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Ciências da Linguagem
Discurso
Alexandra Pinto
Professora Associada da FLUP
Membro do Conselho Científico do CLUP
mapinto@letras.up.pt
DISCURSO
- O discurso é contextualizado, ou uma unidade contextual: não existe discurso senão em contexto. O
sentido do discurso é construído em contexto, não pré-existe. O discurso é influenciado pelo seu
contexto de produção, mas também contribui para o definir e pode, inclusivamente, modificá-lo no
decurso da enunciação;
- O discurso é regulado, é regido por normas: todo o discurso é regido por normas de natureza
linguística e de natureza social;
- Todo o discurso é dialógico: todo o discurso estabelece um diálogo real ou virtual com outros
discursos já produzidos e apenas ganha sentido pleno dentro desse universo de outros discursos face
aos quais ele se posiciona.
(Propriedades extraídas e adaptadas de Charaudeau & Maingueneau – Dicionário de Análise do Discurso.)
O DISCURSO É CONTEXTUAL
Eddy Roulet (1999:188) aponta para um conceito de discurso abrangente que incorpora as várias
possibilidades de atualização deste objeto e para a sua natureza autêntica e contextual: “Utilizo o termo
discurso de maneira genérica para designar todo o produto de uma interação predominantemente
linguística, seja dialógica ou monológica, oral ou escrita, espontânea ou fabricada, nas suas dimensões
linguística, textual e situacional. (tradução nossa).
Adam (2006: 24) defende que o sentido de um texto depende do co(n)texto: “J’écris “co(n)texte” pour
bien dire que l’interprétation d’énoncés isolés portent autant sur la (re)construction d’énoncés à gauche
et/ou à droite (co-texte) que sur l’opération de contextualisation qui consiste à imaginer une situation
d’énonciation qui rende possible l’énoncé considéré. Cette (re)construction d’un co(n)texte pertinente
part économiquement du plus directement accessible: le co-texte verbal et/ou le contexte situationnel de
l’interaction.” (Adam, 2006: 24)
Van Dijk (1985:1) defende o discurso como: “O (...) uso real da linguagem, por locutores reais em
situações reais.”
O DISCURSO É CONTEXTUAL
“Representariam essa teoria e esse modelo uma resposta à verificação empírica imediata de que as
produções verbais se apresentam não como frase, mas sim como “connected discourse”, como texto. Este,
e não a frase, constituiria verdadeiramente o «domínio natural» da teoria linguística e de um modelo
adequado à descrição-explicação dos produtos verbais, já que decididamente, o texto é o signo linguístico
«originário», isto é, não decorrente da teorização linguística, antes, espontânea e naturalmente
actualizado na interacção verbal.” (J. Fonseca, 1992: 29)
Saliente-se que, para Joaquim Fonseca, o texto/discurso constituem uma unidade, que o autor apresenta
como una e indivisível.
O DISCURSO É CONTEXTUAL
Natureza contextual do próprio sentido: "Words do not have meaning; they have uses."
(Wittgenstein, 1953: 43)
“O diálogo - a troca de palavras - é a forma mais natural da linguagem. Mas, mais do que isso: as
declarações longas embora emanem de um único orador - por exemplo, o discurso de um orador,
a palestra de um professor, o monólogo de um ator, as reflexões de um homem só - são
monológicas apenas na sua forma exterior, mas na sua estrutura semântica e estilística são, de
facto, essencialmente dialógicas.” (Bakhtin, 1981: 292).
Locutória
Ilocutória
Perlocutória
Todo o enunciado corresponde a uma ação. Os enunciados são atos, atos de fala (atos linguísticos ou atos
ilocutórios)
Assertivos
Diretivos
Compromissivos
Expressivos
Declarativos
A inscrição do sujeito enunciador no seu enunciado é um tema que, desde sempre, tem desafiado a
Linguística.
Benveniste (1966) trouxe a subjetividade para o centro da reflexão linguística, chamando a atenção para a
forma mais básica de inscrição do sujeito falante na linguagem que é a apropriação da linguagem pelo
sujeito (Fonseca & Fonseca, 1977: 75, 76) em cada ato de enunciação.
Esta apropriação permite ao sujeito assumir-se como o centro de toda a referência linguística, o centro do
discurso.
O sujeito linguístico é este sujeito que se apropria da língua e a converte em discurso em cada ato de
enunciação.
O DISCURSO É SUBJETIVO
Para Émile Benveniste – ‘pai’ da Teoria da Enunciação – o discurso é: “la langue en tant qu’assumée par
l’homme qui parle, et dans la condition d’intersubjectivité qui seule rend possible la communication
linguistique.” (1966:266)
“(…) é um facto simultaneamente original e fundamental o de estas formas «pronominais» não remeterem para a «realidade» nem para
posições «objetivas» no espaço ou no tempo, mas para a enunciação, sempre única, que as contém, e refletirem, assim, a sua própria
utilização. Mediremos a importância da sua função pela natureza do problema que estas formas ajudam a resolver, e que não é outro senão o
da comunicação intersubjetiva. A linguagem resolveu este problema ao criar um conjunto de signos «vazios», não referenciais em relação à
«realidade», sempre disponíveis, e que se tornam «plenos» desde que um locutor os assuma em cada instância do seu discurso (…) O seu
papel é o de fornecerem o instrumento de uma conversão, a que podemos chamar a conversão da linguagem em discurso.(…)
A linguagem instituiu um signo um signo único, mas móvel, eu, que pode ser assumido por cada locutor com a condição de apenas remeter
para a instância do seu próprio discurso. Este signo está, pois, ligado ao exercício da linguagem e declara o locutor como locutor. É esta
propriedade que funda o discurso individual, onde cada locutor assume por sua conta toda a linguagem. O hábito torna-nos facilmente
insensíveis a esta diferença profunda entre a linguagem como sistema de signos e a linguagem assumida como exercício pelo indivíduo.”
(Benveniste, (1966) 1986: 258-266)
Benveniste, É. ((1966) 1986) “De la subjectivité dans le langage” in Problèmes de linguistique générale I, Paris, Gallimard, O Homem na linguagem (tradução
portuguesa Maria Alzira Seixo), Lisboa, Vega Editora.
O DISCURSO É SUBJETIVO
Porque todo o discurso tem origem num sujeito, todo o discurso é subjetivo.
Esta subjetividade constitutiva deixou muitas “pegadas” nas línguas. Enquanto sistemas, as línguas estão
saturadas de elementos e formas diferentes de marcar a presença do sujeito enunciador no enunciado.
«La langue est un phénomène égocentrique, qui donne une place linguistique et fonctionnelle particulière
à la première personne (je), au lieu de l'énonciation (ici) et au moment de l'énonciation (maintenant) ».
(Jacques Moeschler, 1994, p. 42)
Estas marcas que remetem para o EU-AQUI-AGORA fazem parte da subjetividade linguística porque
envolvem diretamente a situação de enunciação e o enunciador. São os DEíTICOS.
O DISCURSO É SUBJETIVO
“Cette subjectivité est omniprésente : tous ses choix impliquent le locuteur – mais à des degrés divers.”
(Kerbrat-Orecchioni, 1980)
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-pragmáticos afins
* Este documento constitui um conjunto de tópicos de aula. Não deve ser entendido nem usado com nenhum outro estatuto. A compilação de
conteúdos efetuada e a redação dada aos mesmos são propriedade intelectual da autora do guião,
1. Subjetividade na linguagem
Diversidade das manifestações nas línguas naturais, estende-se a todos os níveis linguísticos:
fonético, fonológico, morfológico, lexical, sintático, pragmático...)
Exemplos de intensificações:
Repetições
a. ¿Es usted partidaria de la minifalda?
b. De la minifalda, minifalda, minifalda, no
Pronúncia silabeada
Es un PE-SA-DO
Onomatopeias
así que cuando salía // chilando y llorando // buáa/ y venga a llorar/ UNAS
LÁGRIMAS.
Vários
M: ya/ bueno bieen/ otros tiempos/ pero es que es demasiao/ demasiao demasiao/
¡caramba! oye (( )) los pies ¡brmm! ¡hombre! noo noo noo/ no está bien lo
que hacéis!/ ¿eh? Exemplos extraídos de Marta Albelda, La intensificación en el español coloquial, p 72.
2. Modo, modalidade e modalização: centralidade do fenómeno no discurso vs dispersão
conceptual
Modalidade / modalização: uma das mais complexas categorias de análise em Linguística; apresenta uma
grande indefinição conceptual e terminológica.
Para traçar a sua história temos de remontar à doutrina lógico-filosófica de Aristóteles sobre o quadrado
da oposição modal (afirmação universal, negação universal, afirmação existencial, negação existencial) e
sobre as modalidades aléticas (ontológicas: necessário, possível, contingente, impossível) em Organon.
Desde então, esta questão tem sido objeto de análise por várias disciplinas científicas (Filosofia, Lógica,
Semiótica, Linguística), tendo sido propostos vários sistemas de formalização dos conceitos.
Dentro da Linguística, já foi trabalhada a partir de diversas perspetivas, desde a lógica, a semântica, a
sintaxe, a pragmática, a teoria da enunciação, sendo um conceito entendido de modo diferente por
diferentes autores e resultando em propostas de sistematização diferentes consoante o ângulo da
abordagem.
2. Modo, modalidade e modalização: centralidade do fenómeno no discurso vs dispersão conceptual
« Le domaine modal est sans doute celui qui dans les sciences du langage est le plus difficile à cerner, tout
en étant un domaine fondamental de l’étude des langues. » (Carreira, 1997: 197)
« Parler de modalités, sans plus de précision, c'est s'exposer à de graves malentendus. Le terme est, en
effet, saturé d'interprétations qui ressortissent explicitement ou non, selon les linguistes qui l'utilisent, de
la logique, de la sémantique, de la psychologie, de la syntaxe, de la pragmatique ou de la théorie de
l’énonciation. De ce fait, il renvoie à des réalités linguistiques très diverses (…). » (Meunier, 1974: 8)
« Un état des lieux des travaux sur la modalité […] m’ont permis de constater le peu de consensus existant
autour de la notion. Les critères proposés pour définir la modalité en linguistique sont divers et variés:
critères morphosyntaxiques […] sémantiques […] pragmatiques…» (Vittrant, 2012 :116)
3. Modalidade: algumas propostas de conceptualização em Linguística
Charles Bally (1944: 36), salienta a importância da distinção entre modus e dictum, entendendo o dictum
(o que é dito) como o conteúdo representado ou o conteúdo proposicional e o modus, ou seja, a
modalidade ou o operador modal, como a posição do locutor face ao dito, ao conteúdo expresso.
Um enunciado como,
pode ser representado como: Eu creio que P, sendo possível distinguir o dictum ou conteúdo
proposicional (choveu) do modus, (eu creio (que)).
Mas… na maior parte das frases modus e dictum convergem no mesmo material linguístico,
impossibilitando este tipo de análise.
3. Modalidade: algumas propostas de conceptualização em Linguística
André Meunier (1974): oposição entre uma modalidade da enunciação e uma modalidade do enunciado;
Fairclough (2003): distinção entre três tipos de modalidade: modalidade epistémica, deôntica e
categórica e ainda entre modalidade objetiva e subjetiva. A modalidade é uma parte da construção da
identidade: “o quanto você se compromete é uma parte significativa do que você é, assim as escolhas de
modalidade em textos podem ser vistas como parte do processo de textualização de auto-identidades”
(Fairclough, 2003:166).
3. Modalidade: algumas propostas de conceptualização em Linguística
Lyons (1970: 236): 3 escalas de modalidade – desejo e intenção; necessidade e obrigação; certeza e
possibilidade:
“Nous constatons que l’attitude du locuteur peut se marquer grammaticalemente de façons très diverses
dans les différentes langues. On peut établir au moins très échelles de modalité. La première est celle du
souhait et de l’intention. C’est ce qu’illustre l’épitaphe Requiescat in pace (puisse-t-il reposer em paix) : il y
a opposition qui se distingue du subjonctif requiescat et l’indicatif requiescit. (...) La seconde échelle est
celle de la necessité et de l’obligation : Je dois aller à Londres la semaine prochaine, etc. La troisième est
celle de la certitude et de la possibilité : Il peut pleuvoir demain, Il doit être ici etc.”
Para nomear apenas algumas propostas. Muito fica sempre por dizer quando o tema é modalidade...
3. Modalidade: algumas propostas de conceptualização em Linguística
Oliveira (1993; 2013): modalidade é a gramaticalização de atitudes e opiniões dos falantes, correspondendo
a um fenómeno de grande amplitude.
Campos e Xavier (1991); Campos (1998) e Campos (2004): tipologia tripartida de modalidade:
A propósito da modalidade deôntica, Campos diz que esta é instauradora de uma obrigação e logo de uma relação
intersujeitos entre um sujeito deôntico “Sd”, fonte da obrigação, e um segundo sujeito que é o alvo da obrigação (Campos,
1998). Em 2004, a autora convoca Bally para expressar que a modalidade deôntica é a que corresponde ao desejo de que um
determinado estado de coisas seja ou não seja. (Campos, 2004: 271).
A modalidade apreciativa permite a expressão de um juízo de valor ou de uma apreciação sobre um dado
conteúdo proposicional. O juízo de valor pode ser positivo (7) ou negativo (8):
Qualquer uma destas modalidades se expressa em discurso através de recursos linguísticos muito
diversificados.
4. Modalização: algumas propostas de definição em Linguística
Para Charaudeau e Maingueneau (2002: 382-383), a modalização indica « l'attitude du sujet parlant à
l'égard de son interlocuteur, de lui-même et de son propre énoncé »
Para Corbari (2008) a modalização é a estratégia à qual o enunciador recorre para demarcar a sua posição
em relação à mensagem que exprime ou para estabelecer uma interlocução mais ativa com o leitor, no
sentido de o tentar convencer da validade da opinião expressa. (Corbari, 2008).
De acordo com Oliveira & Mendes (2013), pode falar-se em modalização “quando ocorre uma
reinterpretação da força modal de um enunciado de mais forte para menos forte no âmbito do mesmo
domínio modal”. Contudo, segundo as mesmas autoras, uma forma mais lata abarca também o
movimento inverso de “reinterpretação da força modal de um enunciado de menos forte para mais forte
no âmbito do mesmo domínio modal.” (Oliveira & Mendes, 2013).
4. Modalização: algumas propostas de definição em Linguística
A modalização afeta o enunciado como um todo, podendo incidir sobre qualquer termo do mesmo. Ela
pode ser expressa por um verbo, um adjetivo, um tempo verbal, um advérbio, etc. (Culioli, 1971: 26). A
modalização linguística pode apresentar-se ora por meio de elementos linguísticos externos ora por meio
de elementos linguísticos integrados no dito.
Na proposta de Oliveira & Mendes (2013), o valor modal pode ser expresso através de variadíssimos
mecanismos linguísticos, como tempos e modos verbais, advérbios, adjetivos, partículas discursivas com
diferentes valores modais e até sinais de pontuação. Alguns dos mecanismos com função modalizadora
são: verbos semiauxiliares modais como poder, dever, ter (de), haver (de); verbos que veiculam valores
modais como saber, crer, permitir, obrigar; advérbios e locuções adverbiais que veiculam valores modais
de crença; os modos indicativo e o conjuntivo, cuja alternância induz leituras diferentes em diferentes
construções e alguns tempos gramaticais capazes de criar situações alternativas associadas ao domínio da
possibilidade, como é o caso do imperfeito e do futuro, entre muitos outros mecanismos.
Assim, palavras, expressões e construções com estruturas sintáticas diversas podem receber funções
modalizadoras (possivelmente, é possível que x, há possibilidade de x), bem como elementos tais como a
pontuação, a entoação ou até outro tipo de sinais gráficos (aspas, itálicos, sublinhados, negritos,
maiúsculas).
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-
pragmáticos afins
A noção de que o sujeito deixa as suas marcas no discurso está, também, presente nos trabalhos de Kerbrat-
Orecchioni (1980).
Esta autora distingue o discurso objetivo do discurso subjetivo, observando que o primeiro é aquele “que se
esforça para apagar qualquer traço da existência de um enunciador individual”, sendo o segundo o discurso
“no qual o enunciador se impõe explicitamente («eu acho isso feio») ou surge implicitamente («isso é feio»)
como a fonte avaliativa da asserção”.
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-
pragmáticos afins
A autora introduz o conceito de subjectivèmes, conjunto de categorias linguístico-discursivas que, oriundas de classes
gramaticais distintas e com estatutos linguísticos diversos, servem de veículo para a marcação do sujeito no enunciado:
“toute séquence discursive porte la marque de son énonciateur, mais selon des modes et des degrés divers.” (idem: 162)
“lorsqu’un sujet d’énonciation se trouve confronté au problème de la verbalisation d’un objet référentiel, réel ou imaginaire,
et que pour ce faire il doit sélectionner certaines unités dans le stock lexical et syntaxique que lui propose le code, il a en gros
le choix entre deux types de formulations :
• le discours « objectif », qui s’efforce de gommer toute trace de l’existence d’un énonciateur individuel ;
• le discours « subjectif », dans lequel l’énonciateur s’avoue explicitement (« je trouve ça moche ») ou se pose implicitement
(« c’est moche ») comme la source évaluative de l’assertion. (idem: 69)
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-pragmáticos afins
A autora chama a atenção para o facto de que a subjetividade linguística é constitutiva: ela está sempre
presente em todos os discursos;
A sua marcação não é uma questão de presença vs ausência, mas, sim, uma questão de grau;
A expressão da subjetividade permite diferenciar tipos de discurso e géneros de texto:
“Le principe que nous avons précédemment énoncé : la subjectivité langagière est partout, mais diversement
modulée selon les énoncés, vaut pour les ensembles textuels aussi bien que pour les unités textuelles : il n’est
pas de « genre » qui échappe à l’emprise de la subjectivité, ni le discours des historiens, ni celui des
géographes, ni celui des lexicographes, ni celui des juristes , ni même celui des mathématiciens . Mais ce ne
sont pas les mêmes « subjectivèmes » qu’ils exploitent les uns et les autres.
Utiliser les critères énonciatifs (entre autres critères) pour fonder une typologie des textes, c’est donc chercher
les types de marques énonciatives qui sont tolérées/refusées par chaque type de discours, et caractériser
chaque genre par une combinaison inédite d’énonciatèmes.” (idem: 173)
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-pragmáticos afins
Para operacionalizar a análise da subjetividade, a autora distingue nas classes dos adjetivos, dos substantivos e
dos advérbios, diferentes categorias. Na classe dos adjetivos distingue as seguintes classes:
Graças às categorizações que formulou, constrói um quadro teórico aplicável à análise do fenómeno da subjetividade no
discurso.
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-pragmáticos afins
Mesmo os adjetivos “objetivos” (relacionais ou não qualificativos) podem, em contexto, ganhar valores
subjetivos (afetivos e axiológicos).
Adjetivos afetivos: enunciam uma reação emocional do locutor face ao objeto que modificam.
Adjetivos avaliativos não axiológicos: Não fazem intervir juízos de valor, nem envolvimento afetivo do locutor,
mas implicam uma «”évaluation qualitative ou quantitative de l’objet dénoté par le substantif qu’ils
déterminent» (Kerbrat-Orecchioni, 1980, pp. 85-86)
“cette classe comprend tous les adjectifs qui, sans énoncer de jugement de valeur, ni d’engagement affectif du
locuteur (du moins au regard de leur stricte définition lexicale : en contexte, ils peuvent bien entendu se
colorer affectivement ou axiologiquement), impliquent une évaluation qualitative ou quantitative de l’objet
dénoté par le substantif qu’ils déterminent.” (ibidem)
(os adjetivos não são intrinsecamente axiológicos, embora possam ganhar sentidos axiológicos)
Ex: Esta casa é grande
Mas, confrontar o seguinte slogan publicitário: “Um pequeno grande carro.” ou o enunciado: “Ele foi um
grande homem.”
Adjetivos avaliativos axiológicos: «portent sur l’objet dénoté par le substantif qu’ils déterminent un jugement de
valeur, positif ou négatif »
(os adjetivos são intrinsecamente axiológicos pois transportam uma polaridade semântica negativa ou positiva)
« les axiologiques sont dans leur ensemble plus fortement marqués subjectivement »
“(...) le but ultime (et dans une certaine mesure utopique) de cet inventaire des unités énonciatives étant,
après les avoir affectées d’un indice de subjectivité, d’ élaborer une méthode de calcul du taux de subjectivité
que comporte un énoncé donné, ce qui permettrait de trancher tous ces débats confus sur l’objectivité de tel
ou tel article ou organe de presse.” (Kerbrat-Orecchioni, 1980,p 73)
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-
pragmáticos afins
A Teoria dos atos ilocutórios proporcionou uma outra forma de perspetivar a expressão linguística da
modalidade.
Searle (1969) define cinco categorias básicas de atos ilocutórios: assertivos, diretivos, comissivos, expressivos
e declarativos. É possível estabelecer uma aproximação entre a chamada modalidade deôntica e os atos
comissivos e diretivos; entre a modalidade epistémica e os atos assertivos e entre a modalidade apreciativa e
os atos expressivos.
Exemplificando através dos atos assertivos, para Searle, as asserções são atos ilocutórios que comprometem o
enunciador com a verdade da proposição. A condição de sinceridade dos atos assertivos, definida por Searle
como uma das condições de felicidade deste tipo de atos, depende da crença do enunciador no que enuncia,
relacionando-se, por isso, com o seu grau de certeza no dito.
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-
pragmáticos afins
Baseando-se em Norrick, Lopes (2018) distingue dois tipos de atos expressivos: atos expressivos fortemente
institucionalizados, determinados por convenções sociais, e que envolvem, na sua realização, fórmulas
ritualizadas estereotipadas e atos expressivos que traduzem genuinamente emoções, sentimentos e
avaliações subjetivas do falante.
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-
pragmáticos afins
“Tem o sujeito falante uma noção intuitiva de ênfase, que genericamente associa ou amplamente faz
convergir com a de «expressividade» no uso da língua. Dizer de um dado Enunciado que ele é
enfático significa, na verdade, em termos correntes, reconhecer que nele se tornam perceptíveis ou
notórios valores expressivos ou expressivo-apelativos que o afectam quer globalmente quer em
algum ou alguns dos seus elementos constituintes.
Uma tal apresentação da ênfase é, sem dúvida, demasiado genérica. Nela caberá todo o domínio da
chamada «linguagem afectiva», do mesmo modo que o vasto campo da metáfora e das outras figuras
'de retórica' ou 'de estilo', ou (numa formulação mais englobante) todos os fenómenos de «desvio» a
padrões ou normas tidos como de uso «banal» da língua. Em boa verdade, porém, tal apresentação
genérica está em sintonia com a intuição do falante, que em todos os domínios acabados de referir
reconhece a presença de traços de «expressividade» que de algum modo sublinham, dão saliência
ou relevo a um Enunciado ou a algum dos seus termos. Manifestam-se esses traços em
variadíssimos aspectos da configuração dos produtos verbais, como sejam, entre tantos outros,
selecção do léxico e de esquemas sintagmáticos, combinações «anómalas» de elementos lexicais, usos
particulares de determinadas categorias gramaticais, exploração da matéria fónica (por reforço
articulatório, matizações de prosódia).” (Fonseca, 1985: 214)
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-
pragmáticos afins
Soares (1996) efetua uma síntese sobre os estudos em Pragmática que se debruçaram sobre este tópico.
“a escolha de uma realização linguística particular do acto ilocutório (mitigada ou reforçada) é co--
determinada, entre outros factores, por duas condicionantes situacionais específicas, envolvidas na
comunicação interpessoal: (a) factores sociais que incluem parâmetros atinentes à relação entre os
participantes ((1) poder social e (2) distância social); e (b) contexto situacional.” (idem: 168)
Encontramos diferentes mecanismos linguísticos a operar na modificação ilocutória de atenuação (9) e (10) e de reforço (11)
de atos assertivos.
“Nesse processo de tomada de decisão quanto à selecção de estratégias capazes de comunicar o objectivo pretendido, é
facultada ao locutor a possibilidade de optar por uma acção discursiva com força ilocutória neutra, reforçada ou atenuada.
(...) Este esquema representa os graus de força ilocutória afectos a cada acto de discurso, graus esses representados num
"continuum" - escala de valores - que se desenvolve a partir de um pólo negativo - situado na zona da modalidade de
"atenuação" - até um pólo positivo - localizado na zona da modalidade do reforço -, e passando por diversas soluções
intermédias que convergem para uma zona neutra.” (idem: 168 – 169)
“os marcadores (linguísticos e não linguísticos) responsáveis por estas modulações de intensidade acrescentam ao valor
lógico-semântico do enunciado a que se agregam informações pragmático-contextuais concernentes a mudanças não só no
estado de conhecimentos e no domínio de motivações do locutor, mas também no estado de obrigações dos intervenientes e
na qualidade da sua relação.” (ibidem)
5. Relação dos conceitos de modalidade e modalização com outros conteúdos semântico-
pragmáticos afins
A atenuação é definida por Briz & Albelda (2013: 192), como “uma atividade argumentativa (retórica)
estratégica de minimização da força ilocutória e do papel dos participantes na enunciação para tentar chegar
com êxito à meta prevista”.
Albelda (2004) estuda as formas através das quais a intensificação se codifica linguisticamente, as funções
comunicativas que cumpre, assim como as funções sociais. A intensificação é uma categoria pragmática a
propósito da qual a autora diz o seguinte:
Por ser uma categoria pragmática, apenas uma perspetiva funcional sobre o fenómeno pode ser compreensiva:
“lo que singulariza a la intensificación es su función y no sus formas. Es legítimo, por tanto, aplicar el mismo
concepto, intensificación, a lo que podrían considerarse dos fenómenos diferentes. (idem: 396)
Briz e Albelda propõem uma tipologia de recursos de atenuação (2013): 22 mecanismos linguísticos e não
linguísticos, que incluem entre outros:
Num estudo sobre mitigação conversacional, Fraser diz que esta produz o efeito de "reducing the
harshness or hostility of the force of one's actions (...).”, protegendo os interactantes das consequências do
ato de discurso. (Fraser, 1980:342).
1. A propósito dos enunciados abaixo, explique o efeito dos atos linguísticos indiretos (derivação
ilocutória) na redução da força ilocutória dos atos de discurso:
2. Explique o efeito discursivo das expressões abaixo apontadas por Fraser como “sentence initial
disclaimers”:
3. Demonstre, a partir dos enunciados abaixo, que estes “sentence initial disclaimers” podem mitigar
tipos de atos ilocutórios diferentes:
4. Identifique, a partir dos exemplos abaixo, sobre que atos ilocutórios o disclaimer exemplificado incide:
5. Explique o efeito na redução da força ilocutória dos atos de discurso produzido pelos verbos
parentéticos (na terminologia de Fraser, 1980), “hedges” frásicos (na terminologia de Lakoff, 1980),
verbos modalizadores epistémicos (na terminologia de Holmes, 1984 e 1993), "- ('minus') Committer’’’
(na terminologia de House & Kasper, 1981:166) ou ainda verbos performativos que expressam valores
modais epistémicos e evidencialidade (na terminologia de Briz e Albelda, 2013: 304):
7. A propósito dos enunciados abaixo, explique o efeito das perguntas-tag na redução da força ilocutória
dos atos de discurso:
Através dos "upgraders", o enunciador aumenta a força ilocutória do ato. (Com isto pode diminuir, em
certos casos, os fatores [escolha] e [benefício], em prejuízo do Tu.)
Exercícios de Aplicação
8. Formule enunciados simulados para demonstrar o efeito na redução da força ilocutória de alguns dos
"downgraders” (House & Kasper, 1981) listados abaixo :
8.1 “Hedges”:
Expressões como: "kind of”, "sort of, "somehow", "and so on", "more or less", "rather",... (ibidem: 167)
8. 2 "Downtoners"
Modificadores de frases como, "just", "simply", "possibly", "perhaps" , “rather”... (ibidem:161)
8.1 Identifique, nos enunciados abaixo, sobre que tipo de atos ilocutórios a expressão exerce a sua função
modalizadora:
1) Será que conseguimos marcar algum horário alternativo? de repente um café, alguma coisa assim?
(EX41)
2) hahahaha verdade! E se a gente marcasse de dia e em um lugar mais perto? De repente nao teríamos
esses problemas...(Ex44)
3) “Poderíamos puxar um trio elétrico na Avenida Paulista. De repente, levar o padre Marcelo Rossi” ( Ex 60)
4) de repente amanhã ou domingo, que acham? Mas talvez amanhã jante com meu pai, ta vindo pra Sampa.
(Ex 11)
(exemplos extraídos de Silva, Cristiane Reis - O uso da expressão «de repente» como modalizador da força
ilocutória. Dissertação de Mestrado, FLUP, 2021)
Exercícios de Aplicação
8.2 Identifique, nos enunciados abaixo, sobre que tipo de atos ilocutórios a expressão “de
repente” exerce a sua função modalizadora:
8.3 Identifique, nos enunciados abaixo, sobre que tipo de atos ilocutórios a expressão “de repente” exerce
a sua função modalizadora:
8) Antes eu nunca tivesse dito nada do que eu disse, de repente não estaria doendo como dói agora..! (Ex
69)
9) se eu não fosse tão teimosa, de repente eu não estaria com joelho ferrado agora, mas.....(Ex 74)
10) Queria poder voltar no tempo e mudar umas coisas, de repente eu n estaria assim agora ( Ex75)
11) as vezes eu penso, se eu tivesse feito diferente, hoje de repente eu estaria feliz.. ;s (Ex76)
12) Eu queria tanto ter quem eu tinha a uns meses atrás, agora já era, se eu n tivesse tomado decisão na hr
da raiva de repente eu n estaria assim agr (Ex77)
Exercícios de Aplicação
8.4 Identifique, nos enunciados abaixo, sobre que tipo de atos ilocutórios a expressão “de repente” exerce a sua
função modalizadora:
13) De repente, na terça eles mostram como foi esses sete anos que ela estava presa. Estou aguardando ansiosa.
(Ex 27).
14) (A)Sonhei com a Tainara a noite toda e acordei chorando.. .sem bom dia! – (B)Reza por ela, de repente ela
está precisando. ( Ex 72)
15) Thiago disse que de repente a gente (o público) não entendeu direito: o imunizado não vota. Qdo foi que vc
explicou isso pra nós, ( Ex 60)
16) Tem um estudo do professor Miguel Nicolelis em que ele relaciona a dengue com a Covid 19. A pesquisa
indica que é possível que quem tenha tido dengue, possa apresentar uma imunização a Covid 19. De repente a
dengue pode nos salvar de um mal maior. ( Ex 50)
17) Será que isso não é mais um ato falho do PGR84? De repente houve fraude mesmo! Será que foi o Haddad
que realmente teve a maioria dos votos? Tô aqui só pensando... ( Ex 56)
18)Vou passar umas musicas pro meu iPod, me arrumar e sair. De repente mais tarde eu volto, nao sei. Beijos
85pros followers xx ( Ex23)
Exercícios de Aplicação
Holmes contribui para distinguir entre objetivo e força ilocutória: "The terms 'illocutionary force’ and
'illocutionary point' are sometimes used interchangeably to describe the function or purpose of a speech
act. I have consistently used only 'illocutionary point' in this sense. The term 'illocutionary force' is used in
this paper to refer to the strength with which the illocutionary point is presented (cfr., Searle 1976:5)."
(Holmes, 1984: 345)
Holmes (1984) defende que, através do uso de marcadores de reforço e de atenuação, o sujeito
enunciador comunica (1) um significado modal (i.e., uma atitude epistémica, expressa de acordo com
uma escala gradativa, em relação à validade do conteúdo proposicional assertado) ou/e (2) um significado
afetivo (i.e., a sua atitude (emotiva) para com o Tu.
Exercícios de Aplicação