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sydneyjoaosindique@gmail.com
GT-1
Resumo
O presente trabalho, pretende trazer uma reflexão sobeje acerca da tessitura da Escola e as
identidades Étnico-Culturais em Moçambique, bem como suas implicações no diálogo com
as diferenças. O trabalho sobre as Identidades étnico-Culturais se dá a cada instante, e exige
que a escola alimente uma “Cultura da Paz”, baseada na tolerância, no respeito as
diferenças étnicas e na noção de cidadania compartilhada por todos os moçambicanos. Na
escola, o aprendizado não ocorrerá por discursos, e sim num cotidiano em que uns não
sejam “mais diferentes” do que os outros, ou seja, no ambiente de caracter relacional com o
diferente. O artigo tem por objectivo, compreender a sincronia entre a educação e as
identidades étnicos culturais moçambicanos, seu carater relacional com as diferenças, de
maneira específica, procuramos discutir sobre as fronteiras étnico-culturais e o tribalismo
em Moçambique e o lugar das identidades étnicas na escola. Tomamos como referencias
teóricas para o nosso debate, os livros de Guilherme Basílio, (2010), José de Sousa Miguel
Lopes, (2010) e a obra de Philippe Poutignat e Jocelyne Streiff Fenart, (1998). A afirmação
da diversidade é traço fundamental na construção de uma identidade nacional que se põe e
repõe permanentemente, tendo a Ética como elemento definidor das relações sociais e
interpessoais.
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Professor, Activista Social, Escritor e Investigador. Licenciado em Ensino de Filosofia e História pela
Universidade Pedagógica de Maputo; Certificação em Desenvolvimento de Negócios Sociais e Liderança
Cívica pela University of South Africa (UNISA-SBL), School of Business Leadership, África do Sul-
Johanesburg. Certificação como Instrutor de Sistemas e Mecanismos Africanos de Direitos Humanos com
foco na Liberdade de Associação, pelo Centro Africano de Estudos sobre Democracia e Direitos Humanos da
Gambia, Banjul. Mestrando em Cooperação e Desenvolvimento na Universidade Eduardo Mondlhane.
Introdução
Objectivamente, pretendemos com este trabalho trazer uma reflexão ainda que inacabável,
sobre a escola e as identidades étnicas culturais moçambicanas num dialogo entre as suas
diferenças. O tema propõe uma concepção que busca explicitar as identidades étnicas
culturais que compõe a sociedade moçambicana, compreender suas relações históricas,
marcas das desigualdades e apontar transformações necessárias, oferecendo elementos para
a compreensão de que valorizar as diferenças étnicas e culturais não significa aderir aos
valores do outro, mas respeita-los como expressão da diversidade, tal diversidade que é
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SINDIQUE Cláudio João, Pensamento Educacional em Severino Ngoenha: A Moçambicanidade como
Substracto Axiológico na Construção do Sistema Nacional da Educação Moçambicana, Universidade
Pedagógica de Maputo, 2017.
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São três grupos étnicos bantu Moçambicanos, os macondes situados no sudoeste de Tanzânia e no Nordeste
de Moçambique. Os Maxanganas, designados por Tsongas estão situados no sul de Moçambique. Os Macus
também situados no norte de Moçambique, como maior grupo étnico.
traço fundamental na construção da identidade nacional. No final, o grande desafio
colocado a escola, é de reconhecer a diferença como parte inseparável da identidade
nacional e dar a conhecer a riqueza representada por essa diferença etnocultural que
compõe o património sociocultural moçambicano.
Tomamos como questões cruciais: como criar uma identidade nacional que se sobreponha
as identidades étnicas existentes e seja capaz de contê-las e canalizá-las no sentido de
favorecer a unidade e a formação da consciência na escola? Em outras palavras, como criar
uma identidade nacional sem prejudicar as fronteiras das identidades étnicas e regionais que
são fonte da diferença/diversidade, e portanto riqueza cultural? Qual papel da educação
neste diálogo entre as diferenças?
Ao tratar esta temática, é importante distinguir etnia, etnicidade, cultura, a que o tema se
refere, de tribalismo. As culturas são produzidas pelos grupos sociais ao longo das suas
histórias, na construção de suas formas de subsistência, na organização da vida social e
política, nas relações com o meio e os outros grupos, na produção de conhecimento. A
diferença da cultura é fruto dessa singularidade.
A tribo e etnia são dois termos quase equivalentes. Para P. Mercier citado por Chichava,
uma etnia é um grupo fechado, descendendo de um mesmo antepassado ou, mais
geralmente, tendo a mesma origem, possuindo uma cultura homogénea e falando uma
língua comum. Por seu lado, Honigmann afirma que “em geral, os antropólogos estão de
acordo sobre os critérios através dos quais uma tribo (como sistema de organização social)
pode ser descrita: um território comum, uma tradição de descendência comum, uma
linguagem comum, uma cultura comum e um nome comum, todos estes critérios formando
a base da união de grupos mais pequenos tais como povoações, bandos, distritos, linhagens,
(MERCIER apud CHICHAVA, 2008,p.2).
Por seu turno, Catherine Coquery‐Vidrovitch, afirma que o conceito de etnia teria aparecido
pela primeira vez no vocabulário científico por volta de 1787. Nessa altura, tinha uma
conotação religiosa, significando “pagão”, em oposição ao cristão ou ao judeus. Com a
emergência do imperialismo colonial nos finais do século XIX, o conceito vai mudar de
sentido, passando a designar os povos ou sociedades consideradas “primitivas” ou pré‐
industriais, em oposição às sociedades ocidentais ou evoluídas. A partir dessa altura, a tribo
ou etnia, em oposição à nação fenómeno então tido como tipicamente ocidental, foi
considerada como um fenómeno africano, onde os respectivos povos não teriam
consciência da sua unidade nem vontade de viver em conjunto, (Cf. CATHERINE
COQUERY‐VIDROVITCH, apud CHICHAVA, 2008,p.2).
Chichava (2008) afirma ainda, que o tribalismo, que à semelhança de todos os “ismos” tem
uma conotação ou carga negativa, seria a exclusão dos que não pertencem à nossa tribo ou
etnia, marginalizando‐os ou excluindo‐os. O tribalismo seria a instrumentalização ou a
manipulação das identidades étnicas com vista a tirar certos benefícios. Mas o tribalismo
não pode ser visto apenas do lado negativo, ele pode também constituir o veículo de
reivindicações populares e, frequentemente provocar paixões colectivas.
Fazendo uma pesquisa paralela, encontramos Lopes José no seu Livro Educação e Cultura
Africanas e Afro-brasileiras: Cruzando Oceanos (2010) onde procura trazer uma reflexão
ateada, afirmando que o Tribalismo em particular para Moçambique, nasce desde os
campos da luta armada (1965-1974) e na pós-independência (1975). Certamente este
tribalismo nasce porque as mais de vinte etnias, com suas culturas e suas línguas, foram
sistematicamente ignorados em nome do discurso da unidade nacional, (LOPES,
2010,p.71). Por um lado, estava o receio da FRELIMO 4 quanto a possibilidade de se vir a
fracionar o país, constituindo-se comunidades étnicas totalmente desvinculadas do poder
central, levando a reforçar o discurso face ao fenómeno de tribalismo, por outro lado, tal
comunidade étnica que se poderia vir a constituir seria sempre apenas uma comunidade
imaginária, sem maior legitimidade que a da comunidade nacional, (Ibid,p.72).
Samora Machel5 citado por Lopes (2010) abordou pela primeira vez de forma sistemática e
através de vários ângulos o fenómeno de tribalismo, como grande inimigo da unidade
nacional, um problema que espalhado no tecido social moçambicano, podia levar a morte o
projecto da construção da Nação. Nas afirmações de Samora, o fenómeno ainda existia,
criando assim as fronteiras étnico-culturais entre moçambicanos, tal como se pode perceber
neste discurso: “Fomos suaves, não mexemos suficientemente o fundo dos problemas e, por
isso, de novo hoje toma forma”, (SAMORA apud LOPES, 2010,p.78). É evidente que até o
período da independência as fronteiras étnicas já estavam instaladas em moçambique,
nascidos nas rivalidades culturais existente nessas etnias. Samora recorre o exemplo do
período da luta armada, para revelar que quando, a partir da província de Cabo delgado, se
pretendeu levar a guerra do Rovuma ao Lúrio, para fazer avançar a luta libertadora para a
província de Nampula, a missão fracassou, porque o tribalismo não permitiu. O tribalismo
assume aqui essa exclusão e negação entre os povos, aliás Samora e a FRELIMO
4
Frente de Libertação de Moçambique
5
Primeiro Presidente da República Popular de Moçambique
caracterizavam o tribalismo como uma doença que enfraquece os povos africanos. Ele foi
mais contundente ao caraterizar o tribalismo como um “primitivo num estado precário de
subdesenvolvimento cultural, social e económico”, (Ibid,p.79).
Como amar aquilo que não se conhece? Como admirar aquilo que não
conhecemos? Então, odiamo-nos porque não nos conhecemos (…) mas nem todos
podem nascer na mesma província ou no mesmo distrito, (LOPES,2010,p.88).
De facto, Samora já afirmava que muitos eram tribalistas sem saberem, porque não
conheciam outras pessoas e imaginavam que só eles é que existiam. Quando não se
conhece a cultura dos outros, suas danças, suas cancões, sua música, pensa-se sempre que
sua própria dança e música são as melhores.
Desta perspectiva, a nossa atenção concentra-se nas fronteiras que integram os grupos
étnicos moçambicanos, tornando-se a fronteira étnica que define o grupo e não matéria
cultural que ela abrange. A fronteira étnica canaliza a vida social, acarretando de um modo
frequente de organização muito complexa das relações sociais.
Em suma, pode se dizer que as fronteiras dos grupos étnicos moçambicanos, como qualquer
grupo étnico, não representam barreiras, elas nunca são exclusivas, e sim, mais ou menos
fluidas, moventes e permeáveis. Argumento reforçado por Mazula (2008) citado pelo
Basílio, que as identidades étnicas moçambicanas são constituídas como modelo de vida
das pessoas nas suas relações diárias, e no decorrer do tempo esses grupos vão se
costurando porque elas são incompletas, estão sempre em processo, sempre se formando,
por exemplo, os makwas, os shanganas, os rongas, os nyungues, como identidades étnicas
locais estão em processo de formação e de transformação, nenhuma delas constitui-se de
forma acabada, (MAZULA, apud BASILIO, 2010,p.211). É claro, como sublinha Cabaco
(2008) que o moçambicano no geral tem a sua maneira de lidar com os outros que é
característico de cada cultura. Os modos de relacionamentos com as pessoas, de expressar
as preocupações variam de cultura para cultura e caracterizam os núcleos étnicos. Só para
destacar, Cabaço cita o exemplo dos makwas, os macondes, os mashanganas, os bitongas,
os masenas, os ndaus que cultivam e conservam um modo específico de ser, de viver e de
se relacionar sem entrar em conflito com os outros grupos.
2.2.A Escola como Lugar da Diferença das Identidades Étnicos Culturais
Em moçambique, existem cerca de 20 núcleos étnicos com seus respectivos sub grupos que
se identificam de modo diferente, mas que em sua unidade formam a moçambicanidade
político-cultural. Cada um dos núcleos étnicos possui características peculiares, sua cultura
e tradição bem diferenciada, portanto sua própria identidade. Entretanto, Basílio afirma que
nenhum desses núcleos constitui ameaça para identidade política nacional, antes pelo
contrário
estão em
relação
dialógica. É
nessa
relação
dialógica
onde se
extrai
aspectos
comuns que são
ensinados nas
escolas
rumo a
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O trabalho não faz uma pesquisa aprofundada sobre esses grupos étnicos, mas sim procura mostrar e trazer
uma contribuição sobre o papel da escola na convivência com as diferenças étnicas.
Fonte: Guilherme Basílio, (2010,p.208)
Mesmo antes da educação tradicional autóctone, as regiões rurais baseadas nos ritos de
iniciação articulavam-se com a educação formal, servindo-se de fonte de transmissão e
consolidação dos valores identitários de cada grupo. A escola ganha sua relevância, por
reorganizar e sistematizar os valores da educação tradicional rumo ao desenvolvimento da
população. Aliás, Lopes já dizia que para a Frelimo a educação constituiu-se no elemento
fundamental capaz de resgatar a dignidade do povo moçambicano, sua cultura e, ao mesmo
tempo, para dar sustentação ao projecto socioeconómico, (Lopes, 2010). Em outras
palavras, Lopes diz nos que a educação tem o papel de tornar possível um projecto de
unidade nacional, de construção da nação moçambicana e consolidação das identidades
étnicas.
Esse tema necessita, portanto, que a escola, como instituição voltada para a constituição de
sujeitos sociais e ao afirmar um compromisso com a cidadania, coloque em análise suas
relações, suas práticas, às informações e os valores que veicula.
Pela educação pode-se combater, no plano das atitudes, a discriminação manifestada em
gestos, comportamentos e palavras, que afasta e estigmatiza grupos sociais. Contudo, ao
mesmo tempo que não se aceita que permaneça a atual situação, da qual a escola é
cúmplice ainda que só por omissão, não se pode esquecer que esses problemas não são
essencialmente do âmbito comportamental, individual, mas das relações sociais, e que
como elas têm história e permanência. O que se coloca para a escola é o desafio de criar
outras formas de relação social e interpessoal, por meio da interação o trabalho educativo
escolar e as questões sociais, posicionando-se crítica e responsavelmente diante delas.
Trata-se de oferecer ao aluno, e construir junto com ele, um ambiente de respeito, pela
aceitação; de interesse, pelo apoio à sua expressão; de valorização, pela incorporação das
contribuições que venha a trazer. Trata-se, também, de garantir espaço para situações
específicas vividas pelo aluno em seu cotidiano fora da escola, como a situação do aluno
trabalhador, seja no campo, seja na cidade. Poder expressar o que sentiu diante da
discriminação significa a oportunidade de ser resgatado da humilhação, e de partilhar seus
sentimentos com colegas. Ou seja, trata-se de ensinar a dialogar sobre o respeito mútuo
num gesto que pode transformar o significado do sofrimento, ao fazer do ocorrido ocasião
de aprendizagem.
STOER, S. R., & MAGALHÃES, A. M. (2005). A Diferença Somos Nós. Porto: Edições
Afrontamento.