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CAPÍTULO 3 • PLANEJAMENTO E DIDÁTICA

As relações entre
professor e alunos

Introdução
Uma das grandes questões educacionais hoje se refere ao comportamento
dos alunos, ou melhor, à falta de comportamento dos alunos de um lado e ao
descaso com a ação de ensinar do professor por outro lado. Sabemos que por
sermos seres estritamente sociais, nossas relações começam a se estabelecer
desde o nascimento.
Até alguns anos atrás, as relações sociais dentro da escola eram bem deter-
minadas e cada ator sabia como agir e o que esperar da atuação do outro dentro
daquela situação. Hoje, no entanto, as relações entre professores e alunos são
indeterminadas, isto é, não seguem um padrão, especialmente nos anos finais do
Ensino Fundamental (do sexto ao nono ano) e no Ensino Médio, tendo em vista
a própria evolução social que vem acontecendo. E a relação professor-aluno
acaba refletindo o que ocorre fora do ambiente escolar.
Neste capítulo, trataremos de alguns problemas que interferem no processo
de ensino e de aprendizagem derivados das relações estabelecidas entre profes-
sores e alunos.
Para você identificar as relações entre professor e alunos como parte das
condições organizativas do trabalho docente e compreender a relação profes-
sor-aluno como reflexo dos acontecimentos macrossociais, indicamos a leitura
do artigo “Relação professor-aluno: uma revisão crítica”, de Denise de Cássia
Trevisan Siqueira. O artigo está disponível no sítio <http://www.conteudoescola.
com.br/site/content/view/132/31>. A leitura desse artigo é importante, pois lhe
proporcionará uma revisão da relação professor-aluno como uma atitude social.

3.1 Aspectos cognoscitivo e socioemocional


A sala de aula não é um espaço onde acontece apenas a transmissão de
conteúdos. Muito pelo contrário, é um espaço onde se estabelece grande parte
das relações sociais que são determinantes para nossa vida. Na sala de aula,
aprendemos valores e comportamentos da nossa sociedade, adquirimos a possi-
bilidade de lidar com o conhecimento científico e de analisar e criticar esse
conhecimento, interpretar a sociedade na qual estamos inseridos.
Todas essas relações acontecem entre alunos e alunos e entre alunos e
professores. Nos anos finais do Ensino Fundamental (do sexto ao nono ano), os

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alunos passam a conviver com diversos professores em um único dia, como é o


caso dos professores de linguagens, línguas e matemática. Os professores são
determinantes para a vida de cada aluno, mesmo aqueles que dizem que tal
professor “não fede nem cheira”, significa que o professor deixou de influenciar
determinados aspectos que deveria.
Freire (1996, p. 73) destaca que
O professor autoritário, o professor licencioso, o professor compe-
tente, sério, o professor incompetente, irresponsável, o professor
amoroso da vida e das gentes, o professor mal-humorado, sempre
com raiva do mundo e das pessoas, frio, burocrático, raciona-
lista, nenhum deles passa pelos alunos sem deixar sua marca.

A partir dessa afirmação, podemos inferir que a relação estabelecida entre


professores e alunos constitui o cerne do processo pedagógico, pois ambos
podem ensinar e aprender por meio de suas experiências. Libâneo (2008,
p. 249) afirma que “as relações entre professores e alunos, as formas de comu-
nicação, os aspectos afetivos e emocionais, a dinâmica das manifestações na
sala de aula fazem parte das condições organizativas do trabalho docente”.
Quando o ensino tradicional imperava nas mentalidades coletivas e havia
um único formato para o processo de ensino, a afetividade do professor para
com o aluno era impensável na sala de aula. Por outro lado, havia um respeito
para com o professor, que foi sendo perdido ao longo do tempo, juntamente
com o prestígio da profissão, o que acabou afetando a posição docente em
sala de aula. Hoje sabemos que a afetividade (confiança e empatia) e o respeito
não se acham excluídos da cognoscibilidade, no entanto o que muitas vezes o
professor não se dá conta é que não se pode permitir que a afetividade interfira
no cumprimento ético do exercício da docência e da consequente autoridade
que esse exercício demanda.
Há de se fazer um reconhecimento das duas características determinantes
ao trabalho docente: a característica cognoscitiva e a socioemocional.

3.1.1 Característica cognoscitiva


Por trabalhar com o conhecimento, o professor precisa estabelecer formas
de comunicação eficientes dos conteúdos escolares, pois, no exercício da
docência, têm-se sempre em vista tarefas cognoscitivas especificadas por meio
de objetivos da aula, conteúdos, atividades, problemas e avaliações. Por ser um
processo, pressupõe-se que os alunos têm uma determinada potencialidade de
aprendizagem, indicada por sua idade, experiências vivenciadas, prontidão do
conteúdo e até desenvolvimento físico.
O trabalho docente não é unidirecional e sim bidirecional. Respeitada tal
premissa, o professor deve ainda considerar:
t o manejo dos procedimentos do ensino (métodos e técnicas adequadas
a cada objetivo e conteúdo);

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t a utilização dos recursos da linguagem, considerando até mesmo o tom


da voz que se utiliza;
t o nível de prontidão dos alunos;
t a necessidade de deixar muito claras as expectativas com relação ao
conhecimento, isto é, o que realmente se espera dos alunos.

3.1.2 Características socioemocionais


As características socioemocionais exprimem-se nos vínculos afetivos e nas
normas que regem as condutas em sala de aula, o que costumamos chamar de
disciplina. A indisciplina em sala de aula é hoje um dos grandes problemas do
cotidiano escolar. Ela se deve a diversos fatores, entre os quais podemos apontar
a perda de prestígio e respeito por parte do professor perante a sociedade, o que
afetou sua posição em sala de aula. O aluno vê o professor muitas vezes como
um funcionário diretamente pago por ele, no caso das escolas particulares, ou um
funcionário público, no caso das escolas municipais, estaduais e federais.
Na verdade, o que se espera do educador no século XXI é que ele seja um
facilitador do acesso às informações, não deixe de lado o conteúdo específico da
matéria, mas auxilie os alunos no conhecimento do mundo e de seus problemas
(injustiças, solidariedades e fatos), oriente a caminhada deles na interpretação e
na ação. O objetivo é um ensinar ativo, em que o aluno é o sujeito da ação. A
atuação do professor é tão importante que Perrenoud (2001, p. 176) afirma que
A principal ferramenta de trabalho do professor é sua pessoa, sua
cultura, a relação que instaura com os alunos, individual ou cole-
tivamente. Mesmo que a formação esteja centrada nos saberes,
na didática, na avaliação, na gestão da classe e nas tecnologias,
nunca se deve esquecer a figura do professor.

A atuação do professor está mesclada por critérios objetivos e subjetivos.


Por isso é primordial ao docente a articulação do conhecimento e da emoção,
sob a forma dos afetos desenvolvidos em sala de aula. Chacón (2003, p. 13)
expõe que
Hoje há um crescimento da consciência coletiva sobre a necessi-
dade de desentranhar os aspectos emocionais do conhecimento,
nos quais possivelmente há de se buscar a raiz de muitos fracassos
de nossa vida intelectual e, em particular, de nossa educação.

Todas essas considerações demonstram a necessidade de articulação do conhe-


cimento e da emoção, sob a forma dos afetos desenvolvidos em sala de aula, pois
hoje se sabe que existe uma forte correlação positiva entre gostar do professor
e gostar da matéria, ou a aversão à matéria e, consequentemente, ao conteúdo
desta. Tudo isso está diretamente relacionado ao modo de relacionamento do
professor com os alunos, à postura do professor em sala de aula, que pode influen-
ciar a vida escolar do educando, gerar emoções positivas ou negativas.

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Com relação à indisciplina, o professor deve buscar uma interação em torno


dos objetivos e do conteúdo da aula, combinar sempre severidade e respeito.
Por que o professor é uma autoridade em sala de aula? Ao responder a essa
pergunta, você estará apto a resgatar a autonomia do professor em sala de aula.
O professor é uma autoridade tendo em vista sua posição intelectual, moral e
técnica, assim representa a sociedade, exerce um papel de mediador entre o
indivíduo/aluno e os conhecimentos formais acumulados em toda a história da
humanidade dignos de relevância naquela matéria.
A autoridade intelectual do professor se manifesta no domínio dos conteúdos
da matéria que leciona e dos métodos e dos procedimentos de ensino que utiliza
para mediar esse conhecimento. Isso inclui o tato em lidar com os coletivos,
com as diferenças individuais e a capacidade de controlar e avaliar o conheci-
mento gerado. Muitos professores perdem o controle na sala por não exercerem
a autoridade intelectual, ou por não dominarem os conteúdos curriculares, ou
por não se preocuparem com os métodos e os procedimentos de mediação do
conhecimento.
A autoridade moral contempla as características da personalidade do
professor, por isso é muito diferenciada. São características da autoridade
moral: os traços de caráter, a sensibilidade, o senso de justiça e até mesmo a
dedicação profissional do docente.
A autoridade técnica alia-se à autoridade intelectual, constitui-se pelo conjunto
de hábitos, capacidades e habilidades de direção eficaz do processo de ensino e
de aprendizagem. Portanto até os exercícios selecionados para garantir a assimi-
lação de determinado conteúdo demonstram a autoridade técnica do professor.
Libâneo (2008, p. 253) destaca que
A disciplina da classe depende do conjunto dessas caracterís-
ticas do professor, que lhe permitem organizar o processo de
ensino. Entre os requisitos para uma boa organização do ensino
destacam-se:
t um bom plano de aula, onde estão determinados os objetivos,
os conteúdos, os métodos e procedimentos de condução da
aula;
t a estimulação para a aprendizagem que suscite a motivação
dos alunos;
t o controle da aprendizagem, incluindo a avaliação do rendi-
mento escolar;
t o conjunto de normas e exigências que vão assegurar o
ambiente de trabalho escolar favorável ao ensino e controlar
as ações e o comportamento dos alunos.

Podemos concluir que o ato de educar em um ambiente formal como a


escola não é um trabalho para amadores; muito pelo contrário, o docente tem

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de estar profissionalmente preparado para estabelecer relações produtivas com


seus alunos. Há necessidade de normas explícitas de funcionamento da classe.
No próximo capítulo, trataremos dos objetivos do ensino, especificaremos que
os objetivos antecipam os resultados e os processos esperados e expressam os
conteúdos que devem ser trabalhados, de acordo com as diretrizes curriculares. Você
terá oportunidade de verificar como definir os objetivos a serem desenvolvidos.

Resumo
A sala de aula é um espaço onde se estabelecem relações sociais. A postura
do profissional docente é fundamental para o sucesso dessas relações. O aluno
estabelece uma correlação entre o conteúdo da matéria e o professor, que deter-
mina a vida intelectual do primeiro. A autoridade docente deriva de sua postura
intelectual, moral e técnica e determina o estabelecimento da própria disciplina
em sala de aula.

Atividades
1. Entreviste dois ou três professores de Matemática ou Língua Portuguesa que
são considerados pela comunidade escolar como “bem sucedidos” no manejo
disciplinar da sala de aula e no controle da disciplina. Procure identificar em
suas falas aspectos da autoridade intelectual, moral e técnica. Elabore, em
seguida, um breve relatório de suas conclusões e socialize com seus colegas.

2. Para Libâneo (2008), como vimos, o processo de ensino deve ser entendido
como o conjunto de atividades organizadas pelo professor e pelos alunos
para o domínio do conhecimento e o desenvolvimento das capacidades
cognitivas. Para ele, o ponto de partida deve ser o nível atual de conheci-
mentos, experiências e desenvolvimento dos alunos. Nessa perspectiva e de
acordo com o conteúdo estudado neste capítulo, coloque (V) para as asser-
tivas verdadeiras e (F) para as falsas. O processo de ensino caracteriza-se

I. pelo trabalho docente que toma como referência a prática social da


qual o professor e o aluno são integrantes.
II. como um processo em que o professor passa a matéria e o aluno recebe
e reproduz mecanicamente o que aprendeu.
III. pelo desenvolvimento e transformação progressiva da capacidade inte-
lectual dos alunos em direção ao domínio dos conhecimentos e habili-
dades e sua integração.
IV. pela unilateralidade, uma vez que o professor ensina e o aluno aprende.
A sequência correta é

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a) V, V, F, F. c) F, V, F, V.
b) V, F, V, F. d) F, F, V, V.

3. Relacione os itens a seguir.


I. Autoridade intelectual
II. Autoridade moral
III. Autoridade técnica

( ) Domínio dos conteúdos da matéria que leciona.


( ) Conjunto de hábitos, capacidades e habilidades de direção eficaz do
processo de ensino e de aprendizagem.
( ) Traços de caráter, sensibilidade, senso de justiça e dedicação profis-
sional do docente.
( ) Os exercícios selecionados para garantir a assimilação de determinado
conteúdo demonstram a autoridade do professor.
( ) Características da personalidade do professor.
( ) Domínio dos métodos e procedimentos de ensino que utiliza para mediar
o processo de ensino e aprendizagem.

A sequência correta é
a) I, III, II, III, II, I. c) III, II, I, I, II, III.
b) I, I, II, II, III, III. d) III, III, II, II, I, I.

4. Sobre as relações professor-aluno, pode-se afirmar que


a) os comportamentos do professor e dos alunos fazem parte de uma
expectativa baseada em valores sociais claramente definidos.
b) o desempenho e as relações professor-aluno independem do ambiente
institucional.
c) os limites do conceito expresso pela relação aluno não se intrincam na
prática do processo pedagógico com o conteúdo de ensino e com a
metodologia adotada.
d) o aluno espera ser reconhecido como pessoa e valoriza no professor as
qualidades que os ligam afetivamente.

Comentário das atividades


Na atividade 1, você deve ter procedido a entrevista e deve ter identificado
aspectos da autoridade intelectual, moral e técnica que os professores apre-
sentam em seus cotidianos. Talvez você tenha percebido que os professores que
dominam o conteúdo a ser trabalhado, que esboçam isso em um plano de aula

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e o executam com prazer, tenham mais facilidade em manter a disciplina em


sala de aula. Você pode ainda ter encontrado um professor que, por sua postura
moral e dedicação, conquista a confiança e a credibilidade dos alunos. Enfim,
com certeza, você teve a oportunidade de identificar os aspectos da autoridade
trabalhados ao longo do capítulo.
Na atividade 2, você deve ter optado pela sequência apontada na opção
(b). As assertivas (II) e (IV) são falsas, pois se referem a uma visão “bancária”
da educação que não leva em consideração a participação ativa do aluno no
processo de ensino e de aprendizagem.
Na atividade 3, você, com certeza, apontou a alternativa (a) como correta,
pois a autoridade intelectual do professor se manifesta no domínio dos conteúdos
da matéria que leciona e dos métodos e procedimentos de ensino que utiliza para
mediar esse conhecimento. Essas características determinam o tato em lidar com
os coletivos, com as diferenças individuais e na capacidade de controlar e avaliar
esse conhecimento gerado. Já a autoridade moral contempla as características da
personalidade do professor. Caracteriza-se pelos traços de caráter, sensibilidade,
senso de justiça e dedicação profissional do docente. Já a autoridade técnica
constitui-se pelo conjunto de hábitos, capacidades e habilidades de direção eficaz
do processo de ensino e de aprendizagem. Assim, até os exercícios selecionados
para garantir a assimilação de determinado conteúdo demonstram a autoridade
técnica do professor.
Na atividade 4, você acertou se optou pela alternativa (d), pois, como vimos
neste capítulo, as qualidades que unem professor e aluno afetivamente chegam a
determinar até a ligação do mesmo com a matéria trabalhada. A alternativa (a)
está errada, porque os comportamentos do professor e dos alunos não podem
ser baseados em valores sociais claramente definidos, pois não existe essa homo-
geneidade quando se trata de valores. A opção (b) está equivocada tendo em
vista que o desempenho e as relações professor-aluno são determinados também
pelo ambiente institucional. E, por fim, a opção (c) está errada porque os limites
do conceito expresso pela relação aluno se intrincam sim na prática do processo
pedagógico com o conteúdo de ensino e com a metodologia adotada.

Referências
CHACÓN, I. M. G. Matemática emocional: os afetos na aprendizagem da mate-
mática. Porto Alegre: Artmed, 2003.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
São Paulo: Paz e Terra, 1996.
LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 2008.
PERRENOUD, P. A prática reflexiva no ofício de professor. Porto Alegre: Artmed,
2001.

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Anotações

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