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UNIDADE CURRICULAR: PSICOLOGIA SOCIAL DA VIDA QUOTIDIANA

CÓDIGO: 41054

DOCENTE: Profª Joana Miranda

A preencher pelo estudante

NOME: Adriana Cristina Reis Ferreira

N.º DE ESTUDANTE: 1500016

CURSO: Licenciatura em Ciências Sociais

DATA DE ENTREGA: 12 de abril de 2019

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TRABALHO / RESOLUÇÃO:

“.... Que minha solidão me sirva de companhia,


Que eu tenha a coragem de me enfrentar,
Que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim,
me sentir como se estivesse plena de tudo.”
Clarisse Lispector

O tema solidão é proposto tendo como principal objetivo a sua


caracterização e a identificação de um grupo particular que seja vulnerável a tal
fenómeno, para o meu trabalho o grupo escolhido na abordagem deste tema foi
o de “cuidadores informais”, aqueles que prestam assistência a outra pessoa,
maioritariamente seus familiares, cujo o grau de incapacidade não permite que
sejam autónomos para os atos necessários a sua existência. Primeiramente
farei uma reflexão sobre o que é solidão e seus diferentes significados,
caracterizarei o grupo escolhido para depois propor uma estratégia de
intervenção que auxilie de forma a minorar o problema.
Particularmente, o facto de estar só nunca foi para mim uma experiência
negativa que me fizesse sentir insegura, desamparada ou angustiada,
contrariamente do que sentem a maioria das pessoas que conheço, talvez o
motivo seja o facto de ser filha única ou desses momentos de solidão serem de
escolha estritamente pessoal, aquilo que Moustakas (1961) citado por Neto
(2000) classificou como “traço de personalidade”, mas o facto é que nunca me
senti desconfortável em estar só, não significando com isso que deixe de
apreciar a companhia das pessoas, pelo contrário, mas o estar só é para mim
um reequilíbrio que me proporciona uma visão mais clara de mim, do mundo e
das pessoas que me rodeiam; segundo a abordagem existencialista citado por
Neto (2000, p.329) isto deve-se ao facto dos seres humanos serem pessoas
sós e com isso a solidão ser utilizada de modo positivo e percecionada como
uma condição facilitante e criadora Por outro lado, o fenômeno da solidão vai
mais além do facto de se estar só, um sentimento que não escolhe idade,
estatuto social e nem sempre está relacionado com o facto de ter ou não
companhia, por exemplo, nunca se imaginaria que em plena era das
tecnologias de comunicação as pessoas pudessem se sentir tão solitárias, cito

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como exemplo uma investigação do ISPA de Lisboa que associa rede sociais a
solidão nos jovens, “o estudo sustenta que há qualquer coisa na comunicação
online que causa a solidão,...” (Pequenino, 2019). Portanto, quando nos
deparamos com as diferentes vivências, perceções e significados
proporcionados pelo sentimento da solidão percebemos o desafio que se
coloca para a sua definição, pois apesar de ser um fenômeno universal,
quando estamos sós “não significa que sintamos a solidão sempre do mesmo
modo” (Neto, 2000, p. 325). Por esse motivo é que não existe uma definição
universalmente aceite, como referido por Neto (2000), são várias as
abordagens teóricas que definem a solidão, existindo entre elas apenas três
aspetos que são partilhados: a solidão é uma experiência subjetiva,
psicologicamente desagradável e resulta de um relacionamento deficiente.
Ao refletir sobre este trabalho são duas as situações que me vieram a
mente quase que instantaneamente, uma foi a minha perspetiva e vivência
pessoal da solidão e a outra foi uma experiência marcante de minha infância, o
meu primeiro contato com um cuidador informal. Isto se passou há mais de 40
anos atrás, quando tive aulas de apoio na casa de uma professora que havia
deixado de lecionar na escola por ter uma filha com deficiência profunda,
completamente dependendente da mãe. Estou a falar de um tempo em que as
pessoas com deficiência e seus cuidadores eram um hiato na sociedade,
quase um tabu, pelo menos era assim no Brasil. O seu sorriso ao me receber
para as aulas revelava autêntica alegria e com o passar do tempo admirei a
sua resiliência, hoje percebo o quão solitário deve ter sido o seu caminho.
Cuidar de uma pessoa dependente é um desafio, pois a sua assistência
envolve um empenho permanente, um esforço físico e uma sobrecarga
emocional, não esquecendo de acrescentar as despesas financeiras, pois o
cuidador informal é na sua maioria um familiar ou amigo que assume esta
função sem nenhuma contrapartida financeira, muitas vezes sendo obrigado a
interromper a sua vida profissional e abdicar de seu tempo, isto é, ver restrito o
seu tempo livre, estando sempre condicionado e, consequentemente, afastado
de uma vida social satisfatória. Segundo a abordagem cognitiva referida por
Neto (2000), a divergência entre os níveis de contatos desejados e realizados
acabam por ser refletidos na solidão, esta existirá para o cuidador a medida
que seus contatos sociais sejam restritos, aquilo que Weiss (1973) distinguiu

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como “solidão social”. No projeto Eurofamcare o perfil dos cuidadores
informais em Portugal, publicado em seu relatório de 2004, mostra que na sua
maioria são mulheres, familiares da pessoa de quem cuidam, apresentam
baixa escolaridade e residem com a mesma, variáveis que podem potenciar
fragilidades psicológicas e estados emocionais negativos “a solidão pode
aparecer associada a uma vasta gama de sentimentos” (Neto, 2000, p. 325).
Para minorar a solidão o projeto proposto seria intitulado “Cuidar de
quem cuida” e consistiria em quebrar a rotina diária do cuidador informal e o
isolamento, voluntários apadrinhariam um cuidador, não especificamente para
ajudar nas tarefas, mas para que num dia por semana proporcionasse uma
quebra do isolamento. Os participantes desse projeto deveriam ser estudantes
da área de enfermagem, psicologia ou voluntários previamente preparados
com estratégias de comunicação e para a construção de uma dinâmica/
interação positiva entre o voluntário e o cuidador. Os cuidadores informais
poderiam ser informados do projeto através de associações ou centros de
saúde, e a existência do projeto deveria ser divulgada em universidades para a
participação de estudantes, como também para aqueles que desejassem fazer
a diferença para pessoas que fazem toda a diferença.

Bibliografia:

Neto, F. (2000). Psicologia Social (Vol. II). Lisboa: Universidade Aberta.

Pequenino, K. (13 de Março de 2019). Sozinho entre milhares de amigos. O


Público, consultado em 09 de abril de 2019
https://www.publico.pt/2019/03/13/tecnologia/noticia/conectados-redes-
sociais-solidao-1864958.

Sousa, L., & Figueiredo, D. (2004). Services for Supporting Family Carers of
Elderly People in Europe. National Background Report for Portugal,
EUROFAMCARE - University Hospital Hamburg - Esppendorf, Institute
for Medical Sociology.

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