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DIREITO DO CONSUMIDOR
AULA 3
Você já ouviu falar nos contratos celebrados “no fio do bigode”? Ou nos
chamados “contratos de gaveta”? Práticas relativamente comuns no passado,
esses hábitos consistiam em celebrar negócios sem necessariamente redigir um
contrato e assiná-lo por meios oficiais. Na imensa maioria dos casos, os acordos
celebrados sem testemunha ou provas eram integralmente cumpridos.
Por esse motivo, muitas pessoas – em especial aquelas com mais idade
– dizem que no passado as coisas eram mais corretas e os indivíduos cumpriam
com sua palavra. É o famoso “no meu tempo não tinha isso”. O que ocorre é que,
naquela época, as comunidades eram certamente menores. Se alguém
prometesse algo e acabasse não cumprindo, a notícia se alastrava com relativa
facilidade e o caloteiro acabava sem credibilidade.
Hoje quase não é mais possível celebrar um acordo sem um contrato ou
prova escrita. Os contratos, sejam eles quais forem, e questões relativas a
personalidade e nome, formas e modalidades de pagamento, negócios,
questões de família, condomínio, indenizações e danos são todos tema de uma
área do Direito chamada Direito Civil, que estudaremos no decorrer dessa aula.
O atual Código Civil (CC) – grande instrumento normativo desse ramo do
Direito – foi instituído pela Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, tendo entrado
em vigor um ano após sua publicação. Antes desse Código, vigorava no Brasil
outro Código Civil, mas de 1916 (Lei n. 3.071, de 1 de janeiro de 1916).
Certamente que a sociedade de 2002 pouco se parecia com a de 1916. Por isso,
a necessária atualização do CC/2002.
Outro ponto de grande importância do CC/2002 é que ele revogou não
apenas o Código de 1916, mas também metade do Código Comercial de 1850
(isso mesmo, do século XIX!). As questões relativas à abertura de empresas,
sociedades empresariais, contrato social, exclusão de sócios, mudança de
capital social entre outras são também abordadas pelo CC/2002.
Esses são apenas alguns, dentre os vários temas, que estudaremos
nessa e na próxima aula! Vamos lá?
CONTEXTUALIZANDO
Imagine que você precisa muito adquirir um veículo. Seu trabalho está
prosperando, você está sendo reconhecido por seu chefe e superiores, e chegou
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a tão sonhada hora de tornar-se motorizado. Depois de muito procurar, você
encontra o automóvel que sempre quis num preço que cabe em seu bolso:
moderno, seminovo e muito bonito, seu carro está sempre limpo, encerado e
polido, prontinho para te levar a qualquer lugar.
Porém, nem tudo são flores, e o que era para ser sonho torna-se
pesadelo. Um dia, o carro não liga. Depois de muito insistir, ele liga, mas você
ouve um grande estouro. Além do susto, um cheiro de queimado começa a tomar
conta de sua garagem. Na oficina, você descobre que o carro foi vendido a você
com um problema que o antigo dono certamente sabia. O mecânico lhe
demonstra que uma manutenção barata havia sido feita para mascarar um
problema grave no motor. Se você estivesse em uma rodovia, possivelmente o
defeito poderia causar um grave acidente.
Para reparar o motor, será necessária uma pequena fortuna; e agora, o
que fazer? Você deve arcar com o prejuízo? Você deve acionar o vendedor do
automóvel na Justiça, ou no Procon? Lembre-se de que o Procon só deve ser
acionado quando o lado vendedor é uma pessoa jurídica (empresa), e não uma
pessoa física. Como, então, resolver esse caso? Esse é um dos vários temas
que abordaremos nessa aula.
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exemplo de aplicação da analogia era a incidência do Decreto-lei
2.681/1912, antes do Código Civil de 2002. Previa esse decreto a
responsabilidade civil objetiva das empresas de estradas de ferro. Por
ausência de lei específica, esse dispositivo legal passou a ser aplicado
a todos os tipos de contrato de transporte terrestre. Por uma questão
lógica, e pela presença de lacuna normativa, tal comando legal passou
a incidir em ocorrências envolvendo bondes, ônibus, caminhões,
automóveis, motos e outros meios de transporte terrestre.
Só podem celebrar todos esses atos aqueles que estejam em pleno gozo
de sua personalidade. Os direitos da personalidade, adquiridos com o
nascimento e legitimados com a maioridade, são intransmissíveis e inalienáveis,
o que significa que não podemos jamais renunciar a eles. Dentre os mais
importantes direitos da personalidade está o nome. Como diz o CC/2002: “Art.
16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o
sobrenome”.
Aqueles que têm ofensas feitas ao seu nome – sejam pessoas físicas ou
jurídicas – podem e devem receber as devidas reparações. Novamente,
estabelece o CC/2002: “Art. 17. O nome da pessoa não pode ser empregado por
outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo
público, ainda quando não haja intenção difamatória”. Essa proteção também se
aplica à imagem.
Venosa (2017, p. 187) informa ainda que “a imagem da pessoa é uma das
principais projeções de nossa personalidade e atributo fundamental dos direitos
ditos personalíssimos. O uso indevido da imagem traz, de fato, situações de
prejuízo e constrangimento”. É o caso de, por exemplo, um programa televisivo
veicular a imagem e nome de alguém como procurado pela justiça, sendo que a
pessoa nada deve à lei.
Nesse caso, a pessoa cujo nome e imagem foi veiculada, certamente terá
direito a uma indenização por dano moral. O mesmo se aplica a empresas: por
exemplo: quando alguém ofende uma empresa na internet, dizendo ter sido
enganado ou prejudicado, o ofensor pode ser condenado a indenizar o ofendido
caso suas palavras sejam provadas falsas e caluniosas. Comenta Venosa (2017,
p. 187) que “para fins de indenização, deve ser avaliado se a divulgação atingiu
a honra, a boa fama ou a respeitabilidade da pessoa envolvida. Se a
manifestação teve finalidades comerciais, aflora diretamente o dever de
indenizar”.
Em termos de imagem e vida privada, diz o CC/2002: “Art. 21. A vida
privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado,
adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário
a esta norma”. Aqui protege-se a intimidade das pessoas. Em tempos de redes
sociais, vazamentos de vídeos ou imagens comprometedoras tornaram-se,
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infelizmente, comuns. Além desses direitos – questões relativas à capacidade,
exercício e gozo de atos da vida civil, nome e imagem – a personalidade abrange
ainda diversos outros temas, como a sucessão e a morte, que não serão objeto
de nossa discussão aqui.
Trataremos, no tema a seguir, do negócio jurídico, que tem na capacidade
uma importante condição de validade.
O que fazer, então, quando a coisa objeto do contrato vem eivada de vício
redibitório? Resta à pessoa que sofreu o dano lançar mão da chamada “ação
edilícia”. São duas opções: a primeira é a chamada ação redibitória, na qual a
parte lesada pode pedir o desfazimento do negócio jurídico. Nesse caso,
devolve-se o bem ao vendedor que, por sua vez, devolve o dinheiro ao
comprador. Outra opção é a ação estimatória, na qual a parte lesada busca do
vendedor o valor necessário para efetuar a reparação do vício redibitório, ou um
abatimento no preço do total. É o que afirma o CC/2002:
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TEMA 4 – OBRIGAÇÕES
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A esse respeito, afirma o CC/2002: “Art. 233. A obrigação de dar coisa
certa abrange os acessórios dela, embora não mencionados, salvo se o contrário
resultar do título ou das circunstâncias do caso”.
Quando falamos na obrigação de dar coisa certa, nos referimos a algo
que pode ser individualizado. É o imóvel situado na rua X, número Y, de
matrícula Z. Ou então o automóvel da marca A, modelo B, placa C e chassi D.
Trata-se de um item específico. Quando o art. 233 do CC/2002 afirma que a
obrigação de dar abrange os acessórios, isso significa que aquele que adquire
um automóvel leva junto o rádio nele instalado; aquela pessoa que adquire uma
casa, leva também as benfeitorias nela incluídas.
E o que seriam as obrigações de dar coisa incerta? Como posso saber
algo se é incerto? Explicam Gagliano e Pamplona Filho (2020, p. 370) que essa
obrigação possui prestação que “consiste na entrega de coisa especificada
apenas pela espécie e quantidade. É o que ocorre quando o sujeito se obriga a
dar duas sacas de café, por exemplo, sem determinar a qualidade (tipo A ou B).
Trata-se das chamadas obrigações genéricas”.
Ou seja: aquilo que é incerto indica-se pelo tipo de coisa que é – soja,
café, arroz, feijão. É o que reitera o CC/2002: “Art. 243. A coisa incerta será
indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade”. Os contratos do
agronegócio incluem-se nesse tipo de obrigação.
Outro tipo muito comum de obrigação são as obrigações de fazer. É o que
ocorre na prestação de serviços de forma geral. A esse respeito, Gagliano e
Pamplona Filho (2020, p. 379) discorrem que
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Além dos exemplos acima, podemos citar os serviços de consultoria.
Muitos são contratados levando em consideração a reputação e conhecimentos
do consultor, de forma que são obrigações de fazer infungíveis. E o que seriam
as obrigações de não fazer? O não fazer é, antes de mais nada, uma omissão.
Você pactua com alguém que esse alguém não terá determinada conduta.
Novamente, Gagliano e Pamplona Filho (2020, p. 388) explicam que uma
obrigação de não fazer é
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tudo, para que as pessoas criem direitos e obrigações entre si: “Você me dá uma
quantia em dinheiro, e eu presto consultoria na empresa em que você trabalha”.
O contrato é o documento que estipula os detalhes dessa relação: a forma
de pagamento, o prazo, a data de entrega e todos os dados sobre o que
combinamos estarão ali escritos. Contratos podem ser gratuitos, quando
somente uma das partes se obriga a alguma coisa, como numa doação; ou
onerosos, quando envolve vantagens patrimoniais para ambas as partes.
E quando um contrato se forma? Antes mesmo da assinatura de um dado
documento, um contrato se forma quando as vontades se encontram, como
afirmam Gagliano e Pamplona Filho (2020, p. 661):
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É justamente por isso que indicamos que toda proposta comercial seja
acompanhada de um prazo: “a presente proposta terá validade de X dias”. Do
contrário, pode-se ter dores de cabeça com exigências incabíveis de nossa
clientela.
TROCANDO IDEIAS
NA PRÁTICA
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3498071, 2.ª Câmara de Direito Privado, Catanduva, Rel. Des. Morato
de Andrade, j. 03.03.2009, DJESP 26.03.2009).
FINALIZANDO
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e III - forma prescrita ou não defesa em lei”. Quando um negócio jurídico é
celebrado mediante coação ou erro de uma das partes, esse negócio é nulo ou
anulável.
Você aprendeu também que as obrigações tratam de relações
patrimoniais, o que pode ser – por exemplo – uma compra e venda firmada em
um contrato. Os contratos são fontes essenciais das obrigações. Existem vários
tipos de obrigações: de dar coisa certa, de dar coisa incerta, de fazer, de não
fazer e obrigação solidária, entre outras.
Tanto as obrigações quanto os contratos possuem, nas declarações de
vontade das partes, sua condição de validade. As tratativas não obrigam as
partes, mas você aprendeu que, quando um dos lados é levado a acreditar que
o acordo será celebrado, seus gastos e despesas devem ser indenizados no
caso de não celebração.
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REFERÊNCIAS
TARTUCE, F. Manual de direito civil: volume único. São Paulo: Saraiva, 2021.
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