da sua competência para a prática de
atos administrativos ou de atos de administração ordinária.

182.3.1.1. Ato de delegação

A delegação de poderes a que o CPA se refere é uma delegação administrativa, efetuada por um ato da
Administração de caráter concreto e individual; excluem-se, assim as delegações legais, bem como as efetuadas por
regulamento.
Pressupõe-se apenas a delegação por ato unilateral, afastando-se, as delegações contratuais – unilateralidade da
intervenção do delegante.

182.3.1.2. Lei de habilitação

A delegação de poderes, enquanto ato da Administração, pressupõe duas normas jurídicas prévias:
o Norma atributiva do poder delegado (a norma que atribui ao órgão A o poder de aplicar coimas)
o Norma de habilitação de delegação (a norma que atribui ao órgão A o poder de delegar o seu poder de
aplicar coimas)

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A delegação de poderes depende, em geral, de lei de habilitação, o CPA não tem o propósito de assumir, em geral,
a condição de lei de habilitação. Trata-se de estabelecer um regime para uma figura jurídica que outras normas
permitem mobilizar.
Mas, em exceção a essa regra, o CPA também constitui lei de habilitação e contém normas que habilitam órgãos
administrativos a efetuarem delegações.

a) Delegação para a prática de atos de administração ordinária


Os órgãos competentes para decidir em determinada matéria ficam genericamente habilitados (‘podem
sempre’) a delegar no seu imediato inferior hierárquico, adjunto ou substituto a prática de atos de
administração ordinária nessa matéria.
Uma habilitação com o mesmo alcance é conferida aos órgãos colegiais em relação aos respetivos
presidentes. Esta habilitação não opera havendo lei de habilitação específica que estabeleça uma particular
repartição de competências entre os diversos órgãos.
O CPA não indica o que deve entender-se por atos de administração ordinária no âmbito da matéria em que
um órgão é competente para decidir, mas tudo aponta para assim se considerarem os atos instrumentais
isolados, os atos preparatórios, em geral apenas com relevância jurídica interna, bem como os atos de
execução de uma competência decisória.
Pelo menos em regra, esta delegação não tem como objeto a competência para a prática de atos
administrativos.

b) Subdelegação de poderes
O delegante é autorizado a subdelegar os poderes delegados, sendo atribuída a mesma autorização ao
subdelegado, uma vez que a subdelegação constitui uma delegação, uma norma de habilitação de
delegações.

182.3.1.3. Âmbito subjetivo da delegação

O CPA pressupõe uma figura de delegação que opera no âmbito de relações que envolvem, na qualidade de
delegantes, órgãos administrativos, órgãos da AP. O órgão administrativo suscetível de figurar como delegante é
aquele que a lei de habilitação indicar.

A delegação que o CPA tem como referência é a que, nos termos da lei de habilitação, tem ou pode ter na condição
de delegado num órgão da mesma pessoa coletiva pública a que pertence o órgão delegante.

Todavia, a regulamentação também se aplica à delegação efetuada, nos termos da lei de habilitação, por um órgão
administrativo de uma pessoa coletiva num órgão de outra pessoa coletiva.
Cremos que se pressupõe apenas as delegações efetuadas em órgãos de pessoas coletivas públicas.

A regulamentação do CPA atinge as delegações que, com fundamento em lei, os órgãos administrativos possam
efetuar em agentes da mesma pessoa coletiva.
Delegáveis, podem ser órgãos, pertencentes ou não à pessoa coletiva a que pertence o órgão delegante, bem
como agentes pertencentes a essa pessoa coletiva, o CPA não contém qualquer indicação, sobre quais podem ser
os órgãos ou os agentes delegáveis.
Uma tal indicação deverá constar da lei de habilitação.

Pode suceder que a lei de habilitação não proceda à indicação dos órgãos ou agentes delegáveis. Muitas vezes, as
leis autorizam os órgãos da AP a delegar os seus poderes, mas não indicam o órgão ou agente que pode beneficiar
da delegação. O CPA também não contém essa indicação. Parece-nos de considerar, o princípio segundo o qual o
órgão legalmente habilitado a delegar pode delegar (apenas em órgãos) ou agentes que, em
relação a si, estejam em condição de subalternidade ou subordinação jurídica.
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182.3.1.4. Âmbito objetivo da delegação

O CPA tem em vista a delegação de poderes para a prática de atos administrativos e atos de administração
ordinária. A figura de delegação considerada no CPA é a que tem por objeto poderes ou competências de decisão
ou poderes para a prática de atos de administração ordinária no âmbito das competências de decisão.

182.3.1.5. Delegação como transferência de exercício de competência

Na perspetiva do CPA, a delegação efetua a transferência do exercício de uma competência do órgão administrativo
delegante (competência de que este é titular, que lhe pertence nos termos da lei): ao delegado é permitido praticar
os atos administrativos sobre a matéria da competência normal do delegante.
Por pressupor que o delegado exerce uma competência alheia (que não lhe pertencia antes, nem passa a pertencer-
lhe depois da delegação) ali atribui-se ao delegante o poder de avocar os poderes delegados, bem como de
revogar ou de substituir os atos praticados pelo delegado.

182.3.2. Regime jurídico

182.3.2.1. Requisitos do ato de delegação

O ato de delegação de competências, a praticar pelo órgão delegante, tem de cumprir requisitos, em matéria de
especificação e de publicidade.
O ato de delegação deve especificar (enunciar de forma específica, objetiva e clara), os poderes delegados ou
subdelegados, ou enumerar quais os atos que o delegado ou subdelegado pode praticar – exigência de
especificação do ato de delegação.

O ato de delegação deve mencionar a norma atributiva do poder delegado (norma de competência) e aquela que
habilita o órgão a delegar (norma de habilitação).
A falta dos elementos de especificação ou de menção obrigatória conduzem à invalidade do ato de delegação.

A eficácia jurídica da delegação (ou subdelegação) depende da sua publicitação nos termos legais. O ato de
delegação deve ser publicado no Diário da República ou na publicação oficial da entidade pública a que pertence o
órgão delegante. Além desta forma oficial de publicitação, sem a qual não produz efeitos, o ato de delegação tem
ainda de ser publicitado na internet, no sítio constitucional da entidade em causa. O prazo de 30 dias, conta-se
desde o momento da prática do ato de delegação e sugere que este ato caduca se não for publicado no referido
prazo.

182.3.2.2. Limites ao poder legal de delegação

A catalogação legal de poderes indelegáveis constitui um exercício inútil, porquanto o que a lei precisa de prever é
a possibilidade de delegação e não o inverso. Sem lei de habilitação os poderes de um órgão administrativo são
sempre indelegáveis; esta é a regra da indelegabilidade dos poderes administrativos. Não faz sentido uma
enumeração legal de poderes que não podem ser delegados.

O art45º do CPA, sob a epígrafe “Poderes indelegáveis” sugere um catálogo de poderes, de competências
administrativas, que não podem ser delegadas.

Todavia, numa leitura mais cuidada, verifica-se que não é exatamente isso que se quer prever nas alíneas do
preceito: estas não indicam, em rigor, poderes legalmente indelegáveis.

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A intenção é de definir um regime a aplicar aos órgãos habilitados por lei a efetuar delegações de poderes. O
sentido deste regime não consiste, em estipular uma proibição objetiva da delegação de certos poderes, mas antes,
em proibir especificamente o órgão legalmente habilitado a delegar – de delegar os seus poderes em certos órgãos
ou agentes ou de os delegar numa extensão tal que fique despojado do exercício de todos os seus poderes.

A epígrafe do artigo revela-se enganadora, o que está em causa é uma indicação legal que não se refere ao objeto
da delegação, mas aos limites gerais do poder administrativo de delegação.

a) Proibição da delegação da globalidade dos poderes

A proibição da delegação da globalidade dos poderes só se compreende se se tiver presente que, por vezes, a lei
de habilitação não procede a uma enumeração ou indicação, precisa e específica dos poderes delegáveis.
A proibição que o CPA estabelece, aplica-se nos casos em que a lei de habilitação não procede a uma especificação
ou enumeração dos poderes delegáveis, autorizando a delegação de quaisquer poderes do delegante. Neste
cenário, o delegante está proibido de delegar a globalidade dos seus poderes, terá de manter na sua esfera o
exercício de uma parte deles. Basta, para não desrespeitar o limite, que o delegante conserve o exercício de uma
pequena parte das suas competências. O que a lei parece querer evitar é que um órgão administrativo se transforme
apenas num órgão delegante, deslocando para outro órgão o exercício de todas as suas competências.

b) Proibição de delegação de poderes suscetíveis de serem exercidos sobre o próprio delegado

O sentido da proibição é o da delegação de certos poderes do delegante no órgão ou agente delegado. O CPA
proíbe que o delegante delegue num determinado agente os seus poderes de disciplina ou avaliação desse mesmo
agente. Também se deve considerar proibida a delegação da competência para a apreciação de recursos nos
órgãos ou agentes que tenham praticado os atos objeto desses recursos; de resto, a intervenção do titular do órgão
ou agente nessa situação configura um impedimento

c) Proibição da delegação de poderes a exercer pelo delegado fora do âmbito da respetiva competência
territorial

A proibição legal aplica-se, neste caso, à delegação de poderes em órgãos que têm competência apenas numa área
territorial delimitada; ex.: um diretor geral, que a lei autoriza a delegar a sua competência para licenciar indústrias,
não poderá delegar num diretor regional do norte a competência para licenciar indústrias a instalar na região centro.
O CPA pretende limitar o poder de delegação, de modo a que esta não perturbe a lógica de vinculação das
competências dos órgãos a um determinado território.

182.3.2.3. Regime aplicável à atuação do delegado

O órgão ou agente delegado passa a dispor do poder (e do dever) de exercer a competência delegada. Um poder-
dever, uma vez que o delegado não pode, por sua iniciativa, abandonar ou deixar de exercer as competências
delegadas.
Apesar de não ser nem se transformar no titular da competência, cabe ao delegado a responsabilidade, no plano
jurídico, decorrente dos atos que pratica. Qualquer órgão administrativo é o responsável pelas consequências dos
seus atos, e isso inclui os que pratica no âmbito da delegação.

O princípio de equivalência entre a atuação do delegado e a que teria sido realizada pelo delegante; por ex.: se os
atos praticados pelo delegante estivessem sujeitos a recurso administrativo necessário, o mesmo deverá suceder
com os atos do delegado; os atos do delegado devem entender-se como manifestações da competência
reconhecida ao delegante.

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Contudo, esse princípio de equivalência entre os atos do delegado e os que seriam praticados pelo delegante,
conhece vários desvios; por ex.: os atos do delegado não são impugnáveis em tribunais nos mesmos termos em que
seriam se praticados pelo delegante: as regras de competência territorial dos tribunais aplicam-se em função de se
tratar de uma atuação do delegado e não do delegante; o mesmo vale para a competência dos tribunais em razão
da hierarquia, se o primeiro-ministro delega poderes num ministro, o tribunal competente para apreciar as ações de
impugnação das decisões do ministro proferidas ao abrigo da delegação é o tribunal administrativo, e não o
Supremo Tribunal Administrativo.

182.3.2.4. Regime dos atos praticados pelo delegado

O CPA estabelece algumas exigências formais quanto aos atos que o delegado pratica no exercício dos poderes
delegados. Impõe que estes atos mencionem a qualidade de delegado no uso da delegação. Visa-se que os
destinatários fiquem cientes de que se trata de atos praticados ao abrigo de uma competência delegada. A
inobservância, bem como a observância defeituosa, não determinam a invalidade dos atos do delegado, mas os
interessados não podem ser prejudicados no exercício dos seus direitos pelo desconhecimento da existência da
delegação.

Os atos do delegado podem ser anulados, revogados ou substituídos pelo delegante. Os atos do delegado podem
também ser objeto de reclamação (impugnação para o próprio delegado), nos casos expressamente previstos em
lei, pode haver recurso administrativo especial para o delegante dos atos praticados pelo delegado.

182.3.2.5. Relação de delegação: poderes do delegante

A delegação está na origem de uma relação jurídica entre delegante e delegado. Uma relação instuito personae,
que envolve uma confiança do titular do órgão delegante no titular do órgão ou agente delegado.
Uma relação caracterizada pela supremacia jurídica do delegante, o qual dispõe de poderes sobre a própria relação
de delegação, bem como sobre os atos praticados pelo órgão delegado.

a) Emissão de diretivas e instruções vinculativas


O delegante tem o poder de emitir diretivas ou instruções vinculativas relativas ao modo como devem ser
exercidos os poderes delegados.
O exercício da competência delegada encontra-se submetido à orientação do delegante. As diretivas e as
instruções são vinculativas, o delegado tem sempre de atender ou considerar o que nas mesmas se dispõe.
O incumprimento das diretivas e instruções pode comportar consequências no plano da relação de
delegação. Mas a violação das diretivas e das instruções não provoca a invalidade dos atos praticados pelo
delegado.

b) Autorização da subdelegação de poderes


A subdelegação de poderes pode considerar-se um tipo de delegação, com a diferença estrutural
consistente no facto de a delegação propriamente dita envolver, na posição de delegante, o órgão titular da
competência, ao passo que a subdelegação envolve, na posição de subdelegante, o órgão ou agente com
competências delegadas.
O delegante pode autorizar o delegado a subdelegar (salvo disposição legal em contrário). O CPA habilita o
órgão delegante a autorizar o delegado a subdelegar.
Se a lei não estabelecer coisa diferente ou se o delegante ou subdelegante não excluírem de forma expressa
uma tal possibilidade, qualquer subdelegante pode subdelegar as competências que lhe tenham sido
subdelegadas.
‘Todo’ ou ‘qualquer’ subdelegado dispõe do poder legal de subdelegar.

c) Avocação

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Avocação: ato pelo qual um órgão chama a si o exercício da competência de um outro órgão, para decidir
um caso específico ou um conjunto definido de casos; o delegante tem o poder de avocar.
Trata-se antes de um ato pelo qual o órgão delegante chama a si o exercício da sua própria consistência
(que delegou).
Como a delegação consiste na transferência do exercício da competência, enquanto a mesma está em vigor,
não existe uma dupla possibilidade de exercício (pelo delegante e pelo delegado) da competência
delegada. A avocação permite ao delegante recuperar o exercício de um ou alguns poderes delegados,
mantendo a delegação quanto aos poderes não avocados.
A lei não regula a forma do ato de avocação, qualquer forma de comunicação poderá ser utilizada (e-mail,
sms, telefone) o ato de avocação pode até ser praticado de forma concludente (ex.: solicitação ao delegado
do envio do processo administrativo relativo a um caso específico). Enquanto ato autónomo, praticado de
forma expressa ou tácita, a avocação tem o propósito prático de tornar o delegado ciente de que o
delegante chamou a si o exercício da competência num âmbito definido. Neste sentido, a avocação previne
o risco da ocorrência de decisões contraditórias ou de duas decisões para a mesma situação da vida.
Na sequência da avocação, o delegado vê-se destituído do exercício da competência delegada, pelo que o
ato que venha a praticar é ilegal (por incompetência).
Na hipótese de o delegante exercer a (sua) competência sem proceder à avocação, o ato que pratique não
deverá reputar-se inválido.
A falta de resposta a requerimento dirigido a delegante (ou subdelegante) é imputada ao delegado (ou
subdelegado), mesmo que a este não tenha sido remetido o requerimento.
Assim, por ex.: depois de um ministro ter delegado a competência X num secretário de Estado, o
requerimento que o interessado apresenta ao ministro no sentido da prática de um ato no âmbito daquela
competência X é considerado requerimento dirigido a órgão competente, decorrendo do preceito estar
preenchida a condição do dever legal de decidir. A falta de decisão do ministro sobre o requerimento é
imputada ao delegado, o secretário de Estado.

d) Anulação, revogação e substituição dos atos praticados pelo delegado


O delegante tem o poder de anular, revogar e substituir os atos praticados pelo delegado, ao abrigo da
delegação de poderes.
O órgão delegante pode exercer qualquer destes poderes oficiosamente, por iniciativa própria. Quando a
lei o estabelecer, também o pode fazer a pedido dos interessados, mediante recurso administrativo especial.
A revogação e a anulação dos atos do delegado apenas podem ocorrer enquanto vigorar a delegação. A
competência do delegante para revogar, anular (e também substituir) atos do delegado esgota-se (caduca)
com a extinção da delegação.

Os atos administrativos do delegado estão assim, expostos a uma apreciação pelo delegante, o qual,
cumprindo as regras gerais, pode determinar:
o A revogação (fundada em razões de mérito, conveniência ou oportunidade)
o A anulação (fundada em invalidade)
o A substituição de atos praticados pelo delgado

Qualquer destes poderes, incluindo o de substituir os atos praticados pelo delegado, é suscetível de ser
exercido pelo delegante sem necessidade de avocação.
Os poderes do delegante não se limitam à determinação da cessação ou da destruição dos efeitos dos atos
praticados pelo delegado. Vão mais longe, e podem passar pela prática de novos atos que substituam ou
alterem atos praticados pelo delegado.

e) Revogação e anulação da delegação


O delegante pode, a todo o momento, fazer cessar a delegação por revogação. A delegação, que constitui
um ato livre do delegante é também um ato livremente revogável.

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Quanto ao poder de anulação do ato de delegação; a anulação tem como fundamento a invalidade do ato
de delegação.

182.3.2.6. Extinção da delegação

Duas formas de extinção da delegação:


o Revogação e anulação
o Caducidade

A caducidade pode surgir como consequência do esgotamento dos efeitos da delegação (ex.: delegação para
decidir sobre pedidos de autorização durante o mês de julho) ou em virtude de mudança dos titulares dos órgãos
delegante ou delegado.

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