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A integração dos alunos portadores de necessidades especiais no ensino regular, tema desenvolvido
nesse estudo traz como finalidade a análise e a reflexão sobre a qualidade da educação do ensino
ministrado, a fim de melhorar o desempenho escolar. Apesar dessas iniciativas, têm-se muitas barreiras
físicas e sociais que impedem o efetivo processo de incluir crianças portadoras de necessidades edu-
cativas especiais nas instituições de ensino. Voltamos nosso olhar para os diferentes discursos que
constituem as práticas diárias dos professores. Nosso objetivo é verificar que sentido os professores e
a escola dão à educação inclusiva, frente aos desafios dessa prática escolar, pois a escola inclusiva
tem na aprendizagem a sua prioridade e é centrada no aluno. O desafio é muito maior que ensinar, é
fazer aprender, porque todos podem aprender. A escola, como instituição social, representa cenário
institucional onde acontece o processo de ensino e aprendizagem, um espaço vivo de interação.
A escola com seus estatutos e mandatos instituídos, normas de disciplina, currículos, conteúdos, me-
todologias, sistema de avaliação, regras e regulamentos e atribuições diversos dos professores. Fixa
os níveis de comportamento esperados implícitos em seu ideal pedagógico. Mas, o desenvolvimento
escolar de uma criança adolescente portadora de necessidades especiais, vai além do processo esco-
lar. Esta criança conta com apoio de professores, mas capacitados, esforço dos próprios alunos com-
partilhados, com apoio da sociedade e também com o esforço dos pais, para que haja um aprendizado
de qualidade onde o aluno possa crescer e desenvolver aptidões que certamente ele tem e às vezes
tem em abundância, mesmo sendo especial.
A inclusão, implica mudança desse atual paradigma educacional, para que se encaixe no mapa da
educação escolar. É inegável que os velhos paradigmas da modernidade estão sendo contestados e
que o conhecimento, matéria-prima da educação escolar, está passando por mudanças.
Fixar uma determinada identidade como a norma é uma das formas privilegiadas de hierarquização
das identidades e das diferenças. A normalização é um dos processos mais sutis pelos quais o poder
se manifesta no campo da identidade e da diferença. Normalizar significa eleger arbitrariamente uma
identidade especifica como parâmetros em relação ao quais as outras identidades são avaliadas e
hierarquizadas.
As diferenças culturais, sociais, étnicas e a diversidade humana está sendo cada vez mais desvelada
e descartada. A integração dos alunos com necessidades educativas especiais implica muito mais do
que simplesmente o aluno numa escola regular. Trata-se de um processo em que o aluno tem oportu-
nidades para se desenvolver e progredir em termos educativos para uma autonomia econômica e so-
cial. A integração é igualmente um processo em que as próprias escolas necessitam de mudar e de se
desenvolver e proporcionar um ensino de elevado nível a todos os alunos e o máximo de acesso aos
que têm necessidades educativas especiais.
A exclusão gera efeitos terríveis. Ela afeta a alto-estima e a identidade, produzindo um sentimento de
desvalorização nos indivíduos excluídos. Ao mesmo tempo, produz efeitos sociais, econômicos, cultu-
rais e políticos, uma vez que reafirma a desigualdade e as injustiças sociais, auxiliando na formação
de cidadão de “segunda classe” (CARVALHO, 2000).
Na área pedagógica, não parece correto ter-se como ponto de referência as deficiências ou incapaci-
dades, mas sim compreender o que é importante é o ser humano, com a adaptação do posto de traba-
lho à pessoa, às suas habilidades e características individuais, no campo da pedagogia teremos de
evitar que a deficiência se coloque entre o professor e o aluno, impedindo-nos de ver a pessoa que
está por detrás dessa deficiência.
O momento de se passar da ideia de que todos devem ter as mesmas oportunidades para a noção de
que todos deveriam ter oportunidades diferentes para desenvolver as suas potencialidades e satisfazer
as suas necessidades, dadas as nossas diferenças individuais. Segundo Mittler (2003, p. 159):
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INCLUSÃO ESCOLAR E DIVERSIDADE CULTURAL
Quanto à formação de professores para inclusão escolar entendemos que inicialmente se faz neces-
sário desconstruir algumas concepções tais como a ideia de que a escola inclusiva requer muito trei-
namento e só é possível concretizá-la com especialistas em educação especial; a ideia de que somente
turmas homogêneas de alunos garantem o desenvolvimento de um bom trabalho, como se todos os
alunos assimilassem da mesma forma e numa proporção o que lhes foi repassado, e finalmente, a ideia
de que o domínio da teoria precede a prática como se formação a prior, sem conhecer o aluno concreto
e real, assegurasse ao professor facilidades para o trabalho.
De acordo com Mittler (2003), a escola inclusiva deve atender ao pluralismo cultural do seu anulado e
buscar respostas individuais para as necessidades especiais individuais. Se antes cabia ao aluno com
deficiência se adaptar a escola, agora, dentro da concepção da escola inclusiva, é ela quem deve se
adaptar ao aluno. Para que isso ocorra, conjugam-se as responsabilidades do professor da turma
aonde o aluno se encontra, do diretor, dos demais dos servidores da escola, para discutirem sobre os
mecanismos que devem ser utilizados para se encontrar uma resposta exitosa à diversidade. A medi-
ção dos demais colegas irá beneficiar a todos, com ou sem deficiência. O currículo é, ou deve ser o
mesmo, fazendo-se necessário investigar quais adequações curriculares devem ser feitas para cada
aluno, individualmente, de forma a se obter melhores resultados.
A inclusão não prevê a utilização de métodos e técnicas de ensino específicas para estas ou aquelas
deficiências. Os alunos precisam aprender até o limite em que conseguirem chegar, se o ensino nas
unidades escolares for de quantidade, isto é, se o professor considerar o nível de possibilidade de
desenvolvimento cada um e explorar essas possibilidades, por meio de atividades e necessidades, seja
para construir uma ideia, ou resolver um problema, realizar uma tarefa. Eis um grande desafio a ser
enfrentado pelas escolas para se chegar à inclusão.
Neste sentido é primordial que sejam revistos os papéis desempenhados pelos diretores, coordenado-
res, no sentido de que ultrapassem o teor controlador, fiscalizador e burocrático de suas funções pelo
trabalho de apoio, orientação do professor e de toda a comunidade escolar.
A descentralização da gestão administrativa, por sua vez deve promover uma maior autonomia peda-
gógica, administrativa e financeira de recursos materiais e humanos das escolas, por meio de conse-
lhos, colegiados, assembleias de pais e de alunos. Mudam-se os rumos da administração escolar e
com isso o aspecto pedagógico das funções do diretor e dos coordenadores e supervisores poderá
emergir.
A escola para maioria das crianças brasileiras é o único espaço de acesso aos conhecimentos univer-
sais e sistematizados, ou seja, é o lugar que vai lhes proporcionar condições de desenvolver e de
tornar-se um cidadão, alguém com identidade social e cultural.
No Brasil, estudos realizados nas interfaces da educação e das relações interétnicas expuseram as
dificuldades enfrentadas pelas crianças negras no sistema escolar, indicando a necessidade de serem
encontrados mecanismos de combate ao preconceito e discriminação raciais ao nível da socialização
primária e secundária, ou seja, na família e na escola. Para a superação do problema, destacam a
importância de serem elaboradas novas propostas e materiais didáticos para enfrentar a questão, e a
construção de uma identidade negra positiva que se construa na relação com o branco e no reconhe-
cimento da diferença. Grande parte das propostas curriculares para o enfrentamento do preconceito e
da discriminação raciais, dirigidas para o ensino fundamental e médio, volta-se para o ensino de Histó-
ria. Outras são desenvolvidas a partir de experiências educacionais de grupos e entidades negras or-
ganizadas, em interação com o sistema formal e oficial de ensino. Mesmo que possam ser considera-
das insuficientes, o certo é que estas propostas rompem com a imobilidade. Entretanto, tais iniciativas
enfrentam dificuldades de incorporação efetiva.
Dentre essas dificuldades, pode-se destacar as encontradas nos cursos de formação de professores.
Apesar dos avanços expressivos promovidos na avaliação dos livros didáticos, para evitar preconceitos
e outros equívocos, e nos Parâmetros Curriculares Nacionais, que têm um capítulo dedicado ao plura-
lismo cultural enfatizando a “necessidade imperiosa da formação dos professores no tema” (Brasil,
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INCLUSÃO ESCOLAR E DIVERSIDADE CULTURAL
Ministério da Educação, 1997, p. 4; Valente, 2003a), urge encontrar e definir medidas para os profes-
sores intervirem na questão racial. Embora esses parâmetros representem um avanço considerável
rumo ao tratamento eficaz da questão, uma vez que os dispositivos legais até então existentes mantêm-
se prudentemente no campo das formulações abstratas, seja na Constituição, seja na Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (LDB)1 (Valente, 1998), ainda são reticentes as propostas de combate
ao racismo e pouco delineadas as medidas concretas de abordagem. De nada adianta dispor de livro
didático e currículo apropriados se o professor for preconceituoso, racista, e não souber lidar adequa-
damente com a questão. Uma proposta de formação/capacitação dos professores para trabalhar com
a temática é capaz de enfrentar o desafio lançado para a implementação da lei nº 10.639 (Brasil, Con-
gresso Nacional, 2003) – a Lei Ben Hur –, que torna obrigatório o ensino da história e da cultura afro-
brasileira no currículo oficial das escolas públicas.
Da teoria à intervenção
Embora a coibição de manifestações de racismo seja imprescindível no plano legal, conquistas e avan-
ços alcançados nessa direção não bastam para transformar as concepções arraigadas no imaginário
da população brasileira. Em razão disso, muitos estudiosos das relações interétnicas e militantes de
grupos negros organizados no país têm apontado para a necessidade de se dar maior atenção ao
processo educativo que se desenvolve em várias instâncias da convivência humana. É no transcorrer
desse processo que se cristalizam concepções falsas sobre os negros – também internalizadas pelo
grupo étnico, dificultando a construção de uma identidade positiva, capaz de contrapor-se às concep-
ções negativas, elaboradas historicamente pelos grupos brancos dominantes.
Os estudos que buscaram analisar as interfaces entre educação e relações interétnicas apresentam
indicativos bastante preocupantes. Podem ser destacados os seguintes: mantendo-se constante o nível
de instrução, maior número de brancos encontra-se empregado, em comparação ao número de negros;
os negros possuem um percentual maior de analfabetos, quando comparados aos contingentes de
pardos e brancos na mesma situação; os índices e a incidência de exclusão e de repetência são supe-
riores entre os negros; as crianças negras que permanecem na escola têm uma trajetória irregular,
marcada por maior número de interrupções em relação à criança branca; o atraso escolar é menor
entre os brancos, e essa diferença vai-se tornando mais dramática à medida que aumenta a idade do
aluno; o aluno negro ou o aluno pobre é absorvido pela rede escolar de maneira diferente do aluno de
classe média ou não- -pobre e, uma vez constituída essa clientela, os professores atuam no sentido de
reforçar a crença de que os alunos pobres e negros não são educáveis; há um ritual pedagógico que
exclui a história de luta dos negros, impõe um ideal de ego branco, folcloriza a cultura negra mas, no
discurso, propugna a igualdade entre as crianças, independentemente de cor; os livros didáticos discri-
minam os negros e falta material de apoio que auxilie aos professores a enfrentar o preconceito e a
discriminação intra-escolares; a escola não auxilia a formação da identidade racial e, além disso, re-
força de forma negativa alguns estereótipos que prejudicam o processo socializador.
Em que pese a contribuição oferecida por esses estudos, a criança tem sido negligenciada pela reflexão
sobre o grupo negro no Brasil. Entretanto, pode-se considerar que um contingente expressivo de cri-
anças negras vem substituindo a “casa” pela “rua”, porque são pertencentes às camadas mais carentes
da população nacional, apresentando dificuldades de acesso à socialização primária, fazem parte de
famílias que têm sua organização afetada pela carência econômica, e são constantemente acuadas
pelo preconceito e discriminação raciais. Tratadas com suspeição, como se essas crianças tivessem
um potencial seguro para a delinquência, a presença e atitudes delas acabam por reforçar o estigma
racial.
Considerando-se também o baixo índice de escolaridade do negro ante outros segmentos étnicos da
população brasileira, as chances de acesso à educação formal e sistemática são menores para a cri-
ança negra. Esse quadro é ainda mais grave quando se considera a educação infantil, nível da educa-
ção básica, considerada hoje pelos pedagogos como indispensável para o êxito nos estudos posterio-
res. Esse nível educacional tem sido inacessível ao grupo negro, quer por não ser satisfatoriamente
atendido pelo Estado, quer por razões econômicas quando ministrado em escolas particulares.
As raras famílias negras que têm condições de arcar com esses custos enfrentam a discriminação
velada de escolas que impedem o ingresso de suas crianças.
Nesse sentido, a educação infantil seria duplamente seletiva: social e racialmente (Pereira, 1987).
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INCLUSÃO ESCOLAR E DIVERSIDADE CULTURAL
Corroborando a afirmação de que é nesse nível da educação básica que se apresenta o quadro edu-
cacional mais grave para as crianças negras, as propostas curriculares para o enfrentamento do pre-
conceito e discriminação raciais são dirigidas para o ensino fundamental e médio, e são especialmente
voltadas para o ensino de História. Também as experiências educacionais de grupos e entidades ne-
gras organizadas, mesmo quando desenvolvidas em interação com o sistema de ensino regular, en-
frentam dificuldades de incorporação efetiva e acabam por atender, basicamente, a uma clientela cuja
faixa etária tem mais de 7 anos.
Com base nas dificuldades apontadas por esses estudos e no conhecimento sobre a conformação das
relações entre brancos e negros no Brasil, tenho refletido sobre a importância de serem desencadeadas
ações mais pragmáticas, no sentido de “equipar” a sociedade e, em especial, a escola, para progressi-
vamente enfrentar a questão racial.
Como escrevi em outra oportunidade (Valente, 2003b), atualmente parece oportuno insistir na reflexão
sobre as políticas afirmativas de caráter universal e específico, nos diferentes níveis de ensino. No meu
entender, é uma falsa questão contrapô-las, como se excludentes fossem. Por isso, o equívoco do
debate sobre as cotas não consiste apenas “em enfatizar a modalidade mais polêmica das políticas de
ação afirmativa” (Silvério, 2002, p. 220). De fato, ação afirmativa e cotas são coisas diferentes.
A afirmação de que “enquanto o ensino fundamental e médio exige uma universalização, o ensino
superior necessita de medidas que garantissem o ingresso de certos grupos dele sistematicamente
excluídos [...]” (idem, p. 213-214), parece negar o acúmulo de conhecimento que se tem sobre esses
níveis de ensino no tocante ao tratamento da questão racial.
O que os dados apresentados no início deste texto estariam a demonstrar, senão a necessidade de
serem implementadas ações afirmativas específicas na educação básica? Ao contrário do que pensa
Silvério (2002, p. 220), as políticas universalistas não têm obtido o sucesso almejado porque não vêm
sendo articuladas às ações específicas.
A discussão sobre os negros no Brasil, historicamente, tanto no senso comum como em meios acadê-
micos, vem sendo conduzida de forma a polarizar a “questão social” e a “questão racial”. No meu en-
tender, trata-se de discussão há muito superada, a não ser nas perspectivas idealistas...
Esta última, também uma construção que engloba a ideia de filiação racial, ao referir-se à percepção
das diferenças ou à escolha de identidades étnicas e raciais é decisiva para a compreensão daqueles
que são classificados, mas, sobretudo, daqueles que classificam.
Dessa maneira, torna-se um conceito analítico importante. Mas esse processo de identificação racial
“ascende da terra ao céu” (Marx & Engels, 1986, p. 37): o contexto histórico no qual se manifesta é o
da sociedade capitalista e das relações de classe que lhe é peculiar. Ou seja, a especificidade racial
só pode ser compreendida à luz dessa organização social. Não se trata “disso ou daquilo” (outro dua-
lismo!) ou de uma combinação que pressupõe soma, mas de contradição.
A articulação de valores universais – isto é, valores do capitalismo, marcado por concepções de mundo
antagônicas – às especificidades etnoculturais permite que o espaço político não seja fragmentado e
não seja degradada a democracia, possível somente quando um direito comum regula a coexistência
das liberdades individuais e particulares (Valente, 2002, p. 77).
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Valendo-me dos argumentos apresentados acima, políticas universais implicam políticas específicas,
e vice-versa, em todos os níveis de ensino. Acredito ainda que a maior ou menor eficácia de políticas
de ação afirmativas para os negros esteja inversamente relacionada ao nível de ensino, isto é, quanto
antes o racismo, a discriminação e o preconceito forem enfrentados, melhores serão os resultados
educacionais.
Mas para que seja garantida a “qualidade” desse processo há que se enfrentar os desafios na formação
de professores, para que saibam lidar adequadamente com a questão. E isso não se faz em cursos
intensivos de capacitação nos finais de semana e sem que se leve em consideração, de um lado, o
conhecimento acumulado sobre a temática, de outro, aquele “cristalizado” que por vezes falseia.
Por essa razão, a formação de professores da educação básica para o tratamento da questão racial
nas escolas, abarcando o desenvolvimento de metodologias para a educação infantil e a implementa-
ção da Lei Ben Hur, nos níveis fundamental e médio, que torna obrigatório o ensino da história e da
cultura afrobrasileira, envolve várias dimensões: desde o repensar sobre a política educacional até a
“capilaridade” do processo que envolve os professores e os alunos nas salas de aula. Como polos de
um mesmo processo, ambos exigem uma “mudança de olhar” que se proponha a ver, entender, reagir,
e não mais silenciar ante o racismo que se manifesta nos espaços escolares.
Uma agenda possível, no âmbito da educação formal, seria, num primeiro momento, tomar-se a política
educacional do país como dimensão definidora de metas e objetivos que se pretende atingir no campo
da promoção da igualdade racial, impondo-se recuperar os seus fundamentos legais. Entre outros, a
Constituição Federal, as proposições doutrinárias que norteiam a Lei de Diretrizes e Bases da Educa-
ção Nacional, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental, as Diretrizes Nacionais
para a Educação no Campo e os Parâmetros Curriculares Nacionais. Em outras palavras, essa forma-
ção “específica” não se descola da necessidade de uma formação “em geral” dos professores brasilei-
ros, há tanto tempo reclamada.
Em razão disso, ao se procurar politizar a ação educativa para a promoção da igualdade racial, articu-
lando-a à política educacional, não cabe tergiversar na discussão sobre o poder e sobre a conformação
do Estado – envolvendo sociedade política e sociedade civil, que se dá em diferentes patamares de
representação (federal, estadual, municipal) e é marcada por conflitos e por interesses antagônicos. E,
nesse caso, também não vale escamotear o fato de que se deva tomar “partido”: opções políticas de-
vem ser feitas sobre o sentido e o significado que se pode imprimir a essas ações.
Dito de outra forma, para implementar a Lei Bem Hur poder- -sei-a, por exemplo, obrigar que as escolas,
através de seus professores, o façam, e não resta dúvida de que se trataria de uma ação que concretiza
a política educacional. Mas apenas num nível, talvez o mais elementar, sujeito a resistências, conheci-
dos os mecanismos das relações raciais no Brasil. A opção política para a superação desse nível em
que tal política ganharia concretude pode ser: estabelecer que essa ação seja revestida de conteúdo
significativo que implique o aprendizado para além dos mediadores institucionais locais, e que tenha
como foco não apenas a “comunidade escolar” em todos os níveis, mas a extrapole.
Como decorrência dessa opção, tal aprendizado deve fazer parte do planejamento pedagógico das
escolas, considerando:
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INCLUSÃO ESCOLAR E DIVERSIDADE CULTURAL
c) a mobilização dessas demandas, tomadas como prioritárias em diferentes momentos e com diferen-
tes graus de intensidade, na perspectiva de se construir um projeto coletivo, calcado em processos
participativos e democráticos.
Na verdade, essa opção política foi feita, se considerarmos as Diretrizes Curriculares Nacionais “que
orientarão as escolas brasileiras dos sistemas de ensino na organização, na articulação, no desenvol-
vimento e na avaliação de suas propostas pedagógicas” (Brasil, Conselho Nacional de Educação, 1998,
p. 31).
Assim, para que a estratégia de promoção da igualdade racial não seja abortada, impõe-se partir do
conhecimento acumulado, do pensado e do vivido por professores e sociedade envolvente, que não
são imunes ao racismo. A superação do senso comum é possível quando embasada num “acerto de
contas” com a formação recebida e cristalizada.
Definida a direção política que se pretenda imprimir a essas ações, não se pode desconsiderar a im-
portância de que essa opção seja partilhada. Desse modo, deve-se fazer uma escolha que também
exija a intervenção sobre as concepções de senso comum da “comunidade local” onde se pretenda
atuar, definindo medidas para a sua formação e procurando conhecer experiências de mobilização
comunitárias já em andamento, para potencializá-las.
A formação de professores da educação básica, particularmente os responsáveis pelo ensino das dis-
ciplinas História e Estudos Sociais, em exercício, visaria:
a) sensibilizá-los para a importância de incorporar ao currículo existente recorte que destaque a história
e cultura afro-brasileira – com base no conhecimento acumulado, mas sujeito a transformação;
b) trocar experiências, aprimorá-las e difundir aquelas voltadas para a valorização do respeito à dife-
rença;
A estrutura pedagógica dessa formação deveria privilegiar o currículo existente e as inúmeras possibi-
lidades que podem ser abertas para tratar a questão racial, ou seja, temas referentes à conformação
histórica das relações raciais no Brasil. O formato de seminários em que o diálogo e a troca de experi-
ências sejam a tônica parece ser uma boa sugestão.
Na formação dos futuros professores, os cursos de pedagogia, normalmente superior e demais licen-
ciaturas deveriam ser os focos de atenção. Sabidamente, esses cursos têm por clientela a população
mais carente. Entretanto, seus formandos têm a inserção profissional mais apropriada para desenvolver
ações estratégicas no campo educacional. É indispensável a incorporação da temática racial nesses
cursos. Desse modo, poderá ser estabelecida uma articulação dinâmica entre todos os níveis da edu-
cação brasileira (educação básica, média e ensino superior), com o envolvimento de várias áreas de
competência da estrutura institucional, promovendo a formação de futuros profissionais da educação e
daqueles que atuam como professores nas escolas municipais/estaduais brasileiras na discussão do
tema.
Por fim, a constituição de um conselho consultivo, formado por setores do governo e da sociedade civil
que trabalham com o tema, poderá permitir a conformação final do projeto de formação de professores,
bem como o monitoramento, análise e avaliação das ações levadas a cabo.
Com a Lei Ben Hur e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Relação Étnico-Raciais e para o En-
sino de História e Cultura Afro- -Brasileira e Africana promoveu-se um avanço histórico, não isento de
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percalços futuros, como se pode entrever nessa “agenda possível”. Mas vale a pena buscar superar
quaisquer dificuldades na construção de uma sociedade antirracista.
O discurso sobre a escola, uma das mais importantes instituições da modernidade, está historicamente
articulado ao da construção dos estados nacionais e de uma cidadania e cultura comuns a todos e
todas. Para a conhecida pesquisadora argentina Emília Ferreiro, referindo-se ao contexto latino-ameri-
cano e à dificuldade da escola pública dos nossos países desde o início de sua institucionalização de
trabalhar com as diferenças, afirma:
Uma escola para todos e todas foi a grande luta do século XX. Universalizar a escolarização. Expandir
os sistemas escolares. Garantir o acesso de todas as crianças e jovens. Ampliar os anos da escolari-
zação obrigatória. Estas têm sido metas continuamente revisitadas, reconfiguradas e atualizadas.
Ainda não plenamente conquistadas, apesar dos grandes avanços realizados.
No entanto, todo este processo de afirmação do direito à educação escolar se dá em uma sociedade
como a nossa marcada estruturalmente por desigualdades, discriminações e processos de negação do
“outro”, os diferentes e marginalizados.
Neste contexto, particularmente a partir dos anos 90, a palavra inclusão vem se afirmando cada vez
com maior força no âmbito principalmente das políticas públicas de caráter social. Políticas inclusivas,
inclusão digital, escola inclusiva etc. As expressões se multiplicam. Ao mesmo tempo, as palavras jus-
tiça social, dignidade e igualdade, palavras-força, que em décadas anteriores foram fortemente mobili-
zadoras de muitas buscas e propostas no âmbito socioeducativo, são minimizadas nas discussões e
perdem vigor no espaço simbólico.
Este texto pretende oferecer alguns elementos para uma reflexão sobre este deslocamento semântico,
que certamente não é neutro, e propor uma perspectiva de afirmação de uma escola que rompa com a
homogeneização que vem estruturando o “formato escolar” (Dubet, 2011) moderno, e se caracterize
por ser intercultural e emancipatória.
Estamos acostumados a contrapor exclusão à inclusão. O universo semântico da exclusão está asso-
ciado a verbos como eliminar, expulsar, abandonar, negar, silenciar, recusar, privar, enquanto inclusão
se relaciona com envolver, implicar, inserir, pertencer, participar.
Neste sentido, diante de sociedades marcadas por processos de exclusão, que se multiplicam e agra-
vam com as políticas neoliberais, tendo presente esta lógica dualista, promover processos de inclusão,
em suas diferentes dimensões, se torna uma consequência óbvia para todos aqueles cidadãos e cida-
dãs comprometidos com processos de democratização num horizonte de afirmação dos direitos de
igualdade na sociedade em que vivemos.
No entanto, é importante problematizar esta lógica. Que significa incluir? Seu horizonte é simplesmente
integrar na sociedade vigente? Supõe assimilação dos referentes ideológicos e culturais dominantes
na sociedade em que vivemos? Trata-se exclusivamente de promover o acesso a determinados bens
e serviços sem questioná-los? Pode ser realizada numa perspectiva alternativa e crítica ao modelo
sociopolítico vigente? Como? A que inclusão social nos estamos referindo? Exclusão e inclusão estão
contrapostas ou são processos que podem estar articulados?
Não pretendo aprofundar nesta problemática. Simplesmente oferecerei alguns elementos que nos per-
mitam problematizar a relação entre exclusão e inclusão, do ponto de vista social e educacional.
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Uma primeira afirmação que considero fundamental é a de que o binômio exclusão-inclusão está vin-
culado à problemática da desigualdade social, característica estrutural das sociedades capitalistas em
que vivemos. É neste contexto que a questão deve ser colocada.
Se não for assim, corremos o risco de, mais uma vez, legitimar um discurso que está a serviço da
afirmação do modelo político e socioeconômico vigente.
O sociólogo francês Robert Castel (2004), em seu instigante texto sobre “As armadilhas da exclusão”,
partindo da constatação de que, particularmente a partir da década dos 90, a “exclusão vem se impondo
pouco a pouco como um mot-valise para definir todas as modalidades de miséria do mundo: o desem-
pregado de longa duração, o jovem da periferia, o sem domicílio fixo etc. são excluídos” (p.17), mani-
festa e justifica sua desconfiança em relação a um uso indiscriminado deste termo, tanto do ponto de
vista analítico quanto político-social, e identifica três formas diferenciadas de exclusão. A primeira diz
respeito à supressão completa de uma comunidade, seja sob a forma de expulsão ou extermínio. O
genocídio constitui a forma mais radical desta política de exclusão. Uma segunda modalidade de ex-
clusão consiste em construir espaços fechados e isolados da comunidade no seio mesmo da comuni-
dade. Mas existe um terceiro tipo de exclusão, segundo este autor, que nos interessa de modo especial.
Consiste em que “certas categorias da população se vêm obrigadas a um status especial que lhes
permita coexistir na comunidade, mas com a privação de certos direitos e da participação em certas
atividades” (p.39). Trata-se, portanto de incluir, excluindo, subalternizando, inferiorizando.
Nenhuma das três formas de exclusão apresentadas podemos afirmar que tenham desaparecido do
planeta e da nossa sociedade. No entanto, segundo o mesmo Castel, é a terceira modalidade que vem
crescendo e assumindo diferentes concretizações. Trata- -se de sob a aparente inclusão, excluir, invi-
sibilizando assim os processos da própria exclusão. Considero que é possível afirmar que esta pers-
pectiva está hoje especialmente presente nos processos educacionais e se vem afirmando. Como se
reveste do discurso da inclusão, muitas vezes, nos passa desapercebida. Está presente com especial
força quando a inclusão, isto é, a presença dos “outros”, dos diferentes, nos contextos educativos se
dá sem que nenhuma outra mudança seja introduzida, pelo contrário, tudo permanece “o mesmo”. É
esta a inclusão que queremos afirmar?
Alfredo Veiga Neto (2001), partindo de outro ponto de vista e baseado na perspectiva foucaultiana,
tendo por referência fundamental o binômio normais/anormais, que me atrevo a aplicar a incluídos-
excluídos, também reconhece diferentes formas de exclusão: a negação dos anormais/excluídos no
plano epistemológico e as práticas concretas de exclusão delas decorrentes que têm como caracterís-
tica básica a rejeição e a obsessão pela diferença como aquilo que contamina a pureza, a ordem e a
suposta perfeição do mundo; o recurso à proteção linguística dada por algumas figuras de retórica, tais
como perífrases do tipo ‘portadores de necessidades especiais’; a naturalização da relação normais/in-
cluídos - anormais/ excluídos, “isso é, pensar a norma em termos naturais, como algo que aí está, à
espera de ser entendida e administrada pelos especialistas” (p.108); e, uma quarta alternativa, que
propõe problematizar estas questões de modo radical e sem medo, enfrentando as dificuldades que
esta posição apresenta, tanto no plano conceitual e teórico, quanto no plano prático.
Através das diferentes questões aqui apresentadas, fica evidente a complexidade das relações entre
inclusão e exclusão social e a importância de que nos perguntemos sobre o que queremos dizer quando
afirmamos como educadores e educadoras o nosso compromisso com a inclusão social.
Reitero a afirmação de que as políticas de inclusão, em sentido amplo, têm sido fortemente enfatizadas
entre nós a partir da década dos 90. Emerge, articulada a esta perspectiva, de novo, uma visão “salva-
cionista”, “messiânica”, que encara a educação escolar como a grande responsável pela inserção do
país num mundo globalizado, na sociedade do consumo e do conhecimento.
Referindo- -se ao tema que nos ocupa, diante da permanência e diversificação das formas de exclusão,
a proposta é formular algumas políticas sociais de caráter focalizado, e, principalmente, promover um
amplo processo de inclusão educacional.
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INCLUSÃO ESCOLAR E DIVERSIDADE CULTURAL
... não podemos afirmar que a ideia de inclusão seja recente entre os educadores deste país. Recente
é a versão atualizada do termo e o desencadear de um movimento educacional que, assim como os
anteriores, propõe o novo como condição necessária de adequação da escola às exigências mais re-
centes e sempre renovadas do mundo globalizado. Como sabemos, sempre que a sociedade capitalista
entra em crise, a escola é chamada em seu socorro (p.206).
Segundo Pierucci (1999), houve nas últimas décadas uma mudança de sensibilidade, de clima social
e cultural em torno da articulação entre igualdade e diferença. Da ênfase na igualdade, muitas vezes
silenciadora e/ou negadora das diferenças, estas passam a primeiro plano, podendo comprometer ou
eclipsar a afirmação da igualdade.
Como articular estes polos sem que um anule o outro, ou o deixe na penumbra, relativizando sua im-
portância? Como estas questões podem ser trabalhadas nos processos sociais e na educação?
Na linha de pesquisa que coordeno desde 1996, com o apoio do CNPq, através do Grupo de Estudos
Cotidiano, Educação e Culturas (GECEC), vinculado ao Departamento de Educação da PUC-Rio, esta
temática tem sido central. Reconhecer estas tensões na sociedade e nos processos educacionais e
estimular a construção e as relações mais igualitárias, tendo presente as assimetrias de poder entre
pessoas e grupos, muitas vezes, parece negar as diferenças ou silenciá-las. Por outro lado, reconhecer
as diferenças, em muitas situações, é visto como legitimar desigualdades ou enfraquecer a luta por
superá-las.
Moreira e Candau (2003, p.161) assinalam com força como a perspectiva homogeneizadora está im-
pregnada na dinâmica escolar:
A escola sempre teve dificuldade em lidar com a pluralidade e a diferença. Tende a silenciá-las e neu-
tralizá-las. Sente-se mais confortável com a homogeneização e a padronização. No entanto, abrir es-
paços para a diversidade, a diferença e para o cruzamento de culturas constitui o grande desafio que
está chamada a enfrentar.
Mas estas, em geral, são subsumidas pelas concepções hegemônicas e pelas políticas públicas, par-
ticularmente de medição em larga escala, que favorecem a uniformização do sistema educativo. No
entanto, apesar dos inúmeros constrangimentos, são desenvolvidas práticas pedagógicas por muitas
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INCLUSÃO ESCOLAR E DIVERSIDADE CULTURAL
Lopez-Hurtado Quiroz (2007) faz a seguinte síntese da sua trajetória de incorporação na agenda latino-
americana:
Nestes trinta anos, desde que o termo foi acunhado na região, a aceitação da noção transcendeu o
âmbito dos programas e projetos referidos aos indígenas e hoje um número importante de países – do
México à Terra do Fogo - vem nela uma possibilidade de transformar tanto a sociedade em seu conjunto
como também os sistemas educativos nacionais, no sentido de uma articulação mais democrática das
diferentes sociedades e povos que integram um determinado país.
Desde este ponto de vista, a interculturalidade supõe agora também abertura diante das diferenças
étnicas, culturais e linguísticas, aceitação positiva da diversidade, respeito mútuo, busca de consenso
e, ao mesmo tempo, reconhecimento e aceitação do dissenso, e na atualidade, construção de novos
modos de relação social e maior democracia (p.21-22).
A primeira intitula relacional e a define como referida basicamente ao contacto e intercâmbio entre
culturas e sujeitos socioculturais, apresentando a tendência a reduzir as relações interculturais ao âm-
bito das relações interpessoais, minimizando os conflitos e a assimetria de poder entre pessoas e gru-
pos pertencentes a culturas diversas. No que diz respeito às outras duas posições, descreve e discute
as modalidades que intitula de funcional e crítica. A funcional é apresentada como estratégia para fa-
vorecer a coesão social, assimilando os grupos socioculturais subalternizados à cultura hegemônica.
Está orientada a diminuir as áreas de tensão e conflito com os diversos grupos e movimentos sociais,
sem afetar a estrutura e as relações de poder vigentes. No entanto, colocar estas relações em questão
é exatamente o foco da perspectiva da interculturalidade crítica.
Para Walsh (2009b), na perspectiva crítica a interculturalidade é Mais que um simples conceito de inter-
relação, a interculturalidade assinala e significa processos de construção de conhecimentos “outros”,
de uma prática política “outra”, e um poder social “outro”, de uma sociedade e um sistema de vida
“outros”. Em suma, marca formas distintas de pensar, agir e viver em relação aos padrões de poder
que a modernidade e a colonialidade instalaram (p.232).
Situo-me nesta perspectiva e a partir dela venho desenvolvendo diferentes reflexões e pesquisas. Des-
crevo alguns componentes que me parecem fundamentais. Sua relevância vem sendo confirmada por
diversas pesquisas realizadas. Destaco cinco critérios básicos que me parecem importantes de serem
tidos em conta no desenvolvimento da educação intercultural (CANDAU, 2002, p.99).
A primeiro parte da afirmação de que a educação intercultural é sempre histórica e socialmente situada.
Nesse sentido, é uma prática social intimamente relacionada com as diferentes dinâmicas presentes
numa sociedade. Por isso, as escolas e os programas de formação de educadores/as deverão estimu-
lar a capacidade de compromisso com conteúdo e práticas que promovam a emancipação, a democra-
cia e a transformação da realidade. Deverão combinar, por um lado, a aquisição de conhecimentos e a
formação da visão crítica e, por outro, um forte apelo ao reconhecimento dos diferentes sujeitos e atores
sociais, identificando suas identidades socioculturais e afirmando a construção democrática. Nesta
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perspectiva, a pedagogia e as culturas podem ser vistas como campos de luta, que se relacionam no
papel que a escolarização/educação cumpre na vinculação entre conhecimento e poder.
O segundo critério destaca a importância de articular no nível das políticas educativas, assim como das
práticas pedagógicas, o reconhecimento e valorização da diversidade cultural com as questões relati-
vas à igualdade e ao direito humano à educação -que inclui a aprendizagem significativa- de todos/as.
Nesse sentido, no contexto de um currículo escolar como forma de política cultural, a meta primordial
da educação é criar condições para o fortalecimento do poder individual e coletivo e a autoformação
dos educandos/as como sujeitos epistemológicos, sociopolíticos e agentes culturais.
A escola, na perspectiva intercultural, só poderá ser eficaz se não se deixar vencer pela lógica do
sistema e se propuser a promover comportamentos e práticas que resultem em uma progressiva cons-
trução de conhecimentos, atitudes e práticas que conduzam à emancipação dos grupos subordinados
por meio de uma transformação das relações assimétricas de poder entre os diferentes grupos socio-
culturais, o que pressupõe que sejam implementados processos de empoderamento.
O terceiro critério afirma que a educação intercultural requer um enfoque global capaz de afetar a cul-
tura escolar e a cultura da escola, a todos os atores e a todas as dimensões do processo educativo.
Por isso, é importante que os educadores/as contem com uma fundamentação teórica consistente que
os ajude a valorizar, compreender e avaliar os significados que seus educandos constroem socialmente
sobre si mesmos e sobre a sociedade, dando-lhes os meios necessários para que possam conhecer a
si mesmos e se fortalecer como sujeitos de direito.
Neste sentido, a vida escolar deve ser compreendida não como um sistema unitário, monolítico e infle-
xível de regras e relações, mas como uma arena na que surgem e acontecem lutas, afirmações, con-
testações e resistências. Esse espaço também pode ser visto como uma pluralidade de discursos que
se cruzam, estabelecendo interrelações, confluências, tensões e conflitos. Como um terreno móvel
onde a cultura interna da escola se confronta, hibridiza e dialoga com a cultura social, da rua, da co-
munidade, da cidade, dos meios de comunicação e informação, onde educadores/ as e educandos/as
ratificam, negociam, rejeitam e reconstroem as formas como as experiências e práticas educacionais
são nomeadas e concretizadas.
No quarto critério, destaco que a perspectiva intercultural questiona o etnocentrismo que, explícita ou
implicitamente, está presente na escola e nas políticas educativas, colocando a questão central de que
critério utilizar para selecionar e justificar os conteúdos, no sentido amplo, trabalhados na escola. O
último critério nos lembra que a educação intercultural afeta as diferentes dimensões do currículo -
implícito e oculto- assim como também as relações entre os diferentes agentes do processo educativo.
Como agente cultural, o/a educador/a tem um papel pedagógico duplo: por um lado, deverá analisar a
maneira como a produção cultural se organiza no âmbito das relações assimétricas de poder na escola
(por exemplo, textos didáticos, currículo, programas, políticas e práticas educacionais etc.); por outro
lado, é necessário que desenvolva estratégias capazes de estimular as relações entre as escolas e os
movimentos sociais voltados para a transformação da realidade em espaços de construção democrá-
tica com justiça social e cultural.
Considero que o deslocamento semântico, especialmente presente a partir dos anos 90, que privilegia
o papel da educação na perspectiva da inclusão social não constitui um discurso neutro. Pelo contrário,
desloca a preocupação por uma educação escolar comprometida com a transformação social para o
seu papel de formadora de sujeitos que se insiram na lógica predominante nas sociedades atuais,
centradas no mercado e no consumo. Neste sentido, inclusão-exclusão são faces de uma mesma rea-
lidade e é possível incluir excluindo, isto é, de uma forma subalternizada, particularmente os conside-
rados diferentes. O que considero importante hoje é “reinventar a escola”, na construção de uma edu-
cação escolar realmente democrática, que articule igualdade e reconhecimento das diferenças. Valo-
rize os diversos sujeitos, saberes e práticas ancorados em diversas tradições culturais e se comprometa
com um horizonte de emancipação social. Nesta perspectiva afirmo a importância das contribuições da
educação intercultural. Considero que esta perspectiva é fundamental se queremos contribuir para que
a escola seja reinventada e se afirme como um lócus privilegiado de formação de novas identidades e
mentalidades capazes de construir respostas, sempre com caráter provisório, para as grandes ques-
tões que enfrentamos hoje, tanto no plano local, quanto nacional e internacional.
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