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Raros são os objetos que hoje se oferecem isolados, sem o contexto de objetos que

os exprimam. Transformou-se a relação do consumidor ao objeto: já não se refere a


tal objeto na sua utilidade específica, mas ao conjunto de objetos na sua
significação total. (BAUDRILLARD 2008:15-16)

Nova arte de viver, nova maneira de viver, dizem as publicidades, o ambiente


quotidiano que se respira: pode fazer shopping agradável no mesmo local
climatizado, comprar de uma só vez as provisões alimentares, os objetos destinados
ao apartamento e à casa de campo, os vestidos, as flores, o último romance ou a
última quinquilharia, enquanto marido e filhos vêem um filme ou almoçam todos ali
mesmo, etc” (BAUDRILLARD 2008:17)

As comunicações de massa não nos oferecem a realidade mas a vertigem da realidade


[…] Vivemos desta maneira ao abrigo dos signos e na recusa do real. Segurança
miraculosa: ao contemplarmos as imagens do mundo, quem distinguirá esta breve
irrupção da realidade do prazer profundo de nela não participar. A imagem, o signo,
a mensagem, tudo o que consumimos, é a própria tranqüilidade selada pela distância
ao mundo e que ilude, mas do que compromete, a alusão violenta ao real.
(BAUDRILLARD 2008:25-26)

A produtividade, enquanto obsessão coletiva consignada nos livros de contas,


desempenha antes de mais a função social de mito. Para alimentar semelhante mito,
tudo é bom, mesmo a inversão de realidades objetivas, que introduzem a contradição
nos números que a sancionam. (BAUDRILLARD 2008:37)

Todas as sociedades desperdiçaram, dilapidaram, gastaram e consumiram sempre além


do estriti necessário, pela simples razão de que é no consumo do excedente e do
supérfluo que tanto o individuo como a sociedade, se sentem não só existir, mas
viver. (BAUDRILLARD 2008:40)

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A noção de utilidade é substituída pela produção de valores:

A noção de utilidade, de origemn racionalista e economista, tem portanto de rever-


se segundo uma lógica social muito mais geral em que o desperdício, longe de
figurar como resíduo irracional, recebe uma função positiva, substituindo a
utilidade racional numa funcionalidade social superior e se revela, no limite, como
a função essencial – tornando-se o aumento da despesa, o supérfluo, a inutilidade
ritual do “gasto para nada”, o lugar de produção de valores, das diferenças e do
sentido – tanto no plano individual como no plano social. (BAUDRILLARD 2008:40)

[…] uma definição do “consumo” como “consumição”, isto é, como desperdício


produtivo – perspectiva inversa da do “econômico”, fundado na necessidade, e na
acumulação e no cálculo em que, pelo contrário, o supérfluo precede a necessário e
em que a despesa precede em valor (se é que não no tempo) a acumulação e
apropriação. (BAUDRILLARD 2008:40)

O que hoje se produz não se fabrica em função do respectivo valor de uso ou da


possível duração, mas antes “em função de sua morte”, cuja aceleração só é igualada
pela inflação dos preços. […] a publicidade realiza o prodígio de um orçamento
considerável gasto como o único fim, de diminuir o seu valor/tempo, sujeitando-se
ao valor/moda e à renovação acelerada. (BAUDRILLARD 2008:44-45)

Todo o discurso sobre as necessidades assenta numa antropologia ingênua: a da


produção natural para a felicidade. Inscrita em caracteres de fogo por detrás da
menor publicidade para as Canárias ou para os sais de banho, a felicidade constitui
a referência absoluta da sociedade de consumo, revelando-se como o equivalente
autêntico da “salvação”. (BAUDRILLARD 2008:49)
Esta felicidade é àquela que encarna e recolhe nas sociedade modernas; O mito da
Igualdade, que oriunda da Revolução Industrial, refere-se a uma felicidade
mensurável, ou ainda, o bem-estar mensurável por objetos e sinais de conforto (cf.
BAUDRILLARD 2008:49)

A “Revolução do Bem Estar” é a herdeira, a testamenteira da Revolução Burguesa ou


simplesmentede toda a revolução que erige em princípio a igualdade dos homens sem a
poder (ou sem a conseguir) realizar a fundo. O primncio da democrátido acha-se
então transferido de uma igualdade real, das capacidades, responsabilidades e
possibilidades sociais, da felicidade (no sentido pleno da palavra) para a
igualdade diante do objeto e outros signos evidentes do êxito social e da
felicidade. (cf. BAUDRILLARD 2008:50)

Os objetos de consumo corrente torna-se cada vez menos significavos da categoria


social, e até mesmo os rendimentos, na medida em que as maiores disparidades se vão
atenuando, vêem diminuir o seu valor como critério distintivo. É mesmo possível que
o consumo (tomando no sentido de despesa, de compra e de posso de objetos visíveis)
perca prograssivamente o papel eminente que desempanha hoje na geometria variável
do estatudo, em proveito de outros critérios e de outros tipos de conduta. Em
ultima análise, será apanágio de todos, quando já nada significar. (BAUDRILLARD
2008:61)

Desde já se vê a hierarquia social a adotar critérios mais sutis: o tipo de


trabalho e de responsabilidade, o nivelde educação e de cultura (a maneira de
consumir bens correntes pode constituir uma qualidade ‘muito rara’), a participação
nas decisões. O saber e o poder são ou irão ser os dois bens mais raros das
sociedades de abundância. (BAUDRILLARD 2008:61)

Nunca se consome o objeto em si (no seu valor de uso) – os objetos (no sentido
lato) manipulam-se sempre como signos que distinguem quer filiando-o no próprio
grupo tomado como referênciaideal quer demarcando-o do respectivo grupo por
referência a um grupo de estatuto superior. (BAUDRILLARD 2008:66)

É precisamente ai que residem o valor estratégico e a astúcia da publicidade:


atingir cada qual em função dos outros, nas suas veleidades de prestigio social
reitificado. Nunca se dirige apenas ao homem isolado: visa-o na relação
diferencial e quando dá a impressão de retardar as suas motivações <<profundas>>,
fá-lo sempre de modo espetacular, isto é, convoca sempre os vizinhos, o grupo, a
sociedade inteiramente hierarquizada para o processo de leitura e encarecimento que
ela instaura. (BAUDRILLARD 2008:72)

Todo o discurso, profano ou cientifico, a cerca do consumo se articula na sequência


mitológica de um conto: um homem, <<dotado>> de necessidades que o <<impelem>> para
objetos, <<fontes>> da sua satisfação. Mas, como o homem nunca se sente satisfeito
(aliás, é censurado por isso) a historia recomeça sempre indefinidamente, com a
evidência defunta das velhas fabulas. (BAUDRILLARD 2008:78)

As necessidades visam mais os valores que os objetos e a sua satisfação possui em


primeiro lugar o sentido de uma adesão a tais valores. A escolha fundamental,
inconsciente automática do consumidor é aceitar o estilo de vida de determinada
sociedade particular (portanto, deixa de ser escolha! – acabando igualmente por ser
desmentida a teoria da autonomia e soberania do consumidor). (BAUDRILLARD 2008:79-
80)

Tal sociologia não nos leva muito longe. Exceptuando o fato de que a noção de
conformidade escondeu apenas uma imensa tautologia, o americano médio definido pelo
<<standard package>> (que, por sua vez, se define como a média estatística dos bens
consumidos – ou, em termos sociológicos: tal individuo faz parte de tal grupo
porque consome tais bens e consome tais bens porque faz parte de tal grupo) – o
postulado de racionalidade formal, que vimos em ação nos economistas, ao tratar da
relação do individuo com os objetos, encontra-se agora simplesmente transferido
para a relação do individuo com o grupo. A conformidade e a satisfação são
solidarias: segundo o princípio lógico da equivalência, trata-se de idêntica
adequação do sujeito aos objetos ou do sujeito a o grupo, depois de admitidos como
separados. Os conceitos de <<necessidades>> e de <<norma>> constitui
respectivamente a expressão dessa adequação miraculosa. (BAUDRILLARD 2008:80)

Tanto na lógica dos signos como na dos símbolos, os objetos deixam de estar ligados
a uma função ou necessidade definida, precisamente porque correspondem a outra
coisa que La seja a lógica social quer a lógica do desejo, às quais servem de campo
móvel e inconsciente de significação. (BAUDRILLARD 2008:89)

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O Açambarcamento dos objetos não tem finalidade (<<objetless craving>>, no


pensamento de Riesman). As condutas de consumo, aparentemente orientadas e
dirigidas para o objeto e para o prazer, correspondem na realidade a finalidades
muito diferentes – a da expressão metafórica ou desfiada do desejo, a da produção
por meio de signos diferenciais de um código social de valores. Não é determinante
a função individual de interesse através de um conjunto de objetos, mas a função
instantaneamente social de troca, de comunicação o e de distribuição dos valores
através de um conjunto de signos. (BAUDRILLARD 2008:91)

O consumo surge como sistema que será a ordenação dos signos e a integração do
grupo; constitui simultaneamente uma moral (sistema de valores ideológicos) e um
sistema de comunicação ou estrutura de permuta. (BAUDRILLARD 2008:91)

Assim como o sistema de parentesco não se funda, em ultima instância, na


consangüinidade e na filiação, num dado natural, mas no arranjo arbitrário de
classificação, – assim também o sistema de consumo não se baseia em derradeira
instância na necessidade e no prazer, mas num código de signos (de objetos/signos)
e de diferenças. (BAUDRILLARD 2008:92)

Não se trata de dizer que não existem necessidades e utilidade natural, etc. –
trata-se de descobrir que o consumo, enquanto conceito específico da sociedade
contemporânea, não consiste nelas. Tal constatação é válida para todas as
sociedades. O que para nós tem significado sociológico e fixa nossa época sob o
signo do consumo é precisamente a reorganização generalizada deste nível primário
em sistema de signos que se revela como um dos modos específicos, talvez como o
modo especifico de passagem da natureza à cultura da nossa época. (BAUDRILLARD
2008:93)

Uma das melhores provas de que o principio e a finalidade do consumo não é a


fruição reside no fato de esta se encontrar hoje forçada e institucionalizada, não
como deireito ou como prazer, mas como dever do cidadão. (BAUDRILLARD 2008:94)

O consumidor e o cidadão moderno não têm que se esquivar à coação de felicidade e


de prazer, que na nova ética constitui o equivalente da obrigação tradicional de
trabalho e de produção. O homem moderno passa cada vez menos a vida na produção
pelo trabalho e cada vez menos a vida na produção e inovação continuas das próprias
necessidades e do bem-estar. Deve velar pela mobilização constante de todas as
virtualidades e capacidades consumptivas. Se se esquecer, lembrar-lhe-ão com
gentileza e insistência que tem o direito de ser feliz. Portanto, não é verdade que
ele seja passivo, já que desenvolve e tem de desenvolver uma atividade continua. De
outro modo, corria o risco de se contentar com o que tem e de se tornar associal.
(BAUDRILLARD 2008:94)
O consumo reduz-se a simples setor aparentemente anómico por não ser regulado,
segundo a definição de Durkeim, por regras formais e por dar a impressão de estar
entregue à desmesura e à contingência individual das necessidade. Como geralmente
se imagina (eis a razão por que a <<ciência>> econômica sente repugnância em
mencioná-lo), não constitui um setor marginal de indeterminação onde o individuo,
aliás coagido de todos os lados por regras sociais, recuperaria, finalmente, na
esfera <<privada>> e entregue a si mesmo, uma margem de liberdade e de divertimento
pessoal. O consumo surge como conduta ativa e coletiva, como coação e moral, como
instituição. Compõe todo um sistema de valores, com tudo o que este termo implica
enquanto função de integração do grupo e de controlo social. A sociedade de consumo
é ainda a sociedade de aprendizagem do consumo e de iniciação social ao consumo –
isto é, modo novo e especifico de socialização em relação à emergência de novas
forças produtivas e á reestruturação monopolista de um sistema econômico de alta
produtividade. (BAUDRILLARD 2008:95 – 96)

Semelhante fenômeno, sob as múltiplas formas que assume, é capital para a


interpretação da nossa sociedade, porque poderiamos ater-nos a esta inversão formal
dos signos e considerar como efeito de democratização o que não passa de simples
metamorfose da distância de classe. (BAUDRILLARD 2008:110)

Em suma, os objetos culturais perderam todo significado humano: o proprietário, de


certa maneira, transforma-os em feitiços que lhe permitem apoiar uma atitude, O que
(a prioridade do valor diferencial) Rieman aplica aos objetos <<culturais>> (a este
respeito, não existe diferença entre <<objetos culturias>> e <<objetos materiais>>)
era como que ilustrado experimentalmente pelo exemplo de uma cidade mineira da
taiga do Quebeque onde – assim relata o repórter – apesar da proximidade da
floresta e da quase nula utilidade do automóvel, cada família possui no entanto
diante da porta o respectivo carro: << O veiculo lavado e mimado que , de tempos a
tempos, se faz girar uns quantos quilômetros pela estrada que cerca a cidade ( não
há outras estradas), representa o símbolo do nível de vida americano, o sinal de
que se pertence à civilização mecânica ( o autor faz também comparação das
sumptuosas limusinas e de uma bicicleta inteiramente inútil encontrada na selva
senegalesa, em casa de um antigo oficial subalterno, que veio outra vez viver para
a aldeia). (BAUDRILLARD 2008:110 – 111)

A função deste sistema de diferenciação vai sim muito além da satisfação das
necessidades de prestigio. Se se admitir a hipótese acima enunciada, descobre-se
que o sistema nunca atua sobre as diferenças reais (singulares, irredutíveis) entre
pessoas. O que funda como sistema é o fato de eliminar o conteúdo e o ser próprios
de cada qual (forçosamente diferente) para lhes substituir a forma diferencial,
industrializável e comercializável como signo distintivo. Elimina toda a qualidade
original para ter apenas o esquema distintivo e a sua produção sistemática. A este
nível, as dierenças deixam de ser exclusivas: não só se implicam logicamente entre
si na combinatória da moda (tal como as cores diferentes <<se combinam>> entre si),
mas ainda no horizonte sociológico: trata-se da permuta das diferenças que sela a
integração do grupo. (BAUDRILLARD 2008:112)

O consumo define-se sempre pela substituição da relação espontânea mediatizada por


meio de um sistema de signos. (BAUDRILLARD 2008:116)

Como a violência, também a sedução e o narcisismo são previamente revezados por


modelos, industrialmente produzidos pelos mass media e transformados pelos signos
referenciáveis (pata que todas as raparigas se apaixonem por Bridgitte Bardot,
requer-se que os cabelo, a boca ou determinado pormenor do vestido as distinga,
isto é, forçosamente a mesma coisa para todas). Cada qual encontra a própria
personalidade no cumprimento da tais modelos. (BAUDRILLARD 2008:117)

Entre as dimensões características da nossa sociedade, em matéria de saber


profissional, de qualificação social e de trajetória individual, encontra-se a
reciclagem. (BAUDRILLARD 2008:124)

O termo <<recilcagem>> consegue, de fato, inspirar várias reflexões: evoca


irresistivelmente o <<ciclo>> da moda, onde cada qual tem de estra << ao corrente>>
e de reciclar-se todos os anos, todos os meses e todas as estações, no vestuário,
nos objetos e no carro. Se não o fizer, não é verdadeiro cidadão da sociedade de
consumo. (BAUDRILLARD 2008:125)

A cultura já não se produz para durar. Mantem-se certamente como instancia


universal e como referencia ideal e tanto mais quanto se encontra a caminho de
perder a sua substância de sentido (assim como também nunca se exaltou tanto a
natureza como depois de estar já destruída por todos os lados): na sua realidade,
porém em virtude do modo de produção, encontra-se submetida à mesma vocação de
<<atualidade>> que os bens materiais. (BAUDRILLARD 2008:127)

A comunicação de massa exclui a cultura e o saber. Não se trata de entrarem em ação


verdadeiros processos simbólicos ou didáticos, porque seria comprometer a
participação coletiva que constitui o sentido de semelhante cerimônia –
participação que se efetua unicamente por meio de uma liturgia e de um código
formal de sinais cuidadosamente esvaziados de todo o conteúdo de sentido.
(BAUDRILLARD 2008:130)

Toda esta substância cultural é <<consumida>> na medida em que o seu conteúdo não
alimenta a prática autônoma, mas a retórica da mobilidade social, procura esta que
visa outro objeto diferente da cultura, ou melhor, só visa esta como mero elemento
codificado de estatuto social. Opera-se, portanto, uma inversão e o conteúdo
genuinamente cultural só aparece como conotação e função secundária. Afirmamos
então que é consumido, da mesma maneira que a máquina de lavar é objeto de consumo,
a partir do momento emque cessa de ser utensílio e se torna elemento de conforto ou
de prestigio. Ficamos a saber que ela perde a presença especifica e que muitos
outros objetos a poderiam substituir – entre os quais também a cultura. Ao deslizar
para outro discurso, tornando-se substituível e homogênea (

ainda que hierarquicamente superior) a outros objetos, a cultura transforma-se em


objeto de consumo. (BAUDRILLARD 2008:136)

Lógica do consumo – segundo vimos – define-se como manipulação de signos.


Encontram-se ausentes os valores simbólicos de criação e a relação simbólica de
interioridade; funda-se toda a exterioridade. O objeto perde a finalidade objetiva
e a respectiva função, tornando-se o termo de uma combinatória muito mais vasta de
conjuntos de objetos, em que o seu valor é de relação. Por outro lado, desaparece o
seu sentido simbólico e o seu estatuto antropomórfico milenário, tendendo a
esgotar-se num discurso de conotações, também elas relativas umas ás outras no
quadro de um sistema cultural totalitário, isto é, que pode integrar todas as
significações, seja qual for a respectiva origem. (BAUDRILLARD 2008:146)

A <<verdade>> do objeto contemporâneo já não consiste em servir para alguma coisa,


mas em significar; deixou de ser manipulado como instrumento, sendo utilizado como
signo. (BAUDRILLARD 2008:151)

Ao reportar-nos ao sistema descrito, não devemos esquecer que <<certo sorriso>> faz
parte dos signos obrigatórios do consumo; não dá provas de humor e de distância
critica, mas constitui apenas a recordação deste valor critico transcendente,
atualmente materializado no piscar de olhos. Semelhante distancia falsa encontra-se
presente em todo o lado, nos filmes de espionagem, em Godard, na publicidade
moderna que a utiliza continuamente como alusão cultural, etc. Neste sorriso
<<cool>>, acaba-se por já não distinguir o sorriso do humor do da cumplicidade
comercial. O mesmo ocorre na arte pop – cujo sorriso resume, no fim de contas, a
sua ambigüidade: não se trata do sorriso da distância critica, mas do concluio.
(BAUDRILLARD 2008:156)

Não é tanto pelo facto de a valorização tonal publicitária sugerir que , no fundo,
a história do mundo é diferente e que só o investimento dos objetos de consumo
possui real valor. Isso é secundário, eficácia real é mais sutil: trata-se de impor
pela sucessão sistemática das mensagens a equivalência da história e do fait –
divers, do acontecimento e do espetáculo, da informação e da publicidade ao nível
do signo. Aqui reside o verdadeiro efeito do consumo, e não no discurso
publicitário direto. Encontra-se, graças aos suportes e aos meios técnicos da TV e
da rádio, no corte do acontecimento e do mundo em mensagens descontinuas,
sucessivas e não – contraditórias signos na dimensão abstrata da emissão. O que
depois consumimos não é tal espetáculo ou tal imagem em si, mas a virtualidade da
sucessão de todos os espetáculos possíveis – e a certeza de que a lei de sucessão e
de corte dos programas fará que nada corra o risco de emergir a não ser como
espetáculo e signo entre outros. (BAUDRILLARD 2008:157)

As imagens da TV pretendem ser a metalinguagem de um modo ausente. (BAUDRILLARD


2008:160)

A publicidade constitui um dos pontos estratégicos de semelhante processo. Surge


como reino preferido do pseudo – acontecimento. Transforma o objeto em
acontecimento, construindo – o como tal por meio da eliminação das suas
características objetivas. Edifica- o como modelo e como fait – divers espetacular.
(BAUDRILLARD 2008:165)

O problema da <<veracidade>> da publicidade deve pôr-se da seguinte maneira: se os


publicitários <<mentissem>> verdadeiramente, seria fácil desmascará-los – só que
não o fazem – se não o fazem, não é por serem demasiado inteligentes, mas sobretudo
porque <<a arte publicitária consiste principalmente na invenção de enunciados
persuasivos, que não sejam nem verdadeiros nem falsos>> (Boostin). Pelo simples
fato de já não haver original ou referencial concreto à semelhança de todos os
mitos e palavras mágicas, a publicidade baseia-se noutro tipo de verificação – da
self – fulfilling prophecy (a palavra que se realiza em virtude da própria
proliferação). <<O agente publicitário de sucesso é mestre de nova arte – a arte de
tornar verdadeiras as coisas ao afirmar que o são. Surge como adepto da técnica das
profecias que se cumprem por si mesmas>>. (BAUDRILLARD 2008:166)

Faz do objeto um pseudo – acontecimento que irá tornar – se o acontecimento real da


vida quotidiana através da adesão do consumidor ao seu dircurso. (BAUDRILLARD
2008:166 – 167)

Desta maneira, os analistas começam a debruçar-se doutamente, com delicioso


calafrio, sobre os fantasmas publicitários, sobre as manifestações de oralidade
devoradora, de analidade ou de fálico aqui e além presentes – tudo ramificado no
inconsciente do consumidor que apenas estava à espera de ser manipulado (pressupõe-
se desde já tal inconsciente, uma vez que Freud assim disse – essência escondida
cujo alimento preferido é o símbolo ou o fantasma). Idêntica circuldaridade viciosa
existe entre o inconsciente e os fantasmas, como outrora entre o sujeito e o
objeto, ao nível da consciência. Indexam – se e definem-se de modo recíproco o
inconsciente estereotipado enquanto função individual e os fantasmas difundidos
pelas agências publicitárias como produtos finitos. Iludem-se assim todos os
verdadeiros problemas postos pela lógica do inconsciente e pela função simbólica,
ao materializá-los espetacularmente num processomecanico de significação e de
eficácia dos signos: <<Existe o inconsciente e, depois, os fantasmas que o
importunam. Esta miraculosa conjunção promove a venda>>. Ingenuidade análoga à dos
etnólogos, que acreditam nosmitos que os indígenas lhes contavam, tomando-os à
letra e aceitando igualmente a superstição indígena na eficácia mágica dos mitos
racionalista da <<<mentalidade primitiva>>. Começa-se já a duvidar do impate direto
da publicidade nas vendas: também já seria tempo de por radicalmente em
questão esta mecânica fantasmática ingênua – Álibi tanto dos analistas como dos
publicitários. (BAUDRILLARD 2008:195)

O termo <<recilcagem>> consegue, de fato, inspirar várias reflexões: evoca


irresistivelmente o <<ciclo>> da moda, onde cada qual tem de estra << ao corrente>>
e de reciclar-se todos os anos, todos os meses e todas as estações, no vestuário,
nos objetos e no carro. Se não o fizer, não é verdadeiro cidadão da sociedade de
consumo. (BAUDRILLARD 2008:125)

A cultura já não se produz para durar. Mantem-se certamente como instancia


universal e como referencia ideal e tanto mais quanto se encontra a caminho de
perder a sua substância de sentido (assim como também nunca se exaltou tanto a
natureza como depois de estar já destruída por todos os lados): na sua realidade,
porém em virtude do modo de produção, encontra-se submetida à mesma vocação de
<<atualidade>> que os bens materiais. (BAUDRILLARD 2008:127)

A comunicação de massa exclui a cultura e o saber. Não se trata de entrarem em ação


verdadeiros processos simbólicos ou didáticos, porque seria comprometer a
participação coletiva que constitui o sentido de semelhante cerimônia –
participação que se efetua unicamente por meio de uma liturgia e de um código
formal de sinais cuidadosamente esvaziados de todo o conteúdo de sentido.
(BAUDRILLARD 2008:130)

Toda esta substância cultural é <<consumida>> na medida em que o seu conteúdo não
alimenta a prática autônoma, mas a retórica da mobilidade social, procura esta que
visa outro objeto diferente da cultura, ou melhor, só visa esta como mero elemento
codificado de estatuto social. Opera-se, portanto, uma inversão e o conteúdo
genuinamente cultural só aparece como conotação e função secundária. Afirmamos
então que é consumido, da mesma maneira que a máquina de lavar é objeto de consumo,
a partir do momento emque cessa de ser utensílio e se torna elemento de conforto ou
de prestigio. Ficamos a saber que ela perde a presença especifica e que muitos
outros objetos a poderiam substituir – entre os quais também a cultura. Ao deslizar
para outro discurso, tornando-se substituível e homogênea (

ainda que hierarquicamente superior) a outros objetos, a cultura transforma-se em


objeto de consumo. (BAUDRILLARD 2008:136)

Lógica do consumo – segundo vimos – define-se como manipulação de signos.


Encontram-se ausentes os valores simbólicos de criação e a relação simbólica de
interioridade; funda-se toda a exterioridade. O objeto perde a finalidade objetiva
e a respectiva função, tornando-se o termo de uma combinatória muito mais vasta de
conjuntos de objetos, em que o seu valor é de relação. Por outro lado, desaparece o
seu sentido simbólico e o seu estatuto antropomórfico milenário, tendendo a
esgotar-se num discurso de conotações, também elas relativas umas ás outras no
quadro de um sistema cultural totalitário, isto é, que pode integrar todas as
significações, seja qual for a respectiva origem. (BAUDRILLARD 2008:146)

A <<verdade>> do objeto contemporâneo já não consiste em servir para alguma coisa,


mas em significar; deixou de ser manipulado como instrumento, sendo utilizado como
signo. (BAUDRILLARD 2008:151)

Ao reportar-nos ao sistema descrito, não devemos esquecer que <<certo sorriso>> faz
parte dos signos obrigatórios do consumo; não dá provas de humor e de distância
critica, mas constitui apenas a recordação deste valor critico transcendente,
atualmente materializado no piscar de olhos. Semelhante distancia falsa encontra-se
presente em todo o lado, nos filmes de espionagem, em Godard, na publicidade
moderna que a utiliza continuamente como alusão cultural, etc. Neste sorriso
<<cool>>, acaba-se por já não distinguir o sorriso do humor do da cumplicidade
comercial. O mesmo ocorre na arte pop – cujo sorriso resume, no fim de contas, a
sua ambigüidade: não se trata do sorriso da distância critica, mas do concluio.
(BAUDRILLARD 2008:156)

Não é tanto pelo facto de a valorização tonal publicitária sugerir que , no fundo,
a história do mundo é diferente e que só o investimento dos objetos de consumo
possui real valor. Isso é secundário, eficácia real é mais sutil: trata-se de impor
pela sucessão sistemática das mensagens a equivalência da história e do fait –
divers, do acontecimento e do espetáculo, da informação e da publicidade ao nível
do signo. Aqui reside o verdadeiro efeito do consumo, e não no discurso
publicitário direto. Encontra-se, graças aos suportes e aos meios técnicos da TV e
da rádio, no corte do acontecimento e do mundo em mensagens descontinuas,
sucessivas e não – contraditórias signos na dimensão abstrata da emissão. O que
depois consumimos não é tal espetáculo ou tal imagem em si, mas a virtualidade da
sucessão de todos os espetáculos possíveis – e a certeza de que a lei de sucessão e
de corte dos programas fará que nada corra o risco de emergir a não ser como
espetáculo e signo entre outros. (BAUDRILLARD 2008:157)

As imagens da TV pretendem ser a metalinguagem de um modo ausente. (BAUDRILLARD


2008:160)

A publicidade constitui um dos pontos estratégicos de semelhante processo. Surge


como reino preferido do pseudo – acontecimento. Transforma o objeto em
acontecimento, construindo – o como tal por meio da eliminação das suas
características objetivas. Edifica- o como modelo e como fait – divers espetacular.
(BAUDRILLARD 2008:165)

O problema da <<veracidade>> da publicidade deve pôr-se da seguinte maneira: se os


publicitários <<mentissem>> verdadeiramente, seria fácil desmascará-los – só que
não o fazem – se não o fazem, não é por serem demasiado inteligentes, mas sobretudo
porque <<a arte publicitária consiste principalmente na invenção de enunciados
persuasivos, que não sejam nem verdadeiros nem falsos>> (Boostin). Pelo simples
fato de já não haver original ou referencial concreto à semelhança de todos os
mitos e palavras mágicas, a publicidade baseia-se noutro tipo de verificação – da
self – fulfilling prophecy (a palavra que se realiza em virtude da própria
proliferação). <<O agente publicitário de sucesso é mestre de nova arte – a arte de
tornar verdadeiras as coisas ao afirmar que o são. Surge como adepto da técnica das
profecias que se cumprem por si mesmas>>. (BAUDRILLARD 2008:166)

Faz do objeto um pseudo – acontecimento que irá tornar – se o acontecimento real da


vida quotidiana através da adesão do consumidor ao seu dircurso. (BAUDRILLARD
2008:166 – 167)

Desta maneira, os analistas começam a debruçar-se doutamente, com delicioso


calafrio, sobre os fantasmas publicitários, sobre as manifestações de oralidade
devoradora, de analidade ou de fálico aqui e além presentes – tudo ramificado no
inconsciente do consumidor que apenas estava à espera de ser manipulado (pressupõe-
se desde já tal inconsciente, uma vez que Freud assim disse – essência escondida
cujo alimento preferido é o símbolo ou o fantasma). Idêntica circuldaridade viciosa
existe entre o inconsciente e os fantasmas, como outrora entre o sujeito e o
objeto, ao nível da consciência. Indexam – se e definem-se de modo recíproco o
inconsciente estereotipado enquanto função individual e os fantasmas difundidos
pelas agências publicitárias como produtos finitos. Iludem-se assim todos os
verdadeiros problemas postos pela lógica do inconsciente e pela função simbólica,
ao materializá-los espetacularmente num processomecanico de significação e de
eficácia dos signos: <<Existe o inconsciente e, depois, os fantasmas que o
importunam. Esta miraculosa conjunção promove a venda>>. Ingenuidade análoga à dos
etnólogos, que acreditam nosmitos que os indígenas lhes contavam, tomando-os à
letra e aceitando igualmente a superstição indígena na eficácia mágica dos mitos
racionalista da <<<mentalidade primitiva>>. Começa-se já a duvidar do impate direto
da publicidade nas vendas: também já seria tempo de por radicalmente em

questão esta mecânica fantasmática ingênua – Álibi tanto dos analistas como dos
publicitários. (BAUDRILLARD 2008:195)

Em todo este assunto, encontramo-nos perante uma mitologia de segundo nível, que se
empenha por induzir a tomar como fantasma o que não passa de fantasmagoria, por
lançar armadilhas aos indivíduos através de uma simbólica cheia de expedientes,
servindo-se do mito do seu inconsciente individual para o investir como função de
consumo. (BAUDRILLARD 2008:196)

Super- signo que é a marca; ou seja, a verdadeira e única mensagem. (BAUDRILLARD


2008:197)

A publicidade vê – se por toda a parte a mimar os modos de comunicação imediatos,


intimistas e pessoais. Procura falar à dona de casa a linguagem da dona de casa
que mora em frente, esforça – se por falar ao quadro ou á secretária como o patrão
ou a colega, empenh – se por se dirigir a cada um de nós como amigo, como superego,
como voz interior, servindo – se do modo de confissão. Suscita assim intimidade,
segundo um verdadeiro processo de simulação, onde ela não existe, que entre os
homens que entre estes e os produtos. Eis que entre outras coisas (e talvez em
primeiro lugar) se consome na publicidade).

Entrar no ciclo do consumo e da moda não é apenas rodear-se de objetos e de


serviços a seu bel-prazer, é mudar de ser e de determinação. É passar de um
principio individual fundado na autonomia – o caracter, o valor próprio do eu –
para um principio de reciclagem perpétuo pela indexação num código em que o valor
do individuo se faz racional desmultiplicado e mutável: é o código da
<<personalização>>, de que nenhum individuo em si é depositário, mas que atravessa
cada individuo na sua relação significada aos outros. A <<pessoa>> como instância
de determinação desaparece em proveito da personalização. A partir daí, o
indivbiduo deixa de ser foco de valores autônomos, constitui apenas o termo de
relações múltiplas num processo de inter – relações móveis. (BAUDRILLARD 2008:229)

Em suma, é um ser sociométrico, cuja definição é a de se encontrar na intersecção


dos outros. (BAUDRILLARD 2008:229)

No modo especifico do consumo, já não existe transcendência, nem sequer a


transcendência feiticista da mercadoria; reina apenas a imanência à ordem dos
signos. (BAUDRILLARD 2008:262)

O sujeito do consumo é a ordem dos sinais. (BAUDRILLARD 2008:262)

A nossa sociedade pensa – se e fala – se como sociedade de consumo. Pelo menos, na


medida em que consome, consome – se enquanto sociedade de consumo em idéia. A
publicidade é o hino triunfal desta idéia. (BAUDRILLARD 2008:264)

BAUDRILLARD, Jean. “A sociedade de consumo”. Edições 70. 2008. 2ª Edição.

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