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Apelo do Papa a Carlos Magno

Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa


Departamento de História
História Medieval (Política e Cultura)
Licenciatura em História
Apelo doSilva
Docente: Professora Doutora Maria Manuela Papa (Leão III) a Carlos Magno
Discente: João Goes de Melo
1.º semestre do ano letivo 2020/2021
Neto de Carlos Martel1 e filho de Pepino, o Breve2, Carlos Magno foi considerado pelo Papa
São João Paulo II como o “Pai da Europa” no ano de 2004, por ocasião da receção do Prémio
Internacional Carlos Magno, por ter contribuído para a união da Europa Ocidental. Nascido
em 742, foi rei de vários povos: foi rei dos Francos entre 768 e 814, rei dos Lombardos entre
774 e 814, e rei dos Romanos (por nomeação do Papa Leão III) entre 800 e 814, sendo que o
reinado deste último povo causou a fundação do Império Carolíngio, que atualmente
corresponde aos atuais territórios da França, ocidente alemão e norte de Itália. Carlos Magno
foi pai de Luís, o Piedoso (o seu sucessor com rei dos Francos e Imperador do Sacro-
Império), Pepino (ou Carlomano), encarregue do território italiano, ainda com o pai vivo e
Carlos, o Jovem, bem como das filhas Rotrudes, Berta, Gisela, Teoderada e Rotaida.
O Papa que apelou a Carlos Magno foi o Papa São Leão III (795-816), de origens romanas,
que até à sua eleição para o papado estava responsável pela igreja de Santa Suzana em Roma.
Este apelo que me proponho a comentar decorre da pressão dos Lombardos, povo pagão
originário do Norte Europeu, que ameaçava a cristandade. O pai de Carlos Magno, Pepino, já
tinha estado em disputas contra este povo de forma a defender a cristandade e o
estabelecimento do papado, algo que gerou a gratidão dos anteriores Papas. Leão III terá
apelado à ajuda contra os Lombardos após ter sofrido um ataque na cidade de Roma em 799,
por parte dos Lombardos, que o agrediram e torturaram. Anos antes, em 796, Carlos Magno
teria jurado lealdade à Santa Igreja, protegendo-a dos pagãos, conferindo ao Papa um papel de
protetor religioso, cujas orações seriam uma ajuda para os exércitos derrotarem os infiéis. Um
traço curioso deste apelo é estar redigido como se o Papa já tivesse morrido (“Defendei-as
sem perda de tempo; libertai-as das mãos dos Lombardos que as assaltam, para que o meu
corpo, que sofreu o martírio por Nosso Senhor Jesus Cristo e que a morada onde ele repousa
segundo a vontade de Deus não sejam conspurcados […]”, nas linhas 13-16), algo que só
ocorreu em 816, já depois da morte de Carlos Magno em 814. O apelo de Leão III inicia com
uma espécie de sedução, expressando o carinho que sente pelo povo franco, que lhe é
“particularmente querido” (linha 6). No apelo, o Sumo Pontífice acusa os lombardos de serem
um povo opressor, desrespeitoso, problemático e desestabilizador, que pretendiam lançar a
discórdia no seio da Igreja, bem como efetuar pilhagens, cuja presença já era bem conhecida
no território da Península Itálica. São Leão III apela aos reis Pepino, o Breve, a Carlos Magno
e ao irmão do rei, Carlomano, bem como à hierarquia clerical e à aristocracia, que em nome

1
Mordomo do Palácio entre 717 e 741, bem como líder dos Francos
2

Tem este nome devido à sua baixa estatura. Foi rei dos Francos entre 751 e 768. Além de Carlos Magno, foi
também pai de Carlomano.
de Deus, da Virgem e de todos os mártires, para que Roma seja libertada do jugo dos
lombardos, que chacinavam os habitantes, não respeitando as sagradas escrituras. Caso o
apelo do Papa fosse atendido, seriam recompensados, tanto na vida terrena, como na
eternidade. Desesperado, Leão III apela à rápida ação antes que os ímpios destruam a Santa
Igreja. Caso estes reis desobedecessem ao pedido do Papa, não seria permitida a sua entrada
no Reino de Deus
A importância deste apelo do Papa a Carlos Magno decorre do pacto feito entre os dois que
garantia a autoridade de Carlos Magno e a proteção do Papa e da Cristandade contra os
pagãos e hereges, o que também permitia que Carlos Magno invadisse territórios bárbaros,
cristianizando-os. No dia 25 de dezembro de 800, Carlos Magno é coroado pelo Papa Leão
III, inaugurando assim o Império Carolíngio, sendo o primeiro estádio do Sacro Império
Romano-Germânico, que existiu até ao século XIX, tendo sido conquistado por Napoleão
Bonaparte, na Batalha de Austerlitz. Eginhardo, cronista carolíngio e biógrafo de Carlos
Magno dos séculos VIII e IX, relata em La Vie de Charlemagne a sua coroação pelo Papa São
Leão III e consequente ascensão ao trono: na verdade, Carlos Magno não saberia das
intenções do Papa, sendo que a sua deslocação a Roma 3, que seria apenas para a restauração
da estabilidade, se tornou no dia da coroação de Carlos Magno, a 25 de dezembro de 800, mas
caso soubesse das intenções do Sumo Pontífice, não teria entrado na igreja.

Referências:

3
Durante os seus 47 anos de poder, Carlos Magno não se limitou apenas a defender a Igreja de São Pedro, mas
também a dotou de ricas decorações. Visitou Roma por 4 vezes, e na sua última deslocação a Roma, Carlos
Magno permaneceu lá até ao Inverno, de forma a normalizar a situação, mas acabou por ser coroado por Leão III
RUAS, Henrique Barrilaro, Os Grandes da História: Carlos Magno, Lisboa, Crediverbo,
1976

LOMAS, Francisco Javier, DEVÍS, Federico, De Constantino a Carlomagno. Disidentes,


Heterodoxos, Marginados, Cádiz, Servicio de Publicaciones de la Universidad de Cádiz, 1992

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