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Análise de Filme: O mínimo para viver

Aluna: Geórgia Priscila da Silva

Orientadora: Heloísa Zapparoli

Resumo

O texto que discorre trata-se da análise do filme “O mínimo para viver”, contemplando
uma discussão relacionada à problemática do transtorno alimentar, especificamente a
anorexia vivida pela personagem Ellen e como ela e sua família, caracterizada como
uma família disfuncional está inserida nesse processo de doença e em busca de sua cura.
Os métodos de análise utilizados são as percepções do filme nessa perspectiva e
reflexão sobre como o processo terapêutico pode ser conduzido com uma pessoa que
tem uma imagem distorcida de si mesmo e não se enxerga como realmente é. Através da
Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), trataremos desse paralelo com os
conceitos de flexibilidade psicológica e desfusão cognitiva podem contribuir com
resultados mais saudáveis.

Palavras-chave: psicologia, terapia de aceitação e compromisso, flexibilidade

psicológica, desfusão cognitiva, transtorno alimentar.

A análise que discorre trará elementos do filme “O mínimo para viver”.


Estrelado pela atriz Lily Collins, produzido e distribuído pela plataforma de streaming
Netflix no ano de 2017 - fala sobre, dentre vários transtornos e distúrbios psicológicos,
o enfoque no transtorno alimentar (TA). A narrativa mostra que a personagem Ellen, de
20 anos e sua família estão em processo de vivenciar a doença da mesma, a anorexia.
Sendo assim, antes de trazer a realidade vivenciada nesta obra, é importante
destacar de forma geral quanto aos transtornos alimentares, um mal que atinge uma
quantidade significativa da população mundial de ambos os sexos, especialmente os
jovens. As causas do transtorno alimentar são multifatoriais, ou seja, envolvem fatores
psíquicos, socioculturais, biológicos, econômicos e outras problemáticas que venham a
interferir na conduta da alimentação e nutrição adequada de um ser humano. De acordo
com a 5ª edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-V,
2014), o Transtorno Alimentar é caracterizado por uma perturbação persistente na
alimentação ou no comportamento relacionado à alimentação que resulta no consumo
ou absorção alterada de alimentos, comprometendo a saúde física e o bem estar
psicossocial.
No caso da personagem Ellen, a anorexia é o distúrbio alimentar tratado como
tema central. A anorexia é um dos principais transtornos alimentares existentes na
contemporaneidade, caracterizado pela distorção da imagem corporal onde a pessoa
com o transtorno vê seu peso e imagem de forma distorcida, geralmente recusando-se a
manter o peso ideal compatível com a sua idade e estatura. No filme, Ellen acredita
estar sob controle de toda situação, quando na verdade sem que consiga perceber, a cada
dia que passa seu corpo está mais magro, fraco e doente. Seu entorno familiar se
apresenta como um núcleo disfuncional, porém com o tempo tentam se manter unidos
com o objetivo de ajudá-la a compreender o transtorno e melhorar sua saúde.
A personagem Ellen também mostra uma personalidade reclusa, assim como
“bloqueia” sua alimentação, também bloqueia as interações sociais e afetivas, vestindo
uma armadura perante a vida que dificulta o apoio e o auxílio de outras pessoas diante
do seu transtorno, recusando e negando que esteja acontecendo algo extremamente
prejudicial para sua vida.
Sendo assim, essa análise tem como objetivo discutir a questão norteadora: como é
possível conduzir o processo terapêutico com alguém que não possui a real noção de sua
forma a voltar a enxergar a si própria tal qual como é? Alguns elementos da Terapia de
Aceitação e Compromisso (ACT), podem nos ilustrar ao decorrer do filme e da presente
análise, como conceitos como flexibilidade psicológica, metáforas e dentre outros podem
apontar caminhos possíveis de serem trilhados junto a questão proposta como reflexão.

Análise do filme “O mínimo para viver” (EUA, 2017)


O filme “O mínimo para viver”, dirigido por Martin Noxon e em exibição no
streaming Netflix conta a história da personagem Ellen, uma jovem que está lidando com
anorexia. Durante o enredo da história contada a personagem da jovem é retratada através
de sua dinâmica familiar, crenças, não aceitação do transtorno, sexualidade, laços afetivos e
dentre outros elementos incluindo suas perspectivas de futuro. Ellen é enviada para um
programa de recuperação pouco convencional liderado por um médico interpretado por
Keanu Reeves. O filme explora os desafios emocionais e físicos enfrentados por Ellen
durante seu processo de recuperação, destacando a complexidade dos distúrbios
alimentares e a importância do apoio e compreensão na jornada para a cura.
A narrativa foca nas relações interpessoais e na autodescoberta, oferecendo uma
visão intimista sobre a batalha contra os distúrbios alimentares. "O Mínimo para Viver"
busca sensibilizar o público para a gravidade desses problemas de saúde mental e promove
a compreensão da importância do apoio no caminho para a recuperação. Aprofundando um
pouco mais e contextualizando a trama, vemos o retrato de um grupo de pessoas que estão
em uma espécie de tratamento e aborda diversos aspectos comuns a pacientes com
transtornos alimentares que estão em uma clínica de tratamento.
Em diversas cenas, Ellen conta as calorias dos alimentos em seu prato; uma outra
jovem não conseguia comer adequadamente e precisava ser alimentada por sonda, por isso
pensar nas calorias a deixava ansiosa. É mostrada uma filmagem de uma jovem falando
sobre vomitar depois de comer e até discutindo como fazer isso; fotos de Elena correndo,
“caminhando rapidamente”, sentando e medindo os braços para ver se consegue cobri-los,
menciona o uso de laxantes, mostra a rotina da instalação e mostra pesagens diárias da
personagem.
A análise psicológica do filme dentro do que está proposto nos objetivos tem como
destaque alguns pontos norteadores para serem seguidos. A seguir serão explanados
conforme as percepções foram lançadas. A representação e sensibilização da trama também
contribuem para a conscientização sobre transtornos alimentares e ajuda a combater o
estigma associado a essa condição, mostrando de forma realista a vida de quem sofre com a
anorexia, o que pode abrir diálogos e debates sobre questões de saúde mental.
No filme "O Mínimo para Viver" destaca a complexidade dos transtornos
alimentares, mostrando que eles são influenciados por uma variedade de fatores, incluindo
traumas pessoais, pressões sociais e problemas familiares. A protagonista, Ellen, lida com
um histórico familiar disfuncional e questões não resolvidas que contribuem para a
existência do seu transtorno alimentar.
Os transtornos alimentares são condições de saúde mental que afetam a relação de
uma pessoa com a comida, seu corpo e sua imagem corporal. Alguns dos transtornos
alimentares mais comuns incluem anorexia nervosa, bulimia nervosa e transtorno de
compulsão alimentar. Esses transtornos podem ter sérios impactos na saúde física e
emocional das pessoas que os vivenciam. No filme e neste artigo, serão focadas as
impressões referentes à anorexia nervosa.
A anorexia nervosa, segundo a APA (2013) é marcada por uma restrição extrema
na ingestão de alimentos, resultando em peso corporal significativamente baixo. Pessoas
com anorexia podem ter uma percepção distorcida de sua própria imagem corporal. Alguns
aspectos da anorexia nervosa sob uma perspectiva psicológica em paralelo ao filme são
importantes de serem pontuadas e destacadas:

 Distúrbio da imagem corporal: pessoas com anorexia nervosa


frequentemente têm uma percepção distorcida de sua própria imagem
corporal. Mesmo quando estão fisicamente abaixo do peso saudável, elas
podem ver a si mesmas como acima do peso. Esse fenômeno é conhecido
como dismorfia corporal e é uma parte crucial da psicopatologia da
anorexia;
 Fatores emocionais: Muitas pessoas com anorexia nervosa têm uma visão
distorcida de seu próprio corpo, percebendo-se como acima do peso, mesmo
quando estão excessivamente magras, muitas vezes está associada a uma
baixa autoestima e autocrítica exacerbada;
 Restrição alimentar: A restrição alimentar pode se tornar um mecanismo de
enfrentamento para lidar com estresses emocionais ou eventos traumáticos.
A sensação de controle sobre a ingestão de alimentos pode oferecer uma
falsa sensação de segurança e alívio temporário de outras ansiedades;
 Controle e perfeccionismo: em sua grande maioria das vezes, a anorexia
nervosa está associada a um desejo excessivo de controle, tanto sobre a
alimentação quanto sobre o próprio corpo. Existe uma busca incansável pela
magreza como uma forma de alcançar padrões de perfeição, muitas vezes
ligados a uma autoestima baseada na aparência.

A intervenção familiar, vista no filme – apesar de se apresentar uma dinâmica


considerada disfuncional para o crescimento saudável de uma adolescente é extremamente
importante para a evolução do caso. Como no caso de Ellen, a terapia familiar é uma
abordagem eficaz, pois a anorexia nervosa pode afetar dinâmicas familiares diretamente,
sendo a colaboração entre membros da família crucial para apoiar a recuperação.

No filme, Ellen precisa aprender a aceitar a realidade de seu transtorno alimentar e


as implicações que ele tem em sua vida, compreendendo seu passado e os desdobramentos
das dinâmicas familiares nas quais está inserida. Durante seu internamento na clínica de
recuperação, percebe-se como a terapia a ajuda a se conscientizar dessas questões e a
praticar a aceitação. Através do seu compromisso com a mudança, a ACT promove o
compromisso com a mudança positiva, Ellen faz um compromisso com sua própria
recuperação ao participar do programa de tratamento residencial. A terapia, interação e o
apoio dos outros pacientes a encorajam a comprometer-se com o processo de recuperação,
mesmo quando enfrenta dificuldades, questões essas que a fazem vivenciar diversas
recaídas e momentos difíceis durante o processo.

Na discussão do filme que se segue, é importante notar que a abordagem


terapêutica dependerá das necessidades específicas do indivíduo. A ACT pode ser uma
opção eficaz para algumas pessoas com transtornos alimentares, especialmente aquelas que
se beneficiam de uma abordagem tecnicamente centrada nos processos mentais e no
desenvolvimento de uma relação saudável consigo mesmas e com a comida.

Discussão

O filme narra de forma realista à rotina de desafios enfrentados por pessoas que são
diagnosticadas e sofrem com transtornos alimentares, mostrando as pressões sociais quanto
a imagem corporal e as complexidades subsequentes dessa condição. A protagonista, Ellen
interpretada por Lily Collins, lida com a anorexia nervosa. O filme explora suas
experiências, relacionamentos familiares e a busca por tratamento e o desenvolvimento do
personagem oferece uma visão do processo de recuperação através do processo
psicoterapêutico e seus desdobramentos.

As relações interpessoais abordadas na obra também são grande importância nessa


construção, onde é possível perceber as dinâmicas familiares e como os transtornos
alimentares podem afetar as relações em todos os seus níveis de complexidade, bem como
a importância do apoio social no processo de recuperação. Destaca-se na trama, a terapia
como parte crucial do tratamento, apresentando diferentes métodos terapêuticos, incluindo
a importância do processo de psicoterapia e terapia de grupo.

Explorando as causas e possíveis motivações ou gatilhos, é possível visualizar as


possíveis causas subjacentes dos transtornos alimentares, como pressões sociais, traumas
passados, problemas familiares e questões que envolvem autoestima e aceitação de si e do
entorno tal qual ele se apresenta.
É importante observar que o tratamento de transtornos alimentares é bastante
complexo e muitas vezes requer uma abordagem multidisciplinar, envolvendo médicos,
psicólogos, nutricionistas e outros profissionais de saúde. A ACT pode ser uma parte muito
valiosa desse tratamento disponível, sendo altamente recomendável procurar a ajuda de um
profissional de saúde mental especializado em transtornos alimentares para uma avaliação
e tratamento adequados.

De acordo com Dalgalarrondo, (2018, p. 340), “a anorexia nervosa caracteriza-se


pela perda de peso auto induzida por abstenção de alimentos que engordam ou por
comportamentos como vômitos e/ou purgação auto induzidos, exercício excessivo e uso de
anorexígenos e/ou diuréticos (apud Fichter, 2005; Wilson; Shafran, 2005). Há uma busca
implacável de magreza e o medo intenso e mórbido de parecer ou ficar gorda (o).”

Como mencionado acima, destacamos que a complexidade apresentada na


narrativa, trata-se da anorexia nervosa vivenciada pela protagonista. O filme oferece um
retrato vívido da anorexia nervosa, um transtorno alimentar caracterizado por uma
preocupação excessiva com o peso corporal, restrição alimentar extrema e uma imagem
distorcida do próprio corpo.

Nesse sentido, relacionando as percepções do filme com a Terapia de Aceitação e


Compromisso (ACT), vislumbramos que esta é uma abordagem da psicoterapia que se
concentra em ajudar as pessoas a desenvolver uma relação mais saudável com seus
pensamentos e emoções, bem como a agir de acordo com seus valores e objetivos de vida.
Por ser uma abordagem baseada na aceitação, significa que encoraja a aceitação de
pensamentos e emoções difíceis em vez de tentar evitá-los ou controlá-los promovendo o
compromisso com ações significativas e valores pessoais.

No contexto relacionado aos transtornos alimentares, pode-se aplicar a ACT de


modo que a aceitação de pensamentos e sentimentos dessas pessoas, especialmente no caso
de Ellen quanto aos pensamentos negativos sobre seu corpo, peso, alimentação e tudo que
envolva também a sua nutrição. O trabalho de aceitação leva a paciente a não mais lutar
contra esses sentimentos e angústias e sim aceitá-las e perceber que elas existem, tal qual o
transtorno em si. Aceitar isso não significa concordar com esses pensamentos
disfuncionais, mas reconhecê-los como parte de sua experiência humana para tentar torna-
los menos desagradáveis e possíveis de serem rompidos para uma melhora no quadro.
A jornada para a recuperação da protagonista aborda a importância da busca pela
recuperação. Ellen é enviada para um programa de tratamento residencial onde conhece
outros pacientes que enfrentam desafios semelhantes. A narrativa descreve as tentativas de
melhoria, recaídas e triunfos que fazem parte do processo de diminuição, recuperação e
remissão de sintomas. A forma como seria desejável o desenvolvimento da terapia
desempenha um papel fundamental em sua evolução. A relação com seu terapeuta, Dr.
Beckham, e os vínculos formados com outros pacientes são aspectos cruciais para o
progresso de Ellen, que aos poucos constrói esse repertório mais robusto quanto a
criticidade da distorção corporal presente na anorexia nervosa que vivencia.

Destaca-se como ponto de partida e crucial o processo de desenvolvimento da


flexibilidade psicológica neste artigo, associando essa modalidade diretamente a
importância adquirida pelo paciente em seu processo de (des) construção. A história
enfatiza a importância da auto aceitação e do desenvolvimento de uma compreensão mais
profunda de si mesmo. Ao longo do filme, Ellen confronta questões internas muito
complexas e começa a reconhecer a necessidade de compreender as circunstâncias que a
cercam no intuito de superar o transtorno.

Sendo assim, até que Ellen consiga chegar nessa etapa de aceitação através de ações
variáveis da flexibilidade psicológica proposta na ACT, como é possível conduzir o
processo terapêutico com alguém que não possui a real noção de sua forma a voltar a
enxergar a si própria tal qual como é?

Dentre diversos direcionamentos terapêuticos possíveis a este questionamento, a


personagem demonstra processos de flexibilidade psicológica - que é um conceito-chave na
Terapia de Aceitação e Compromisso e está relacionada à capacidade de lidar com
pensamentos, emoções e experiências de forma adaptativa, sem tentar evitá-los ou
controlá-los de maneira rígida. Em outras palavras, é a capacidade de não ficar retido em
padrões rígidos de pensamento, ações e comportamento, mas sim de ser capaz de ajustar e
adaptar as respostas de acordo com as necessidades e valores pessoais, enfatizando a
importância de aceitar a realidade e a experiência pessoal.

A flexibilidade psicológica na ACT auxilia as pessoas a se desenvolverem e se


adaptarem melhor a situações desafiadoras, lidando de maneira mais eficaz com
pensamentos e emoções difíceis. De acordo com Hayes (2021), a flexibilidade psicológica
refere-se à capacidade de uma pessoa de se adaptar a diferentes situações e contextos, bem
como de responder de maneira eficaz aos desafios e mudanças na vida.

Focar com a personagem em estabelecer sentidos e caminhos para abertura e


flexibilização psicológica ao invés de ficarem presos aos pensamentos sobre o corpo e a
comida, os exercícios como a técnica do Hexaflex, incentivam a pessoa a se concentrar em
ações alinhadas com seus valores e objetivos de vida, promovendo uma relação mais
saudável com o corpo e a alimentação.

É importante também mencionar como conceitos relacionados à ACT, a percepção


da desfusão cognitiva desenvolvida pela personagem e seus colegas, que envolve a
separação de pensamentos negativos e autocríticos da própria identidade. Ellen lida com
pensamentos autocríticos sobre seu corpo e autoestima ao longo do filme e a terapia a ajuda
a aprender a desfusão desses pensamentos e a não identificar-se totalmente com eles,
suportando os desafios de forma mais funcional de curto em longo prazo.

A desfusão cognitiva, de acordo com Hayes (2021), se trata de um conceito


relacionado à ACT que se refere a um processo terapêutico que tem por objetivo separar ou
desvincular os pensamentos dos sentimentos e sensações associados a eles. Em outras
palavras, a desfusão cognitiva envolve a capacidade de observar e entender os pensamentos
de maneira mais assertiva e objetiva, em vez de se deixar levar por eles ou identificar-se
completamente com eles. Isso permite que o sujeito tenha uma relação mais saudável com
seus pensamentos, especialmente quando esses pensamentos são negativos, autocríticos ou
perturbadores, como é o que se apresenta na trama.

Em paralelo aos desafios físicos, o comprometimento psicológico é complexo e


intenso. A ansiedade em torno da comida e do ato de comer é avassaladora, acompanhada
por um medo irracional de ganhar peso; a autoestima afunda, enquanto a negação da
gravidade do próprio estado é comum, mesmo quando amigos e familiares expressam
preocupação. Dessa forma, a desfusão cognitiva na ACT e no acompanhamento a pessoa
anoréxica com o perfil da nossa principal personagem, propõe que esses pensamentos são
eventos mentais, e não fatos ou verdades absolutas sobre a pessoa.

Uma técnica comum de desfusão que seria interessante aplicar com a personagem é
visualizar os pensamentos como palavras escritas em nuvens, folhas de papel ou outro
objeto imaginário, podendo ajudar a separar os pensamentos da própria identidade. E ao
rotular pensamentos como "pensamentos sobre o corpo" ou "pensamentos sobre comida", a
personagem poderia começar a categorizá-los como eventos mentais temporários, em vez
de verdades imutáveis.

Sendo assim, por vezes, a desfusão cognitiva envolve abordar esses pensamentos
difíceis com algumas doses de humor e criatividade e certa leveza diante da complexidade
dos pensamentos, reduzindo a carga emocional associada a ele encorajando a pessoa a se
distanciar dos pensamentos, observando-os de uma perspectiva mais ampla e reduzindo a
identificação excessiva com esses pensamentos.

Destarte, todos esses elementos, ao decorrer e ao final da narrativa trazem consigo a


reflexão e possibilidades de enfrentamento para o combate e melhora dos sintomas da
anorexia – engajando a personagem através dos conceitos da ACT descritos e formulados
nesta trajetória.

Conclusão

A vida de uma pessoa com anorexia nervosa é permeada por uma constante e
desafiadora compreensão dos sintomas e cura, onde a relação com a comida torna-se
motivo de conflitos internos e externos. No centro dessa experiência, como retratado por
Ellen, está a obsessão desenfreada pelo peso e pela forma corporal, ela não percebe, mas
está emaranhada em ciclo complexo de restrição alimentar e um profundo medo de ganhar
peso.
A jornada diária é marcada por rituais meticulosos em torno da alimentação. Cada
escolha alimentar é calculada minuciosamente, as calorias são meticulosamente
monitoradas, e a ansiedade associada a cada refeição é avassaladora. A comida, que deveria
ser uma fonte de nutrição e prazer, transforma-se em um campo de batalha onde a vitória é
medida pela capacidade de resistir à necessidade básica de se alimentar.
A vida social da pessoa com anorexia nervosa muitas vezes é comprometida, pois
eventos sociais que envolvem comida tornam-se fontes intensas de desconforto. O
isolamento torna-se uma escolha, uma maneira de evitar enfrentar a ansiedade associada às
interações sociais que, inevitavelmente, incluem alimentação. O corpo transforma-se em
uma fonte de insatisfação constante. A percepção distorcida da própria imagem corporal
vivenciada por Ellen cria uma barreira entre a realidade e a imagem que a pessoa vê no
espelho e mesmo quando a evidência física da subnutrição é visível, a negação persiste.
A anorexia nervosa não afeta apenas o corpo, mas também a mente. Pensamentos
intrusivos sobre comida, peso e imagem corporal permeiam a consciência, tornando-se uma
trilha sonora constante. A desfusão cognitiva, a capacidade de se distanciar desses
pensamentos, torna-se um desafio, levando a uma identificação profunda e prejudicial com
essas ideias distorcidas.
A busca incessante pela magreza é uma busca por controle, uma tentativa de
encontrar ordem em um mundo e numa vida que muitas vezes se apresenta de forma
caótica. No entanto, esse controle é uma ilusão, pois a anorexia nervosa se torna a força
dominante na vida da personagem, ditando escolhas, comportamentos e perspectivas.
A busca por tratamento muitas vezes é complicada pela própria natureza do
transtorno, que pode resistir à mudança e à aceitação de ajuda. O caminho para a
recuperação é longo e desafiador, exigindo uma abordagem multidisciplinar que aborde
não apenas os sintomas físicos, mas também os fatores psicológicos subjacentes.

Com toda a narrativa de “O mínimo para viver” associada aos conceitos em ACT
trazidos através da explanação da flexibilidade psicológica e desfusão cognitiva é
importante reconhecer que a anorexia nervosa é uma condição séria que requer tratamento
profissional. A intervenção precoce é fundamental para melhorar as chances de
recuperação e a compreensão profunda dos aspectos psicológicos desse transtorno
alimentar é essencial para o desenvolvimento de abordagens terapêuticas eficazes.
Portanto, foi percorrido no processo desse trabalho o direcionamento da pergunta
inicial do objetivo refletido, descrito como ajudar uma pessoa que se vê de forma diferente
do que realmente se apresenta fisica e emocionalmente trazendo à luz em como a Terapia
de Aceitação e Compromisso podem contribuir de forma grandiosa e eficaz na intervenção,
dimunuição e melhoria dos sintomas para uma vida de mais qualidade, mais real e mais
focada no momento presente.
Por fim, em sua trajetória, a personagem Ellen entende depois de todo processo
terapêutico vivenciado, reflete sobre seu transtorno alimentar com relação com a doença da
mãe, que foi uma depressão que se inicia no pós-parto e que permanece ao longo de sua
linha do tempo, renegando a si mesma. Uma das cenas mais marcantes foi sua decisão de
continuar a viver, mesmo com todas as dificuldades familiares e emocionais direcionando
ela ao contrário. Em seu sono de despedida ao pensar e decidir em não mais viver, percebe
e entende seu corpo nu, cadavérico, sem cor e desfalecendo para a morte, em uma cena
muito impactante e a partir disso, desperta para que esse seja um momento de continuar a
lutar por sua vida e despertar para de fato tratar e vencer o transtorno.
Referências

American Psychiatric Association (APA). . Manual diagnóstico e estatístico de


transtornos mentais: DSM-5.. 5 Porto Alegre: Artmed, 2014.

DALGALARRONDO, Paulo. Transtornos Alimentares. In: DALGALARRONDO,


Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. 2. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2008. p. 340-346.

HAYES, Steven C.; WILSON, Kelly G.; HAYES, Steven C.. Terapia de aceitação e
compromisso: O processo e a prática da mudança consciente. 2 Artmed, 2021.

Noxon, M. (Produtor/Diretor). 2017. O mínimo para viver. AMBI Group; Sparkhouse


Media; Foxtail Entertainment; Mockingbird Pictures, To the Bone Productions. Estados
Unidos: Netflix.

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