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O Imaginário , O Real e

O Simbólico
A tripartição estrutural
estabelecida por Lacan
O Imaginário, O Real e O Simbólico
HISTÓRICO:

A tripartição estrutural real-simbólico-imaginário


(RSI) estabelecida por Lacan desde a conferência
pronunciada em julho de 1953 na fundação da
Sociedade Francesa de Psicanálise e intitulada “ O
simbólico, o imaginário e o real” foi objeto de
contínua investigação até o fim de seus
seminários.

Embora esta tripartição não apareça


nomeadamente na obra freudiana, Lacan tira dela
todo o seu alcance, de modo que, sem ela
dificilmente seria possível entender a essência
das teses freudianas sobre o psiquismo.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
É possível dizer que os três registros psíquicos
desta tripartição concernem aos três grandes
segmentos da descoberta freudiana, como se
as diferentes regiões da vasta obra de Freud
pudessem confluir, todas elas, para cada um
desses registros nomeados por Lacan.

O próprio Lacan afirma que o RSI são


categorias elementares sem as quais não é
possível distinguir nada da experiência humana.
Na verdade, não se pode pensar nenhum
desses registros a não ser em suas relações
com os outros.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Mais de vinte anos depois dessa conferência
inaugural, em 1974-75, o seminário de Lacan foi
denominado RSI e nele empenhou-se em fazer um
balanço sobre os desenvolvimentos introduzidos
ao longo de todos esses anos de seminário em
torno dessa tripartição. Lacan, ao fazer esta
avaliação, afirma:

“Freud não tinha do imaginário, do simbólico e


do real a noção que eu tenho, mas mesmo assim,
tinha uma suspeita de suas existências. Aliás, é
verdade que pude extrair meus três registros de
seu discurso, com tempo e paciência. Comecei
pelo imaginário, depois tive que mastigar a
história do simbólico com essa referência
lingüística e acabei por lhes perceber esse famoso
real, sob a forma do nó.”
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Neste momento, tratava-se para Lacan de reunir
os três registros, ou como ele mesmo afirma, as
três instâncias sob a nova ótica adquirida por
meio do nó borromeano.

Foi na mesma conferência que parece ter surgido


pela primeira vez a célebre fórmula lacaniana do
“retorno aos textos freudianos”, que Lacan
introduziu também pela primeira vez a sua tópica
RSI.

É desnecessário sublinhar a relevância desse fato:


o retorno a Freud, promovido por Lacan, acha-se
intimamente associado à nomeação dessas três
instâncias psíquicas.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Sua conferência: O Real ,o Imaginário e o
Simbólico tinha como objetivo político fazer da
SFP o lugar de uma nova ortodoxia freudiana
para enfrentar a corrente adaptacionista da
psicanálise norte-americana, pois neste
momento, a obra de Freud caíra num acentuado
esquecimento em prol das leituras revisionistas
promovidas pelos pós-freudianos.

Lacan considera essa conferência uma


verdadeira introdução para uma certa orientação
do estudo da psicanálise e a encerra dizendo
que fez apenas uma introdução ao relatório de
Roma sobre o tema da linguagem na psicanálise.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Histórico

Lacan considera essa conferência uma verdadeira


introdução para uma certa orientação do estudo
da psicanálise e a encerra dizendo que ali fez
apenas uma introdução ao relatório de Roma
sobre o tema da linguagem na psicanálise.

Segundo Elisabeth Roudinesco, essa conferência


constitui, juntamente com o “Discurso de Roma”,
um verdadeiro bloco que representa o primeiro
passo para a elaboração de uma teoria do
tratamento, sua direção, sua temporalidade e suas
pontuações.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Na conferência de 1953, o RSI são apresentados
como três registros muito distintos e essenciais
da realidade humana. O Real é apresentado
desde já como aquela parte dos sujeitos que
nos escapa na análise, como aquilo que
constitui os limites de nossa experiência.

O Imaginário, surge para descrever apenas os


ciclos instintuais dos animais, nos quais
pode-se ver ocorrer um certo número de
deslocamentos, que significam um esboço de
comportamento simbólico. O imaginário deve
ser considerado a partir da imagem.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
O Simbólico tem a ver com uma função complexa
e latente que envolve toda atividade humana,
comportando uma parte consciente e outra
inconsciente, ligadas à função da linguagem e,
mais especialmente à do significante mais o
saber. O simbólico está em jogo na própria
experiência analítica, ele é responsável pelas
profundas transformações no sujeito.

O simbólico faz do homem um ser de fala, regido,


subvertido pela linguagem, o que determina as
formas do seu vínculo social e, principalmente
suas escolhas sexuadas.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Muitos anos depois, no seminário RSI, Lacan irá
mostrar que os três registros
real-simbólico-imaginário não podem ser isolados,
uma vez que se apresentam unidos de modo
indissolúvel na topologia do nó borromeano, tipo
de nodulação em que os elos, pelo menos três,
estão amarrados uns aos outros de tal forma que,
se cortarmos apenas um deles, todos os outros se
desligam simultaneamente.

Lacan considera que foi através deste nó que


pôde demonstrar algo que seria impossível
expressar: de que é preciso pelo menos três para
que a estrutura se dê.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
HISTÓRICO:

Pode-se observar, ao longo do ensino de Lacan,


um deslocamento da ênfase que é posta em cada
um dos registros, caminhando de início do
imaginário para o simbólico e, finalmente
desembocando no real.

Assim, no “estádio do espelho” é o registro


imaginário que é elaborado enquanto tal, ao passo
que em “Função e campo da Palavra” e na
“Instância da Letra” trata-se da tematização
aprofundada do simbólico.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Já o real, pode-se ver o interesse crescente que
nele é posto por Lacan a partir da introdução do
objeto a no seminário sobre “O desejo e sua
Interpretação”. O que não impede que já se
tenha, desde o estádio do espelho, elementos
embrionários que servirão para a elaboração do
simbólico e do imaginário.

A tripartição RSI engendra-se, para Lacan, a


partir da questão central da psicanálise, a
diferença sexual, uma vez que a prática
psicanalítica evidencia que a realidade do
inconsciente é sexual.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
HISTÓRICO:

Lacan depreende dos textos freudianos sobre a


sexualidade o fato de que o imaginário do sujeito
falante, opostamente ao do animal, que é pleno,
sem brechas, apresenta uma falta originária, uma
falta real que virá precisamente ser preenchida
pelo simbólico.

Neste sentido, Lacan falou dessa falha no


imaginário do sujeito humano como sendo uma
falta congênita que o ser real do homem apresenta
em suas relações naturais.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
O simbólico é aquele registro, heterogêneo ao
imaginário, que vem ocupar, no sujeito, o lugar da
falta real primordial de seu imaginário.

Lacan especifica que o humano se caracteriza


pela fala, daí o neologismo parlêtre (fala-ser),
neologismo que unifica num único termo o ser e a
fala.

O fato de caracterizar-se como um ser de


linguagem tem como conseqüência tornar
precário o estatuto do seu ser, pois o discurso
filosófico apresentava, e ainda apresenta, em seu
horizonte a idéia de unidade originária do ser
humano.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Para Lacan, ao contrário, o que a psicanálise
evidencia é que o ôntico para o ser falante é
precisamente uma falta originária, daí ele
introduzir outro neologismo hontologie, que
associa a vergonha (honte) à ontologia: se o
ôntico para o humano está relacionado com a
vergonha, é porque o sexual e a destrutividade
estão em seu cerne.

No “estádio do espelho”, ao introduzir sua


temática do imaginário, Lacan demonstra que
este se caracteriza, no sujeito falante, por estar
submetido à função simbólica.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
O estádio do espelho representa o momento de
constituição da matriz originária do eu, que, sendo
a sede das posteriores identificações imaginárias
alienantes, tem o poder de uma verdadeira estátua
pregnante. Uma imagem de si próprio que
prevalece em suas relações cotidianas.

Ao estabelecer a distinção fundamental entre o eu


e o sujeito, Lacan distingue a um só tempo o
imaginário e o simbólico e indica a posição
excêntrica do sujeito em relação ao eu. Para
Lacan, a descoberta freudiana do inconsciente
reside na apreensão primeira de que o sujeito não
é o indivíduo, termo que provém do latim e que
significa aquele que não é dividido.
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Ao contrário desta unidade proposta para o indivíduo, o
sujeito se especifica por sua divisão constitutiva, sendo
determinado pelo simbólico justamente enquanto barrado,
dividido pelos significantes que o constituem. Daí Lacan
escrever $ para designar o sujeito.

O lugar do sujeito é o lugar do corte, da escansão, da


ruptura, da lacuna , do evanescente, ao passo que o eu
representa precisamente a configuração da unidade, de
uma completude construída imaginariamente a partir do
olhar do Outro.

Tal unidade do eu é, para Lacan, uma miragem, um


engano. Em seu Seminário sobre O eu na teoria e na
técnica da psicanálise, Lacan destaca a clivagem entre o
plano do imaginário e a função simbólica que não lhe é
homogênea e cuja introdução na realidade constitui um
forçamento.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Lacan aborda o tema do real de dois modos distintos:
• O real é o impossível de ser simbolizado
• O real é o que retorna sempre do mesmo lugar (a
compulsão à repetição)
Resumindo, o real remete sempre à falta originária da
estrutura, à falha constituinte do inconsciente.

O real não indica aquilo que comumente se chama


realidade, pois a realidade, diferente do real que já estava
ali, é essa montagem do simbólico e do imaginário.

O real, ao contrário, é precisamente aquilo que escapa a


esta realidade, o que não se inscreve de nenhum modo
pelo simbólico; ele remete ao traumático, ao inassimilável,
ao impossível.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Já a realidade, que é possível ser entendida como a
realidade psíquica, é configurada a partir da fantasia
inconsciente fundamental, modo pelo qual cada sujeito faz
face ao real da inexistência da relação sexual.

Situada na base da realidade psíquica, a fantasia é


constituída pelo simbólico, pelos significantes do Outro, e
mediatiza o encontro do sujeito com o que é inabordável
enquanto tal, o real.

Todo futuro relacionamento do sujeito com o seu


semelhante e com o mundo externo será sempre
mediatizado por essa tela de fantasia, por um lado
protetora do real traumático, e por outro, produtora de uma
fixação objetal perversa, o gozo específico a cada um.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Lacan fala de père-version para designar essa
entrada do sujeito no simbólico a partir de alguma
versão paterna constituinte de sua fantasia
inconsciente.

Se a fantasia protege do real, ela igualmente será


responsável pela produção de sintomas que
passarão a ter o valor de real para o sujeito.

O ensino de Lacan caminhou no sentido do


cerceamento cada vez mais rigoroso da categoria
do real e aquilo que ele considera o núcleo do
inconsciente desloca-se gradativamente, do
simbólico para o real.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Sobre este deslocamento diz ele: “O
inconsciente permanece o coração do ser para
alguns, e outros acreditarão seguir-me ao fazer
dele o outro da realidade.

A única maneira de sair disto é colocar que ele é


o real, o que não quer dizer nenhuma realidade.
O real na medida em que ele é impossível de
dizer, isto é, na medida em que o real é o
impossível, muito simplesmente.” No seminário
A topologia e o tempo (1978), Lacan situa o
inconsciente numa região intermediária entre o
simbólico e o real, articulado tanto com um
como com o outro: “O real é o inconsciente.”
O Imaginário, O Real e O Simbólico

O inconsciente é o simbólico”. Nessa perspectiva,


Lacan poderá afirmar que a clínica psicanalítica “é
o real na medida em que ele é o impossível de
suportar”.

Tal articulação interna e indissociável entre o


simbólico e o real merece ser distinguida do
seguinte modo: o núcleo do inconsciente é real, é
uma falta originária constituída pelo objeto
perdido do desejo e é em torno dessa falta que o
inconsciente se estrutura, no simbólico, como
uma linguagem. Lacan esclarece esse ponto ao
chamar a atenção para o fato de que “estrutura” é
sinônimo de simbólico e de linguagem.
O Imaginário, O Real e O Simbólico
Há uma certa redundância na afirmação lacaniana de que
“o inconsciente é estruturado como uma linguagem”.
Quando Lacan faz esta afirmação, ele se refere ao
inconsciente na medida em que esse nos é revelado na
experiência clínica através das formações do inconsciente:
sintomas, sonhos, atos falhos, mas o núcleo do
inconsciente é real enquanto radicalmente inabordável
pelo simbólico.

Assim, as formações do inconsciente são estruturadas


pelo simbólico e se depositam sobre o furo do real
constituído pelo troumatisme (palavra que associa o furo,
trou, ao trauma) estrutural.

A própria definição do real enquanto o impossível de ser


simbolizado faz referência ao registro da linguagem, do
simbólico, como também revela que é apenas através do
simbólico que se tem acesso ao real.

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