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NOÇÕES GERAIS DE DIREITO E FORMAÇÃO HUMANÍSTICA

A) SOCIOLOGIA DO DIREITO

1. A pré-sociologia do direito: A compreensão social


dos gregos; Aristóteles; os medievais; absolutismo;
iluminismo; contratualismo.

(i) Compreensão Social dos Gregos

Por pre-sociologia entende-se os estudos anteriores a Comte.

Os gregos tinham um pensamento diferente daquele que vigora na modernidade. Eles


estão inseridos em um contexto anterior ao capitalismo, numa sociedade escravocrata,
numa sociedade que primava pela democracia e pelos debates entre homens livres.

Por conseguinte, os gregos partem da sociedade para o indivíduo, ao contrário da visão


social dos modernos, que é do indivíduo para sociedade (perspectiva individualista).

Platão explica a sociedade a partir dos fenômenos sociais. A sociedade é medida por ela
mesma. Não há homem justo numa sociedade injusta, de modo que se a sociedade for
injusta, todos os membros que a compõe também o serão (vínculo indissolúvel entre
sociedade e indivíduos). É uma perspectiva molecular, e não atomizada como a dos
modernos, que faz uma separação entre indivíduo e sociedade. Na sociedade platônica,
todos devem ser responsabilizar por todos.
Platão afirma que o mais sábio deve governar, e por isso é criticado pelos modernos por
ser autoritário, determinista. De qualquer modo, o ponto de destaque da sua sociologia é
que deve ser dado primazia ao todo em relação à parte.

Aristóteles também compartilha dessa visão de primazia da sociedade sobre o


indivíduo. Ele desenvolve reflexões a respeito da justiça social, ressaltando que a
injustiça se revela na carência e no excesso na distribuição dos bens sociais. Os homens
são animais políticos, e necessariamente vivem em sociedade, porque isso é de sua
natureza (o que é bem distinto da concepção da teoria do contrato social desenvolvida
no capitalismo moderno).
(ii) Os medievais

Ao final da Idade Antiga entrou em cena uma nova explicação do mundo, a do


cristianismo. Surge a ideia de que o mundo é governado pela vontade de Deus. Os
governantes detém o poder pela vontade divina. Assim, cortou-se os laços que
vinculavam a sociedade às ações humanas (como existia em Platão e Aristóteles), o que
empobreceu a sociologia.

A sociologia medieval é profundamente metafísica, afastada dos vínculos reais da


sociedade.

Santo Agostinho trabalha com uma distinção entre o mundo de Deus (céu) e o mundo
dos homens (terra). A Terra e a vida social são eivadas de corrupção, oriundas do
pecado original (Adão e Eva), de modo que não se pode esperar plenitude de virtudes ou
de justiça na sociedade, pois os homens são pecadores. Nesse ponto, Agostinho já
indica uma virada, pois a sociedade será analisada a partir dos atributos dos homens
pecadores (foco na característica individual).

Tomas de Aquino resgatou uma leitura aristotélica reincorporando elementos que


expliquem a vida social a partir da ação humana. Isso porque o homem não se salvaria
apenas pela fé (como ocorria em Agostinho), mas também pelas obras, pelo agir justo
na sociedade humana.

(iii) Absolutismo, Iluminismo e Contratualismo

Com o Renascimento, sobretudo após a Reforma Protestante e a Contra-Reforma, a


análise sociológica continuou a ser metafísica (para além da física, para além da
realidade), tendo apenas havido uma alteração do paradigma da teologia para o
paradigma da razão. Mudança da sociologia teológica para a sociologia racionalista.

Absolutismo
Hobbes, em “O Leviatã”, reflete sobre o Estado, concluindo que ele seria fundamental
para apaziguar os conflitos entre os homens que seriam maus por natureza (o homem é
o lobo do homem). O Estado teria um Poder Absoluto nas mãos do soberano para
garantir a segurança dos indivíduos, que renunciaram, no pacto social, a parcela de sua
liberdade. Note-se que a ideia de Estado de Natureza é bem distinta do pensamento
aristotélico, pois no estado de natureza de Hobbes os homens viveriam de forma
isolada, o que gerava muitos riscos, até que concordam em se reunir e formar uma
sociedade através do contrato social. A sociedade, assim, seria artificial, criada após o
homem. Já para Aristóteles, o homem seria um animal social, que já nasce no seio da
sociedade e dela depende para subsistir.
O contrato social é uma ficção para explicar a sociedade.
Antes, o Estado Absolutista tinha fundamento no poder divino, mas a teoria do contrato
social lhe dá substrato racional.

Iluminismo
Os burgueses, que antes apoiaram o absolutismo como uma forma de acabar com os
problemas feudais, passaram a perceber que a sua manutenção não mais era
interessante, pois o Estado Absolutista conferia privilégio à nobreza e ao clero. O
Absolutismo ainda era fundado na teologia, pois o monarca era considerado o
mandatário de Deus.
Os iluministas pregam a superação da teologia pela razão. Mas essa razão não é prática,
mas sim metafísica, pois seria individualista e eterna.

Contratualismo
O contratualismo de Hobbes justifica o poder absolutista, já que pelo contrato social os
homens lhe outorgaram poderes para que imponha a ordem e acabe a guerra de todos
contra todos que vigia no estado de natureza.
O contratualismo de Locke (destaque para a propriedade privada) e Kant têm nítido viés
capitalista e era voltado para acabar com o Absolutismo, pois neste modelo o Estado já
não respeitava nem garantia os interesses da burguesia.
O contratualismo de Rousseau já continha remorsos, de modo que é elogiada por
Alysson Mascaro. Para Rousseau, a proposta de contrato social não é descritiva, mas
propositiva. O indivíduo deve encontrar no Estado a concretização do seu próprio
interesse e do interesse de todos. Essa ideia de vontade geral (interesse de todos) faz
com que o Estado não possa ser apropriado pelas vontades do soberano ou de uma
classe. Rousseau mais democrata que liberal, tanto que critica até mesmo o
individualismo da propriedade privada.
Em suma, o pensamento burguês moderno, iluminista, não consegue escapar do
caminho metafísico da análise da sociedade.

2. A. Comte e E. Durkheim.

São os fundadores da sociologia com a nomenclatura que atualmente conhecemos.


Mas, se for levada em consideração a sociologia em quanto acepção que leva em conta a
realidade como grande elemento da compreensão social, a própria filosofia de Hegel já
trazia essa ideia (Hegel deixou de separar a razão da realidade).

Auguste Comte

Comte rompeu definitivamente com as crenças religiosas e as abstratas ideias


iluministas que alimentavam a pré-sociologia, enquanto análise metafísica.

Comte está inserido na primeira metade do século XIX, no apogeu da Revolução


Industrial.

Abominando as explicações da sociedade que não partiam da própria realidade social,


Comte propõe que se reconte a história a partir de “três estados”, os quais seriam etapas
progressivas do conhecimento humano: “estado teológico; estado metafísico e estado
positivo”.

Quanto mais primitivo o pensamento, mais ligado a teologia ele estava. Quanto mais
avançado, mais estaria incorporado à ciência, aos dados da realidade.

No estado teológico o homem busca compreender o mundo a partir de divindades e


espíritos. Conhecimento simplório, com respostas absolutas à angústias humanas. Nesse
estado teológico, primeiro o homem explicava o mundo com os fenômenos
incompreensíveis da natureza (cosmos – fase fetichista). Num segundo momento, cria-
se a ideia de deuses e espíritos (fase politeísta). Na última fase, chega-se ao moniteísmo.

Depois do estado teológico, vem o metafísico. Abstrai-se aspectos sobrenaturais para a


explicação da sociedade. Passa-se a se considerar que existem forças naturais e leis
constantes que organizam e regem o mundo e sociedade, havendo uma racionalidade
abstrata. Note-se que a teoria do contrato social é pautada nessa racionalidade abstrata,
não sendo apta a uma verificação empírica.

Finalmente, se chega ao estado positivista. Superando-se as crenças da etapa teológica e


a racionalidade abstrata da fase metafísica, passa a ser adotada uma compreensão
científica do mundo, diretamente a partir da observação dos fatos. Ideia empirista,
factual, científica.

Comte entende que a sociologia foi a ciência que nasceu por último e é a mais
importante das ciências, pois lida com o todo, enquanto as demais fazem recortes
específicos.

Comte trata de duas partes importantes da sociologia, uma estática e outra dinâmica. A
estática observa fenômenos invariáveis, constantes de todos os grupos sociais, como a
família e a religião. A dinâmica trata da evolução das sociedades, observando suas
alterações. Da estática vem o conhecimento da ordem. Da dinâmica viria o progresso. O
lema “ordem e progresso”, assim, encerra o fundamental do pensamento de Comte
sobre a sociologia.

O positivismo de Comte foi, assim, um divisor de águas entre a pré-sociologia (pautada


em fatores metafísicos, como os fenômenos naturais, a religião ou a razão abstrata) e a
sociologia propriamente dita.

Emile Durkheim

Durkheim representou o apogeu da sociologia enquanto ciência autônoma, com


métodos e princípios que regem as próprias ciências naturais.

Para Durkheim, com a inspiração das ideias de Comte, a sociologia deve ser pensada a
partir da própria sociedade.

Durkheim define um método sociológico (observação, comparação, experimentação,


quantificação estatística).
O objeto da sociologia são os fatos sociais. A análise do fato social deve ser objetiva
(positivismo) e não valorativa. O fato social deve ser tratado como “coisa”. O fato social
não é algo isolado, mas um fato social deriva de outro, em relação de cadela causal. Um
fato social é explicado por outro fato social, e assim por diante. Os fatos sociais
poderiam ser analisados de forma empírica e estatística. Para exemplificar sua teoria,
Durkheim fez a análise do fato social suicídio, refutando, de maneira objetiva e
estatística, o senso comum de que ele estaria relacionado a doenças mentais.
Análise do fato social e não do indivíduo

Durkheim buscava entender, em especial, as causas pelas quais ocorria a coesão social,
investigando as causas da solidariedade, para explicar a estabilidade social (perspectiva
do consenso, na coesão, ao contrário da perspectiva adotada por Weber e Marx, que
focavam na dominação social, no conflito).

Aula do Mege sobre Durkheim:


Livro: Sociologia e Filosofia

A primeira questão colocada por DURKHEIM é que a Sociologia não está presa apenas
ao factual, mas também é capaz de estudar valores, ligados à moral social, captando a
objetividade de sentido dos valores que coordenam a sociedade.

DURKHEIM combate os filósofos metafísicos, que trabalham com a ideia de uma


moral absoluta, transcendental, como consta do pensamento de Kant (“a moral é apenas
um dever”). A moral é mais do que um dever, sendo também um desejo social. Há
uma desejabilidade para que a moral seja um valor social. A moral é um dever e um
bem desejável para DURKHEIM.

DURKHEIM também combate os psicólogos e sociólogos subjetivistas, que tentam


defender a ideia de que os indivíduos são seres isolados e que criam para si próprios
valores particulares. DURKHEIM diz que não obstante os indivíduos possam ter
uma moral subjetiva, esta, em grande parte, é determinada pela moral coletiva.
Para DURKHEIM, moral subjetiva só é verificada quando o sujeito age de modo
imoral, ou seja, quando atua contra a moral objetiva, da sociedade.

DURKHEIM também combate a psicanálise (psicólogos que defendem as


representações sociais inconscientes). Para DURKHEIM, é a consciência do homem
que capta as representações sociais. Essa consciência é coletiva, que é mais do que o
somatório das consciências individuais.

DURKHEIM afiram que a vida social possui valores e moral objetivas. A moral
objetiva é formada por representações coletivas, que transcendem a simples soma de
representações individuais. A moral objetiva é referência comum para todos os
indivíduos, mas estes mantém algum grau de moral subjetiva. O grande determinador de
comportamentos sociais é a moral coletiva.
A moral coletiva, além de um dever, é um desejo. A sociedade deseja a moralização,
pois ela contribui para o adequado modo de vida.
A sociologia deve captar o ideal valorativo da sociedade, a moral coletiva, da sociedade.
O sociológico pode ser capaz de descrever as representações sociais.
DURKHEIM é importante no sentido de revelar uma ideia de moral coletiva, que
influencia o indivíduo, e oferta a noção de representação social.

DURKHEIM entende que só há valor moral na coletividade. A coletividade faz


transcender os interesses subjetivos. A moral começa quando se verifica a vida em
grupo. Esse raciocínio é completamente distinto de Kant, no qual o indivíduo, em sua
própria razão, estabelece uma razão de pretensão universalista (juízo categórico),
havendo destaque para a moral subjetiva.

A vida individual e a vida coletiva são feitas de representações. O coletivo não é a mera
somatória da soma dos individuais. As representações coletivas são exteriores ás
consciências individuais. As formas de agir e pensar são obras do indivíduo, mas elas
emanam de uma força maior que é a vida coletiva. DURKHEIM propõe uma sociologia
do coletivo.

Para DURKHEIM a moralidade é objetiva, gerada pela coletividade. Todo indivíduo


tem um grau de imoralidade a partir do momento em que ele não se conforma com o
todo. A moralidade objetiva é um ponto comum e impessoal para o julgamento das
ações, mesmo porque a moralidade subjetiva é quase sempre indeterminada.

A moral não é apenas um dever, mas também é um bem, um desejo social. Para
DURKHEIM o bem e o dever são as características de todo ato moral. Devemos
obedecer as regras morais porque ela nos ligam a fins que acreditamos desejáveis e
bons. A sociedade transcende ao indivíduo, sendo uma autoridade moral, que
impõe que os indivíduos se curvem e respeitem as ordens prescritas pela sociedade.

A moral objetiva consiste num conjunto de regras que forma a moral do grupo. A
moral subjetiva é como cada indivíduo capta a moral do grupo para si. A
individualidade aparece quando o sujeito é imoral, distinguindo-se da moral do
grupo.

O valor pode ser uma realidade. DURKHEIM revive uma tradição de que os valores
seriam uma realidade porque presentes no cotidiano. Podem não ser objetos materiais,
mas são objetos espirituais, ideias, que uma vez captados nas representações socais,
podem ser passíveis de comunicação e conhecimento.

A conclusão é que a sociologia positiva, para DURKHEIM, diz que não é apenas o
empírico que é passível de leitura sociológica. A sociologia pode se abrir aos estudos
da moralidade, dos valores, ideias espirituais. É possível uma ciência dos valores
sociais (ex: institutos de pesquisa eleitoral). Leitura das representações sociais.

A moralidade coletiva (objetiva, comum) é referência para a moralidade individual


(subjetiva), sendo que esta somente aparece quando o sujeito representa em
desconformidade com a moral coletiva. A verdadeira moral é a moral coletiva. A
moral é um dever, mas também é um desejo (moral enquanto BEM + DEVER).
Cabe à sociologia positiva demonstrar cientificamente que essa moralidade
objetiva existe dentro da coletividade. A vida em sociedade tem valores coletivos,
que compõem a moral coletiva, a moral coletiva cria representações sociais
coletivas, as representações sociais forja a moral dos indivíduos, e a moral
subjetiva se conforma à moral coletiva.

Obs: Princípio da rebelião: O que ocorre é a oposição à coletividade por parte da


própria coletividade, que se torna mais consciente de si mesma.

3. Max Weber.

Livro Ciência e Política, duas vocações.


Weber entende que os cientistas (grupo do qual os sociólogos fazem parte) estudam o
“ser”, analisam a realidade, mas se abstém de tomar partido da própria realidade. Fazem
análises e explicações, mas não apontam caminhos, não fazem juízos de valor.

Os políticos é aquele que aponta caminho, propõe novos modelos, faz juízos de valor, e
trabalha no campo do “dever-ser”.

Weber pregava essa separação entre ciência e política, propondo uma reflexão pura da
ciência sociológica (tal como Kant que acreditava numa reflexão filosófica pura). Em
sentido contrário, Comte e Marx entendiam que o cientista da sociologia analisava a
realidade e já tomava partido sobre ela.

Weber também adota uma linha de raciocínio contrária aos demais sociólogos do seu
tempo. Ele diz que a sociologia não analisa a sociedade, mas sim a ação dos indivíduos
(individualismo metodológico weberiano). Parte do indivíduo (através das ações
individuais que se repetem) para chegar à sociedade, e não o contrário.

O método de análise weberiano em relação aos atos sociais individuais (objeto da


sociologia para Weber) está guiado na ideia de “tipos ideais”. Tipos ideais são a
caricatura do tipo individual, são o exagero de características dos tipos individuais.
Tomam-se, em geral, as características maiores que vão se repetindo nesse coletivo de
indivíduos. Note-se, portanto, que a sociologia de Weber é idelista, e não empirista. Um
dado não tem valor antes de ser idealizado

Durkheim trabalha com ação social; Weber com ação individual. A sociologia de Weber
é compreensiva, ao passo que a sociologia de Marx é propositiva, crítica,
revolucionária.

A sociologia Weberiana é, ao mesmo tempo, crítica e resignação. Weber reconhece que


a sociedade é plantada na dominação, e não na solidariedade. No entanto, não permite
que, cientificamente, o sociólogo denuncie o hoje e aponte como o transforma para um
novo amanhã. Nisso é bem difefente de Marx.

Aula do Mege sobre Werber:


Weber é um autor alemão que viveu na transição do século XIX para o século XX,
presenciando o ápice na crença da razão humana como fator de desenvolvimento, mas
também começando a perceber os limites desse racionalismo absoluto (tanto que Weber
presencia a I Guerra Mundial). No entanto, ainda assim Weber é um autor que acredita
na razão para a construção do bem estar.

Racionalidade, Burocracia (como fenômeno da modernidade – aparato de


funcionários organizados em instituições, criando ritos e procedimentos para organizar a
sociedade, dar previsibilidade e estabilidade – sendo um fator importante para organizar
o mundo. Mas a burocracia tem mazelas, pois quando excessiva engessa a vida,
prejudicando a dinamizidade dos debates) e Poder (dominação tradicional, carismática
e pela legalidade) são os pontos chave do pensamento de Weber.

Para Weber, a Racionalidade é uma equação dinâmica entre meios e fins. A ciência
traz clareza ao pensamento, para a escolha dos métodos que guiarão as escolhas. A
política escolhe os fins, colhendo da ciência os meios para se chegar a esses fins.
Toda ação humana pressupõe escolhas, com metas e valores. A ciência fornece recursos
para verificar a eficiência entre os meios e os fins. A ação deve ser responsável, e as
consequências da ação, posteriormente, legitimam os meios. A ação política racional
deve se preocupar com as consequências (ética da responsabilidade).
Para Weber, as condições necessárias para o funcionamento do Estado Moderno estão
no equilíbrio entre o conhecimento científico e a ação deu ma política responsável. O
Estado moderno legitima o uso da força e da violência por meio da legalidade, da
democracia, de um aparato burocrático que cria ritos e procedimentos que estabilizam
as decisões.
Ciência como conhecimento objetivo. Não há objetividade pura (sempre haverá
escolhas subjetivas), mas o cientista pode se afastar da sua própria subjetividade na
escolha do método. Quanto mais fiel ao método, à observação, à ciência mais próximos
da objetividade estaremos.

Weber apresenta o político profissional, o Estado Burocrático, a racionalização do


mundo. Trata ainda da ética da convicção e da ética da responsabilidade.
Na ética da convicção o sujeito adota seus princípios e entende que se o mundo deve se
curvar às suas ideias, e se o mundo assim não o fizer, o mundo é que está errado. O
homem da ética da convicção está disposto a tudo para impor suas próprias convicções.

Na ética da responsabilidade, o sujeito busca o consenso entre as ideias e as


consequências. O sujeito pondera seus ideais com as consequências que o ato pode ter.

Weber e a significação da ciência: ciência como a construção de conhecimentos que


possam aclarar a adoção de meios adequados para a realização de fins. Ciencia como
um conhecimento objetivo, seguro. A ciência, contudo, não pode ter o controle da vida,
pois ela não valora, mas apenas auxilia na tomada das decisões.

Estado e Dominação
Weber distingue a dominação em tradicional (costume), carismática (herói) e legal. A
dominação legal é adotada no Estado Contemporaneo, do domínio da legalidade, da
burocracia.

A burocratização
A burocracia organiza a sociedade, mas traz consequências tanto boas quanto ruins. A
maioria das consequências são boas, pois a burocracia impessoaliza o exercício do
poder, impessoaliza a administração pública. A consequência ruim é que a
burocratização do Estado, levada às últimas cosnequencias, tira a dinâmica do viver, tira
a criatividade.

Ética da convicção, da responsabilidade e o homem da vocação política


O “homem autêntico” é aquele que apesar das suas convicções, ele as equilibra com as
consequências que dela podem advir. A vocação do homem que vive para a política
(político vocacionado) age com as suas próprias convicções, mas age também com
responsabilidade, pois se preocupa com as consequências dos seus atos.

Max Weber e a significação da ciência


A ciência é neutra em relação aos valores, ainda que isso não ocorra de maneira
absoluta, pois a escolha do método e do objeto não deixam de ser subjetivas.
Ciência não se faz com ideologia. A ciência precisa de práticas rigorosas, e uma
separação rigorosa entre juízo de fato (aquilo que é) e juízo de valor (aquilo que deve
ser). Todos os elementos subjetivos e valorativos devem ser afastados na análise
científica. O conhecimento criado apenas por valores pessoais, subjetivos, nada
contribui para se aclarar a realidade, mas, ao contrário, quase sempre a camuflam.
A ciência deve ser objetiva ao descrever o objeto e construir o conhecimento, e não
subjetiva, valorativa. Deve a ciência ter neutralidade axiológica. O conhecimento da
realidade (o que é) deve ser neutro, científico. Deve haver algum grau de veracidade no
conhecimento, para que, depois, ele sirva de base para as escolhas políticas (como deve
ser), estas dotadas de subjetividade.

Para chegar à neutralidade axiológica, Weber estrutura “tipos ideias”.


O poder caristmático, tradicional e legal são tipos ideias. Toda a dominação, na prática,
envolverá alguns aspectos de carisma, tradição e legal, nunca sendo pura.
Mas o tipo ideal é adequado para perceber e descrever a realidade. A realidade é sempre
mais complexa do que a ciência, mas as categorias científicas ajudam a descrevê-la. Os
tipos ideais permite a construção de indicadores para descrever a realidade a partir de
conceitos científicos, cognisciveis, objetivos.

A ciência, para Werber, é objetiva nos seus métodos, na descrição da realidade, na


clarificação de conhecimentos, sendo neutra axiologicamente. Sem uma ciência neutra
em relação ao valor não se consegue conhecer, de fato, a realidade, e, por isso, as
decisões politicas nela pautada são ruins. O cientista deve ter o desejo de neutralidade.

Ciência, Desenvolvimento da tecnologia e controle da vida

A Ciência oferta um ganho de clareza, indicando os meios necessários para o


atingimento de fins, pautando as escolhas que serão feitas pelos homens.
Há, porém, um paradoxo, pois a ciência não pode controlar a vida. A ética e a política
da responsabilidade é que deve controlar a vida, sendo que a ciência fica encarregada
apenas de fornecer o substrato (subsídios) para a tomada de decisões éticas e políticas
responsáveis.
O desenvolvimento científico deve passar por um filtro ético para que a vida seja
adequada. A ciência desenvolve instrumentos, disciplinas, clareza, mas ela não dá
sentido em si mesmo à vida. A ciência dá os meios e os métodos, mas a qualidade de
vida é decidida pelas escolhas valorativas das pessoas. Assim, a última palavra sobre o
controle da vida é das escolhas éticas e políticas dos indivíduos.
A ciência exige especialização. A ciência é a construção de um conhecimento objetivo,
racional, que auxilia no desenvolvimento. Mas a ciência não tem em suas mãos o
controle sobre o significado da vida.

Os fundamentos de legitimidade da dominação: dominação legal, tradicional e


carismática
A dominação tradicional é a do patriarcado (ex: Idade Média, tribos), onde os costumes,
o passado, o hábito. É regida pela ação tradicional.
A dominação caristmática é própria dos dons pessoais do governante (“pai dos pobres”,
herói). Ação afetiva e ação racional com relação aos valores.
O Estado Contemporâneo é aquele onde a dominação legal é a predominante. ação
racional com relação aos fins. Ela se funda no conjunto de regras racionais e jurídicas
que legitimam a aquisição e o exercício do poder. A legalidade funda-se na obediência
às obrigações decorrentes do ordenamento jurídico. Há uma cadeia de comando,
hierarquizada e burocratizada, representada pelo Estado, enquanto instituição que
monopoliza o exercício legítimo da força, assim como os instrumentos de gestão, os
recursos públicos, bens públicos, bens de uso comum do povo, etc. Para Kelsen, a
política se subordina ao Direito.

Os tipos de dominação acima elencados são “tipos ideais”, que, na prática, não se
verificam de forma pura. Ex: Chaves exercia dominação carismática (“herói
bolivariano”), mas também tinha aspectos de dominação tradicional (histórico
centralizados dos governos da américa latina) e dominação legal (segundo o Direito que
criava). Mas nos Estados Contemporâneo, o que prevalece é a dominação legal.

Weber adverte que a denominação legal, com base na burocracia, permite uma gestão
impessoal da qualidade de vida, aliada à ética da responsabilidade.

Weber fala que o Estado Moderno é um agrupamento funcional organizado segundo


ordens (burocracia), detentor do monopólio sobre o uso legítimo da força. Nesse Estado
é que surge a figura do político profissional, que tem benefícios e malefícios.
O político profissional que vive DA política, ou seja, extrai da política a sua
subsistência, o seu sustento, ele ficará comprometido pelos desejos subjetivos do
político, de modo que haverá perda de eficiência.
O político profissional deve ter alguma dependência econômica em relação ao Estado,
para que possa ter liberdade de escolha e não confundir os interesses particulares com o
interesse público. Esse político profissional, que vive PARA a política, é o ideal. Viver
para a política é politicar por ideal.

O homem político deve ter qualidades básicas: paixão (sem ela, nada é feito), senso de
responsabilidade (valoração das consequências) e senso de proporção (equilíbrio).

Estado Moderno e Burocratização

O Estado Contemporâneo monopoliza o exercício legítimo da força, por meios legais.


No contexto do Estado, surge a burocratização. A burocracia, na época de Weber, era
considerada fenômeno de eficiência, pois impessoaliza a gestão da máquina pública. A
burocracia está relacionada à dominação racional-legal. Domina-se por meio de normas,
regras, regulamentos, que estabelecem uma forma de gestão racional dos recursos para
se colher fins adequados. Corpo estável de funcionários públicos, o que contribui para a
precisão, disciplina, continuidade e objetividade da prestação de serviços públicos. A
burocracia cria previsibilidade, ritos, procedimentos, que organizam a gestão. Há uma
divisão hierárquica das funções, mecanismos de controle.
As consequências da burocratização podem ser boas e ruins. A burocratização é boa
porque evita a gestão carismática e tradicional da coisa pública, tornando-a mais
eficiente, transparente objetiva, previsível, impessoal e segura (segurança jurídica). No
entanto, há um aspecto ruim na burocratização, que o engessamento, a perda de
criatividade, o corporativismo (ideal de interesse do Estado em detrimento do interesse
das pessoas). Já os críticos do Estado Moderno dizem que os ritos são opressores
(Kafka).
Seve haver mecanismos de controle da burocracia, como audiências públicas, MP,
Tribunal de Contas, etc.
A política como vocação é que é capaz de colher da burocratização as coisas boas
(objetividade, impessoalidade, segurança jurídica), e evitar as consequências ruins
(força esmagadora do Estado contra os indivíduos, engessamento, corporativismo).

Ética da Convicção, Ética da Responsabilidade e Vocação Política


O homem autêntico, com vocação política, é aquele que tem ideologias (ética da
convicção), mas que as equilibra com as consequências que podem advir dos seus
posicionamentos (ética da responsabilidade). O homem autêntico age com
responsabilidade ao fazer valer seus princípios.
A ética da convicção não exclui a ética da responsabilidade e vice-versa.
A ética da convicção é calcada em valores. A ética da convicção mal instrumentalizada
dá origem ao indivíduo utópico, sonhador, como um bolchevique revolucionário,
disposto a tudo para fazer valer suas convicções (inclusive usar da violência extrema,
extermínio, etc). Na ética da convicção, o homem idealista atribui as consequências
negativas das suas ações ao mundo, e não a ele próprio.
O homem da ética da responsabilidade faz a valoração das consequências da ação que
pretende praticar. Ele relativiza suas convicções à luz das consequências. Preocupa-se
com os fins, que devem justificar os meios.
A ética da responsabilidade, para Werber, é a ética da política. Mas isso não exclui a
ética da convicção. O homem autêntico, com vocação política, deve ser capaz de
conviver com as duas éticas. O homem autêntico é aquele que tem vocação política,
equilibrando seus princípios e convicções com a valoração das consequências dos seus
atos.

O homem que vive PARA a política sabe que a sociedade deve subsidiar a atividade
política e partidária. Age com ética da responsabilidade, sem abandonar seus princípios,
equilibrando-as. Ele privilegia a burocratização para extrair as consequências boas,
evitando as ruins. A razão é um equilíbrio, uma vocação, um instrumento de tomada de
decisão. O Estado democrático, racionalizado, burocrático, pautado na dominação legal,
é o ideal segundo Weber.

4. Hegel e Marx.

Marx entende que não há a possibilidade de que um conhecimento a respeito da


sociedade seja isento, especulativo, apenas teórico. A ciência social não seria neutra e
imparcial, de modo que envolve uma tomada de posição.

Marx abandona por completo a concepção idealista da sociedade, refutando qualquer


aspecto metafísico. Incorpora o aspecto histórico para a compreensão das questões
sociais.
O pensamento de Marx é muito influenciado por Hegel, sobretudo nas primeiras obras
de Marx.

Hegel focava seus estudos na realidade. Lançou mão de um método inovador, a


dialética. Pela dialética, o indivíduo, na sua relação direta com a sociedade, por meio
histórico, analisa as contradições sociais. O Estado, para Hegel, era a encarnação
máxima da racionalidade do seu tempo. Marx compartilha o método desenvolvido por
Hegel, mas não suas conclusões.

O método dialético criado por Hegel busca antinomias, os opostos, a contradição, os


interesses contrapostos. É um método que faz suas análises a partir do CONFLITO. A
dialética revela as contradições da sociedade, denunciando os conflitos sociais que a
movem e que a formam.

As posições antagônicas (tese e antítese) analisadas no método dialético devem ser as


grandes questões estruturais da sociedade, e a contradição deve ser tão grande a ponto
de não ser possível uma solução negocial (meio-termo), mas apenas se resolvem com a
superação dos seus próprios termos. Por exemplo, na relação entre escravo e senhor, não
é possível obter um acordo de que alguém passe a ser apenas “meio-escravo”. Ou a
escravidão é mantida ou ela é superada. O conflito é mantido até que tese e antítese
chegam a uma síntese, em que elas são superadas dando lugar a uma nova estrutura. No
caso da relação escravo e senhor, o conflito acabou quando surgiu, como síntese, o
feudalismo, o que inaugurou outra dialética, entre o senhor feudal e o servo, e assim por
diante.

Marx entende que no capitalismo existe o conflito entre o proletariado e os detentores


dos meios de produção. Dessa dialética, não pode resultar um “meio-termo” (ex:
direitos trabalhistas), pois isso ainda é uma forma de manter o conflito e a dominação
do modelo capitalista. A síntese é a superação total dessa contradição, e só ocorrerá
quando surgir algo novo, que seria a superação do capitalismo.

O método dialético de Hegel, usado por Marx, tem o grande mérito de deixar de buscar
compreender as contradições da sociedade de modo estático, como se estas fossem
eternas. Pelo contrário, as contradições são históricas, variáveis.
A diferença entre o pensamento de Marx e Hegel é a seguinte: ambos usam o método
dialético, mas Hegel buscava captar as contradições do pensamento, das ideias, para
depois entender como se davam na realidade. A dialética de Hegel era, assim, uma
dialética idealista. Já em Marx, a dialética é concreta, real, deve buscar as contradições
nas oposições efetivas da sociedade, e somente depois é que veremos que essas
oposições reais se desdobram no campo das ideais. A dialética marxista é material
(MATERIALISMO HISTÓRICO), e a de Hegel é idealista.

Marx afirma que Hegel está certo ao analisar a sociedade a partir da história, através do
método dialético, observando os conflitos. Mas Marx apontará que o erro de Hegel está
em afirmar que o conflito, primeiramente, aparece no nosso entendimento, na razão, e
só depois se transforma em realidade. Para Marx é o contrário, pois primeiro o conflito
surge na realidade e depois as pessoas o entendem racionalmente.

Marx diz que as grandes contradições sociais devem ser encontradas no nível produtivo
da sociedade, nas RELAÇÕES DE PRODUÇÃO.

Obs: Marx se aproxima de Weber ao trabalhar na perspectiva do conflito, das relações


de dominação. No entanto, as diferenças surgem a partir do momento em que Weber
não apresenta um caráter histórico e evolutivo dos conflitos, tal como faz Marx. Além
disso, Weber separa a ciência da política, de modo que faz a crítica social, mas se
resigna, sem propor soluções, ao passo que Marx indica o caminho a ser seguido, sugere
a revolução, afirmando que é impossível desenvolver uma ciência social neutra.
Enquanto Weber é “Crítica e Resignação”, Marx é “Crítica e Transformação”.

Sobre o Direito, Marx entende que este, como fenômeno estrutural específico da
sociedade, só se verifica na sociedade capitalista. Nos modos de produção pré-
capitalistas, o senhor dominava o escravo pelo uso da força; o senhor feudal dominava o
servo pela propriedade imutável da terra; já no capitalismo, a dominação é indireta e
ocorre através do Estado de Direito.

Se visualizarmos uma cena de um trabalhador arando um campo e mando de outrem,


como definir qual o sistema de produção está vigente. Deve-se investigar as causas
desse trabalho. No modelo escravagista, o mando ocorrida pela força bruta, e se o
escravo não cumprisse o comando seria castigado. No feudalismo, a dominação se dava
pela terra, pois o servo tinha de produzir para subsistir e pagar a parte que cabia ao
senhor. No capitalismo, essa relação de exploração se verifica a partir do contrato de
trabalho. O Direito, assim, estrutura a sociedade capitalista intermediando a exploração
de classes.

Além da função estrutural de intermediar a exploração capitalista, o Direito, segundo o


marxista Pachukanis, exerce um papel ideológico, já que dificulta a compreensão da real
estrutura social, pois trata das coisas em termos idealistas. O trabalhador e o burguês
são considerados “iguais” para fins de celebração do contrato de trabalho, mas, na
realidade, não estão em pé de igualdade. O Direito, assim, tem essa função suplementar
de servir de máscara ideológica ao capitalismo, tratando como formalmente iguais
aqueles que são desiguais.

O marxismo, assim, é a grande teoria crítica para a sociologia do Direito.

5. Habermas. Raymond Aron.

Habermas pode ser considerado um liberal progressista.


É um discípulo da segunda geração da Escola de Frankfurt. Numa primeira fase do seu
pensamento (Habermas jovem) está presente um pensamento mais crítico, alinhado à
tradição marxista-hegeliana. Na segunda fase (Habermas maduro), Habermas se
converte de marxista para liberal, e essa segunda fase suplantou a primeira.

A base do pensamento do Habermas maduro está na sua teoria do “agir comunicativo”,


que trabalha uma linha sociológica e filosófica do CONSENSO, da comunicação
racional, do entendimento.

A comunicação racional não é algo metafísico, que alcança a verdade. Os homens se


comunicam e alcançam entendimento comuns, consensos. Mas esses consensos não
necessariamente são verdadeiros (o que revela uma vaga lembrança da crítica marxista
de seu pensamento inicial). De todo modo, Habermas passou a adotar uma pragmática
da comunicação.

Pelo agir comunicativo, por meio do diálogo, estabelece-se um vínculo comunicacional


entre as pessoas, o que possibilita um entendimento comum. Cria-se, então, uma
racionalidade de origem comunicacional. Os conceitos, tal como a justiça, são
consensos construídos pela comunicação. Não são verdades metafísicas, mas consensos
sociais obtidos pela comunicação.

A comunicação deve ser o mais democrática possível, isenta de dominação, para que os
consensos sejam democráticos.

Habermas promoveu uma virada linguística em seu pensamento. Ao invés de refletir


sobre as relações de poder, passa a analisar as relações de comunicação.

A teoria do agir comunicativo, que aponta ao consenso racional, revela que Habermas
maduro resgata Kant, e se coloca contrário à “pos-modernidade”. A pos-moderinidade
apregoa que as sociedades e os grupos têm variadas racionalidades, distintas,
fragmentadas e dispersas, havendo vários ambientes de cultura praticamente autônomos.
Ao contrário do pós-modernismo, Habermas diz que é preciso apontar a uma sociedade
mundial o mais idealizada possível, racionalizável, sem ceder às lógicas de grupos
desconectados entre si. É preciso uma lógica universal, um direito universal, um
caminho, pois alguma razão haverá de recobrir a todos (uma lei válida para todos, uma
ação válida para todos, uma verdade comum). A pos-modernidade vem para acentuar a
existência de racionalidades distintas e incomunicáveis entre os sujeitos, mas Habemas
combate essa ideia procurando um consenso comunicativo racional.

Para Habermas, o Direito tem o condão de transformar o conflito entre partes em


consenso, através dos seus procedimentos. As normas produzidas pelo Estado são gerais
e impessoais, de modo que os procedimentos estabelecidos pelo Direito são
democráticos, garantindo uma possibilidade de agir comunicativo consensual.

Habermas aponta para um projeto político de “democracia radical”. Se houver uma


radicalização da democracia, os consensos serão cada vez mais possíveis.
Uma das formas de radicalizar a democracia, em Habermas, é transcender o nível
nacional e postular uma política consensual internacional. Daí o papel reservado às
grandes instituições internacionais, como a ONU, além dos papeis desempenhados pelas
ONGs internacionais.
No campo da sociologia do Direito, o tema de legitimação pelo procedimento marca o
pensamento de Luhmann e é utilizado por Habermas. Em Luhmann, a criação de leis,
sentenças, e todas as decisões jurídicas será considerada formalmente legítima e
socialmente lefítima se cumpridos os procedimentos institucionalmente estabelecidos
para essa criação. A legitimação decorre do procedimento. Há, assim, uma transposição
da lógica positivista para a sociologia do direito.
Habermas entende que ao estabelecermos procedimentos os mais universalizados
possíveis, todo o conflito que entrar por esse procedimento sairá legitimado, porque seu
potencial de consenso tornar-se-á maior. O procedimento democratiza e, portanto,
legitima. Cria-se um programa político, de legalidade como ferramenta da democracia
radical.
A crítica que se faz é que a legalidade não necessariamente gera legitimidade, sobretudo
nas sociedades que demandem transformação, onde a injustiça está institucionalizada e
é tornada jurídica.

Aulas Mege:

HABERMAS

Habermas escreve em 1992 um livro chamado “Entre Faticidade e Validade”, onde


trabalha sua filosofia do Direito. Entre o fato e validade, como se faz essa legitimação?
O Direito é algo que necessita de uma legitimação diante dos fatos, mas ao mesmo
tempo é uma ordem de validade. Numa tradição Hegeliana, Habermas percebe que o
Direito possui esse paradoxo, pois sua legitimidade depende da resolução dos
problemas factuais, mas, ao mesmo tempo, ele não pode ser fato social, por ser validade
normativa.

A teoria discursiva de Habermas não privilegia o direito formal, tampouco é uma teoria
de cunho material. Ela não se atém aos padrões estabelecidos, e propõe o que denomina
de “liberdade comunicativa”. O conteúdo, a regra de decisão, se legitima a posteriori,
depois que o procedimento cria as possibilidades de trocas de comunicações racionais
para o estabelecimento do direito que será aplicado.
Ex: as regras do edital devem ser rígido-flexíveis o suficiente para permitir que todo o
debate a priori que será realizado sobre o procedimento licitatório permite que se
construa um resultado de como a obra será feita, de maneira melhor do que se todos os
requisitos estivessem pré-estabelecidos no edital.
Assim, o resultado posterior, filtrado por uma ampla participação comunicacional de
todos os envolvidos torna a decisão mais legítima. Não existem seres clarividentes para,
a priori, definir o que deve ser feito, sobretudo numa sociedade complexa, em que os
valores são fluídos. O procedimento abre espaço para a participação comunicacional
(pluralista) e legitimadora da decisão e do posicionamento mais adequado. Trata-se da
teoria do discurso, segundo a qual cada um constrói seu discurso, participando do
procedimento democrático que legitima a tomada de decisão. A ética do diálogo
racional revela que Habermas defenda a existência de um valor procedimental.

Nesse paradigma, somente a liberdade comunicativa é a prescritora de condutas. A regra


da tomada de decisão, aquilo que vai prescrever condutas, é sempre tomada a posterior,
ou seja, após o procedimento de participação comunicacional. Não é possível decidir
nada a priori, sendo necessário permitir um diálogo para que se chegue à decisão mais
legítima, a posteriori, pois há sempre uma margem de negociação, de pluralização e de
argumentação.

Habermas adota como pressupostos:


a) Escola de Frankfurt
b) Critica Marxista à cultura de massas
c) Dialética
d) Linguística
e) Hermenêutica

Habermas é um dos últimos representantes da Escola de Frankfurt. Essa escola tinha


como preocupação os limites da crítica marxista à cultura de massas (capital,
liberalismo clássico, alienação), reconhecendo que as críticas marxistas são válidas, mas
a proposta de solução (com a definição do que seria adequado fazer, a priori, segundo o
pensamento de alguns líderes) não seria adequada, pois tenderia ao totalitarismo. A
Escola de Frankfurt, assim, procura manter uma crítica da sociedade e um busca da
liberdade da igualdade sem cair em totalitarismos marxistas.
Para tanto, Habermas vai buscar o paradigma da linguagem. Há uma dialética entre o
mundo inserido no mundo (inserido nas relações de cultura, de interesse, de trabalho, de
tradição, etc) e a crítica racional que deve ser feita ao mundo. O marco dessa
perspectiva é a linguagem. O homem é um ser linguístico, que constrói discursos. Esses
discursos devem ser racionais, procedimentais.

O diálogo entre seres iguais e racionais é capaz de estabelecer consensos democráticos.


O que garante a democracia no mundo contemporâneo são os Estados Constitucionais, o
Direito. O Direito, para Habermas, é o grande depositário da ética contemporânea. A
sociedade é extremamente plural, não havendo um valor que crie identidades. O Direito
cria essa identidade para a sociedade, estabelecendo que as decisões são procedimentais,
negociadas, acordadas, dentro de um espaço democrático. Profusão de procedimentos,
como audiências públicas, contraditório, etc. A priori os valores são negociáveis, desde
que não sejam levados ao extermínio.

A Democracia e Razão Procedimental de Habermas trabalha com quatro níveis de


evolução: indivíduo maduro cognitivamente e moralmente, uma sociedade madura
culturalmente e educacionalmente, um direito evoluído procedimentalmente e um
estado evoluído democraticamente. Indivíduo livre e evoluído educacional e
moralmente, sociedade livre e evoluída culturalmente, um Direito livre e evoluído
procedimentalmente e um Estado livre e oxigenado democraticamente.
Obs: Os críticos de Habermas dizem que seu texto é voltado para um pais europeu,
desenvolvido educacionalmente e economicamente. Portanto, a ideia de Habermas
talvez não seja um texto adequado para o Brasil, por exemplo.

As evoluções ocorrem nos seguintes passos:

- Psicologia cognitiva da moral: o amadurecimento cognitivo se dá com o


“descentramento” progressivo da visão de mundo. Na infância, o homem é egocêntrico
e sequer compreende as relações sociais. O homem maduro já não é mais ecogêntrico, já
tem uma visão de grupo, e legitima suas ações com base na lealdade ao grupo. O
homem procedimental (pronto para a Democracia Procedimental) já consegue se
perceber inserido em um todo. Constrói-se um indivíduo pos-convencional, capaz de
proferir discursos reflexivos dotados de impessoalidade (respeitando e sendo respeitado
pelo outro).

- Sociedade arcaica, avançada e moderna: a sociedade arcaica corresponde ao indivíduo


pré-convencional, guiado por um determinismo mitológico (religioso, etc). A sociedade
avançada (por exemplo, a do Direito Romano) é marcada pelo deslocamento da
mitologia para a tradição. A sociedade moderna, para Habermas, consiste num projeto a
ser realizado, no qual surge uma consciência convencional e universalista da moral e do
direito, um respeito a ideia do desenvolvimento autônomo dos indivíduos, a razão de
cada indivíduo autônomo é que propõe a solução dos problemas. Discursos racionais
neutros e impessoais, proferidos por indivíduos autônomos, capazes de pensar por si
próprios (ao invés de serem guiados pela mitologia ou tradição).

- Direito revelado, tradicional e moderno: Na sociedade arcaica, vigorava o direito


revelado (baseado numa ética mágica, editado por uma autoridade mitológica). O direito
tradicional é pautado numa ética da lei, vigora na sociedade avançada, composta por
indivíduos grupais, mas o direito se prende a valores metafísicos de validade
(obediência aos valores do líder, do pai de família, etc). O direito
moderno/contemporâneo é aquele procedimental. O direito poe no mundo moderno a
legitimidade, a legalidade, a neutralidade e a procedimentalidade. O Direito não se pode
retirar a sua legitimidade de valores metafísicos, pois tais valores não são
compreendidos em escala uniforme e universal. A legitimidade decorre dos
procedimentos dialógicos e comunicativos entre indivíduos livres. O Direito vai
contemplar alguns valores, formalizando-os, e eles devem guiar as decisões dos homens
livres e racionais (obs: na definição de Habermas, o neoconstitucionalismo seria m
direito tradicional, pois ainda preso em alguma escala a valores morais e éticos). O
direito não deve ser revelado por uma autoridade (sacerdote ou legislador clarividente),
mas deve ser participativo, comunicativo e procedimental.

- Estado de Direito, Estado Social de Direito e Estado Democrático de Direito.


O Estado de Direito é o estado liberal (legalismo negativo). O Estado Social é o Estado
prestacional, pautado no fornecimento de meios para a emancipação do indivíduo. O
Estado Democrático de Direito é aquele onde os indivíduos estão aptos a agir
comunicativamente, procedimentalmente e racionalmente para tomar as decisões mais
adequadas. O Direito garante autonomia aos indivíduos e procedimentos formalizados
para o exercício das racionalidades éticas. O Direito é um fato que se poe na sociedade
para que os indivíduos nele busquem os procedimentos para legitimar as decisões
racionais. Procedimento democrático de formação da vontade do Estado através da
soberania popular. A cada procedimento deve haver um discurso de justificação (“regra
u”). Não se obtém discursos genéricos, mas argumentos concretos para melhor definir
determinada situação, através da ética comunicativa, reflexiva, racional e pautada na
ética da alteridade. O Estado Democrático cria o Direito, o Direito se legitima pela sua
legalidade e impessoalidade, criando ritos procedimentais para a tomada decisão dentro
de uma sociedade moderna, de ética racional de indivíduos autônomos.

Esse é o pensamento de Habermas na teoria do discurso comunicativo aplicada ao


Direito (Livro Facticidade e Validade). A Constituição é o centro ético da sociedade,
e ali os direitos fundamentais se legitimam pela sua própria positividade, e devem
ganhar concretude por meios de decisões a posteriori tomadas através do procedimento
democrático de diálogo comunicativo entre indivíduos livres para a tomada de decisões.
A complexidade do mundo contemporâneo exige um procedimento aberto ao debate
comunicativo entre os indivíduos para a tomada de decisões a posteriori, não sendo
mais possível admitir como ideal uma definição prévia e clarividente das decisões sobre
o mundo.

RAYMOND ARON

Intelectual francês que viveu dos anos 30 aos anos 80 do século XX.

Ao lado de Weber, RAYMOND ARON faz uma contraposição ao pensamento marxista


no edital do TJSP.

RAYMOND ARON é um pensador liberal e democrático. É um pensador de centro-


direita, no sentido de ser um defensor da liberdade, da democracia, da economia de
mercado, crítico à violência revolucionária, ao conservadorismo da extrema direita
centralizadora do Poder, crítico do conservadorismo católico exagerado. É um defensor
do Estado liberal de direito. Para ele, o marxismo é quase uma religião, que cria ilusões,
além de ser mais uma política dos intelectuais do que do próprio proletariado.

Contra um pensamento absoluto, há que se escolher o preferível contra o detestável.


Não existem bem ou mal absolutos.

RAYMOND ARON entende que ser um liberal é ser um humilde, reconhecendo que a
vida é extremamente complicada, e que a única certeza que nos temos é que pela
liberdade podemos escolher os melhores caminhos possíveis para nossa vida.
O socialista já tem uma leitura pronta e acabada de mundo e, por isso, é um arrogante,
pois se acha detentor da verdade.

RAYMOND ARON é útil no concurso para contestar as ideologias absolutas, as


verdades prontas e acabadas. É um contraponto à visão exacerbada de marxismo de
ALYSSON MASCARO.

Ao colocar RAYMOND ARON no edital, o examinador estabelece três críticas:


- A ideia de que só os universitários intelectuais pensam e elegem o que deve ser feito,
acreditando-se detentores da verdade a priori;
- o conservadorismo absoluto, não aberto às mudanças dos valores operada na
modernidade;
- a extrema esquerda revolucionária.

Deve-se superar as ideologias absolutas em nome de uma inserção prática diante do


mundo, pontual, buscando o mais provável, factível, razoável. RAYMOND ARON
(crítico da revolução russa) faz parte de uma tradição francesa junto com Montesquieu
(separação de poderes) e Tocqueville (crítico da revolução francesa).

Em conclusão, RAYMOND ARON instrumentaliza o Direito, o Estado de Direito, a


Democracia, como um mecanismo de ação política humilde, modesta, com sabedoria
em nome do possível (reformas possíveis, pontuais), em busca de uma melhora de vida
possível. Há que se ter equilíbrio, fugindo-se de revolução de esquerda, ditatura da
direita conservadora. É um pensamento liberal-democrático crítico.

É um pensador que se contrapõe às ideologias.


No contexto do edital, pode-se falar que uma crítica marxista às mazelas do capitalismo,
sem cair desejo de uma violência revolucionária, de modo que as críticas são válidas,
mas a proposta marxista não é factível. Deve-se buscar, com humildade, reformas
democráticas no Direito para que ele permite a emancipação das pessoas.

6. Sociologia do direito crítica: Escola de Frankfurt.

A sociologia do direito contemporânea é composta de conservadores, como Luhmann e


Habermas, e críticos, como os membros da Escola de Frankfurt.
É a corrente marxista menos revolucionária e explosiva, o a leva a ser a menos rejeitada
pelo mundo universitário burguês. Trabalha com uma análise marxista mas que já
renunciou parcialmente à ideia de transformação do mundo.

Dentro da escola de Frankfurt, destacam-se Horckheimer, Theodor Adorno, Marcuse,


Walter Benjamin, Erich Fromm, Reich e Franz Neumann. Vai da década de 30 até 70.

O denominador comum da escola de Frankfurt é a tentativa de entender a sociedade por


um viés crítico, e não como ela se nos apresenta à primeira vista. O problema da
RAZÃO é central para esse entendimento crítico.

As pessoas em geral imaginam que a ordem existente, injusta, dominadora, exploradora,


é assim porque a humanidade ainda não usou as armas da razão para compreender esta
ordem e imediatamente denunciá-la. Quando as armas da razão fossem usadas, a
dominação seria denunciada e a sociedade então se transformaria. O senso comum
imagina que a sociedade é injusta porque lhe falta razão. Mas a Escoa de Frankfurt
revela justamente o contrário. A ordem social capitalista é construída a partir da razão.
O capitalismo impulsiona uma razão de dominação, fomenta a racionalidade para
dominar mais e melhor.

A Escola de Frankfurt defende que existe uma racionalidade intrínseca na sociedade


capitalista, que é a RAZÃO INSTRUMENTAL, que utiliza todas a estrutura de
engrenagens racionais para dominar a sociedade. Contra essa razão, deve-se levantar
uma RAZÃO CRÍTICA, que perceba para onde está indo essa razão instrumental e
saiba criticá-la.

Se no Iluminismo se apregoava a era da razão contra uma sociedade feudal baseada em


crenças irracionais, a Escola de Frankfurt agora diz que na era capitalista, a questão é
opor uma razão libertadora e crítica contra uma razão instrumental e dominadora. Que
razão é essa que destina recursos para mandar o homem à lua mas não consegue
alimentar todas as pessoas?
O Direito é um dos grandes artefatos da razão instrumental dominadora. O Direito
institucionaliza a dominação. A injustiça ocorre inclusive quando a lei é aplicada e
cumprida.

A razão instrumental envolve o método analítico. O homem sabe fazer robô, sabe fazer
bomba atômica, mas não sabe para quê. Sabe quantos pobres existem, quantos não têm
acesso à justiça, mas todo esse conhecimento não se levanta para a transformação.

A sociedade capitalista é estruturalmente doente. Ela vive do consumo, incentiva o


consumo, mas impede a maioria de consumir, pois não lhe dá condições para tanto. O
direito é um instrumento que mantém essa doença social, chancelando a possibilidade
de alguns terem o que o resto não tem.

A maioria dos pensadores da Escola de Frankfurt concluiu que o capitalismo chegou a


tal grau que a dominação instrumental já não poderia mais ser revolucionada (exceção a
cargo de Marcuse, que era radical e esperançoso).

Mas existem autores que guardam alguma relação com a Escola de Frankfurt, ainda que
distante, tendo viés marxista, mas são heterodoxos e não resignados, portando-se de
maneira crítica e revolucionária. Destacam-se Lukacs e Bloch.

Luckacs trabalha com as ideias de reificação e totalidade. Afirma que a sociedade


capitalista é reificada, ou seja, é coisificada, tornada um mero objeto (o homem não vale
pelo que ele é, mas por aquilo que ele tem). As coisas valem pelo que representam no
mercado, e não pelo que elas são. Não plantamos para comer, mas para vender. O
trabalhador é também uma mercadoria, pois vende sua força de trabalho. O pensamento
também é coisificado, com a perda de compreensão da sociedade de forma mais
profunda. A totalidade, por sua vez, impõe uma obrigação de enxergar o todo, não
compartindo os fatos sociais em eventos isolados ou subsistemas. Quando se
compartimentaliza o conhecimento (ex: direito positivo, desvinculado da política, da
moral, etc), fica mais difícil perceber as injustiças e adotar um comportamento crítico.

Bloch trabalha com a ideia de utopia, enquanto sonho. Ele defende que existe uma
utopia concreta, que seriam meios e alternativas de transformação social. A dominação
nunca é absoluta e completa. Sempre existe uma possibilidade de transformação. A
sociedade capitalista de regras, mas esse direito é da propriedade privada, do
afastamento dos indivíduos. O mundo só será justo quando esse direito for
transformado, tratando os homens como irmãos. O socialismo é a meta da
transformação e da revolução da sociedade.

Obs: ver também Escola de Frankfurt na parte de filosofia crítica.

7. Sociologia do direito brasileiro: Caio Prado Júnior e Raimundo Faoro.

O problema fundamental do Direito Brasileiro é o longo tempo de colônia de


exploração. O Brasil é uma nação periférica, de modo que não consegue exercer de
maneira plena a autonomia jurídica e política de um Estado Nacional. Além disso,
apresenta a herança de uma longa história de injustiças e explorações típicas de colônias
escravagistas.

No Brasil, há injustiças fora e dentro do Direito. Fora do Direito, ainda existe o


fenômeno do coronelismo. Há regiões em que a lei não fala, quem fala é o coronel.

Num primeiro momento, a sociologia do direito brasileiro apontou no sentido de que


haveria relações do tipo capitalista (estado de direito burguês, com a dominação legal
burocrática) em concomitância com relações do tipo feudal (coronelismo do interior).

Mas com o desenvolvimento da sociologia brasileira, com Caio Prado Junior, Raimundo
Faoro, Fernando Henrique Cardoso, Celso Furtado, entre outros, passou-se a perceber
que aquela explicação era rasa.

Caio Prado Jr diz que desde o início o Brasil foi colonizado a partir de uma orientação
capitalista. Portugal, que foi o primeiro Estado Nacional já no século XVI, instalou no
Brasil uma colônia escravagista para a exploração de minerais e vegetais. O Brasil não
passou por uma estrutura feudal. Mas se o Brasil foi estruturado no sistema capitalista,
porque o Direito tem essas fissuras? Porque o capitalismo brasileiro é periférico,
pautado na escravidão.
O Brasil não teve uma Revolução Industrial. No Brasil o trabalho foi explorado não a
troco de uma remuneração vil (como no caso da Europa da Revolução Industrial), mas a
troco de nada (escravidão). A relação, assim, era entre capitalista-escravo, o que torna
ainda maior a dicotomia.
O Brasil não vivenciou o modelo feudal, porque neste a produção era destinada ao
próprio feudo e o servo ficava com o excedente para sua subsistência. No Brasil não,
porque praticamente toda a produção era voltada ao mercado externo, à metrópole, e a
mão-de-obra não tinha remuneração, eram negros e índios escravizados.
Como o capitalismo que se instaurou desde o Brasil-Colonia vertia sua produção para o
exterior (até porque, em se tratando de mão de obra escrava, praticamente não havia
mercado interno de consumo), nosso pais desde o início esteve em relação de
dependência com o mercado externo. Mais uma herança do capitalismo periférico,
marcado pela super-exploração.

Além de periférico, o capitalismo instaurado no Brasil foi patrimonialista (Raimundo


Faoro). No patrimonialismo, o governante é um burguês, e além de proteger a
burguesia, age como burguês, acumulando propriedades e patrimônio.
No capitalismo liberal, o Estado ajuda a burguesia, mas, ao menos formalmente, simula
distância, transparecendo apenas editar as regras do jogo. No capitalismo
patrimonialista a relação entre Estado e Burguesia é mais profunda, eles são a mesma
coisa.
O “jeitinho brasileiro”, antes de ser uma forma popular de se furtar à lei, é uma forma
usual de as elites forjarem e moldarem as leis aos seus interesses particulares não-
universalizáveis. “Aos amigos tudo, aos inimigos a lei”.
No Brasil, havia Código Penal desde 1831 (os explorados precisavam ser disciplinados),
mas o Código Civil só veio em 1916 (pois não havia tanta necessidade de regular as
relações privadas).
As ordenações manuelinas, afonsinas e fillipinas tratavam muito mais das questões
relacionadas aos poderes e direitos do Estado do que as relações da vida privada. O
Estado teve direitos bem antes de a sociedade ter direitos civis.

O Brasil seguiu o modelo de capitalismo patrimonialista ao menos do período colonial


até 1930. Mesmo com a abolição da escravidão, a exclusão social permaneceu
gigantesca, bem como a dependência face ao mercado externo (exportação de recursos
naturais e produtos agrícolas). Na década de 30, Vargas concedeu direitos trabalhistas
ao povo, fomentando o mercado interno e tornando o capitalismo mais complexo. O
capitalismo passou a ser intervencionista, pois o Estado participava ativamente da
direção social, o qual perdura até a década de 80, quando a burguesia passa a reclamar
pela alta liberalização, com políticas neoliberais.

Aulas Mege:

SOCIOLOGIA BRASILEIRA
CAIO PRADO e RAIMUNDO FAORO

São pensadores brasileiros que instrumentalizam alguns conceitos:


- O Brasil está inserido num capitalismo tardio, o que gera consequências na formação
do Estado e da sociedade;
- Trata-se de um capitalismo periférico, pois a inserção do Brasil na economia mundial
é feito com alta dependência do capital internacional, não tendo um círculo de produção
própria, sendo muito dependente da balança comercial, um capitalismo dependente;
- Um capitalismo orientado e político (é uma apropriação do Estado por classes da
oligarquia rural e da burguesia dos grandes centros, como industriais, famílias
tradicionais, etc, que fazem com que o Estado sirvam aos seus interesses), quase um
pré-capitalismo;
- A origem no trabalho escravo da formação do Estado Brasileiro faz com que a força de
trabalho não ganhe o status de proletariado (força de trabalho qualificada e orientada da
qual o industrial depende). Ao contrário da ética protestante, em que o trabalho é a
inserção do homem diante do mundo e de Deus, numa sociedade escravocrata o trabalho
manual diminui o valor do indivíduo trabalhador.

Tudo isso é fruto do patrimonialismo Português, que usava do Brasil-Colonia


basicamente para retirar riquezas, arrecadar tributos. As relações privadas eram
relegadas basicamente aos usos e costumes dos donatários das capitanias hereditárias
(quase senhores feudais). Direito, assim, se estrutura apenas no Direito do Estado, não
se preocupando com as relações sociais e com as relações privadas. As ordenações
filipinas eram quase em sua integralidade formada por normas de arrecadação.

O patrimonialismo estatal acaba por proteger os grupos que se apropriam do Estado.


Estado forte, com interesse arrecadatório, com alto grau de tecnicismo de direito púvlico
e uma quase ausência de direito privado. Esse mercantilismo originado pela Colônia
cria uma sociedade autoritária. O Estado usa a violência para manter o povo em seu
lugar. O grande senhor de direitos é o Estado, e não há direitos voltados à sociedade.

CAIO PRADO diz que o direito colonial brasileiro não conheceu a diferença entre
Estado e certos direitos civis, pois tudo era Estado, tudo girava em torno dos interesses
do Estado. “Há um Estado mas não há um povo”. Há uma verdadeira
institucionalização da subordinação. Ser subordinado ao Estado é a principal
instituicionalização do Direito herdado das relações coloniais, e isso ainda não foi
modificado na era do capitalismo patrimonialista e oligopólico.

Como exemplo do patrimonialismo, pode-se citar as relações incestuosas do BNDES


com as empreiteiras; as renúncias fiscais a grandes empresas, etc. É quase uma
privatização dos lucros e socialização dos prejuízos.

O patrimonialismo resulta na organização do capitalismo brasileiro a partir dos


interesses do Estado em detrimento do povo e das relações privadas.

A legalidade que se pretende neutra e técnica, ou seja, independente da vontade política,


entre nós, na herança colonial do nosso capitalismo, não se institucionaliza. Pelo
contrário, em geral a sociedade fica fora da coordenação pelas leis. Há uma evidente
suborinação aos interesses do Estado pelos particulares. As relações econômicas e as
relações privadas são relegadas aos usos e costumes. A legalidade brasileira é uma
legalidade de Estado, cujo objetivo é aliar os interesses do Estado aos da alta burguesia
e do latifúndio, garantindo privilégios e interesses.

Patrimonialismo, colonialismo, estado conservador, oligopólio, relação de trabalho


fragilizada pela tradição escravocrata. O Estado é o grande senhor dos direitos e da
manutenção dos privilégios. A burocracia estatal se apropria dos privilégios, protegendo
a oligarquia rural e a grande burguesia urbana (grupos de famílias tradicionais,
industriais e banqueiros). Ausentes direitos individuais e sociais. Sociedade autoritária,
pois faltando legitimidade e reconhecimento ao Estado, cabe a ele apenas ser o fator da
violência real para manter a ordem, mas essa ordem foi instaurada apenas para perpetuar
privilégios e interesses.

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