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RESUMO
Estuda a trajetória dos direitos humanos e sua relação com os direitos fundamentais. Reflete
sobre a dignidade da pessoa humana e a efetividade da prestação jurisdicional. Utiliza revisão
bibliográfica como metodologia para construir esse arcabouço teórico. Realiza também
revisão documental, do CPC vigente e do novo CPC, para traçar um paralelo entre ambos.
Identifica que os novos dispositivos legais podem levam a um menor rigor no atendimento ao
disposto no art. 319, II, do novo CPC. Pontua, com base nessas análises, que as inovações
permitem um maior protagonismo do Magistrado. Pondera que essas inovações podem
decorrer do diálogo das fontes, em especial com o direito processual do trabalho. Conclui,
com base nessas reflexões, que a introdução dos §§ 1º ao 3º no artigo 319, do novo CPC pode
permitir uma maior efetividade da prestação jurisdicional enquanto direito fundamental.
1 Considerações iniciais.
O presente artigo surge a partir da identificação de inovações jurídicas no que diz
respeito aos requisitos legais da petição inicial no processo comum, identificação que decorre
da publicação na imprensa oficial, em 17 de março de 2015, da Lei Federal 13.105/2015 –
mais conhecida como o novo Código de Processo Civil (CPC).
Em face do disposto no artigo 1º dessa nova norma jurídica, que se encontra em
vacatio legis de um ano, salta aos olhos a necessidade de revisitar o diploma normativo
constitucional com vistas a utilizá-lo como fonte hermenêutica fundamental.
Em vista disso, e considerando os valores e princípios que formam a base da Carta
Magna, em especial no que diz respeito ao Preâmbulo e aos direitos e garantias, pareceu-nos
essencial que o presente estudo apresentasse um panorama jurídico a partir da trajetória
histórica e conceitual dos direitos humanos, pois o tipo de direito que serve como fundamento
da República Federativa do Brasil, conforme o artigo 1º de sua Constituição.
Deve-se ter em mente que ao se falar em trajetória de uma visão ou de um
conceito se deduz que essa visão ou esse conceito não foi o mesmo ao longo do tempo mas,
1
Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Especialista em Direito do Trabalho e
Processo do Trabalho pela ESA (OAB/PE). Mestrando do Programa de Pós-graduação em Direitos Humanos da
Universidade Federal de Pernambuco . Advogado militante.
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ao contrário, que a compreensão atual acerca de seu sentido não é o mesmo de séculos atrás.
Podemos dizer que os direitos humanos:
requerem três qualidades encadeadas: devem ser naturais (inerentes nos seres
humanos), iguais (os mesmos para todo mundo) e universais (aplicáveis por
toda parte).
Para que os direitos sejam direitos humanos, todos os humanos em todas as
regiões do mundo devem possuí-los igualmente e apenas por causa de seu
status como seres humanos. (HUNT, 2009, p. 19)
Essa visão pode parecer óbvia, bem como pode soar natural se falar em direitos
humanos para todos como indissociável de uma sociedade organizada sob as normas de um
Estado democrático de Direito, nos moldes da formação liberal dos países do ocidente.
No entanto, é essencial lembrar que os direitos humanos nem sempre tiveram essa
conceituação, razão pela qual se torna fundamental conhecer o processo histórico de sua
formação e de seu aperfeiçoamento político e institucional. Assim, por meio de revisão de
literatura e análise documental, apresentamos uma visão da trajetória dos direitos humanos e
suas similitudes e distinções em relação aos direitos fundamentais.
Em seguida, realizamos uma reflexão acerca da dignidade da pessoa humana e a
eficácia normativa como pressupostos para uma efetiva prestação jurisdicional. A abordagem
incluiu não apenas a questão do conceito de dignidade ao longo do tempo, mas também o seu
enquadramento no arcabouço jurídico interno.
Feita esse exame iniciamos o estudo da efetividade da prestação jurisdicional,
apontando semelhanças e distinções entre conceitos como concretização, realização, eficácia e
efetividade, sempre à luz dos fundamentos teórico-normativos apresentados anteriormente.
Por fim, traçamos um paralelo entre os requisitos da petição inicial no CPC
vigente e o novo CPC. Apresentamos uma análise crítica da eventual adequação do artigo
284, do CPC vigente, em relação a todas as questões de fundo constitucional anteriormente
discutidas. Em seguida, abordamos a questão do diálogo das fontes e as relações entre o
direito processual civil e o direito processual do trabalho.
Por fim, indicamos quais foram as inovações trazidas pelo artigo 319, §§ 1º ao 3º,
do novo CPC e de que forma elas se coadunam com os princípios e valores estudados
anteriormente no presente artigo.
Esperamos que, ao final, o presente escrito contribua na identificação de pontos
relevantes no que tange à melhor técnica jurídica, com vistas a um ingresso seguro em juízo,
seja em relação aos feitos que venham a ter o CPC como a principal norma processual, seja
em relação às ações que venham a ser distribuídas no âmbito da Justiça do Trabalho.
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Parece-nos importante, ainda, apresentar uma distinção objetiva entre direitos humanos
e direitos fundamentais, a fim de que se possa fazer referências a esses ou aqueles de forma
mais precisa, apreendendo-se o real sentido de um e de outro.
Objetivamente, podemos afirmar que os autores – ao menos parte considerável desses –
consideram que os direitos humanos são aqueles reconhecidos no âmbito do direito
internacional como direitos inerentes à condição do homem enquanto ser, e que não
encontram limites nas fronteiras dos Estados. Já os direitos fundamentais são os direitos
humanos incorporados ao ordenamento jurídico-constitucional. (ANDRADE, 2008, p. 16).
A partir desse entendimento se pode falar em direitos humanos como premissas do
surgimento das normas relativas a direitos fundamentais, no ordenamento jurídico interno dos
países, a exemplo dos direitos contidos na Constituição da República Federativa do Brasil, de
1988 (CR/88), em seu Título II, (BRASIL, 1988, b) e que trata dos direitos e garantias
fundamentais, com a seguinte organização: dos direitos e deveres individuais e coletivos, dos
direitos sociais, da nacionalidade, dos direitos políticos e dos partidos políticos.
Vê-se claramente a distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais, posto que
esses – normas constitucionais que tratam de direitos e deveres fundamentais – são inspirados
naqueles. Por exemplo, veja-se que o artigo 3º, da DUDH, determina que “Todo o homem tem
direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.”. Trata-se de direito humano, não obstante
positivado no ordenamento jurídico internacional.
Dito direito humano, o direito à vida, é positivado no ordenamento constitucional
brasileiro por meio do artigo 5º, caput, da CR/88.
Clara, portanto, a distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais, posto que
esses são inseridos no ordenamento jurídico em face da influência, direta ou indireta,
daqueles. (CADEMARTORI, 2012, p. 8)
Importante registrar que, assim como a distinções acima, diversas são as apresentadas
na doutrina, seja em relação a direitos humanos e direitos fundamentais, seja em relação às
distinções ou semelhanças entre si ou ainda sob outros primas de análise.
Ao final, mais importante do que realizar profundos estudos a fim de definir com
clareza as distinções e semelhanças entre direitos humanos e direitos fundamentais, e sua
conceituação, seja buscar caminhos e mecanismos que viabilizem a efetiva garantia e proteção
desses direitos. Nesse sentido, alinhamo-nos ao pensamento de Norberto Bobbio no sentido
de que “o problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de
justificá-lo, mas o de protegê-los”. (BOBBIO, 1992, p. 24)
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A exemplo, veja-se que a DUDH estabelece como direitos humanos, em seus artigos 1º e 3º, dentre outros, a
liberdade, a igualdade e a vida. Da mesma forma, o artigo 5º, da CR/88, positiva-os como direitos fundamentais.
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A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
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Pois bem; a Carta Magna impõe ao Estado, por meio do artigo 5º, XXXV, da CR/883
(BRASIL, 1988, b) um dever de agir, qual seja, o de prestar a tutela estatal segundo as normas
da jurisdição sempre que houver a provocação do Estado, na figura do Estado-Juiz e conforme
a norma processual aplicável. Trata-se de direito fundamental do cidadão, constitucionalmente
previsto.
Contudo, para que haja o respeito à realização da dignidade da pessoa, por meio do
gozo desse direito fundamental, é essencial que essa prestação jurisdicional não seja vazia de
sentido, não se dê somente no plano teórico ou normativo, mas no mundo real,
fenomenológico. De fato, faz-se necessária a realização da norma constitucional, a
materialização do dispositivo legal em uma ação efetiva do Estado. (CARVALHO, p. 16)
A esse respeito, convêm ressaltar que
A concretização constitucional [...] vai consistir primeiramente em um
conjunto de procedimentos estruturados no sentido de garantir a eficácia da
constituição. [...] Temos, então, a concretização constitucional como um
método procedimental de garantia da eficácia da constituição a partir da
utilização dos procedimentos previstos na esfera metodológica pertinente.
[...]
Quanto à realização da constituição, temos essa ideia ligada ao que
conceituamos como efetividade. Consiste a realização constitucional na
aplicação prática da norma constitucional, ou seja, a concretização fática,
real, empírica, de seu conteúdo. [...] a realização da constituição está ligada
ao efetivo cumprimento da norma constitucional no plano social.
(GALINDO, 2006, p. 166-167)
Em razão disso se torna fundamental apresentar, mesmo que de forma bastante sucinta,
a distinção entre efetividade e eficácia, sendo essa ligada à norma propriamente dita e aquela
à repercussão fenomenológica, os reflexos da norma na realidade concreta; trata-se do “dever-
ser normativo e o ser da realidade social”. (BARROSO, 1996, p. 83)
A eficácia diz respeito à capacidade de uma determinada norma de produzir, de fato, o
efeito desejado no plano da realidade. (COL, 2002); de outra forma, “a possibilidade concreta,
real e imediata da norma ser realizada”. Já a efetividade se refere “à realização do postulado
normativo no âmbito fático, correspondendo então à noção de eficácia social.” (GALINDO,
2006, p. 164)
Relativamente à efetividade se indaga:
Será que o direito à tutela jurisdicional é apenas o direito ao procedimento
legalmente instituído, não importando a sua capacidade de atender de
maneira idônea o direito material? Ora, não tem cabimento entender que há
direito fundamental à tutela jurisdicional, mas que esse direito pode ter a sua
efetividade comprometida se a técnica processual houver sido instituída de
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A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito.
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Maior.
Pois bem; da leitura do artigo 5º, da CR/88, podemos extrair dois importantes princípios
que informam a interpretação a ser data às normas do novo CPC; quais sejam, o da celeridade
(art. 5º, LXXVIII) e o da efetividade processuais.
Como visto, a norma processual deve ser não apenas eficaz, mas efetiva, especialmente
diante das normas constitucionais postas e do disposto no art. 1º, do novo CPC.
No que tange à norma processual em específico, os requisitos da petição inicial estão
dispostos, tanto no CPC vigente quanto no novo CPC, em Seção própria. No CPC vigente se
estendem do artigo 282 ao artigo 285-B. Já no novo diploma processual os requisitos estão
dispostos do artigo 319 ao artigo 321. Em face dos objetivos do presente texto limitaremos
nossa análise às inovações introduzidas pelos parágrafos 1º a 3º do artigo 319, do novo CPC,
que se remetem ao inciso II do mesmo artigo.
O texto do CPC vigente assim dispõe:
Art. 282. A petição inicial indicará:
I - o juiz ou tribunal, a que é dirigida;
II - os nomes, prenomes, estado civil, profissão, domicílio e residência do
autor e do réu;
[....]
Art. 284. Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos
exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades
capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a
emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias.
Por fim, o § 3º se mostra alvissareiro por privilegiar o acesso à Justiça, enquanto direito
fundamental do indivíduo e previsão constitucional que privilegia o exercício da cidadania e a
proteção da dignidade da pessoa do jurisdicionado.
5 Considerações finais.
Cremos ter ficado demonstrada, de início, a importância dos direitos humanos enquanto
fundamento das normas introduzidas no ordenamento jurídico, por meio dos direitos e
garantidas fundamentais já existentes e outros que venham a se fazer necessário proteger em
tempos futuros.
Nessa linha de raciocínio, acreditamos que as inovações trazidas pelos §§ 1º a 3º do
novo CPC vem a oxigenar a prática forense e permitir que se imprima uma maior celeridade
ao andamento do processo por meio da adoção de práticas e de uma hermenêutica que
valorize a efetividade da prestação jurisdicional em detrimento do rigor formal.
Certamente há muito ainda por fazer, no que se refere a se ter, de fato, um Estado de
direito no Brasil, no sentido posto pela Carta aos Brasileiros. (TELLES JUNIOR).
Contudo, acreditamos que inovações como as trazidas pelo novo CPC e estudadas neste
artigo são um passo importante, sendo certo que é preciso estar atendo a fim de se buscar
construir uma hermenêutica jurídica efetivamente comprometida, por meio da aplicação das
diversas normas jurídicas, com o respeito e a defesa intransigente dos direitos fundamentais.
Somente assim, e disso estamos convictos, estarmos no caminho de uma Justiça cada vez
menos imperfeita.
Ao final, a melhor hermenêutica, baseada nos valores e nas normas fundamentais
estabelecidas na CR/88, permitirá que se caminhe em direção à sociedade idealizada pela
Assembléia Nacional Constituinte, refletida no Preâmbulo da Carta Magna, não raro ignorada
como fundamento filosófico e político do texto constitucional, mas aqui transcrita:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-
estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de
uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
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