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O trabalho de Jean Guilaine iniciou-se em paragens que o arqueólogo considerou

próximas, como Languedoc, em Montpellier, os Pirenéus franceses, Andorra e


Catalunha. Por quinze anos, trabalhou estudou sítios de implantação de primeiros
agricultores na Península Itálica, provenientes do Oriente. Na ilha do Chipre, estudou
durante 25 anos a neolitização de uma ilha que não tinha cereais para cultivar nem
animais para domesticar. Após realizar trabalhos no sul de França, afirma que definiu
vários grupos culturais como o Juberriense, Montbolo e Bizience, que contribuíram para
um melhor entendimento do Neolítico.
Jean Guilaine também estudou as guerras, para que não se procedesse à mitificação das
sociedades antigas, sendo que estes conflitos surgem após as riquezas e os excedentes
que o Neolítico criou. Com isto, Guilaine iniciou os seus estudos sobre a figura do
guerreiro, muitas vezes representada em esculturas de pedra, envergando as suas armas.
Mas a presença deste ideal de guerra era mais notória nos túmulos masculinos das
culturas do calcolítico, fazendo com que se identificasse a arma ao sexo masculino,
desde os tempos mais primórdios. O discurso de Guilaine centra-se agora nas práticas
funerárias e na hierarquização post-mortem, que se nota na construção de túmulos de
grande envergadura, os quais tiveram vários indivíduos envolvidos nas suas
construções, podendo ser destinados a um único indivíduo, ou vários, exemplificando
com o caso dos túmulos neolíticos de Carnac e os túmulos dos “príncipes” no Wessex,
Saxónia e na Armórica.
Guilaine aponta os anos entre 3000 e 2500 a.C. como anos de apogeu em sociedades
como o Antigo Egipto (primeiras dinastias), a Europa Antiga e a Palestina, e de
acontecimentos como o florescimento da Idade do Cobre em território português.
Depois, até ao ano de 2000 a.C., dão-se desestruturações e conflitos que resultam na
decomposição do poder central no Egipto, no desaparecimento de Ebla (importante
cidade-estado do norte da Síria) e a destruição de cidades situadas na Anatólia e na
região do Levante. Até 1500 a.C., verifica-se um novo período de ascensão com a
retoma do desenvolvimento urbano no corredor Siro-palestinense, o crescimento do
Império Hitita e as descobertas dos túmulos em Micenas, que eram ricamente
decorados. Em 1200 a.C., o Mediterrâneo atingiu o seu auge. A oriente, o comércio
chegou a unir o Império Novo egípcio, o Império Hitita e os reinos micénicos. Porém,
em 1200 a.C., uma nova crise veio deflagrar no Mediterrâneo, resultante do declínio do
Antigo Egipto, do império hitita, dos reinos micénicos e das culturas do Bronze médio-
recente.
Guilaine levanta a questão sobre qual é o papel de Portugal nesta conjetura. Nos seus
tempos de estudante Jean Guilaine leu Les ages préhistoriques de l’Espagne au
Portugal (Emile Cartailhac), assim como La civilisation énéolithique dans la péninsule
Ibérique (Nils Aberg), tendo mais tarde adquirido El Neolitico de Pavia, do arqueólogo
português Vergílio Correia, tendo esta última obra fornecido a Guilaine uma perspetiva
do megalitismo no Alentejo. Enquanto investigador, estabeleceu ligações com Afonso
do Paço quando este escavava a Vila Nova de São Pedro, tendo recebido as publicações
que este elaborava sobre as grutas de Alapraia. Em 1969, visitou o país pela primeira
vez, tendo trabalhado no Museu Etnográfico do Porto, no Instituto Martins-Sarmento,
em Guimarães, tendo visitado museus em Aveiro, Coimbra, Figueira da Foz, Alcobaça e
Santarém. Na capital, encontrou-se com influentes personalidades como Fernando de
Almeida, antigo diretor do Museu Nacional de Arqueologia e presidente da Associação
dos Arqueólogos Portugueses, Georges Zbyszewski, Leonel Ribeiro, Manuel Farinha
dos Santos e Octávio da Veiga Ferreira, tendo com estes visitado localidades como Vila
Nova de São Pedro, Zambujal, Torres Vedras, Alapraia e megálitos do Alentejo, com
destaque para a Anta Grande do Zambujeiro. Em visitas mais recentes, pôde conviver e
partilhar os seus estudos com uma geração mais jovem de investigadores, como Vítor
Jorge, Joaquina Soares, João Zilhão, Ana Catarina Sousa, Rui Parreira e Rosa Cruz.
A Pré-História em Portugal é influenciada por ciclos, ritmos, e convivências tanto
mediterrânicas como atlânticas. De facto, Portugal neolitizou-se de forma oriental, mas
a partir do surgimento dos dólmens, a personalidade atlântica de Portugal acentuou-se,
tornando-se assim num “farol megalítico” que ilumina a pré-história ocidental, como
Galiza, o centro-oeste de França, a Bretanha e a Dinamarca. A esfera mediterrânica
retoma o seu protagonismo, com o surgimento do marfim de África e da Ásia, que
tornam o sul da Península Ibérica como um conjunto cultural inserido nas grandes
culturas calcolíticas.
O seu discurso é concluído com uma interpretação de Guilaine sobre esta “Revolução
Neolítica”: ao se domesticarem as plantas e os animais, os humanos adquiriram
segurança, armamento e aperfeiçoaram as suas técnicas. A agricultura gerou excedentes,
o que permitiu que alguns indivíduos se tornassem artesãos. Porém, esta situação pouco
durou, com o surgimento de desigualdades, estatutos hereditários, o desejo de fazer
lucros e a exploração excessiva dos recursos, e até dos indivíduos. Jean Guilaine
considera que ainda hoje o humano paga o preço destes problemas, mas apela a que se
encontre um caminho de forma a aproveitar os atributos intelectuais da espécie Sapiens.

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