O surgimento de novas tecnologias como a câmera fotográfica no campo artístico, acabou
por revelar que toda representação por mais mimética que seja é artificial, ou seja, uma construção da realidade. Também deixa ainda mais visível, o processo no qual todo trabalho artístico é submetido: a montagem, cada vez mais fragmentada com o progresso industrial. Assim como o pintor, o fotógrafo torna-se um manipulador de signos, os vai selecionando e ordenando em determinado suporte, afim de criar uma composição que melhor traduza suas intenções. E isto não é diferente no cinema, a arte da imagem em movimento, onde a montagem cinematrográfica é um poderoso recurso na construção de um olhar sobre determinado tema, seja ele uma representação ou abstrato. Ao dispôr as cenas numa ordem específica, o diretor do filme cria uma narrativa temporal dotada de ritmo e atmosfera, guiando o olhar do espectador sobre a obra, potencializada ainda mais pelo escuro da sala de cinema. Dentre as diversas obras incluídas no CD-ROM, escolhi cinco produções audiovisuais, para assim tentar ilustrar como o processo de montagem cinematográfica é trabalhado por cada diretor. Em "A chegada do trem na estação de Ciotat" (1895) de Louis e Auguste Lumière, presente no bloco Movimento, estamos diante da gênese do cinema e de suas primeiras apresentações em público. O filme traz a filmagem da chegada do trem à estação, a partir de um plano-sequência fixo. Uma montagem simples, ainda sem o uso da fragmentação da cena, e que nos remete às pinturas realistas e a sua preocupação com a representação da realidade. Em "Outubro" (1927) de Sergei Eisenstein, presente no bloco Fragmentação, podemos perceber uma maior experimentação da linguagem cinematográfica, na construção de um discurso repleto de subjetividade, metafórico, extraindo o máximo dos signos, ao contar a queda do Tzar e revelar o clima de mudanças e revoluções sociais da época. Em "O gabinete do Dr. Caligari" (1919) de Robert Wiene, presente no bloco Distorção e uma importante obra do cinema expressionista alemão e experimental, podemos perceber a força da montagem na construção de soluções plásticas que tentam traduzir bem os estados mentais da loucura. Já em "Um cão andaluz" (1928) de Luis Bunuel e Salvador Dalí, presente no bloco Profusão, parceria entre dois artistas surrealistas na construção de um filme bem experimental que tão bem traduz os mistérios do inconsciente. Por fim, em "O retorno à razão" (1923) de Man Ray, presente no bloco Abstração, estamos diante do resultado obtido a partir da utilização da linguagem cinematográfica por um fotógrafo experimental, que nos apresenta uma sequência desconexa de imagens (os fotogramas) revelando um caráter abstrato da montagem audiovisual.