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Fichamento do Capítulo I da obra Curso de Direito Administrativo de Celso Antônio Bandeira

de Mello
I. As funções do Estado
1. Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, o Direito Administrativo é o ramo do Direito
Público que disciplina o exercício da função administrativa, assim como pessoas e órgãos que a
desempenham. Busca identificar tal função cotejando-a com as demais funções estatais. Bandeira
de Mello define que função pública é a atividade exercida no cumprimento do dever de alcançar o
interesse público, mediante o uso dos poderes necessários conferidos pela ordem jurídica.

2. Hoje em dia, prevalece a afirmação de que há uma trilogia de funções no Estado: a legislativa, a
administrativa (mais conhecida como executiva) e a jurisdicional.

Essas funções estão distribuídas entre três blocos denominados “Poderes”, absorvendo as funções
correspondentes aos seus próprios nomes: Legislativo, Executivo e Judiciário.

3. Essa trilogia, segundo o autor do livro, não reflete uma verdade, trata-se de uma essência, ou
seja, é pura e simplesmente uma construção política que recebeu consagração jurídica.

Dentro de uma construção ideológica feita por Barão de Montesquieu, é fundamental dividir o
exercício dessas funções entre diferentes órgãos, mas sua distribuição não se processa de maneira a
preservar a rigidez absoluta a exclusividade de cada órgão no desempenho da função que lhe
confere o nome. Isso se da porque o Poder é uno.

II. Os critérios de distinção das funções do Estado


4. Os critérios para caracterizar as funções do Estado podem ser reduzido em apenas dois, segundo
Celso Antônio: A) um critério subjetivo, que se propõe a identificar a função por quem a produz e
B) um critério objetivo que toma em conta as atividades. Esse segundo critério pode ser
subdividido em dois: a) um critério objetivo material, que busca reconhecer a função a partir de
elementos intrínsecos a ela, e b) um critério objetivo formal, que se apega essencialmente em
características de direito, ou seja, em atributos especificadamente deduzíveis do tratamento
normativo que lhes corresponda.

5. Analisando esses critérios, nota-se que o subjetivo é insatisfatório, pelo fato de inexistir uma
correspondência exata entre um dado conjunto orgânico e uma certa função.

6. Sendo assim, tanto o Legislativo quanto o Judiciário, como Executivo, exerceriam as três
funções estatais: de modo normal e típico, principalmente aquela que lhes corresponde
primacialmente e, em caráter menos comum, funções pertinentes a outros órgãos do Poder. Sendo
assim, jamais de poderia definir com certeza se uma atividade é legislativa, administrativa ou
jurisdicional pelo simples fato de pertencer a um dos poderes.
7. Por outro lado, o autor também afirma que não se pode sufragar o critério objetivo material,
pois, no Direito, uma coisa é o que é por forca da qualificação dada pelo próprio Direito, ou seja,
não por alguma causa intrínseca.

8. Além disso, os qualificativos usados pelos que buscam identificar as funções pela essência delas
certamente não seriam capazes de aclarar a identificação a que se propõem, a não ser em relação a
atos da função administrativa, que mesmo que adotando critério objetivo material, ficariam a
margem da Administração.

9. Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, o critério adequado para identificar as funções do
Estado é o critério formal, ou seja, aquele que se prende a características impregnadas pelo próprio
Direito.

Assim, a função legislativa é a função do Estado, e apenas ele exerce, por via de normas gerais,
que se fundam direta e imediatamente na Constituição.
A função jurisdicional é a função que o Estado, e só ele, exerce por via de decisões que resolvem
controvérsias com força de coisa julgada, ou seja, que corresponde a decisão proferida em ultima
instancia pelo Judiciário.

A função administrativa é a função que o Estado ou quem lhe faça as vezes exerce na intimidade
de uma estrutura e regime hierárquicos e que no sistema constitucional brasileiro se caracteriza
pelo falo de ser desempenhada mediante comportamentos infralegais ou infraconstitucionais.

III. A função política ou de governo


10. Há certos atos que não se enquadram em nenhuma das três clássicas funções do Estado, como:
a iniciativa das leis pelo chefe do poder executivo, a sanção, o veto, a dissolução dos parlamentos
nos regimes parlamentaristas e convocações de eleições gerais, ou a destituição de altas
autoridades por crime de responsabilidade no presidencialismo, a declaração de estado de sitio, a
decretação de calamidade pública, a declaração de guerra. Todos esses são atos jurídicos que não
se encaixam na função jurisdicional, assim como não se enquadram na função legislativa (por
serem atos concretos). Também não se afeiçoam a função executiva, nem do ponto de vista
material, nem do ponto de vista formal.

Sendo assim, tais atos, na visão do autor, integram uma função que deveria se chamar “função
política” ou de “governo”, mas de maneira diferente do que tida na Europa, pois em vários países
europeus sustenta-se que os atos políticos ou de governo são infensos a controle jurisdicional,
entendimento este que é inaceitável por ser incompatível com o Estado de Direito.

III. A função política ou de governo


“Função política”, ou de “governo”, são as denominações dadas aos atos que não se alocam
satisfatoriamente em nenhuma das três funções clássicas do Estado, como por exemplo: a iniciativa
das leis pelo Chefe do Poder Executivo, a destituição de altas autoridades por crimes de
responsabilidade, a declaração do estado de sítio, declaração de guerra, etc. Tais atos não se
enquadram na função jurisdicional; na função legislativa, por serem atos concretos; não são
compatíveis à função executiva, pois não estão dirigidos à gestão concreta e imediata da sociedade,
mas sim a gerência de situações extremas, que pressupõe decisões essencialmente políticas.

IV. O Direito Administrativo


“O direito administrativo é o ramo do direito público que disciplina a função administrativa, bem
como pessoas e órgãos que a exercem” (BANDEIRA DE MELLO, Celso. Curso de Direito
Administrativo, pag.37, 32ª edição, 2015).
Porém, há parcelas que adentram a função administrativa, mas que são excluídos do Direito
Administrativo, e são tratados em seus próprios ramos. É o caso do Direito Tributário, do Direito
financeiro, do Direito Previdenciário.

V. Origem do Direito Administrativo


O Direito Administrativo teve origem na França. Após o triunfo da Revolução Francesa, inexistiam
disposições que regulassem a conduta do Estado com seus administrados, pois as normas
existentes até então disciplinavam apenas as relações entre particulares, desajustadas para a
regulação do Poder Público, com seus administrados, sendo todos já vinculados a uma ordem
jurídica.

Por esta nova disciplina que se formava, e pelas novas leis que nasciam, instituiu-se o Conselho do
Estado pelo artigo 52 da Constituição de 15 de Dezembro de 1799, e foi a partir das decisões deste
conselho que se forjou os princípios e concepções do que hoje se entende por Direito
Administrativo.

VI. As bases ideológicas do Direito Administrativo[1]


Celso de Mello alega que a impressão de que o Direito Administrativo é concebido em favor do
Poder, repousa de forma equivocada na cabeça das pessoas. Afirma que, infelizmente, formulações
doutrinárias tendem a contribuir para que o Direito Administrativo seja visto como um ramo do
direito aglutinador de “poderes” do Estado em sua feição administrativa, ao invés de ser
considerado como um conjunto de limitações aos poderes do Estado, ou, muito mais
acertadamente, como um conjunto de deveres da Administração em face dos administrados.

Talvez a razão primordial desta forma errônea de encarar o Direito Administrativo resida no fato
de que este, ao surgir, foi encarado como um direito que discrepava do “direito comum”, isto é, do
direito privado. Prossegue o autor que o Direito Administrativo, tal como foi sendo elaborado,
pressupunha existência, em prol do Estado, de prerrogativas inexistentes nas relações particulares,
as quais foram denominadas de “exorbitantes”.

Posteriormente com Léon Diguit nasce um pensamento inverso, no qual a ideia central do Direito
Administrativo seria a noção de “serviço público”, isto é, de serviços prestados à coletividade pelo
Estado, por serem indispensáveis à coexistência social. Observa-se que esta abordagem contempla
a ideia de que o “poder” seja o núcleo do Direito Administrativo. Assim, propõe uma visão de que
o Direito Administrativo e seus institutos organizam-se em torno do dever de servir à coletividade,
do encargo de atender as necessidades gerais.
O autor expõe, citando Cyr Cambier, que tal concepção põe no centro o dever de servir, e não no
poder de impor, suscitando com maior espontaneidade e coerência todos os temas ligados ao
controle do poder, às limitações à autoridade, à fiscalização dos atos Administrativos. As ideias de
dever e de função são as que cumprem com exatidão o papel do Estado de Direito e não o “poder”.

Celso de Mello argumenta que o risco de se colocar o “poder” como ponto central do Direito
Administrativo é de enfatizar uma concepção autoritária. Anota também que o verdadeiro titular do
poder é o povo (art. 1º, § 1º da Constituição da República), logo é este que está acima de tudo,
sendo o administrador um terceiro que gere os negócios de interesse do povo.
Em seguida o autor traz a questão: “onde, então, o lugar para o Poder no moderno Direito
Público?” Responde que este só aparece como algo ancilar, rigorosamente instrumental e na
medida estrita em que é requerido como via necessária e indispensável para tornar possível o
cumprimento do dever de atingir a finalidade legal.

Considerando a história do Direito Administrativo, Bandeira de Mello afirma que este nasceu com
o Estado Democrático de Direito, fora da lógica das relações entre Poder e soberano. Logo, o
Direito Administrativo só poderia existir a partir do instante em que o Estado estivesse
enclausurado pela ordem jurídica. Ele foi criado para regular a conduta do Estado e mantê-la
afivelada às disposições legais, dentro dos interesses do povo contra as motivações particulares dos
detentores do exercício do Poder estatal.

O autor manifesta que as bases ideológicas do Direito Administrativo são as que resultam das
fontes inspiradoras do Estado de Direito, e neste, considera que há a confluência de duas vertentes
de pensamento: a de Rousseau e a de Montesquieu.

O primeiro defendeu o princípio da igualdade de todos os homens e como decorrência disso se tem
a soberania popular. Porém, como não seria possível que todos pudessem atuar simultaneamente
no exercício do Poder, fez-se necessário a “representação” (abominada por Rousseau pelo fato de
acreditar que a soberania não poderia ser representada assim como não poderia ser alienada, sendo
melhor a democracia direta).

Quanto à Montesquieu, o pensador anotou que todo aquele que detém o Poder tende a abusar dele e
que o Poder vai até onde encontra limites. Assim, para melhor se controlar o Poder, nada melhor
do que o próprio Poder. Ou seja, cumpre fracioná-lo, para que suas parcelas se contenham
reciprocamente. E, desta forma, afirmou a ideia da tripartição do exercício do Poder.

Celso de Melo expõe um ponto crucial, afirmando que “o Estado de Direito é exatamente um
modelo de organização sócia que absorve para o mundo das normas, para o mundo jurídico, uma
concepção política e a traduz em preceitos concebidos expressamente para a montagem de um
esquema de controle de Poder”. Para isto, é necessário atenção ao princípio da igualdade, tão cara
à Revolução Francesa.

Dá sequência o autor alegando que a história política da humanidade trabalhou no sentido de


instaurar progressivamente garantias do indivíduo contra aqueles que exercem o Poder. Também
coloca que a partir de certo instante, começou-se a perceber que as pessoas eram prejudicadas, não
apenas pelos detentores do Poder político, mas também pelos que o manejavam: os detentores do
Poder Econômico. Surgiu então o Estado Social de Direito, preocupando em promover o bem estar
social.

Celso de Mello considera este modelo o mais avançado de progresso, colocando que a Constituição
Brasileira de 1988 representa perfeitamente este ideário. Entretanto, afirma que nos últimos anos o
Estado Social de Direito passou, em todo o mundo, por uma enfurecida crítica, coordenada por
todas as forças hostis aos controles impostos pelo Estado e aos investimentos públicos por ele
realizados. Ponderou também, que o fenômeno da “globalização” pretendeu reinstaurar o ilimitado
domínio dos interesses econômicos, entretanto este “movimento não passa, na História, de um
simples soluço, e já começa a despedir”.

VII. O regime jurídico-administrativo.


O Direito Administrativo se concretiza como ramo autônomo do Direito por possuir princípios que
lhe são peculiares e lhe dão identidade. Nesta perspectiva, a doutrina aponta seus princípios
básicos que o dão forma, como se inter-relacionam e o subprincípios derivados.

Devendo interpretar o princípio como preceito fundamental que se irradia de diferentes formas,
definindo a lógica e a racionalidade do sistema normativo, de forma que o descumprimento de um
princípio e se reveste de maior ilegalidade ou inconstitucionalidade.

Assentada a importância dos princípios, o autor Celso Antônio aponta que a analise global das
futuras tendências do Direito Administrativo são frutos da estrita analise das ideias centrais que o
norteiam, assim como da metódica dedução de todos os princípios subordinados a subprincípios
que descansam, originariamente, nas noções categorias que presidem sua organicidade (pag 55).

Importa indicar que o Direito Administrativo está entroncado ao Direito Público, reproduzindo
suas características, sendo a principal dela, a maior importância dada ao interesse da sociedade e o
interesse público em geral, acrescidas das suas características particulares.

Na perspectiva do Direito Administrativo, deve se enfatizar dois princípios: o da supremacia do


interesse público sobre o privado e da indisponibilidade, pela administração, dos interesses
públicos, sendo princípios específicos do ramo administrativo.

A importância dos citados princípios se mostra em sua tradução no sistema judiciário, porém, não
possuem valor absoluto, sendo apenas fonte-matriz do sistema, de maneira que ordenamento
jurídico o qualificou assim.

Como dito por Garrido Falla, o Direito Administrativo se ergue no binômio das prerrogativas da
Administração e dos direitos administrados. Esse binômio expressam os citados princípios
intrínsecos da Administração Pública possuindo funções explicadoras e aglutinadoras

VIII. Conteúdo do regime jurídico-administrativo[2]


b) Indisponibilidade, pela Administração Pública, dos interesses Públicos.

Celso de Mello alega que é um engano inferir que todo interesse público é exclusivamente
interesse do Estado. Na realidade, o autor define que o interesse público corresponderia à dimensão
pública dos interesses individuais, ou seja, todo interesse advindo de particulares com foco na
sociedade como um todo. Ressalva Celso de Mello, ainda, que não existe coincidência necessária
entre interesse público e interesse do Estado e demais pessoas de Direito Público.

O Estado pode, como entidade jurídica, possuir interesses públicos e privados. Ou seja, é
necessário observar que há circunstâncias em que o Estado age conforme seu individualismo em
questões que não possuem vínculo com o interesse público. Todavia, somente poderá defender
estes interesses próprios quando não se chocarem com os interesses públicos propriamente ditos.

Os interesses públicos propriamente ditos são os chamados pelo autor de interesses primários do
Estado. Dentre os vários exemplos apresentados pelo autor, dois merecem destaque: o primeiro
relata que, caso o Estado possua o interesse de aumentar a tributação desmesuradamente dos
administrados para enriquecimento do Erário, em contrapartida ao empobrecimento da Sociedade
e, segundo exemplo, seria reduzir os salários de seus funcionários a valores ínfimos. Em ambos os
exemplos, o Estado agiria em benefício próprio e não da Sociedade.

Os interesses secundários seriam os secundários e não podem, em qualquer hipótese, se sobressair


aos interesses públicos propriamente ditos, ainda que emanados do Estado, os quais “não
respondem à razão última de existir propriamente das pessoas governamentais em geral”. [3]

Na visão de Celso de Mello, a estrutura do conceito de interesse público responde a uma categoria
lógico-jurídica, que reclamam tal identificação. Cediço cuidar da diferença entre o interesse em
criar a norma propriamente dita e o interesse público. A norma, por mais que seja um grupo de
pessoas demonstre os seus devidos fundamentos do ponto de vista político e sociológico, ainda é
sempre necessário analisar como tal haja sido qualificado em dado sistema normativo. Em outras
palavras, não é possível criar uma norma, independente de qual seja, se esta por qualquer razão
violar a Constituição.
Sempre será do ponto de vista jurídico o interesse público nos termos do que estiver disposto
na Constituição, a qual representa o direito de toda uma sociedade que precisa ser protegido. Nesta
toada, é visível que há situações em que a Constituição, representação máxima do interesse
público, possa proteger o interesse particular em detrimento do Estado.
O autor exemplifica que é de interesse público que o sujeito que sofrer dano por obra realizada
pelo Estado seja cabalmente indenizado, como previsto no art. 37, § 6º do texto constitucional . Ou
seja, ocorre uma situação em que a Constituição privilegia o interesse privado, por meio de
proteção de bens e interesses individuais, sendo um caso, na visão do autor, de uma supremacia
inversa: a do interesse particular.
Dessa forma, por meio deste capítulo o autor busca demonstrar que, em via de regra, sempre será
predominado o interesse público propriamente dito e que, em determinadas situações, este direito
pode ser refletido por meio da proteção dos interesses particulares.

IX. Conteúdo do refirme jurídico-administrativo


a) Supremacia do interesse público sobre o privado

O autor afirma que o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular é o princípio
geral do direito inerente a qualquer sociedade. Uma vez que, a própria existência do Estado
somente possui sentido se o interesse a ser por ele almejado e protegido for o interesse público, ou
seja, o de todos.

Este princípio surgiu no século XIX, vez que o direito deixa de ser apenas um instrumento de
garantia os direitos dos indivíduos e passa a objetivar a consecução do bem de todos e da justiça
social. A Constituição Federal prevê no artigo 37, os interesses representados pela Administração
Pública, e têm a sua aplicação na efetiva atuação do princípio da supremacia do interesse público.
Deste princípio entende-se, que em todos os conflitos existentes entres um particular e um
interesse público, sempre deve prevalecer o interesse de todos, do coletivo, significa que o poder
público possui autoridade sobre o particular. Essa é uma das atribuições conferidas à administração
pública, uma vez que ela atua por conta de tal interesse, ou seja, o Poder Legislativo ao editar suas
leis ou normas, deve se orientar por esse princípio, levando em consideração que a coletividade
está em um nível acima ao do particular, podendo até modificar, ainda que unilateralmente,
relações já estabelecidas no passado.

O autor diz que o Estado, ao contrário dos particulares, não tem livre escolha em relação aos seus
contratantes, sendo obrigado a licitar para então descobrir a outra parte. Todos os princípios
sofrem, evidentemente, limitações e temperamentos e, têm lugar na conformidade da lei, de acordo
com os limites, respeitados os direitos.

Infelizmente, na prática não é isso que acontece, muitas vezes esse princípio é ignorado e em
consequência temos normas ou leis que favorecem apenas o particular, ou os mais abastados ou
influentes. Por isso é que deve ser designada à administração pública, por enquanto, o dever de
interpretar o interesse público, sempre comparando com a realidade de cada um, no caso concreto.
E em seguida, cabe ao judiciário, examinar a exatidão com as leis e a constituição federal .
b) Indisponibilidade, pela administração, dos interesses públicos.

De acordo com Celso Antônio Bandeira De Mello, a administração pública, assim como as pessoas
administrativas, já que subordinada à lei, não tem disponibilidade sobre os interesses públicos. Na
administração, os bens e os interesses não estão à livre disposição de vontade do administrador.
Vale ressaltar que o titular dos referidos direitos é o Estado, a administração apenas tem o dever de
curá-los nos termos das finalidades predeterminadas legalmente, as quais se compreende que
estejam submetidas aos seguintes princípios:

(i) Princípio da legalidade: Tal princípio explicita a subordinação da atividade administrativa à lei.
Nas palavras de Celso Antônio Bandeira De Mello “A lei inúmeras vezes, ao regular abstratamente
as situações, o faz de maneira à irrogar ao administrador o encargo de eleger, perante o caso
concreto, a solução que se ajuste com perfeição às finalidades da norma, para o que terá de avaliar
conveniência e oportunidade caso a caso”.
• O princípio da legalidade abrange o da finalidade. Já que, de acordo com o autor, não se
compreende uma lei e não se entende uma norma sem entender qual o seu objetivo. Entende-se que
há abuso de poder quando a Administração não atende ao fim legal, ao qual está obrigada;

• Decorre também o princípio da razoabilidade, pois a Administração tem certa liberdade para
escolher o comportamento cabível e mas adequado diante do caso concreto. Ainda, de acordo com
Edmir Netto de Araújo "o princípio da razoabilidade traduz a congruência lógica entre o fato (o
motivo) e a atuação concreta da Administração;

• Além desses, também é decorrente do princípio da legalidade o da proporcionalidade do ato à


situação que demandou a sua expedição. Já que a lei outorga competência tendo em vista um certo
fim. Assim, qualquer medida administrativa mais intensa ou mais extensa que a prevista é tida
como inválida, ela ultrapassa a sua finalidade legal;

• Outro princípio postulado pelo da legalidade é princípio da motivação, isto é, o que impõe à
Administração Pública o dever de expor as razões de direito e de fato pelas quais tomou a
providência adotada. Isso é necessário pois, se por exemplo, a administração tinha uma certa
liberdade para fazer um ato, não se saberia ao certo se ele atingiu à sua finalidade, se foi tomado de
acordo com a legalidade e se obedeceu à razoabilidade e à proporcionalidade. Importa dizer que a
ausência de motivação torna o ato nulo desde a sua enunciação;

• Tratando-se da premissa maior da Administração Pública, isto é, da indisponibilidade dos


interesses públicos, o autor Celso Antônio Bandeira de Mello cita uma série de princípios
essenciais que estão direta e indiretamente conectados com o supracitado, dos quais objetivam o
bom funcionamento e a busca pelo atendimento ao interesse público por parte da Administração.

O princípio da ampla responsabilidade do Estado é visto pelo autor como o grande responsável
pela existência de outro princípio presente em todo o Direito, o princípio da Legalidade. Isso
porque o Estado possui obrigações e deveres e, tratando da Administração pública, esses são a
busca pelo interesse público, do qual, se não atingido, seja por atos ineficazes ou pela própria
omissão deles, a própria Constituição Federal brasileira aplica sanções. Esse princípio, ainda, é
entendido por Bandeira de Mello, como sendo completado pelo princípio da igualdade, isso
significa que, se o Estado não respeitar a isonomia, não apenas os atos lícitos como também os
ilícitos devem ser objeto de responsabilidade do Estado e, portanto, este deve responder.
(ii) Princípio da obrigatoriedade de desempenho da atividade pública: Trata-se do interesse público
que se apresenta como uma obrigação ao administrador público, e não como forma de opção à
vontade deste. Ou seja, a busca incessante pela satisfação do interesse público é realizada através
de atos feitos por pessoas que representam a atividade da administração pública, isto é, os
administradores públicos, que, por sua vez, não possuem a escolha de agir ou ser omisso diante de
um problema que atinja um interesse social, mas sim, possui a obrigação de agir e realizar políticas
públicas, por exemplo.

O Estado possui uma série de obrigações perante a sociedade, dentre elas, no âmbito da
Administração pública, é o de atender o interesse público de forma incessante, mesmo que a
inciativa para se adquirir tal objetivo tenha sido individual. Portanto, segundo o princípio da
continuidade do serviço público, o Estado deve assumir qualquer serviço que se de interesses
públicos, devendo tratar essa meta como acima de qualquer outro interesse. Além desse, existe a
premissa da impossibilidade de dissolução “sponte própria” das pessoas administradas, que é a
obrigação dos administradores em priorizar os interesses públicos perante quaisquer outros.

(iii) Princípio do controle administrador ou tutela: Diz a respeito ao dever do Estado solucionar
seus interesses por meio de órgãos representativos da Administração Pública. A fim de cumprir
isso, o Estado acaba criando entes submetidos ao mesmo regime de indisponibilidade de interesses
públicos e, portanto, desenvolvendo um sistema que consiga o bom funcionamento e a correta
distribuição de tarefas por parte dos órgãos e dos administradores.

(iv) Princípio da isonomia: Em relação aos administradores, em específico, existe um princípio que
rege o caráter impessoal para com os próprios administradores e, principalmente, para com os
administrados. Esse é o chamado de princípio da isonomia ou igualdade dos administradores em
face da Administração, do qual visa que não haja qualquer espécie de favoritismo.

A Administração Pública, com a finalidade de ser bem regida e possuir um bom e eficaz
funcionamento, possui a exigência de licitação para a realização de negócios com os particulares,
isto é, ela implica na obrigação de oferecer a estes a oportunidade de dispor em igualdade de
condições. Além disso, a Administração pública possui a incumbência de atender a todos os
cidadãos, sem discriminações.

(v) Princípio da publicidade: Não é de exclusividade da Administração pública, mas é de grande


relevância por definir que os atos que são implementados devem ser emitidos em público. A
publicidade possui uma característica importantíssima para todo o Direito, especialmente para
questões que envolvem atividades do Poder Público, da qual é conhecida como o zelo pela
transparência da atividade administradora.

(vi) Princípio da inalienabilidade dos direitos concernentes a interesses públicos: Os interesses


públicos são inalienáveis e, por tal motivo, não podem ser transferidos aos particulares, como por
exemplo, os bens públicos inalienáveis e impenhoráveis. Além disso, é inviável a transferência de
tal bem do campo estatal ao campo privado. A única possibilidade é a transferência do exercício da
atividade, e não os direitos oriundos desta.

Com o objetivo de haver um bom funcionamento do regimento do poder público e,


consequentemente, da Administração pública, deve haver um intermédio de um órgão imparcial e
independente capaz de sancionar os atos ilícitos e ineficazes e exigir reparações patrimoniais
quando necessário. Esse princípio é o princípio do controle jurisdicional dos atos administrativos e,
esse órgão imparcial e independente, no Brasil, é o Poder Judiciário.

(vii) Princípio da hierarquia: Por fim, o autor Celso Antônio Bandeira de Mello cita dois últimos
princípios que cercam a premissa máxima da indisponibilidade, por parte da administração pública,
dos interesses públicos. O primeiro é o princípio da hierarquia, do qual disserta sobre a
importância da organização, da qual a existência é exclusiva na função administrativa, inexistindo
nas funções legislativa e jurisdicional. A segunda e última, trata-se do considerado pelo autor como
uma das principais bases não apenas do Direito Administrativo, mas como de todas as áreas do
Direito, o princípio da segurança jurídica. No caso da Administração, porque objetiva evitar
alterações surpreendentes que instabilizam a situação dos administradores.

De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello, o sistema de uma disciplina jurídica constitui-se
do conjunto de princípios que lhe dão especificidade em relação ao regime de outras disciplinas.
Todos os institutos que abarca articulam-se em função da racionalidade própria de tal sistema
específico, segundo as peculiaridades que delineiam o regime, dando-lhe tipicidade em relação a
outros. Dá sequência o autor, dispondo que no campo do Direito, os princípios são livremente
determinados pelos homens, sendo, portanto, mutáveis. Ao ser delineado um sistema pelo
Legislador, este pode fixar inconscientemente um conjunto de princípios que informam o sistema,
desde que as normas postas traduzam sua acolhida.

Quanto ao jurista, ressalta que interessam os princípios consagrados, haja ou não o legislador
pretendido conscientemente instaurá-los. O autor justifica dispondo que tais princípios estão
sempre à disposição de autoridade legislativa, podendo ser modificados ou derrogados a qualquer
tempo, seja pela substituição de princípios básicos ou alteração dos mesmos e, por causa disso, o
jurista deve centrar sua investigação, raciocínio e construção teórica única e exclusivamente no
regime, não interessando as realidades substanciais ou infraestruturais que determinaram a opção
do legislador, salvo como elemento auxiliar para compreensão. As únicas noções que importam ao
jurista são as qualificadas pelo sistema normativo, definidas em função de um regime, de nada
adiantando recorrer aos conceitos anteriores sobre os quais já incidiu o juízo do legislador. O
intérprete então recebe conceitos novos, posto que os anteriores se desvaneçam, cedendo lugar ao
produto da qualificação legislativa.

O autor destaca a grande importância da noção de regime administrativo, que explica cada um dos
institutos de Direito Administrativo e permite fixar-lhes a identidade, pela compreensão de tais
disciplinas. Cada instituto apresenta peculiaridades quanto aos princípios que os norteiam,
obedecendo a regras particulares e ocorrendo certa refrangência nos princípios genéricos ao se
encontrarem com princípios específicos de cada um deles, sendo os princípios específicos a
tradução particularizada dos princípios genéricos, de acordo com as peculiaridades de cada figura
jurídico-administrativa.

Ao ser um instituto conhecido como de Direito Administrativo, se sabe de antemão que receberá
conjunto de princípios genéricos, cabendo apenas agregar-lhes as peculiaridades, o sentido, a
direção e a intensidade de aplicação de tais princípios em cada caso, assim como derrogações
provocadas pelos subprincípios ligados à natureza particular do instituto. O pensador ainda
enfatiza a necessidade de perceber e definir o sistema formado pelo objeto e o sistema maior no
qual o objeto se insere.

Ressalta ademais que poucos foram os princípios expressamente delineados para figurarem como
básicos dos vários institutos. Têm sido erigidos ao nível de princípios básicos alguns como o
princípio da legalidade, da prevalência do interesse público sobre o privado, o princípio da
continuidade do serviço público, o da igualdade de todos perante o serviço público, o princípio da
dualidade de jurisdição (comum e administrativa), o princípio da responsabilidade do Estado, entre
outros, esparsos e desconexos entre si, raramente apresentados como noções que tipificam o
regime administrativo.
Dando sequência, conceitua a noção de relação de administração como a base última na construção
sistemática da disciplina, conferindo a referida noção o caráter de princípio fundamental, peça-
matriz de todo o Direito Administrativo.

Expõe adiante que Hely Lopes Meirelles, antes da Constituição de 1988, enumerava apenas o
princípio da legalidade, da moralidade e da finalidade como ditames básicos da Administração
Pública. Entretanto, a doutrina tratou desse problema da fixação dos princípios fundamentais da
matéria, restando assim, por ser convenientemente delineado o regime administrativo. Na
sequência chama a atenção para a lacuna na matéria que reclama preenchimento urgente: os poucos
princípios diretamente qualificados pela doutrina como noções articuladoras do Direito
Administrativo, pelo fato de não haver a doutrina atribuído ao regime administrativo função
categorial.
Concluí então, dispondo que a afirmação dos vários cânones que compõem o regime
administrativo estabelece ditames genéricos para o entendimento e a interpretação do Direito
Administrativo, ressaltando que estes princípios vigoram segundo algumas condições,
regulamentação e limites, admitindo variantes, temperamentos e qualificações particulares à vista
do significado singular que assumem em função da legislação concernente aos diversos institutos
da matéria, bem como o papel de guia empenhado pelos mesmos, orientando a compreensão da
disciplina, unificando e lhe dando organicidade e coesão. Trata dos princípios citados como
“Direito Comum do Direito Administrativo”, admitindo apenas certas refrações e particularidades
ao encontrarem cada um dos institutos, em suas particularidades especificamente ditadas pelos fins
a que tendem.

[1] Os entendimentos apresentados neste tópico foram retirados de MELLO, Celso Antônio
Bandeira. Curso de Direito Administrativo, 32ª edição, São Paulo: Editora Malheiros, 2015, pp.
43-53.
[2] Os entendimentos apresentados neste tópico foram retirados de MELLO, Celso Antônio
Bandeira. Curso de Direito Administrativo, 32ª edição, São Paulo: Editora Malheiros, 2015, pp. 65
- 69.

³ Cit. De Celso Mello de Atos Administrativos e Direitos dos Administrados, São Paulo, Ed. RT,
1981, pp. 16 a 17

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