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Introdução Geral

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Distinguir análise de introdução, definir conceitos básicos


e descrever fatores exógenos e endógenos que afetam o comportamento de uma
economia.

Nosso curso de introdução à análise macroeconômica oferece a você, interessado ou


interessada em compreender o mundo ao seu redor, um caminho de aprendizado ao mesmo
tempo simples, lógico e atual. O percurso que iniciamos agora vai auxiliá-lo a entender muitos
dos temas que hoje podem ser um tanto nebulosos quando você lê jornais, assiste aos telejornais
ou acompanha os analistas de economia falando sobre a macroeconomia brasileira e do resto
em blogs e redes sociais na internet.
Nós vamos começar este módulo descrevendo a estrutura da macroeconomia, um tema
bastante complexo, que muitas vezes se beneficia do uso da linguagem matemática como forma
de simplificar e tornar mais claras as relações lógicas e de causalidade entre as variáveis ma-
croeconômicas. Esta é uma perspectiva adotada na chamada corrente principal da teoria econô-
mica (mainstream)1 , que é a que adotamos neste curso. Porém, nossa proposta é minimizar
ao máximo possível o uso da linguagem matemática e comunicar um modelo macroeconômico
completo em economia aberta de uma forma simples e lógica.
Eventualmente, vamos utilizar alguns gráficos cujos significados serão oportunamente
explicados e vocês entenderão como aproveitar a visualização gráfica para entender melhor e
para aproveitar mais todo o conteúdo que vamos desenvolver aqui juntos.
De início, é importante diferenciarmos entre um curso de introdução à macroecono-
mia e um curso de introdução à análise macroeconômica. A diferença é sutil, mas importante.
Este curso está projetado para que você compreenda a estrutura lógica e possa utilizá-la para
analisar os problemas da macroeconomia.
1
Esta abordagem é a mesma dos livro-textos de macroeconomia mais usuais em suas edições mais recentes.
Porém a estrutura clara de equilíbrio geral em economias que adotam o regime de metas de inflação que
adotamos aqui, se aproxima mais de Carlin e Soskice (2010), de Taylor (2000) e de Walsh (2002). Veja
também Blanchard (2008) para uma discussão sobre a evolução da macroeconomia

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Em um curso de introdução à macroeconomia, em geral, a preocupação fundamen-


tal é a de tratar de conceitos básicos, formas de mensuração das variáveis macroeconômicos e
sua relação com a contabilidade nacional; os temas estudados na macroeconomia são tratados
de forma mais superficial, com o intuito de esclarecer o que são desemprego, inflação, taxas
de juros, balanço de pagamentos, taxas de câmbio, por exemplo. A palavra análise que uti-
lizamos no nosso curso indica que temos um propósito um pouco mais ambicioso, queremos
alcançar a compreensão da estrutura lógica da macroeconomia, com o que seremos capazes de
acompanhar mais de perto o debate macroeconômico no país e no mundo. Estes conhecimentos
são bastante relevantes e poderão nos ajudar a tomar decisões melhores, tanto para o dia-a-dia
quanto profissionalmente.
Começamos por desagregar a macroeconomia de acordo com o tipo de agentes e suas
decisões, o que nos permitirá entender melhor como as conexões nessa estrutura são realizadas,
como essas decisões dos agentes produzem os resultados macroeconômicos. Vejamos: famílias,
empresas, governos tomam decisões. As decisões de todos esses agentes produzem resultados
em termos de produção de bens e serviços (produto interno bruto - PIB) e de formação de
preços, cujas médias são expressas nas taxas de inflação - estas são as variáveis endógenas
fundamentais da macroeconomia.
O produto interno bruto é uma agregação de todos os bens e serviços finais que
são produzidos numa economia, num determinado período de tempo. Durante um trimestre
(ou ano) temos a mensuração, por meio das metodologias das contas nacionais, do produto
que foi produzido pela sociedade naquele trimestre (ano). Quando as decisões de consumo,
de investimento, de gastos do governo, de exportações, de importações são entendidas numa
sequência lógica, temos um primeiro passo para entender como é que se determina o produto
de uma economia (em geral, representamos essas relações em um fluxo circular da renda).
Já a taxa de inflação é uma média geral dos preços dos bens e dos serviços que são
negociados na economia. Portanto, se a inflação mostra uma elevação, isso significa que, em
média, os preços dos bens e serviços na economia se elevaram. Alguns podem ter revelado uma
queda de preços, outros podem ter revelado uma elevação de preços. Em média, predominou
uma elevação, portanto, a inflação vai revelar essa elevação e vai nos mostrar que a economia
está produzindo um resultado a partir da decisão dos agentes, de mais inflação. Como inflação e
produto são as variáveis endógenas fundamentais desse processo, como essas variáveis são de-
terminadas? Esse é o nosso objetivo fundamental, e encontraremos respostas para essa pergunta
mais adiante.
As flutuações do produto e da inflação sofrem influências de diversos fatores, muitos
deles estão fora do contexto da economia que é o foco de análise, ou seja, são exógenos. As
situações econômica e política do resto do mundo (o conjunto das outras economias) pode afetar
a economia doméstica, tanto mais quanto à economia doméstica mantenha relações comerciais
ou financeiras com o resto do mundo, ou seja, tanto mais quanto mais aberta for a economia
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doméstica.

Figura 1 – Fatores que influenciam a macroeconomia doméstica no curto prazo

Do ponto de vista doméstico, também há fatores que são exógenos ao recorte da análise
macroeconômica: a estrutura política, o funcionamento das instituições e a cultura daquela
sociedade afetam a maneira como os agentes tomam suas decisões econômicas e isso se reflete
na formação do produto e da inflação.

REFERÊNCIAS

BLANCHARD, O. J. The State of Macro. Annual Review of Economics, v. 1, n. 14259, p.


209–228, aug 2008.

CARLIN, W.; SOSKICE, D. A new keynesian open economy model for policy analysis. 2010.
Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=1664910>.

TAYLOR, J. B. Teaching modern macroeconomics at the principles level. American Economic


Review, v. 90, n. 2, p. 90–94, may 2000.

WALSH, C. E. Teaching Inflation Targeting: An Analysis for Intermediate Macro. The Journal
of Economic Education, v. 33, n. 4, p. 333–346, 2002.
Flutuação Macroecnômica

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Objetivos desta aula: continuar tratando de fatores que afetam as flutuações e


discernir flutuação de crescimento econômico - curto ou médio prazo de longo
prazo.

Um outro fator muito relevante para compreendermos como a atividade econômica


evolui ao longo do tempo, é entendermos que há fatores domésticos, características da nossa
própria economia, que afetam mais a economia no curto prazo ou no longo prazo. Podemos
distinguir o que seja o longo prazo e o curto prazo, do ponto de vista macroeconômico, da
seguinte forma: longo prazo é um tempo suficientemente longo para que a economia tenha
capacidade de acumular mais estoque de capital e produzir novos bens e serviços na econo-
mia. Trata-se da capacidade da economia de acumular capital físico, principalmente: máquinas
equipamentos, edificações, infraestrutura, capacidade de produzir e fornecer energia para que
as empresas e as famílias possam realizar suas atividades. Todos esses aspectos associados ao
estoque de capital da economia, são aspectos que demoram muito tempo para mudar.
Mas o que é suficientemente longo? Quanto tempo? É importante ter a dimensão tem-
poral em termos de em anos, por exemplo, e, neste caso, estamos falando de pelo menos, a 10
anos. Não só o estoque de capital precisa evoluir, como também a qualificação do trabalhador.
O trabalho também pode contribuir para que, de maneira relevante, a economia tenha maior
produtividade, ou seja, consiga produzir mais bens e serviços, ou diferentes bens e serviços,
mais diversificados e mais complexos, a partir da qualificação desses trabalhadores que vão,
em conjunto com o estoque de capital e aplicando uma certa tecnologia de produção, contribuir
para que nós tenhamos o PIB resultante.
Esses aspectos de longo prazo são exatamente o que nós vamos resgatar e reforçar
no nosso penúltimo módulo. Há que estar claro, desde já, que quando falamos em análise
macroeconômica, o foco principal é o comportamento da macroeconomia no curto e médio
prazos, ou seja entre um ano e outro, dentro de 5 anos, dentro de 8 anos, e que nesses prazos
uma série de fatores intrínsecos ou externos afetam nossa análise.

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Os fatores externos, ou exógenos, que já começamos a classificar, são tais como o


comportamento da atividade econômica nos demais países, a situação política, institucional e
cultural dos demais países e também a situação política, institucional e cultural do país domés-
tico. Além desses fatores, nós temos fatores que no curto prazo serão tomados como dados,
exógenos, como por exemplo: o nível de poupança, a tecnologia de produção, a produtividade
dos fatores de produção, e o estoque de capital, como já dissemos.
A macroeconomia flutua porque todos esses fatores afetam as decisões dos agentes e
as respostas dos agentes a esses fatores endógenos e exógenos resulta em determinado nível
de uma atividade econômica e de inflação, levando a economia, por exemplo, a situações em
que a atividade esteja acima da capacidade de produzir bens e serviços, dados os fatores de
longo prazo. E de outra forma, esses fatores externos podem nos levar para uma condição em
que a economia passe por um processo de atividade menor do que aquele que ela é capaz de
expressar ao longo de 10, 15, 20 anos, ou seja, menor que o crescimento de longo prazo.

Figura 1 – Flutuação da atividade econômica em torno da sua capacidade de


crescimento

A flutuação da macroeconomia em torno dessa sua tendência de crescimento de longo


prazo, sua evolução e dinâmica são o foco principal da análise macroeconômica de curto prazo.
Assim, os nossos módulo seguintes estarão sempre voltados para a compreensão dos fatores
que nos ajudam a compreender como e porque a economia flutua. E mais, o que esperar do
governo da economia que esteja em análise em relação às flutuações da atividade econômica,
da inflação e das demais variáveis endógenas da macroeconomia? Será que o governo deve
fazer com que a economia alcance uma um nível de atividade muito maior do que aquele que
ela é capaz de sustentar ao longo do tempo? Será que o governo deve estimular a demanda
agregada e levar a economia para uma situação que, dadas as condições de oferta no longo
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prazo, dificilmente ela conseguirá manter por mais de 1, 2 ou 3 anos?


Do ponto de vista da corrente principal,essa é uma ação equivocada: veremos adiante,
conforme progredirmos na compreensão da estrutura da macroeconomia, que a expectativa é de
que o governo atue no sentido de minimizar as flutuações macroeconômicas, utilizando os seus
instrumentos de política econômica, que são políticas monetária e fiscal.
Também teremos a oportunidade de estudar as características de regimes de metas de
inflação - governos que adotam esse regime têm exatamente um compromisso bastante claro e
explícito com a manutenção da taxa de inflação entre certos limites, ou seja, compromisso com
a estabilidade da inflação.
Continue acompanhando nosso curso e dedicando um pouco do seu precioso tempo
para desenvolver as atividades que estamos propondo, para que você ganhe ainda mais capaci-
dade de compreensão dessa estrutura lógica que começamos a desvendar a partir de já!
Simplificando o conjunto complexo

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Objetivos desta aula: desagregar a macroeconomia em segmentos com distintas


lógicas de decisão dos agentes que, ao serem compreendidas separadamente, le-
vam ao entendimento dos passos lógicos que as reconectam na determinação da
Demanda Agregada e da Oferta Agregada.

Preparados? Vamos lá!


Para começarmos, então, a entender melhor a estrutura lógica da macroeconomia, va-
mos desagregar a macroeconomia em algumas partes. Ao analisar as partes individualmente,
vamos reproduzir aqui a metodologia de análise da corrente principal, que vai nos permitir,
por meio de uma sequência lógica de raciocínio, conectar cada uma dessas partes e, de fato,
elucidar e entender a formação do produto e da inflação, variáveis endógenas fundamentais da
macroeconomia.
Esta estratégia didática, muito utilizada em livros-texto de macroeconomia, é bastante
interessante, porque auxilia na simplificação do conjunto complexo que é o mundo real, mas
também é muito desafiadora! Mas estou segura que você vai ficar comigo até alcançarmos
a compreensão econômica dos fatores por trás do famoso gráfico em que demanda agregada
e oferta agregada, em conjunto, numa estrutura lógica única, definem o produto e a taxa de
inflação simultaneamente.
O conjunto complexo da macroeconomia será expresso em relações básicas e funda-
mentais que propiciam a compreensão da maneira mais simples possível, segmentado em quatro
grupos. Dois desses grupos farão parte dos chamados mercados financeiros, que abordaremos
detalhadamente nos próximos módulos. Esses segmentos são: o mercado monetário, que é o
mercado em que o banco central opera, gerencia a política monetária da economia; e um ou-
tro mercado muito relevante que é o cambial, que representa o fato de que esta economia em
análise é uma economia aberta. Uma economia aberta é uma economia que faz transações com
o resto do mundo, não só comerciais, mas também financeiras. E necessariamente as transa-
ções que são realizadas, sejam com parceiros comerciais ou com investidores internacionais,

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requererão a troca da moeda doméstica pelas moedas internacionais (ou vice-versa). Teremos a
oportunidade de, em um módulo específico mais adiante, estudar em mais detalhes o mercado
cambial.

Figura 1 – A estrutura lógica da Demanda Agregada

Então o mercado monetário e o mercado cambial representam a estrutura financeira da


macroeconomia. Por outro lado, nós temos também o segmento dessa estrutura que vai expres-
sar o nível de atividade, como e quanto esta economia produz de bens e serviços. É o chamado
mercado de bens e serviços. Do ponto de vista agregado, é um mercado bastante abstrato, é
como se pudéssemos representar no PIB (Y) todos os bens e serviços finais da economia que
são produzidos em um determinado período de tempo. Apenas para alertá-los e para resgatar
um pouquinho esses conceitos mais básicos de macroeconomia, tratamos de bens e serviços
finais por um motivo muito simples: os bens e serviços intermediários que entram na cadeia
produtiva dos bens finais não podem ser contabilizados no PIB, caso contrário estaríamos con-
tando duas vezes aquela produção na economia. Então, para eliminar a possibilidade de dupla
contagem, sempre contabilizamos no PIB os bens e serviços finais da economia. O mercado de
bens e serviços vai representar, então, essa estrutura produtiva, a capacidade da economia de
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produzir em um determinado período de tempo, por exemplo, carros, aulas de Economia, ser-
viços médicos, serviços financeiros, arroz, soja, feijão, etc. Apenas a parcela da produção que
efetivamente está disponível para ser comprada pelas famílias (bens ou serviços de consumo
finais) ou pelos empresários (bens ou serviços de capital finais), num determinado momento do
tempo, ou comprada pelo próprio governo como despesa corrente, estão contabilizados no PIB.
No mercado de bens e serviços, também chamado de lado real da macroeconomia,
vamos entender elementos bastante relevantes da decisão das famílias entre consumir e poupar,
da decisão dos investidores produtivos, dos empresários, em, por exemplo, comprar uma nova
máquina para aumentar a capacidade de produzir novos bens e serviços no futuro. E também
das decisões do governo, tanto de consumir, ou seja, de gastar, de comprar bens e serviços
produzidos na economia, quanto da decisão de tributar.
Portanto, temos até este momento, três subgrupos que compõem essa estrutura lógica:
dois mercados financeiros, mercado monetário e o mercado cambial, o mercado real, que é o
mercado de bens e serviços, e temos a contrapartida do mercado real, em termos de meios de
produção que se expressará no mercado de trabalho. Dado o número de máquinas, de equipa-
mentos, de infraestrutura da economia, que são aspectos de longo prazo, como já discutimos,
teremos na contratação ou na dispensa dos trabalhadores a contrapartida da evolução do produto
da economia.
Em outros termos, o produto da economia só pode aumentar se mais trabalhadores es-
tiverem sendo contratados para produzir novos bens e serviços. Quando o produto da economia,
por outro lado, decresce significa necessariamente que trabalhadores foram dispensados, estão
desempregados e, portanto, a economia está produzindo abaixo da sua capacidade de produção.
Então, a flutuação do produto tem uma contrapartida direta na flutuação do emprego e inversa
na flutuação do desemprego. Então, entender o mercado de trabalho, a sua dinâmica e como,
a partir dos custos de produção, as empresas formam os seus preços, propiciará condições de
desenhar o conjunto completo, de desenhar a estrutura lógica completa da macroeconomia para
análise de curto prazo.
Nessa estrutura lógica, com desenho desses quatro segmentos, um aspecto muito im-
portante que já podemos observar é o seguinte: a conexão lógica entre os mercados financeiros,
ou seja, o mercado monetário e o mercado de câmbio, e o mercado de bens e serviços representa
o comportamento da demanda agregada.
O que é demanda agregada? Demanda agregada nada mais é do que o conjunto de
demandas da sociedade, não só em termos de bens reais, concretos: carros, arroz, feijão, roupas,
geladeiras, automóveis, serviços médicos, aulas de economia 1 , mas também do ponto de vista
de ativos financeiros 2 .
1
Sempre tem aula de economia nesse pacote, não é mesmo? :-)
2
Para quem já estudou um pouco de macroeconomia em algum momento anterior, estamos nos referindo a
estrutura lógica muito conhecida no ensino padrão da área que é o chamado modelo IS-LM. É um um modelo
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Figura 2 – Fatores que explicam a oferta agregada de curto prazo

Enquanto mercados financeiros e mercado de bens e serviços nos permitem compre-


ender o comportamento da demanda agregada na macroeconomia, o mercado de trabalho será
a chave fundamental para a compreensão do comportamento da oferta agregada. E é por meio
da interação entre a demanda agregada e a oferta agregada que teremos condições de entender
o funcionamento da macroeconomia em seu conjunto, ou seja, teremos um modelo macroe-
conômico completo. Então, nossas atividades, daqui para frente, estarão sempre voltadas para a
compreensão individual de cada um desses segmentos, e lá adiante vamos ter a oportunidade de
dizer exercitar a lógica dessa estrutura em conjunto, de entender como, em conjunto, inflação,
produto, taxa de juros, taxa de câmbio, desemprego e emprego, evoluem ao longo do tempo.

REFERÊNCIAS

MANKIW, N. G. The Macroeconomist as Scientist and Engineer. Journal of Economic


Perspectives, v. 20, n. 4, p. 29–46, sep 2006.

WOODFORD, M. Convergence in Macroeconomics: Elements of the New Synthesis.


American Economic Journal: Macroeconomics, v. 1, n. 1, p. 267–279, jan 2009.

relativamente antigo, e que será aqui substituído por uma versão mais moderna e mais próxima da fronteira da
macroeconomia. Para entender esse processo de desenvolvimento da área, sugiro a leitura de Woodford (2009)
e Mankiw (2006)
Introdução à Demanda Agregada

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Objetivos desta aula: entender flutuação como situações de aquecimento (boom)


e desaquecimento ou recessão e introduzir uma hipótese simplificadora sobre o
comportamento da Oferta Agregada.

Como nosso foco é a compreensão da estrutura lógica que explica as flutuações da ma-
croeconomia, será muito comum que utilizemos a representação gráfica do comportamento do
produto ao longo do tempo e da inflação ao longo do tempo, as nossas duas variáveis macroe-
conômicas fundamentais. Tratamos essas variáveis como fundamentais porque são aquelas que,
uma vez tenhamos alcançado a compreensão do que as determina, teremos condições também
de entender o comportamento também da taxa de juros, da taxa de câmbio, do consumo das
famílias, do investimento dos empresários, das expectativas dos agentes - de todas as variáveis
endógenas intermediárias.
Então é bastante interessante observar que, quando fatores exógenos que, daqui para
frente, chamaremos de choques, quando esses fatores exógenos se alteram, ou seja, quando a
economia sofre choques externos ou internos, as decisões dos agentes se alteram e, ao terem
alteradas as suas decisões em função dessas novas informações, os resultados em termos de
nível de atividade, de produto, de inflação, também se alteram.
A macroeconomia flutua porque ela sofre diversos choques e esses choques fazem com
que os agentes alterem suas decisões. Então, significa que, no curto prazo, o produto estará
acima da sua capacidade de crescimento de longo prazo, ou abaixo dela. A taxa de crescimento
de longo prazo depende, fundamentalmente, dos fatores de longo prazo, como já mencionamos
e voltaremos a eles lá adiante.
Portanto, observemos que se a economia tem uma capacidade de crescer ao longo de
10, 15, 20 anos, se tem uma taxa de crescimento nesse período sustentável em torno de 3% por
exemplo, em certos momentos, em certos trimestres ou em certos anos, esta economia pode estar
crescendo a 4,5%, a 5%, a 7%, porém, essa flutuação, ou seja, a economia se movimentando
no curto e no médio prazo, não expressa a capacidade de crescimento de longo prazo. Ela

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Flutuação da atividade econômica em torno da sua capacidade de


Figura 1 –
crescimento

expressa uma circunstância, um momento atual, em que a economia está superaquecida. Como
a economia alcança essa circunstância e que ajustes e politicas decorrem daí, elucidaremos
mais adiante. Mas apenas para não deixá-los muito curiosos, podemos adiantar que é porque
a utilização da capacidade instalada em termos de capital nunca é utilizada totalmente - em
situações normais, a utilização da capacidade instalada é não ultrapassa 90% em geral.
No entanto, essa circunstância de superaquecimento não é algo que seja sustentável por
décadas e décadas. A partir de um certo ponto e, de acordo com a estrutura lógica da corrente
principal, entenderemos como a revisão da decisão dos agentes frente a essa situação e suas
expectativas sobre o futuro produzirão uma reversão nessa flutuação e a economia começará
a retornar para o seu nível de taxa de crescimento mais próximo da sua capacidade de longo
prazo.
Porém, enquanto esse processo de ajuste endógeno acontece, diversos outros choques
podem afetar a economia, que podem ser, inclusive, negativos no sentido de levar o nível de
atividade para situações de crescimento abaixo do potencial, produzindo um resultado de eco-
nomia desaquecida ou em recessão. A economia em recessão, pela nomenclatura tradicional
adotada em macroeconomia, apresenta pelo menos três trimestres consecutivos de taxa de cres-
cimento negativa. Nós não estamos necessariamente falando de taxa de crescimento negativo
para a economia, mas se a capacidade de crescimento da economia é de 3% ao ano, e essa eco-
nomia começa a crescer a 2,5%, a 2%, a 1,5%, a 0,5%, ela continua com taxas de crescimento
positivas, portanto a economia, no ano, está produzindo mais bens e serviços do que no ano
anterior, porém, está produzindo menos do que ela poderia produzir em condições normais. A
pergunta fundamental que a gente tem que se fazer em situações como essa é: quais são os
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fatores que levaram a economia para uma situação de desaquecimento, em que o nível de em-
prego está baixo e o nível de desemprego está alto. Que fatores são esses? Ao identificar os
fatores, teremos condições de dar a resposta de um milhão de dólares, que é: o que o governo
deve fazer? Ou o que se espera que o governo faça numa situação como essa, a partir da teoria
macroeconômica da corrente principal.

Figura 2 – A estrutura lógica da Demanda Agregada

Para compreendermos a estrutura lógica por trás da demanda agregada, nosso foco
se volta para compreensão de três segmentos da estrutura macro: os mercados financeiros,
compostos pelo mercado monetário e o mercado cambial, e o mercado de bens e serviços. Em
conjunto, esses três mercados nos darão a estrutura da demanda agregada. Portanto, até que
nós completemos nosso estudo desta estrutura lógica, ou seja, dos determinantes e das decisões
dos agentes em cada um desses três segmentos, nós estaremos olhando para a macroeconomia
apenas pelo lado da demanda agregada.
Para simplificar, portanto, adotamos uma hipótese adicional: o produto da economia
será determinando apenas pela Demanda Agregada e manteremos fixa a taxa de inflação. Mais
adiante, essa hipótese será relaxada e nível de atividade e inflação serão reintegrados e compre-
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endidos como uma estrutura única. Porém, nesse momento, para facilitar o nosso aprendizado,
vamos adotar essa estratégia, ou seja, adotar essa hipótese simplificadora inicial e tratar, mais
detalhadamente e com bastante cuidado, a estrutura da demanda agregada supondo portanto que
a oferta agregada seja horizontal, ou seja, que a taxa de inflação esteja fixa.
Efeitos da renda disponível sobre o Consumo das
famílias

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Objetivos desta aula: compreender a lógica da decisão de Consumo das famílias


e o papel do multiplicador keynesiano na dinâmica macroeconômica.

As decisões de dispêndio doméstico, de compras de bens e serviços finais, que se ex-


pressam no mercado de bens e serviços são nosso foco nesta aula, o chamado lado real da
economia. Nesta estrutura lógica, certos tipos de agentes tomam decisões de forma semelhante,
isso vai nos possibilitar entender a decisão, ou as decisões desses agentes de forma segmentada
e nele identificamos três grupos importantes: de um lado nós temos os agentes privados, e do ou-
tro lado o governo. Nesta primeira segmentação, nessa primeira separação, os agentes governo
e agentes privados terão lógicas de decisão diferentes. No contexto dos agentes privados, pode-
remos identificar três subgrupos que estarão tomando decisões em resposta à fatores distintos.
Esses três agentes são: as famílias, que vão representar as decisões de consumo da economia;
os empresários, que representarão as decisões de investimento produtivo, as decisões que estão
associadas ao estoque de capital da economia ao longo do tempo; e um segmento específico,
formado por agentes privados, que tomará decisões basicamente voltadas para a relação do país
com o resto do mundo. Esses agentes serão entendidos e classificados como exportadores e
importadores de bens e serviços.
Claramente, o segmento de exportações e importações está associado às famílias em
relação a sua decisão de consumo, ou seja, as famílias podem decidir consumir bens produzi-
dos domesticamente ou bens importados, bens produzidos por outros países. O mesmo pode
ser observado pelo lado do empresário ao decidir comprar um equipamento que pode ter sido
produzido domestica ou externamente.
Então são quatro tipos de agentes que vão tomar decisões de acordo com as circunstân-
cias da economia, de acordo com alguns fatores que serão mais ou menos importantes para cada
uma dessas decisões. Quando tratamos da decisão dos agentes, nós estamos tratando de teorias

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de tomada de decisão, que é o fundamento básico da nossa ciência, a ciência econômica e,


portanto, também o fundamento básico da macroeconomia, da análise macroeconômica.
Quando nos perguntamos do que depende o consumo das famílias? O que leva uma
família a tomar uma decisão de consumir, de dispender parte da sua renda adquirindo certos
bens ou serviços na economia? Para responder a essa pergunta, nós temos as teorias de consumo
nos ajudam a entender como essas decisões são tomadas, quais são os principais fatores que as
afetam.
Portanto, podemos partir de teorias mais simples, até teorias mais complexas em que
a decisão de consumir será tomada levando em conta não só o momento presente, mas também
o consumo futuro - teorias de decisão intertemporal de consumo. Inicialmente, vamos entender
a decisão de consumo das famílias a partir da perspectiva da teoria keynesiana do consumo.
Nela, vamos encontrar a primeira sistematização de um elemento muito relevante na análise
macroeconômica de curto prazo e que tem um papel dinâmico extremamente importante, que é
o efeito multiplicador.
A princípio, o consumo das famílias depende diretamente da renda que sobra para as
famílias, depois de pagos os tributos ao governo. A renda disponível nada mais é, do que a
renda que sobra para que as famílias possam gastar, possam comprar bens e serviços, após o
pagamento dos tributos, determinados e arrecadados pelo governo. Keynes, em 1936, em sua
Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, consolidou o conceito do efeito multiplicador -
conhecido na literatura como multiplicador keynesiano que é uma consequência lógica do fato
de que as famílias consomem uma parcela da sua renda disponível.
Assim, nossa primeira maneira de entender a decisão de consumo parte da renda dis-
ponível das famílias e do fato de que, em geral, e em média, as famílias, estarão dispostas a
gastar uma parcela da sua renda disponível. A família que decide não consumir integralmente a
sua renda disponível terá uma sobra, uma parcela que é a poupança. Essa divisão entre quanto
consumir e o quanto poupar é dada por um conceito bastante importante na nossa análise, que
é a propensão marginal a consumir. A propensão marginal a consumir indica quanto de cada
unidade adicional de renda disponível as famílias estarão dispostas a gastar em bens de con-
sumo finais, que podem ser duráveis, como geladeira carros, que podem ser semiduráveis,
como equipamentos eletrônicos, equipamentos, roupas, por exemplo, que duram um período
relativamente curto de tempo; ou não duráveis, que basicamente dizem respeito aos bens de
consumo associado à alimentação, ao transporte, à locomoção, à diversão. Então, as famílias
podem consumir quaisquer desses bens ou serviços disponíveis na economia. Quando elas deci-
dem que parcela elas devem consumir e que parcela elas devem poupar, elas estão expressando
isso que chamamos de propensão marginal a consumir.
O conceito de propensão marginal a consumir, quando levamos em conta as famílias
como um todo, ou seja, o agregado, a macroeconomia, sempre será alguma parcela entre 0 e
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1, excluindo os dois extremos. Significa que, em média, em geral, as famílias estão dispostas
a consumir 50% da sua renda disponível ou 70% da sua renda disponível ou 90% da sua renda
disponível ou 40%, ou seja, qualquer fração entre 0 e 1. Isso vale para o agregado, mas obvi-
amente pode haver, individualmente, uma família que decida consumir mais do que sua renda
disponível. Como isso é possível? Uma família pode consumir, num determinado período de
tempo, mais do que a sua renda disponível. Quais são os mecanismos que propiciam essa troca
da família entre o consumo presente e o consumo futuro? Esses mecanismos estão exatamente
nos mercados financeiros. É sempre possível para uma família que queira consumir mais do
que a sua renda disponível, se ela tem acesso aos mercados de crédito, ela pode antecipar a sua
renda futura tomando o crédito do mercado de crédito e, portanto, hoje ela pode consumir 120%
da sua renda, por exemplo, isso é perfeitamente factível para uma família individualmente.
Porém, quando consideramos o agregado, vamos observar que não é possível que as
famílias consumam 120% da renda disponível na economia. Enquanto certas famílias indivi-
dualmente podem consumir mais do que tem como renda disponível, outras famílias podem
consumir uma parcela muito pequena da sua renda disponível,pr exemplo, 10% da sua renda
disponível, 5% da renda disponível. Normalmente, uma família que consome mais do que sua
renda disponível, está trazendo renda futura para o presente, está tomando um crédito no mer-
cado de crédito. Em geral, famílias de mais baixa renda, em certos momentos, tomam essa
decisão. Por quê? Porque querem antecipar, por exemplo, o consumo de um bem durável ou
semidurável. Querem adquirir, por exemplo, uma nova geladeira, um novo carro, então, em
certos momentos, essas famílias podem antecipar as suas rendas no mercado de crédito.
Por outro lado, na outra ponta, famílias de renda mais elevada na economia, em geral,
já tem um nível de consumo bastante elevado. Digamos que as suas necessidades básicas certa-
mente já estão satisfeitas e que as suas necessidades adicionais, de bens de luxo, por exemplo,
também estão razoavelmente satisfeitas, de tal forma que, quando essa família têm mais renda
disponível, ela continua gastando uma parcela pequena desta renda disponível com consumo.
Então, as famílias de mais alta renda, em geral, têm uma propensão marginal a consumir mais
baixa. As famílias de mais baixa renda, em geral, apresentam uma propensão marginal a consu-
mir mais elevada. Em média, a economia vai expressar, em termos agregados, o comportamento
médio dessas famílias de distintas propensões marginais a consumir, então, digamos que, em
média, considerando a economia como um todo, as famílias dispendam, gastem em bens de
consumo cerca de 60%, 70% da renda disponível. Os outros 40% ou 30% se transformam em
poupança, e essa poupança, como veremos mais adiante, será extremamente importante para
o financiamento de projetos de investimento que levem ao aumento do estoque de capital na
economia.Trataremos novamente desse tema lá no módulo de crescimento econômico.
Por ora, basta que entendamos que as famílias não podem escolher consumir 0% da
sua renda disponível. Por que motivo? Porque o consumo é exatamente aquilo que faz com
que as famílias tenham os bens e serviços necessários para sua sobrevivência. Então, se a gente
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

pensar em termos abstratos, se uma família não consome bens de consumo, o que acontece com
essa família ao longo do tempo? Ela não sobrevive. Portanto, a economia não existiria com
uma propensão marginal a consumir igual a zero. Por outro lado, também, não podemos pensar
que as famílias, em média da economia, pudessem consumir 100% da sua renda disponível.
Isso significa que tudo que estaria sendo produzido na economia, num determinado período
de tempo, estaria sendo comprado e consumido pelas famílias, o que significa dizer que não
haveria bens e serviços de investimento nesta economia. Se, de novo, pensamos em termos
bastante abstratos, se a economia não tem bens de investimento, o estoque de capital dessa
economia ao longo do tempo declina, e essa economia também tenderia a desaparecer. Então,
os extremos 0 e 1 estão fora do que se registra como possibilidade média para o comportamento
da propensão marginal a consumir.
A partir da propensão marginal a consumir, surge um elemento dinâmico muito rele-
vante. Para nossa análise, considere que produto e a renda sejam sinônimos, desconsiderando
alguns aspectos mais técnicos de mensuração do produto e da renda, que não é o nosso foco.
Pensemos que um fator externo propicia a elevação do produto na economia. Que fator ex-
terno pode ser este? Um exemplo bastante simples e imediato, é um comportamento de um
país externo. Pensemos que a economia dos Estados Unidos esteja passando por um momento
de superaquecimento, que o produto americano está crescendo bastante, o que significa que os
americanos devem estar comprando mais bem brasileiros. Isso vai produzir uma elevação no
nível de atividade brasileiro, que entenderemos melhor em alguns instantes, porém já observa-
mos aí um efeito externo, um choque externo positivo, fazendo com que o produto da economia
brasileira cresça. Quando o produto da economia cresce, a renda da economia cresce. Quando
a renda cresce, o que acontece com o consumo das famílias? Cresce também. Quanto? Um
pedacinho do que cresceu a renda.
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE I 5

Figura 1 – Consumo das famílias e o multiplicador keynesiano

Que pedacinho é esse? A propensão marginal a consumir. Então, apenas para ficar
mais concreto, vamos colocar números neste exemplo: se a renda adicional, se a renda se
elevou em 100 unidades monetárias, em R$ 100 por exemplo, de quanto o consumo das famílias
se elevaria? Os R$ 100 iniciais foram devidos ao aquecimento das economias externas, que
propiciaram as exportações e, portanto, o produto da economia brasileira cresceu em R$ 100,
a renda da economia brasileira cresceu em R$ 100, esse é o impacto inicial. Num segundo
momento, esse impacto inicial vai ter uma resposta por parte de quem? Das famílias. Por
quê? Porque se as famílias têm 100 unidades monetárias, R$ 100 a mais, de renda disponível,
quanto elas consumirão? Elas consumirão uma parcela dessa renda adicional, por exemplo,
50%. Então, vejam que os R$ 100 iniciais, vão levar as famílias a consumirem mais. Quanto
a mais? Por exemplo, R$ 50 a mais. Significa que, as famílias vão comprar bens e serviços
da economia, de quanto? De R$ 50 a mais. Isso significa que a renda da economia subiu
novamente. Se o produto da economia subiu de mais 50, a renda subiu novamente demais
50. Isso produz um segundo movimento de resposta do consumo das famílias. Então, agora,
as famílias vão consumir uma parcela desses 50. Quanto? 50%, supondo que a propensão
marginal a consumir seja 50%, que corresponde a um consumo adicional de 25 reais.
Quando as famílias decidem consumir em função do aumento da renda, a cada etapa
de consumo se produz um aumento adicional de renda, que produz um aumento adicional de
consumo, que produz um aumento adicional de renda. Enfim, este processo vai nos levar a
uma sequência de pequenos aumentos ao longo do tempo, então é preciso que haja tempo na
nossa análise, ou seja uma análise dinâmica. Ao longo do tempo, esse processo vai produzir um
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 6

efeito final superior aos R$100 iniciais que foram produzidos pelo efeito externo. Este é o efeito
multiplicador, ou chamado multiplicador do consumo keynesiano. Este efeito multiplicador faz
com que a renda, ao final desse processo, cresça a um múltiplo da mudança inicial, que depende
da propensão marginal a consumir.
Se observamos essa sequência de pequenos pedacinhos, teremos uma sequência con-
siderada uma progressão geométrica, cuja soma infinita é o próprio multiplicador do consumo.
Para não fugir do propósito de manter a nossa explicação no nível da lógica da teoria econômica,
utilizando o mínimo possível de recursos técnicos formais matemáticos, observemos apenas que
o resultado final desse impacto multiplicador é expresso por 1/(1-menos a propensão marginal
a consumir). Assim, se a propensão marginal a consumir é de 50%, teríamos um efeito mul-
tiplicador de 2, ou seja, o impacto inicial de 100 unidades monetárias de elevação do produto
causado por fatores externos, produziu, nessa sequência de retroalimentação da renda com con-
sumo, do consumo com dispêndio doméstico, do dispêndio doméstico com a renda, da renda
com consumo, levaria a um crescimento final da renda de duas vezes 100, ou seja, 200. Este
é o efeito multiplicador, é um efeito dinâmico muito importante para entender a estrutura e a
conjuntura macroeconômica, principalmente do ponto de vista do nível de atividade ao longo
do tempo.
Efeitos da taxa de juros e das expectativas sobre o
Consumo das famílias

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: compreender como taxa de juros e confiança do consumidor


afetam a decisão intertemporal de consumo das famílias.

Já apresentamos um primeiro fator extremamente relevante para entender a decisão de


consumo das famílias, expressa na propensão marginal a consumir e o respectivo multiplicador
keynesiano. Porém, esse não é o único fator que afeta a decisão de consumo das famílias.
As teorias mais modernas de consumo nos levam a entender o efeito da taxa de juros sobre a
decisão de consumo, e neste caso, estamos considerando que as famílias levem em conta não só
o consumo no momento presente, mas também o consumo futuro.
Deste ponto de vista, nós podemos entender a poupança do momento presente como
sendo a fonte para propiciar o consumo do futuro. Mas o que leva uma família a decidir consu-
mir no futuro e não no presente? O que leva uma família a tomar essa decisão é como ela será
remunerada pela sua poupança. Muito bem, então vejamos que aqui, já começamos a identifi-
car uma conexão entre o mercado de bens e serviços e os mercados financeiros. Por quê? A
maneira como a família será remunerada pela sua poupança, está associada a formação da taxa
de juros nos mercados financeiros.
A partir do momento em que a decisão de não consumir e de poupar é tomada, a família
está levando em conta como ela será remunerada por sua poupança, ou seja, como ela poderá
consumir no futuro. Será que ela poderá consumir mais no futuro do que ela consumiria hoje?
A resposta é sim, por quê? Porque a renda no futuro será valorizada, ou seja, ela receberá
uma remuneração, ela receberá uma taxa de juros, de tal forma que no futuro a família possa
consumir mais do que ela consumiria hoje. Então, estamos observando que a taxa de juros é um
fator extremamente relevante para a decisão de consumo das famílias.
Nós estamos identificando, então, dois fatores importantes para a decisão de consumo
das famílias. O primeiro deles é a renda disponível, que propicia o elemento dinâmico do multi-
plicador keynesiano, que já tratamos. E agora, estamos observando que a taxa de juros também

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

é um elemento relevante na decisão de consumo ao longo do tempo, chamada de decisão de con-


sumo intertemporal das famílias. Ao longo do tempo, taxas de juros mais elevadas incentivam
as famílias a pouparem mais do que consumirem, por quê? Porque se a taxa de juros se eleva, a
poupança que a família decide fazer hoje, valerá mais amanhã, e propiciará mais consumo ama-
nhã. Essa é uma explicação mais moderna para a decisão de consumo das famílias, que leva em
conta não só a decisão do momento corrente, que depende da renda disponível, mas também a
decisão de consumo de todos os períodos de hoje para o futuro, que essa família terá de tomar
e terá que reavaliar a sua decisão entre consumir e poupar ao longo do tempo. Portanto, quanto
maior a taxa de juros, quanto mais elas forem remuneradas pela sua poupança, será, então,
um incentivo para que as famílias consumam menos hoje e poupem mais para consumir mais
amanhã.
Em síntese: quanto maior a renda disponível, mais as famílias consomem e maior o
efeito multiplicador propiciado pela propensão marginal a consumir; quanto maior a taxa de
juros, as famílias decidem consumir menos hoje, poupar mais e assim terem a possibilidade
de consumir mais ao longo dos períodos futuros com a renda adicional da taxa de juros sobre
a poupança do momento presente. A taxa de juros é o custo de oportunidade que as famílias
têm na sua relação entre o consumo presente e o consumo futuro. Então, a conexão entre os
mercados de bens e serviços e os mercados financeiros começa a ficar desenhada na nossa
estrutura lógica da macroeconomia.
É muito importante observar que, nesta decisão entre o consumo presente e o consumo
futuro, um outro elemento, da ordem das preferências das famílias é muito relevante. Este outro
elemento diz respeito à impaciência que as famílias apresentam em relação ao consumo. As
famílias expressam a sua impaciência em relação ao consumo quando decidem descontar renda
futura para consumir hoje. Então, quanto mais os agentes utilizam o crédito para financiar o
seu consumo, isso nos dá uma indicação de que a preferência por consumir hoje e não consumir
amanhã é maior do que a remuneração que eles receberiam para deixar de consumir hoje, ou
seja, poupar, e consumir mais amanhã. Então, é muito importante que levemos em conta,
e sempre estejamos alertas para compreendermos melhor as decisões de consumo, que essas
decisões estão associadas às características de impaciência em relação ao consumo, que famílias
diferentes apresentam.
Para dar um exemplo muito simples, muitas vezes nos perguntamos porque que as
famílias compram bens financiados, com taxas de juros muito elevadas, mas ainda assim tomam
a decisão de obter o bem e consumir o bem no presente. Certamente é porque a impaciência em
relação ao consumo, ou seja, a taxa intemporal de preferência dessas famílias, é mais elevada
do que o custo de oportunidade, que é a taxa de juros que o mercado financeiro vai oferecer pela
poupança dessa família. Então é bastante comum que certas famílias antecipem o seu consumo
utilizando o mercado de crédito, mesmo quando as taxas de juros estão muito elevadas. Então,
é perfeitamente possível e compreensível a partir da teoria econômica da tomada de decisão,
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE I 3

que famílias tomem esse tipo de atitude.


Além desses fatores que nós estamos ressaltando, é importante também chamar aten-
ção para o fator expectativas. As expectativas que as famílias têm em relação à sua capacidade
de gerar renda no futuro, em relação às condições da economia no futuro, em relação às con-
dições das taxas de juros no futuro, essas expectativas afetarão a decisão das famílias hoje.
Portanto, muitas vezes, observamos que as economias apresenta um comportamento de con-
sumo das famílias que não necessariamente está refletindo a renda disponível de hoje, ou a taxa
de juros de hoje, mas está refletindo aquilo que as famílias esperam que aconteça com a renda
no futuro e com a taxa de juros no futuro.
As expectativas são um elemento fundamental na decisão dos agentes, e não é dife-
rente em relação à decisão das famílias sobre consumir e poupar, ou seja, sobre consumir hoje
ou consumir amanhã. Além dos elementos que já destacamos, precisamos levar em conta tam-
bém os aspectos associados às expectativas das famílias em relação ao comportamento dessas
variáveis no futuro. Muitos países buscam captar essas expectativas em indicadores de confi-
ança do consumidor, que tentam captar exatamente a sensação, as expectativas das famílias em
relação ao futuro das suas próprias rendas, da economia, das taxas de juros, da remuneração dos
seus ativos financeiros, como a poupança. Portanto, esses indicadores de confiança do consu-
midor, de certa forma, potencialmente nos dão informações sobre as expectativas dos agentes.
Por exemplo, por questões que podem estar associadas ao resto do mundo ou ao cenário polí-
tico doméstico, as famílias podem acreditar que tal crise se estenderá por um período longo e,
portanto, as suas expectativas em relação ao futuro levam as famílias a consumirem menos hoje.
Então, renda disponível, taxa de juros e, as expectativas das famílias em relação ao
comportamento futuro afetam sua decisão de consumir hoje. Apresentamos, assim, de uma
maneira sintética e bastante completa, a decisão de consumo das famílias de uma perspectiva
bastante moderna, muito semelhante à maneira como as modernas teorias de análise macroe-
conômica consideram em seus modelos dinâmicos de equilíbrio geral. O próximo passo será
entender como se dá a decisão de investimento produtivo.
Decisões de Investimento Produtivo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: diferenciar investimento produtivo e investimento finan-


ceiro, elucidando os principais aspectos que afetam a decisão de investir produtiva-
mente e como avaliar a rentabilidade do investimento.

Após estudar o componente consumo das famílias, o foco principal desta lição é com-
preender como são tomadas as decisões de investimento produtivo. Iniciamos chamando a
atenção para uma diferença muito importante: entre o investimento produtivo ou investimento
econômico e o investimento financeiro. O investimento produtivo é um investimento que está
voltado para a produção de novos bens e serviços, que serão utilizados no processo produtivo
para a produção no período seguinte - os chamados bens de investimento, aqueles bens que
propiciam a continuidade da produção na economia. O investimento financeiro diz respeito
às decisões de alocação de carteira ou portfólio, em que ativos financeiros os agentes decidem
colocar a sua riqueza 1 .
O investimento produtivo respeito à produzir novas máquinas, novos equipamentos,
nova infraestrutura, prédios e edificações, estradas, telecomunicações, extração de recursos na-
turais, produção de minérios, de aço, de ferro, elementos que, na composição da economia,
estão relacionados com a capacidade de produzir bens e serviços. É o que chamamos de esto-
que de capital, que nada mais é que o acúmulo de investimento produtivo ao longo do tempo.
A cada momento de tempo, digamos, um trimestre, temos uma mensuração do total
de investimento produtivo, que estará disponível para ser comprados e utilizados no processo
produtivo da economia. A cada período, essa quantidade se acumula ao longo do tempo e forma
o estoque de capital da economia. Obviamente, ao longo do tempo esse mesmo estoque vem
sendo utilizado para a produção de bens e serviços em geral, não só de capital, mas também de
consumo, sobre os quais já conversamos. Neste processo de utilização do estoque de capital no
1
Riqueza é o acúmulo, o estoque de poupança que os agentes foram realizando ao longo do tempo até o momento
presente

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

processo produtivo, há uma depreciação do estoque de capital, que deve ser superior à depre-
ciação do estoque utilizado neste mesmo período, para que o estoque de capital da economia
continue a crescer ao longo do tempo.
Quando o estoque de capital permanece relativamente constante, ou seja, não se altera
de maneira significativa, significa que, naquele período, o investimento praticamente ficou igual
à depreciação do uso do estoque de capital anterior.
A decisão de investir produtivamente é uma decisão extremamente complexa, que
requer um conjunto de informações bastante amplo. Muitas vezes, o grau de precisão desse
conjunto de informações não é muito elevado, muitas vezes nós tomamos a decisão de investir
produtivamente sobre um cenário de grande incerteza, ou de grande risco, como preferirmos.
Quanto maior o risco, maiores são as chances de que aquela decisão não seja bem sucedida no
futuro.
Os agentes na economia que são os responsáveis por tomar a decisão de investimento
produtivo são as empresas, que têm uma perspectiva de lucratividade futura, e que hoje deve
tomar decisões de, por exemplo, substituir um equipamento no seu processo produtivo, investir
em equipamentos com maior tecnologia, de construir um novo galpão para estocar os seus
produtos acabados e prontos para venda ou para estocar matéria-prima, e, dessa forma, a tornar
o seu negócio ainda mais produtivo e lucrativo.
As decisões de investimento produtivo podem ser tomadas no âmbito de uma empresa
que já está em processo de desenvolvimento, que já existe, ou pode ser um novo projeto de in-
vestimento em que um empresário, um investidor produtivo, pretende iniciar um novo negócio,
que vai levar à produção de novos bens e serviços no futuro.
A primeira complexidade dessa tomada de decisão é ter de considerar um horizonte
de tempo relativamente longo, que é a vida útil do projeto. Por exemplo, a construção de um
novo galpão para estoque tem uma vida útil de mais de 20 anos, já que se trata de construção
civil. Tomar a decisão no momento presente, levando em conta que uma máquina, por exemplo,
pode durar 10 anos, é um tempo longo de planejamento. Para tanto, o investidor precisa medir,
de alguma maneira, qual é o retorno que esse investimento pode lhe oferecer, uma variável
extremamente relevante para a tomada de decisão do empresário.
Para termos uma ideia da complexidade de uma análise de um projeto de investimento,
precisamos projetar ao longo da vida útil daquela máquina, ou daquele novo processo produtivo
que está sendo desenvolvido, o fluxo de caixa que esperamos receber, por realizar este novo
investimento.
O fluxo de caixa pode ser entendido como a diferença entre as receitas que aquele
investimento propiciará à empresa, subtraídos dos custos que deverão acompanhar o processo
produtivo desse novo equipamento, deste novo projeto, ao longo da sua vida útil. Se estamos
falando de um investimento de vida útil de 10 anos, estamos falando em projetar esses fluxos
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE II 3

Figura 1 – Investimento produtivo: complexidade

de caixa ao longo desses 10 anos, que é uma tarefa bastante complexa.


Normalmente, há a perspectiva sobre como a economia evoluirá ao longo do tempo,
trata-se basicamente da relação da macroeconomia com o setor em que aquele projeto se insere,
como neste setor está evoluindo a tecnologia, como estão os concorrentes deste projeto neste se-
tor, custos e matérias-primas que serão utilizadas no processo produtivo, a força de trabalho que
será contratada para operar, para gerenciar esse projeto de investimento, ao longo da sua vida
útil, etc., uma série de variáveis são relevantes para que possamos ter, minimamente, condições
de projetar esse fluxo de caixa.
Se pensarmos que há uma série de informações e de variáveis, que são difíceis de serem
medidas e previstas neste processo de análise do projeto, passamos a entender o quão importante
é a disponibilidade deste empresário, deste empreendedor, em realizar o seu projeto, mesmo
estando sujeito a uma análise, que, na melhor das hipóteses, poderá ser realizada de acordo
com cenários. Para minimizarmos os riscos, projetamos esse fluxo de caixa para um cenário
moderado, digamos o cenário mais provável para a economia, comparado aos piores fatores
que podem se alterar e afetar negativamente a previsão, o cenário pessimista. E eventualmente,
também, podemos estar interessados no desempenho desse projeto de investimento no caso de
uma mudança para um cenário mais otimista. Mas, obviamente, interessa ter muito mais clareza
sobre o que seja o cenário moderado e o que seja o cenário pessimista.
Custo de oportunidade e expectativas

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Destacar a relevância, para a decisão de investir produtiva-


mente, da remuneração de alternativas ao investimento produtivo e das expectativas
dos empresários sobre o retorno esperado do seu projeto.

Uma vez projetados os fluxos de caixa para os diversos cenários possíveis de análise,
ao longo da vida útil do projeto de investimento, uma outra informação muito relevante para
a tomada de decisão é: qual é o montante de investimento hoje? De quanto será necessário,
qual o montante de recursos, qual o valor do investimento necessário hoje? É chamado de I0 ,
investimento no momento inicial. É o montante de recursos necessário para que aquele fluxo de
caixa seja produzido ao longo da vida útil do projeto de investimento.
Essa informação é relativamente simples, porque basta cotar em mercado, no momento
presente, os preços de todos os recursos, de todos os equipamentos, de todos as matérias-primas,
de toda infraestrutura, do trabalho, de todos os elementos que serão necessários para que o
projeto comece a operar. Considerando a complexidade das demais informações, essa é uma
informação relativamente simples de ser obtida, que é de quanto o empresário precisa hoje para
realizar o seu projeto de investimento. A partir do montante inicial de investimento e do fluxo
de caixa esperado, é possível obter o retorno esperado desse projeto de investimento, que é a
taxa interna de retorno 1 .
O retorno esperado do projeto de investimento é uma Taxa Interna de Retorno (TIR),
que é a taxa que traz o fluxo de caixa esperado deste projeto ao valor presente do investimento
inicial. Se o restorno esperado do projeto for maiso que um dado custo de opotunidade, o
projeto é economicamente viável, ou seja, é a melhor alternativa de uso dos recursos. Tomemos
1
As técnicas matemáticas de análise de projeto ou de qualquer fluxo de caixa de ativos financeiros são o Valor
Presente Líquido (VPL), A Taxa interna de Retorno (TIR), medidas de relação Benefício-Custo e de payback
descontado

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

como exemplo os investimentos A e B, com vidas úteis de 5 anos e fluxos de caixa esperados
(FC) e são descritos na Tabela 1:

F C1 F C2 F C3 F C4 F C5
I0 = + 2
+ 3
+ 4
+
1 + T IR (1 + T IR) (1 + T IR) (1 + T IR) (1 + T IR)5

Tabela 1 – Exemplos de projetos de investimento

A B

Investimento inicial (I0 ) (250.000) (210.000)


Ano 1 70.000 50.000
Ano 2 80.000 50.000
Ano 3 80.000 80.000
Ano 4 60.000 80.000
Ano 5 50.000 60.000

Taxa Interna de Retorno 11,95% 14,90%

Valor Presente Líquido R$ 11.884,1237 R$ 28.778,40

Fonte: Elaboração própria.

O Valor Presente Líquido (VPL) é o resultado entre o valor presente do fluxo de caixa
descontado a um custo de oportunidade, no caso dos exemplos é tomada uma taxa de 10%, e o
montante de investimento inicial. Caso esse resultado seja positivo, o projeto é economicamente
viável.
Ambos os projetos do exemplo são economicamente viáveis, porém o projeto B apre-
senta um retorno esperado mais elevado e, se os fundos forem escassos, este seria preferível a
A.
É importante fazer uma distinção nesse momento: estamos interessados no retorno es-
perado em termos reais, e não em termos nominais e, portanto, precisamos descontar a inflação
deste retorno e observar o retorno real que esperamos obter no projeto de investimento. Mais
adiante, também, quando tratarmos de mercados financeiros, será reforçada esta relação entre
retorno e taxa de juros nominal e real, porém, basta nesse momento termos em mente que o que
é importante para a tomada de decisão é o retorno real esperado pelos investidores. Neste caso,
nós temos então uma das variáveis importantes para a tomada de decisão, que é obtida a partir
da própria análise do projeto de investimento.
Observamos desde já que, para que esse fluxo de caixa seja formado é muito importante
que ressaltemos o papel das expectativas em relação ao futuro. As expectativas do empresário
afetam a maneira como este fluxo de caixa vai ser mensurado. Então, se houver, de fato, empre-
sários que estão um tanto quanto pessimistas em relação ao futuro, esse pessimismo pode afetar
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE II 3

sua disposição em aceitar realizar um projeto, cujo retorno esperado não lhe pareça suficiente-
mente elevado. E aí é que vem a variável parâmetro de comparação relevante, que é seu custo
de oportunidade. O custo de oportunidade do projeto de investimento produtivo diz respeito
ao retorno de outras possíveis aplicações desse mesmo recurso, aquilo que deixo de ganhar,
quando decido realizar o projeto de investimento produtivo.
Então, vejamos: quais são as opções do empresário? Vamos supor que, inicialmente,
esse empresário tenha o montante de recursos I0 , obtido por meio de lucros anteriores na sua
empresa, ou que ele próprio vá fazer o aporte a partir do seu estoque de riqueza pessoal para
realização do projeto de investimento. Partindo dessa hipótese, o I0 está disponível. Quais são
as alternativas? Ou o empresário realiza o projeto de investimento produtivo ou, simplesmente,
ele aloca aquele montante em ativos financeiros alternativos. No lugar de realizar o projeto de
investimento produtivo, que propiciará um fluxo de caixa, com chances de prover uma certa
taxa de retorno esperado, sob um certo grau de risco, o empresário pode simplesmente optar
por alocar esse recurso no mercado financeiro, comprando ativos financeiros e recebendo a sua
remuneração. Então, o custo de oportunidade para o investimento produtivo é, simples-
mente, o retorno dos ativos financeiros que o empresário abre mão quando decide realizar
o projeto de investimento.
Porém, se o empresário não dispuser do I0 para realizar o projeto de investimento,
ele poderá buscar fontes de financiamento nos mercados financeiros, reforçando o fato de que o
custo de oportunidade relevante para um projeto de investimento produtivo, diz respeito ao custo
dos fundos que os empresários captariam no mercado financeiro para financiar o seu projeto.
Por hora, vamos tratar este custo de oportunidade como se fosse a taxa de juros dos ativos
financeiros, do mercado financeiro. O empresário realizará o investimento produtivo sempre
que o retorno esperado do seu projeto de investimento produtivo superar aquilo que ele está
abrindo mão, que é o retorno do mercado financeiro.
Dado o grau de incerteza/risco sobre o fluxo de caixa projetado, para que haja uma
decisão em favor do projeto de investimento, a rentabilidade esperada desse projeto deve ser
relativamente elevada quando comparada ao custo de oportunidade. Para dar um exemplo con-
creto, vamos pensar que o investimento produtivo tem uma perspectiva de gerar um retorno de
15% ao ano para o investidor, sendo que este retorno esperado foi detectado no cenário mo-
derado. No cenário pessimista, esse mesmo projeto de investimento teria uma perspectiva de
retorno de 10%. Quando comparado às alternativas de um mercado financeiro que, por exemplo,
tem uma taxa média de remuneração dos seus ativos de 10%, vejam que a decisão de investir
produtivamente já fica um pouco mais difícil, pois, se o cenário pessimista acontecer, o retorno
esperado do projeto de investimento, fica praticamente igual ao retorno dos ativos financeiros.
Pois bem, como o risco é muito elevado, e a decisão de investir produtivamente uma decisão
muito difícil de ser desfeita instantaneamente, naturalmente há uma tendência do empresário a
desistir do seu projeto de investimento produtivo e não captar recursos no mercado financeiro,
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

ou não utilizar os seus próprios recursos e alocar os seus próprios recursos em ativos financeiros
disponíveis, obtendo 10% de retorno, com, talvez, um pouco menos de risco do que aquele que
ele teria se decidisse realizar o seu projeto de investimento produtivo.
Mas, por que a decisão de investir produtivamente é tão difícil de ser desfeita? Por
que ela não pode ser mudada muito rapidamente? Por um motivo muito simples, ela envolve
a compra de ativos reais, e ativos reais são ativos de baixa liquidez na economia, ou seja,
dificilmente um empresário que comprou um equipamento, que montou um galpão, que colocou
uma empresa para operar, vai conseguir se desfazer desses ativos de maneira rápida sem ter uma
grande perda de capital. Por envolver ativos de baixa liquidez, tomar a decisão hoje e desfazê-la
daqui a um ano é, normalmente, um processo que imputa uma elevada perda de capital para o
empresário.
Essa análise é bastante rica e ilustra, em grande parte, o processo de tomada de deci-
são, principalmente quando nós levamos em conta as expectativas dos empresários neste fluxo
de caixa projetado, e na obtenção da taxa esperada de retorno do projeto de investimento. Key-
nes (1982) chamou essa taxa esperada de retorno de eficiência marginal do capital. Neste
contexto, a decisão de investir produtivamente deveria levar em conta o diferencial entre a efi-
ciência marginal do capital e o seu custo de oportunidade, que como já dissemos, reflete a taxa
de juros dos mercados financeiros.
A partir da perspectiva da Teoria Keynesiana, temos aqui condições de entender de que
fatores depende a decisão de investimento produtivo. Mais recentemente, temos contribuições
dos desenvolvimentos das teorias de portfólio e uma abordagem mais moderna para esta tomada
de decisão pode ser entendida a partir da perspectiva, por exemplo, do chamado “q de Tobin”
(veja (FAMÁ; BARROS, 2000) ou (BODIE; KANE; MARCUS, 2014)) que é, nada mais, do
que uma avaliação do valor de mercado do projeto, em contraposição ao seu custo de reposição.
A decisão de investimento produtivo, como então acabamos de verificar, está sempre
bastante sujeita ao que Keynes chamou de espírito animal dos investidores, ou seja, a sua
disposição em aceitar riscos, que muitas vezes são difíceis de serem mensurados. Se pensar-
mos hoje na perspectiva dos empreendedores, dos empresários que apostam e realizam projetos
inovadores, como fazer essa conta? Como calcular a eficiência marginal do capital, a taxa in-
terna de retorno ou o retorno esperado desses projetos de investimento? Há muitas incertezas
envolvendo esse tipo de decisão. É claro que o exemplo aqui foi um pouco mais extremo, inves-
timento em projetos inovadores tem muito mais essa característica, mas é apenas para chamar
atenção para o fato de que investimento produtivo em geral é uma a decisão que pode flutuar,
que pode produzir um grau de instabilidade na demanda agregada, que muitas vezes pode re-
querer uma contraposição de atuação por parte do governo.
E este é justamente o papel que, dentro do contexto dos componentes da demanda
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE II 5

agregada 2 , é ressaltado pela teria Keynesiana para o governo. Como as decisões de investimento
são instáveis, o gasto do governo faria o papel de contrabalancear momentos da economia em
que a demanda agregada esteja flutuando como decorrência de decisões privadas, cabendo ao
governo o papel de estabilizar a demanda agregada.
Obviamente, de lá para cá a nossa compreensão do papel do governo na economia
evoluiu bastante, hoje a perspectiva da decisão do governo entre gastar ou não leva em conta
aspectos que necessariamente requerem que o governo cumpra uma certa função na economia,
dentro da sua possibilidade de realização de política fiscal e mantenha intertemporalmente o
seu orçamento equilibrado. Então, a perspectiva moderna não olha mais apenas para o gasto
do governo como se ele estivesse desconectado da fonte de receitas. Vamos, então, elucidar,
de uma maneira relativamente simples, como é que se dá o processo de decisão do governo
em relação aos seus gastos, em relação aos tributos, e como isso afeta a estrutura da demanda
agregada.
REFERÊNCIAS

BODIE, Z.; KANE, A.; MARCUS, A. J. Investments. 10. ed. New York, N.Y.: McGraw-Hill
Education, 2014. ISBN 9780077861674.

FAMÁ, R.; BARROS, L. Q de Tobin e seu uso em finanças: aspectos metodológicos e


conceituais. Caderno de Pesquisas em Administração, v. 7, n. 4, p. 27–43, 2000.

KEYNES, J. M. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. [S.l.: s.n.], 1982. ISBN
853510917X.

2
Consumo das famílias, investimento produtivo, gastos do governo e exportações líquidas
Gastos do Governo e Política Fiscal

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: compreender os princípios da tomada de decisão do go-


verno, considerando que ele opere sob um regime de sustentabilidade fiscal.

A proposta aqui não é discutir detalhadamente o papel econômico do governo em


uma economia, apenas delinear os princípios da sua tomada de decisão. Apesar de saber que
a maioria das decisões de um governo se dá por motivos políticos, aqui serão representados
apenas os aspectos econômicos dessa tomada de decisão.
É necessário ressaltar que o componente de gasto presente na demanda agregada diz
respeito aos gastos correntes, que são os gastos para manutenção da máquina pública, gasto
com pessoal, com matéria-prima, com todo o funcionamento do governo, em seus diversos
níveis, Municipal, Estadual e Federal, mas também estamos falando de gastos do governo em
investimentos produtivos, os chamados gastos de capital.
Da perspectiva do orçamento público, gastos e receitas precisam ser considerados. As
receitas basicamente advêm da arrecadação de tributos, que podem ser divididos em três tipos:
os impostos, as contribuições, e as taxas e tarifas. A cada período de tempo, esses gastos e
receitas são contabilizados e produzem um resultado. A diferença entre gastos (G) e receitas
(R) fiscais é do que chamamos de resultado primário. Quando o governo adota uma meta de
superávit primário, significava que o governo objetiva arrecadar mais do que gasta em termos
de orçamento fiscal. Porém, podem ocorrer também déficits primários, ou seja, resultados em
que os gastos são maiores que a arrecadação de tributos líquidos de subsídios.

Resultado primário = G − T > 0 ==> Déficit primário

Resultado primário = G − T < 0 ==> Superávit primário

Embora a fonte original de arrecadação de receitas do governo sejam os tributos, even-


tualmente, os governos antecipam receitas futuras nos mercados financeiros por meio da emis-
são de dívida. A emissão de dívida hoje, nada mais é do que a antecipação do tributo que o

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

governo pretende arrecadar amanhã. Então, é possível obter recursos emitindo títulos de dívida
nos mercados financeiros, que terão de ser devolvidos em uma certa data, em 10 anos, 15 anos,
em 5 anos, que é o prazo de maturidade desses títulos.
Então, de certa forma, estamos transferindo para gerações futuras o pagamento das
dívidas, ou das necessidades de financiamento do governo de hoje. Essas necessidades de
financiamento não são compostas apenas pelo resultado primário. Assim como o governo pode
emitir dívida hoje, para financiar a sua necessidade de financiamento hoje, ele pode ter feito
isso em outros momentos do passado e, portanto, em geral os governos têm já um estoque de
dívida em mercado.
E esse estoque de dívida requer que o governo remunere os ofertantes de recursos
financeiros informando-os sobre essa remuneração no momento em que essas dívidas (Bt ) são
colocadas a mercado. Então, ao longo do tempo, a emissão de dívidas no passado (Bt−1 )
vai produzindo a necessidade de pagamento de juros ao longo dos períodos futuros. Quando
consideramos esse fluxo de pagamento de juros que o governo precisa fazer e somamos esse
fluxo ao resultado primário, temos um outro conceito muito importante em Finanças Públicas
que é o resultado nominal, também chamado de necessidade de financiamento do setor
público - NFSP, medida em um período (mês, trimestre, ano).

Resultado nominal = (G − T ) + Montante de juros pagos

Então, aí temos já o quadro completo, temos tanto aquilo que o governo precisa porque
ele gastou mais do que arrecadou, quanto aquilo que ele precisa pagar de juros (r) sobre as dí-
vidas que ele já emitiu no passado. Então, este resultado nominal, em sendo deficitário, requer
a emissão de novas dívidas, ou seja, a venda de novos títulos de dívidas hoje, que vão produzir,
lá na frente, mais necessidade de pagamento de juros. Então, ao fim, ao cabo, podemos dizer
que, em algum momento, teremos que ter uma reversão desse processo por meio de elevação
de tributos ou de diminuição de gastos. Estas são as variáveis de ajuste que devem produzir, ao
longo do tempo, um processo tal que o governo mantenha a sua sustentabilidade fiscal, que
significa que ele tem uma maneira de gerenciar as suas necessidades fiscais, que em certos mo-
mentos produz resultados deficitários e em outros momentos produz resultados superavitários,
de tal forma que a relação da dívida com o comportamento da economia como um todo, que
chamamos de relação dívida-pib, seja estável. Podemos descrever essas relações da seguinte
maneira, conhecida com Restrição Orçamentária Intertemporal do Governo1 :

Bt − Bt−1 (G − T ) r ∗ Bt−1
= +
P IB P IB P IB
1
Essa restrição intertemporal descreve o comportamento ao longo do tempo da relação dívida-pib como uma
equação em diferenças finitas de primeira ordem, cuja solução mostra a trajetória da dívida-pib
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE II 3

Quando a relação dívida-pib está crescendo muito, significa que a dívida está crescendo
mais do que o PIB. Se a dívida está crescendo mais do que o PIB, é sinal de que o governo
vem, ao longo dos últimos períodos, necessitando buscar financiamento junto aos mercados
financeiros para cobrir seu resultado nominal deficitário.
Essa estratégia de decisão do governo, a partir da perspectiva da teoria macroeconô-
mica moderna, é uma estratégia intertemporal, que não leva em conta só o ano corrente, ou seja,
não é necessário que o governo produza resultados superavitários ou sempre nulos, ou seja,
equilíbrio, em todos os momentos do tempo. O que é necessário é que haja um processo tal
que, se houve uma sequência de déficits, que em seguida haja uma sequência de superávits, de
tal forma que ao longo do tempo a relação dívida-pib não exploda.
Nesse sentido, podemos entender que a relação entre gastos e tributos no contexto da
demanda agregada pode produzir déficits em situações em que a economia esteja crescendo
pouco, em situações em que a economia esteja num processo de crescimento abaixo do seu
potencial ou em recessões. Em situações como essa, seria possível que o governo utilizasse o
seu instrumento fiscal, a sua política fiscal, estimulando a demanda agregada gastando mais e,
eventualmente, produzindo um resultado nominal deficitário, buscando fontes de financiamento
em mercado financeiro, que em períodos seguintes pudessem ser compensadas por resultados
nominais superavitários. O instrumento fiscal entendido como um elemento que pode gerar
uma estabilização da demanda agregada tanto no boom quanto no textitbust do ciclo econômico,
minimizando as flutuações.
O governo que tem um instrumento fiscal disponível, significa um governo que produz
resultados negativos, déficits, em certos momentos e superávits em outros. Então, seria de
se esperar que, quando o ciclo da economia se reverter, seria o momento em que o governo
reverteria a sua ação, diminuindo seus gastos ou elevando os seus impostos para recompor a sua
estrutura fiscal e manter estável a relação da dívida do governo com a capacidade de gerar bens
e serviços da economia, que é o PIB.
Do ponto de vista da lógica do governo, no contexto da macroeconomia moderna, essa
é a ação esperada do governo em termos de gestão de política fiscal. Essa ação afeta diretamente,
como estamos averiguando nesse momento, a dinâmica da demanda agregada na economia: se
o governo tributa mais, obviamente sobra menos renda disponível, e as famílias consomem
menos. Ao consumirem menos o processo multiplicador, que já analisamos anteriormente, leva
a economia para um nível de produto menor que o anterior ao longo dos próximos 2, 3 anos.
Então, um processo dinâmico que vai atuar tanto na minimização do pico do ciclo, quanto na
minimização do vale do ciclo da economia, um instrumento bastante útil e muito importante,
que, se bem gerenciado, pode auxiliar a estabilização da macroeconomia e melhorar o ambiente
de tomada de decisão em geral para todos os agentes.
Relações com o resto do mundo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender os efeitos de exportações e importações de bens e


serviços sobre o lado real da economia, no mercado de bens e serviços.

Passamos a analisar os componentes do dispêndio doméstico no contexto de uma eco-


nomia aberta. Nesse aspecto, o interesse é entender as conexões da nossa economia, da econo-
mia doméstica, com o resto do mundo, do ponto de vista, principalmente, dos fluxos de bens
e serviços. Mais adiante, quando falarmos do mercado de câmbio, trataremos dos aspectos
financeiros associados a determinação da taxa de câmbio.
Neste ponto, o foco principal é entender os fatores que afetam as exportações de um
país para o resto do mundo, bem como as importações dos demais países para o país domés-
tico, que denominamos componentes de exportações líquidas, em que subtrai-se daquilo que
exportamos, aquilo que importamos (X − M ). As exportações líquidas são um elemento fun-
damental no contexto da demanda agregada, e que vão nos dizer como o resto do mundo afeta
diretamente a nossa demanda, ou dispêndio, em relação àquilo que produzimos e àquilo que os
demais países produzem e vendem para o país doméstico.
Vamos pensar, inicialmente, no componente de exportações. Do que dependem as
exportações? Quais são os principais fatores que determinam o quanto um país exporta daquilo
que ele produz domesticamente, tanto de bens quanto de serviços? Retomando a compreensão
sobre o consumo das famílias, não é tão difícil entender que aquilo que é exportado depende
basicamente do que outros países desejam comprar dos nossos produtos. Então, no fundo, é
como se estivéssemos olhando para o consumo de outros países, daquilo que produzimos. E
do que depende o consumo das famílias que estão em outros países? Basicamente depende da
renda dessas famílias, ou seja, da renda dos seus respectivos países.
A renda do resto do mundo é, portanto, um importante fator para determinar o quanto
exportamos. Vejam que de nada adianta que aumentemos nossa produção que pode ser expor-
tada, se não tivermos demandas, ou seja, se do outro lado não houver compradores dos nossos
produtos, e haverá compradores tanto mais a renda disponível desses compradores esteja em

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

elevação. Quando o resto do mundo está passando por uma por um período de aquecimento,
ou seja, as economias do resto do mundo estão crescendo, principalmente daquelas economias
que são parceiros habituais de consumo dos produtos produzidos internamente, ou dos serviços,
naturalmente elas demandarão mais dos produtos produzidos aqui.
A renda do resto do mundo, PIB do resto do mundo, é um fator primordial para que
haja um comportamento positivo das exportações domésticas. Por outro lado, as importações,
ou seja, aquilo que compramos dos produtos que são produzidos no resto do mundo depende
da capacidade de consumo das nossas famílias e das nossas empresas. Da mesma forma que os
países do resto do mundo podem comprar os nossos bens e serviços de consumo ou de capital,
também nossas famílias ou nossas empresas podem comprar bens e serviços de consumo ou
de capital produzidos no resto do mundo. E do que que vai depender essa nossa capacidade
de comprar produtos que outras economias produzem? Da renda, assim como o consumo das
famílias depende basicamente da renda, as importações também dependem fundamentalmente
da renda doméstica.
Há um outro fator que é extremamente importante e que, principalmente, pode nos
ajudar a entender a relação entre as exportações e as importações ao longo do tempo, consi-
derando a capacidade de ganhar novos mercados, de ampliar o nosso comércio internacional.
E esse fator extremamente relevante é, exatamente, a competitividade dos produtos e serviços
domésticos. A competitividade expressa o conteúdo de inovação, de tecnologia que utilizamos
no processo produtivo.
Quanto maior a competitividade dos produtos domésticos, no sentido de incorpora-
rem tecnologias que poupem custos, que agregam valor, que tragam benefícios para aqueles
compradores dos produtos lá fora, mais competitivos eles se tornarão. Então, é possível que se-
jamos competitivos exportando produtos agrícolas? Sim, é possível que tenhamos desenvolvido
tecnologia inovadora ou processos produtivos que fazem com que nossos produtos sejam prefe-
ríveis a produtos internacionais. É possível obter ganhos de competitividade nas diversas áreas,
nos diversos setores da economia. Naqueles setores em que desenvolvemos maiores ganhos de
competitividade, naturalmente teremos vantagens em comercializá-los com o resto do mundo.
Esta relação de competitividade, ela é medida por um conceito um tanto quanto abs-
trato, a taxa real de câmbio (e). Não trataremos com detalhes técnicos esse conceito, porque
nosso propósito aqui é capturar as grandes linhas lógicas das relações que guiam a estrutura
da macroeconomia. Basta compreendê-lo como competitividade relativa entre os produtos e
serviços domésticos e os do resto do mundo. Mais adiante, quando falarmos de mercado cam-
bial, vamos observar que, no curto prazo, o efeito da taxa de câmbio (E = preço de uma uni-
dade de moeda internacional em termos de moeda doméstica) pode ter alguma relevância na
competitividade-preço.
Porém, do ponto de vista da economia real, é a taxa de câmbio real ou a competiti-
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE II 3

vidade dos produtos domésticos que importa e este fator revela-se tanto mais relevante quanto
maior é o horizonte temporal de análise, ou seja mais buscamos entender o comportamento de
longo prazo.

Figura 1 – Determinantes das exportações líquidas

Desse modo, podemos sintetizar os principais fatores que afetam as exportações líqui-
das como sendo determinados por esses três elementos: a renda do resto do mundo, PIB do resto
do mundo, se o resto do mundo está crescendo, as nossas possibilidades de exportação aumen-
tam. Nossas exportações em geral crescem quando a renda do resto do mundo cresce. Quando
a renda doméstica aumenta, também naturalmente importamos mais, tanto porque queremos
consumir bens e serviços importados, mas também porque as oportunidades de investimento
produtivo se elevam e, naturalmente, as importações também de máquinas e equipamentos se
elevam. Existe aqui um elemento da renda doméstica afetando as importações, de tal forma
que, quando a renda doméstica se eleva, as exportações líquidas caem. Significa que, se as
exportações ficam iguais e as importações crescem, reduz-se a diferença, o saldo da balança
de transações correntes.E quando a renda do resto do mundo aumenta, as exportações sobem,
mas não necessariamente as importações, portanto temos um saldo positivo de exportações lí-
quidas, que se reflete no resultado da balança de transações correntes. O superávit ou déficit
da balança de transações correntes está expresso nesta relação entre o que exportamos e o
que importamos. Além desses dois elementos, renda do resto do mundo e renda doméstica, um
outro fator extremamente importante é, como já ressaltamos, a competitividade relativa do país
doméstico com o resto do mundo. Esses três elementos vão guiar o dinamismo das exporta-
ções líquidas e, portanto, como este componente vai afetar a demanda agregada da economia
doméstica.
Estrutura Lógica do Mercado de Bens e Serviços

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Explicitar a lógica do lado real da economia, por meio da
conexão lógica de decisão de cada agente responsável pelas decisões sobre os com-
ponentes do dispêndio doméstico: famílias (consumo), empresas (investimento pro-
dutivo), governo (gastos e tributos) e resto do mundo (exportações líquidas).

O dispêndio doméstico, ou seja, a soma dos componentes consumo das famílias, in-
vestimento produtivo, gastos do governo e exportações líquidas, é guiado pela lógica de decisão
dos agentes, contribuindo para que entendamos a determinação da atividade doméstica. Esse
resultado ainda não pode ser estudado completamente, pois necessitamos que o quadro esteja
completo, com a compreensão da demanda agregada e da oferta agregada. Porém, é muito
comum nos estudos de macroeconomia, que, ao sintetizarmos os componentes da demanda
agregada, uma hipótese simplificadora seja imposta, eliminando do nosso raciocínio, momenta-
neamente, os efeitos da oferta agregada. Isso significa que, estamos analisando uma economia
em que a demanda agregada determina o PIB, a renda da economia, e por enquanto temos
apenas o mercado de bens e serviços em análise 1 .
A hipótese simplificadora de que não há limites pelo lado da oferta agregada implica
que a inflação na economia estaria estável 2 , o que significa em termos gráficos que a Oferta
Agregada se tornaria horizontal. É uma hipótese que visa simplificar por motivos didáticos
o conjunto completo da macroeconomia. Podemos pensar o seguinte: de que depende o pro-
duto dessa economia? Basicamente da demanda agregada. Exatamente por isso que algumas
correntes econômicas mais keynesianas e ligadas à obra original de Keynes, também conheci-
dos como pós-keynesianos, enfatizam tanto o papel do governo como estabilizador da demanda
1
As economias desenvolvidas passaram pela Grande Depressão após a quebra da Bolsa de Nova York, ao longo
do início dos anos 30, os Estados Unidos, por exemplo, chegou a ter mais de um terço da sua população econo-
micamente ativa desempregada. Ou seja, havia trabalho disponível, havia capacidade ociosa elevadíssima nas
empresas, porém a economia não conseguia sair desse nível de produção muito baixa. Keynes (1982) identi-
ficou esse momento como de insuficiência de demanda naquelas economia, e centrou seu foco de análise na
compreensão da Demanda Agregada. É isso que estamos fazendo aqui, porém, apenas como recurso didático!
2
Veja livros-textos como (BLANCHARD, 2011)

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

agregada, em situações em que a economia esteja passando por uma recessão ou por um nível
de atividade mais baixo, ou seja, crescendo menos do que o potencial, no vale da flutuação do
ciclo econômico.
Mais adiante, veremos que não é possível considerar a determinação do produto sem
considerar a determinação da inflação, mas, por enquanto, pensemos dessa forma simples e
vamos nos fazer a seguinte pergunta: o que acontece nessa economia, basicamente descrita pela
estrutura da demanda agregada, quando, por exemplo, ocorra uma elevação na renda do resto
do mundo? Estamos fazendo uma análise de estática comparativa: partimos de uma situação
inicial de equilíbrio, e uma variável exógena 3 , muda causando um efeito sequencial sobre a
decisão dos agentes que determinam a demanda agregada e, com isso, teremos um efeito sobre
o produto da economia.
Este primeiro experimento de estática comparativa começou com a suposição de que,
a partir de um equilíbrio inicial, estejamos observando uma atividade econômica mais robusta
nos países desenvolvidos. O nosso raciocínio deve ser iniciado, então, pelo impacto dessa
mudança exógena dobre as exportações líquidas. Quando a renda do resto do mundo sobe,
as exportações domésticas se elevam e a produção de bens e serviços na economia se eleva,
como não há restrição pelo lado da oferta, a economia pode produzir mais bens e serviços
e atender a essa demanda adicional externa por nossos produtos. Como a renda é igual ao
produto, a renda aumenta também e isso afeta agora o consumo agregado das famílias, por meio
da propensão marginal a consumir, que as leva a consumir uma parcela da renda disponível
adicional, e subsequentemente o aumento do consumo eleva novamente a renda, que eleva
novamente o consumo, disparando o multiplicador keynesiano. Este efeito multiplicador é que
vai propiciar que, ao final do processo de ajuste da macroeconomia, tenhamos um aumento
na renda doméstica mais do que proporcional, em relação à elevação das exportações que se
iniciaram com aumento da renda do resto do mundo.
Esse processo de ajuste leva tempo para acontecer, não é imediato: o aumento exó-
geno inicial das exportações, um processo de efeito multiplicador que passa pelo consumo das
famílias e pela resposta do consumo das famílias ao crescimento da renda da economia, vai pro-
duzindo um efeito que, ao final o processo, leva a uma renda maior. Esse efeito multiplicador,
dentro do contexto da demanda agregada, é extremamente relevante para que se possa entender
como uma flutuação na economia demora tempo para acontecer, seja quando há um boom ou
seja quando há um bust 4 .
Observe que, nesse movimento, naturalmente, as empresas contrataram mais traba-

3
Variável exógena é uma variável que afeta o equilíbrio, mas que não está descrita pelo comportamento dos
agentes do modelo, como já definimos no início de nosso curso!
4
Sempre bom lembrar que temos uma compreensão ainda parcial da estrutura da macroeconomia, que é o
funcionamento do mercado de bens e serviços, e que, para que tenhamos de fato uma compreensão completa da
própria demanda agregada, será necessário que as conexões deste mercado de bens e serviços sejam realizadas
com os mercados financeiros da economia.
D ISPÊNDIO D OMÉSTICO – PARTE II 3

Figura 1 – Estática comparativa: elevação da renda do resto do mundo

lhadores e, naturalmente, utilizaram mais os equipamentos que existem disponíveis, ou seja, o


estoque de capital da economia. Mas, por enquanto, não estamos levando em conta os efeitos
do aumento do uso do estoque de capital e da contratação de trabalhadores sobre a formação
dos preços na economia.
Diversas outras análises podem ser realizadas nesse contexto. Pode-se pensar, por
exemplo, sobre os impactos de uma mudança na propensão marginal a consumir dos consu-
midores, ou seja, na disponibilidade dos consumidores em consumir uma parcela adicional da
sua renda. Esta variável, ela é bastante estável, não muda com muita frequência nas econo-
mias, sendo que economias mais desenvolvidas, normalmente, têm uma propensão marginal a
consumir mais baixa do que economias menos desenvolvidas. Conforme uma economia vai se
tornando mais desenvolvida, ela pode apresentar uma diminuição na sua propensão marginal a
consumir, e isso poderia ser utilizado como uma análise de estática comparativa. Quando a pro-
pensão marginal a consumir cai, o consumo cai, o dispêndio doméstico cai, o que significa que
as empresas vão ficar produzindo bens e serviços que não serão comprados e, então, diminuem
o seu ritmo de produção. O produto cai, a renda cai de novo, o que tem um impacto secundário,
menor sobre o consumo dessa vez, e dispara o multiplicador keynesiano, fazendo o produto cair
um pouco mais do que aquele montante inicial causado pelo fator exógeno.
Um outro fator exógeno muito importante nesse contexto, que sempre analisamos em
macroeconomia, é a política fiscal. O que acontece, dentro dessa estrutura lógica de mercado
de bens e serviços, quando o governo gasta mais ou gasta menos.
Partindo inicialmente de um equilíbrio, suponha um aumento nos gastos do governo
(G). Como é que se dá esse processo lógico do mercado de bens e serviços? Muito simples:
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

Figura 2 – Estática comparativa: política fiscal expansionista

o governo vai gastar mais, significa que ele vai comprar mais bens e serviços que estão sendo
produzidos na economia, portanto há uma pressão de compra que vai levar as empresas a produ-
zirem mais, contratar mais trabalhadores, usarem mais suas máquinas, e o produto da economia
aumenta, quando o produto da economia aumenta, a renda aumenta, quando a renda aumenta, o
consumo das famílias (C) se eleva! Qualquer que seja o fator inicial que produz o impacto sobre
a renda, o impacto de segunda ordem, de terceira ordem, de quarta ordem, etc., sempre será a
resposta do consumo das famílias a esse aumento inicial da renda, e esse efeito acumulado é
condensado, é expresso no conceito do multiplicador keynesiano, como já analisamos em aula
anterior. Uma vez que se inicia um processo de aquecimento, esse processo terá uma dinâmica
de retroalimentação ao longo do tempo, até que um outro choque afete a decisão dos agentes
mudando as respostas dinâmicas.
Vale observar que, no contexto de economia aberta e com as importações respondendo
à renda doméstica também, há um vazamento no efeito multiplicador: quando a renda sobe,
as importações sobem e isso quasa uma pequena queda nas exportações líquidas, diminuindo
o efeito do multiplicador do consumo. Em ambos os casos, o equilíbrio final deste modelo
simplificado ainda é maior que o inicial: Y2 > Y1 .

REFERÊNCIAS

BLANCHARD, O. Macroeconomia. [S.l.]: Pearson, 2011. ISBN 9780133061635.

KEYNES, J. M. Teoria geral do emprego, do juro e da moeda. [S.l.: s.n.], 1982. ISBN
853510917X.
Mercados Financeiros
Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender o papel econômico dos mercados financeiros, con-
siderando os custos de transação e a assimetria de informação típicos desses mer-
cados.

Até este momento, estamos com um nível de compreensão ainda bastante parcial sobre
a estrutura da macroeconomia. Temos um detalhamento maior do funcionamento das decisões
dos agentes no mercado de bens e serviços. Porém, a demanda agregada se constitui a partir da
integração entre o lado real da economia, representado pelo mercado de bens e serviços, e o lado
financeiro da economia. Quando analisamos a decisão de investimento produtivo, dissemos que
a decisão deve levar em conta o seu custo de oportunidade, que é a taxa de juros dos mercados
financeiros. Temos aqui um elo muito claro entre os mercados financeiros e o lado real da
economia. Mas há, também, um outro caminho por meio do qual os mercados financeiros
podem afetar a atividade econômica: via exportações líquidas. Lembremos que já chamamos
a atenção para a relevância da competitividade-preço, cujo comportamento depende de um dos
mercados financeiros, o mercado cambial. Há, então, pelo menos dois elos claros entre o lado
real e o financeiro da economia e, neste módulo, apresentamos a estrutura básica dos principais
segmentos dos mercados financeiros, e vamos destacar quais são os que diretamente afetam as
dinâmicas das flutuações macroeconômicas.
Mercados financeiros são termos genéricos para representar uma série de operações,
uma série de produtos, uma série de ativos diferentes que são negociados nesses mercados.
Vamos começar entendendo, de uma maneira bastante simples, qual é o papel econômico dos
mercados financeiros, que principais fatores fazem com que a compreensão dos mercados
financeiros seja extremamente necessária para o entendimento completo sobre a dinâmica da
demanda agregada.
Os mercados financeiros 1 podem ser entendidos como mercados por meio dos quais os
recursos financeiros da economia são canalizados entre aqueles agentes que poupam, ou seja, os
1
Há inúmeros livros e referências sobre esse tema, uma indicação para tratar dos ativos e produtos dos mercados
brasileiros é Assaf (2015); para uma relação entre os mercados brasileiros e a crise de 2008, veja Garcia (2011);
para os aspectos teóricos, o livro de Bodie, Kane e Marcus (2014) continua sendo recomendado!

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

agentes que têm excesso de fundos, excesso de recursos financeiros, e aqueles agentes que têm
escassez de recursos financeiros, ou seja, aqueles agentes que necessitam de recursos financeiros
para financiar as suas decisões, as suas atividades. Muitas vezes é comum usar a alegoria de
que os mercados financeiros seriam uma maneira de facilitar as negociações da economia para
que os recursos possam fluir de maneira mais dinâmica e mais eficiente na economia.
Essa é uma maneira simples de entender, não está incorreta, mas nosso ponto aqui tra-
zer à tona um pouco desse papel econômico e que diz respeito a como os mercados financeiros
contribuem para a geração de valor, para produção de bem-estar na economia. Nesse sen-
tido, é necessário observar o seguinte: vamos pensar que aqueles agentes que têm excesso de
recursos, as famílias que estão realizando poupança e que podem dispor desses recursos para
alocação em ativos financeiros, teriam muito mais dificuldades para encontrar para quem em-
prestar, que ativos comprar, em que alocar sua carteira, se não houvesse um intermediador, uma
estrutura financeira que propiciasse a diminuição de uma falha muito importante na estrutura
dos mercados financeiros, que é a falha de assimetria de informação.
Os mercados financeiros não operam em concorrência perfeita. Os mercados finan-
ceiro operam sob falhas, e uma das falhas mais significativas é a falha de assimetria de infor-
mação. Isso significa que o tomador de recursos sabe muito melhor quais são as suas próprias
condições de pagamento, de devolução de empréstimo, e de manutenção dos seus contratos, do
que o ofertante de recursos.
A estrutura dos mercados financeiros, principalmente a intermediação financeira, pro-
picia que a assimetria de informação seja diminuída, condensando informações sobre ambas as
partes e, principalmente, sobre a parte credora, para facilitar a transferência desses recursos e
a formação das taxas de juros, que serão cobradas para a transferência desses recursos. Esse
papel econômico, que é de diminuir o grau de assimetria de informação nas transações finan-
ceiras, leva a que os mercados financeiros efetivamente contribuam para melhorar a eficiência
da economia.
Há também uma contribuição importante para a diminuição dos custos de transação,
devido à escala das transações. Os intermediários financeiros, porque fazem muito mais tran-
sações do que cada agente individualmente, têm um ganho de escala que também propicia uma
diminuição dos custos das transações e, portanto, uma maior eficiência. Basicamente, o papel
dos mercados financeiros é exatamente o de minimizar os efeitos da assimetria de informação
e dos custos de transação nesta relação entre ofertantes de recursos e demandantes de recursos.
Para termos uma visão mais completa dessa estrutura, segmentamos os mercados financeiros,
de acordo com suas características específicas, como estratégia didática.
R ELEVÂNCIA DOS M ERCADOS F INANCEIROS 3

REFERÊNCIAS

ASSAF, A. A. Mercado financeiro. [S.l.]: Atlas, 2015. ISBN 9788522454365.

BODIE, Z.; KANE, A.; MARCUS, A. J. Investments. 10. ed. New York, N.Y.: McGraw-Hill
Education, 2014. ISBN 9780077861674.

GARCIA, M. G. P. O Sistema Financeiro e a Economia Brasileira Durante a Grande Crise de


2008. [S.l.: s.n.], 2011. ISBN 9788586500657.
Mercados de Capitais e de Crédito

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: apresentar o papel do financiamento direto (mercado de ca-


pitais) como fonte de recurso e de ativos de longo prazo e o financiamento indireto
(mercado de crédito) como fonte de recursos e de ativos de curto e médio prazos,
atendendo às demandas de diferentes tipos de poupadores e de tomadores de recur-
sos.

Vamos começar a nossa análise olhando para o segmento dos mercados financeiros
que, teoricamente, está voltado para a oferta de fundos e a demanda por fundos de longo prazo,
o mercado de capitais. Normalmente, o investidor financeiro que busca ativos desse segmento
visa retorno de médio a longo prazos. É também no mercado de capitais que os investidores
produtivos, preferencialmente, buscariam fundos para financiar seus projetos de investimento.
Na estrutura dos mercados financeiros este segmento é chamado de financiamento di-
reto, no seguinte sentido: o emissor do ativo que vai ser negociado é diretamente o agente que
necessita de recursos, por exemplo, a empresa que precisa de recursos para financiar o seu pro-
jeto de investimento, e do outro lado uma família, um fundo de investimento ou um investidor
institucional que tem recursos e compra o ativo que vai ser emitido diretamente pelo deman-
dante de recursos, que no caso seria a empresa. Esse ativo financeiro negociado é débito para o
tomador de recursos e crédito para o ofertante de recursos.
Essas transações são concretizadas por meio de dois tipos de ativos: os títulos de
longo prazo, que representam dívida, capital de terceiros para as firmas; e as ações, que repre-
sentam parte da propriedade da empresa que as emite. Esses ativos 1 são comprados e vendidos
por meio de uma prestação de serviços financeiros, prestada por uma instituição financeira
que subscreve o processo de emissão desse novo lote de títulos ou de ações, que são as novas
emissões, momento em que a empresa vai efetivamente obter os recursos que ela deseja. Esse
momento inicial de emissão é chamado de mercado primário. No mercado primário, basica-
mente, atuam instituições financeiras, que são reguladas e permitidas pelo banco central para
1
Nossa intenção aqui não é a detalhar as especifidades desses ativos, para isso veja Assaf (2015) ou um livro de
mercados financeiros de sua preferência!

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

atuarem diretamente nesse segmento dos mercados financeiros. O investidor financeiro decide
sua compra em função da lucratividade futura que esse projeto que ele está ajudando a financiar
pode render, expressa em dividendos, distribuição de lucros, ou, se ele estiver comprando um
título, está interessado no pagamento de juros periódicos e na devolução do principal ao final
do prazo de vencimento do título - ambas as decisões almejam o longo prazo. Entretanto, os
investidores financeiros poderão vender seu ativos a qualquer momento se houver mercados
secundário com liquidez e volume de negociação relevantes. Mercados secundários são os
mercados em que esses ativos, inicialmente colocados à disposição no mercado primário, são
renegociados entre outros investidores financeiros ou especuladores. Neste momento, quando
os investidores renegociam entre si, compram e vendem ações ou títulos que já foram emi-
tidos anteriormente, estamos observando apenas um processo de realocação de portfólio dos
investidores financeiros, e este processo não vai produzir nenhum tipo de recurso adicional para
empresa, que já fez a sua captação no mercado primário. Por exemplo, no caso das ações, o
mercado secundário está representado pelas bolsas de valores, em que os investidores finan-
ceiros realocam seu portfólio. Os mercados secundários são muito importantes no processo
de transferência de recursos, porque o investidor sinaliza a sua expectativa em relação àquele
ativo quando decide vender uma ação que estava no seu portifólio. A cada renegociação de um
ativo em bolsa, seu preço é redefinido à medida em que os investidores reavaliam o potencial
de lucratividade daquela empresa no futuro. Ou seja, é um processo de precificação, de valora-
ção, da empresa emissora a cada momento no tempo. É um processo muito importante porque
se aquela empresa decidir emitir um novo lote de ações, ela terá, a partir das informações do
mercado secundário, uma referência para o preço das novas ações que serão vendidas.
Governos também podem atuar no segmento de mercado de capitais por meio de emis-
são de títulos de longo prazo para financiar déficits nominais 2 . Neste caso, o governo compete
com o setor privado pela oferta de recursos de longo prazo, concorrendo com o investimento
produtivo pelos recursos escassos que são disponibilizados nos mercados de capitais. Adicio-
nalmente, o mercado de capitais pode ter um papel relevante para o crescimento econômico à
medida em que propicia fontes de financiamento de longo prazo para o investimento produtivo,
que constitui o estoque de capital da economia. É por isso que, não raramente, observamos
economias com mercado de capitais pouco desenvolvidos tendo dificuldades em financiar os
investimentos produtivos, e muitas vezes o próprio governo acaba fazendo o papel de ofertante
de recursos de longo prazo neste segmento, por meio de bancos públicos, como observamos ao
longo da história da economia brasileira 3 .
As taxas de juros, que estão associadas à remuneração dos títulos de longo prazo,

2
Na aula 9, tratamos desse conceito: resultado primário somado ao fluxo de pagamento de juros pagos sobre as
dívidas (títulos) já emitidos.
3
Vale observar que o governo pode ter uma participação relevante nessa oferta de recursos de longo prazo, propi-
ciando acesso para pequenas, médias e até grandes empresas ao financiamento de longo prazo, principalmente
para o desenvolvimento de novas tecnologias ou inovações de produtos e serviços, e inovações tecnológicas.
R ELEVÂNCIA DOS M ERCADOS F INANCEIROS 3

assim como os retornos que expressam a remuneração das ações das empresas no longo prazo,
representam o custo de oportunidade para que as empresas possam tomar a decisão entre investir
produtivamente e como compor as fontes de recursos entre capital próprio (ações) e capital de
terceiros (títulos).
Uma parcela significativa das famílias, todavia, não dispõe de recursos por períodos
muito longos, pois podem pretender utilizá-los no médio prazo, seja para comprar uma casa
própria, ou para pagar as parcelas intermediárias do financiamento de uma casa própria, por
exemplos. Essas famílias buscam aplicações financeiras que possam lhes render alguma re-
muneração, porém sem um comprometimento temporal muito longo, tais como uma conta de
poupança, para famílias com elevado grau de aversão ao risco, um fundo de renda fixa ou de
renda variável, etc. A composição do portfólio vai depender do grau de aversão ao risco e
buscando prazos de investimento de curto a médio - essas famílias ofertam, assim, seus recur-
sos a intermediários financeiros (bancos comerciais, principalmente) que serão os emissores
dos ativos que elas compram, compondo uma etapa do processo de financiamento indireto no
mercado de crédito.
Na outra ponta do mercado de crédito, estão tanto famílias quanto empresas como to-
madores de recursos. As famílias, normalmente, buscam recursos de médio prazo para financiar
consumo de bens duráveis e semiduráveis, como já foi discutido quando estudamos os deter-
minantes do consumo das famílias. As famílias podem buscar no mercado de crédito recursos
para financiar a compra de um carro, a compra de uma geladeira - a compra de bens duráveis
e semiduráveis, em geral. Os bancos comerciais que captaram os recursos das famílias poupa-
doras agora passa a ofertá-los às famílias e empresas tomadoras. O segmento de crédito é uma
fonte muito relevante de financiamento para atividade econômica, inclusive para empresas que
buscam nele financiamento de capital de giro, desconto de duplicatas, adiantamento de contrato
de câmbio e também financiamento de investimento produtivo, para empresas de pequeno e
médio portes que não têm acesso ao mercado de capitais.

REFERÊNCIAS

ASSAF, A. A. Mercado financeiro. [S.l.]: Atlas, 2015. ISBN 9788522454365.


Mercados Monetário e Cambial

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: introduzir os segmentos monetário e cambial que serão tra-
tados com maior profundidade nos próximos módulos.

Mercado monetário é aquele segmento em que o banco central realiza a operação dos
seus instrumentos de política monetária, e é neste mercado em que a taxa básica de juros da
economia é determinada. A taxa básica de juros é a taxa de juros de curto prazo na economia
e compõe a formação das taxas de médio e de longo prazos, por meio da estrutura a termo
da taxa de juros - ETTJ. Detalharemos a seguir um pouco mais da relação entre as taxas de
juros e os prazos dos títulos: os de curtíssimo prazo, do mercado monetário, os de médio prazo,
referência para a formação das taxas de juros no mercado de crédito, e os de longo prazo que
vão oferecer a referência da formação de taxa de juros no mercado de capitais.
A taxa de juros básica é aquela paga por títulos emitidos pelo agente de menor risco na
economia, que é o governo, no curto prazo. O governo é considerado, na estrutura de mercado
financeiro doméstico, o agente de menor risco, porque não se espera que uma economia, uma
sociedade, possa vir a falir como ocorre com empresas. A referência de menor risco deve-
se ao fato de que, ainda que o governo tenha problemas na gestão da sua dívida e venha a
pedir uma moratória ou uma interrupção de pagamentos, em um momento mais adiante, por
meio de negociação com seus credores, esse governo poderá voltar a participar dos mercados
financeiros. Se pensarmos nos mercados financeiros internacionais, devemos buscar referências
de menor risco no mundo, tais como os títulos emitidos pelo tesouro dos EUA.
O nosso propósito é entender como o governo pode utilizar os seus instrumentos de
política monetária para diminuir a variação da taxa de inflação e contribuir para que a inflação,
ao longo do tempo, fique próxima daquela meta estabelecida pelo próprio governo, por meio do
seu comitê de política monetária, num regime de meta de inflação.
Considerando que nos interessa entender a lógica macroeconômica de uma economia
aberta, uma economia que interage com o resto do mundo, por meio do comércio e dos fluxos
de capitais, necessariamente deve haver um mercado em que a moeda doméstica de curso legal

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

pode ser trocada por moeda estrangeira e vice-versa - são os chamados mercados cambiais.Por
exemplo, no caso brasileiro, um exportador precisa converter seus dólares por reais, ou seus
euros por reais. Um importador, quando compra um equipamento ou um bem de consumo que
ele vai revender aqui no país, necessita de moeda conversível internacional, dólar por exemplo,
domesticamente a moeda que ele recebe como fruto da sua atividade econômica é o real e, para
pagar pelo seu equipamento importado, ele precisa trocar reais por dólares.
Pelo lado dos fluxos de capital, um investidor financeiro pode não encontrar, no con-
junto de ativos financeiros doméstico, todas as suas alternativas desejadas de investimento, e
decide investir em ativos nos mercados internacionais precisará trocar moeda doméstica por
estrangeira. O mesmo acontece com os investidores estrangeiros que decidem trazer parte de
sua riqueza para investir no mercado doméstico, por exemplo, comprando títulos do governo
doméstico, ou comprar ações das empresas domesticas em bolsa de valores, também precisará
trocar seus dólares por reais, no caso brasileiro.
No mercados cambiais os preços relativos entre moedas serão formados, as chamadas
taxas nominais de câmbio. Para facilitar a compreensão, em geral, adotamos uma moeda inter-
nacional de referência, por exemplo, o dólar, mas a lógica de funcionamento do mercado serve
para qualquer outra moeda estrangeira. Por exemplo, no caso brasileiro, a relação de quantos
Reais são necessários preciso para comprar um dólar é o que chamamos de chamamos de taxa
nominal de câmbio. A taxa nominal de câmbio, na verdade é um preço em moeda doméstica de
uma unidade de uma moeda estrangeira qualquer. Para entendermos a dinâmica de formação da
taxa de câmbio, precisamos entender a demanda e oferta por dólares e a interrelação dos seg-
mentos monetário-cambial, ambos extremamente importantes para compreensão da demanda
agregada da macroeconomia.
Determinantes da taxa de câmbio no longo prazo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Entender a teoria da Paridade do Poder de Compra, des-


tacando suas principais contribuições para a compreensão do comportamento do
câmbio no longo prazo, bem como suas insuficiências.

A partir dos anos setenta do século passado1 , a compreensão de quais são os determi-
nantes principais do comportamento do câmbio se torna cada vez mais relevante por conta da
flexibilidade dos regimes cambiais o que, obviamente, afeta a decisão dos agentes em geral.
Com o desenvolvimento da teoria macro e com os acontecimentos históricos principalmente
marcados pelo fim dos acordos de Bretton Woods, novas abordagens surgiram para a compre-
ensão dos determinantes de câmbio. Basicamente, o que observamos hoje na literatura é uma
separação inicial entre a busca da compreensão desses determinantes no longo prazo e no curto
prazo, conectados pelas expectativas dos agentes.
A perspectiva de longo prazo é pautada na teoria da Paridade do Poder de Compra
(PPC), que parte de um princípio muito antigo em teoria econômica, já presente nos clássicos
da economia, que é a Lei do Preço Único. Essa "lei"afirma o seguinte: se dois bens são iguais
(ou são homogêneos), não havendo nenhum tipo de barreira ou de custos de transação entre
mercados que transacionam esses dois bens, ao longo do tempo há uma tendência para que os
preços nesses dois mercados sejam iguais. Quando observamos um excesso de demanda em um
desses mercados é natural que a oferta que está sendo realizada no outro mercado se direcione
para o mercado em excesso de demanda, porque o mercado com excesso de demanda produz
um preço mais elevado. Essa é a relação entre esses dois mercados, sem barreira comerciais ou
custo de transação, que produz o resultado da lei do preço único.
Esse princípio bastante simples serviu de ponto de partida para a PPC: se os países
comercializam bens semelhantes ou cestas de bens parecidos e há pouquíssimas barreiras ou
1
Se voltarmos na história do pensamento econômico, vamos observar que as questões de economia aberta
passaram a ser tratadas no contexto dos modelos macroeconômicos a partir dos anos 50, principalmente com
as contribuições de Meade, Mundell e Fleming e que fornecem um instrumental básico bastante utilizado ainda
hoje no ensino de graduação, conhecido como modelo IS-LM-BP

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

nenhuma barreira ao comércio internacional, os custos de transação não são impeditivos, ha-
veria uma tendência para que seus preços se igualassem ao longo do tempo. Acontece que
quando falamos em preços relativos entre países distintos, estamos falando em preços cotados
em moedas distintas. Não podemos simplesmente comparar os preços nos Estados Unidos,
por exemplo, com os preços no Brasil porque os preços nos Estados Unidos estão cotados em
dólares e os preços no Brasil estão cotados em reais. Essa comparação não pode ser direta:
necessariamente temos de transformar o preço em dólar em preço em reais ou o preço em reais
no preço em dólar, e para isso utilizamos o preço relativo das moedas, ou seja, a taxa nominal
de câmbio (E).
Uma vez que haja essa tendência para que os preços domésticos (P) e internacionais

P se equiparem no longo prazo, é possível observar esta relação de preços medidos de em uma
mesma moeda como uma possível maneira de compreender a determinação da taxa nominal
de câmbio no futuro. Esta relação de preços, quando convertidos por uma mesma moeda se
torna, portanto, um preço relativo que denominamos na literatura de taxa de câmbio real (e).
Temos aqui uma diferença importante entre a taxa de câmbio nominal, que é o preço de um
ativo financeiro, e a taxa de câmbio real que, que mede a relação entre o nível geral de preços
de um país e o nível geral de preços de um outro país convertidos para uma mesma moeda por
meio da taxa de câmbio nominal.

EP ∗ eP
e= ⇒E= ∗
P P

Se tomarmos o logaritmo e a derivada em relação ao tempo, temos a equação abaixo


(o ponto sobre a variável indica sua variação em relação ao tempo) que indica que, se a infla-
ção doméstica é maior que a externa, a PPC prediz que a taxa nominal de câmbio sobe pela
diferencial (a moeda doméstica se depreciaria).:

!
Ė ė Ṗ P˙ ∗
= + − ∗
E e P P

A taxa de câmbio real, pela PPC, deveria ser relativamente estável ao longo do tempo
e ela tenderia para 1 se os países realmente transacionassem cestas de bens e serviços muito
parecidas. Obviamente, isso não acontece no mundo real: cestas de bens produzidos em paí-
ses diferentes são relativamente diferentes. Embora seja possível encontrar homogeneidade em
commodities internacionais, dificilmente encontraremos homogeneidade na gama de bens e ser-
viços que são comprados e vendidos entre os países, não atendendo ao princípio da lei do preço
único. A não existência dessa homogeneidade os bens que são comercializados já produz um
diferencial de preço e, portanto, dificilmente a taxa real de câmbio se estabiliza em torno de
1, mas ela se estabiliza em torno de um certo nível, ou seja, o resultado mais importante da
PPC, na verdade, é que a taxa real de câmbio se estabiliza ao longo do tempo certo em um
R ELEVÂNCIA DOS M ERCADOS F INANCEIROS 3

nível que revela a competitividade relativa dos países, refletindo também o grau de barreiras
internacionais do comércio, sejam unilaterais ou não, e também os custos de transação desse
comércio internacional, assim como as preferências dos agentes. Basicamente, o elemento fun-
damental que queremos ressaltar é o significado da taxa real de câmbio enquanto uma medida
de competitividade entre países.

Figura 1 – Determinantes do câmbio

Quando olhamos para a nossa capacidade de ganhar ou perder fatias do comércio in-
ternacional, basicamente estamos buscando entender qual é a relação de competitividade dos
nossos produtos com os produtos internacionais e essa competitividade é produzida a partir da
nossa condição de produção de bens e serviços, ou seja: ela basicamente depende da produti-
vidade dos fatores de produção. Esse é um aspecto muito importante para discutir ganhos ou
perdas de fatias no comércio internacional no longo prazo, em 10, 15, 20, 30 anos.
É importante observar que no longo prazo, em termos de competitividade real, os
fatores mais relevantes estão associados ao processo de produção de um país: qual é o nível
tecnológico que ele utiliza no seu processo de produção, qual é a qualificação da mão-de-obra,
qual é a qualificação ou desenvolvimento tecnológico, ou seja, a produtividade marginal de
cada um dos fatores de produção, contribuindo para produzir produtos melhores, com mais
tecnologia e, portanto, com mais condições de competir com diversos produtos oferecidos pelos
outros países nos mercados internacionais.
Desse ponto de vista, se é plausível que a taxa real de câmbio seja relativamente estável
no longo prazo, podemos utilizar essa estabilidade como forma de entender o comportamento
da taxa nominal de câmbio. Essa compreensão é tanto melhor quanto mais se tratam de relações
comerciais entre países mais parecidos, países desenvolvidos, países que tenham um graus se-
melhantes de desenvolvimento tecnológico. E a literatura empírica tem mostrado isso, no caso
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

de países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento: parte dela que indica que a paridade do


poder de compra é uma boa indicação da nossa formação da taxa de câmbio no longo prazo,
porém considerando-se os diferenciais de tecnologia e uma boa parte da literatura aponta no
sentido contrário de que em geral a taxa de câmbio nominal no futuro não encontra na teoria da
PPC uma boa fonte de explicação.
Porém, no curto prazo a nossa compreensão é um tanto melhor sobre o comportamento
do câmbio nominal, principalmente a flutuação, a alta volatilidade que o câmbio apresenta no
curto prazo, entendendo que basicamente no curto prazo os principais determinantes da taxa no-
minal de câmbio são associados às decisões financeiras e não a decisões comerciais. Os fluxos
de capitais financeiros, em geral, representam uma proporção muito mais relevante na determi-
nação da demanda e da oferta de dólares no mercado cambial em relação aos fluxos comerciais,
que são mais estáveis e muito mais ligados ao comportamento da renda internacional e ao PIB
doméstico, que propriamente ao preço da moeda estrangeira. Entretanto, expectativas sobre o
comportamento do longo prazo podem afetar o comportamento do curto prazo, como vamos
ver em seguida, por meio da teoria da paridade de juros descoberta.
Determinantes da taxa de câmbio no curto prazo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: apresentar uma síntese da teoria do portfólio como funda-
mento para a Paridade de Juros Descoberta, que expressa a decisão dos agentes
entre investir em ativos domésticos e internacionais, definindo fluxos de capitais
que determinando a taxa nominal de câmbio no curto prazo.

A compreensão dos determinantes do câmbio no curto prazo requer um resgate da


teoria do portfólio, que vai ser a nossa base para a compreensão da tomada de decisão dos
agentes em relação a investir nos seus recursos domesticamente ou investir esses recursos nos
mercados financeiros internacionais. Trata-se de alocação de carteira em que os agentes têm
à disposição não só os ativos do mercado financeiro doméstico, mas também podem escolher
entre mercados domésticos e mercados financeiros internacionais. A teoria do portfólio nos
ajuda a entender a tomada de decisão financeira no seguinte sentido: os agente vão levar em
consideração o risco relativo, retorno relativo, liquidez relativa e qual é o montante total de
recursos, a riqueza, que há à disposição para cada um desses agentes alocarem sua carteira.
Quando observamos a riqueza dos agentes, quanto maior a riqueza, maior será a de-
manda por ativos financeiros, e isso vale para quaisquer que sejam os ativos financeiros domés-
ticos e internacionais (ativos, derivativos, contratos futuros, ações, fundo de renda fixa, fundo
de renda variável, ou mesmo a poupança tradicional). O mesmo vale para os agentes internacio-
nais, eles têm um estoque de riqueza e podem decidir alocar essa riqueza no mercado financeiro
brasileiro, no do México, na Rússia ou nos mercados internacionais, que estão representados
pelos grandes mercados dos Estados Unidos e da Europa. Por outro lado, dada a liquidez e o
risco de cada um dos ativos financeiros, os agentes compararam o retorno relativo de cada um
deles e preferem aquele de maior retorno. O mesmo vale para o risco: dado os retornos, vamos
desejar mais ativos que tenham um menor risco, se os retornos forem iguais. A relação entre
risco relativo de ativos também é um determinante importante da demanda de ativos, de acordo
com a teoria do portfólio. O grau de liquidez também é uma variável relevante, pois possibilita

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

vender ou comprar um ativo no momento mais oportuno em mercado secundário1 . Basta que
compreendamos o seguinte: se a relação de risco está dada, ou seja, é exógena; a relação de
liquidez está determinada; o estoque de riqueza disponível para a tomada de decisão está dado,
os agentes vão levar em conta o retorno relativo entre os ativos e isso também é verdade para
ativos domésticos e internacionais.
O retorno de ativos domésticos será expresso pela taxa de juros doméstica, porém ob-
viamente, não necessariamente estamos falando de títulos públicos nessa alocação de portfólio.
Mas para que possamos compreender a relação de uma forma simples, a referência fundamental
que vamos utilizar é a taxa básica de juros, que é referência para todas as outras taxas de juros
nos mercados domésticos, assim como a taxa de juros internacional vai ser a referência para
formação de todas as outras taxas de juros, de todos os retornos dos ativos internacionais2 . Va-
mos expressar esses retornos relativos por meio da teoria de determinação do câmbio no curto
prazo conhecida como Paridade de Juros Descoberta ou a Descoberto (PJD)
A PJD relaciona a taxa de juros doméstica à taxa de juros, ambas medidas na mesma
moeda, tudo o mais constante (risco relativo, liquidez relativa e riqueza dos agentes). Sempre
que comparamos países distintos, assim como aconteceu com o nível geral de preços, é neces-
sário converter as medidas para uma mesma unidade monetária, ou seja, não se pode comparar
taxas de juros para investimento em reais com taxas de juros para investimentos em dólares
diretamente.
Vejamos um exemplo simples: se a taxa de juros doméstica é de 10% por período e a
taxa de juros internacional é de 5% para o mesmo período de tempo, não podemos simplesmente
comparar 10% com 5% porque os 10% são ganhos que teremos ao final do período em reais e
5% são os ganhos que teremos ao final de um mesmo período em dólares, portanto não podemos
comparar diretamente 10% com 5%, é preciso considerar o efeito da conversão de reais para
dólares ou dólares para reais no início do período e no final do período. E é isso que a PJD vai
nos mostrar: qual é a relação entre as taxas de juros considerando-se que ambas estejam sendo
medidas numa mesma moeda?
Assuma: a taxa de juros de ativos domésticos é iD , a de ativos estrangeiros é iF , a taxa
nominal de câmbio hoje é Et , medida como unidades de moeda doméstica por 1 unidade de
e
moeda estrangeira (R$/U SD$, no caso brasileiro), já a taxa de câmbio futura esperada é Et+1 .
e
Se há uma expectativa de depreciação da moeda doméstica: Et+1 > Et e a taxa de
e
Et+1 −Et
variação esperada para o câmbio será positiva, Et > 0, o contrário se a expectativa for de
apreciação da moeda doméstica.

1
Esses são os quatro elementos mais relevantes na nossa compreensão dos fundamentos da teoria de portfólio,
que parte dos princípios da alocação de carteira de Markovitz, que expressa a decisão de demandar ativos
financeiros como resultado de um processo de maximização do retorno dado risco ou de minimização do risco
no retorno.
2
Veremos isso com detalhes na última aula deste módulo!
R ELEVÂNCIA DOS M ERCADOS F INANCEIROS 3

Logo, o retorno dos ativos domésticos em termos de moeda estrangeira é a taxa de


juros doméstica menos a expectativa de depreciação da moeda doméstica:

e
Et+1 − Et
RD em termos de moeda estrangeira = iD −
Et

E o retorno dos ativos estrangeiros em termos de moeda doméstica é a taxa de juros


estrangeira somada à expectativa de depreciação da moeda doméstica:

e
Et+1 − Et
RF em termos de moeda doméstica = iF +
Et

Assim, já que devemos comparar taxas de juros medidas na mesma moeda, a PJD pode
ser representada por:

e
Et+1 − Et
iD = iF +
Et

Para tomar essa decisão necessitamos de mais uma informação, além das respectivas
taxas de juros, do prazo do investimento e da taxa nominal de câmbio hoje: precisaremos saber
qual será a taxa nominal de câmbio no vencimento do investimento. Essa é uma pergunta
bastante complexa, mas de alguma forma é preciso que tenhamos uma expectativa sobre a taxa
de câmbio futura. Vejamos num exemplo: Se investirmos R$1000 no mercado doméstico, com
10% de juros, converteremos nossos R$1100 ao final do período a uma taxa de câmbio esperada
de 2,50, teremos apenas USD$440. Se compararmos com investimento internacional, trocando
o montante inicial em moeda doméstica por USD$500, com uma taxa de câmbio atual em 2,00,
termos aos final do período USD$525. Se comparamos USD$525 comparado com USD$440,
concluímos que o investimento internacional é mais atrativo. Ou seja, que manter o meu recurso
nos mercados internacionais e receber 5% de juros em dólares é mais vantajoso do que receber
10% de juros em reais com uma expectativa de depreciação do real de 20%.
Observe que mesmo tendo uma taxa de juros nominal doméstica mais elevada do que
a internacional, se a expectativa de depreciação da moeda doméstica é muito elevada, ela pode
mais do que compensar o ganho oferecido pela taxa de juros e levar o nosso investidor ao tomar
a decisão de não colocar os seus recursos do mercado doméstico, e, sim, no mercado internacio-
nal. Mantendo a suposição de que o risco relativo seja estável, o fluxo de capitais vai sair do país
doméstico e vai para os mercados internacionais. Por outro lado, quando há uma expectativa de
apreciação da moeda doméstica, há um ganho adicional ao retorno oferecido domesticamente,
o que faz com que os agentes tenham um maior interesse nos ativos domésticos. Observem que
estamos tratando, em geral, de retornos associados a riscos diferentes, há, necessariamente, um
diferencial de risco entre o governo brasileiro e dos Estados Unidos, por exemplo, que deve
estar contabilizado no diferencial de taxas de juros mesmo considerando a PJD.
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

A partir da teoria da PJD, podemos entender o comportamento da taxa nominal de


câmbio, porque a taxa de juros doméstica é formada em função dos objetivos domésticos na
gestão da política monetária doméstica, como veremos adiante, e o mesmo acontece com a taxa
de juros internacional de referência, que pode ser representada pela taxa dos Estados Unidos
e portanto são dados exógenos em relação ao mercado de câmbio. Logo, uma vez que essas
duas taxas sejam determinadas pelas respectivas políticas monetárias de cada um desses países,
podemos concluir que a taxa nominal de câmbio vai ser um reflexo da decisão dos agentes
de entrar ou sair de um mercado financeiro em função desse diferencial de taxa de juros e
podemos entender a PJD como uma teoria de determinação da taxa de câmbio. Se houver
uma elevação na taxa de juros doméstica, dada a expectativa de taxa de câmbio no futuro e a
taxa de câmbio no presente, ou seja, dada a expectativa de depreciação da moeda doméstica,
uma elevação na taxa de juros doméstica faz com que os agentes tenham mais interesse em
ativos domésticos do que em internacionais.
Haverá uma entrada de capital financeiro, produzindo um excesso de oferta de dólares
no mercado cambial, que pressiona o preço do dólar para baixo, a taxa nominal de câmbio cai,
ou seja, moeda doméstica se aprecia. Uma queda na taxa de juros doméstica leva ao resultado
contrário, ou seja, vai produzir uma depreciação da moeda doméstica. A mesma coisa vale
quando os Estados Unidos fazem sua política monetária e elevam a taxa de juros internacional,
há um movimento de saída de capitais financeiros do país para o resto do mundo.resultando em
depreciação da moeda doméstica.
Introdução à Derivativos
Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: distinguir entre ativos financeiros negociados em mercados


a vista e derivativos, em que as negociações são feitas no presente para entrega
futura do ativo subjacente, destacando o papel do hedger e do especulador.

Nos quatro segmentos anteriores, embora houvesse diferenças em prazos de maturi-


dade e graus de risco entre os ativos de cada segmento, todos têm uma característica comum:
seus ativos financeiros são comprados e vendidos no momento presente, são chamados de mer-
cados a vista, ou mercados spot. Mas existe uma série de outras de outros ativos financeiros que
têm uma característica um pouco diferente e um papel muito importante dentro da estrutura dos
mercados financeiros, porque permitem negociações no presente para entrega de ativos no fu-
turo. Ou seja, os agentes hoje podem negociar nesse segmento dos mercados financeiros ativos
de interesse, mas que só serão efetivamente trocados, transacionados, comprados e vendidos,
no futuro, com um preço predeterminado: são os chamados mercados de derivativos.
Os derivativos são instrumentos financeiros bastante complexos por diversos motivos,
um deles é o fato de que o ativo sobre o qual se negocia hoje um preço para entrega futura,
chamado ativo subjacente, possa ser qualquer outro ativo do mercado financeiro ou mesmo
commodities minerais ou agropecuárias. Derivativo é um ativo que deriva de outro ativo e, na
verdade, um derivativo pode derivar de um conjunto de outros ativos, ou seja, há uma gama
enorme de possibilidades de criação de derivativos nos mercados de derivativos.
Para ilustrar, apresentamos algumas operações mais comuns nos mercados de deriva-
tivos. Uma delas é o contrato futuro, que permite às partes comprada e vendida, que estão
negociando neste contrato, definir hoje o preço a que o ativo subjacente será negociado no fu-
turo (3 ou 6 meses à frente, 40 dias à frente, por exemplos), definido como prazo de exercício
do derivativo. O ativo subjacente pode ser uma ação de uma empresa, um índice de ações, uma
moeda estrangeira, uma moeda digital, uma commodity, como por exemplo, açúcar, café, soja,
boi gordo, petróleo, ouro, etc.
Considere um exportador que receberá o pagamento em dólares pelo produto vendido
daqui a 90 dias. Ele não consegue saber hoje por quanto será possível vender esses dólares no

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

mercado de câmbio à vista daqui a 90 dias, e em geral está interessado em ter segurança e não
quer ficar exposto à variação do preço do dólar lá na frente. Neste caso, ele poderia assumir a
posição de vender dólares daqui a 90 dias por um preço X num contrato futuro, em que, do outro
lado, há alguém que está apostando no fato de que o dólar no mercado a vista lá na frente estará
mais alto do que X, e assumindo a posição comprada no mesmo contrato futuro. A aposta da
posição comprada, nesse caso, é de que terá um ganho de arbitragem comprando dólares a X e
vendendo por mais que X no mercado a vista daqui a 90 dias. Esse sujeito que faz a contraparte
apostando no ganho de arbitragem, normalmente, é um especulador, e o sujeito que busca a
segurança, normalmente, é o hedger, que busca minimizar o efeito da flutuação do preço do
ativo subjacente lá na frente.
As modalidades de derivativos são:

• Swap
O swap é uma troca de fluxos de caixa entre ativos com indexadores distintos, por exem-
plo, uma dívida com juros indexados ao câmbio e outra com juros indexados à inflação.
Os responsáveis pelas dívidas trocam apenas o fluxo de caixa, mas não o principal, até o
vencimento do swap.

• Contrato futuro
Uma parte concorda em fornecer um ativo em alguma época no futuro, em troca do acordo
da outra parte em pagar um preço combinado na ocasião do fornecimento. O primeiro in-
divíduo fica com a sua posição vendida no futuro, e o último, fica com posição comprada.
tais contratos são regulamentados e garantidos por câmaras de compensação, como a B3,
no caso brasileiro.

• Contratos a termo
Não são negociados em bolsa, pois são acordos particulares entre duas instituições finan-
ceiras ou uma instituição e um cliente. São os chamados contratos de balcão.

• Opções
As opções podem ser de venda ou de compra. O comprador de uma opção de compra,
por exemplo, adquire o direito de comprar o ativo subjacente no futuro, a um preço pré-
determinado, ele exercerá a opção apenas se o preço do ativo for maior que o preço de
exercício da opção na data de vencimento, pagando antecipadamente por esse benefício -
o prêmio ou preço da opção.

Não temos tempo hábil para entrar em detalhes, infelizmente, mas é um importante ter
em mente que os mercados de derivativos têm um papel fundamental na estrutura dos mercados
financeiros, que é esse de possibilitar negociações no momento presente com o travamento do
R ELEVÂNCIA DOS M ERCADOS F INANCEIROS 3

preço do ativo subjacente no futuro, o que dá oportunidade para aqueles agentes que querem se-
gurança, que não querem estar sujeitos à variação dos preços dos ativos no futuro, encontrarem
essa segurança, assim como dá oportunidade para aqueles agentes que buscam oportunidades
de ganho por meio da volatilidade, por meio da variação do preço dos ativos no futuro, terem
a oportunidade de apostar em ganhos, os especuladores, que propiciam liquidez e volume de
negociação nos mercados.
Uma das fontes principais da última crise financeira de 2007/2008, uma bolha especu-
lativa no mercado de derivativos que começou com as hipotecas americanas de baixa qualidade,
ou seja, de alto risco, as hipotecas subprime, a partir das quais diversos derivativos foram cria-
dos e geraram uma estrutura extremamente arriscada e de altos retornos. Quando os mutuários
começaram a ter dificuldades para manter suas hipotecas, isso gerou o efeito bola de neve dentro
da estrutura de derivativos e produziu toda a crise que conhecemos e acompanhamos nos anos
2007 e 2008.
Gerenciando risco de câmbio futuro

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Discernir entre Paridade de Juros Descoberta e Coberta,


com uso de derivativos para definir a taxa de câmbio futura.

Em nossa apresentação sobre os determinantes do câmbio no curto prazo, vários fatores


permaneceram constantes, enquanto utilizávamos a teria da Paridade de Juros Descoberta (PJD)
para tomar decisão de alocação de portfólio a partir dos retornos relativos avaliados na mesma
moeda. Porém, sempre é possível entender outros efeitos sobre a formação da taxa de câmbio,
por meio daquela teoria, tais como uma mudança na percepção de risco relativo entre os países,
situações em que há uma queda na liquidez internacional, entre outros, produzindo mudanças
nas demandas por ativos financeiros em geral e afetando, por consequência, as taxas de câmbio
dos países envolvidos.
É importante observar isso porque esses diversos choques que afetam a decisão de
alocação de carteira podem produzir um efeito sobre o resto da macroeconomia, como vamos
observar lá na frente. Quando finalizarmos o nosso modelo completo macroeconômico, uma
fonte possível de choque vem exatamente por meio dos fatores que elencamos como sendo
importantes para a tomada de decisão de alocação de carteira internacional. Vamos chamar
bastante atenção para isso lá adiante, quando estivermos analisando possíveis fontes de choques
que afetam a nossa macroeconomia.
Vamos esclarecer um outro aspecto sobre a PJD: por que “descoberta”? Porque es-
tamos tratando de uma decisão de investimento financeiro tomada hoje que leva em conta a
expectativa da taxa de câmbio no futuro, como o futuro é incerto, há um risco elevado de a
expectativa seja diferente da taxa de câmbio à vista, no prazo de vencimento do investimento.
Porém, os próprios mercados financeiros já nos fornecem instrumentos, alternativas para que
possamos determinar o preço da moeda estrangeira no futuro. Que mercados são esses em que
que negociamos hoje o preço de um ativo para ser entregue no futuro? Os mercados de de-
rivativos, sobre os quais já falamos também. Em lugar de utilizar na paridade de juros uma

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

expectativa sobre o câmbio no futuro, é sempre possível usar o valor da taxa de câmbio contra-
tado nos mercados futuros, ou seja, o preço contratado para um período à frente por meio de
um contrato futuro de câmbio.
Ao adotarmos essa estratégia, passamos ao conceito de Paridade de Juros Coberta.
Por que coberta? Porque agora estamos "hedgeados", estamos protegidos da variação do
preço da moeda estrangeira no futuro, pois esse preço já está determinado, ou seja, minimi-
zamos o risco da operação financeira contrapondo uma operação em derivativos que não precisa
ser só com futuros, pode ser com opções ou mesmo swaps, travando uma operação de prote-
ção, de hedge, para o câmbio num período adiante. Quando isso é realizado, temos a cobertura
desse risco de variação do preço da moeda estrangeira e temos, portanto, a expressão da teoria
no formato da paridade de juros coberta.
Essa estratégia é muito comum, em geral, as decisões financeiras de alocação de port-
fólio internacional buscam o hedge cambial em derivativos. Assim, na prática, estamos sempre
falando da paridade de juros coberta e ela será tão mais coberta quanto mais houver casamento
entre os prazos dos investimentos, com suas respectivas taxas de juros, e as possibilidades de
contratação ou de negociação de preço ao futuro. Nem sempre é possível fazer um hedge per-
feito, mas é sempre possível compor diferentes contratos, compor diferentes derivativos, e obter
a maior cobertura possível do risco de variação de preço da moeda estrangeira no final do pe-
ríodo de investimento.
Estrutura Lógica dos Mercados Financeiros

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: compreender a conexão das taxas de juros de curto, médio e
longo prazos por meio da Estrutura a Termo da Taxa de Juros e o fato de que no ní-
vel macroeconômico os mercados financeiros aparecem apenas em seus segmentos
monetário e cambial.

Os mercados financeiros estão sendo caracterizados aqui por segmentos que têm ca-
racterísticas específicas. Vale ressaltar que os segmentos monetário e cambial serão retomados,
porém, para fecharmos essa apresentação geral, é importante reforçar a conexão entre as taxas
de juros de curto, médio e longo prazo. Ao tratarmos de um mesmo emissor livre de risco,
por exemplo, títulos emitidos pelo governo, temos, na composição dessas taxas, a definição
das taxas básicas para os diversos prazos de vencimento e de negociação de ativos nos merca-
dos financeiros, referências fundamentais para a formação das demais taxas de juros de outros
emissores.
O comportamento da taxa de juros em relação ao prazo de maturidade dos títulos é
conhecido como estrutura a termo da taxa de juros - ETTJ. A estrutura a termo da taxa de
juros, em geral, apresenta um comportamento de que as taxas de juros de títulos com prazos de
maturidade maiores são mais elevadas que as taxas associadas aos títulos de prazos mais curtos.
Esse comportamento ascendente da ETTJ é conhecido como curva normal, exatamente por ser
a que se verifica maior frequência na estrutura dos mercados financeiros. A curva normal ocorre
porque, em geral, os títulos de longo prazo requerem que os investidores financeiros abram mão
de liquidez por um tempo maior e, para isso, eles demandam um prêmio de liquidez. Portanto,
títulos de prazos maiores naturalmente embutem esse prêmio de liquidez, resultando em que a
estrutura a termo da taxa de juros apresente um comportamento ascendente.
Chamamos a atenção para este conceito, EETJ, porque quando o banco central realiza
política monetária, ele altera exatamente a ponta curta dessa curva, ou seja, as taxas de juros
de curto prazo, e uma pergunta muito importante no contexto dos mercados financeiros, é essa:
como a alteração das taxas curtas por meio da política monetária afetam a formação das

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Mercados Financeiros

taxas mais longas? Dito de outra forma, até que ponto a política monetária, a gestão da taxa
básica de juros, tem efeito sobre as taxas de financiamento de longo prazo?
Em geral, em países em que os mercados financeiros são bem desenvolvidos, com uma
oferta de recursos bastante elevada, o efeito da política monetária sobre as taxas de juros de
longo prazo é muito pequeno. Significa que alterar as taxas de juros de curto prazo tem um
efeito na economia de curto e médio prazos, principalmente pela dinâmica, que já estudamos,
das respostas de consumo e do investimento, porém elas não devem afetar de forma significativa
a formação das taxas de juros para recursos de longo prazo, o que, de certa forma, desconecta a
gestão da taxa de juros de curto prazo, ou seja, a política monetária, das taxas que são relevantes
para o crescimento econômico. Voltaremos a esse tema mais adiante, quando estivermos, ao fi-
nal do curso, utilizando a estrutura lógica para pensar na análise macroeconômica, reforçaremos
a diferença entre a flutuação da macroeconomia e a sua capacidade de crescer no longo prazo.
Mercados financeiros são formados por segmentos que, didaticamente, foram divididos
de acordo com o tempo de disponibilidade de recursos, o tipo de operação que se faz em cada
R ELEVÂNCIA DOS M ERCADOS F INANCEIROS 3

segmento, entre mercado monetário, mercado de crédito, mercado de capitais e o mercado


de câmbio, além do segmento de derivativos que pode estar associado a qualquer um desses
outros quatro segmentos, por ter seus ativos como ativos subjacentes. Há uma diversidade
enorme de ativos financeiros disponíveis nos mercados financeiros, com alternativas para formar
o portfólio, para alocar a riqueza, dos investidores financeiros em um número razoavelmente
grande de ativos.
Porém, quando pensamos a estrutura dos mercados financeiros no contexto da macroe-
conomia, uma coisa bastante curiosa acontece: essa variedade toda se resumindo, basicamente,
em três tipos de ativos. Por que que isso acontece e como esta simplificação pode ser entendida
como um resultado do processo de análise macroeconômica? Vamos esclarecer.
Os ativos financeiros significam débitos para certos agentes e créditos para outros. Dé-
bito para quem emitiu o ativo e crédito para quem o comprou, temos uma relação de partidas
dobradas, de débito e crédito na negociação dos ativos financeiros. Quando agregamos os
agentes na macroeconomia, em geral separamos os agentes entre agentes privados e governo,
de tal forma que quando colocamos todos os agentes privados em um único grupo, empresas,
famílias, etc., um ativo que é crédito para um agente é débito para o outro e esse ativo não apa-
rece no nível agregado. É por isso que as ações, os títulos negociados entre os agentes privados,
toda a gama de ativos financeiros, ou de aplicações financeiras que o sistema bancário oferece
para os agentes, ficam submergidas na agregação da macro, e apenas os ativos financeiros que
são negociados entre o governo e os agentes privados, ou entre a economia doméstica e o resto
do mundo aparecem, são analisados na estrutura da macro. Nesse caso, restam os ativos nego-
ciados entre o governo e os agentes privados: títulos públicos e moeda. E na negociação da
economia doméstica com o resto do mundo, temos também o segmento do mercado cambial.
Por esse motivo que, na estrutura lógica da macroeconomia, que apresentamos logo
de início, temos o mercado cambial, o mercado monetário e o mercado de bens e serviços,
como sendo a lógica de funcionamento básica da demanda agregada, e o mercado de trabalho
que vai nos ajudar a entender a estrutura da oferta agregada no curto prazo. Então, quando
tivermos este conjunto completo formado por esses quatro mercados integrados, e operando de
forma inter-relacionada, poderemos fazer uma análise macroeconômica completa, entendendo
os determinantes do produto, da inflação, da taxa de juros e da taxa de câmbio, que serão as
nossas variáveis endógenas fundamentais.
Se há títulos emitidos pelo governo, e negociados entre governo e agentes privados, por
que somente o mercado monetário aparece? Não há títulos de médio, de longo prazo do governo
emitidos? Sim, há. Porém, basicamente tratamos dos títulos de curto prazo, que são os títulos
com data de vencimento de até 1 ano e que formam a taxa básica de juros da economia e isso se
deve a um motivo bastante simples: nossa análise é uma análise estática, não vamos considerar
a passagem do tempo explicitamente em nossa lógica de análise macroeconômica, em nosso
modelo simplificado. Portanto, não conseguimos conectar claramente o comportamento da taxa
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

de curto com as demais taxas na estrutura a termo. Seria necessário considerar a passagem
do tempo, precisaríamos fazer uma análise dinâmica, que se tornaria bastante complexa de ser
comunicada apenas do ponto de vista lógico, sem uso de instrumentos matemáticos formais.
Em geral, os modelos macroeconômicos em nível básico e intermediário, principal-
mente no nível de graduação, são normalmente estáticos, são modelos em que buscamos en-
tender um ponto de referência para onde a economia está caminhando, ou seja, o chamado
equilíbrio estático, mas não temos muitas informações ou muitos instrumentos para descrever
como as variáveis se comportam ao longo do tempo, ou seja, a dinâmica não está claramente de-
senhada no contexto desses modelos, e é por isso que os títulos de longo prazo do governo não
são tratados no contexto do segmento de mercados financeiros, em modelos macroeconômicos
mais simplificados.
Regime monetário-cambial sob metas de inflação

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Estudar a conexão entre a escolha dos regimes monetário,
cambial e fiscal na macroeconomia, considerando que o objetivo principal da auto-
ridade monetária seja o de manter a estabilidade da inflação.

Um regime macroeconômico é um conjunto de normas escritas ou não, um conjunto


de ações, por meio das quais o governo se compromete a atuar na economia perante ao pú-
blico, perante aos agentes privados da economia. Esses regimes podem estar escritos, podem
ser leis, ou não, podem ser simplesmente institucionalizados pela prática do governo, seja pelo
lado da sua gestão da política monetária, pelo lado da sua gestão da política cambial, ou ainda,
retomando as aulas anteriores pela gestão da política fiscal. Quando falamos de regimes macro-
econômicos, estamos falando da escolha que os governos realizam em relação a como gerenci-
arão o regime monetário, o regime cambial e o regime fiscal na macroeconomia.
Já tratamos da gestão fiscal na macroeconomia que, a princípio, deve atender à restri-
ção orçamentária intertemporal do governo: ele deve gerenciar gastos e tributos de tal forma
que, ao longo do tempo, tenha uma sustentabilidade fiscal. Essa uma forma de gerenciar a po-
lítica fiscal significa adotar um certo regime fiscal. Por exemplo, podemos ter adoção de um
regime fiscal em que o governo se comprometa em atingir certas metas de superávit primário
ou de superávit nominal, ou de estabilizar a relação dívida-PIB ao longo do tempo, qualquer
uma dessas escolhas seria um exemplo de regime fiscal.
Do ponto da atuação do governo frente aos mercados financeiros, consideramos as
escolhas estritamente dos regimes monetário e cambial. E há uma conexão entre essas escolhas,
ou seja, assim como a escolha do regime fiscal deverá ter algum grau de influência sobre a
organização da macroeconomia e a gestão das demais políticas macroeconômicas, as escolhas
do regime monetário e cambial também se inter-relacionam.
A princípio, estamos pensando em regime monetário, fiscal e cambial que estejam de
acordo com o contexto do regime de metas de inflação. Esse contexto é muito comum em

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

países desenvolvidos, que não necessariamente adotam o regime de metas de inflação explici-
tamente, mas que gerenciam suas políticas monetária, cambia e fiscal, em conjunto, no sentido
de propiciar que a gestão da política monetária esteja voltada para o alcance da estabilidade da
inflação no longo prazo 1 .
Os bancos centrais de países que atuam sob esse regime são responsáveis por fazer
com que o objetivo estabelecido pelo regime monetário, de estabilizar a inflação futura, seja
alcançado pela gestão da política monetária no dia a dia. Para isso, é importante que o gestor
da política monetária tenha, pelo menos, a independência de instrumento, que significa que
o banco central é capaz de escolher e gerenciar os seus instrumentos de política monetária, a
fim de direcionar, de conduzir a formação da taxa básica de juros da macroeconomia, para que
a economia ao longo do tempo, no futuro, alcance um certo patamar de inflação, que esteja de
acordo com a meta de inflação estabelecida pelo órgão planejador - o Ministério da Fazenda e
o Comitê de Política Monetária, Copom, no caso brasileiro. A meta de inflação é estabelecida
entre limites de flutuação, superior e inferior, exatamente para acomodar choques imprevistos,
e fazer com que haja uma maneira de verificação da eficácia da gestão da política monetária,
sem estar estritamente ligado a um número específico, ou seja, o centro da meta.
Num regime de metas de inflação, teremos, pelo lado fiscal, exatamente um compor-
tamento semelhante àquele que já estudamos, um comportamento em que o governo esteja
comprometido com a sustentabilidade fiscal, com o equilíbrio intertemporal das suas contas.
Por que isso é importante? Exatamente para que possamos ter a determinação da taxa de ju-
ros na economia sendo guiada de forma independente das necessidades fiscais do governo, ou
seja, para que não haja muita interferência entre aquilo que está acontecendo do lado fiscal e a
formação da taxa de juros básica. Isso já é um exemplo do que seria a independência de ins-
trumento. Essa ligação poderia surgir, por exemplo, de o governo persistentemente produzisse
déficits primários, o que significa que ele precisaria buscar recursos nos mercados financeiros
para equilibrar o seu orçamento, financiando os seus gastos em excesso por meio de emissão de
dívida. Emitir dívida significa se comprometer com uma certa taxa de juros. Quanto mais o go-
verno esteja numa situação fiscal crítica, mais os agentes que oferecem recursos nos mercados
financeiros requererão uma taxa de juros mais elevada, para comprar títulos com maior risco,
já que o governo cada vez gasta mais, cada vez emite mais títulos e, portanto, a possibilidade
de que ele tenha algum problema de inadimplência no futuro se eleva, o que eleva a percepção
de risco dos agentes nos mercados financeiros. Dessa forma, temos um exemplo em que o lado
fiscal do governo estaria puxando as taxas de juros para cima. Isso poderia ser incompatível
com o objetivo da política monetária, e poderia pré-determinar, ou seja, ter uma conexão de

1
Atualmente, 27 países adotam o regime de metas de inflação formalmente, entre desenvolvidos, por exemplo,
Austrália, Canadá, Nova Zelândia, Suécia, Suíça, Reino Unido e em desenvolvimento, como Brasil, Chile,
Colômbia, Israel, México, Peru, Turquia. Outros países mantêm o mesmo compromisso com a estabilidade de
inflação como objetivo fundamental da política monetária no longo prazo, ou seja, atuam como se adotassem
o regime de metas de inflação, tais como os Estados Unidos, a zona do Euro, o Japão.
R EGIME M ONETÁRIO SOB METAS DE INFLAÇÃO 3

causalidade sobre as taxas de juros da política monetária, que são as taxas de juros de curto
prazo. Essa seria uma situação que chamamos em macroeconomia de dominância fiscal.
É importante que, numa estrutura de metas de inflação, minimizemos a possibilidade
de existência de dominância fiscal, é importante que tenhamos independência de instrumento.
A independência de instrumento, neste caso, significa simplesmente que o Banco Central tem
condições de gerenciar a taxa de juros de acordo com os objetivos da política monetária, que
não estão sob os efeitos de um comportamento fiscal insustentável.

Figura 1 – Tripé Macroeconômico: conexão lógica entre os regimes fiscal, cambial e monetário

Da perspectiva macroeconômica da corrente principal, é fundamental que haja sus-


tentabilidade fiscal, mas também é muito importante que a atuação do governo em termos de
política cambial não predetermine a atuação da política monetária, formando o chamado tripé
da macroeconomia - para que haja independência de instrumento de política monetária, faz
necessário que a taxa nominal de câmbio seja determina pelo mercado cambial, na adoção de
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

um regime cambial flexível administrado.


Importante salientar que a escolha de regimes macroeconômicos é uma escolha polí-
tica realizada pela poder Executivo e chancelada pelo Congresso e, exatamente por isso, que,
quando há uma eleição majoritária sempre há a possibilidade de haver uma contraposição entre
perspectivas diferentes de escolhas para esses regimes. É muito importante entender quais são
os custos e os benefícios de se escolher um regime ou outro, e esse é o papel da teoria econô-
mica. Porém, a escolha é realizada pelo nível político, pelos gestores, pelo executivo e pelo
congresso, que, numa sociedade democrática, ao serem eleitos pelo voto, deveriam representar
a escolha majoritária da sociedade.
Nesse curso, no contexto de regime de metas, relativa independência entre lado fiscal e
o lado monetário é um pré-requisito, mas na verdade não há como se pensar no regime de metas
de inflação, sem que haja uma certa independência, sem que haja uma certa uma possibilidade
de que a política monetária possa ser gerenciada de forma independente ou o mais indepen-
dente possível da política fiscal. Assim, teríamos dois instrumentos para que o governo pudesse
gerenciar as flutuações da macroeconomia: o instrumento fiscal e o instrumento monetário.
As escolhas do governo em relação à sua atuação de política monetária e que regime
cambial pretende adotar não podem ser feitas de forma independente. Uma vez que um regime
cambial seja escolhido, o regime monetário estará certamente pré-determinado. E o contrário
também é verdadeiro, ao escolhermos o regime monetário, necessariamente há que se escolher
um regime cambial compatível. Por esse motivo, normalmente, falamos em arranjo monetário-
cambial e regime monetário-cambial, porque são duas escolhas dependentes, uma está conec-
tada à outra, é impossível fazê-las de forma separada. Desse ponto de vista, precisamos pensar
quais são as escolhas possíveis, por que e como escolhemos essas combinações entre o regime
cambial e monetário? Ao longo das próximos módulos, trataremos detalhadamente desta im-
portante conexão.
O papel da moeda na economia

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Compreender o papel de meio de troca, unidade de conta e


reserva imperfeita de valor de moedas fiduciárias.

Para definirmos as escolhas, é necessário que passemos, de maneira também rápida e


relativamente superficial, sobre uma discussão muito importante a respeito do que seja a moeda
na economia.
O que é a moeda na economia? Qual é o seu papel, e como a escolha dos regimes
cambial e monetário está associada à compreensão do que seja moeda? Observando a história
das economias, encontramos diversas commodities que serviram de moedas longo do tempo,
mas vamos pensar no contexto mais recente. A partir dos anos 70, observamos uma mudança
muito relevante no sistema de pagamentos internacional, marcada pela quebra dos acordos de
Bretton Woods, que desde o fim da segunda guerra mundial garantia a paridade fixa entre as
moedas domésticas e o dólar e o lastro deste em ouro. Com a quebra desse acordo de forma
unilateral por parte dos EUA, houve a necessidade de se estabelecer um novo arranjo para o
sistema de pagamento internacional, estabelecido em termos de paridades flexíveis, de relação
entre moedas que podiam mudar ao longo do tempo. Os países começaram a adotar regime
de câmbio flexível e as moedas domésticas e conversíveis internacionalmente perdem a sua
referência em relação ouro, perdem o seu lastro, retomando a hegemonia de moeda fiduciária.
Sempre houve a coexistência ao longo da história, de moedas lastreadas ou moedas metálicas e
moedas fiduciárias. Ao longo do tempo, houve o predomínio da moeda lastreada com o padrão
ouro e depois com sistema de Bretton Woods e com a queda de sistema no início dos anos
70, começou o predomínio da existência de moedas puramente fiduciárias, moedas baseadas na
confiança.
E a moeda, basicamente, qualquer que seja a estrutura de pagamentos de uma econo-
mia ou internacional, tem um papel fundamental: ser um meio de troca de uma sociedade, de
uma economia. Um ativo financeiro é meio de troca na economia quando ele tem aquilo que
chamamos de poder liberatório. Poder liberatório é a capacidade de quitar transações, signi-
fica simplesmente isso. Por exemplo, quando vamos à padaria e compramos o pãozinho de todo

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

dia, pagamos com nosso cartão de débito, utilizando um recurso que está disponível na nossa
conta corrente, esse montante de recursos é moeda: uma vez utilizada, a transação está saldada,
ou seja, paguei com meu cartão de débito, ou com a moeda que está no meu bolso, papel-moeda
ou moedas metálicas, quitei a transação. O que aconteceria se eu tivesse utilizado o meu cartão
de crédito para fazer o pagamento? Seria bastante diferente: transação estaria quitada entre
mim e o dono da padaria, mas não estaria saldada entre a gestora do cartão de crédito e mim.
Temos aí o uso de um instrumento financeiro que não saldou a transação, portanto não é moeda,
ou seja, cartão de crédito é credito, não é moeda.
Ser meio de troca é a característica fundamental da moeda, em decorrência de ser meio
de troca, ela também passa naturalmente a ser usada como unidade de conta, ou seja, todos os
bens e serviços passam a ser cotados em moeda, seus preços são expressos em moeda. E além
disso, a moeda também pode ser uma reserva de valor de forma imperfeita, o que significa que
ela pode transportar valor no tempo, porque a inflação corrói o sobre o poder de compra, o valor
real, da moeda.
Em se tratando de moedas fiduciárias, um tema muito relevante é a determinação do
seu valor: o que garante o valor de uma moeda fiduciária? A confiança. É muito importante
que o governo escolha e comunique claramente para a sociedade quais são os regimes por meio
dos quais ele vai atuar, que a sociedade reconheça e legitime esses regimes, por meio das suas
escolhas em sociedades democráticas, votando, para que esses regimes se institucionalizem e se
tornem parte do processo histórico da sociedade, ou seja, não esteja sujeito a mudanças radicais
a cada novo governo, por exemplo. Especificamente em relação ao regime monetário, isto é
extremamente relevante, porque é a manutenção do regime de metas de inflação, a clareza com
que o governo o gerencia, a comunicação do governo sobre a sua gestão para o público, e a
compreensão do público de que o regime está sendo conduzido conforme indicado e anunciado
previamente, que produz credibilidade e valor para a moeda doméstica, já que ela não tem
nenhum lastro real. Uma moeda fiduciária tem o seu valor e ganha credibilidade quanto mais
os agentes confiem que o banco central, braço executivo do governo, irá gerenciar a política
monetária de tal forma a garantir a estabilidade de inflação e o poder de compra da moeda, no
contexto do regime de metas de inflação.
Credibilidade como âncora nominal

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Discutir a relevância de âncoras nominais para moedas fi-
duciárias e introduzir diferentes tipos de âncoras.

No regime de metas de inflação, o valor da moeda está ancorado na credibilidade do


governo. Mas quais seriam as outras possíveis âncoras para o valor da moeda? Este termo,
âncora para o valor de uma moeda fiduciária, é conhecido na literatura como âncora nominal.
Toda economia que atua com uma moeda fiduciária precisa escolher uma âncora para essa
moeda fiduciária, precisa escolher algo que sirva como referência para o valor dela. Ao longo
do desenvolvimento da literatura de economia monetária, assim como a partir da experiência de
gestão de política monetária e cambial dos países desenvolvidos, principalmente, observamos
uma convergência entre a gestão e a teoria econômica no sentido de definir e esclarecer quais
seriam as possíveis âncoras, algo que garanta o valor da moeda ao longo do tempo.
Observamos que, além do regime de metas de inflação, que predomina hoje como ân-
cora nominal, outras possibilidades envolvem mais claramente a relação cambial-monetária.
Por exemplo, um país pode escolher, unilateralmente, ancorar a sua moeda numa moeda forte
internacional. Chamamos isso de regime câmbio fixo. Escolher um regime de câmbio fixo,
significa escolher ancorar o valor da sua moeda doméstica a uma moeda internacional, a uma
moeda conversível internacional de referência. Dessa forma, a credibilidade da moeda domés-
tica passa a estar ligada a credibilidade da moeda internacional. O regime de câmbio fixo produz
uma âncora natural para a economia, que é a referência da moeda estrangeira.
Fazer essa escolha é uma possibilidade para qualquer governo, um governo recém-
eleito ou um governo que esteja durante o seu período de mandato, pode escolher mudar o
regime de câmbio flexível para câmbio fixo. A grande questão é: quais são os custos e be-
nefícios dessa escolhas? Um benefício relevante é ancorar o valor da moeda doméstica numa
moeda de referência internacional e produzir uma estabilidade de preços domesticamente, uma
estabilidade de inflação, que depende basicamente da moeda internacional. Isso é interessante,
principalmente quando o país passa por processos contínuos de inflação ou de hiperinflação, em

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

que o governo dessa sociedade não consegue, pelos seus instrumentos de gestão, atuar no sen-
tido de fazer com que esse processo seja eliminado, ou seja, estabilizar a inflação. Nesse caso,
quando a economia sofre processos de inflação crônica ou de hiperinflação, em geral, uma saída
rápida para ancorar a economia é adotar o câmbio fixo.
Há, porém, um custo também muito relevante: ao fazer essa escolha, o banco central
está se comprometendo com a adoção de uma paridade de troca entre a moeda doméstica e
a moeda internacional, a taxa nominal de câmbio, que é o preço de uma unidade de moeda
estrangeira em termos de moedas domésticas. Isso significa que, toda vez que houver excesso
de oferta de dólares, ou excesso de demanda por dólares no mercado cambial, o banco central
tem de atuar no mercado cambial por meio dos seus dealers1 , e, ao atuar, contrabalancear os
efeitos das decisões privadas, comprando ou vendendo dólares no mercado cambial.
Nesse processo de intervenção no mercado de câmbio para manter a taxa nominal
fixa, o banco central afeta também a circulação de moeda doméstica. Quando há um excesso
de oferta de dólares e uma pressão para queda do preço do dólar, o banco central tem que
operar no mercado comprando dólares, quando ele compra dólares, paga esses dólares com a
moeda doméstica. Ele compra dólares e coloca reais em circulação, coloca moeda doméstica
em circulação. Ao fazer essa operação, vamos observar que há um efeito sobre a liquidez
doméstica, um efeito sobre a circulação da moeda doméstica, a circulação de reais, no caso
brasileiro.
Em termos mais técnicos, o banco central comprou dólares, aumentou o nível de re-
servas internacionais e, ao mesmo tempo, aumentou o montante de reais em circulação, pelo
aumento da base monetária. Isso corresponde a uma operação que afeta o ativo monetário e o
passivo monetário do banco central, que é exatamente a base monetária, aquela moeda domés-
tica que o banco central coloca em circulação. Mesmo ainda não tendo entrando em detalhes
sobre a gestão da política monetária, podemos antecipar o seguinte resultado: se o efeito da in-
tervenção cambial acaba sendo refletido na oferta de moeda doméstica, se o banco central quer
controlar o câmbio, como ele poderia controlar a taxa de juros, ou a circulação de moeda do-
méstica de uma forma diferente daquela que foi o resultado da sua intervenção no câmbio? Não
é possível, simples assim. Dito de outra forma,ou ele escolhe um câmbio fixo e deixa a quanti-
dade de moeda doméstica, e, como será visto daqui a pouco, a determinação da taxa básica de
juros doméstica ser endógena, ou seja, ser uma consequência da sua atuação no câmbio, ou se
ele quiser operar a política monetária para objetivos domésticos, como estabilidade de inflação,
fazendo com que a gestão da taxa de juros conduza a economia para um certo nível de inflação
no futuro, ele deve abrir mão de determinar o preço da moeda estrangeira. Se, por outro lado, o
banco central vende dólares para cobrir um excesso de demanda, os agentes do mercado cam-

1
Dealers de câmbio são instituições financeiras credenciadas e autorizadas pelo banco central a atuar em seu
nome no mercado, já que bancos centrais, normalmente, não realizam operações diretamente nos mercados
financeiros
R EGIME M ONETÁRIO SOB METAS DE INFLAÇÃO 3

bial estão pagando por esses dólares com moeda doméstica, que sai das mãos do público e vai
para o portfólio do banco central, ou seja, diminuindo a circulação de moeda doméstica.Não
é possível que o governo escolha câmbio fixo e gestão ativa da política monetária para
objetivos domésticos simultaneamente 2 .
Embora essa seja uma possibilidade de âncora nominal, a escolha do câmbio fixo, a
teoria econômica nos mostra, condiciona a escolha do regime monetário, em vários momentos
podem conflitar, levando a um dilema de política econômica. Se o compromisso é com o câm-
bio, o governo tem que manter seu compromisso às custas da política monetária ou quebrar seu
compromisso e mudar o regime cambial para fazer política monetária ativa 3 .

Figura 1 – Âncoras Nominais

Há outras possibilidades que foram experimentadas e colocadas em prática ao longo da


história econômica das economias desenvolvidas. Podemos citar, por exemplo, o uso da âncora
baseada no PIB nominal, que dominou a gestão da política monetária americana dos anos 80 e
início dos anos 90, em que há uma preocupação tanto com a estabilidade de preços quanto com
a flutuação da atividade econômica. O PIB nominal pode ser entendido como o produto entre
2
Isso é um ensinamento básico de modelos de macroeconomia aberta da década de 50, o famoso modelo
Mundell-Fleming, que talvez alguns de vocês já tenham estudado ou já tenham ouvido falar. É um modelo
bastante simples, mas que mostrava com clareza a relação entre a escolha de regime cambial e monetário,
basicamente levando a esse resultado que acabamos de ver
3
Temos um claro exemplo dessa inconsistência no caso brasileiro recente: até final de 1998, operamos com
um regime cambial muito semelhante ao regime de câmbio fixo. A taxa de câmbio mudava de acordo com
aquilo que o banco central escolhia, revelando um comportamento quase linear de elevação da taxa nominal
de câmbio, desde meados de 1995. A âncora nominal era a taxa de câmbio, porém, com a piora da situação
fiscal e a perda constante de reservas internacionais, o governo reeleito não conseguiu manter sua promessa
de campanha e logo em janeiro de 1999 alterou o regime cambial para o flexível administrado. Sem o com-
promisso com uma taxa de câmbio, o governo pode implementar a adoção do regime de metas de inflação em
junho daquele ano
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

o nível geral de preços e o PIB real. Significa que ter uma meta para o PIB nominal, é ter uma
meta para a estabilidade de preços e para a estabilidade da flutuação do produto ao longo das
flutuações macroeconômicas. É uma meta interessante, mas difícil de ser compreendida pelo
público, difícil de ser acompanhada e de ser mensurada, e é por isso que os Estados Unidos
foram, ao longo do tempo, abandonando esse tipo de meta, e começando a adotar metas mais
fáceis, mais explícitas e mais plausíveis do ponto de vista do acompanhamento, da compreensão
do público, como é o caso das metas de inflação. Além do câmbio, das metas de inflação e do
PIB nominal, houve também uma importante contribuição dos monetaristas para esse tema: a
proposta de ancorar o valor da moeda por meio de uma política monetária que tivesse restrita
a produzir uma taxa de crescimento da oferta de moeda constante, a chamada regra de Fried-
man. Isso também produziria uma escolha de âncora para a economia. Basicamente são essas
as possibilidades, mas mais modernamente, mais recentemente, por conta de questões de com-
preensão do povo, facilidade de comunicação e de gestão da política monetária, as economias
têm caminhado, têm convergido para âncoras baseadas em credibilidade e que se expressam
por meio das expectativas de inflação dos agentes, na configuração de um regime de metas de
inflação.
Gestão da Política Monetária

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Descrever os ativos que compõem o mercado monetário


e como a realocação de portfólio dos agentes afeta a formação da taxa de juros,
definida como retorno até o vencimento de um título.

O mercado monetário é o mercado em que a gestão da política monetária é realizada.


É constituído tipicamente pelos ativos moeda, sobre o qual já falamos, também títulos públicos
de curto prazo e, dependendo da forma como se instituiu o mercado monetário na economia
em análise, as reservas bancárias também tem um papel bastante relevante. O objetivo aqui
é elucidar a conexão entre títulos e moeda, que é a representação simplificada da gestão da
política monetária no caso brasileiro - nosso caso de interesse imediato, mas também é útil para
analisar qualquer estrutura de mercado monetário.
Os títulos públicos do mercado monetário são de curto e curtíssimo prazo, com ven-
cimento de até 1 ano e que normalmente são negociados na gestão da política monetária com
compromisso de recompra ou de revenda, normalmente são operações que duram poucos dias,
1 dia, em geral (overnight) e guia a formação da taxa básica de juros no dia a dia ao longo
do tempo. Um dos instrumentos de política monetária são as operações de compra e venda de
títulos em mercado secundário, realizada pelos dealers do mercado monetário, instituições fi-
nanceiras credenciadas pelo banco central para atuar em seu nome e fazer as ofertas de compra
e venda nesses mercados. Do ponto de vista prático, sempre tem essa essa intermediação, como
já vimos, um banco central não realiza operações diretamente nos mercados financeiros. Do
ponto de vista teórico, de maneira simplificada, fazemos referência a "banco central comprando
ou vendendo títulos nos mercados de títulos".
Como vimos anteriormente, ao agregarmos os agentes na macroeconomia estática, há
à disposição dos agentes dois ativos para que eles possam alocar seu portfólio (distribuir sua
riqueza): moedas e títulos públicos de curto prazo. Dado o estoque de riqueza, os agentes
decidem qual o percentual desse estoque querem aplicar em títulos e qual vai ser mantido na
forma de moeda. Uma pergunta que logo surge quando se pensa em alocar uma carteira entre

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

moeda e títulos, é a seguinte: mas se moeda necessariamente é um ativo financeiro que não paga
nenhum tipo de remuneração, e que ainda por cima tem uma perda do seu poder de compra dada
pela evolução da inflação, por que cargas d’água as pessoas gostariam de manter moeda no seu
portfólio? O que leva os agentes a demandar moeda na economia? Veja que, para entender
a lógica da gestão da política monetária, precisamos entender porque os agentes demandam
moeda. E mais, precisamos entender um pouco do processo de oferta de moeda na economia,
quais são os agentes que afetam esse processo, e qual é o papel do banco central, no processo de
oferta de moeda. Esses dois aspectos são essenciais para a compreensão de política monetária
e de formação da taxa de juros numa economia. Nesse ponto, é interessante observar, antes
mesmo de detalharmos com maior profundidade essas decisões de oferta e de demanda por
moeda, que, toda vez que os agentes quiserem mais moedas do que o que tem disponível, a
alternativa natural é que este agente vá ao mercado de títulos, e oferte títulos, vendendo parte dos
títulos que estão em sua portfólio. Este ponto é importante para que se compreenda a conexão
entre o mercado de moeda e o mercado de títulos de curto prazo, ambos partes constituintes do
mercado monetário.
Sempre que há, por algum motivo que ainda não estamos detalhando, um excesso de
demanda por moeda no mercado de moeda, por exemplo, necessariamente há uma contrapar-
tida de excesso de oferta de títulos no mercado de títulos. E o contrário também é verdadeiro:
toda vez que há um excesso de oferta de moeda, ou seja, mais moeda do que o que os agentes
desejam, eles compram títulos, aumentando a demanda por títulos no mercado de títulos. Essa
conexão é simplesmente o processo de decisão de alocação de portfólio, de colocar um estoque
de riqueza, uma parte em títulos, uma parte em moeda. Se eu quero mais moeda, eu quero
menos títulos, se eu quero mais títulos, eu quero menos moedas - é o chamado processo de
realocação de portfólio.
Os títulos são ativos financeiros com características específicas, padronizados com va-
lor de face (F) igual a 1000 unidades monetárias, podem ter prazos de maturidade diversos,
como vimos anteriormente, e apresentam fluxos de caixa também variados:

• Títulos descontados (zero coupon bonds): não oferece o pagamento de um cupom e sem-
pre será vendido no mercado a um preço inferior ao seu valor de face, produzindo retorno
positivo para o título;

• Títulos com cupom (coupon bonds): Cupons são pagamentos que ocorrem em períodos
de tempo específicos, normalmente semestrais ou anuais e que revertem para o portador
do título um fluxo de caixa até o prazo de vencimento, a maturidade do título, em que o
principal é pago.

O emissor do título, no caso o governo, está se comprometendo com o pagamento do


fluxo de caixa, com a devolução do principal ao final do prazo de vencimento desse título. Para
R EGIME M ONETÁRIO SOB METAS DE INFLAÇÃO 3

que saibamos qual é a atratividade deste título, precisamos de algumas informações, uma delas
é o prazo de vencimento, outra é qual é a composição do cupom, se o cupom é prefixado, pós-
fixado, se o cupom leva em conta alguma indexação, se ele acompanha, por exemplo, índice
de preços, se ele acompanha o câmbio, temos uma diversidade razoável de combinações dessas
informações. Estamos aqui falando basicamente de títulos de vencimento de até 1 ano, ou
seja, prazo de maturidade de até 1 ano e, neste caso, temos normalmente características título
descontado, embora seja possível que haja pagamento de cupom semestral.
Quando falamos em taxa de juros, estamos tratando da remuneração de um título ex-
pressa pela seu Yield To Maturity -YTM ou retorno até o vencimento, que nada mais é do que a
taxa interna de retorno do fluxo de caixa prometido pelo título que está sendo negociado, consi-
derado o preço de mercado do título no presente. É importante que se observe que este conceito
é válido para títulos de qualquer prazo de maturidade (T), e emitido por qualquer emissor. É
um conceito genérico, taxas de juros sempre se referem a remuneração de títulos de diversos
prazos.

C1 C2 C3 CT + F
P0 = + 2
+ 3
+ ... +
1 + Y TM (1 + Y T M ) (1 + Y T M ) (1 + Y T M )T

E para um título descontado:

F
P0 =
(1 + Y T M )T
Note-se que, necessariamente, o preço negociado hoje (P0 ) do título tem uma relação
inversa com a sua taxa de juros. Por exemplo, um título com cupom de R$ 100, a cada ano e
prazo de maturidade de 5 anos, vendido a R$ 1000 no momento da sua emissão tem que taxa
de juros? Basta fazer essa conta em uma planilha ou calculadora financeira:

100 100 100 100 1100


1000 = + 2
+ 3
+ 4
+
1 + Y TM (1 + Y T M ) (1 + Y T M ) (1 + Y T M ) (1 + Y T M )5

E a resposta é 10% de taxa de juros, exatamente a mesma taxa de retorno do cupom


100
RC = 1000
= 10%, o que significa que que está sendo pago por ele hoje, r$ 1000, pra poder
receber r$ 100 por ano e os r$ 1000 devolvidos lá no final. É verdade que a taxa de juros é
sempre igual à taxa de cupom? Não, não é verdade. Depende do preço ao qual o título está
sendo negociado hoje. É por isso que o mercado secundário de títulos, em que os títulos
são comprados e vendidos a toda momento, fornece uma importante informação sobre o que
os agentes esperam que aconteça com retorno desse título no futuro. Quando observamos a
compra e a venda desses títulos, um preço vai se formar no mercado de títulos. Se esse preço
for menor do que R$1000, a taxa de juros do título vai ser maior que 10%. E se esse título
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

for negociado hoje, no momento inicial do seu fluxo de caixa, a um preço maior que R$ 1000,
significa necessariamente que a taxa de juros desse título, ou seja, a taxa interna de retorno
desse fluxo de caixa será menor que 10%. Significa que toda vez que o preço de um título sobe,
a taxa de juros dele cai e toda vez que o preço cai, a taxa de juros sobe. Enfim, esta relação
inversa entre o preço do título e a taxa de juros é fundamental para entender como a decisão de
vários agentes na economia pode afetar a formação da taxa de juros e qual é o papel do Banco
Central na gestão da política monetária que tem como objetivo guiar a formação de uma certa
taxa de juros, predeterminada pelo Comitê de Política Monetária.
Determinação da Taxa de Juros

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Compreender como demanda e oferta de títulos resultam em


um preço do título, e portanto, uma taxa de juros correspondente.

Como nosso tempo é muito escasso, precisamos fazer certas escolhas. Infelizmente,
não poderemos estudar em mais detalhes todas as nuances e as implicações de prazos distintos
e efeitos de mudanças da taxa de juros sobre o retorno dos títulos (o chamado risco de taxa de
juros) 1 .
Vamos agora estudar o processo de formação do preço e da taxa de juros respectiva de
um título genérico, a partir da compreensão dos fatores determinantes da demanda e da oferta
de títulos, ou seja, do mercado de títulos. Se esse mercado está em equilíbrio, temos um preço
médio desse título sendo negociado e uma taxa de juros associada a este preço. Porém, se por
algum motivo exógeno a esse mercado, a demanda por títulos aumenta, ocorre um desequilíbrio
do tipo excesso de demanda que produz uma pressão para elevação do preço do título, porque
tem mais gente querendo comprar o título do que gente querendo vender. Quando a pressão de
demanda produz uma elevação no preço dos títulos, a taxa de juros desse título cai.
Preço do título subindo, taxa de juros caindo, preço do título caindo, taxa de juros
subindo. A compreensão intuitiva dessa relação também é relativamente simples: Se hoje paga-
mos R$1000 para ter um fluxo de caixa com cupom de 10%, a taxa de juros é de 10%. Porém,
se hoje pagarmos menos para ter esse mesmo fluxo de caixa, significa que além dos 10% do
cupom, ainda temos um ganho de capital, pois pagamos mais barato por um ativo que dará o
mesmo fluxo de caixa. Somando o fluxo de caixa com o fato de que pagamos mais barato, a taxa
de juros do título será maior naturalmente, sendo o contrário também válido. As características
do títulos não mudaram, porém, o preço flutuou no mercado por condições de demanda ou de
oferta, podemos ter um ganho ou uma perda de capital que afeta a taxa de juros do título.
1
Deixo um alerta: para avaliar a exposição de título com distintas maturidades e fluxos de caixa ao risco de taxa
de juros, usamos medidas de Duration, que é um prazo médio de maturidade ponderado pelo peso relativo do
valor presente de cada fluxo sobre o fruxo de caixa total.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Mercado de títulos genérico

A decisão de comprar ou vender um título, modernamente, é entendida a partir


da teoria do portfólio2 , que explica a demanda por ativos financeiros a partir do seu retorno
esperado relativo aos demais ativos da economia, do seu risco relativo e de sua liquidez relativa,
dada a riqueza a ser alocada. Os fatores retorno e liquidez relativos afetam positivamente a
demanda pelo ativo em análise, ou seja, quanto maiores mais demandado o ativo, assim como
a riqueza; já o risco relativo, tem um efeito inversamente proporcional, quanto maior o risco de
um ativo em relação ao risco dos demais disponíveis, menor sua demanda 3 .
Pois bem, vejamos que, para que possamos compreender a formação da taxa de juros,
precisamos entender como moeda e títulos se relacionam. Já fizemos essa análise levando em
conta não a teoria do portfólio, mas a simples decisão de realocação de portfólio dos agentes.
Quando eu quero mais moeda, eu quero menos títulos, quando eu quero mais títulos, eu quero
menos moedas. Esta lógica básica conectar esses dois mercados que compõem o mercado mo-
netário. Como há a inter-relação, quando um deles está em equilíbrio o outro, necessariamente,
estará. Assim, basta que representemos o comportamento de um deles para que a lógica de
raciocínio do modelos macroeconômico esteja completa. É comum, na literatura da área, que
apresentemos o mercado monetário pela lógica do mercado de moeda, e isso é uma consequên-

2
A teoria do portfólio foi desenvolvida a partir dos anos 50, com as contribuições de Markowitz para a teoria
de seleção de carteiras, e constitui a base da Moderna Teoria de Finanças, em que agentes avessos ao risco
alocam sua riqueza em função da relação retorno e risco dos ativos disponíveis, como vimos no Módulo sobre
Mercados Financeiros
3
Essa perspectiva pode ser adotadas para a compreensão da demanda por moeda, que também é um ativo
financeiro. Aqui, vamos ficar num nível de compreensão um pouquinho mais simples, mas o suficiente para
que possamos entender a gestão da política monetária e a formação da taxa de juros. Vamos apresentar a teoria
de demanda por moeda, a partir de uma perspectiva mais simplificada, que é a perspectiva keynesiana.
R EGIME M ONETÁRIO SOB METAS DE INFLAÇÃO 3

cia da inovação ou da contribuição que Keynes ofereceu para nossa macroeconomia lá nos anos
30, com seu livro clássico, destacando o papel da moeda e da taxa de juros nas inter-relações
macroeconômicas4 .
No entanto, colocar o foco sobre o mercado de moeda não significa que o mercado
de títulos tenha desaparecido da nossa análise. Ele continua importante porque é nele que a
taxa de juros se forma. Assim, para entender a política monetária e sua gestão da taxa de juros
básica, vamos entender o processo de oferta de moeda e o processo de demanda por moeda na
economia.

4
A opção metodológica e retórica de apresentação da teoria foi sempre trazer a lógica do mercado de moeda,
e foi isso o que prevaleceu, por exemplo, no modelo bastante conhecido de quem já tem algum conhecimento
anterior de economia, que é chamado o modelo IS-LM, em que o mercado de bens e serviços está represen-
tado IS e o mercado monetário está representado pela LM que é exatamente a representação do equilíbrio no
mercado de moeda.
Determinantes da Demanda por Moeda

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender como os motivos transação, precaução e especu-


lação explicam a demanda por moeda de acordo com a teoria de preferência por
liquidez.

A teoria keynesiana de demanda por moeda é conhecida como teoria da preferência


por liquidez, pois a moeda é o ativo líquido por natureza, classificado como ativo de liquidez
máxima na economia. Ter liquidez máxima é exatamente ter a capacidade de quitar transações,
que já discutimos anteriormente. Os demais ativos têm graus de liquidez diferentes porque
muitos deles não podem ser comprados e vendidos, ou seja, transformados em moedas, instan-
taneamente e quando podem, em geral, implicam em um risco de ganho ou de perda de capital
nesse processo. Quanto mais ilíquido é um ativo, mais demorado e/ou custoso é transformá-lo
em moeda. Quando falamos em preferência por liquidez, estamos falando em demanda por
moeda.
Por que as pessoas demandam moeda? Porque a moeda produz benefícios,gera a capa-
cidade de fazer transações, é um meio de troca na economia. Portanto, o motivo inicial, aquele
motivo mais fácil de ser compreendido, é o fato de que as pessoas querem moeda porque elas
desejam fazer transações, comprar e vender bens e serviços ou ativos financeiros em geral. Se
sabemos que eu temos, ao longo de um período, por exemplo, um mês, um fluxo de pagamentos
que precisamos honrar (por exemplo, pagar o aluguel da casa, a conta de telefone, as despesas
em datas específicas ao longo do mês), ao recebermos o salário (renda) uma parte dessa renda,
aquela que decidimos poupar, será alocada em ativos financeiros que rendem juros, que pagam
uma remuneração. Porém, uma parte deixaremos no formato de moeda, no formato líquido,
porque sabemos que temos uma série de pagamentos regulares ao longo do mês. Muitas vezes
não vale a pena o esforço de ficar alocando e realocando o portfólio, e optamos por deixar em
moeda pra fazer face às transações que devemos realizar no período de tempo.
Quanto maior o volume de transações que os agentes realizem, maior é o PIB da eco-
nomia, o nível de atividade, que passa a ser a aproximação utilizada para analisar a demanda por

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Demanda por Moeda

moeda, pelo motivo transação, da economia como um todo. Quanto maior (menor) o nível de
atividade da economia, mais (menos) moeda os agentes da economia desejarão - há, assim, uma
relação diretamente proporcional entre a demanda por moeda e o nível de renda da economia.
Porém, algumas transações não podem ser previstas com segurança no momento pre-
sente, podemos estar sujeitos, por exemplo, a algum evento não previsto que pode fazer com
que precisemos de liquidez imediata e essa incerteza nos faz demandar manter moeda para nos
precavermos dessas situações. Considerando a incerteza sobre o futuro, optamos por deixar um
pouco mais de moeda do que aquilo estimamos que seria necessário para fazer transações. Uma
pessoa que aja desse maneira é tida como uma pessoa precavida. Assim, o motivo precaução
é um segundo motivo que leva as pessoas a quererem manter moeda, a quererem ter liquidez,
mesmo a moeda não pagando nenhum tipo de remuneração.
Ainda nesse mesmo caminho, certas transações que desejamos fazer, muitas vezes po-
dem apresentar uma oportunidade melhor para serem realizadas no futuro. Se há uma expecta-
tiva de que o futuro nos trará oportunidades melhores de comprar ou vender um ativo financeiro,
por exemplo, podemos escolher ficar com mais moeda hoje para que, no momento em que essa
oportunidade acontecer, possamos possa realizar operação mais lucrativa. Ou seja, estaríamos
apostando na possibilidade de obter uma vantagem em comprar um ativo no futuro no lugar
de comprá-lo hoje. Essa estratégia de correr o risco de ganhar ou perder é a especulação. O
motivo especulação também é um motivo pelo qual os agentes decidem ficar com um montante
adicional dos seus recursos no formato de moeda hoje1 .

1
A incerteza sobre o futuro é um dos elementos centrais das contribuições de Keynes para a teoria macroeconô-
mica. Para a corrente principal, incerteza e risco probabilístico são sinônimos. O risco sobre o comportamento
dos preços no futuro pode levar os agentes demandarem mais moeda hoje, do que a que demandariam apenas
pelo motivo transação.
I NSTRUMENTOS DE P OLÍTICA M ONETÁRIA 3

Frente à incerteza/risco, os motivos precaução e especulação, são os outros dois moti-


vos que nos levam à compreensão do porque que as pessoas escolhem manter uma parcela dos
seus recursos no formato de moedas. São esses três motivos que sintetizam os benefícios que a
liquidez oferece. Mas, como toda decisão econômica, não há só benefícios, há também custos.
Quando escolhemos manter uma parte dos recursos no formato de moeda, abrimos mão de mais
títulos. E já sabemos que os títulos têm um retorno positivo, ou seja, pagam uma taxa de juros
para o seu comprador. Portanto, nesse caso, estamos avaliando alternativas à moeda, das quais
abrimos mão, ou seja, estamos falando do custo de oportunidade de manter moeda em nossos
portfólio, que é a taxa de juros dos títulos. Nesse sentido, quanto maior for a taxa de juros dos
títulos, menos liquidez eu vou querer, menos moeda eu vou querer.
Há duas forças guiando a demanda por moeda, uma que me faz querer mais moedas,
e que expressa, portanto, os benefícios da liquidez,e outra, que é o custo de oportunidade de
manter moeda, expresso pela taxa de juros que os títulos, que são os ativos alternativos à moeda.
Em relação ao motivo transação, vale ressaltar que a relação da demanda por moeda
com a renda leva em conta também os preços dos bens e serviços, ou seja, é uma relação com
a renda nominal, expressa pela quantidade de bens e serviços, que é o PIB real, multiplicado
por um índice de preços de bens e serviços, produzindo o PIB (ou renda) nominal. Por que
é importante fazer essa observação? Por um motivo muito simples: se demandamos moeda
para comprar 10 bens, e o preço de cada bem é de R$ 1, eu preciso de R$ 10. Se o preço dos
bens aumenta, se cada um desses bens passa a custar R$1,50, agora necessitaremos de R$ 15
para comprar os mesmos bens. Assim, a demanda por moeda responde a uma combinação de
quantos bens e serviços eu quero comprar, que é o PIB real, e qual é o preço médio desses bens
e serviços, dado por um Índice Geral de Preços. Isso significa que sempre que o nível geral de
preços subir e, portanto, tivermos uma inflação, teremos um efeito sobre a demanda por moeda,
as pessoas que desejarão mais moeda para comprar os mesmos bens.
O processo de Oferta de Moeda: Depósito
compulsório

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Entender como os diversos agentes afetam o processo de


oferta de moeda e destacar o instrumento de política monetária que afeta o "poder
de criação"de moeda pelos bancos comerciais.

O mercado de moeda tem, como qualquer mercado, uma demanda e uma oferta. Aca-
bamos de entender, de uma maneira simplificada, a decisão de demandar moeda por meio da
teoria de preferência por liquidez. Passamos a estudar, nessa e nas próximas aulas, como se dá
o processo de oferta de moeda e como os instrumentos de política monetária afetam a circula-
ção de moeda na economia. Esse é um aspecto muito importante, bastante complexo, mas que
também vamos tentar trazer de uma maneira relativamente simples e que nos ajudará a enten-
der como a política monetária, ao ser gerenciada, afeta o dispêndio doméstico, o consumo, o
investimento, as exportações líquidas e, portanto, produz um efeito real na economia no curto
prazo.
E mais adiante, também, nosso objetivo é entender como a política monetária pode ser
usada para minimizar flutuações que ocorram por outras causas, por choques sobre a econo-
mia. O processo de oferta de moeda, é um processo que envolve a decisão de três tipos de
agentes diferentes da economia. Antes de entender a decisão desses agentes, é bastante útil
que se defina muito claramente o que seja a moeda na economia, em termos bastante pragmá-
ticos. Moeda é aquilo que tem poder liberatório, como já vimos, aquilo que é utilizado para
saldar transações, só pode ser duas coisas: papel-moeda em poder do público, cédulas e moedas
metálicas, somado aos depósitos à vista em conta corrente.
Este agregado monetário, assim chamado, é conhecido na literatura como M1. Quando
falamos de oferta de moeda, estamos falando do agregado monetário M1. Este agregado mo-
netário é analisado da perspectiva da decisão do público entre qual a proporção desse recurso
mantido em moeda ficará no formato efetivamente de notas e moedas metálicas e qual será de-
positado no seu banco, na sua conta corrente, para que se possa fazer transações usando o cartão

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

de débito. Essa decisão é uma decisão unicamente do público. Ela depende, obviamente, da
tecnologia utilizada como sistema de pagamentos na economia. Conforme haja uma evolução
dessa tecnologia, há uma tendência natural para que as pessoas mantenham, praticamente, a
totalidade da sua moeda no formato de depósito à vista. Hoje, é cada vez mais fácil encontrar
pessoas que fazem todos os seus pagamentos com seu cartão de débito.
O desenvolvimento tecnológico do sistema de pagamentos afeta a decisão do agente
do quanto vai manter como moeda no bolso e quanto vai colocar na sua conta corrente, de
tal forma que, quanto mais a população tem acesso ao sistema bancário, ou seja, quanto mais
acessíveis forem as contas correntes, em geral, em média na população, maior será a proporção
de moeda mantida como depósito à vista. E essa é uma decisão muito importante porque ela
depende única e exclusivamente do público, ou seja, do detentor da moeda. O banco central
não pode dizer qual a parcela da moeda que os cidadãos deixarão no bolso ou na conta corrente.
Essa é uma decisão só, e única, e exclusiva do público, que está condicionada pelo ambiente
institucional e tecnológico, porém pode ser mudada. Pensemos o seguinte: numa situação de
crise, em que haja uma desconfiança de que o sistema bancário enfrentará uma crise, bancos vão
fechar e vamos ter um risco maior em relação à nossa moeda que está depositada nesses bancos
e dessa desconfiança pode ocorrer um pânico bancário, as pessoas vão até o banco e querem
sacar a sua moeda da sua conta corrente e guardar embaixo do seu colchão. Portanto, essa
decisão é uma decisão do público, ela não muda muito ao longo do tempo, é uma decisão que,
dado o ambiente institucional e tecnológico, é bastante estável e só muda em circunstâncias
realmente de percepção de risco e desconfiança em relação à segurança do sistema bancário, o
que raramente acontece em economias desenvolvidas1 .
Essa decisão do público afeta a disponibilidade de recursos para os bancos comerciais,
que propiciarão um efeito muito importante de circulação da moeda, que é o efeito multiplica-
dor, e que é originário exatamente da captação de recursos em contas correntes, em depósitos
à vista do público na economia. Quanto maior o percentual de moeda mantido no formato de
depósito à vista, maior a oferta de recursos que os bancos comerciais possuem a custo zero, já
que não há remuneração sobre recursos em depósitos à vista (moeda não paga juros, por defi-
nição) e que pode ser emprestado para outros agentes na estrutura do sistema bancário por uma
determinada taxa de juros.
Ou seja, captação de depósitos à vista é uma fonte importante de recursos para o pro-
cesso de intermediação bancária. Quando um banco capta depósito à vista empresta esse recurso
também, em curto, curtíssimo prazo para outros agentes, por exemplo, uma empresa que neces-
site de recursos para capital de giro, que queira descontar uma duplicata, ou seja, recursos de
curto e curtíssimo prazo. Isso faz com que tenhamos aí um processo de empréstimos por

1
Exceto, obviamente, em situações de crises financeiras ou bancárias, como por exemplo o que vivemos recen-
temente em 2007/2008. Mas em condições normais de temperatura e pressão, essa decisão é relativamente
estável.
I NSTRUMENTOS DE P OLÍTICA M ONETÁRIA 3

meio do sistema bancário, a partir da captação de depósitos à vista. Se um banco comercial


pode captar recursos a 0% e pode emprestar a uma taxa de juros positiva, qual seria a decisão
óbvia? Emprestar 100% dos recursos captados à vista, porque isso maximizaria a lucratividade
do banco. Porém, isso produziria um efeito bastante perigoso no sistema bancário, que é o risco
de iliquidez do sistema bancário.
Se o sistema bancário fosse deixado a sua própria sorte, provavelmente haveria situa-
ções recorrentes de falta de liquidez no sistema. Significa que, quando você coloca R$ 1000 na
sua conta corrente e vai usar esses R$ 1000 em pagamentos ao longo de um período de tempo,
os bancos vão usar esses R$ 1000 para emprestar para outros agentes. Se todo esse recurso fosse
emprestado para outros agentes e você, o dono desses R$ 1000, decidisse ir ao seu banco sacar
R$ 1000 no caixa eletrônico e manter em espécie no seu bolso, o que aconteceria? Esses R$
1000 não estariam disponíveis para serem devolvidos para você. E isso, obviamente, causaria
um pânico, uma corrida bancária por falta de liquidez no sistema bancário. É por isso que, con-
forme os bancos centrais foram se institucionalizando nas economias desenvolvidas, o banco
central regula esse sistema. “Regula” significa que ele estabelece um percentual desses depósi-
tos à vista que não pode ser utilizado pelos bancos comerciais no seu processo de empréstimos
a partir da captação desses recursos.
Esse percentual chamado de reservas compulsórias, que são uma parte dos depósitos
à vista que os bancos comerciais são obrigados (compulsório) a recolher aos cofres do banco
central, e é exatamente esse percentual que vai garantir a liquidez do sistema bancário. É claro
que, se todo mundo for ao mesmo tempo sacar tudo que tem na sua conta corrente, teremos
uma crise bancária, obviamente, mas a possibilidade de isso acontecer é muito pequena. Basta
que tenhamos uma boa estimativa de qual é o fluxo médio de depósitos e de saques em contas
correntes, que teremos aí, qual é o percentual médio de reservas compulsórias que o banco
central deve estabelecer no sistema bancário.
A definição d percentual de reservas compulsórias é de responsabilidade do banco cen-
tral e pode, portanto, ser utilizada como um instrumento de política monetária. Significa que,
ao estabelecer o percentual de reservas compulsórias, o banco central interfere no processo de
oferta de moeda da economia. Ao interferir neste processo, como veremos daqui a pouco, guia
a formação das taxas de juros básicas da economia. Em termos apenas de manutenção de liqui-
dez do sistema bancário, os depósitos ou reservas compulsórios poderiam ser algo como 5% a
10% dos depósitos à vista. Porém, quando um banco central estabelece percentuais de reservas
compulsórias muito elevados, claramente, ele está utilizando essa sua prerrogativa como ins-
trumento de política monetária. Quanto maior o percentual de reservas compulsórias, menos
recursos dos depósitos à vista sobram para os bancos comerciais emprestarem para outros agen-
tes. Isto diminui a circulação da moeda, diminui o que chamamos de multiplicador bancário.
Ao diminuir o multiplicador bancário, a oferta de moeda, a moeda em circulação na economia,
cai. É nesse sentido, nesse processo de empréstimos a partir da captação à vista, que dizemos
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

que os bancos comerciais"criam"moeda, ou seja, aceleram o processo de circulação da moeda,


por meio do processo de captação à vista e empréstimo. Se tivermos um percentual baixo de
reservas compulsórias, esse processo é potencializado, portanto o multiplicador bancário cresce
e a oferta de moeda na economia cresce.
É importante observar que, embora as reservas compulsórias sejam obrigatórias, como
o próprio nome já diz, nada impede que os próprios bancos comerciais definam uma manu-
tenção de reservas voluntárias. Ou seja, os bancos comerciais, por iniciativa própria, podem
escolher não emprestar todos os recursos que sobrarem depois de recolhido os depósitos com-
pulsórios. Por que um banco faria isso? Um banco pode decidir manter reservas voluntárias
em situações, por exemplo, de inadimplência muito elevada, em situações em que o risco do
pagamento desse recurso seja muito elevado. Ele pode tomar essa decisão porque está, por
exemplo, escolhendo ficar com liquidez para fazer operações mais rentáveis, que ele espera ter
oportunidade de fazer no futuro - o motivo especulação também funciona aqui!É nesse sentido
que, assim como a decisão do público, a decisão dos bancos comerciais também vai afetar o
processo de oferta de moeda.

Figura 1 – Processo de Oferta de Moeda: efeitos das decisões dos agentes

Assim, a decisão também, dos bancos comerciais é relevante para oferta de moeda na
economia. Quanto mais os bancos escolhem manter as reservas voluntárias, seja como caixa,
seja como depósitos adicionais na conta de reservas no banco central, mais eles produzem o
efeito de diminuir o processo de circulação da moeda, ou seja, menor o multiplicador mone-
tário (m), portanto menor a oferta de moeda.
Este multiplicador é aplicado a partir de um montante inicial de moeda, que denomi-
namos base monetária (H). A base monetária é um conceito contábil e que corresponde ao
passivo monetário do banco central. Basicamente, o passivo monetário é composto por papel-
I NSTRUMENTOS DE P OLÍTICA M ONETÁRIA 5

moeda em poder do público, mais o total de reservas do sistema bancário. Nesse total de reser-
vas, temos as reservas compulsórias, e eventualmente as reservas voluntárias que os próprios
bancos decidam manter. É o montante de moeda que podemos pensar como sendo efetivamente
criado e colocado em circulação pelo banco central, a base monetária é o princípio do processo
de oferta de moeda. A partir dela, a decisão do público do quanto manter de moeda no seu
bolso ou na sua conta corrente, a decisão dos bancos comerciais de manter suas reservas volun-
tárias e, aqui, neste momento, já temos uma das importantes decisões do banco central, que é
a definição do percentual de reservas compulsórias que cada banco deverá obedecer. Essas três
decisões irão afetar o processo de multiplicação de moeda, ou seja, o multiplicador monetário,
além dessas decisões, ainda há mais duas decisões, que estão em mais dois instrumentos de
política monetária. É por isso que, de forma simplificada, sempre associamos a oferta de moeda
na economia ao banco central, como se o banco central fosse o único responsável pela oferta
de moeda na economia. Na prática, não é bem assim que acontece. Vemos aqui que a decisão
do público e a decisão dos bancos comerciais também afetam o processo de oferta de moeda na
economia.
O processo de Oferta de Moeda: taxa de redesconto de
liquidez

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Entender como a sinalização sobre o custo de empréstimos


de liquidez jundo ao banco central afeta o processo de oferta de moeda.

Outros dois instrumentos de política monetária à disposição de um banco central, em


termos gerais, são: a definição de uma outra taxa de juros conhecida como taxa de redesconto
de liquidez e as famosas operações de mercado aberto, as operações de textitopen market, com
títulos públicos. Vamos começar apresentando o instrumento taxa de redesconto de liquidez.
Esse é um instrumento que está associado ao papel dos bancos centrais como emprestadores
de última instância. O sistema bancário é regulado e suas normas são definidas pelo banco
central, e uma das normas é a de que um banco não pode finalizar o seu dia fechando seu
caixa em débito, ou seja, no vermelho. Ao longo do dia o banco vai recebendo recursos e
emprestando. O controle desses fluxos depende do sistema de informação, do sistema bancário
de pagamentos de que o país disponha. Ao final do dia, quando a tesouraria do banco fecha, ela
observa que ela tem recursos sobrando. Isso obviamente não é interessante para o banco, passar
de um dia para o outro com excesso de dinheiro em seu caixa. Por outro lado, outros bancos
podem constatar o contrário, que emprestaram mais do que receberam de depósito à vista. O
primeiro processo é, então, buscar recursos no próprio sistema bancário, no próprio sistema
interfinanceiro, emitindo um título que é comprado por outro banco que tem recursos sobrando,
é um empréstimo entre bancos, por meio de certificados de depósitos interfinanceiros1 . Aqueles
bancos que conseguirem resolver o seu problema emprestando entre si estão dentro das normas.
Porém, pode ser que haja um banco que esteja numa situação reconhecida no mercado
interbancário como mais arriscada, esteja com uma carteira de ativos mais complicada, assu-
mindo maiores riscos, e pode ser que nenhum banco queira emprestar recursos para ele. Se
ele estiver com escassez de liquidez, necessariamente buscará recursos de liquidez no banco
1
No caso brasileiro são os CDI’s, e uma taxa de juros se forma nesse mercado de CDI’s.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

central, tomando um empréstimo pelo qual o banco central cobrará uma taxa de juros pré-
anunciada. Esta taxa de juros é a taxa de redesconto de liquidez. É a taxa de juros que os
bancos comerciais terão de pagar ao banco central se precisarem de liquidez ao final do dia.
É o banco central fazendo seu papel de emprestador de última instância, garantindo a liquidez
do sistema, garantindo que o sistema funcione normalmente, sem grandes riscos ou pânico por
falta de liquidez.
O que acontece se o banco central eleva a taxa de redesconto de liquidez? Isso pro-
duzirá uma elevação das taxas de juros entre os próprios bancos no sistema interfinanceiro e,
ainda assim, depois a rodada do interfinanceiro, se os bancos precisarem recursos , ao recorrer
ao banco central, terão que pagar mais caro, que é a nova taxa, elevada por decisão do Banco
Central em um determinado momento do tempo.

Figura 1 – Processo de Oferta de Moeda: efeitos da taxa de redesconto

O banco central, ao elevar a taxa de redesconto, sinalizou para o sistema bancário que
o custo dos recursos aumentou. Portanto, com essa sinalização, os próprios bancos já se tornam
mais cautelosos ao longo do dia e diminuem o seu fluxo de empréstimos, para não correrem o
risco de ter que pagar uma taxa maior para o banco central (BC), se precisarem de recursos de
liquidez no final do dia. Isso significa que os bancos, ao se tornarem mais precavidos, diminuem
o processo de circulação de moeda, diminuem o multiplicador monetário, o que faz com que
a oferta de moeda na economia caia. Operar o instrumento taxa de redesconto de liquidez
significa definir qual vai ser o custo dos empréstimos de liquidez que o BC fará ao sistema
bancário caso algum banco necessite de recursos ao final do dia.
Este é um instrumento de política monetária muito importante, na maior parte dos ban-
cos centrais internacionais. No caso brasileiro, não operamos efetivamente esse instrumento de
I NSTRUMENTOS DE P OLÍTICA M ONETÁRIA 3

política monetária, desde o início dos anos 2000, em que o Novo Sistema de Pagamentos Bra-
sileiro foi implantado, considerado um dos sistemas de pagamentos mais avançados do mundo
(permite fazer transações on-line, transferência de recursos entre contas correntes quase instan-
tâneas, etc). Essa estrutura tecnológica de sistema de informação altamente avançada, e que em
parte foi fruto de investimentos em Tecnologia de Informação nos períodos de hiperinflação,
produziu uma estrutura, um sistema de pagamento tão eficiente e que faz com que os bancos
tenham que manter o seu equilíbrio de caixa em tempo real ao longo do dia.
Diferentemente de outros países, o instrumento de taxa de redesconto de liquidez, na
prática, não tem efeito na gestão da política monetária brasileira. Em países que têm o mercado
de reservas como foco da gestão de política monetária, como é o caso do FED, Sistema Federal
de Reservas do Banco Central americano, como é o caso do banco da Inglaterra, do Banco
Central europeu, a principal referência de gestão da política monetária é a determinação da
taxa de redesconto de liquidez. Quando o comitê de política monetária brasileiro se reúne, ele
define uma meta para a taxa de juros formada no mercado de títulos. Essa é uma peculiaridade
específica do nosso sistema, e que vai fazer com que não tenhamos um efeito prático na gestão
da política monetária para o instrumento taxa de redesconto de liquidez, mas isso não significa
que perdemos um instrumento de política monetária, a taxa de redesconto existe, se houver
necessidade o Banco Central do Brasil (BCB) fará o papel de emprestador em última instância,
mas na verdade com essa gestão em tempo real por parte dos próprios bancos e do sistema
bancário, o risco disso acontecer caiu muito. No fundo, o risco de liquidez no sistema bancário
brasileiro é gerenciado em tempo real e ao longo do dia pelos próprios bancos, diminuindo
o risco de que o banco central tenha de fazer o papel de emprestador de última instância, no
funcionamento normal do mercado.
O processo de Oferta de Moeda: Open Market

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Entender os efeitos da compra e venda de títulos públicos


sobre a base monetária e sobre a formação da taxa básica de juros.

Até esse momento, já temos o esclarecimento da decisão de três agentes sobre a oferta
de moeda: o público, e sua decisão de manter o papel-moeda, em seu bolso ou na sua conta
corrente; os bancos comerciais, em sua decisão de manter ou não reservas voluntárias; e o
banco central, na sua decisão sobre os instrumentos de política monetária reservas compulsórias
e taxa de redesconto de liquidez. Resta, ainda estudarmos os mecanismos de operação do
instrumento mais utilizado na gestão da política monetária que é o open market, a compra e a
venda de títulos públicos por parte do banco central (BC), representado por seus dealers, como
já discutimos. Esse é o processo gerenciamento da formação de taxa de juros mais eficaz em
relação aos outros dois instrumentos, no sentido de ter um impacto mais rápido na formação
da taxa de juros, e de ter a medida desse impacto mais facilmente acompanhada e medida pelo
próprio BC e pelos agentes em geral.
Começamos destacando que o instrumento open market corresponde, do ponto de vista
contábil, no balancete do BC, a uma operação ativa do BC em termos da rubrica títulos públicos
no seu portfólio. E ao mesmo tempo, quando o BC compra títulos, por exemplo, ele paga esses
títulos com moeda. Ao mesmo tempo que temos uma elevação no ativo, temos uma elevação
no passivo monetário do BC, que é a base monetária. E exatamente por isso que a operação do
instrumento open market é mais efetiva, porque ela atua diretamente sobre a base monetária e
a transmissão dessa atuação para a oferta de moeda e para a taxa de juros é mais rápida e mais
imediata do que via efeito multiplicador. O multiplicador sempre é um processo que leva tempo
para que alcance seu efeito completo.
A conexão com o mercado de títulos é imediata, afetando mais rapidamente a for-
mação da taxa básica de juros. Quando um BC faz uma operação de open market de compra
(vende), por exemplo, títulos públicos que estão no portfólio (do BC) dos agentes financeiros
ou do público passam para a carteira do BC (dos agentes financeiros ou do público), que os

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Processo de Oferta de Moeda: efeitos do open market

paga (recebe) creditando (debitando) na conta de reservas bancárias ou na rubrica papel moeda,
elevando (diminuindo) a base monetária. A operação de open market sempre é uma operação
que impacta inicialmente o mercado de títulos, mas simultaneamente produz um aumento ou
uma redução da base monetária. Quando a moeda sai do público e volta para o BC, significa que
a moeda em circulação diminuiu, a base monetária cai e portanto temos uma oferta de moeda
menor.
Como que isso produz uma mudança na taxa de juros? Quando observamos um BC
operando instrumentos de política monetária, estamos observando uma gestão que vai buscar
uma formação de taxa de juros no mercado de títulos que seja compatível, ou que esteja muito
próxima àquela determinada pelo comitê de política monetária, em sua última reunião. Quando
o comitê se reúne, ele escolhe uma taxa de juros que é considerada adequada para aquele mo-
mento na economia. Chamamos essa taxa de juros de meta da taxa de juros, no caso brasileiro
é a meta da taxa SELIC over, de um dia para o outro. A meta de taxa de juros determinada deve
ser perseguida pelo BC acompanhando e atuando, quando necessário, no mercado de títulos
para que a média das negociações com títulos naquele dia esteja o mais próximo possível da
meta estabelecida pelo Comitê. É por isso que a taxa de juros observada, aquela que o mercado
forma todo dia, oscila em torno da meta. Sinal de que o Banco Central está fazendo o seu
trabalho, que é gerenciar a política monetária para produzir esse resultado.
Se o BC quiser elevar a taxa de juros para um patamar diferente daquele que os agentes
estão dispostos a negociar, não será possível, pois isso depende da percepção de risco daquele
ativo por parte dos agentes. Quanto mais o governo estiver instável, quanto mais crises tivermos,
maior a percepção de risco, maiores as taxa de juros que os agentes desejarão. Portanto, o
I NSTRUMENTOS DE P OLÍTICA M ONETÁRIA 3

mercado vai guiando a formação da taxa de juros e o papel de um BC é tentar fazer com que as
expectativas dos agentes e do Banco Central convirjam, num regime de metas de inflação, para
que o resultado das negociações efetivamente esteja bem próximo, tão próximo quanto possível,
da meta estabelecida pelo Comitê.
O ponto fundamental, no entanto, é compreender a conexão entre a gestão da política
monetária por meio do open market, operações ativas para o BC, e a sua contrapartida em
termos de passivo monetário ou em termos de base monetária. Sempre que o BC compra um
título no mercado de títulos públicos, ele está aumentando os ativos títulos públicos na sua
carteira de ativos, e tá pagando em moeda, ou seja, ele está aumentando também o seu passivo
monetário, que é o papel-moeda em poder do público ou as reservas bancárias. Isso significa,
de qualquer forma, que a base monetária se elevou. Quando a base monetária se eleva, a oferta
de moeda na economia se eleva por um dado multiplicador. Portanto, quando o banco central
compra títulos, ele coloca moeda em circulação, expandindo a oferta de moeda na economia.
Vejam que, simultaneamente, temos uma situação em que há um excesso de demanda no
mercado de títulos e um excesso de oferta de moeda, como havíamos falado inicialmente.
Esses desequilíbrios desaparecerão porque o preço do título e sua respectiva da taxa de juros
mudam, alterando, assim, as decisões de compra e venda de títulos.
Revisemos o raciocínio lógico: para um excesso de demanda por títulos há uma pressão
para elevação no seu preço; quando o preço dos títulos começa a subir, a taxa de juros começa a
cair; no mercado de moeda, o excesso de oferta inicial começa a ser reequilibrado porque, com a
taxa de juros mais baixa, o custo de oportunidade de reter moeda cai e a quantidade demandada
de moeda se eleva - a decisão dos agentes muda porque o custo de oportunidade está mudando!
Isso significa que, simultaneamente, quando o preço do título sobe, a taxa de juros cai, ambos
os mercados caminham para um novo equilíbrio com taxa de juros mais baixa, em função
da política monetária de compra de títulos públicos, e que daqui para frente vai ser chamada
de política monetária expansionista. Expansionista num sentido muito específico, que diz
respeito ao impacto da taxa de juros sobre atividade econômica, mas que vamos entender depois
por enquanto podemos pensar que é expansionista porque aumentou a moeda em circulação, a
oferta de moeda, e diminuiu a taxa de juros.
Efeitos dos instrumentos monetários sobre a taxa de
juros

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender o impacto dos demais instrumetos de política mo-
netária sobre a taxa de juros, por realocação de portfólio dos agentes.

Agora vamos buscar entender como a operação dos outros dois instrumentos produz
um efeito sobre a formação da taxa de juros. Os outros dois instrumentos, como já ressaltamos,
têm um impacto inicial no efeito multiplicador. A diferença fundamental aqui é que o início
do processo é no mercado de moeda, e não no mercado de títulos. Do mercado de moeda,
vamos ter um reflexo no mercado de títulos, enquanto que no open market acontece o contrário:
impacto inicial no mercado de títulos que se reflete rapidamente no mercado de moeda.
Vamos começar com o instrumento taxa de redesconto de liquidez. O banco central
(BC) faz uma política monetária expansionista, por exemplo, o que significa por enquanto au-
mentar a liquidez da economia. Como o BC deve operar o instrumento taxa de redesconto de
liquidez para produzir esse efeito? Se ele diminuir a taxa de redesconto de liquidez, que sinali-
zação ele estará dando para o sistema bancário? A sinalização de que o custo dos empréstimos
de liquidez estará mais barato ao final do dia, caso algum banco necessite deste recurso. Ora,
qual vai ser a ação imediata dos bancos frente a esta nova informação? Acelerar o seu processo
de empréstimos a partir das captações, porque se ele, eventualmente, no final do dia, não conse-
guir se financiar no interfinanceiro e precisar tomar recursos junto ao BC, pagará mais barato. O
custo de arriscar ficou menor e ele empresta mais, o que produz um aumento no multiplicador
monetário, que eleva a oferta de moeda.
O impacto inicial se dá no mercado de moeda, a oferta de moeda se elevou. Frente
a esta nova oferta de moeda, os agentes na economia vão rever a sua decisão de alocação de
portfólio, como há mais moeda do que aquela que os agentes desejam para uma certa taxa de
juros, passam a demandar mais títulos públicos. O excesso de oferta de moeda vai levar os
agentes demandarem mais títulos e, portanto, leva a um excesso de demanda no mercado de
títulos. Quando o mercado de títulos começar a responder esse excesso de demanda, produz

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

uma elevação do preço do título e queda da taxa de juros. Quando a taxa de juros começa a cair
no mercado de títulos, a resposta no mercado de moedas vai no sentido de revisão da quantidade
demandada já que o custo de oportunidade de manter moeda está menor, portanto os agentes
começam a desejar mais liquidez, e a quantidade demandada por moeda aumenta, quase como
se estivéssemos caminhando sobre a mesma curva de demanda por moeda.

Figura 1 – Realocação de portfólio no mercado monetário

O que vamos observar é simultaneamente esses desequilíbrios, de excesso de oferta


de moeda e excesso de demanda por títulos, sendo encerrados, ou seja, o clearing desses dois
mercados, por meio da pressão de excesso de demanda por títulos que elevou o preço do título
e diminuiu a taxa de juros. Ou seja, a queda inicial da taxa de redesconto de liquidez produ-
ziu uma queda na taxa de juros básica. Temos aí o efeito expansionista da política monetária
operada via instrumento taxa de redesconto de liquidez.
Podemos também ter esse mesmo efeito se o BC decidir operar o instrumento reservas
compulsórias. A política expansionista está associado a uma queda do percentual de reservas
compulsórias. Quando a taxa ou percentual de reservas compulsórias cai, os bancos comerciais
terão mais recursos disponíveis em relação ao que eles captaram a vista, para emprestar. O
multiplicador monetário sobe e a oferta de moeda sobe na economia, produz um excesso de
oferta de moeda no mercado de moeda e, por realocação de portfólio, os agentes passam a
demandar mais títulos públicos. Pressão no mercado de títulos públicos para subir o preço
dos títulos, o preço do título começa a subir, a taxa de juros começa a cair, o que acontece no
mercado de moeda? As pessoas passam a querer mais liquidez, a quantidade demandada de
moeda sobe e se torna condizente com a oferta maior de moeda, até que o desequilíbrio em
ambos os mercados seja eliminado simultaneamente.
Câmbio nominal e o efeito competitividade-preço

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Entender o efeito de mudanças da taxa de câmbio nominal


sobre a competividade-preço e desta para o lado real da economia.

Vimos que o comportamento da taxa de câmbio no curto prazo, tudo mais constante,
depende do retorno relativos dos ativos domésticos e internacionais, medidos na mesma moeda.
Uma elevação (queda) na taxa de juros doméstica, por exemplo, produz um fluxo de entrada
(saída) de capitais que leva a um excesso de oferta (demanda) de dólares no mercado cambial e
portanto a uma queda (elevação) no preço do dólar, ou seja, apreciação (depreciação) da moeda
doméstica. Essa movimentação da taxa nominal de câmbio afeta a produção de bens e serviços
no lado real da economia, por meio das exportações líquidas, como vimos no segundo módulo.
As exportações líquidas são guiadas, basicamente, pelo comportamento da renda doméstica, da
renda do resto do mundo e pela taxa de câmbio real.

A taxa de câmbio real é a medida da competitividade relativa entre os países, e = EP
P
,
conforme vimos anteriormente. No curto prazo, quando há variações na taxa de câmbio no-
minal (E), que afetam a percepção dessa competitividade pelos agentes que estão comprando
e vendendo bens e serviços no comércio internacional. Não é um efeito de ganho ou perda de
competitividade em termos reais, é um efeito preço e por isso normalmente na literatura chama-
mos esse efeito de competitividade-preço, para ficar bem claro que não se trata efetivamente
de incorporar mais ou menos tecnologia, de aumentar a produtividade do capital ou do trabalho,
ou, ainda, melhorar as características institucionais e políticas de uma economia que produzem
um efeito de ganhos de competitividade e avanço tecnológico. É, simplesmente, o efeito preço
que significa que, quando a taxa nominal se aprecia, até que essa apreciação se reflita em ou-
tras variáveis nominais da economia e afete o nível geral de preços (P), leva tempo e enquanto
ocorre esta dinâmica de ajuste, há uma percepção de mudança na relação de trocas do ponto de
vista real entre os países, que é o efeito da competitividade-preço - a apreciação nominal, no
curto prazo, produz apreciação real, desestimulando exportações e estimulando importações.
Não é um efeito que vai durar para sempre, é um reflexo que aparece apenas enquanto
os efeitos dinâmicos estão ocorrendo na economia, enquanto as decisões estão sendo tomadas

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

ao longo do tempo, produzindo a possibilidade de que uma mudança no câmbio nominal seja
percebida como uma como um ganho ou perda de competitividade. Neste caso, chamamos
competitividade-preço, para ficar bem claro que relação com a competitividade expressa no
longo prazo pela Paridade do Poder de Compra, mas que pode levar a uma uma resposta tanto
do ponto de vista das importações quanto das exportações.

Figura 1 –Efeito competitividade-preço: o canal do câmbio na transmissão da


política monetária

Quando assumimos que essa resposta seja relevante, estamos assumindo que o efeito
competitividade-preço seja mais importante para decisão de importar e exportar do que a própria
renda doméstica ou a renda do resto do mundo. Essa é uma hipótese relativamente forte, ou
seja, que requereria evidências empíricas para que avaliássemos a sua plausibilidade para a
economia em análise. Assim, quando há uma apreciação (depreciação) da moeda doméstica,
há uma perda (ganho) de competitividade-preço ou seja uma queda (elevação) da taxa real de
câmbio em termos desta mudança de câmbio nominal. Essa mudança produz um incentivo
para que houvesse mais importações e menos exportações. Os produtos domésticos ficariam
mais caros no resto do mundo e os produtos importados ficaram mais baratos domesticamente,
diminuindo o saldo de exportações líquidas, que é um dos componentes do dispêndio doméstico
no mercado de bens e serviços.
Portanto a conexão entre taxa de juros doméstica e câmbio nominal e entre câmbio
nominal e câmbio real, que é o efeito competitividade-preço, produz a seguinte conexão ló-
gica: quando há uma elevação na taxa de juros doméstica, há uma apreciação da taxa nominal
de câmbio que se reflete, momentaneamente, como uma apreciação da taxa real de câmbio,
E NTENDENDO A D EMANDA AGREGADA 3

que produz o efeito de diminuir o saldo de transações correntes, ou seja, diminuir o dispêndio
doméstico, diminuir a renda da economia, diminuir em consequência o consumo das famílias,
disparando o multiplicador keynesiano, que potencializa a queda das exportações líquidas ini-
cial. Em conjunto com a diminuição do investimento e do consumo - resultado da elevação da
taxa de juros - um efeito ainda maior de diminuição, ou seja, acentua o efeito restritivo da
política de elevação da taxa de juros, de uma política monetária restritiva. Esses efeitos se
combinariam, o efeito via câmbio, que é o canal de transmissão do câmbio da política monetária
e o efeito restritivo sobre a demanda agregada no contexto dos mercados de bens e serviços.
Respostas da Política Monetária às flutuações
macroeconômicas: A Regra de Taylor

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: compreender a tomada de decisão sobre a meta da taxa


de juros em função do compromisso com a manutenção da âncora nominal e, em
segundo plano, com a minimização da flutuação do produto - comportamento ex-
presso na Regra de Taylor.

Como é que se dá essa decisão de escolha da taxa de juros? Numa reunião de um


comitê de política monetária, vários fatores são levados em consideração. Só teremos uma
compreensão adequada de como esses fatores formam a decisão desse comitê quando finalizar-
mos nosso curso, ou seja, quando tivermos nosso modelo macroeconômico completo.
Ao longo das últimas décadas, o foco da análise e comunicação da política monetária
saio do montante agregado monetário e voltou-se para a taxa de juros, porque é muito mais
fácil para as pessoas entenderem a gestão da política monetária em função de uma certa taxa de
juros do que em função de um agregado monetário, que um conceito mais complexo e difícil
de ser mensurado. No entanto, a cada oferta de moeda em circulação, medida pelo agregado
M1, corresponde uma taxa de juros. Tanto faz, do ponto de vista técnico, tratarmos por um
lado ou por outro, porém, do ponto de vista da comunicação e da gestão, da transparência da
política monetária é muito mais eficiente gerenciar a partir da taxa de juros do que do agregado
monetário. Portanto, tendo isso em perspectiva nossa pergunta fundamental é: o que leva um
comitê de política monetária a escolher uma certa meta para a taxa de juros?
A primeira informação relevante é a expectativa de inflação dos agentes para, pelo
menos, os próximos 12 meses. Se a taxa de inflação esperada pelo público, pelos agentes dos
mercados financeiros, estiver acima da meta com a qual banco central está comprometido, o que
o banco central deve realizar hoje uma política monetária restritiva, elevando a taxa de juros de
tal forma que haja o efeito de diminuição do nível de atividade e a inflação convirja para meta
estipulada.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Dito de outra forma, temos aqui uma taxa de juros que está respondendo à diferença
entre a expectativa de inflação e a meta de inflação no futuro, pois os mecanismos de trans-
missão da política monetária ocorrem ao longo do tempo e vão se acumulando até que, em torno
de um ano, alcançam seu efeito máximo. Uma mudança na taxa de juros hoje não vai alterar a
inflação deste mês ou do próximo, pois a inflação atual é uma consequência das decisões dos
agentes na economia e do próprio banco central de doze, nove meses atrás. É claro que outros
fatores vão afetar a trajetória da economia é por isso que a gestão da política monetária.
O objetivo fundamental aqui é entender que a decisão da escolha de uma certa taxa de
juros está associada ao comportamento da inflação no futuro, revelado pelas expectativas dos
agentes, em relação à meta já pré-estabelecida no regime de metas de inflação. Esse é foco
principal da política monetária, porém se a inflação e as expectativas estiverem relativamente
estáveis é também possível que a política monetária seja gerenciada auxiliando o governo
em seu papel de minimizar a flutuação do produto, do emprego e da renda na economia.
Se a economia está numa fase de baixa do ciclo econômico, não necessariamente uma recessão,
mas está crescendo menos do que o potencial, a política monetária eventualmente também pode
ser utilizada para estimular a economia, desde que isso não coloque em risco âncora nominal do
sistema monetário, que é a convergência das expectativas em relação à meta de inflação. Se não
houver conflito de objetivos, a política monetária pode auxiliar na gestão da economia buscando
minimizar a flutuação do produto na economia.
Por responder à flutuação tanto da inflação esperada quanto do produto, expressamos a
gestão da política monetária como uma equação que responde à diferença entre expectativa de
inflação (pie e a meta π T no período à frente e responde também à diferença entre o produto yt
e o produto potencial y∗, que é que chamamos de gap do produto. Essa maneira de representar
a gestão da política monetária é conhecida na literatura como Regra de Taylor, e uma versão
comum a que segue, em que iT é a meta de taxa de juros, r∗ é a taxa real de juros de longo prazo
e α e β são parâmetros positivos :

i = iT + α ∗ (π e − π T ) + β ∗ (yt − y ∗ )

com iT = r∗ + π T

Como se trata de uma resposta do banco central à flutuação macroeconômica, temos


assim, uma gestão de política monetária que reage à flutuação macroeconômica e não que
causa a flutuação econômica. Mesmo num nível básico de compreensão da estrutura lógica
macroeconômica, podemos tratar as decisões de politica econômica de uma maneira muito mais
próxima ao que observamos no mundo real, que é um banco central que sempre reage à flutu-
ações da macroeconomia, causadas por diversos tipos de choques de demanda e de oferta. É
dessa maneira mais moderna que se entende a atuação do banco central (BC), sempre respon-
E NTENDENDO A D EMANDA AGREGADA 3

dendo às flutuações. Isso vai ficar bastante claro, espero, quando terminarmos de complementar
a estrutura lógica completa de um modelo macro, que nos permita analisar os determinantes de
inflação e de nível de atividade da economia.
Como as alterações nas taxas de juros devem ser consideradas em termos de impacto
acumulado ao longo do tempo e, também porque, no regime de metas de inflação, não é ade-
quado que o banco central surpreenda os agentes na economia espera-se que o BC não produza
mudanças bruscas na taxa de juros e não quebre a estrutura de formação de expectativas dos
agentes, pois elas ancoram a macroeconomia. Se o Banco Central começa a surpreender os
agentes, ele pode produzir um efeito que chamamos de inconsistência temporal ou inconsis-
tência dinâmica, que é fazer escolhas de taxas de juros que sejam adequadas para o momento
presente, mas que coloquem em risco os resultados futuros da economia, principalmente, da
inflação.
Inconsistência intertemporal é um tema muito importante dentro da literatura de ma-
croeconomia, de economia monetária. Dizendo de maneira simples, o fato de que o BC deve
estar comprometido com regras, ou seja, ele não deve buscar surpreender os agentes para tirar
proveito dessa surpresa em termos de flutuação do produto ou da inflação, é natural também
que a taxa de juros evolua em variações pequenas e vá sendo alterada no sentido de queda (ou
de elevação) ao longo das reuniões e ao longo dos meses na gestão da política monetária. Isso
significa que o BC está comprometido com uma estrutura importante para o funcionamento do
regime de metas de inflação e buscando manter a ancoragem nominal da macroeconomia. Isso
produz uma flutuação da taxa de juros muito suavizada, tem um componente muito forte de
persistência, é exatamente por conta desses elementos que fazem parte da estrutura de funcio-
namento do regime de metas de inflação.
A Lógica da Demanda Agregada

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: estabelecer as conexões lógicas entre a Regra de Taylor,


a Paridade de Juros Descoberta e o lado real da economia (mercado de bens e
serviços), sintetizadas na Demanda Agregada.

Percorremos, até aqui, os caminhos necessários para a compreensão dos determinantes


da demanda agregada, de acordo com as teorias da corrente principal, simplificada como uma
perspectiva keynesiana de equilíbrio geral com expectativas racionais, e isso vai se tornando
claro conforme vamos construindo a estrutura lógica da macroeconomia.
Estamos, portanto, com todos os elementos disponíveis para entender a lógica de fun-
cionamento, as variáveis relevantes e o impacto das políticas econômicas sobre a demanda
agregada em economia aberta, sintetizando as relações entre o mercado monetário (Regra de
Taylor), mercado cambial (textbfParidade de Juros Descoberta) e o mercado de bens e servi-
ços (textbfCurva IS - lado real). Lembrem-se de que, no início da nossa análise, fizemos uma
suposição bastante forte e que se mantém até o momento: que a inflação esteja constante, ou
seja, que a oferta agregada na economia seja horizontal. É uma hipótese simplificadora para
que possamos entender todos os processos e etapas e, ao final, teremos um quadro completo,
que permitirá entender tanto a flutuação da inflação, quanto do produto, do emprego e do de-
semprego.
Nesse contexto, vamos avaliar como os mercados monetário-cambial e de bens e ser-
viços se inter-relacionam. O primeiro passo é entender como podemos representar essas inter-
relações de uma maneira relativamente simples e gráfica, para que possamos, ao longo dos
nossos próximos encontros, finalizar e complementar a estrutura macroeconômica completa
considerando os efeitos de oferta agregada e, portanto, de inflação. Essas inter-relações são
representadas no plano bidimensional, plano cartesiano, em que o eixo das ordenadas mede a
inflação e o eixo das abscissas representa o produto da economia. É um gráfico que já apre-
sentamos lá no início, e estamos sempre reforçando e utilizando ao longo das nossas aulas para
expressar a demanda agregada que é a conexão entre mercado monetário, mercado cambial e
mercado de bens e serviços.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – A lógica da Demanda Agregada

No plano inflação e produto, como estamos sob a hipótese de inflação constante, po-
demos pensar que um dado nível de inflação será compatível com um certo nível de produto
pelo lado da demanda agregada, e teremos um ponto no quadrante positivo de inflação e produto
(um par ordenado), o ponto A. Esta combinação de inflação e de produto é uma combinação que
atende às inter-relações desenhadas nos mercados monetário, de câmbio e de bens e serviços.
Como podemos observar onde estaria um outro ponto, um outro par ordenado entre inflação e
produto, que também atendesse a essas relações lógicas expressas nesses mercados?
Antes, qual o significado de “atender às relações lógicas expressas nesses mercados”?
Significa que todos esses mercados estão em equilíbrio destes mercados e este é o fundamento
da Demanda Agregada. Queremos representar todos os possíveis pares ordenados entre inflação
e produto no contexto das relações lógicas que desenhamos aqui. É assim que operamos, como
estamos no contexto principalmente de determinação do produto e a inflação está constante, a
nossa lógica de raciocínio é pensar da seguinte maneira: o que aconteceria pelo lado da de-
manda agregada na determinação do produto, se a taxa de inflação fosse diferente naquela
inicial? 1 . Vamos fazer o raciocínio inicial para entendermos a lógica da demanda agregada
para diferentes níveis de taxa de inflação. Qual será a taxa de inflação da macroeconomia
dependerá da inter-relação entre a demanda agregada e oferta agregada.
A nossa pergunta é: o que acontece nessas inter-relações entre os mercados monetário,
cambial e de bens e serviços numa circunstância em que a taxa de inflação, por exemplo, seja
mais alta do que aquela que estamos considerando inicialmente. Supondo que haja uma taxa de
inflação maior, o que acontece nesse circuito de inter-relações de demanda agregada? Nossa

1
Está se perguntando por que a taxa de inflação seria diferente daquela inicial? Não sabemos ainda, só podere-
mos entender o movimento simultâneo de inflação de produto quando nosso modelo estiver completo. Quando
tivermos o modelo em que o equilíbrio geral da macroeconomia esteja sintetizado (ainda falta do lado da oferta
agregada), poderemos explicar simultaneamente o produto e a inflação.
E NTENDENDO A D EMANDA AGREGADA 3

análise sempre buscará o ponto inicial, o ponto em que essa mudança tem o seu primeiro efeito
e se pergunta “bom, essa taxa de inflação mais elevada no contexto da nossa lógica de demanda
agregada, terá feito onde em primeiro lugar? Em que segmento, em que decisão dos agentes
essa mudança impacta em primeiro lugar?"Vamos relembrar que a lógica de decisão da política
monetária e o equilíbrio do mercado monetário está, no regime de metas de inflação, sintetizado
numa expressão simplificadora que chamamos anteriormente de Regra de Taylor.
Segundo o comportamento do banco central (BC) expresso pela Regra de Taylor,
uma situação de mais inflação deve levar o BC a fazer uma política monetária restritiva. Ele
deve operar um dos seus instrumentos de política monetária, por exemplo, o open market para
produzir uma elevação na taxa de juros. Portanto, o BC deve produzir um efeito de diminuição
de circulação da moeda para o público, por meio de uma operação de venda de títulos públicos,
tirando moeda de circulação por meio da diminuição da base monetária, resultando em uma
situação com menos moeda em circulação e uma taxa de juros mais elevada, via open market
de venda.
Qual é o passo seguinte? Qual o efeito da taxa de juros mais elevada sobre o mercado
de bens e serviços? O mercado de bens e serviços é um mercado em que temos na decisão
de consumo das famílias, a decisão de investimento dos investidores produtivos das empresas
das firmas, a decisão de contas de consumo do governo, gastos do governo, e de tributação e
o resultado das exportações líquidas reais, que já analisamos no nosso primeiros módulos. O
impacto inicial da elevação da taxa de juros recai sobre os componentes de investimento
produtivo e de consumo das famílias. Lembrando que as famílias podem fazer uma opção
entre consumo presente e consumo futuro. Quando a taxa de juros sobe, há um incentivo para
um consumo futuro e portanto há poupança hoje e uma queda do consumo hoje. Quando a taxa
de juros sobe, projetos que antes eram economicamente viáveis deixam de ser, o investimento
produtivo cai, ou seja, esses dois componentes do dispêndio doméstico caem.
O que acontece com as exportações líquidas? Exatamente o efeito que discutimos
anteriormente, que passa pelo mercado cambial, quando a taxa de juros doméstica se eleva -
tudo mais constante - produz-se um incentivo para que haja mais demanda por ativos domés-
ticos, portanto um fluxo de capitais para dentro do país e consequente excesso de oferta de
dólares, com o que o preço do dólar cai, ou seja, a moeda doméstica se aprecia e, via efeito
competitividade-preço, o saldo de exportações líquidas diminui, contraindo ainda mais o dis-
pêndio doméstico.
Com esse primeiro impacto sobre cada um dos componentes, as empresas vão formar
estoques indesejados e tomarão a decisão de diminuir a produção da economia2 . Essa diminui-
ção da produção, da renda, e em consequência há um segundo round de ajustes, em função do
multiplicador keynesiano, o consumo das famílias cai mais um pouquinho, que diminui ainda
mais o dispêndio doméstico, que diminui ainda mais a renda no processo do multiplicador, pu-
2
Explicaremos como se dá esse processo no contexto da oferta agregada.
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

xando a economia prum nível de atividade mais baixo. Qual é o resultado final? A economia
vai ponto de equilíbrio pelo lado da demanda agregada com uma taxa de inflação maior e
um nível de atividade menor de um produto (ponto B), que também obedece às inter-relações
da demanda agregada para a circunstância de uma taxa de inflação maior.
Exatamente isso que nos permite desenhar no gráfico inflação-produto uma curva de
demanda agregada negativamente inclinada mostrando que quanto maior a inflação menor
produto da economia, quanto menor a inflação maior o produto da economia. Mas é impor-
tante entender a lógica por trás deste resultado, caso contrário cairíamos no tipo de análise que
costumo chamar a “macroeconomia das curvas que pulam”. Não queremos aqui fazer análi-
ses do tipo “macroeconomia das curvas que pulam”, então precisamos percorrer, com bastante
clareza, a lógica de decisão dos agentes que está por trás da curva de demanda agregada
negativamente inclinada, que é uma lógica totalmente diferente de uma curva de demanda no
contexto da microeconomia, no contexto da teoria do consumidor. Quando pensamos economia
que funciona de acordo com os cânones modernos, em que BC sempre reage às flutuações da
economia e, portanto, representamos o equilíbrio monetário pela reação do BC, por meio de
uma expressão simplificada que, a Regra de Taylor, a uma situação de mais inflação o BC vai
reagir elevando a taxa de juros; a uma situação de menos inflação, o BC vai reagir diminuindo
a taxa de juros e essa reação do BC à inflação é que produz os efeitos reais, transmite à eco-
nomia real o impacto inicial da política monetária restritiva de elevação da taxa de juros ou
expansionista de diminuição na taxa de juros.
Deslocamentos da Demanda Agregada: Choque de
expectativas

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Entender os primeiros impactos de um choque de Demanda


Agregada, a partir dos efeitos de um maior otimismo dos agentes sobre o futuro.

Agora que já sabemos o significado da representação gráfica da demanda agregada


no plano inflação-produto, podemos nos perguntar: como essa curva muda de posição? Já
vimos, nas aulas anteriores, um exemplo de uma mudança propiciada pelo canal do câmbio,
como consequência de um choque restritivo monetário. Que outros fatores deslocam a curva de
demanda agregada, ou seja, produzem maior demanda agregada ou menor demanda agregada,
dado um mesmo nível de inflação?
Veja que agora voltamos para o contexto de taxa de inflação fixa e vamos nos perguntar
que fatores podem afetar a posição dessa curva no gráfico e, portanto, a combinação entre uma
dada inflação e o seu respectivo nível de atividade econômica, o seu respectivo produto ou renda
da economia. Esses fatores são todos aqueles que consideramos exógenos, fatores que não
são determinados pelo funcionamento da economia doméstica, que são determinados fora dela.
Para começarmos a elencar esses fatores, vamos partir do mercado de bens e serviços. Vamos
observar que as expectativas dos empresários em relação à rentabilidade futura dos projetos
de investimento, melhora porque, por exemplo, os empresários estão mais otimistas quanto ao
futuro vai ser melhor. Por exemplo, se uma crise política assola uma determinada economia,
daqui a 2 ou 3 anos pode não estar mais produzindo efeitos negativos sobre a economia e,
portanto, espera-se que no médio prazo a economia apresente um cenário com nível de atividade
maior e inflação estável, um cenários mais otimistas. Qual o impacto disso sobre a demanda
agregada?
O impacto inicial recai sobre a decisão dos investidores produtivos, suas projeções de
fluxo de caixa dos projetos de investimentos serão mais otimistas e produzirão retornos espera-
dos nesses projetos maiores para um mesmo nível de taxa de juros - mais constante. Quando as
expectativas dos empresários se elevam em relação a se tornarem mais otimistas, isso significa

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

que o investimento produtivo cresce, porque mais projetos se tornam viáveis e o montante in-
vestido na economia aumenta sobe, o que eleva o dispêndio doméstico e renda. Quando a renda
sobe, dados impostos, a renda disponível sobe e o consumo das famílias também se eleva, e
produz um segundo round de elevação do dispêndio doméstico e assim sucessivamente - que é
o efeito multiplicador keynesiano que já conhecemos bem.
Essa mudança para um cenário mais otimista por parte das expectativas dos empresá-
rios, é porque uma elevação do dispêndio doméstico e uma elevação na renda para o mesmo
nível de taxa de juros, já que a inflação está constante. Assim, essa situação é representada
graficamente com uma curva de demanda agregada mais à direita e acima em relação anterior:
o deslocamento para a direita da curva de demanda agregada.

Figura 1 – Otimismo sobre o futuro: choque positivo de expectativas

Precisamos sempre lembrar de explicar como o choque inicial afeta as decisões dos
agentes, que são os fundamentos lógicos da decisão econômica, para produzir um resultado
diferente do anterior, e portanto uma curva numa posição diferente. Para continuar essa com-
preensão, passamos a analisar um choque de política fiscal. Vamos observar como é que se dá
esse processo só pelo lado da demanda agregada. Lembrando que este ainda não é uma res-
posta final, porque estamos apenas entendendo a estrutura a partir da demanda agregada e não
podemos explicar o comportamento simultâneo de inflação e produto. Logo continuamos no
contexto em que a taxa de inflação vai ficar constante e a economia macroeconomia vai res-
ponder apenas em termos de mudança do produto a esse choque exógeno, que vai ser agora
exemplificado como a política fiscal.
Deslocamentos da Demanda Agregada: Choque de
Política Fiscal

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Aprofundar a compreensão dos efeitos de um choque de


demanda sobre as decisões dos agentes, a partir de uma política fiscal expansionista.

Vamos partir de uma política fiscal expansionista, realizada por meio de uma elevação
do gasto do governo ou uma diminuição dos tributos. Vamos pensar em termos de elevação
de gastos. Inicialmente a elevação de gastos do governo já é um componente direto do dis-
pêndio doméstico, quando o governo eleva seus gastos significa que ele está comprando mais
bens e serviços. Isso produz uma pressão sobre os mercados de bens e serviços na econo-
mia, de tal forma que os estoques das empresas caem, as empresas começam a produzir mais
bens e serviços, o produto sobe, a renda sobe. Este é a primeira etapa do efeito da política
fiscal expansionista. Em seguida vamos ter resposta do consumo das famílias, que responde
ao comportamento da renda e também se eleva e iniciam-se os efeitos em cadeia decrescentes
sistematizados no multiplicador keynesiano e, portanto, se houve um aumento no gasto, por
exemplo, de 1.000 unidades monetárias, o efeito sobre a renda no final é um efeito de maior do
que mil unidades monetárias.
Portanto, vamos representar a política fiscal expansionista com um deslocamento para
a direita na curva de demanda agregada. O impacto poderia ser pensado pelo lado dos tributos.
E aí precisaríamos partir de uma redução nos tributos, que tem impacto sobre a renda disponível
das famílias: quando os tributos caem, sobra mais renda para as famílias e o consumo aumenta.
O consumo aumenta, o efeito multiplicador da renda doméstica aumenta, produto aumenta, a
renda aumenta.
Vamos ter também o impacto de combinação do mesmo nível de taxa de inflação com
nível de atividade maior. Podemos perguntar: qual é o impacto disso sobre o câmbio na econo-
mia? Se considerarmos que esse impacto expansionista da política fiscal produz uma elevação
no nível de renda da economia doméstica, que foi acompanhado de elevação do consumo das
famílias, mas também de elevação das importações. Se houve impactos sobre as importações,

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Choque positivo de demanda

vamos observar uma demanda maior por dólares no mercado cambial, usado para fazer face aos
pagamentos dos produtos importados, um excesso de demanda no mercado de câmbio produz
uma elevação na taxa de câmbio, ou seja, uma depreciação da moeda doméstica, efeito que
também pode ser entendido por meio da Paridade de Juros Descoberta, que expressa a decisão
de alocação de portfólio dos agentes financeiros: temos hoje uma taxa de câmbio maior, o que
diminui a expectativa de depreciação do câmbio, tornando os ativos domésticos mais atrativos e
aumentando a oferta de dólares. Porém, como já ressaltamos anteriormente, os efeitos financei-
ros devem predominar sobre os comerciais na determinação do câmbio no curto prazo. Os dois
resultados que poderiam acontecer no caso do câmbio são ambíguos, e caso o efeito do aumento
das importações seja mais relevante que o de realocação de portfólio, teríamos um efeito líquido
de depreciação da moeda doméstica, em decorrência da política fiscal expansionista.
Ao final, o impacto continua sendo expansionista, mas há um vazamento pelo canal
externo, pelo canal do setor externo, da relação do país doméstico com o resto do mundo, em
que o aumento da renda aumenta as importações, que diminuem as exportações líquidas, que
diminui um pouco o efeito do multiplicador keynesiano, porém não o suficiente para compensar
o efeito expansionista dos gastos do governo, deslocando a curva de demanda agregada para a
direita.
Deslocamentos da Demanda Agregada: Choque
externo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Continuar entendendo os efeitos de choques sobre a De-


manda Agregada, por meio de um choque externo negativo.

Se a economia do resto do mundo passa por uma fase de diminuição do seu nível de
atividade, uma fase em que está crescendo menos do que o seu potencial, que consequências
sobre a economia doméstica podemos identificar? Começamos identificando o ponto inicial de
conexão entre a diminuição da renda do resto do mundo e a economia doméstica, que é o saldo
de exportações líquidas: a renda do resto do mundo cai, temos menos exportações domésticas
para o resto do mundo, portanto as exportações líquidas caem, e há um efeito no mercado cam-
bial, com uma menor oferta de moeda estrangeira, gerando um desequilíbrio do tipo excesso de
demanda por dólares, o que vai produzir uma elevação no preço do dólar, ou seja, uma depre-
ciação da moeda doméstica, que leva ao mesmo efeito competitividade-preço que chamamos
atenção anteriormente e que pode contrabalancear a queda das exportações inicialmente identi-
ficada como resposta à queda do produto do resto do mundo. Portanto, podemos ter um efeito
competitividade-preço que volta a recolocar nossas exportações no patamar maior.
O impacto inicial, o choque inicial do produto menor, provavelmente deve prevalecer,
mas no fundo, isso é uma questão empírica, que precisa ser mensurada e analisada com dados.
Porém supondo que o efeito da renda do resto do mundo seja mais relevante e prevaleça, as ex-
portações líquidas caem, o dispêndio doméstico cai, as empresas começam a acumular estoques
indesejados, diminuem o ritmo de produção, o PIB cai, a renda cai, o consumo responde à queda
na renda intensificando o impacto de baixa sobre a nossa situação inicial pelo choque exógeno
de diminuição da atividade econômica do resto do mundo. O efeito multiplicador produz uma
intensificação desse impacto inicial, que veio por meio das exportações líquidas e que vai levar
a economia doméstica para o nível de atividade mais baixo, para uma renda mais baixa ao final
desse processo - se a taxa de inflação permanecer a mesma.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Queda da renda do resto do mundo: choque negativo de demanda

Observe que a queda na renda doméstica também produz uma redução das importações
liquidas que diminui um poco a queda de exportações líquidas inicial, e que se expressa no
equilíbrio final com um nível de renda mais baixo, para uma mesma taxa de inflação. Essa
sequencia lógica de eventos é representada graficamente com um deslocamento para a esquerda
da curva de demanda agregada. São aspectos como esses que eu acabei de dar como exemplos
que vão produzir diferentes combinações para o mesmo nível de taxa de inflação com diferentes
níveis de renda e vamos representar a nossa curva de demanda agregada em pontos distintos no
nosso gráfico da macroeconomia que caminha para se completar com a nossa compreensão do
lado da oferta agregada já no próximo módulo.
Introdução ao modelo completo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: introduzir a lógica da da Oferta Agregada e destacar sua


relevância para a compreensão das flutuações macroeconômicas.

Nesta etapa do curso, estamos caminhando para a compreensão do conjunto completo


da macroeconomia, aquele que anunciamos lá no início das nossas aulas. Já entendemos a
estrutura lógica por trás da demanda agregada e passamos a nos perguntar sobre o outro lado,
que diz respeito às condições de produção, às condições de oferta agregada da macroeconomia.

Figura 1 – O lado da produção: Oferta Agregada

Voltando à estrutura lógica da macroeconomia moderna, representada pela conexão


entre quatro mercados, vamos voltar nossa atenção para o 4o e último segmento, que trata do
funcionamento do mercado de trabalho. Antes de efetivamente discutirmos a lógica dos ofer-
tantes e dos demandantes de trabalho, e a formação dos salários e dos preços na economia,
vamos falar um pouco mais sobre este lado da macroeconomia, sobre o comportamento da
oferta agregada, e a importância da oferta agregada nessa estrutura lógica.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Vamos lembrar que, até o último módulo, estávamos tratando a estrutura macroeconô-
mica como se a taxa de inflação fosse constante, ou como se o nível geral de preços não mudasse
e, portanto, não houvesse inflação no final das contas1 . Esta era apenas uma simplificação, para
que pudéssemos entender de forma mais clara, os efeitos e os componentes das decisões dos
agentes por trás da demanda agregada, como já sabemos. Porém, sabemos que essa não é uma
boa representação do mundo real, pois a renda da economia flutua, em função da ocorrência
de choques de demanda agregada (e de oferta, mais adiante), mas também há uma flutuação da
taxa de inflação, e muitas vezes, inclusive, apresenta processos inflacionários.
Tratar demanda agregada e oferta agregada em conjunto permite explicar não só as
flutuações do produto e da inflação, mas também de outras variáveis endógenas, como a taxa
nominal de câmbio, a própria taxa de juros, instrumento de política monetária, o consumo
das famílias, os investimentos produtivos, as exportações líquidas. Todas essas decisões vão
ser definidas no conjunto da estrutura lógica, que vai nos levar a entender, principalmente,
o comportamento dessas duas variáveis endógenas fundamentais, que são produto (renda) e
inflação.
A interação entre a demanda agregada e oferta agregada macroeconomia nos permite
entender situações em que a economia esteja aquecida, com emprego maior e com desemprego
mais baixo e, eventualmente, também, com pressões maiores sobre a inflação, ou situações em
que a economia esteja numa baixa do ciclo econômico, num processo de crescimento menor do
que o potencial que a economia possui, associado a uma inflação menor ou, eventualmente, uma
inflação maior. Que combinação de choques a economia sofre que pode produzir recessão, ou
crescimento mais baixo e inflação? Que combinação de choques pode levar a economia a ficar
super aquecida, a apresentar um crescimento maior que o crescimento potencial e, portanto,
caminhar na parte de cima da flutuação macroeconômica e, ao mesmo tempo, apresentar uma
taxa de inflação relativamente estável, ou mesmo um baixo crescimento da inflação, ou uma
aceleração da inflação. Ao completar a estrutura lógica para poder dar essas respostas.
E dar essas respostas é exatamente realizar uma análise macroeconômica, obvia-
mente aqui, num nível mais introdutório, num nível mais básico, mas ainda assim suficiente
e adequado para a compreensão das economias modernas com regime de metas de inflação e
formação de expectativas.

1
No último módulo, dedicaremos uma aula para definir mais precisamente a relação entre o nível de preços e a
taxa de inflação
Oferta Agregada: Fatores de médio e longo prazos

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: relação capital-produto, crescimento da força de trabalho e


desenvolvimento tecnológico são fatores relevantes para o longo prazo, enquanto
que as condições do mercado de trabalho explicam as condições de produção no
curto e médio prazos.

Para tratarmos da oferta agregada, precisamos lembrar que o lado da produção na


economia depende de uma série de fatores, principalmente das condições em que a economia
acumulou estoque de capital ao longo do tempo, e hoje usufrui desse estoque de capital para a
produção de novos bens e serviços.
Produzir novos bens e serviços num determinado momento, sejam de capital ou de
consumo, depende da decisão de investimento produtivo líquido, descontada a depreciação do
uso dos estoque já existente. Como vimos no Módulo 2, é o investimento líquido que produz
um certo montante de estoque de capital disponível na economia, que são as máquinas, os
equipamentos, infraestrutura de transportes, de comunicações, de portos e ferrovias, de energia,
enfim, tudo aquilo que propicia que a produção de bens e serviços aconteça numa economia.
Esse nível de estoque de capital está associado com certo nível de uso de tecnologia,
ou de desenvolvimento tecnológico, que o país tenha desenvolvido ao longo das suas décadas
anteriores e que hoje se consolida em máquinas e equipamentos disponíveis para utilização
no processo produtivo na produção de novos bens e serviços. Quando tratamos de flutuações
macroeconômicas, o estoque de capital é tomado como dado, como constante, porque a mu-
dança de estoque demora para acontecer, evolui ao longo do tempo e muda de patamar bastante
lentamente. Ao longo do tempo, o investimento produtivo oscila, ao longo do tempo em deter-
minados anos o investimento produtivo sobe um pouco mais, em outros, cai e ao mesmo tempo
estoque de capital vai sendo utilizado e se depreciando, de tal forma que esta relação entre
novo investimento e a depreciação, muitas vezes, resulta em uma estabilização, ou uma mu-
dança muito lenta do patamar do estoque de capital ao longo do tempo, principalmente quando
consideramos a relação capital-produto, observamos que essa relação é bastante estável, muda
pouco.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

O desenvolvimento tecnológico permite significativas mudanças na acumulação de


estoque de capital como proporção do produto ao longo do tempo que consideramos que seja
relevante no longo prazo, relevante para compreender crescimento econômico. Já sabemos
também que certas decisões em relação à situação macroeconômica podem ter um mecanismo,
um canal, por meio do qual o estoque de capital no longo prazo seja afetado, já discutimos isso
no contexto de investimento e do consumo e na própria política fiscal. Porém, numa primeira
aproximação de análise de situação macroeconômica, podemos considerar o crescimento do
estoque de capital com proporção do PIB como uma variável exógena, como um fator que não
será o mais importante para a compreensão da flutuação no curto prazo.
Nesse contexto, quando olhamos para a função de produção, a capacidade de produzir
bens e serviços que uma economia apresenta, observamos um fator, que é o capital, tomado
como proporção do produto ou simplesmente o estoque de capital, está dado. O outro fator que
participa da capacidade de produzir, expressa pela função de produção agregada, é o trabalho.
Este insumo também muito relevante para o processo produtivo é, no curto prazo, a variável
de ajuste do nível de produção, por isso o processo produtivo da economia é expresso pelas
condições e funcionamento do mercado de trabalho.
Nosso objetivo é entender o mercado de trabalho, como se dá a formação de salários
reais, a determinação do emprego e do desemprego. Para tanto, trataremos esse mercado de
uma perspectiva mais moderna, que é a proposta do nosso curso como todo, de tal forma a
torná-lo mais próximo dos mercados que observamos no mundo real. O mercado de trabalho
será tratado como um mercado que não opera em concorrência perfeita, mas, sim, de uma
perspectiva mais moderna, em que a oferta de trabalho envolverá uma atuação de barganha dos
trabalhadores, com expectativas racionais e a demanda por trabalho dependerá de uma atuação
da firmas com poder de monopólio no mercado de bens e serviços.
Antes, vale a pena tratarmos brevemente do funcionamento do mercado de trabalho em
concorrência perfeita. Nessa estrutura de mercado, o salário real e o emprego são determinados
pelas forças de oferta e demanda, e não há desemprego involuntário - o equilíbrio do mercado
determina o pleno emprego do trabalho, todos os que desejam trabalhar ao salário real vigente,
encontram postos de trabalho. Esta é a visão da macroeconomia clássica, que predominou até
os anos de 1920.
No nível de emprego de pleno emprego, corresponderia, naturalmente, o nível de de-
semprego de pleno emprego. Ou seja, a relação entre emprego e desemprego é uma relação
conceitual, conectada pela força de trabalho, que é o total de indivíduos na sociedade que estão
em condições de participar da força de trabalho, do processo produtivo na economia - desse
total, que é a força de trabalho (L), uma parte estará empregada (N), e outra parte estará desem-
pregada (U), ou seja: L = N + U .
Se considerarmos relação entre empregados como proporção da força de trabalho, tam-
O FERTA AGREGADA E E XPECTATIVAS R ACIONAIS 3

bém vamos ter a relação entre desempregados como proporção da força de trabalho, e essa é
definição de taxa de desemprego, é o percentual que mostra qual é o volume, qual é o montante
de pessoas desempregadas em relação ao total da força de trabalho.

L N U
=1= +
L L L
Emprego e desemprego são simétricos, quando o emprego sobe, o desemprego cai, se
considerarmos que a força de trabalho esteja constante 1 . Por enquanto, podemos tomar um
contexto estático, um contexto de curto prazo, principalmente, podemos tomar esta variável
como dada.
Dadas essas definições, estamos falando que, se estivéssemos no contexto de concor-
rência perfeita no mercado de trabalho, o equilíbrio neste mercado determinaria o nível de
emprego de equilíbrio, e este nível de emprego seria considerado o nível de desemprego de
pleno emprego, ao qual corresponderia o desemprego de pleno emprego. Isso significa que
esse desemprego estaria associado apenas às decisões dos agentes, é o chamado "desemprego
voluntário". Ou seja, ao salário de equilíbrio, as pessoas que não estão trabalhando, assim o
fazem porque, na sua lógica de decisão entre trabalhar e não trabalhar, o salário real vigente não
é compensador o suficiente para incentivar essas pessoas a aceitarem esse salário e aceitarem,
portanto, um posto de trabalho,. No contexto do mercado em concorrência perfeita, a demanda
por trabalho também é obtida a partir das decisões de buscar o máximo lucro possível, dadas
as restrições pelo lado das firmas, resultando em uma demanda por trabalho guiada igualdade
entre a contribuição de cada trabalhador adicional para o processo produtivo e o salário real,
essa que seria a condição de otimização pelo lado da firma 2 .
Esse era exatamente o ponto em que a compreensão do funcionamento do mercado
de trabalho se encontrava nas primeiras décadas do século XX, ou seja, 1910, 1920. E sabe-
mos que logo após a crise de Nova York, tivemos um efeito bastante grave, recessivo sobre as
economias, em que a taxa de desemprego cresceu enormemente. Esse foi o contexto em que a
teoria keynesiana foi apresentada como uma alternativa a esta compreensão microeconômica do
funcionamento do mercado de trabalho em concorrência perfeita. Esse é o contexto histórico
a partir do qual o mercado de trabalho passou a ser considerado como um mercado em que os
lados de oferta e demanda tomam suas decisões fora do contexto da concorrência perfeita.
Observando o mundo, e observando a perspectiva que a teoria oferecia para compre-
ensão do mundo, fica bastante claro que não é possível que consideremos que uma taxa de
1
A força de trabalho só evolui significativamente com tempo, ou seja, com o passar do tempo será um fator
relevante para estudarmos crescimento econômico
2
A demanda por trabalho expressa a produtividade marginal decrescente do trabalho, para um dado estoque de
capital, e a oferta de trabalho representa a decisão de trabalhar ou não, em função do fato de que, os trabalha-
dores têm um número limitado de horas, em que tem de alocar o trade-off entre lazer e trabalho. Quando o
salário real não é suficiente para que os agentes escolham o trabalho em lugar do lazer, esses trabalhadores são
considerados como desempregados voluntariamente.
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

desemprego da ordem de 8, 10, 12, 15%, ou crises severas como já vivemos na história recente
das economias capitalistas, com taxas de desemprego em torno de 10 a 15%, não é possível
que se admita que a explicação do desemprego voluntário seja uma explicação razoável, uma
explicação que nos ajuda a entender o mundo.
É nesse sentido, e no contexto de evolução da compreensão da relação entre salários
e inflação, que foi sendo produzido ao longo dos anos 50, 60, 70 e 80, e que começou com
uma contribuição muito importante, o trabalho do Phillips (as famosas curva de Phillips), ao
longo dessas décadas que citadas, fomos aprimorando nossa compreensão do comportamento
do mercado de trabalho e da relação entre a formação dos salários e a formação dos preços
na economia.
Não temos condições de reconstruir esse desenvolvimento teórico ao longo daquelas
décadas, pois isso nos levaria a introduzir um novo módulo no nosso curso, o que seria bastante
interessante, porque ofereceria uma perspectiva mais histórica do desenvolvimento dessas teo-
rias. Infelizmente, não temos tempo suficiente para isso, e optamos por já apresentar uma teoria
de oferta agregada de curto prazo consistente com os chamados modelos novo-keynesianos.
E no contexto da oferta agregada, isso nos leva a apresentação de uma estrutura do
mercado de trabalho em que não há a suposição de concorrência perfeita, em que podemos
observar a ocorrência de desemprego involuntário, o que significa que, durante as flutuações
macroeconômicas, estaremos numa situação de desequilíbrio no mercado de trabalho. A situa-
ção de equilíbrio será alcançada apenas no médio prazo, ou seja, depois que todos os ajustes da
estrutura macro em resposta a um choque tenham sido realizados, e estejamos novamente, no
que vamos chamar daqui para frente de equilíbrio de médio prazo.
Obviamente, isso ainda não está claro para vocês, mas eu espero que ao longo das
próximas aulas, consigamos chegar a esse resultado. Teremos um aprendizado pelo lado da
oferta agregada, que se conectará com o aprendizado que já tivemos pelo lado da demanda
agregada, e vamos, a partir dessa estrutura lógica, analisar as respostas que os agentes quando a
economia sofre algum tipo de choque e vamos nos perguntar também, como tanto as autoridades
monetárias por meio da gestão da política monetária, como autoridade fiscal por meio da gestão
da política fiscal deveriam responder a esses choques.
Oferta de trabalho e o processo decisório dos
trabalhadores

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: estudar o processo de formação de salários por parte dos
trabalhadores, que possuem expectativas racionais e poder de barganha.

Na literatura sobre o funcionamento do mercado de trabalho, há algumas abordagens


distintas que vão nos levar a resultados semelhantes. Essas abordagens estão associadas às
contribuições desenvolvidas, principalmente, no final dos anos 80 e dos anos 90, para que pos-
samos representar, na estrutura lógica da macroeconomia, um funcionamento de mercado de
trabalho que seja mais consistente com o mundo real. Estamos no contexto dos modelos novo
keynesianos, como já apontamos. E nesse contexto, a compreensão de o que leva um traba-
lhador a ofertar trabalho no mercado de trabalho e como a sua decisão de oferta depende das
circunstâncias do mercado de trabalho, são aspectos muito relevantes.
Nessa perspectiva novo-keynesiana, entendemos o trabalhador como um agente que
busca interferir na formação do salário. Saímos do contexto de um indivíduo que é tomador
de preço, que é uma característica da concorrência perfeita, para um contexto de um indivíduo
que passa a ser formador do salário. O salário, portanto, vai depender de como esses agentes
vão se posicionar no mercado, e temos aí pelo menos duas maneiras distintas de entender esse
posicionamento, uma com a teoria de salário eficiência, e a outra também bastante comum, é
sobre a suposição de que, os trabalhadores, por meio dos sindicatos, têm um certo poder de
mercado, eles têm uma influência sobre a formação dos salários.
Adotamos aqui a perspectiva de trabalhador com poder de barganha, que é uma pers-
pectiva bastante comum nos livros-textos de macroeconomia: o conjunto de trabalhadores atua
no sentido de buscar salários reais esperados mais elevados em função das circunstâncias do
mercado de trabalho em um determinado momento.
Negociar salários reais esperados é uma consequência do fato de que a variável so-
bre a qual os trabalhadores podem ter alguma influência é sobre o salário nominal. O salário

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

que está sendo negociado com outra parte, com as empresas, e firmados em contratos com um
conjunto de trabalhadores, esses contratos duram um tempo determinado e não muda frequente-
mente. Em geral, os profissionais de uma categoria têm uma data-base para renegociação desses
salários, e este contrato de trabalho vai durar por um período também negociado 1 .
Quando um trabalhador, ou um conjunto de trabalhadores, barganha por salários nomi-
nais, ele tem que formar uma expectativa sobre a inflação, porque se ele acha que a inflação no
próximo ano vai ser de 10%, ele vai negociar, pelo menos, um aumento de 10% do seu salário
nominal, para manter o seu poder de compra, para manter o salário real relativamente estável.
dependendo das condições do mercado de trabalho, podem tentar buscar ganho de salário real
pleiteando um aumento nos salários nominais superior a 10%. Essa é a estratégia dos trabalha-
dores, ele quer pelo menos manter o seu salário real, manter o seu poder de compra durante a
vigência do seu contrato de salário.
Adicionalmente, sabemos que, quando a circunstância do mercado de trabalho é de
desemprego elevado, os trabalhadores, ao buscarem salários nominais, também estarão sujeitos
à possibilidade de serem despedidos, se tornarem desempregados, com uma taxa de desem-
prego muito elevada a probabilidade de se reempregarem após perderem seu emprego diminui,
portanto os trabalhadores terão menos poder para barganhar por salários nominais numa
situação em que a taxa de desemprego na economia seja muito elevada.
Assim como a taxa de desemprego e a expectativa de inflação são dois fatores muito
importantes nesta barganha por salários nominais, as características institucionais, característi-
cas que estão associados a quais são as normas de funcionamento desse mercado, também são
importantes. Podemos pensar em normas de funcionamento e que haja um benefício, como,
por exemplo, o salário desemprego. Se o mercado de trabalho funciona sob uma norma em que
trabalhadores desempregados terão acesso ao benefício pago pelo governo, que é normalmente
o salário desemprego, isso afeta a decisão dos trabalhadores em barganhar mais salários e correr
mais riscos de estar desempregado, ou seja, agora estar desempregado não significa ter renda
zero. Significa ter um mínimo de renda, ter alguma renda garantida pelo benefício governa-
mental. A existência desse benefício, de certa forma, muda o patamar a partir do qual salários
nominais são barganhados, pois diminui o custo de oportunidade de estar desempregado. Um
outro aspecto importante é a existência, por exemplo, de salários mínimos, que defina um pa-
tamar inferior a partir do qual salário são formados. Vamos, do ponto de vista prático, deixar
esses fatores (denominados em conjunto por z) fixos e pensar na relação principal. que é dada

1
No Brasil, negociamos salários em contratos de 1 ano, mas em outras economias, esses contratos podem durar
vários anos, a depende das características institucionais de cada país. Também é verdade que esse tipo de
estrutura, em que os trabalhadores têm poder de barganha em função da sua organização, ela tem sido menos
relevante, principalmente na economia americana, em que a desregulamentação do mercado de trabalho levou a
negociações mais individuais e, portanto, diminuindo este poder de barganha que os trabalhadores poderiam ter
se negociassem seus salários em conjunto. Ainda assim, continua sendo uma boa aproximação para economias
europeias, por exemplo, e ainda para a economia brasileira, mas não necessariamente esta explicação precisa
ser adotada para que os resultados que vamos obter se mantenham.
O FERTA AGREGADA E E XPECTATIVAS R ACIONAIS 3

pelo nível de desemprego da economia (u = U/L) e pela expectativa de inflação (P e ).

Figura 1 – O processo de oferta de trabalho

Esse processo decisório dos trabalhadores é denominado regra de formação dos salá-
rios, que está representada no gráfico do mercado de trabalho para facilitar nossa compreensão.
Nesse gráfico, o eixo vertical traz o salário real esperado PWe e, no eixo horizontal, a taxa de
desemprego (u). Pela perspectiva dos formadores de salários (W), deduzimos que quanto maior
a taxa de desemprego, menor o poder de barganha dos trabalhadores em buscar renegociação
de salários mais elevados. Portanto, o salário nominal cresce menos que a inflação ou cai2 .
Uma mudança na lei do salário mínimo, por exemplo, será um choque sobre o mer-
cado de trabalho que vai produzir um rearranjo nesse mercado e a formação de salário diferente
dos anteriores. A partir de salários diferentes, outras consequências acontecerão na economia
e produzirão também flutuação, tanto na inflação quanto no emprego, como veremos mais adi-
ante. Quanto maior expectativa de inflação dos trabalhadores, mais os trabalhadores buscarão
2
CORREÇÃO: No vídeo da aula, a representação do mercado de trabalho contem um erro: o eixo horizontal
mostra Trabalho (N) em lugar de desemprego (u), que é o correto, conforme a figura desse material.
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

salários nominais mais elevados, com relação diretamente proporcional. Por outro lado, quanto
maior a taxa de desemprego, menor o poder de barganha dos trabalhadores e portanto salários
nominais vão crescer menos ou vão ficar estáveis.
Um ponto importante para observar nesse momento é que a existência de negociações
em períodos diferentes do tempo e com prazos diferentes ou ainda que elas tenham o mesmo
prazo, mas sejam negociadas em datas bases diferentes, essa justaposição de contratos produz
um efeito de rigidez na variação dos salários nominais na economia, que é muito importante
para entender a situação econômica no contexto da corrente principal. Observe que não são to-
dos os trabalhadores da economia que negociam seus salários no mesmo momento. Categorias
profissionais diferentes que negociam seus salários em momentos diferentes, produzido uma
justaposição de contratos que, por sua vez, resulta em uma demora no ajustamento dos salários
na economia. Essa demora no ajustamento dos salários é a responsável por fazer com que a in-
flação se ajuste lentamente. Esse ajustamento lento não é uma consequência de irracionalidade
dos agentes ou porque estejam sendo guiados pela inflação passada, mas, sim, da justaposição
e contratos de trabalho. Ainda que eles tenham expectativas racionais, ou seja, que levem em
conta a informação disponível para formar suas expectativas, ainda assim, os salários demora-
rão efetivamente para se movimentar porque a justaposição de contratos produz um efeito de
rigidez no ajustamento dos salários.
Demanda por trabalho e o processo decisório das
firmas

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender o processo de formação de preços a partir dos


custos de produção em firmas que atuam mercados não-concorrenciais e como o
desemprego natural (de equilíbrio de médio prazo) é determinado.

A rigidez nominal é uma característica típica de modelos novo-keynesianos, o termo


keynesiano vem exatamente pelo fato de que, nessa estrutura lógica, rigidez nominal aparece
na macroeconomia, assim como o aparecia inicialmente na proposta keynesiana original. As
fontes de rigidez são várias, iremos apontar outras possibilidades. No contexto dessa versão
da estrutura lógica que estamos apresentando aqui, ela viria justamente pela justaposição de
contratos de trabalho.
A pergunta seguinte é: Como é que salários se conectam a preços? Entender como os
contratantes de mão de obra agem, tomam sua decisão de comprar os serviços que a força de tra-
balho oferece e, portanto, pagar por esse serviço, que é exatamente o salário real é fundamental
para que compreendamos o mercado de trabalho e o funcionamento da Oferta Agregada. Trata-
mos os demandantes de trabalho, ou seja, as empresas, também fora do escopo da concorrência
perfeita e não só no sentido de sua atuação no mercado de trabalho, mas também e, principal-
mente, na sua atuação na formação dos preços de bens e serviços na economia. As empresas
têm poder de influenciar na formação dos preços dos bens e serviços que elas produzem e
vendem no mercado de bens e serviços, isso significa dizer que essas firmas não operam em
concorrência perfeita.
Assim, estamos num contexto em que nem o mercado de trabalho, nem o mercado
de bens e serviços operam em concorrência perfeita, estamos partindo da suposição de que eles
operam com algum tipo de concorrência imperfeita, pode ser uma estrutura oligopolista, em que
poucas dominam o mercado e definem o preço do bem, ou pode ser, como uma simplificação,
que as firmas atuem como se fossem monopolistas nos mercados em que vendem os seus
bens e serviços. Por exemplo, a empresa que produz carro, ela determina o preço do carro a ser

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

vendido no mercado de carro, considerando a demanda por carro. A diferença fundamental aqui
é que as empresas irão se deparar com demanda negativamente inclinada para os seus produtos,
o que significa que se ela eleva o preço dos seus bens e serviços, poderão ter de lidar com uma
queda na quantidade vendida, devido à relação inversa entre preço e quantidade demandada,
que expressa a lógica do consumidor. Assim, a empresa, mesmo sendo monopolista, não pode
determinar um preço qualquer, independente de qualquer coisa, pelo contrário. Ela pode deter-
minar preço, desde que ela leva em conta a reação da demanda, que chamamos de elasticidade
preço da demanda, a inclinação da demanda, ou seja, se a empresa aumentar o preço em 10%,
de quanto a quantidade que conseguirá vender vai diminuir, e qual vai ser o impacto sobre a
receita total da empresa. Novamente, nenhuma empresa vai tomar uma decisão de elevar seus
preços a tal ponto, ela vai elevar seus preços até o ponto em que o ponto em que a queda na
quantidade não produza uma queda na receita total, caso contrário ela não vai elevar o seu lucro
desejado.
A empresa é maximizadora de lucro e tem que buscar formar o preço para vender o
seu bem ou serviço, respeitando como que a demanda reage do outro lado desse mercado, esta
empresa normalmente leva em consideração os seus custos de produção e as características da
demanda pelo bem. Assim, como uma representação simplificada desse processo decisório,
podemos assumir que a empresa irá simplesmente considerar os seus custos e adicionar uma
taxa de markup (µ) sobre eles para formar seus preços. Obviamente essa taxa de markup não
pode ser definida independentemente da elasticidade-preço da demanda. São aspectos mais
técnicos que não vamos tratar aqui, mas é sempre bom deixar esse alerta, ou seja, a taxa de
markup, o lucro que a empresa busca a partir dos seus custos de produção, não pode ser definido
arbitrariamente sem levar em conta o outro lado do mercado, como os agentes vão responder a
essa variação de preço do ponto de vista da demanda pelo bem ou serviço.
Feita essa ressalva vamos tratar aqui, como uma hipótese simplificadora que as empre-
sas definem os preços dos seus bens e serviços em função dos custos de produção multipli-
cados por uma taxa bruta de markup, (1 + µ). Quais são os principais custos de produção?
Temos os custos fixos e os custos variáveis, aqui como estamos pensando em variações, ou seja,
impactos que fazem os preços mudarem, vamos fazer outra hipótese simplificadora de que os
principais custos são os custos variáveis, e que esses custos variáveis estão bem aproximados,
do ponto de vista da macroeconomia, pelos salários pagos aos trabalhadores.

W 1
P = (1 + µ) W −→ =
P (1 + µ)

Esta conexão é fundamental para entender a oferta agregada de curto prazo, e vamos
a partir da compreensão da formação de preços da economia, deduzir que salários reais as
empresas estariam dispostas a pagar aos trabalhadores para manter a sua taxa de markup numa
circunstância em que estas firmas têm poder de mercado no mercado de bens e serviços. Quando
O FERTA AGREGADA E E XPECTATIVAS R ACIONAIS 3

os salários nominais se elevam, para uma dada a taxa de markup, os preços dos bens e serviços
se elevam na economia e podemos definir, a partir daí, que as empresas estão dispostas a pagar
salários reais para os seus trabalhadores até o ponto em que não haja o comprometimento da
taxa de markup dessas empresas. Ou seja, a empresa produz bens e serviços, vende a um
determinado preço e obtém uma receita total. Dessa receita total, uma parte são os custos de
produção - representados pelos salários; e a outra parte é o lucro da empresa. Mas podemos
observar que a soma de salários e lucros esgota a receita desta empresa. Esta empresa não
estará disposta a alterar a sua taxa de markup para pagar salários mais altos. Podemos inferir
que a atuação das empresas no mercado de bens e serviços produz um comportamento dessas
empresas no mercado de trabalho, e que o salário real pago pelo trabalho dependerá de qual foi
a taxa de markup definida pela empresa, em uma relação inversa.

Figura 1 – Formação de Preços

O que significa que salário real e taxa de markup estão disputando o mesmo montante
de receita em termos reais. Um pedaço vai para o lucro, que é a remuneração do estoque de
capital e o outro pedaço vai para a remuneração dos trabalhadores em termos reais. Se o mar-
kup sobe, o salário real que as empresas estão dispostas a pagar será menor, representando a
maneira de agir no mercado de trabalho. Significa que do ponto de vista das empresas, o salário
real é igual ao inverso da taxa de markup e não muda em função do nível de desemprego da
economia. É por isso que graficamente o mercado de trabalho vai ser representado, pelo lado
do comprador da força de trabalho, pela regra de formação de preços, que é o comportamento
monopolista no mercado de bens e serviços definindo um comportamento no mercado de tra-
balho, em que a empresa está disposta a pagar um determinado salário real, qualquer que seja o
nível de desemprego da economia 1 .
1
CORREÇÃO: No vídeo da aula, a representação do mercado de trabalho contem um erro: o eixo horizontal
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

O ponto importante agora é que tratemos o conceito de equilíbrio no mercado de tra-


balho de uma forma bastante específica e que vai acontecer numa situação também muito clara,
que é a situação em que as expectativas de inflação dos agentes tenham se acertado e conduzido
por valor de equilíbrio da inflação no médio prazo.
Observem que o mercado de trabalho, pelo lado dos trabalhadores, foi representado
com um eixo vertical medindo o salário real esperado PWe e, pelo lado dos demandantes de
trabalho, como salário real W
P
. Dessa forma, o equilíbrio nesse mercado só estará definido
sob as circunstâncias em que P e = P , o que significa que os agentes não cometerão erros
de expectativas e, em média, esperam o nível de preços predito pela lógica de funcionamento
da economia2 . Este nível de desemprego, que corresponde a este ajuste de expectativas na
economia é o que vamos continuar chamando nas teorias modernas, mantendo o nome original
das contribuições de Friedman da década de 50, de desemprego natural. É aquele nível de
desemprego que deve prevalecer no médio prazo.
O equilíbrio de médio prazo serve, simplesmente, para que tenhamos um referencial de
pensamento, um ponto para o qual podemos esperar que a economia esteja caminhando ao
longo do tempo, que sirva de referencia para o comportamento dinâmico da economia . Quanto
tempo vai demorar para chegarmos nesse referencial? Teoricamente, nunca; aproximamo-noss
assintoticamente desse referencial, que é o equilíbrio de estado estacionário, tratados nos mode-
los mais formalizados. Porém, em alguns anos, a partir de um choque relativamente importante
que afete a economia, a economia vai flutuar e vai se aproximar suficientemente desse estado
estacionário. Não precisamos estar exatamente nele, mas se os ajustes acontecerem relativa-
mente rápido, podemos considerar que a economia está próxima o suficiente deste conceito
abstrato, que chamamos de estado estacionário, em que desemprego será o desemprego natural,
o emprego, o emprego correspondente a esta parcela do desemprego natural é o pleno emprego
e produto estará próximo suficiente do que chamamos de produto potencial. Todos esses con-
ceitos são abstratos e servem de referência de pensamento dentro da análise macroeconômica.

mostra Trabalho (N) em lugar de desemprego (u), e o eixo vertical mostra Preço (P) no lugar de Salário Real
(W/P), que é o correto, conforme a figura desse material.
2
Essa é uma maneira intuitiva de entender o conceito de Expectativas Racionais, como veremos mais adiante
Oferta Agregada Novo-Keynesiana

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender a curva de Oferta Agregada como resultado das
decisões de trabalhadores, na formação de salários, e de empresas, na formação de
preços.

A pergunta que temos de responder agora é: como conectar desemprego com produto,
na economia. E essa conexão será dada de uma forma relativamente simples. Se lembrarmos o
que vimos, no início deste módulo, a força de trabalho estava dividida entre emprego e desem-
prego, empregados e desempregados ( LL = 1 = NL + UL ). Se estamos considerando com uma
dada força de trabalho, mais desemprego significa menos emprego, menos emprego significa
que as empresas estão usando menos o fator trabalho para produzir bens e serviços e, portanto,
o produto na economia está caindo. A variável de ajuste na decisão das empresas em quanto
produzir vem por quanto contratar ou não de trabalhadores, quando se deseja produzir menos,
as empresas vão dispensar trabalhadores. Essa relação é uma simplificação bastante forte na
função de produção, considerando a função de produção expressa um comportamento linear
com o nível de emprego, a relação é direta, mais emprego significa mais produto.
Neste contexto, podemos de maneira muito simples associar nível geral de preços,
e inflação, com as condições do mercado de trabalho. Vejamos novamente: quanto menor o
desemprego na economia, maior o emprego, quanto maior o emprego, maior o produto da eco-
nomia, resultando em uma situação de aquecimento no mercado de trabalho, isso faz com que
os trabalhadores tenham mais poder de barganha, buscando os salários nominais mais elevados.
Ao buscar salários nominais mais elevados, os custos de produção se elevam também e, em res-
posta, as empresas repassam essa elevação de custos para os preços dos bens e serviços que elas
vendem no mercado de bens e serviços. Portanto, temos uma relação direta entre emprego,
nível de produção e nível geral de preços na economia. Esta relação diretamente proporci-
onal é exatamente aquela que vamos utilizar para expressar toda essa estrutura de decisão de
trabalho e de empresas, do lado da produção, do lado da oferta na economia, para expressar

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Oferta Agregada de curto e de médio prazos

a oferta agregada de curto prazo como sendo uma curva positivamente inclinada no nosso
gráfico 1 .
Vamos resgatar a lógica? Vamos lá, tomemos um ponto qualquer dessa curva ponto
A. Esse ponto diz que, para um dado nível de produto na economia, haverá um dado nível
de emprego, portanto um dado nível de desemprego, ao qual os trabalhadores barganharão um
certo nível de salários nominais, que representarão os custos de produção e que serão repassados
aos preços na economia, mostrando a combinação equivalente ao ponto A, tanto de nível geral
de preços, quanto de produto na economia. Esse é um ponto que está dentro dessa lógica de
oferta agregada de curto prazo.
O que acontece se quisermos comparar esse ponto com outro ponto em que o nível de
produção seja maior que o ponto A, como um outro ponto, o ponto B, que representa um nível
de produto da economia maior. Nível de produto maior significa o que? Mais trabalhadores em-
pregados, já que o ajuste da produção se dá em função de contratar ou dispensar trabalhadores
pelo lado da empresa. Produzindo mais, significa necessariamente que há mais trabalhadores
empregados, a taxa de desemprego está mais baixa do que no ponto A. Se a taxa de desemprego
está mais baixa, significa que o poder de barganha dos trabalhadores no mercado de trabalho
está maior. Os trabalhadores podem buscar salários nominais maiores, podem barganhar e al-
cançar reajustes maiores nos seus contratos de salário. Quando esses salários se elevam nos
1
CORREÇÃO: No vídeo da aula, a representação do mercado de trabalho contem um erro: o eixo horizontal
mostra Trabalho (N) em lugar de desemprego (u), o eixo vertical mostra Preço (P) no lugar de Salário Real
(W/P), e a seta que acompanha Trabalho (N) está invertida, sendo o correto a seta para baixo, conforme a figura
deste material
O FERTA AGREGADA E E XPECTATIVAS R ACIONAIS 3

contratos que vão sendo renegociados, isso vai se refletir em custos maiores que, dada a taxa
de markup da empresa, serão repassados para os preços dos bens e serviços que essas empresas
produzem.
Portanto, vamos ter como resultado dessa estrutura lógica que, toda vez que a economia
estiver num nível de produção maior do que no período anterior, ela também estará com um
nível geral de preços maior do que o anterior, é isso que se revela na curva de oferta agregada.
Essa relação não pode ser mecânica, tem que passar pela compreensão da decisão dos agentes
tanto do lado de formar preços e comprar trabalho, do lado das firmas, quando pelo lado de
ofertar trabalho e barganhar por salários nominais, que é a explicação que estamos utilizando
aqui para o comportamento dos trabalhadores.
Quando observamos o comportamento da economia ao longo do tempo e, levando em
conta que em situações de flutuação da Economia, em situações que caracterizam, portanto,
o curto prazo, não estaremos em o equilíbrio no mercado de trabalho, fora da taxa de desem-
prego natural e, portanto, fora do pleno emprego na economia. Podemos observar que, nessas
situações de flutuação, ainda não temos um ajuste completo de todos os fatores que envolvem
tanto a demanda agregada, quanto a oferta agregada, na macroeconomia. Ainda não houve a
análise do efeito que a mudança no nível geral de preços provoca sobre as expectativas de pre-
ços dos agentes, e portando, ainda não alcançamos o equilíbrio de médio prazo. Teremos uma
etapa intermediário de raciocínio, até o ponto em que as expectativas se ajustem, estaremos no
equilíbrio de curto prazo, que vai nos ajudar a entender as flutuações da economia em torno do
equilíbrio de médio prazo. No equilíbrio de médio prazo, uma vez alcançado, o equilíbrio do
mercado de trabalho estará alcançado também por definição, o que significa que o nível geral
de preços e o nível de preços esperado também terão convergido, serão iguais, e este ponto é
um ponto em que todas as variáveis endógenas estão determinadas e nada as movimentará, ex-
ceto um outro choque que possa abater a economia, mas em resposta ao primeiro choque, todos
os movimentos já teriam sido realizados, todas as decisões foram revistas e a economia teria
alcançado, portanto, essa a referência abstrata de equilíbrio de médio prazo.
Formação de Expectativas e as Curvas de Phillips

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender os efeitos de exportações e importações de bens e


serviços sobre o lado real da economia, no mercado de bens e serviços.

CURVA DE PHILLIPS

1 O MODELO COMPLETO

• Neste ponto, devemos nos perguntar o que acontece quando abandonamos a hipótese
simplificadora de que a Oferta Agregada seja infinitamente elástica.

do curto prazo ao longo prazo

• Lembrando que o produto potencial mostrará as condições de oferta agregada no longo


prazo (crescimento econômico):

Produto em que os fatores de produção estão plenamente empregados. Oferta Agre-


gada

2 OFERTA AGREGADA

• Por que a Oferta Agregada teria uma inclinação positiva?

• Para compreendermos os determinantes da oferta agregada no curto e médio prazos, de-


vemos nos voltar para o mercado de trabalho.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

3 SÍNTESE NEOCLÁSSICA E INFLAÇÃO

• O papel da política fiscal como elemento estabilizador da DA levou à subestimação do


papel da política monetária na economia, a moeda não tinha importância.

• A nova crença levou a políticas de crédito barato que estimularam a inflação. No pós-
guerra, a inflação, e não a recessão amplamente anunciada, foi o que se tornou o principal
problema nos países capitalistas de maneira geral.

• A partir do final da década de 50 a inflação passou a ser um fenômeno sistemático no


mundo, não mais passível de ser analisado enquanto consequência de situações extraor-
dinárias.

• Mesmo com oferta agregada positivamente inclinada, inflação tem natureza auto-eliminadora
no modelo da Síntese:

• Após uma inflação de demanda ou de custo, um novo equilíbrio macro é alcançado e


desaparecem as pressões para elevação de preços.

• Inflação: processo contínuo de elevação de preços

Figura 1 – Modelo Completo

• Análise gráfica:
Ao nível inicial de preços P0, o produto de equilíbrio do lado da demanda aumenta
(todo o mecanismo de ajustes que estudamos se aplica): excesso de demanda;
Os preços não subiriam se OA fosse infinitamente elástica, porém com OA positi-
vamente inclinada e se não estamos a plena capacidade, há espaço para um aumento do
produto e não apenas dos preços;
M ATERIAL DE L EITURA C OMPLEMENTAR 3

Caso estejamos a pleno emprego (oferta agregada vertical), apenas teríamos impacto
inflacionário – como no modelo clássico;

Ao atingir o nível de preços P1 a economia se encontra num novo nível de equilíbrio


de produto e de emprego maior que o anterior e o excesso de demanda inicial que origi-
nou a inflação foi eliminado, não há razão para esperar que o nível de preços continue
crescendo.

Natureza auto-eliminadora da inflação.

• Década de sessenta: microfundamentos (função consumo: ciclo de vida e renda perma-


nente)

• Antes, porém, que a falta de microfundamentos pudesse levar a uma completa reformu-
lação da Síntese, a Curva de Phillips veio se incorporar a ela.

Estabelecendo uma relação não-linear e negativa entre a taxa de crescimento dos


salários nominais e a taxa de desemprego, a Curva de Phillips agregada ao corpo da
Síntese permitiu a análise e explicação da inflação e alcançou enorme sucesso empírico,
o que postergou a derrocada da Síntese.

4 MUNDO REAL DE NOVO...

• No entanto, a década de 70 revelou o pior dos mundos: a inflação era acompanhada por
altas taxas de desemprego.

• A relação estabelecida pela Curva de Phillips não só apresentava alta instabilidade, já cap-
tada vela sua versão aceleracionista, como também aparentemente mudara de inclinação.

• O mundo presenciava o fenômeno da estagflação e, novamente, o instrumental de análise


econômica se mostrava insuficiente.

• Uma nova crítica ergueu-se não só contra a Curva de Phillips, mas também contra todo
o arcabouço da Síntese, mais uma vez questionavam-lhe a falta de microfundamentos,
ainda que os defensores da Síntese atribuíssem a situação de estagflação aos choques de
Oferta ocorridos na década em questão.

• Sob esta crítica, o consenso em macroeconomia, que perdurara cerca de três décadas,
viu-se rompido e novas agendas de pesquisa foram abertas objetivando principalmente
microfundamentar a análise macroeconômica.
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

5 INFLAÇÃO X DESEMPREGO: CURVA DE PHILLIPS

• A primeira fase corresponde à formulação do conceito inicial por Phillips (1958) e o


embasamento teórico fornecido por Lipsey por meio do mercado de trabalho, inclui-se
também nesta primeira fase as contribuições de Samuelson e Solow.

• A fase seguinte é caracterizada pela hipótese da taxa natural de desemprego e pela for-
mulação de uma regra de formação das expectativas inflacionárias, as expectativas adap-
tativas, caracterizando a versão aceleracionista da Curva de Phillips.

• Por fim, a terceira fase consiste na crítica da escola de Expectativas Racionais quanto à
regra de formação adotada na fase anterior. Sob esta nova versão, a Curva de Phillips
colapsa e os resultados obtidos através desta análise remontam os da análise clássica de
total independência entre as variáveis reais e nominais, tanto no curto quanto no longo
prazo.

6 CURVA DE PHILLIPS: PRIMEIRA FASE

• O trabalho original de Phillips foi dedicado à investigação da relação entre a taxa de


crescimento dos salários nominais ∆W e a taxa de desemprego u no período de 1861
a 1957 para o Reino Unido, encontrando empiricamente uma correlação não-linear e
negativa entre aquelas duas variáveis.

• Duas propriedades caracterizaram a forma desta relação: os salários permaneciam estaci-


onários ∆w = 0 quando a taxa de desemprego era de 5,5%; e, a partir da dispersão dos
dados, Phillips concluiu que os salários monetários cresciam um pouco mais rápido que
a taxa de desemprego quando esta decresce e um pouco mais devagar quando u cresce:

• Assim, a taxa de crescimento dos salários nominais dependia não somente da taxa de
desemprego (o nível de excesso de demanda), mas também da mudança de u

• Após esta evidência empírica, surgiu a questão de como se podia interpretar esta rela-
ção teoricamente. A resposta foi providenciada pelo modelo de excesso de demanda de
Lipsey (1960).

• Lipsey derivou a Curva de Phillips a partir de um sistema de demanda e oferta de um


mercado de trabalho com demanda e oferta de trabalho como funções do salário nominal
(ilusão monetária).

• Estas funções são planejadas pelos agentes a cada taxa de salário nominal, de modo que
não se pode concluir daí que o equilíbrio neste mercado implique em ausência de desem-
prego.
M ATERIAL DE L EITURA C OMPLEMENTAR 5

Figura 2 – Mercado de Trabalho

• Em geral, o equilíbrio pode estar aquém ou além do compatível com o equilíbrio de pleno
emprego.

• Foi com a modificação Samuelson-Solow que a curva de Phillips passou a representar a


relação entre a taxa de inflação (π) e a taxa de desemprego, e foi recomendada aos ges-
tores da política econômica como instrumento que permitiria a formulação de programas
de política com combinações alternativas de taxa de inflação e de desemprego.

Figura 3 – Inflação e desemprego


I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 6

• Isto é conseguido agregando-se ao desenvolvimento anterior uma equação de determina-


ção de preços via markup fixo calculado sobre a base de custos da unidade de trabalho.

• Cada ponto da Curva de Phillips assim modificada passou a ser interpretado como uma
alternativa de programa de política econômica, os gestores poderiam escolher uma meta
para estabilização de preços desde que estivessem dispostos a aceitar a taxa de desem-
prego que correspondesse a essa meta, ou vice-versa.

7 CURVA DE PHILLIPS: VERSÃO ACELERACIONISTA

• A Curva de Phillips, tal como formulada em sua primeira fase, obteve embasamento
teórico através da manutenção de uma hipótese que muito incomodava os economistas de
sólida crença na racionalidade neoclássica, qual seja, a de que os trabalhadores guiavam-
se pelos salários nominais para decidirem a quantidade de trabalho ofertada.

• Friedman (1968) e Phelps desenvolveram independentemente caminhos teóricos pelos


quais aquela falha poderia ser suprimida.

• Sob esta nova versão, o comportamento dos participantes do mercado de trabalho, para
dado salário nominal, é motivado pela taxa de salário real e depende, portanto, das expec-
tativas sobre o nível de preços que os agentes sejam capazes de formar. Se estas expecta-
tivas estiverem erradas, o salário nominal pode se equilibrar em posições não compatíveis
com a estrutura dos salários reais e a pleno emprego.

• Funcionamento do mercado de trabalho:


- o salário nominal se move para equilibrar o mercado de trabalho;
- os trabalhadores decidem quanto trabalho ofertar a cada salário nominal formando uma
expectativa de nível de preços (P e), e então transformando o salário nominal em seu
equivalente real, é o salário real que determina quanto trabalho é ofertado.
- os empregadores decidem quanto trabalho demandar a cada salário nominal usando seu
conhecimento sobre o preço de seu próprio produto para transformar o salário nominal
em seu equivalente real, que é, então, igualado ao produto físico marginal do trabalho
pela maximização do lucro.

7.1 EXPECTATIVAS ADAPTATIVAS

• Hipótese de que o valor futuro de uma determinada variável é uma função dos seus valores
passados, idéia que foi usada por Fischer (1930) ao definir a inflação esperada como uma
defasagem distribuída de valores passados, mas que ganhou notoriedade a partir do estudo
de Cagan (1956) sobre hiperinflação.
M ATERIAL DE L EITURA C OMPLEMENTAR 7

• Esta regra admite que os agentes aprendem com seus próprios erros passados. Deste
modo, os agentes (especificamente, os trabalhadores no modelo aqui desenvolvido) não
possuem ilusão monetária, mas, sim, ajustam lentamente suas expectativas à luz dos erros
que têm experimentado com suas expectativas anteriores.
e
πte = πt−1 e
+ θ(πt−1 + πt−1 )
πte = θπt−1 + (1 − θ)πt−1
e

• Partindo de uma situação inicial de equilíbrio a pleno emprego, para o qual corresponde
uma taxa de desemprego, a taxa natural de desemprego u*, suponha que o governo de-
cida ser maior que o desejável esta taxa de desemprego e implemente uma política de
gerenciamento da demanda agregada expansionista, de tal modo que os níveis de produto
e emprego aumentem assim como o nível de preços.

• Esta situação representa um desequilíbrio. No curto prazo, a busca desta política aumenta
a taxa de inflação que passa a ser maior que a taxa de inflação esperada, ou seja, as
taxas realizadas de mudanças nos preços não correspondem aos valores esperados desta
variável e um processo de ajustamento segundo as expectativas adaptativas é iniciado.

• Enquanto o processo de ajuste via expectativas se realiza, tanto os preços quanto os salá-
rios nominais estão crescendo, sendo que o último cresce mais rápido que o primeiro, de
tal modo que a curva de oferta de trabalho vai se deslocando para a esquerda.

• No ajuste, o crescimento dos salários nominais, após um movimento inicial do nível de


preços, impulsiona dinamicamente o crescimento dos preços, até que a taxa de inflação
esperada coincida com a taxa de inflação real.
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 8

• Neste ponto, a taxa natural de desemprego é restabelecida e nem o salário real nem os
preços relativos dos produtos cresceram. A Curva de Phillips foi deslocada para um novo
patamar e corresponde agora às expectativas ajustadas maiores que as anteriores.

• Concluí-se daí que quaisquer níveis de expectativas inflacionárias são compatíveis com
a taxa natural de desemprego, desde que plenamente antecipadas. E que se o governo
quisesse manter a taxa de desemprego abaixo de sua taxa natural, deveria estar disposto a
promover taxas de inflação não antecipadas cada vez mais altas, de modo que pudessem
continuamente superar as taxas de inflação esperadas, uma vez que os agentes aprendem
com a experiência.

• Daí o aceleracionismo desta versão.

• Deste modo, somente a parte não antecipada da taxa de inflação consegue influir no lado
real da economia permitindo um trade-off entre inflação e desemprego no curto prazo, em
outras palavras, somente um erro de expectativas torna inexistente a dicotomia clássica.

• No longo prazo:

As expectativas estarão plenamente ajustadas, e a taxa de desemprego estará a seu


nível natural.

Não há trade-off de longo prazo entre inflação e desemprego.

As diferentes taxas de inflação compatíveis com a taxa natural de

desemprego são plenamente antecipadas e permanecem constantes. A moeda é neutra


no longo prazo e a Curva de Phillips ‚ vertical no nível da taxa natural de desemprego.

• Lucas e mais tarde Sargent argumentam que, se as pessoas estão persistente e sistematica-
mente cometendo erros, elas não podem ser consideradas racionais. Um agente racional
deveria aprender com seus erros e usar de todas as informações disponíveis (não só os
valores passados da variável esperada) a fim de formar suas expectativas.

8 CURVA DE PHILLIPS: EXPECTATIVAS RACIONAIS

• Para integrar estas idéias em modelos econômicos formais, Lucas e Sargent (1978) ado-
taram a técnica de J. Muth (1961) de expectativas racionais.

• Segundo esta técnica, as expectativas são racionais quando, em média, coincidem com
os valores verdadeiros das variáveis sobre as quais as expectativas forem formuladas, ou,
dito de outra forma, a distribuição de probabilidade subjetiva dos resultados é igual à
objetiva.
M ATERIAL DE L EITURA C OMPLEMENTAR 9

8.1 EXPECTATIVAS RACIONAIS

• A hipótese das expectativas racionais envolve três afirmações:

as informações são escassas e o sistema econômico não as desperdiça;

as expectativas são formadas a partir da estrutura específica do modelo que descreve


a economia;

a previsão econômica verdadeira não dá a ninguém uma oportunidade especial de


lucrar a partir dela, se ela é conhecida por todos.

8.1.1 Novos-clássicos e Expectativas Racionais

• As expectativas racionais estão intimamente ligadas à doutrina novo-clássica, embora o


uso deste instrumental não seja peculiar somente a esta escola de pensamento econômico.

• A escola novo-clássica caracteriza-se por três princípios-chave:

as decisões econômicas dos agentes são baseadas unicamente em fatores reais;

os agentes são, no limite de suas informações, otimizadores consistentes, ou seja,


estão continuamente em equilíbrio;

e eles não cometem erros sistemáticos na avaliação do comportamento econômico -


formam expectativas racionais.

8.1.2 Expectativas Racionais

• Formalmente, o conceito de expectativas racionais equivale à esperança matemática con-


dicionada pelo conjunto de informações relevante e disponível para o período de tempo
imediatamente anterior It−1 , o qual inclui todas as variáveis exógenas, todos os valores
passados das variáveis endógenas e, principalmente, a estrutura do modelo.

8.1.3 A Curva de Phillips

• A implicação da hipótese de expectativas racionais é que a taxa de desemprego real oscila


aleatoriamente em torno da taxa natural. Verifica-se que desvios sistemáticos da taxa
de inflação em relação a taxa esperada não podem ser gerados por meio da política de
gerenciamento da demanda agregada para influenciar a taxa de desemprego corrente.

• Sob esta versão, a Curva de Phillips de curto prazo colapsa, nenhuma relação entre infla-
ção e desemprego é encontrada seja no curto ou no longo prazo: ditocomia clássica
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 10

• Apenas uma surpresa sobre o curso da oferta de moeda, por exemplo, pode alterar instan-
taneamente o nível real de emprego. Este modelo não é adequado, portanto, para explicar
movimentos persistentes na taxa de desemprego, tais como os observados nos ciclos dos
negócios no mundo real.

• Neste sentido, há apenas que se fazer uma ressalva. Os resultados aqui apresentados são
derivados da chamada hipótese forte de Expectativas Racionais dentro da escola novo-
clássica. A busca de uma explicação, consistente com este arcabouço teórico, para os
movimentos sistemáticos da taxa de desemprego durante a contração ou expansão de um
ciclo tem levado ao desenvolvimento das teorias dos ciclos reais.

• Por hora, o que nos interessa extrair deste instrumental é que a inflação é um fenômeno
estritamente monetário e que, sob esta versão, a Curva de Phillips deixa de existir ao
mesmo tempo em que se buscam fundamentos de estrita racionalidade neoclássica para a
macroeconomia.

8.2 NESSE CONTEXTO: COMO REALIZAR POLÍTICA MONETÁRIA?

• Novos mecanismos de transmissão – principalmente expressos em rigidez de preços e


salários monetários – da política econômica e de choques em geral para o nível de preços
abriram espaço para o desenvolvimento da teoria monetária positiva e normativa.

• Nesse desenvolvimento, ganha corpo o debate regras versus discricionariedade na condu-


ção da política monetária de controle da inflação. Este debate foi formalmente inaugurado
pelo famoso artigo de Kydland e Prescott (1977) e reafirmado com o trabalho de Barro e
Gordon (1983).
Expectativas Racionais e Inconsistência Dinâmica

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender como a expectativa sobre o futuro afeta as decisões
no presente, fazendo com que um ambiente de atuação do governo por meio de
regras contribua para minimizar as flutuações macroeconômicas.

O equilíbrio geral econômico considera o ajuste de todas as variáveis, inclusive o ajuste


das expectativas dos agentes, caracterizando o equilíbrio de médio prazo. Neste ponto, em
que já temos condições de entender a estrutura completa da macroeconomia, vale a pena que
chamemos a atenção para a formação de expectativas na economia1
Nosso foco aqui é entender esse contexto, já considerando que os agentes formam ex-
pectativas racionalmente, a partir das contribuições fundamentais tanto de Robert Lucas, quanto
de Thomas Sargent, no início da década de 70, para a chamada revolução das expectativas
racionais. E é uma revolução porque de fato transformou a metodologia de análise macroeco-
nomica no seguinte sentido: os agentes respondem, ou seja, mudam as suas decisões hoje em
função daquilo que esperam que aconteça com a economia no futuro, levando em conta, inclu-
sive, as atuações tanto de política monetária quanto de política fiscal que são esperadas como
compatíveis com os regimes macroeconômicos adotados pelo governo e pela sociedade em um
determinado ponto do tempo. Essas expectativas são consistentes com o modelo, o que parece
ser uma hipótese muito forte e recebe muitas críticas desde sua proposição2 .
Porém, digamos que embora pareça ser uma uma suposição de processo decisório
muito radical, na verdade, o que ela produz como resultado que, em média, representa ou tem
representado bem o comportamento dos agentes econômicos no mercado. É importante fazer
1
Não pretendemos fazer, aqui, um resgate do desenvolvimento da História do Pensamento Macroeconômico.
Infelizmente, não temos tempo hábil para isso. Deixo uma material de leitura complementar que pode ajudar
a entender o processo da previsão perfeita, para as expectativas estáticas, expectativas adaptativas e finalmente
expectativas racionais.
2
Há algumas alternativas para descrever o comportamento expectacional dos agentes em desenvolvimento, tais
como um tratamento de decisão não plenamente racional, decisão a partir de agentes heterogêneos, decisões
que levam em conta aspectos psicológicos dentro do aspecto da linha comportamental que vem ganhando força
ultimamente na teoria econômica

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

essa observação, porque, mais do que adotando uma postura que seria bastante ingênua de achar
que os agentes tem condições de conhecer a estrutura lógica da macroeconomia, o famoso mo-
delo macroeconômico que melhor representaria o mundo real e a partir daí fazerem todas as
suas análises, para ter uma resposta sobre qual o comportamento esperado do produto, da infla-
ção, na taxa de juros e assim por diante, mais do que ter a ingenuidade de que os agentes sejam
capazes de fazer isso individualmente, estamos adotando uma hipótese que expressa bem o
comportamento médio, o comportamento dos agentes enquanto entendidos como partes de
mercados3 . Assim, entendemos expectativa racional como sendo um comportamento relativa-
mente simples, um comportamento em que os agentes fazem o melhor que eles podem dado
às restrições que ele têm, dado o conjunto de informações que eles têm à disposição ao
tomar essa decisão, ou seja, não desperdiçam informação disponível, um agente que desper-
diça informação disponível seria considerado um agente irracional e não seria explicado pelo
contexto da nossa teoria da corrente principal.
Quando formulamos modelos formais, modelos matematizados considerando proces-
sos estatísticos, estocásticos desse modelo, a expectativa racional se converte numa estratégia
de solução do modelo bastante complexa em que, de fato, expressamos as expectativas dos
agentes condicional ao funcionamento do modelo. Então é como se os agentes fossem capa-
zes de prever o comportamento da economia a partir da estrutura lógica que o modelo propõe
para explicar a estrutura lógica da macroeconomia em si. É por isso que, normalmente, o con-
ceito de expectativa racional tem uma definição muito simples que é: esperança condicional da
variável, condicionada ao conjunto de informações disponíveis. Novamente, não estamos acre-
ditando que cada um dos agentes da economia seja capaz de produzir esse resultado, mas tão
simplesmente tomando essa hipótese como uma boa representação do comportamento médio
dos mercados.
Ao adicionamos, à estrutura lógica da macroeconomia, elementos de rigidez que fazem
com os preços demorem para se ajustar, como já discutimos no mercado de trabalho a justaposi-
ção de contratos, por exemplo, temos uma defasagem nesse processo de ajuste que, mesmo com
agentes que formam expectativas racionais, vai nos ajudar a entender as flutuações da macroe-
conomia. Assim, as expectativas racionais nos levam a representar agentes na macroeconomia
que, ao tomar suas decisões hoje, levaram em conta aquilo que eles esperam que aconteça no
futuro e essa antecipação afeta os resultados de suas decisões no momento presente.
Já que os agentes levam em conta aquilo que se espera que aconteça com a economia
no futuro, esses agentes incorporaram nas suas decisões presentes resultados de possíveis
ações de política monetária e fiscal que afetarão a economia no futuro. Exatamente neste
contexto que entendemos que, quando um governo faz uma política que é inconsistente ao
3
Por enquanto, ainda não há um novo paradigma para colocarmos no lugar das expectativas racionais, talvez
daqui a alguns anos, ou décadas, seja necessário voltar aqui no nosso curso e rever essa parte final e isso faz
parte da evolução da corrente principal, que se desenvolve e é corrente principal exatamente porque evolui e
incorpora teorias que ajudam a entender melhor o mundo
O FERTA AGREGADA E E XPECTATIVAS R ACIONAIS 3

longo do tempo, ou seja, quando ele age olhando só para o momento presente sem levar em
conta os resultados desta política no futuro, agindo de forma inconsistente ao longo do tempo
(inconsistência intertemporal), os agentes reconhecem essa inconsistência, porque eles reco-
nhecem quais serão os efeitos dessa política no futuro e antecipam esses efeitos, afetando a
decisão dos agentes no contexto de expectativas racionais.
A partir dessa perspectiva, a discussão sobre a atuação do governo por meio de re-
gras ou por discricionariedade evoluiu ao longo das décadas de 70 e 80, no sentido de indicar
que as regras são preferíveis à discricionariedade. Isso porque uma vez que o governo aja in-
consistentemente, por exemplo: suponha que seja esperada uma política fiscal restritiva dadas
as circunstâncias da economia, porém o governo opta por fazer, hoje, uma política monetária
expansionista; os agentes antecipam o efeito dessa política monetária no futuro e tomam de-
cisões diferentes no presente em função dessa antecipação, de tal forma que essa antecipação
produz o efeito de anular aquele ganho que a política discricionária propiciaria para o governo
no momento presente. Assim, se o governo pretende fazer com que esses ganhos sejam perenes,
sejam subsequentes ao longo do tempo, ou seja, que ele possa usufruir de uma política discrici-
onária de forma persistente ao longo do tempo, ele só conseguirá fazer isso se surpreender os
agentes a todo momento, porque se ele seguir aquilo que é esperado pela estrutura de funcio-
namento da macroeconomia, os agentes anteciparão e esses efeitos da discricionariedade serão
minimizados.
O debate sobre inconsistência dinâmica, sobre regras versus discricionariedade, tornou-
se extremamente importante a partir da perspectiva da expectativa racional e, ao longo do tempo,
foi levando tanto a teoria macro quanto a prática das políticas econômicas nos países desenvolvi-
dos e em desenvolvimento, para adoção de regras, de comportamentos pautados por regras,
do ponto de vista da política monetária e da política fiscal. Nesse contexto, osregimes de
meta de inflação vão se consolidando como as escolhas que revelam os melhores resultados, do
ponto de vista da gestão da política monetária, e um comprometimento com a sustentabilidade
do endividamento em relação ao produto da economia ao longo do tempo, também como uma
maneira de evitar que o governo tente usufruir de uma política discricionária.
Então, essa configuração de regras, que não são rígidas, mas que definem um compor-
tamento esperado e combinado com a sociedade em relação às ações de política monetária e
fiscal, produzem uma estabilidade em termos de capacidade preditiva e de tomada de decisão
dos agentes, que contribui para diminuir a flutuação econômica. É nesse sentido que obser-
vamos a teoria macroeconômica e a prática na gestão da política monetária e fiscal no mundo
convergindo para adoção de regras. E é neste contexto que estamos estruturando a nossa análise.
Então, o nosso conjunto macroeconômico, que é bastante complexo, e que está sendo simplifi-
cado em diversos aspectos para que possa ser analisado em conjunto, traz consigo este resultado
fundamental dos desenvolvimentos nas últimas décadas, de que a ação da política econômica
definida no contexto de regras produz melhores resultados do que ação discricionária.
Crescimento Econômico: o Longo Prazo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: reforçar a compreensão sobre os fatores relevantes para o


crescimento sustentado, diferenciando-o dos choques que produzem flutuação.

Uma vez que tenhamos compreendido o significado do equilíbrio de médio prazo e o


papel das expectativas racionais no contexto da estrutura macroeconômica, ainda que de forma
bastante simplificada, podemos voltar à compreensão do equilíbrio no mercado de trabalho
como sendo uma situação que marca um ponto bastante estratégico na nossa análise macroe-
conômica, que é o equilíbrio de médio prazo. Este equilíbrio, uma vez alcançado, significa que
todas as variáveis que afetam as decisões dos agentes já produziam seus efeitos sobre as deci-
sões, inclusive a formação expectativas e, portanto, estamos numa situação tal que a economia
só vai sair daí se sofrer um outro choque, e isso sempre ocorre. Ou seja, quando olhamos para
o mundo real, o que se observa é a economia flutuando em torno deste referencial que estamos
chamando aqui de equilíbrio de médio prazo e que vai corresponder ao produto potencial1 .
Lembremos que mesmo no equilíbrio de médio prazo ainda há variáveis que não foram
alteradas, simplesmente porque o tempo decorrido não foi suficiente para que elas se alterassem.
Estamos falando especificamente daquelas variáveis que explicam o crescimento econômico,
ou seja, as variáveis que são relevantes para que entendamos como o produto potencial da
economia evolui ao longo do tempo, e a qual taxa de crescimento ele evolui (a inclinação da
reta na figura 1).
Qual é a taxa de crescimento de longo prazo da economia? Os fatores que a deter-
minam estão associados ao lado real da economia, e que foram tomados como dados até o
momento, tais como o estoque de capital acumulado no longo prazo. Aqui, a explicação do
crescimento econômico é o que definimos como longo prazo. Alguns livros não distinguem
o médio e o longo prazo e não há problemas com essa nomenclatura, ainda que o equilíbrio
1
Graficamente, representamos este ponto, nossa referência de pensamento, como sendo o ponto em que a curva
de oferta agregada se torna vertical, ou seja, o ponto em que o produto está definido, a inflação está definida
e a economia para de se movimentar. Alguns livros tratam esse equilíbrio como o equilíbrio de longo prazo e
não há nenhuma perda em usar essa nomenclatura

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Crescimento Econômico: evolução do produto potencial ao longo do


tempo

de médio prazo seja denominado de equilíbrio de longo prazo, ele ainda estará sendo tratado
como um ponto estático, uma referência de produto potencial dada A partir do momento em
que a literatura trata da evolução desse produto ao longo do tempo, é que estamos tratando de
modelos de crescimento econômico, ou seja, explicações de porque a economia cresce 10% e
a outra cresce a 2%. Por que uma economia para de crescer por décadas, mantém uma taxa de
crescimento muito baixinha? Como fazer a taxa de crescimento relativamente elevada e se man-
ter por muitas décadas? Desses aspectos que estamos falando e esses aspectos estão associados
principalmente ao acúmulo de capital como proporção do PIB, inicialmente, ao crescimento da
oferta de trabalho, mas principalmente ao crescimento da produtividade marginal tanto trabalho,
quanto do capital, são os aspectos de crescimento econômico de longo prazo.
Determinantes de crescimento econômico estão muito associados a como a economia
evoluiu ao longo em termos de ganhos de produtividade de seus trabalhadores. O que faz
um trabalhador ganhar produtividade? Basicamente é atender adequadamente às condições de
qualidade de vida, tais como boas condições de saúde, saneamento básico, educação, etc., até
aspectos estritamente associado ao seu trabalho, ou seja, a qualificação do capital humano,
que é o conjunto desses fatores, como evolui o capital humano de uma sociedade é um fator
extremamente relevante para entender como evolui a produtividade marginal do trabalho ao
longo do tempo.
Da mesma forma que tanto para a produtividade marginal do trabalho quanto do ca-
pital é extremamente relevante que tenhamos um processo de desenvolvimento tecnológico,
que em geral, passar por processo, uma capacidade de inovar tanto em processo de produção
quanto inovação em produto, criar novos produtos que atendam a novas demandas conforme
O FERTA AGREGADA E E XPECTATIVAS R ACIONAIS 3

a economia evolui ao longo do tempo. Atualmente, aspectos institucionais e culturais das


economias economias vêm sendo associados também a essas condições de crescimento, por
exemplo, economias que têm marcos regulatórios claros e que aplicam as regras do jogo com
rigor, ou seja, tem uma estrutura legal, judiciária forte e sólida, têm obtido sucesso no alcance e
na manutenção de taxas de crescimento elevadas no longo prazo.
Nosso objetivo aqui não é crescimento econômico. Estamos apenas trazendo uma
intuição sobre os principais determinantes do processo de crescimento da economia no longo
prazo, das possíveis explicações de diferenças de crescimento entre países diferentes, níveis de
desenvolvimento diferentes ao longo do tempo e que precisariam ser exploradas em muito mais
detalhe.
Porém, voltando ao nosso foco, que são as flutuações econômicas, estamos plenamente
capacitados a compreender como certos choques afetam a macroeconomia e que respostas es-
peraríamos das autoridades monetária e fiscal em função da ocorrência desses choques. Antes
de analisar um desses choques, vale a pena reforçar o seguinte aspecto: como já discutimos
anteriormente, é importante que tenhamos um cenário de ação, ou seja, um conjunto de normas
claras de ação tanto de política monetária, quanto fiscal e o regime de metas de inflação vem, de
certa forma, trazer essa configuração. Exatamente por isso que o regime de metas de inflação é
expresso como um tripé macroeconômico: a consistência entre a escolha do regime monetário,
do regime cambial e do regime fiscal.
O importante é termos que não fazemos, cometemos o erro de fugir da lógica que mes-
mos desenhamos como uma boa explicação para o funcionamento da economia real. Aprender
a fazer análise econômica, em primeiro lugar, é aprender a utilizar a estrutura lógica correta-
mente. Como como fazer isso? Essa é a aplicação que faremos no próximo módulo!
Choques

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: definir choques e entender como iniciar uma análise macro-
econômica respeitando a estrutura lógica do modelo completo que estudamos.

A primeira tarefa que temos é identificar o choque que afetou a economia. O que signi-
fica identificar o choque? Significa identificar qual a principal variação que trouxe para nossa
economia em análise uma necessidade de resposta dos agentes em relação as suas decisões,
dentro da estrutura macroeconômica. Por exemplo, uma quebra de safra de um produto agrícola
importante, representa um choque? Sim, porque é um evento inesperado, é um evento que não
poderíamos antecipar a partir do funcionamento proposto pela estrutura lógica que utilizamos
para entender o mundo. Dentro dessa estrutura lógica, uma quebra de safra por motivos cli-
máticos, por exemplo, é um choque que afeta a economia pelo lado da oferta agregada. Como
assim? Se a economia é uma importante produtora de produtos agrícolas, é uma exportadora
de commodities agrícolas e produz boa parte da produção agrícola que é consumida dentro do
seu próprio país, uma quebra de safra, um evento inesperado, produz uma redução na oferta de
bens e serviços na economia. Essa redução provoca uma série de mudanças nas decisões dos
agentes, que resulta em produto da economia, inflação, taxa de juros, taxa de câmbio para um
determinado patamar diferente daquele que prevalecia no momento que o choque aconteceu.
Uma análise macroeconômica requer, então:

1. identificar o choque principal que será analisado;

2. identificar impacto inicial do choque, qual agente que responde em primeiro lugar ao
choque em questão;

3. desenvolver o raciocínio lógico que o modelo em utilização propicia, respeitando a cone-


xão entre os mercados que compõem o conjunto completo;

4. responder o que acontece com as principais variáveis endógenas do modelo.

1
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

O processo de ajuste nas decisões dos agentes vai se revelar concretamente com mu-
dança dos patamares dessas variáveis endógenas. E isto é fazer análise macroeconômica. é
muito importante conseguir separar as fontes principais de choque sobre a economia: há cho-
ques que afetam a economia pelo lado da oferta agregada, choques que afetam a economia
pelo lado da demanda agregada, e, ainda, choques que afetam a macroeconomia por ambos
os lados. Um choque de expectativas tem essa possibilidade de afetar tanto a decisão de con-
sumo e investimento como já falamos anteriormente, quanto a decisão de barganha de salários
dos trabalhadores no mercado de trabalho, portanto é uma possibilidade de choque que tem
um efeito simultâneo entre oferta e demanda agregada, o que torna mais e bastante complexa a
análise. Em geral, ainda que reconheçamos que o efeito possa ser simultâneo tanto em oferta
e demanda agregada, escolhemos aquele canal por meio do qual o efeito parece ser mais
forte e, no caso das expectativas de inflação, principalmente temos essas expectativas expressas
explicitamente na decisão de trabalho dos trabalhadores, uma decisão que vai afetar um custo
importante na economia que são salários nominais, e portanto é este mecanismo que assumire-
mos como sendo o mecanismo mais forte, mecanismo que causa impacto de primeira ordem
sobre a estrutura da análise macroeconômica. Tomar essas decisões requer que tenhamos
compreendido razoavelmente a estrutura lógica.
Um outro choque muito importante é o choque de política fiscal, quando o governo
gasta mais do que os agentes esperavam, ele tá produzindo um choque de política fiscal expan-
sionista. Também é possível que o governo mude a taxa de juros numa proporção maior ou
menor do que aquilo que era esperado pelos agentes, e ele também está produzindo um cho-
que de política monetária. Esses choques terão efeitos a partir das respostas dos agentes e da
mudança das suas decisões que vão levar toda a estrutura macro para um outro equilíbrio.
Modernamente, evitamos realizar análises em que o governo produza choques, porque
não se espera que o governo produza flutuação na economia, mas que o governo - por meio
da política monetária política fiscal - reaja a situações da macroeconomia propiciando menos
flutuação. Quando um governo toma decisões discricionárias, ou seja, produz choques, causa
surpresas o que aumenta a flutuação da economia. Podemos concluir que esse governo não está
fazendo o papel que era esperado que ele fizesse dentro da nossa compreensão do seu papel
segundo a corrente principal.
A perspectiva da corrente principal é sempre de que o governo atue no sentido de mi-
nimizar as flutuações da macroeconomia. Se tivermos um choque de oferta ou um choque de
demanda, o papel do governo é identificar esse choque, pensar sobre os efeitos desse choque
sobre a economia e agir de forma a minimizar esses efeitos. Exatamente esse tipo de análise
que faremos daqui para frente, tomaremos um determinado choque, analisaremos como a eco-
nomia responde a este choque e o que esperar que o governo faça para minimizar a flutuação da
macroeconomia em função da ocorrência deste choque.
Os choques podem ser diversos, se pensarmos que a economia doméstica tem conexões
A NÁLISE M ACROECONÔMICA C OMPLETA 3

com o resto do mundo, uma crise no mercado financeiro internacional pode ser uma fonte de
choque original muito importante e que tenha um impacto extremamente relevante na estrutura
da economia doméstica.
Uma crise num país emergente, como um problema na Rússia, por exemplo, um pro-
blema na Índia ou o crescimento da China menos acelerado, qualquer um desses fatores exóge-
nos à economia doméstica, portanto eles são fontes de choques que afetam a economia domés-
tica. Há uma gama enorme de possibilidade de choques que afetam a economia! É importante
que vocês comecem a fazer esse exercício de pensar na estrutura lógica do modelo representada
apenas pelas suas conexões lógicas, sem precisar levar em conta a estrutura matemática formal,
da maneira como estamos apresentando aqui, e em que ponto dessas conexões lógicas um deter-
minado choque entraria e como, a partir daquele ponto, ele se transfere para a economia como
um todo? Dar essas duas respostas, difíceis, mas possíveis, é fazer análise macroeconômica.
Do nível de preços à taxa de inflação

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Compatibilizar análises e definições realizadas utilizando


nível geral de preços (P) com a análise da oferta agregada

Antes de fazermos nosso primeiro exemplo, é importante chamar a atenção para um


aspecto técnico da representação da estrutura lógica, e que está associada à utilização da variá-
vel nível geral (P) de preços, em outros falamos em taxas de inflação (π). Em alguns momentos,
falamos sobre mudanças no nível geral de preços, como sendo a resposta endógena da macro-
economia, em outros momentos falando de mudanças na taxa de inflação, vamos estabelecer
uma conexão entre essas duas variáveis, que é uma conexão muito simples e formal. Todos os
modelos que dizem respeito à determinação do nível de preços, também podem ser entendidos
como modelos de determinação da taxa de inflação.
Precisamos fazer algumas mudanças nas conexões, as variáveis nominais não estão
mais conectadas pelos seus níveis, tais como: salário nominal, nível geral de preços, taxa no-
minal de câmbio, que são as três principais variáveis nominais que temos, passam a ser tratadas
também como sua taxa de mudança. A taxa de mudança, ou a taxa de crescimento dos salários
nominais, a taxa de crescimento da taxa de câmbio, a taxa de crescimento do nível geral de
preços que ativamente a taxa de inflação, a oferta de moeda também passa a ser tratada como a
taxa de crescimento da oferta de moeda. É preciso que haja essa compatibilização: ou tratamos
todas as variáveis nominais em termos de nível, ou tratamos todas essas variáveis em termos de
taxa de crescimento. Essa mudança não tem impacto significativo sobre a estrutura lógica bá-
sica, pois uma taxa de crescimento é simplesmente o valor da variável hoje, menos o valor dela
ontem, sobre o valor dela ontem. O que determina o valor dela hoje, continua determinando,
por exemplo, a taxa de inflação hoje, do ponto de vista dos principais fatores e das conexões
lógicas, não temos mudanças significativas.
Pt −Pt−1
Exemplo: πt = Pt−1

Porém, há um ganho muito importante em utilizarmos taxas de variação das variáveis


nominais, e esse ganho é expresso na conexão da análise lógica com o mundo real. Quando

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

olhamos para o mundo real, não observamos, por exemplo, na imprensa, a divulgação e a
discussão do nível geral de preços, porque ele é um número índice, que, por exemplo, num
determinado momento teria o valor de 105, se no período anterior o índice era de 100, significa
que a taxa de inflação foi de 5%. Em geral, não debatemos e falamos de macroeconomia em
termos de nível geral de preços, mas sim em termos de taxa de inflação. É importante fazer
essa conexão, não deduziremos formalmente essa passagem, mas alertamos que, de preferência
daqui para frente, porque estamos querendo analisar o mundo real, vamos nos referir à taxa de
inflação, à taxa de crescimento da oferta de moeda, à taxa de variação do câmbio, à taxa de
variação dos salários nominais.
Todas as variáveis nominais vão ser tratadas em função das suas taxas de variações
percentual, assim como acontece com o nível geral de preços, na produção da variável mais
relevante para nossa análise, que é a taxa de inflação. É só um aspecto técnico, que não vai
mudar em nada tudo que fizemos até agora, mas vai compatibilizar nossa linguagem, de tal
forma que expressemos os resultados finais agora não em termos de nível geral de preços, mas
em termos de inflação e produto, porque fica muito mais intuitivo, muito mais interessante,
porque se aproxima de como enxergamos o mundo.
Efeitos sobre a Demanda Agregada

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Choque de Demanda Agregada positivo: elevação da renda


de um parceiro comerciais, e seus efeitos no âmbito da demanda agregada.

Estamos prontos para fazermos a nossa primeira análise macroeconômica completa.


Processo que tem várias etapas, descritas na estrutura lógica que se desenvolveu ao longo dos
módulos anteriores. Precisamos sempre nos ater às estruturas lógicas e não dar passos maiores
do que a estrutura lógica permite, porque isso tem uma grande chance de nos levar a conclusões
incorretas e precipitadas.
Vamos partir de um choque de demanda bastante específico e comum a economias que
têm nas suas exportações um fator relevante do seu dispêndio doméstico. A exportação, como
já vimos anteriormente, depende da renda das outras economias, dos países que vão comprar
nossos bens e serviços. Nosso choque será o seguinte: vamos pensar na situação em que um
importante parceiro comercial começa a crescer mais, ou seja, ele está no momento de
aumento de elevação da sua atividade econômica, e a perspectiva de crescimento seja maior nos
anos seguintes (por exemplo, maior da China, tomando a economia doméstica como o Brasil).
Passo 1:
Partimos, assim, de um choque de demanda positivo, porque o efeito sobre o sistema
doméstico será no sentido de elevar as exportações brasileiras. A situação inicial sobre as
exportações e as importações estão em que parte da nossa estrutura lógica? Mercado de bens
e serviços. Vamos observar o primeiro impacto desse choque sobre o nosso mercado de bens e
serviços: o dispêndio doméstico aumenta, pois as importações estão constantes, as exportações
cresceram. Temos um efeito de elevação do dispêndio doméstico.
Passo 2
O primeiro impacto se dá pelo lado da Demanda Agregada. Estamos considerando o
impacto deste fator sobre o produto da economia dada uma taxa de inflação. Temos um choque
de demanda, representado aqui pelo crescimento da China, esse choque aumenta as exportações

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

brasileiras, ou seja, o conjunto de gastos em relação ao que produzimos aumenta - supondo que
a taxa de inflação permaneça a mesma - qual é o impacto sobre o produto? Vamos ter aqui
uma queda nos estoques que as empresas exportadoras e isso faz com que as firmas aumentam
a produção de bens e serviços.

Figura 1 – Efeitos sobre a DA de um choque de Demanda Positivo

Passo 2.A: Inicialmente, só pensando pelo lado da demanda, o produto da economia


aumenta, a renda disponível aumenta, e o que que acontece com o consumo das famílias? Há um
impacto adicional dentro do dispêndio doméstico elevando o consumo das famílias, de acordo
A NÁLISE M ACROECONÔMICA C OMPLETA 3

com o multiplicador keynesiano. O impacto original produz impacto ampliado porque com o
aumento da renda, o consumo das famílias também aumenta e isso produz um ciclo de elevação
consumo-renda que vai nos levar a uma renda maior.
Passo 2.B: Dentro do circuito lógico da demanda agregada, temos o mercado de bens
e serviços, mas temos também o que os mercados financeiros, que estão representados pelo
mercado monetário e pelo mercado cambial, precisamos combinar todos esses aspectos para
saber o que que tá acontecendo com o lado da demanda agregada na economia. Conforme a
renda sobe, a autoridade monetária responde. Como sabemos disso? É só lembrar que a polí-
tica monetária, que busca expressar o equilíbrio monetário, responde de maneira simplificada a
mudanças na expectativa de inflação em relação à inflação e também em relação à mudança no
gap do produto. Ou seja, quando o produto começa a crescer, a autoridade monetária começa a
observar que uma pressão sobre os preços mais produzida na economia e antecipa a essa pres-
são, respondendo com política monetária restritiva. O BC reage endogenamente ao crescimento
do produto, porque o crescimento do produto é um indicador antecedente de inflação no futuro,
e para combater esse efeito hoje ele começa a fazer política monetária restritiva, que pode ser
feita por qualquer um dos instrumentos de política monetária que discutimos anteriormente.
Um instrumento tradicional da operação do dia-a-dia da política monetária é o open
market: o BC faz um open market de venda de títulos públicos, produzido um excesso de oferta
de títulos públicos, o preço do título público cai, a taxa de juros sobe, resultando em uma taxa
de juros um pouco maior economia. Quando a taxa de juros sobe, qual é a próxima resposta
imediatamente nesta estrutura lógica? Investimento produtivo e o consumo. Começamos com
um impacto expansionista dado pelos choque exógeno, que produziu um impacto ampliado via
multiplicador keynesiano e que agora tem um vazamento, ou seja, tem um impacto no sentido
contrário, que é a reação do Banco Central ao crescimento do produto, elevando a taxa de juros
como uma resposta endógena à situação da macroeconomia.
Essa elevação diminui um pouco consumo, diminui um pouco investimento e faz eco-
nomia não expandir tanto quanto ela expandiria se só houvesse mercado de bens e serviços para
ser analisado, para explicar o comportamento da demanda agregada.
Passo 2.C: Mas quando a taxa de juros sobe, há um impacto no fluxo de capitais da
economia e aí vamos voltar a conexão agora para o impacto sobre o mercado cambial: quando
a taxa de juros sobe, o que que acontece com o fluxo de capitais? Temos uma relação de
retorno, dado risco, liquidez, etc., mais atrativa para os ativos domésticos, ou seja, o retorno
dos ativos domésticos está maior em relação ao retorno dos ativos estrangeiros, medidos na
mesma moeda. Vamos ter um influxo de capital, uma entrada de capitais da economia e uma
apreciação da moeda doméstica. Quando a moeda doméstica se aprecia, dado que não temos
mudança ainda na taxa de inflação, um impacto subsequente é sentido também nas exportações
líquidas. Apreciação do câmbio vai produzir uma pequena queda na exportação e um pequeno
aumento na importação, ou seja, vai diminuir o saldo líquido de transações correntes
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

Passo 3
Ao final desse processo lógico, vamos ter uma expansão do produto, mas uma expansão
um tanto menor do que teríamos se não houvesse esses efeitos conectados pelo lado da demanda
agregada entre mercado de bens e serviços, resposta da política monetária (Regra de Taylor) no
mercado monetário e mercado cambial. Ainda sim, liquidamente e quando combinamos esses
efeitos, vamos observar uma elevação da renda, menor do que a que seria se os efeitos não
tivessem sido considerados, uma apreciação da moeda doméstica e uma elevação inicial da taxa
de juros, sintetizados no ponto A da figura 1.
Equilíbrio de curto prazo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: entender a interação entre Demanda Agregada e Oferta


Agregada que resulta no equilíbrio de curto prazo em resposta ao choque positivo
de demanda.

Esse circuito no âmbito da estrutura de demanda agregada, é representado graficamente


pelo deslocamento da curva de demanda agregada. Isso vai nos levar exatamente para um outro
ponto que não é o de equilíbrio inicial, e estamos agora com uma demanda agregada que, para
uma dada a taxa de inflação, está associada a um nível de renda maior. Estamos observando
economia flutuando, o produto está maior do que o produto potencial, estamos num processo
de aquecimento da economia, numa fase de ascensão do ciclo econômico.
Passo 4
A partir do momento em que a renda começa a subir, temos um efeito sobre o lado
da oferta agregada, a macroeconomia não pode ser pensada apenas em termos de demanda
agregada. A demanda agregada se elevou, a renda da economia se elevou, mas a inflação não
vai ficar constante. Temos um impacto sobre a inflação. Como, qual e por onde? É isso que
temos de responder. A partir do momento em que as empresas começam a produzir mais bens
e serviços, já sabemos que do ponto de vista do processo produtivo, ou seja, do ponto de vista
da oferta agregada, as empresas só produzem mais bens e serviços quando contratam mais
trabalhadores.
Isso significa que neste processo, enquanto estamos caminhando para o ponto A - na
verdade, no mundo real, a economia não vai para o ponto A e depois as outras coisas acontecem.
A economia começa a caminhar para o ponto A e, ao mesmo tempo, o lado da oferta começa
a responder. Isso que é dinâmica macroeconômica. O lado da oferta começa a responder com
as empresas contratando mais trabalhadores para produzir mais bens e serviços e fazer face à
elevação líquida do produto, que surgiu com o aumento das exportações, a resposta do consumo,
a resposta da política monetária que já diminuiu um pouco essa expansão e a resposta do câmbio
que também contribuiu para diminuir um pouco essa expansão.

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Equilíbrio de curto prazo devido a choque positivo de demanda

Ao mesmo tempo, as empresas só conseguem produzir mais bens e serviços contra-


tando trabalhadores, o que significa que o emprego aumentou, o desemprego diminuiu, qual
o efeito disso sobre o poder de barganha dos trabalhadores e a negociação por salários nomi-
nais no mercado de trabalho? Os trabalhadores buscarão taxas de crescimento maiores para o
salário nominal, mas não porque a inflação esteja subindo, mas, sim, porque o emprego está
subindo e o desemprego caindo, ou seja o mercado de trabalho está muito aquecido. Então, os
trabalhadores conseguem barganhar por taxas maiores de crescimento do seu salário nominal.
O que acontece a partir daí? As empresas repassarão o aumento dos seus custos de produção
para os preços e é assim que a taxa de crescimento maior dos salários produz uma taxa maior de
variação dos preços na economia, ou seja, uma maior taxa de inflação, é como se estivéssemos
caminhando para um novo Ponto de Equilíbrio de curto prazo, representado no gráfico por E1 ,
em que, enquanto o produto sobe a inflação também começa a subir. Mas como é que é o pro-
duto diminui ainda mais em relação ao ponto A? Por que no equilíbrio de curto prazo estamos
com um produto intermediário entre o original e o ponto A? O que produz essa contração, em
relação ao efeito expansionista inicial do choque?
Passo 5
O que vai produzir essa contração sobre o efeito expansionista inicial do choque agora,
é exatamente o efeito reforçado de política monetária em função do aumento da taxa de inflação.
Quando a taxa de inflação sobre, o BC responde com mais ênfase, porque ele está comprome-
tido com a manutenção da taxa de inflação, ele responde fazendo política monetária restritiva,
vendendo títulos, tirando moeda de circulação, produzindo uma elevação na taxa de juros básica
da economia, investimento e consumo caem, produzindo uma elevação de preços que reforça
o desejo de maiores salários nominais para os trabalhadores no mercado de trabalho. Agora
A NÁLISE M ACROECONÔMICA C OMPLETA 3

temos dois mecanismos pressionando salários para cima: um é a taxa de desemprego, que ainda
que ela não seja tão menor quanto ela seria no ponto A, ela ainda será menor do que ela estava
no ponto E0 , o desemprego continua menor no equilíbrio de curto prazo, o mercado de trabalho
continua mais pressionado, ao mesmo tempo observou-se um crescimento dos preços domésti-
cos, o que, por enquanto, ainda não produziu um efeito sobre os salários nominais, mas essa é
a nossa próxima etapa de desenvolvimento da estrutura lógica.
Então, no ponto de equilíbrio de curto prazo, observamos que o produto está acima do
potencial, o desemprego está menor que o desemprego natural e a taxa de inflação observada tá
acima da taxa de inflação anterior que, supostamente, era a taxa de inflação que o governo tinha
como meta de inflação, afinal se E0 era um equilíbrio de médio prazo, supostamente a inflação
estava equilibrada em torno da meta, que é exatamente a estrutura lógica da âncora nominal no
regime de metas de inflação. Agora temos mais produto na economia, portanto mais emprego,
menos desemprego e mais inflação.
Estabilização endógena no médio prazo

Prof.a Dr.a Roseli Silva

Objetivos desta aula: Entender como o processo de revisão de expectativas, em


conjunto com respostas passivas do banco central, pode levar a economia a uma
situação de inflação maior no médio prazo.

O que vai acontecer a partir daí é o movimento de uma terceira via de impactos que
ainda não consideramos e que, obviamente, não é uma produção parcial dessa maneira no
mundo real, ou seja, esses ajustes acontecem de forma contemporânea e produzindo efeitos
simultâneos sobre a economia, é isso que produz a flutuação, porém neste momento, no ponto
de equilíbrio de curto prazo, ainda não levamos em conta o efeito da mudança das expectativas
de inflação sobre o produto e a inflação da economia.
Passo 6
Até este momento, observamos a inflação, de fato, subindo acompanhando o cresci-
mento do produto acima do potencial. Quando observamos esse movimento, as expectativas
de inflação estavam dadas e não dissemos nada sobre elas. Porém, isso também não é ver-
dade, porque as expectativas de inflação, uma vez que a inflação esteja subindo, os agentes irão
revisar suas expectativas para cima, num contexto de expectativas racionais. Significa que a
inflação está subindo, os trabalhadores esperam mais inflação; ao esperarem mais inflação, na-
turalmente, barganham por mais salários nominais e, com o mercado de trabalho aquecido, os
trabalhadores buscam salários nominais maiores.
Exatamente essa revisão de expectativas e a busca, no processo de barganha, por sa-
lários nominais maiores produzirão custos de produção de produção mais elevados, maiores
custos de produção levam as empresas monopolistas repassam esse aumento de custos para os
preços. Então, a inflação sobe, a expectativa de inflação sobe, e a inflação sobe de novo hoje.
Este é o efeito de expectativas racionais, quando esperamos que a inflação suba no futuro, ela já
começa a subir no momento presente. E é isso que estamos observando nessa estrutura simplifi-
cada de compreensão da oferta agregada da economia: quando a expectativa de inflação começa
a subir é como se a nossa curva de Oferta Agregada de curto prazo começasse a se deslocar para

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

Figura 1 – Estabilização endógena de médio prazo

cima, ou seja, a cada revisão de expectativa, temos salários nominais mais altos e preços mais
altos.
Passo 7
Quanto mais a inflação sobe, mais o BC reage com política monetária restritiva, quanto
mais ele reage com a política restritiva, maior a taxa de juros, menor o consumo, menor inves-
timento, mais apreciada a moeda doméstica, mais importação, menos e exportações, porque a
competitividade-preço afetará as decisões desses agentes. Essa sequência de impactos produ-
zindo uma redução do dispêndio doméstico. Conforme o dispêndio doméstico cai, as firmas
que estavam produzindo muito antes, têm seus estoques indesejados aumentados e começam a
revisar sua decisão de produção, ou seja, começam a produzir menos. Conforme elas produzem
menos, ela se desempregam os seus trabalhadores, o desemprego aumenta, o emprego cai e eco-
nomia começa a ter um produto menor. É neste processo de ajuste que a economia vai para uma
situação final, depois de tudo ter se ajustado, inclusive as expectativas dos agentes, ela vai para
uma situação final em que o nível de produção é exatamente o mesmo que o original, o nível de
emprego e de desemprego é exatamente o mesmo que original, porém a taxa de inflação maior.
O que significa, então, que um choque de demanda que produz uma flutuação na eco-
nomia pode levar economia, no médio prazo, a ter mais inflação do que ela tem hoje, porém
A NÁLISE M ACROECONÔMICA C OMPLETA 3

sem nenhum ganho do ponto de vista real, sem nenhum ganho do ponto de vista do emprego, do
desemprego, do produto potencial da economia, sob as suposições simplificadoras que estamos
fazendo aqui.
Será que essa é uma situação interessante do ponto de vista do funcionamento de um
regime de metas de inflação?
Atuação ativa do Banco Central

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Objetivos desta aula: Entender como a resposta ativa do BC pode contribuir para
minimizar as flutuações, tanto da inflação quanto do produto.

Qual é o comprometimento de um governo, via seu banco central, com a gestão da


política monetária? Não é exatamente manter a estabilidade da inflação no longo prazo? Então,
este equilíbrio de médio prazo final expressa a taxa de inflação maior do que inicialmente, antes
do choque positivo de demanda agregada.
Isso significa que, se a situação se concretiza nesse sentido, de a economia ter o seu
produto mais ou menos próximo do que ele era anteriormente, certo emprego e desemprego
também na mesma circunstância, porém com uma taxa de inflação mais alta, isso significa que
o governo, pelo lado da política monetária, não cumpriu seu compromisso com a estabilidade
de preços. Portanto, esse governo vai perder credibilidade, e pode tomar um das duas decisões:

• ou ele eleva a meta de inflação e faz a meta de inflação convergir para nova taxa de
inflação, que será alcançada depois de todos os ajustes realizados pelos agentes na eco-
nomia, o que também não é muito bom, porque mudar a meta para cima em resposta a
um choque de demanda agregada coloca em risco a credibilidade da política monetária, o
compromisso da autoridade com a estabilidade de preços. O que significa dizer os agen-
tes podem antecipar que, toda vez que houver um choque de demanda positivo, o banco
central elevará a meta de inflação, e a macroeconomia perde sua âncora nominal;

• ou o BC responde ativamente ao choque de demanda, já que as respostas endógenas não


foram suficientes para manter a estabilidade da inflação.

Vamos entender melhor a resposta ativa: responder ativamente significa não só res-
ponder endogenamente, de acordo com a Regra de Taylor, ao comportamento da flutuação do
momento presente, mas antecipar que esse caminho levaria a inflação mais elevada no futuro e
responder a ela, hoje, com um choque de política monetária. Essa resposta ativa, talvez, pudesse

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I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 2

ter sido mais interessante enquanto esse processo de ajustes estava acontecendo, pois poderia
tornar mais curto o processo de ajuste, ou, ainda, fazer a flutuação macroeconômica demorar
menos, e, mais importante fazer com que a inflação no final desse processo esteja de volta para
meta de inflação. Esse é um aspecto extremamente relevante da estrutura de um regime mone-
tário de metas de inflação, ou seja, há um compromisso com a manutenção da meta. Portanto
na presença de um choque positivo de demanda o BC, deve reagir ativamente e não só passiva-
mente, ou seja, antecipando que a taxa de inflação, no futuro, será maior que a meta, caso ele
aja apenas em função daquilo que tá acontecendo com o produto e daquilo que tá acontecendo
com a inflação, endogenamente. Se ele não agir ativamente, estará colocando em risco o seu
compromisso com a meta de inflação, portanto, a sua credibilidade.

Figura 1 – Atuação ativa do BC frente ao choque positivo de demanda

Então, isso significa que, no contexto de um choque de demanda positivo, é importante


que o BC aja ativamente. Ao longo de todo esse processo, observamos o BC elevando a taxa de
juros em pequenos movimentos, que correspondiam apenas a resposta endógena da taxa de juros
à inflação e ao produto. Se agisse de forma mais ativa, se ele produzisse uma maior elevação
na taxa de juros, qual seria a consequência? A consequência seria contrabalancear o choque
positivo de demanda, ou seja, seria fazer com que a curva de demanda voltasse paulatinamente
A NÁLISE M ACROECONÔMICA C OMPLETA 3

ao ponto original, em lugar de esperar que a curva de oferta levasse a economia para uma taxa de
inflação mais alta, por meio do ajuste das expectativas. Antecipando esse efeito, o BC deveria
compensar um choque positivo de demanda, com uma política monetária restritiva mais efetiva
do que simplesmente responder ao gap do produto como ele fez, na nossa lógica inicial.
Então, esperaríamos que o BC comprometido com a estabilidade de preços, a partir
do momento em que o choque de demanda começasse a produzir a elevação da renda, uma
elevação do emprego, uma queda no desemprego e uma potencial pressão sobre a inflação, via
expectativas, que ele já subisse a taxa de juros mais fortemente no momento presente. No en-
tanto, sem produzir uma ruptura no comportamento da taxa de juros, mas produzindo uma ação,
ao longo de alguns ciclos de reuniões do comitê de política monetária, de elevação paulatina-
mente da taxa de juros, para tentar antecipar esse retorno da economia para o pleno emprego
com o mesmo nível de taxa de inflação.
Quando o BC responde ativamente ao choque de demanda, ele também produz um
efeito sobre as expectativas de inflação dos agentes, ou seja, os agentes estão observando o
BC realmente mostrando o comprometimento com a estabilidade da inflação e, portanto, a
expectativa dos agentes é a de que a inflação seja igual à meta, daqui há 2 ou 3 anos. Essa
ação mais ativa, contrabalanceia o efeito positivo do choque inicial de demanda e faz com que
as expectativas se ajustem para baixo. Ou seja, os agentes revisando, ainda que a economia
esteja pressionada do ponto de vista da produção, do emprego, a resposta do BC faz com que
os agentes tenham expectativas de que a inflação volte para meta e não o contrário.
A reação do BC de forma ativa, nessa circunstância de um choque de demanda positivo,
produz um ajuste mais rápido da economia em relação ao produto potencial, ou seja, menos
tempo de flutuação do produto e, mais importante, uma flutuação da inflação, que faz com que
ela convirja para meta de inflação e não contrário, uma flutuação que faz com que ela vá para
um patamar superior, o que coloca em risco a âncora nominal da estrutura da macroeconomia.
A ação ativa do BC tem esse efeito de minimizar tanto a situação do produto, quanto a flutuação
da inflação e garante que, ao final do processo de ajuste, a inflação esteja estável. Exatamente
isso que se espera que o BC faça.
Observe que também é possível entender uma ação conjunta entre a política monetária
e a política fiscal. Estamos enfatizando a política monetária, mas se estivéssemos no contexto
de política fiscal, em que o governo tem um compromisso com a estabilidade da relação dívida-
pib ao longo do tempo, ou seja, ele tem um compromisso com a sua sustentabilidae fiscal,
observaríamos que, a partir do momento que o produto começa a crescer e arrecadação, acom-
panhando o produto, também cresceria, teríamos uma diminuição do déficit do governo, em
decorrência de que a arrecadação esteja subindo e o gasto esteja constante. Porém, a autoridade
fiscal poderia contribuir ainda efetivamente reduzindo gastos. No momento em que a economia
está no ciclo de bonança, está crescendo mais do que o seu potencial de longo prazo, a receita
da arrecadação está crescendo, porque ela depende também do comportamento do produto, da
I NTRODUÇÃO À A NÁLISE M ACROECONÔMICA 4

renda. Com arrecadação crescente, seria um momento de produzir ainda maior poupança do
governo, diminuindo seus gastos, fazendo também uma política fiscal restritiva, ao reforçar o
efeito restritivo da política monetária, a ação conjunta e coordenada de política fiscal e política
monetária produziria um efeito mais eficaz de minimização de flutuação economia.
Estamos exemplificando uma situação em que o ajuste do ciclo econômico não se dá
apenas pela gestão da política monetária, mas em coordenação com a gestão da política fiscal.
Em uma situação em que a economia está em alta no ciclo, se esperaria, se o governo tivesse uma
estrutura fiscal condizente com a sustentabilidade, que, ainda que a receita estivesse crescendo,
que os gastos estivessem caindo, e produzindo um superávit como proporção do PIB maior,
propiciando uma atuação anticíclica de política fiscal. Por simetria, do lado oposto do ciclo,
quando a economia estivesse em baixa, poderíamos observar o governo gastando mais do que
arrecadando e produzindo déficits, que foi a nossa discussão anterior sobre regime fiscal.
Assim, o governo produziria superávit no momento de ascensão do ciclo e déficits no
momento de recessão, momento de queda da atividade econômica, e com isso ele, intercalando
superávits e déficits ao longo do tempo, ele garantiria a sua sustentabilidade fiscal. Se isso
acontecesse, se houvesse essa coordenação de política econômica entre a política monetária e
a política fiscal, o efeito sobre a taxa de juros poderia ser menor, ou seja, o BC poderia elevar
menos a taxa de juros, a economia flutuaria menos, ou seja, teria um ciclo bem mais suave. Esta
ideia de cooperação entre o lado fiscal e o lado monetário é extremamente importante e, dentro
dessa estrutura lógica simplificada, que estamos apresentando, ela teria um benefício de contri-
buir para que a atuação do governo na economia minimizasse a flutuação da macroeconomia.
Chegamos ao fim do nosso curso! Como é um curso introdutório e já tivemos de
lidar com temas, conceitos e teorias bastante complexos, deixo um desafio: que vocês sigam os
mesmos passos que desenhamos aqui, para o choque de demanda positivo, para analisarem os
efeitos sobre as flutuações e as respostas esperadas de política monetária e fiscal nos seguintes
casos:

• Um choque de demanda positivo;

• Um choque de oferta agregado temporário, ou seja, que só afeta a produção no curto


prazo, como uma quebra de safra agrícola;

• Um choque de oferta agregada permanente, que afeta o produto potencial, como por
exemplo o efeito de uma elevação da produtividade do capital por meio de uma inovação
de processo importante.

Agradeço a todos que chegaram até aqui, pela paciência, pela dedicação e espero,
sinceramente, que tenham se divertido aprendendo, tanto quanto eu, ensinando! Críticas e
sugestões, sempre bem-vindas! Grande abraço!

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