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CHAVES, CELMA. (1); LIMA, RODRIGO AUGUSTO DE. (2); OLIVEIRA, LUCIANE
(3); SOUZA, GLENDA (4).
RESUMO
Após o debacle da economia da borracha, empreende-se na cidade de Belém, ciclos intermitentes de
modernização, um a partir da década de 1930, sob os interventores e intendes da Era Vargas, o outro
a partir da década de 1950, sob os auspícios do desenvolvimentismo. Na capital do Pará, esses
processos de modernização e as respectivas ações, se expandiriam das áreas centrais e culminaram
na afirmação de novos espaços para novos grupos sociais, a elite remanescente da borracha, a
burguesia abastada, profissionais liberais e comerciantes, que adotariam um novo modo de morar: as
residências modernas, casas unifamiliares e edifícios de apartamentos. Evidencia-se também
transformações na arquitetura pública, como escolas e sedes de órgãos. Durante a produção desta
nova arquitetura, destaca-se a figura do engenheiro-arquiteto Camilo Porto de Oliveira,
principalmente a partir da década de 1950. O objetivo do artigo é apresentar o processo e resultados
preliminares do registro e interpretação do acervo do conjunto de projetos originais das obras deste
profissional, cedidas por seu sócio ao Laboratório de Historiografia da Arquitetura e Cultura
Arquitetônica (LAHCA) da FAU/UFPA em 2016, composto por 122 projetos, entre nova construção e
reforma. A partir disso, desenvolveu-se um processo de organização, identificação, digitalização das
pranchas originais, fotografias e redesenhos utilizando o software AutoCAD. Posteriormente, gerou-
se um mapa de localização pela plataforma My Maps da Google©. A análise parcial das obras
permitiu a classificação e periodização das obras do arquiteto, cujos números expressivos são
observados entre as décadas de 1950 e 1960, apresentando-se em diversos segmentos, entre eles:
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residenciais, comerciais, institucionais e serviços. Isto possibilitou a geração de gráficos quantitativos,
bem como a localização geográfica, por mapas, registros, fotografias e por tipologias. Além disso, foi
possível identificar e caracterizar fases distintas no processo de concepção projetual do arquiteto,
permitindo-nos inferir as mudanças e permanências que sua obra apresenta ao longo do tempo. O
processo descrito constatou as potencialidades históricas, culturais e científicas do material adquirido,
permitindo a reafirmação do arquiteto e sua contribuição para a arquitetura moderna na cidade de
Belém.
Introdução:
Nesse processo, o grupo que presenciou e arcou financeiramente com a produção dessa
arquitetura, eram famílias ligadas aos dividendos da borracha e da castanha, e profissionais
liberais em ascensão: médicos, advogados. Motivados pela aquisição de novos hábitos
culturais e urbanos ao longo deste período, inspirando não apenas um desejo de renovação,
mas também de retorno a uma modernidade já experimentada no início do século XX
durante a Belle Époque. Porém, os bangalôs ecléticos se tornaram antiquados para as
novas necessidades funcionais e simbólicas daquele grupo, que começariam então a
experimentar com as novas soluções que o repertorio moderno possibilitava. Obras que
objetivavam fundir sentido construtivo, funcionalidade e plasticidade (CHAVES, 2008,
p.163), de acordo com repertório formal inovador da década de 50, em especial. Tal
repertório era avançado para as condições e aspectos culturais locais, o que diferenciava
aquela elite das demais classes.
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Neste panorama de renovação construtiva, destaca-se a figura do engenheiro-arquiteto
Camilo Porto de Oliveira, formado pela escola de engenharia do Pará em 1956, e um dos
responsáveis por introduzir as inovações da arquitetura moderna brasileira em Belém
(CHAVES, 2004). Nesse sentido, a ausência de debate local sobre esse tema não impediu a
adoção de elementos de uma cultura arquitetônica moderna (CHAVES, 2013), em maior ou
menor quantidade, arraigadas a demandas simbólicas e funcionais distintas, de acordo com
as condicionantes reveladas ao longo do percurso arquitetônico de Camilo Porto de Oliveira.
No período de transição do século XIX para XX, a economia da cidade de Belém apresenta
lucros provenientes da produção extrativista do látex até a primeira década, sob a
intendência de Antônio Lemos, o qual se dedicou a obras de embelezamento da cidade. Sob
esta visão modernizante, Lemos imbuído pelos ideais haussmanianos se empenhou em
restaurar Belém, nos aspectos urbanos e arquitetônicos. Desta forma houve uma intensa
busca pela modernização formal, com modificações em relação às plantas baixas, à
implantação no terreno e uso de técnicas e materiais. Nesse período implantou-se em
Belém o anseio por assemelhar-se aos centros europeus, com as inovações construtivas da
época (DIAS E CHAVES, 2015).
Nesse momento, o governo adota a arquitetura moderna como estilo oficial e utilizado como
linguagem de poder e vislumbrado pela classe média alta como significado de status e
paradigma estético. (LARA, 2005). O então presidente do Brasil nomeia em 1930, o
interventor Magalhães Barata para o Estado do Pará, que direcionou a imagem da cidade de
Belém perante os visitantes e o governo central, visando promover uma intervenção que
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abrangesse além das áreas centrais da cidade (DIAS E CHAVES, 2015). A intenção de
modernizar se expressava nas notícias veiculadas nos jornais exaltando as novas
construções, e nos anúncios da imprensa que divulgava os novos materiais de construção
como o cimento e o vidro. Nesse novo cenário sociocultural e econômico surgem as
propostas de novas formas de moradias, com novas composições, que expressavam o
anseio de modernidade desses grupos, que passam a incluir o edifício de apartamentos e as
residências que incorporavam elementos e soluções da arquitetura moderna brasileira.
(CHAVES, 2008)
Conforme Chaves (2008), os novos grupos sociais, constituídos por profissionais liberais em
ascensão da época adquiriam novos hábitos, se identificavam com uma nova cultura
urbana, inspirando no grupo não só um desejo de renovação, mas também de retorno a
uma modernidade já experimentada no início do século XX durante a Belle Époque. Desta
forma, os bangalôs ecléticos se tornavam anacrônicos para suas necessidades funcionais e
simbólicas. Modernidade esta que Adrián Gorélik (1999) pontua como o caminho para a
modernização, o modo de vida e a organização social generalizada e institucionalizada.
Dentre este cenário, destaca-se a atuação dos engenheiros no princípio dos anos 1930 e
adiante, muitos deles como: Laurindo Amorim, Judah Levy, Agenor Penna de Carvalho e
Camilo Porto de Oliveira. Os primeiros em edifícios em altura e o ultimo destaca-se na
arquitetura moderna pela produção de projetos de residenciais unifamiliares, com obras
icônicas na capital paraense.
Ainda segundo Chaves (2012) Camilo Porto de Oliveira foi também um dos responsáveis
pela inserção das inovações da arquitetura moderna brasileira em Belém do Pará, contudo,
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assim como outros engenheiros de sua época, principia a sua trajetória profissional
respeitando a práxis no setor construtivo da cidade daquele momento, bangalôs ecléticos e
com claras referências ao colonial. No entanto durante as décadas de 1940 e 1950 a cidade
de Belém apresenta uma nova elite vigente composta por comerciantes, empresários e
profissionais liberais adquirirá terrenos nos chamados segundo e terceiro “eixos” de
modernização (bairros nobres visados pelo poder público, vistos como “potencializadores”
da modernização), terrenos estes afastados e de amplas dimensões, inseridos em um
contexto distinto aos ofertados no centro da cidade. Dessa forma, surge a necessidade de
um novo modelo de moradia capaz de satisfazer a essa demanda pungente.
Segundo Dias et al (2017) as áreas do entorno desse eixo principal, passaram a ser
pontuadas por obras de referências modernas, as quais confrontavam e incrementavam a
antiga estética residencial do ecletismo. E é neste panorama de renovação construtiva que
as soluções formais e peculiar plasticidade das obras de Camilo Porto se destacarão.
Camilo Porto não teve contato com arquitetura moderna produzida na Europa durante esse
período, mas estava familiarizado com as concepções tão contempladas durante suas
frequentes viagens ao Rio de Janeiro e São Paulo. Tais viagens somadas ao contato com
revistas e catálogos de arquitetura o proporcionaram ferramentas de projeto e alimentaram
um conhecimento, o qual seria executado em larga escala durante a década de 1950 em
suas propostas de residências (Chaves, 2012). Em uma entrevista concedida à Professora
Dra. Celma Chaves em 2002, o engenheiro-arquiteto afirma: “os professores aconselhavam
a não imitar a arquitetura do Niemeyer”, mas sua ponderação de que em Belém não se fazia
uma “autêntica” arquitetura moderna, foi segundo ele, o motivo do projeto de sua primeira
residência portadora de tais referências, a “Casa Moura Ribeiro” em 1949. Desde então as
residências do engenheiro passam a serem modelos seguidos nos círculos sociais da nova
burguesia.
Após a periodização dos projetos partiu-se para etapa de fotografia, o primeiro meio digital e
foi realizada com o equipamento Câmera Canon EOS Rebel T5, o processo de fotografar
cada prancha contida no acervo, de cada jogo de pranchas de projetos. Essa etapa
auxiliaria os colaboradores em uma etapa posterior da pesquisa, de desenho bidimensional
e na menor manipulação do material original do acervo, também na salvaguarda do
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conteúdo. E nesta etapa de fotografia detectou-se que alguns projetos apresentavam jogos
incompletos, ausências de pranchas de elevação, cortes, entre outros dados gráficos
presentes em projeto de arquitetura.
A residência Carlos Dias (1952) se assemelha aos bangalôs ecléticos, em seu exterior
contem beiral aparente, varandas que circundam mais de uma fachada e telhado em quatro
águas. Encontra-se nas plantas sua configuração interna, observa-se uma
compartimentação e setorização dos ambientes que ainda se utilizam das concepções
ecléticas de separação de setores, sendo os setores de serviço e social situados no primeiro
pavimento, enquanto o setor íntimo encontrava-se no segundo pavimento, tendo esta
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circulação linear e do tipo hall. Deste modo, infere-se que as manutenções destas
características referentes à tipologia de bangalôs estão em consonância com o pensamento
de Chaves (2015), quando afirma que a população belenense ainda estava acostumada
com uma arquitetura tradicional. Desta maneira, demonstra-se os limites das demandas
socioculturais e econômicas, bem como as tramas da categoria profissional.
Percebeu-se que houve uma nítida mudança nos projetos nos anos 1960, que nos
direcionou a valorizar esse segundo momento projetual relacionado as ideias de vanguarda
como o racionalismo, funcionalismo e purismo, ressaltando mudanças de caráter técnico-
formais. O projeto para a residência do Dr. Renato Chalú Pacheco (1963), no que ressalta
Dias et al (2017), já demonstra um processo de simplificação nas obras de Camilo Porto, o
arquiteto ainda matinha alguns “signos” do modernismo em seus projetos, tais como as
grandes esquadrias de vidro, o painel de pedra polida e o split level, e apesar não
apresentar tantos cômodos distintos, mantém, ainda assim, o padrão de situar o setor íntimo
no pavimento superior e a proximidade do living à sala de jantar.
Ainda segundo Dias et al (2017), a residência Aziz Mutran (1966) se situa no terreno
ocupando grande parcela de sua totalidade, sendo os espaços não construídos destinados
ao jardim, área precedente e posterior a centralidade da casa, e aos encurtados espaços
laterais, provocados por subtrações em sua forma retangular, planeada. A fachada tem
entre seus elementos a platibanda, janelas em venezianas com grandes vãos e uma grande
diversidade de texturas disseminadas por sua fachada principal e lateral esquerda, o que
nos conduz a identificar um forte indicativo dos ideais modernistas. A setorização é um caso
a parte, os setores social e íntimo dividem o mesmo pavimento com um peque diferença de
aceso feito por uma rampa. O setor de serviço e a garagem são os únicos que permanecem
sob o mesmo nível da rua, deste modo ainda se nota, a presença da compartimentação
visando a funcionalidade da casa. Observou-se também que a estratificação social
continuava refletindo-se na hierarquia e organização espacial, demarcando no território
doméstico, e retrocedendo a mesma compartimentação física das casas do ecletismo
(CHAVES, 2016).
Nota-se a representatividade do trabalho realizado por Camilo Porto de Oliveira, sob esta
pequena amostra da análise de seu acervo, e onde suas obras se localizavam no centro da
cidade ou nas proximidades dele. Este princípio de estudo apenas norteia os rumos da
pesquisa, em busca de alcançar a mais de uma centena de projetos adquiridos pelo
Laboratório de Historiografia e Cultura Arquitetônica.
Considerações Finais
O desenvolvimento deste estudo aborda a produção de arquitetura moderna na Amazônia,
no caso da cidade de Belém, em suas possibilidades e adequações regionais. O estudo que
compreende a análise da realidade projetual ligado a um exame conceitual-conceptivo
desses projetos, sob a uma base tecnológica que auxiliaria no processo de conclusões
acerca da relação da obra e seus atores, nos contextos de construção e entorno. Além
disso, é importante destacar que a sistematização e redesenhos de um número expressivo
de pranchas. Portanto, o trabalho ressalta o processo heterogêneo de difusão da renovação
formal moderna, a partir de uma comparação entre as obras e de uma revisão historiográfica
como “[...] meio para conhecer a própria realidade e, em consequência, projetar um futuro
próprio livre da limitação dos modelos alheios” (WAISMAN, 2013), as verificações
preliminares do estudo presentes neste artigo possibilita a trama e a ruptura dos paradigmas
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correspondentes ao processo de modernização nas realidades distantes dos grandes eixos
de difusão econômico-cultural, contribuindo para a valorização da produção formal-teórica
acerca da arquitetura moderna produzida em Belém.
Referências Bibliográficas
CARVALHO, Bárbara Moraes de. Arquitetura Pública Moderna: Uma Caracterização
entre Tipologia e Lugar na Cidade de Belém. 2013. 121 f. Dissertação (Mestrado) - Curso
de Arquitetura, Universidade Federal do Pará, Belém, 2013.
JONES, Will. Cómo leer edifícios modernos: Uma guía de arquitectura de la era
moderna. Ediciones Akal S.A. Madrid-España. 2016