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Calton Abel Pires

Diversidade cultural em Moçambique

(Licenciatura em Ensino de Química)

Universidade Rovuma

Nampula

2021
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Calton Abel Pires

Diversidade cultural em Moçambique

Universidade Rovuma

Nampula

2021
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Índice
Introdução ................................................................................................................................... 3

Diversidade cultural .................................................................................................................... 4

Áreas de estudo da diversidade cultural ..................................................................................... 4

Diversidade e identidade cultural em Moçambique ................................................................... 6

Diversidade e identidade cultural em Nampula .......................................................................... 7

Conclusão ................................................................................................................................. 13

Bibliografias ............................................................................................................................. 14
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Introdução

Desde a origem do Homem, as diferenças foram sempre demarcadas. Na fase primitiva podiam
ser identificados os grupos humanos das savanas e das florestas densas. A história deixou
exemplos concretos de delimitação de grupos sociais. Por exemplo, na Grécia antiga o “éthnos”
era um conceito que definia um grupo de pessoas diferentes do povo grego. Nesse caso o
“éthnos” representava o “outro”, o “estrangeiro” ou o “étnico”. Face ao “éthnos”, existia o
génos, que queria dizer nós.
Dessa maneira, torna-se clara a valorização da diversidade cultural, do conhecimento mútuo e
da autonomia, visando incrementar a consciência da diferença e o respeito por ela.
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Diversidade cultural

A diversidade, conforme Takahashi (2006, p.3), é a característica básica de formas de vida e


das manifestações de cultura na terra. Ela pode ser biológica ou cultural. De acordo com o
autor citado, há três tipos de diversidade cultural: genética, linguística e cultural propriamente
dita. A diversidade cultural genética refere-se, de acordo com o mesmo autor, “às variações e
similaridades genéticas entre as pessoas” (TAKAHASHI, 2006). A diversidade cultural
linguística aponta para a existência de “diferentes linguagens e sua distribuição em regiões”
(TAKAHASHI, 2006); a diversidade de culturas é o “complexo de indivíduos e
comportamentos dentro de um contexto histórico comum” (TAKAHASHI, 2006).

A questão da diversidade cultural deve ser discutida em simultâneo com a noção das
“diferenças”. As diferenças culturais podem variar consoante a etnia, a raça, a idade, a religião,
o gênero, à região geográfica, visões de mundo, desejos, valores, etc.

O tema da diversidade cultural é, hoje em dia, ao nível da educação, muito abordado, pois os
educadores estão muito preocupados em encontrar formas de conciliar o direito de igualdade à
educação para todos com o respeito às diferenças culturais. Como sabemos, a preocupação
política de constituição da nação e da identidade nacional em prol da constituição de uma
cultura nacional e homogênea provocou a diluição e o apagamento das diferenças culturais na
escola, com o objetivo de garantir uma educação igual para todos.

Áreas de estudo da diversidade cultural

Os estudos sobre a diversidade cultural podem ser enquadrados no âmbito dos estudos culturais
e pós-coloniais. No entanto, autores como COSTA (2006, p. 1-3) consideram que os estudos
pós-coloniais e os estudos culturais, nos quais se integram os relacionados com a diversidade
cultural, multiculturalismo, intercultural idade e a trans-culturalidade, não podem ser
considerados uma matriz teórica, mas apenas uma variedade de contribuições que aparecem
como “uma referência epistemológica crítica às concepções dominantes da modernidade”.
(COSTA, 2006, p. 1).

Os estudos culturais e pós-coloniais começaram a ser feitos na vertente da crítica literária, a


partir dos anos 80 e os seus maiores representantes são Homi Bhabha, Edward Said, Gayatri,
Chakravorty, pivak, ou Stuart Hall e Paul Gilroy. Tais estudos têm relações com o pós-
estruturalismo [Derrida e Foucault], ao se referirem ao carácter discursivo do social; com a
corrente pós-moderna [Lyotard], ao tratarem do descentramento das narrativas e dos sujeitos
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contemporâneos e também com os estudos culturais [desenvolvidos na Universidade de


Birmingham], ao focalizarem a sua atenção às questões do racismo, gênero e identidades
culturais. É nesta última vertente que acontece a convergência entre os estudos pós-coloniais e
os estudos culturais. (COSTA, 2006, p. 3).

De acordo com COSTA (2006, p.3), os estudos pós-coloniais centram as suas atenções nos
seguintes aspectos:

 Crítica à Ciências Sociais por meio da desconstrução de binarismo como entre o


ocidente e o oriente entre o ocidente e o resto do mundo.
 Alternativas epistemológicas, nomeadamente, crítica ao modernismo elogio do híbrido
e crítica da concepção do sujeito das ciências sociais

Os estudos pós-coloniais refletem bastante sobre o conceito de diferença e das identidades dos
sujeitos. A questão do reconhecimento das diferenças torna-se o foco principal da Didática
Multicultural que se baseia em princípios da Educação Multicultural. Tal educação defende o
respeito à diversidade na escola e a necessidade do reconhecimento de direitos iguais para
todos. Para CANDAU (2006, p. 2), as reflexões sobre as relações entre a diversidade cultural e
o quotidiano escolar são um tema de suma importância na educação de forma a que se possa
tornar a escola verdadeiramente democrática. De acordo com GADOTTI (2006, p. 1), a
educação multicultural supõe a existência de uma pedagogia dos direitos humanos, do respeito
pelo outro, pelo ambiente, etc. Para o autor antes mencionado, a educação multicultural tem
duas características principais:

 Pode aparecer como uma abordagem que surge para defender a igualdade de
oportunidades educacionais e de equidade e luta contra todos os tipos de discriminação
e preconceito racial, étnico, sexual, religioso, linguístico, etc.;
 Pode surgir também como uma abordagem curricular, introduzindo mudanças concretas
no currículo que permitam romper a hegemonia de um único tipo de conhecimento, de
cultura e de língua. O ensino bilíngue e a introdução do currículo local em Moçambique,
é um bom exemplo dessa abordagem curricular da educação multicultural na escolas.

Os resultados da educação intercultural foram:

 A realização do princípio da igualdade de oportunidades;


 A reelaboração dos livros didáticos;
 A formação e a qualificação dos educadores;
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 A superação da perspectiva monocultural e etnocêntrica;


 O questionamento e a superação de estereótipos e preconceitos

Diversidade e identidade cultural em Moçambique

Um dos aspectos considerados de maior relevância no novo currículo do Ensino Básico


relaciona-se com a questão da diversidade cultural. O Ministério da Educação no seu Plano
Curricular - MINED/ PCEB (1999, p. 8) refere que “a educação tem de ter em conta a
diversidade dos indivíduos e dos grupos sociais, para que se torne um fator, por excelência, de
coesão social e não de exclusão”. Uma das característica mais preciosas de Moçambique é a
sua diversidade cultural que, potência, acompanha também a sua diversidade biológica.
Takahashi (2006, p. 3) afirma que há uma significativa correlação entre as diversidades
biológica e cultural, i.e., as áreas que têm grande diversidade biológica também reúnem grande
diversidade cultural, por exemplo, a Índia tem 309 línguas e possui 15.000 tipos de flores
nativas; a China tem 77 línguas e 30.000 tipos de flores nativas.

A sociedade moçambicana é multilíngue, pluri-étnica, multi-racial e socialmente estratificada.


Existem em Moçambique várias formas de organização social, cultural, política e religiosa; há
várias crenças, línguas, costumes, tradições e várias formas de educação. A principal
característica do patrimônio cultural moçambicano é a sua diversidade. As manifestações e
expressões culturais são ricas e plurais, sobretudo as ligadas às camadas “populares”. A língua
oficial em Moçambique é a língua portuguesa, mas ela é uma língua minoritária que foi
escolhida para oficial por razões políticas relacionadas com a unidade nacional e com o fato de
não haver à altura da Independência nenhuma língua que estivesse suficientemente
“modernizada” para ser capaz de veicular a Ciência, a Tecnologia e ser capaz de servir de língua
franca em todo o território nacional.

Depois de algum tempo, Com a queda do socialismo, Moçambique adere às reformas do FMI
e do Banco Mundial e passa a defender valores morais completamente contrários ao Socialismo
como a supremacia do setor financeiro, a privatização, a desregulamentação do setor financeiro,
a desnacionalização das riquezas naturais, integração nos mercados internacionais. Por um lado,
sobretudo, as camadas jovens das zonas urbanas, por influência da globalização e da adesão às
novas tecnologias de informação e comunicação, promovem mudanças notórias de costumes e
hábitos culturais por exemplo, ao nível do vestuário, da alimentação dos gostos musicais, etc.
Ocorre também a queda de identidades fortes, de grandes ideologias, projetos e utopias;
proliferam as dependências às modas, ao consumismo, aos luxos desmedidos, ao esbanjamento,
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etc. Se, por um lado, o trânsito cultural num mundo trans-nacional, por meio das novas
tecnologias de informação e comunicação internet, televisão é muito forte e provoca a
“desterritorialização” de hábitos culturais, por outro lado, tal desterritorialização,
contrariamente, ao defendido por vários estudiosos, não vai provocar o desaparecimento das
culturas locais, mas provoca uma reafirmação e revalorização das mesmas. Culturalmente, tanto
se assumem valores trans-nacionais, como também se revalorizam as culturas locais. Exaltam-
se direitos e liberdades individuais, bem como se preserva o particular e o singular.

Defende-se a alteridade, a diferença, a subjetividade e é nesse âmbito que, nos dias de hoje, se
defende a diversidade cultural como elemento importante do desenvolvimento nacional.

Diversidade e identidade cultural em Nampula

Crenças e Cultos

A vida era um valor absoluto, cujo fundamento estava em Deus ou Muluku. Para os a-makuwa,
negar a existência de Muluku era o mesmo que negar a própria vida, dai a expressão: “Muluku
Mpattuxaa ni mwanene a itthu sothene”ou seja, Deus é Criador e dono de todas as coisas”. A
esfera religiosa abarcava tudo o que existe na natureza e para eles, o universo era povoado por
seres materiais e espirituais e, tudo formando numa só coisa.

Para os a-makuwa, Muluku era um só, criador de todas as coisas dono de tudo e Senhor da
humanidade, daí considerar os homens de seus filhos ou anaaka. O que Muluku queria e quer
era o bem das suas criaturas e os homens deviam se preocupar não com Deus, mas sim com os
maus espíritos e com os inimigos, fazendo de tudo para se defender deles.

“Muluku okhala” ou “Deus existe” era uma frase constante entre os povos a-makuwa mais
tradicionais e expressava a existência de Deus não só nas coisas boas, mas também nos
infortúnios da vida, como uma esperança de dias melhores.

Na visão de mundo, para os A-makuwa não havia divisão entre o sagrado e o profano, entre o
mundo e Deus/o divino, entre o natural e o artificial, nem entre o homem e a natureza. O divino
e o sobrenatural estavam por toda parte, convivendo com e no mundo natural e humano,
interagindo com ele e influenciando-o em todos os momentos. Os espíritos dos antepassados
estavam sempre presentes, sempre atenciosos com o que acontecia com seus descendentes. Os
protegia, os orientava e se comunicavam com eles através de sonhos e visões tomando forma
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de animais (especialmente serpentes), possuindo alguém, ou através de uma série de sinais


(geralmente eventos fora do comum).

A crença nos antepassados, tão discutida e afirmada erroneamente como a “religião dos a-
makuwa”, tratava-se não de uma religião, mas sim na crença de que os mortos se tornam
personalidades superiores e estão ao lado de Muluku, como colaboradores directos. A-nakuru
eram espíritos dos mortos que não conseguiram entrar na categoria de “antepassados” por não
estarem em sintonia com Deus.

Acreditava-se que os mortos tinham as mesmas necessidades e exigências que os vivos. Estes,
pelo seu poder temível, mostravam-se irados com os vivos, sendo necessário aplacar as suas
iras e satisfazer as suas exigências para que não pudessem desencadear castigos. Os males que
atormentavam os homens, não eram “atribuídos a Deus” mas sim propagado pelos espíritos ou
outras almas errantes e feiticeiros. Era destes elementos que os vivos deviam se defender,
acalmando-os, aplacando-lhes a ira ou satisfazendo-lhes as exigências.

Os cultos tradicionais, caracterizavam-se por implorações aos espíritos dos antepassados nos
quais envolviam ofertas em locais apropriados de “Makeya” ou “Mukuttho” bebidas
fermentadas (Otheka) ou alcoólicas, pano branco denominado ntthaka e outros produtos.

Para além dos locais de culto que se localizavam em lares familiares ou junto dos povoados,
existiam locais considerados regionais para onde, em caso de aflição de vária ordem, afluíam
as pessoas.

Gestão de conflitos

Entre os a-makuwa de Nampula, no passado, o termo conflito era designado “owanawana” e


significava também contradição ou desentendimento entre duas pessoas. Do owanawana ou
conflito, podia levar a mulattu ou milando quando denunciado `as autoridades tradicionais, os
mamwene.

A família uterina era constituída pelos defuntos, pelos vivos e pelos que virão a nascer, o que
levava ao alargamento do campo de conflito. O não cumprimento de deveres para com os
familiares mortos, podia ser motivo de convulsões sociais e que correspondiam adequadas
medidas de mediação para a reposição da normalidade.
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A procura da reconciliação era pelo medo que tinham de um dia sofrerem maldades como
consequência do desentendimento com os seus semelhantes. Para a resolução de conflitos,
usavam-se como métodos a persuasão, a adivinhação, o mwaavi e os juramentos.

Na persuasão, os chefes, mwene, desempenhavam um importante papel na persuasão aos seus


membros com vista mudança de comportamento e assunção de novas formas de conduta social.
A adivinhação, que era feita por um adivinho ou curandeiro, servia para descobrir algo oculto
como por exemplo: o roubo, as relações extra-conjugais e as doenças.

O mwaavi, consistia no consumo de certas cascas de arvoes específicas, para provar a falsidade
ou culpabilidade num indivíduo, como prova de ter praticado ou não um certo acto. A outra
forma de mwaavi, podia ser com cascas de árvore a ferver e o especialista fazia perguntas aos
dois (ofendido e ofensor) para se acusarem a volta da fogueira. O transbordar da água em
ebulição para um dos lados dos envolvidos na contenda era sinónimo concludente do
envolvimento. Finalmente, os juramentos eram feitos sobre a esteira, o soalho, ou então, campas
de ente queridos.

As práticas de feitiçaria geravam situações de conflito, por isso, entre os a-makuwa de


Nampula, era frequente acusações de feitiçaria. Grande parte de doenças e calamidades eram
atribuídos, pelos adivinhos, a actuação de indivíduos inconscientemente de princípios
maléficos, denominados a-nahavra, portadores de havara ou leopardo.

Num conflito entre indivíduos de Clãs diferentes, o mwene do grupo ofendido, ia ao encontro
do mwene do grupo ofensor ou infractor e na presença dos envolvidos e outros membros da
família, tentam resolver o conflito. Quando não se chegava ao consenso, era levado ao opwaroo.

Para resolver os conflitos sociais comuns como problemas matrimoniais, roubos, recorria-se
primeiro a família, quer dizer, ao mwene do nloko ou ao tio do erukulu. Se a família não
conseguisse resolver, este era transportado ao Mwene mulupale. Para a solução, este e os seus
conselheiros juízes, exigiam um pagamento que devia em bens, produtos, prestação de serviço,
ou mesmo algum dinheiro.

Na herança e sucessão também recorria-se ao diálogo e ao consenso que eram as principais


armas para evitar o conflito entre filhos e sobrinhos uterinos de um homem que morresse
deixando bens ou riquezas. Embora fosse o sobrinho que tivesse o direito a suceder o tio, a
divisão dos bens devia ser feita por dois, nomeadamente: a mulher (incluindo seus filhos) e o
sobrinho (sucessor), isso em caso do homem não aceitar viver com a viúva.
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O uso dos recursos

O sistema tradicional de uso da terra era dominantemente familiar e normalmente à família


alargada. As formas de produção eram individuais, cabendo a exploração a homens e mulheres,
individualmente ou em conjunto e recaia sobre tudo nos membros masculinos a decisão sobre
a alocação de produção.

Na instância superior de hierarquia makuwa, aos chefes dos grupos clânicos ou mamwene,
lhes cabia a função de distribuí-la pelas famílias por si chefiadas. A cada membro família, era
distribuída uma parcela da mata que ainda não estivesse ocupada para abrir a sua machamba,
sobre tudo, `a mulher e seu marido. O uso e posse da terra, ficavam condicionados `a prestação
de serviços das machambas do Rei grande ou a oferta, ao mesmo, de uma pequena parte da
produção familiar.

O acesso a terra entre os a-makuwa se fazia através da mulher: pela morte de uma mulher, uma
outra do mesmo grupo substituía a falecida e assumia então: o estatuto, o esposo e as terras. O
homem não tinha acesso `a terra, senão por intermédio da mulher, enquanto sua esposa no
quadro do casamento. O acesso da terra para o homem, dependia não da sua autoridade familiar,
mas sim da sua esposa, sendo o território dela o lugar de desempenho da actividade produtiva
masculina. A terra herdada, comunalmente, por um grupo familiar tinha várias funções e era
governada segundo o principio de que: os ancestrais, os membros da família e as gerações
futuras deviam viver no mesmo território. Ela era vista como uma fonte de vida para todos
e os que geriam e distribuíam, o Rei grande ou os mamwene, eram obrigados a ter em
consideração as suas necessidades presentes e futuras.

A terra era propriedade privada dos utentes e em caso de morte do chefe da família, esta passava,
por herança, para o filho mais velho da viúva (se fosse mulher) ou sobrinho mais velho da irmã
(se fosse homem). As formas de acesso a terra podiam ainda ser feitas por empréstimos
temporários de uma ou várias parcelas de terra denominadas “Nthala” ou “Mathala” `a famílias
de outras linhagens pelos Chefes dos makholo.

Após várias ofertas ou sucessivas visitas, havendo consentimento, combinava-se as


modalidades de uso, que podia ser: cedência, em troca de produtos; aluguer, por uma campanha
agrícola; ou venda, por um período de dois ou quatro campanhas. A ausência do ocupante
durante algumas épocas de chuva, fazia prescrever o direito de exploração revertendo
novamente a administração do régulo.
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As formas de uso da terra, eram definidas pelos anciãos após as cerimónias de defesa da terra
ou apenas Othukurya elapo, durante as quais rogavam aos deuses e espíritos que os livrassem
de todo o perigo que pudessem surgir.

O mwene era o guardião da terra, ou seja, responsável pela sua conservação e repartição entre
os membros do grupo. Ao constituir-se uma nova família, cabia-lhe a distribuição das terras aos
esposos das irmãs ou sobrinhas retirando, por vezes, aos seus próprios dependentes masculinos
o acesso a terra situada no seu território de origem.

Para agricultura era usado o sistema trienal de rotação de culturas em que passados os três anos,
deixava-se em pousio e passavam a cultivar outra área, para permitir a recuperação da
fertilidade dos solos. Na preparação da nova machamba, usava-se sempre a queimada que devia
ser autorizada pelo mwene mulupale, assim que se aproximasse o início de cada sementeira.
No mesmo contexto, os caçadores também faziam queimadas, mas em tempo seco.

As terras junto as montanhas eram sagradas, o que significava que a sua utilização para
actividades agrícolas era proibida. Estes lugares muitas vezes estavam reservados a cultos.

A água nunca foi controlada e nunca se pagou pelo seu uso, pois, foi sempre considerado como
um recurso sagrado, não podendo por isso ser alienado. A abertura dos poços, cabia as mulheres
que se mobilizavam entre si e só em regiões ou anos de seca, os homens se juntavam para tarefa
que não era antecedida de qualquer cerimónia. Também existiam reservas de água em lagoas,
porém, estes locais eram considerados e utilizados para a realização de cerimónias de adoração
em determinados eventos.

Algumas espécies florestais tais como: jambiri, umbila e moco, não deviam ser cortadas e
para outras, o seu corte era considerado tabú, uma vez que os espíritos não permitiam o seu
abate. Entre os a-makuwa de Nampula, o embondeiro ou mulapa, foi considerado centro de
cultos tradicionais uma vez que para eles, os espíritos passavam maior parte do seu tempo
repousando nestas árvores.

Em relação a fauna, os costumes a-makuwa também ensinavam a proteger animais como o


elefante, o leão ou mwatto, o leopardo ou havara, a cobra mamba ou nttapo, a jibóia ou
nikhurapela, eram considerados como “itthu sa muluku” ou apenas “Coisas de Deus”. Para tal,
os caçadores eram formados por curandeiros “especiais” que durante a sua aprendizagem eram
instruídos de forma a distinguirem os diferentes tipos de animais que deviam ou não ser
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abatidos. Porém, existiam algumas espécies vegetais e animais para o uso exclusivo durante
certos eventos ou ritos.

Em relação a lenha, que era o maior combustível que se usava, era retirada da própria machamba
da família ou perto desta e caso escasseasse podia se ir buscar na mata ou cortar árvores secas
mas sem ultrapassar os limites da propriedade familiar.

Não havia controlo sobre a utilização dos recursos ao nível da comunidade em relação ao
combustível lenhoso e material de construção. Porém em defesa dos interesses da maioria, não
era permitida a exploração desses recursos por pessoas pertencentes a outros grupos. Em casos
especiais de exploração, era necessário uma autorização do mwene pertencente `as terras e
assim evitava-se o conflito entre os diferentes grupos. Se alguém transgredisse estas regras e
fizesse o uso dos recursos proibidos, adoecia ou acontecia-lhe alguma desgraça que podia levá-
lo a morte.
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Conclusão

Diversidade cultural são os vários aspectos que representam particularmente as diferentes


culturas, como a linguagem, as tradições, a culinária, a religião, os costumes, o modelo de
organização familiar, a política, entre outras características próprias de um grupo de seres
humanos que habitam um determinado território.

Moçambique encontra-se no processo da criação da Nação, na condição de país de diversidade


cultural, considerando as diferenças como elementos aglutinadores, dando substância à coesão
e consciência nacionais. Contudo, se num sentido geral a Cultura é universal ao Homem, no
seu sentido mais restrito ela descreve um conjunto de diferenças de um grupo humano
específico em relação aos outros. De facto, a Cultura ao ser partilhada pelas pessoas, é feita em
função dos membros de um grupo que vive num determinado meio. A Cultura converte-se,
assim, num sinal de identidade grupal. Por exemplo, as mesmas práticas anteriormente
indicadas como universais culturais ao serem analisadas em função das diferentes áreas
culturais têm manifestações díspares. Nesse caso falaríamos de diversidade cultural.
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Bibliografias

BERNARDI, B. Introdução aos Estudos Etno-Antropológicos. Lisboa,


Edições 70, 1974.

MARTÍNEZ. Pe. Francisco Lerma. Antropologia Cultural. SMSto.


Agostinho da Matola: S/Ed, 2004.

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