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MEU DELEGADO

SÉRIE "MEU" - LIVRO 3

Valentina Torres
Encolho as pernas abraçando os joelhos, apoio minhas costas contra o
azulejo frio da parede. Fecho os olhos sentindo a ardência das lágrimas que
descem por meu rosto. Só peço que pare, por favor. Mais, socos na porta me
fazem pular assustada, amedrontada.
— Por favor, por favor, pare Spencer — imploro.
— Vadia desgraçada. Abre essa porta Cindy. — Socos, e mais socos.
Sinto algo pingando, abaixo a cabeça e vejo as gotas de sangue
manchando o chão de vermelho. Deslizo a mão limpando minha boca, e a
vejo suja com as evidências de mais uma maldita noite.
— Spencer, por favor — suplico, em meio às lágrimas.
— Eu vou te matar, sua puta — grita alto.
Com um último pontapé a porta se abre. Alucinado e fora de controle, ele
entra no banheiro vindo diretamente em mim. Seus dedos enrolam em meus
cabelos e os puxam me levantando do chão. Posso ver em seus olhos a fúria
cega, e tenho certeza de que hoje será meu fim. Grito por socorro, enquanto
sou arrastada como um animal nosso quarto. Os vizinhos não se intrometem
em brigas de casais, não importa para eles se serei morta. Debato-me
tentando fugir de suas mãos, mas é inútil. Além do mais fugir para onde? Não
tenho ninguém, e ele nunca me deixaria partir com vida.
Sou suspensa no ar, e jogada na cama. Seu grande corpo por cima do
meu, me segurando presa entre ele e o colchão. Usando as pernas como
reforço, abre as minhas pernas rasgando em seguida minha calcinha. Suplico
encarando dentro dos olhos verdes, e o sorriso que nasce nos seus lábios ao
enfiar seu pau, me traz a realidade de que ele é um monstro frio e sem
coração.
Suas mãos seguram meu pescoço com força, e a cada arremetida na
minha boceta seus dedos apertam mais forte, me sufocando. Desisto de lutar,
simplesmente aceito o destino.
— Gosta assim, não é? Admite. Eu vi você olhando para o homem que
coleta o lixo. Quer ser fodida igual uma piranha. — Uma mão solta o
pescoço, e desce em direção ao rosto me esbofeteando.
Deus, por favor, acabe com isso. Acabe com isso, por favor. Sem ar,
sufocando aos poucos, pouco a pouco vou perdendo a consciência.
Quando saio na rua, ando sempre de cabeça baixa, ele que escolhe minhas
roupas, só posso sair em sua companhia, sair é quase um milagre.
Quando o conheci na faculdade, gentil, amoroso, bondoso, não fazia ideia
do tipo de pessoa que ele se tornaria. Às vezes acho que o amor me cegou
para enxergar os sinais. Ciúmes, discussões, suas mãos quando seguravam
firme meu braço, mas sempre em seguida um pedido de desculpas com
flores, e lágrimas.
E como uma tola apaixonada, aceitei seu pedido de casamento. Sempre
fui sozinha criada em lares adotivos e ter alguém cuidando de mim desse jeito
era algo maravilhoso, não podia perdê-lo. Os primeiros dias de recém-
casados foram inesquecíveis. Mas quando engravidei tudo mudou. Do dia
para noite meu príncipe encantado se tornou meu carrasco.
Em sua primeira crise me espancou a ponto de perder o bebê. Sangrando
e com fortes dores abdominais fui levada para a emergência e como uma boa
esposa devotada, contei aos médicos como tinha caído da escada arrumando
o sótão. Depois daquele dia as coisas só pioraram. Violência sexual, agressão
física, humilhação verbal.
Perdida em pensamentos, sou pega de surpresa quando Spencer gira meu
corpo me colocando de bruços e monta por cima da minha bunda. Mordo os
lábios a ponto de sangrá-los. Algo duro é enrolado em meu pescoço e sou
montada como se fosse uma égua.
Minha visão vai ficando turva, embaçada. É o meu fim.
Fecho os olhos sentindo alívio, porém uma voz ao fundo sussurra no meu
ouvido que mereço mais, que não posso acabar assim. Reúno forças que não
sabia que tinha, e decido lutar pela minha vida. O ar fugindo dos pulmões
dificultando respirar, me contorço. Distraído com seu ato de violência, não
percebe quando estico o braço até criado mudo e pego a caneta. Tento mover
o abdômen e com um momento de coragem enfio no seu joelho.
Gritando, Spencer solta a cinta que prendia meu pescoço e rola para o
lado levando as mãos até o ferimento. Respirando fundo, pulo da cama.
— Eu vou te matar, Cindy.
Em pé, nua e sangrando. Procuro a arma que ele esconde em um
compartimento secreto atrás do nosso retrato de casamento. Por vezes fingi
estar dormindo e o vi mexendo. Talvez estivesse só esperando o momento
certo para descarregá-la em mim.
Levanto a arma em punho e miro em sua direção. Olhos que antes tinham
fúria, agora tem medo. Está com medo de mim, querido?
— Você não tem coragem de fazer isso. É só uma puta interesseira. Se
me matar, minha família vai acabar com você.
Engatilho a arma.
— Está com medo?
— Não, e quando eu te pegar. Vai se arrepender — berra entre dentes.
— Quatro anos, Spencer. Aguentei por quatro anos — grito respondendo
de volta.
— Sua vad... — Não deixo que complete a frase.
— CALA A BOCA — berro, apertando o gatilho e disparando três vezes
contra seu corpo.
Solto a arma e ouço o som do baque no chão. Minhas mãos estão
trêmulas, uma onda de pânico percorre meu corpo junto com a dor física.
Fraquejando, me ajoelho balançando o corpo para frente e para trás.
O que vou fazer? O que vou fazer?
Coragem Cindy, coragem.
— Preciso fugir — sussurro.
Levanto arrastando o que sobrou de força, abro a gaveta e pego um
moletom. Não tenho coragem de verificar se está morto mesmo, mais com
três tiros impossível estar vivo. Junto uma mochila com mais algumas peças,
meus documentos pessoais e um pouco de dinheiro que consegui roubar de
sua carteira e guardar ao longo dos anos.
Empurro os cacos da porta do banheiro, e me aproximo da pia. Encaro
meu reflexo no espelho, os hematomas, o sangue, são tudo que vejo. Abro a
torneira e encho as mãos com água, e jogo no rosto limpando os resquícios do
que aconteceu essa noite. Amarro os cabelos em um rabo alto, encaixo a
mochila no ombro. Desviando do corpo desfalecido, saio do quarto indo em
direção à rua.
Ergo o capuz do moletom cobrindo meu rosto, enquanto caminho pela
noite. Não sei como, onde e quando, mas terei uma nova vida. E ninguém
nunca mais irá tocar em mim.
Em frente ao espelho ajeito mais uma vez a gravata borboleta. Porra,
Dylan. Quem se casa usando gravatinha igual de pet shop? Noção zero, sua
sorte que gosto de você. Porque isso é pior que levar um tiro na bunda. Não é
como se já tivesse levado, mas conheço alguns policiais que já levaram e
dizem ser o inferno.
E para piorar a situação, me colocaram com aquela Camilly. Sinto até
calafrios só de pensar naquela mulher. Claramente não nos suportamos, ela é
abusada, depravada e sem educação. O estereotipo feminino que não me
agrada nem um pouco. Mas, prometi para Dylan e Alyssa que não iria
discutir com aquela modelo de Dercy Gonçalves. Sim, não é porque sou
americano que não conheço celebridade famosa internacional. Sou culto,
educado, cavalheiro à moda antiga.
Aquela... Criatura de saia, fode meu psicológico. Ela tem o poder de
acabar com meu dia, só por hoje irei ter paciência. Depois não preciso mais
ver a cara dela e nem seu sorriso largo, os lábios carnudos e rosados. Caralho,
foco Brian. Não faz seu tipo, lembra? Esborrifo mais uma vez o perfume.
Ajeito o casaco do terno e sigo em direção a saída para a garagem. No
parafuso da parede, pego a chave pendurada.
Sento-me atrás do volante, e sigo em direção à igreja. O rádio instalado
com a frequência da polícia anuncia várias ocorrências. Hoje estou de folga,
mas não consigo desligar. Preciso saber o que está acontecendo na minha
área, e o que me aguardará no outro dia.
“Assalto armado com vítima no local. Rua: Barrow street, West village.
Q.A.P?”
Ah qual é? Meu amigo vai casar preciso de um tempo. Sinto muito, mas
não vou atender nenhuma ocorrência. Desligo o aparelho e o silêncio reina
dentro do automóvel.
Conforme me aproximo da igreja, noto a movimentação de carros,
pessoas com trajes de festas. Isso porque seria uma pequena cerimônia para
os mais chegados. É meu chapa, nossa percepção de pequeno e íntimo é
totalmente diferente.
Procuro um local para estacionar, mas não encontro. E como se fosse um
milagre divino, vejo quando um carro acende à seta indicando que está
saindo. Imediatamente giro o volante direcionando na entrada, quando um
híbrido branco entra com tudo na vaga, e pior não se deu o trabalho de dar
seta, roubando meu lugar. Anoto mentalmente a placa.
Ah mas isso não vai ficar assim, eu vou pegar esse desgraçado e ele...
Calo-me na mesma hora que a porta se abre.
Seus cabelos negros e soltos caem sobre os ombros criando uma cortina
sedosa sobre a pele. O vestido vermelho justo ao corpo, marcando cada curva
como se fosse uma segunda pele em contraste com a obra perfeita, bem
diante dos meus olhos.
Meus olhos percorrem da ponta do pé até o último fio de cabelo.
Remexo-me inquieto no banco, mas não consigo desviar o olhar daquela
mistura de deusa com filha do capiroto. Por algum motivo desconhecido,
sinto minha calça ficar apertada ou seria a porra do meu pau inchado e duro?
Amigo, você é um traidor. Está proibido de ficar desse jeito por causa
dela, vai por mim, não vale a pena.
— Oh babaca anda logo. — Ouço o som de buzina e uma voz gritando.
Encaro o retrovisor e vejo a longa fila que se formou atrás de mim.
Coloco a mão para fora e não resisto o impulso de erguer o dedo do meio.
Babaca é você, cretino. Acelero liberando a passagem. Camilly
definitivamente é problema, além do mais ela foge de mim como diabo foge
da cruz. Será que é meu perfume? Ah que se foda essa maluca.
Depois de dez minutos e três quarteirões abaixo da localização da igreja
consigo estacionar. Enquanto subo a ladeira sinto olhares sobre mim,
cochichos, e de canto de olho consigo ver que são mulheres de bochechas
coradas e sorrisos bobos.
Estão rindo de mim ou para mim? Cada dia que passa entendo menos
essas mulheres. Minha doce Sheron era tão fácil de lidar, amorosa, gentil,
educada. Nunca irei me conformar de como ela escapou por entre meus
dedos. Ainda me pergunto se eu poderia ter feito algo para evitar sua morte.
Sempre carregarei essa incerteza dentro da minha alma, e jamais me
perdoarei.
— Ouuu está garanhão hein? — Ethan se aproxima, sorrindo e
assobiando.
— E aí, poderia não ficar gritando isso? Já não estou me sentindo
confortável e você não ajuda.
— Ahhhhh qual é? Um delegado fodão com vergonha, cena épica.
— Ethan — resmungo entre dentes.
—OK. OK. — Erguendo as mãos em sinal de rendição, anda ao meu
lado. — Cara acabei de ver Camilly, se eu pego uma mulher dessa esfolo a
cabeça do gandalf.
— Gandalf? — questiono confuso. Ou seria melhor não pensar no que
significa.
— É meu pau, sabe, coloquei um apelido carinhoso.
— Você me assusta. Juro, e muito. — Recuo dois passos criando certa
distância entre nós.

Enfim chegamos à frente e longa da escadaria da igreja. Subimos pulando


de dois em dois, a cada passo tenho a sensação de que essa maldita borboleta
irá me sufocar. Contornamos a entrada principal procurando a porta da lateral
para os padrinhos. Encontramos e mais que depressa a empurramos para fugir
do calor escaldante. Assim que colocamos o pé dentro da sala o ar gélido toca
minha face, me fazendo suspirar de alívio com os olhos fechados.
Ethan parado ao meu lado, me cutuca com o cotovelo. Observo ao redor
percebo o quanto chamamos atenção irrompendo pela porta daquela maneira.
Envergonhado, balanço a cabeça cumprimentando os demais.
Minha acompanhante disfarça rindo. Os meses em que Dylan permaneceu
no hospital em coma, esbarrei várias vezes com essa mulher, e uma única vez
conseguimos conversar por cinco minutos e para ser sincero não parecia a
mesma pessoa.
— Está charmoso senhor delegado. — Colocando um pé na frente do
outro como se estivesse desfilando, Camilly se aproxima puxando meu braço
para entrelaçar ao seu.
E agora, ferrou tudo. Quem desligou o ar condicionado? Está
esquentando aqui dentro também.
— É... Hum... Você está muito elegante, bonita, sabe. Bonita.
O som da sua gargalhada entra por meus ouvidos, desce por meu corpo
penetrando minha pele, causando arrepios.
— Entendi gracinha. Não precisa ficar envergonhado, sei que me acha
uma tentação. — Piscando, ela sorri com seus lábios carnudos pintado de
vermelho.
Puta merda! Foco Brian, lembre-se que ela não faz seu tipo.
Encaro sua boca, imaginando como seria tê-los em volta de algo grosso e
grande, sentindo a maciez e suavidade. Não, não, agora. Tento afastar os
pensamentos para coelhinhos fofos na fazenda. Engulo em seco, sem saber o
que responder, na verdade sei bem o que gostaria de fazer. Colocá-la de
joelhos e observar sua boca engolindo meu pau. PORRA BRIAN! Não.
Seus olhos escuros e brilhantes encaram os meus de um jeito profundo e
sensual. E sou salvo pela cerimonialista que surge com a prancheta em mãos,
organizando os casais para a entrada. Seguimos a organizadora até a porta de
entrada e ficamos em fila, aguardando o sinal para cada um entre com seu
par.
Mantenho o olhar firme para frente, mas o perfume de Camilly atingi em
cheio meu nariz. Adocicado, suave.
Qual é Brian? Esqueceu Sheron, sua esposa?
Como um flash de memória, relembro o dia do nosso casamento. A
empolgação dela era contagiante, a dedicação com cada detalhe. Fez
questão de acompanhar os decoradores, o Buffet, ela era muito detalhista.
Todos amavam minha Sheron. Usando vestido branco de renda, com um
detalhe singelo no cabelo e um simples buquê de flores do campo.
— Brian. Brian. Vamos. — A voz feminina me traz dos pensamentos
perdidos.
— Sim, vamos — respondo, afastando as dolorosas lembranças.
Como todos os casamentos a noiva está atrasada e pude sentir a agonia de
Dylan enquanto aguarda no altar. O clima tenso impregnou o ambiente.
Ando alguns passos sutilmente e me aproximo o suficiente para que ele
possa me ouvir. — Desfaz essa cara, sua mulher está chegando ok. Ou vou te
dar um soco.
Objetivo alcançado com sucesso. Consigo tirar um sorriso tímido do
famoso agente do FBI.
De repente a marcha nupcial soa alto dentro da igreja, as portas se abrem.
Alyssa está maravilhosa usando seu vestido branco. E ao lado da noiva dona
Emilia, a sogra. Não sei como, mas com o passar do tempo Aly conseguiu
convencer Dylan sobre sua mãe ser tão inocente quanto eles, e aparentemente
fizeram as pazes.
Inquieto ao ver sua mãe, o pequeno Dominic se remexe no colo de uma
senhora e estica os braços na direção dos seus pais. O pequeno está crescendo
rápido.
Percorro meus olhos pela igreja enquanto a marcha ainda toca para a
entrada triunfal da noiva, me pego encarando a senhorita encrenca. E para
minha surpresa, ela me encara de volta com um brilho especial no olhar.
Fique longe tentação, bem longe.
Alyssa está maravilhosa em seu vestido especial de noiva. Lembranças
dolorosas invadem meus pensamentos, engulo em seco sentindo o sabor
amargo da saliva. Mas, minha amiga teve sorte, reencontrou seu grande amor
do passado e mesmo com tudo que aconteceu, agora, estão juntos e serão
felizes para sempre ou até que dure. Depois de tudo que passei só quero viver
minha vida em paz, e sozinha. O amor entre um casal é só um sentimento
ilusório da mais plena satisfação. Infelizmente descobri isso de uma forma
cruel, com muita dor e sofrimento. Mudar de nome, país e fugir das
consequências dos meus atos me custaram um alto preço. Com sorte uma
amiga da época da faculdade conseguiu me emprestar um dinheiro, e pude
recomeçar em um país novo, mas como nada vem fácil, por vezes adormeci
sentada no banco da praça por não ter onde passar à noite. Fome, às vezes
uma refeição por dia ou até mesmo nenhuma.

Já tinha perdido minhas esperanças e só desejava que a morte viesse ao


meu encontro, aquele mundo não tinha mais nada para me oferecer. Nunca
acreditei em milagres, mas a senhora Josefy foi um anjo enviado até mim
como um grande milagre. Ela estava caminhando na praça com seus filhotes,
ao me ver praticamente desmaiada no banco, suja, com fome, e semiviva.
Sentou-se ao meu lado. Permaneci com os olhos fechados, não tinha força
suficiente para reagir. Suas mãos enrugadas ergueram uma garrafa d’água e
um sanduíche na minha direção. Relutei por uns minutos para aceitar a ajuda
de um estranho, mas o que mais eu poderia fazer?

Esquecendo quaisquer resquícios de educação, tomei de suas mãos


rapidamente o que estava oferecendo. Sem cerimônias devorei em pouco
tempo o sanduíche.

— Obrigada — agradeci educadamente com a voz trêmula.

— Não precisa agradecer querida. Faz dias que há vejo sentada aqui nesse
mesmo banco. — Seu olhar terno e gentil, aqueceu meu coração.

— Hum... É obrigada novamente. — Abro um sorriso tímido e


envergonhado.

— Querida, por que está morando na rua? — Calada, encaro o rosto da


senhora. — Desculpe minha intromissão, mas uma mulher jovem e bonita,
assim na rua.

— Tudo bem, é complicado. Problemas familiares. — Colocando sua


mão marcada pela idade por cima, me surpreendi. E pela primeira vez, sinto
vontade de contar o que aconteceu para alguém.

Comecei a história desde o primeiro dia que conheci o Spencer, as


agressões, o cárcere privado, a perda do bebê, mas pulei a parte do
assassinato. Não queria que essa senhorinha bondosa sentisse medo de mim,
a assassina do próprio marido.
Então, um milagre chamado Josefy Carter surgiu na minha vida. Sem
filhos, irmãos ou parentes, ela era uma pessoa sozinha. Comovida, abriu seu
grande coração e as portas de sua casa para mim. Ajudou-me a mudar de
nome acrescentando seu sobrenome, assim me tornando sua filha. Durante
três anos pude sentir como era ter o amor de uma mãe, infelizmente Josefy
morreu com câncer de pulmão. O que tinha em abundância de bondade tinha
em teimosa. Pedi inúmeras vezes para fazer o tratamento e largar o vício do
cigarro, mas ela só respondia.

“Filha estou velha e cansada, quero morrer feliz fazendo algo que
gosto.”
Como sua única herdeira, sou responsável pelo dinheiro e seus
investimentos. Camilly Carter, dona de uma pequena fortuna.

Só posso agradecer por ter encontrado um anjo em meu caminho, graças a


ela tive um recomeço. Confesso que tenho medo, sinto como se a qualquer
momento a polícia fosse invadir o apartamento e me prender pela morte
daquele cretino. Quando deito na cama e fecho os olhos, ainda posso vê-lo
com o cinto na mão. O ódio queimando em seus olhos, suas mãos
estrangulando meu pescoço enquanto me violentava. Já se passaram cinco
anos, mas tenho a impressão de que mesmo morto aquele desgraçado nunca
irá me dar paz.

Ergo a cabeça e sinto o olhar do delegado Brian sobre mim. Como não
iria notar um Deus em formato de homem? Moreno, alto, forte e com um
sorriso que molharia a calcinha de qualquer mulher. Seu único defeito é ser
policial. Impossível se envolver com aquilo que venho fugindo por anos, e sei
como esses policiais podem ser persuasivos quando querem descobrir algo.
Então, melhor manter distância e torcer a calcinha no banheiro.
Minha nova personalidade é descontraída, apaixonada pela vida. E sim,
descobri a sensação de gozar, coisa que o Spencer jamais conseguiu. É típico
a mulher fingir que está satisfeita para agradar o companheiro, mas se tem
algo que aprendi nisso tudo, jamais finja um orgasmo, deixe o homem saber
que ele fode mal, quem sabe assim aprende não pensar só no prazer e
satisfação pessoal.
Encaro os olhos escuros do delegado que desconfortavelmente se remexe
desviando sua atenção. Sinto um calor crescente percorrendo meu corpo, não
consigo evitar percorrer os olhos desde a ponta do seu sapato másculo até o
último fio de cabelo.
Como dizia Josefy: Filha tem que transar muito. Porque depois a terra
vai comer mesmo. Homem é objeto de prazer filha, o deixe pensar que está
te usando, mas na verdade quem está usando alguém é você.
Acatei cada conselho, Josefy era sábia. Em pouco tempo aprendi muita
coisa com ela, desde como investir o dinheiro até como ser feliz na vida
sexual, sem me machucar.
Dominic inquieto estica seus pequenos braços para os pais a todo o
momento, o que faz o padre acelerar os votos matrimoniais. Meus pés doem
dentro do sapato apertado, e logo ouvimos o sonoro SIM do casal de
pombinhos e o DECLARO MARIDO E MULHER. Aplausos seguidos de
gritos de felicitações ecoam dentro da igreja.
A cerimonialista surge das profundezas com sua prancheta e o cabelo
lambido, relembrando com gestos como devemos proceder. Aguardamos a
saída dos noivos, em seguida cada padrinho se encontra no meio do altar com
sua parceira dando os braços para seguir em direção a saída.
Enlaço o antebraço do gostosão, seu perfume atingi meu nariz me
deixando entorpecida. De canto de olho consigo ver sua barba grossa por
fazer, e imagino como seria senti-la no meio das pernas roçando na minha
boceta. Respiro fundo tentando manter o controle.
Lembre-se P.O.L.Í.C.I.A.
Droga, a voz da minha deusa da depravação grita alto como sinal de
alerta vermelho.
OKAY! Não precisa gritar, já entendi. Brian Garcia tem uma enorme
placa grudada nas costas com os dizeres: MANTENHA DISTÂNCIA.
Os convidados se agitam na escadaria da igreja dificultando a passagem
dos padrinhos, tento desviar das pessoas para me aproximar dos noivos, mas
só ouço gritos de mulheres desesperadas para pegar o buquê.
— Vai lá Cami. — Não sei de onde e nem como Ethan surgiu ao meu
lado me empurrando no meio da bagunça.
Empurra, empurra, pisam no pé, cotoveladas. Parece que estou em uma
zona de guerra, e a missão se chama AGARRE O BUQUÊ. Determinada a
fugir do olho do furacão, empurro algumas mulheres até que algo acerta meu
rosto. Involuntariamente ergo as mãos me defendendo, e então, o vejo.
Droga, envolto com uma fita de cetim vermelha e flores brancas, o infeliz
caiu diretamente em mim. Isso não é sorte, é azar puro e simples.
Semicerro os olhos com vontade de jogá-lo de volta para Alyssa. E como
se entendesse minhas intenções, minha amiga balança a cabeça em sinal de
negativa. Sei o que essa noiva safada está pensando, e não quero destruir seu
momento de felicidade. Revirando os olhos, saio pela lateral da igreja,
pisando em todos os pés que estão no caminho. Pisando duro e resmungando
baixo, sigo em direção do carro. Chega dessa coisa, quero só ir para festa,
beber, comer e me divertir.
Enfio a chave na porta e sento no banco do motorista, encaro o buquê, e o
jogo no banco de trás, em casa seu destino será o lixo.

Procuro a mesa com meu nome, e como já esperava estou sentada com
Ethan, Brian e mais uma pessoa que não conheço. Puxo a cadeira e me sento.
Aos poucos os convidados entram no salão. Boquiaberta, vislumbro o
delegado caminhando com um pé na frente do outro. Uauuuu esse homem
podia ser modelo de cueca, ou talvez nu, mas só para mim.
— É aqui. Hum, legal. — Qual é senhor policial? Posso sentir a tensão
sexual emanando do seu corpo.
Apoio os cotovelos na mesa apertando meus seios com os braços
deixando o decote em evidência. Incomodado com a situação, ele se remexe
na cadeira afrouxando o nó da gravata. Posso ver seu pomo de adão subindo e
descendo enquanto engole em seco.
Levanto sensualmente ficando em pé. Deslizo as mãos esticando o tecido
do vestido mais ao mesmo tempo acariciando meu corpo para provocá-lo.
Como se não conseguisse desviar os olhos, ele me observa com desejo
estampado no rosto. Sorrindo maliciosamente, umedeço os lábios com a
ponta da língua.
Brian empurra a cadeira para trás com violência, derrubando-a.
Esfregando as mãos no rosto e de cabeça baixa, se afasta seguindo em
direção do banheiro.
Covarde! Sinto vontade de rir. Se soubesse que causa o mesmo efeito.
— Servida, senhorita? — Pego uma taça de champanhe com o garçom e a
viro de uma vez, devolvendo-a para a bandeja.
Por que esse homem foge de mim desse jeito? Eu sei por que fujo dele,
mas e ele? Alyssa me contou em uma de nossas conversas o quanto é
conservador, turrão. Agora quero saber, algo nele me instiga ao desafio e
gosto disso.
— Oh! Aonde você vai? — Esbarro em Ethan que chega à mesa.
— Já venho — respondo.
Encosto na parede da porta do banheiro masculino, e espero que abra a
porta. Ouço o som do trinco e logo Brian surgi na minha frente. Espalmo as
mãos no seu peito grande e largo, empurrando-o para dentro de novo. Sem
entender nada permanece calado. Giro a chave na fechadura, e a tranco.
— Camilly o que está fazendo? — Como até a voz desse homem pode ser
sexy. Grossa, máscula, firme?
— Shiii. — Coloco um dedo por cima dos seus lábios silenciando-o.
A cada passo que avanço me aproximando, ele recua dois até não ter
como fugir.
— Você está louca. — Sua mão grossa segura meu braço me puxando
para mais perto.
— Quer tanto quanto eu. — Ergo uma perna, e esfrego o joelho no meio
das suas pernas, roçando no seu pau.
Com os lábios apertados de raiva e os olhos injetados de desejo. Brian
toma minha boca em um beijo desesperado e ardente. Minhas mãos abrem os
botões da camisa dele de forma desesperada, então, decido fazer algo
diferente. Posso tornar esse jogo bem interessante, vou amaciar primeiro.
Rapidamente abro os botões da calça. Afasto-me dos seus braços
musculosos, posso ver a expressão confusa no seu rosto. Ergo a barra do
vestido para cima ganhando mobilidade. Ajoelho-me no pequeno espaço.
Puxo a cueca para baixo liberando seu membro duro e excitado.
Seguro seu pau entre as mãos, aperto os dedos envolvendo-o fortemente.
Lentamente começo fazer movimentos subindo e descendo.
— Camilly? — ofegante, me chama.
Sem se importar com o que está ao redor, coloco ponta da língua para
fora e lambo a cabeça rosada, descendo suavemente. Seus gemidos me
instigam a continuar. Substituo as mãos pela boca, engolindo seu pau.
Grande, grosso, sinto batendo no fundo da garganta. Mãos fortes agarram
meus cabelos entrelaçando os dedos no emaranhado do penteado.
Meus lábios envolvem o membro com força, chupo devagar, rápido, com
força. Com uma mão acaricio suas bolas inchadas. A cada sugada Brian
remexe o quadril arremetendo minha boca.
— PORRA! Boca gostosa do caralho — resmunga alto.
Quem diria que o senhor puritano sabia falar palavrões. A cada estocada
fico mais excitada, molhada, imaginando seu pau me fodendo. Mais algumas
sugadas e ouço seu alerta, mas ignoro sentindo seu líquido quente jorrando na
garganta. Engulo até a última gota. Antes que possa esboçar qualquer reação,
mãos fortes seguram meus braços me levantando.
Brian gira nossos corpos pressionando meu rosto contra o azulejo frio.
Excitado, esfrega seu pau na minha bunda por cima do vestido.
— Quero você — ronrona.
— Estou aqui, não é — respondo ofegante.
Empurrando meus joelhos com os seus, afasta minhas pernas. Como um
animal feroz prendendo sua presa, Brian ergue a barra do vestido, deslizando
as mãos na bunda. Sinto o ardor de uma tapa na minha pele. Molhada,
excitada e querendo muito transar com ele, empino o quadril contra o seu.
Enrolando a mão nos meus cabelos, puxa minha cabeça para trás deslizando a
língua por meu pescoço.
— Tem alguém aí?
Batidas na porta nos traz de volta a realidade. Afastamo-nos rapidamente
trocando olhares, enquanto arrumamos nossas roupas.
Outra pancada impaciente na porta me traz de volta a realidade. Por que
deixei isso acontecer? Como pude manchar a memória de Sheron desse jeito,
pior ainda, com Camilly. Deixei-me levar por desejos primitivos, mas porra
como resistir a essa diaba provocadora? Com as mãos tremendo, ergo o zíper
da calça ajeitando meu pau duro dentro da cueca.

— Brian, é o brinde cara anda logo. Está com dor de barriga? — Ethan
bate novamente enquanto gira a maçaneta tentando abrir a porta.

Camilly permanece calada com um sorriso vitorioso nos lábios. Encaro


dentro dos seus olhos e balanço a cabeça negativamente demonstrando o
quanto me arrependo do que aconteceu. Na mais pura ousadia, ela ergue sua
mão e toca meu rosto acariciando com as pontas dos dedos. Agarro seu braço
com força e a puxo para mais perto, Ethan nos ver saindo juntos do banheiro
já é suficientemente ruim.

— Nunca mais faça isso — digo entredentes.

— Você gostou senhor delegado puritano. — Piscando, desliza a língua


nos lábios carnudos e deliciosos.

— Já avisei. — Esbarro no seu corpo para destrancar a porta, e sinto que


Camilly encostar nas minhas costas roçando os seios fartos, provocando-me.
Ela não cansa desses joguinhos?

Abro de supetão a porta. Ethan me encara de boca aberta, mas quando


nota que atrás de mim tem uma mulher, melhor ainda Camilly, seus olhos se
arregalam como se fossem saltar da órbita. Até mesmo alguém desatento
como ele sabe o que um casal pode fazer dentro de um banheiro privado.

A raiva por ter cedido aos meus desejos me consome. Trêmulo, suando,
sinto que estou sufocando. Lembranças dos momentos íntimos com Sheron
invadem meus pensamentos. Minha esposa perfeita. Pisando duro, caminho
rápido para a saída. Ouço vozes chamando meu nome, mas só ouço
zumbidos.

Afasto-me do salão indo em direção ao estacionamento. Procuro por meu


carro e uma maldita coincidência, o carro dela está ao lado do meu. Paro em
frente ao híbrido branco, encarando através do para-brisa escuro. Apoio às
mãos no capô do carro, deixando minha cabeça baixa. Fecho os olhos, e só
vejo os olhos ardentes de desejo de Camilly ajoelhada na minha frente. A
maciez dos lábios, a garganta aveludada e gulosa sugando cada centímetro do
meu pau. A fragrância do perfume suave.

— PORRA! — Fecho as mãos em um soco, mas antes que possa socar o


carro dela, chuto o pneu várias vezes tentando descontar minha raiva e
frustração.

Respiro fundo recobrando o pouco de sanidade que ainda me resta dessa


noite, aperto o alarme do carro destravando a porta. Sento atrás do volante, e
acelero desviando dos carros estacionados, e saio fora daquele lugar, fugindo
de mim mesmo.

Inconscientemente dirijo até o cemitério. Preciso estar com minha esposa,


não importa como. Estaciono o carro de qualquer jeito, talvez pegando duas,
ou três vagas, não importa. Não é como se as pessoas viessem ao cemitério às
nove horas da noite. Como esperava os grandes portões dourados da entrada
estão trancados. Dou a volta no quarteirão procurando um espaço mais baixo
no muro, e sem pensar nas consequências pulo para dentro.

Percorro o caminho de tijolos cinza contando somente com a iluminação


da lua. A paz, e o silêncio é como um bálsamo para a dor que estou sentindo.
Mais alguns passos e paro em frente à lápide com nome de Sheron Garcia.
Minhas pernas fraquejam me colocando de joelhos. Sinto lágrimas descendo
e molhando meu rosto. Engasgado com as palavras não consigo achar um
jeito de pedir perdão por tudo. Principalmente por não a ter salvo daqueles
bandidos.

— Perdoe-me, por favor. Prometi cuidar de você, amá-la e não cumpri


minha promessa. Desculpa Sheron, me desculpa. Por favor. — Debruço o
corpo apoiando as mãos no gramado. — Desculpa.

Sinto algo aquecendo meu rosto, levo as mãos até os olhos cobrindo-os e
com dificuldade, os abro. Os primeiros raios de sol da manhã despontam no
meio das árvores. Estava tão atordoado que não percebi quando cai no sono
ali mesmo. Levanto passando a mão pela calça, camisa, me livrando da
sujeira do gramado. Enfio a mão no bolso, e confirmo que carteira e celular
permanecem intactos. Abaixo para pegar a chave do carro que está jogada no
gramado. Lanço um último olhar na direção do túmulo, e com pesar me
despeço.

— Como entrou aqui? — Sou surpreendido pelo coveiro e sua pá


ameaçadora.

— Longa história, senhor. Já estou de saída, não sou ladrão. Minha


esposa é a dona dessa lápide, e sou delegado. — Enfio a mão no bolso e puxo
o distintivo. Empurro o distintivo e confirmo que não estou mentindo.

— Certo, é proibido, devia chamar a polícia. Espera você é a polícia. —


Posso ver a confusão em seus olhos cansados e com marcas de idade.
— Sim — respondo com o esboço de um sorriso.

Gentilmente o senhor se prontifica para abrir o portão lateral de


funcionários para que eu possa sair sem precisar pular o muro de novo.
Trocamos algumas palavras no percurso e ouço atentamente o seu relato de
quantos casais jovens se perdem para a morte. De uma forma estranha e
egoísta saber disso me traz certo consolo.

Despeço-me sem delongas, e fico indignado como deixei o carro


estacionado. No mínimo levaria três multas por infrações diferentes.

— Porra! — resmungo, abrindo a porta do motorista.

Sentado e desperto para mais um dia de trabalho, ligo o rádio de


comunicação da delegacia. Sonoramente os códigos e ocorrências tomam o
espaço do silêncio. É isso, essa é a minha vida, ajudar pessoas que precisam e
nada mais.

— Só meu trabalho — repito baixo.

Antes de ir para delegacia desvio o caminho passando em casa para tomar


banho e me recompor da tragédia da noite passada. Agora que a fase
casamento já acabou, não tenho o porquê ficar me encontrando com Camilly.
Espero nunca mais ser obrigado ficar em um local tão pequeno e apertado
junto com ela. Banho tomado, dignidade restaurada, sigo em direção ao
trabalho.

Caralho fiquei apenas um dia fora da delegacia e mais parece um ano.


Centenas de processos, relatórios de entrada de evidências judiciais.
Definitivamente não posso me ausentar.

— Senhor? — Catarine bate na porta.


— Sim. — A policial pede que a acompanhe até a recepção, e assim o
faço.

Sentada no banco uma jovem mulher segura seu braço repleto de


hematomas, assim como o rosto. Os lábios vermelhos manchados com
sangue da agressão.

Engulo em seco. Meu sangue se agita nas veias fervendo de fúria. Tantos
anos presenciando vítimas de violência doméstica, mas ainda não consigo ser
indiferente. Quero ir até o desgraçado e ensinar que não se bate em uma
mulher, fazê-lo sangrar do mesmo jeito que sangrou uma pessoa indefesa.
Esfrego disfarçadamente as mãos suadas na calça. Peço para que Catarine
prossiga com o protocolo e em seguida a leve até minha sala.

Em poucos minutos tenho a Jeniffer sentada em frente à minha mesa. Ao


lado sentado no canto em frente ao computador outro policial tomando nota
do depoimento da vítima para inclusão nos autos do processo. Ouço
atentamente cada palavra que sai de sua boca.

— Sim, trabalho em dois empregos e ele sempre rouba meu dinheiro. Não
compra comida para casa, e quando não tem cerveja. Bom, acontece isso. Seu
delegado, eu e meus filhos passamos fome, não sei mais o que fazer, depois
de tantos anos, só criei coragem agora, por favor, nos ajude — implora,
soluçando e chorando.

— Podemos emitir uma medida protetiva para a senhora, impedindo que


ele se aproxime novamente. Mas tenho que ser sincero. Muitos casos essas
medidas são inúteis. Aconselho à senhora morar com algum parente por um
tempo, até pegarmos seu marido e tudo isso se resolver.

Mentir para as vítimas que medidas protetivas são eficazes, é como


entregá-las na mão do agressor novamente. E não posso permitir. Peço para
dois policiais acompanhá-la ao hospital para realizar o exame de corpo de
delito, e depois até a residência para que possa recuperar seus bens e os filhos
que se esconderam na vizinhança.

— Só mais uma coisa. A senhora por acaso sabe onde ele está nesse
momento? —questiono de forma desinteressada.
— Acho que deve estar no bar de um amigo dele.

— Qual o endereço, por favor?

Anoto cautelosamente o endereço. Irei levar a comunicação da medida


protetiva pessoalmente para esse desgraçado.

Aproximando-me do bar, desligo o farol do carro para não o alertar.


Confiro quantas balas tenho no pente da pistola, e a encaixo novamente no
coldre peitoral em seguida visto o casaco. Enfio as mãos no bolso da calça e
faço minha melhor expressão de policial bonzinho, afinal sou representante
da lei, não é?

Conforme me aproximo ouço o som de música alta, risadas


extravagantes. Piso dentro do bar, encarando tudo ao redor. Homens bêbados
discutem sobre futebol mal notando que entrei no estabelecimento. Meus
olhos procuram uma única pessoa, e mais ao canto com uma mulher bêbada
sentada no colo se encontra o agressor.

— Josef? — chamo.

— Quem é você? Não enche meu saco, babaca.

Puxo o casaco para trás expondo a arma e faço sinal com a cabeça para a
mulher sair. Correndo, ela se levanta e passa por mim de olhos arregalados.

— Estou aqui para entregar a medida protetiva de sua esposa Jeniffer,


sabe o que significa?

— Ah ah... Sei... Grande merda. Aquela piranha foi reclamar de mim?


Cadê as provas que foi eu, poderia ter sido o amante, vai saber. — Respiro
fundo contando até cem, mas não funcionou dessa vez.
Avanço sobre ele fechando minhas mãos na sua camiseta, o ergo da
cadeira e bato seu corpo contra a parede com força. Aproximo a boca do
ouvido, para que sinta meu hálito quente no seu cangote.

— Escuta aqui desgraçado. Se chegar perto dela de novo, vou te caçar até
no inferno e meter uma bala nessa cabeça podre. Você entendeu? — Espero
uns segundos a mais e a resposta não vem. — ENTENDEU? — digo
cerrando os dentes.

— Si... Sim — gagueja.

Sorrindo satisfeito, me afasto soltando-o. As pessoas observam de longe


sem se intrometer. Deixo o documento em cima de uma mesa.

— Isso que acontece quando se é um agressor covarde. — Pisco para


eles, batendo o dedo com força no papel.

Viro-me de costas saindo do bar, e antes de sumir, ergo a mão e aceno um


tchau debochado. Cretino não se cria na minha área.
Desligo o chuveiro, empurro a porta de vidro do box e alcanço a tolha
pendurada no suporte da parede. Deslizo o tecido de algodão enxugando
minha pele. Levemente seca enrolo meu corpo, e pego outra para o cabelo.
Ando pelo banheiro até ficar em frente ao espelho. O reflexo de uma mulher
forte, madura e autossuficiente reflete diante dos meus olhos. Por vezes me
pego pensando como o destino pode ser cruel e jogar com a vida das pessoas.
Massageio minhas bochechas com as pontas dos dedos. E o som do celular
tocando me puxa de volta do momento de reflexão.

Ansiosa e com passos rápidos, chego rapidamente na escrivaninha e com


o aparelho em mãos confiro o nome que salta na tela.

“Luca Ricci”

Não era isso que queria ver na tela do celular. Droga esqueci
completamente do trabalho de tese relativas à pena. Era para ter entregado
hoje, mas tinha compromisso importante com o responsável por gerenciar
minha conta no banco. Recusar a chamada ou não? Pensando bem, o senhor
Luca é o professor mais rígido e exigente do curso de direito. Sempre sério
com a expressão fechada, impossibilitando qualquer aproximação. Respiro
fundo, e decido atender.

— Boa tarde. — Mantenho a voz firme, mas por dentro tremendo de


medo.

— Senhorita Carter? — Sua voz fria e penetrante faz minha pele arrepiar.

— Sim. Desculpe prof... — Não termino de falar.

— Não quero saber das suas desculpas, guarde para quem realmente irá
acreditar nelas. Sabe o quanto estimo as notas dos meus alunos, todos se
graduam com louvor e não aceito menos. Dessa vez vou dar uma colher de
chá, tem até amanhã para entregar a tese, caso contrário irei reprová-la na
minha disciplina. Boa tarde.

Em seguida só ouço o som da finalização de chamada. Não esperou nem


que me despedisse. Isso só pode ser falta de sexo, apesar de que ouvi boatos
que várias mulheres o assediam pelos corredores da universidade. Para um
homem com quarenta e cinco anos, ele é bem gostoso. Mas com aquela cara
sempre amarrada duvido que saia com alguém. Tenho medo só de imaginar,
ou o professor Luca pode ser o famoso come quieto. Bom, isso não é da
minha conta. Deito na cama de costas, jogo o celular no meio dos
travesseiros, e encaro o teto azul pálido. Preciso terminar esse trabalho, não
posso reprovar nessa matéria.

“Suas mãos ásperas deslizam por minha barriga lentamente. Fecho os


olhos absorvendo o calor do seu toque. Ansiosa, mordo os lábios esperando
por mais. Pouco a pouco, suavemente, suas mãos abrem o botão da calça.
Apoio o corpo com os cotovelos levantando o tronco. Quero vê-lo. Contorço-
me quando seus dedos roçam meu clitóris, esfregando. Em seguida sinto-os
dentro de mim, fodendo minha boceta úmida. Entrando, saindo, entrando,
saindo, com ferocidade. Um dedo, depois dois, três, alargando o centro para
ele. — Brian — sussurro. Erguendo a cabeça seus olhos castanhos se
encontram com os meus em uma conexão intensa e excitante. Os bicos dos
meus seios se arrepiam de tesão marcando em evidência no tecido da regata.
Selvagem, cru, meu delegado me fode com os dedos de um jeito
dolorosamente prazeroso. A cada investida só quero mais, mais, mais...”
Assustada, e suando frio, sento na cama. O que foi isso? Não Camilly,
esse homem não é para você, nem mesmo nos sonhos. Esqueça e siga em
frente. Além do mais, aquele ogro nem mesmo mandou uma mensagem para
saber como ficou após nosso flagra e sua saída temperamental. E Alyssa
ainda tem a cara de pau de dizer que Brian Garcia é um homem honesto,
sensível, ótimo partido. Aonde? No mínimo deve estar achando que sou
descartável, só porque paguei um boquete para ele. É como todos os outros só
mudam a profissão. Quer saber? Nunca mais quero olhar para esse cretino,
insensível. Pode viver em eterno luto pela esposa perfeita dele, já que
nenhuma mulher se iguala ao patamar de perfeição da falecida. Fala sério.

Ainda enrolada na toalha, levanto, abro o armário em busca do notebook.


Enquanto ligo o note, vou até a cozinha e preparo uma xícara de café. Cafeína
será minha única companheira por hoje.

Atravesso o hall de entrada da universidade correndo como louca. Tenho


dez minutos para entregar a tese que virei à noite escrevendo. A bolsa no
ombro escorrega várias vezes ameaçando ir para o chão. Esbarro em algumas
pessoas no caminho, mesmo tentando desviar ao máximo, sempre tem
aqueles que ficam dormindo no corredor, e especialmente hoje não estou com
paciência.

Bato na porta da sala do senhor Luca, e aguardo. Sinto os pulmões


arderem a cada vez que respiro fundo, engulo em seco controlando a vontade
de vomitar meus órgãos. Definitivamente preciso praticar exercícios físicos.

Após alguns minutos, a porta se abre revelando o professor gostosão.


Arrumo a bolsa novamente, e abro um sorriso amarelo. É difícil se recompor
instantaneamente quando você sentiu como se a sua alma tivesse fugido do
corpo.

Arrogante como sempre e com seu olhar de superioridade, estende a mão


para mim sem dizer nenhuma palavra. Entrego trabalho, e balanço a cabeça
positivamente. A sensação de alívio é maravilhosa. Sinto que estou atraindo
olhares, e só então, percebo que estou de pijama e chinelo.

— Droga — resmungo baixo, envergonhada.

Mais que depressa procuro a saída do bloco principal. Só posso estar


enlouquecendo de vez, a angústia e medo eram tanto que nem ao menos me
dei conta que não tinha trocado de roupa. Não tem problema, afinal, consegui
entregar a tese e estou livre dessa disciplina. Com a consciência tranquila,
caminho até o estacionamento em busca do carro. Conforme me aproximo,
aciono o alarme para abrir a porta.

Dirijo pelas ruas de Nova York escutando “Pyro – Kings of Leon”. E para
completar a vergonha do dia, desafino cantando junto com o cantor, com o
braço apoiado na janela e uma mão no volante. Em vinte minutos estaciono
em frente do prédio. Sabe aquela música que faz parte da sua playlist e você
passaria o dia repetindo por várias e várias vezes? Essa é uma delas. Então,
contínuo sentada esperando que Kings of Leon termine seu ícone musical.
Fecho os olhos, e encosto a cabeça no banco.

Gritos femininos roubam minha atenção. Imediatamente coloco a cabeça


para fora e vejo Yasmim à vizinha de porta com seu namorado. Ele está
segurando-a pelos braços e chacoalhando o pequeno corpo violentamente.
Yasmim tenta se desvencilhar, mas é inútil. Ainda me pergunto como uma
jovem de dezessete anos pode perder tempo com um traste. Ela súplica
pedindo que ele pare. Lembranças nublam meus pensamentos, me deixando
paralisada. Quero sair do carro e ajudá-la, mas não consigo me mexer. A
mesma voz de cinco anos atrás sussurra que tenho que reagir ser forte mais
uma vez.

Buscando forças internamente, pego o celular dentro da bolsa e disco o


número da polícia relatando a agressão. E como sempre informam que iram
mandar uma viatura, mais em quanto tempo? Uma hora, meia hora? Tempo
suficiente para acontecer uma desgraça. Desligo a chamada, e cogito a
hipótese de descer do carro e ir até lá e esfregar a cara desse cretino no chão.

Através do retrovisor consigo ter uma boa visão da situação, e sou


surpreendida quando o homem ergue sua grande mão descendo uma tapa no
rosto de Yasmim, fazendo a jovem recuar alguns passos para trás. Sem
pensar em nada e cega de raiva, abro a porta com força, e corro até o cretino
pulando nas suas costas. Assustado, ele cambaleia em seus próprios pés. Com
os braços em volta do seu pescoço aperto para sufocá-lo, infelizmente não
tenho força suficiente.

Desesperado, agarra em meus braços tentando me tirar de cima, nem um


guindaste me tira daqui. Grito vários palavrões em seu ouvido e continuo
pendurada. O agressor xinga, esbraveja, enquanto Yasmim assisti a cena de
longe sentada no chão. A luz vermelha e azul reflete na fachada do prédio, e
a sirene soa alto.

Até que enfim.


— Vou processar essa delegacia.

Ouço vozes alteradas vindo diretamente da recepção. Processar-nos por


qual motivo? Penso comigo mesmo enquanto termino o relatório da
promotora Suzana. Estou atrasado com o prazo de entrega, então, decido que
outros podem muito bem lidar com a situação.

— Eu não fiz nada, ele fez. Bateu nela, e a polícia demorou demais,
alguém podia ter morrido.

— A senhorita é testemunha da agressão. E senão ficar calma, irei detê-


la por desacato, entendeu?

OK. Acho que está na hora de intervir.

Clico em enviar o documento, fecho o notebook. Ajeito minha camisa


deslizando as mãos para tirar as marcas do tecido. Abro a porta da sala, e
quanto mais me aproximo da confusão tenho a ligeira impressão de que
conheço aquela voz.
PUTA QUE PARIU! Camilly?

Não consigo evitar que meus olhos percorram seu corpo. Cabelos soltos,
nos pés chinelos de tecido, e de pijama. Na, verdade não posso considerar
isso como pijama. O short é tão curto marcando a bunda que tenho vontade
de arrancá-lo com os dentes, e a parte de cima desperta meu pau causando os
efeitos de uma bomba atômica dentro da calça. Ela não está usando sutiã?
Seus bicos arrepiados marcando o cetim me faz salivar.

Merda. Merda. Merda. A visão de tê-la sobre a mesa com as pernas


abertas, rendida aos meus desejos me enlouquece.

Lembranças da sua boca chupando e engolindo meu pau dentro do


banheiro invadem meus pensamentos. Paralisado, observo de longe tentando
manter o controle para me aproximar. Sheron. Isso, prometi que não iria ter
outra mulher na minha vida e manterei a promessa. Abro dois botões da
camisa para refrescar o calor que está me consumindo. Respiro fundo, e
avanço os passos em direção à confusão.

— Camilly? — chamo por seu nome.

Lentamente ela se virá para trás ao ouvir minha voz. Seus olhos castanhos
se encontram com os meus, e posso ver que ficou tão surpresa quanto eu.
Engolindo em seco, noto que suas bochechas ficam coradas instantemente.
Ergo uma sobrancelha totalmente confuso. Nunca imaginei que poderia vê-la
com vergonha, nem sabia que ela sentia isso.

— Brian? Ah que ótimo você é o delegado, então? — Sua expressão


muda de surpresa para furiosa em fração de segundos.

— Sim, sou. O que está acontecendo? — direciono a pergunta ao policial


responsável.

— Senhor, essa moça é testemunha de uma agressão física. O casal está


prestando esclarecimentos. Mas, não entendo...

— Olha aqui. — Camilly ergue a mão interrompendo o policial. — Ele


bateu na namorada na rua, e eu bati nele. Ele não tem que prestar depoimento
e sim ser PRESO, entendeu? P.R.E.S.O — soletra a palavra para o policial.

Caralho, como pode ficar ainda mais sexy?

Limpo a garganta atraindo sua atenção, e cruzo os braços fazendo minha


melhor cara de delegado mal.

— Por que está de pijama na rua?

Maldição que porra de pergunta é essa? Perdi a oportunidade de ficar


calado. Foco Brian, a questão aqui é a agressão e não as curvas da meliante.

Inquieto troco o peso do corpo de uma perna para a outra.

— Isso não é da sua conta, delegado — esbraveja entre dentes como uma
leoa furiosa.

Encaro os lábios carnudos, mas não entendo nenhuma palavra, só consigo


lembrar quando esteve envolta do meu membro. Então, tudo acontece muito
rápido. Camilly tem seu corpo girado contra o balcão com os braços para trás,
o policial recita o código penal enquanto pega as algemas. Avanço sobre ele,
seguro seu braço e o empurro para trás. Cambaleando recua alguns passos e
me encara surpreso com a atitude.

— Não toque nela, entendeu? — O som da minha voz em conjunto com


as palavras soa possessivamente. — Dispensado, vou cuidar pessoalmente da
senhorita.

Minhas mãos descem até a cintura de Camilly segurando firme, e ajudo-a


a se recompor, mas não consigo evitar o contato físico. Essa mulher é como
fogo, sempre pronta para incendiar tudo ao redor, o problema é o estrago que
causa no final. Subo suavemente às mãos por suas costas, acariciando a pele
por cima do tecido de cetim. Respirando fundo, seu peito sobe e desce
rapidamente. Sinto a maciez dos seus cabelos nas pontas dos dedos
misturando à fragrância deliciosa de morango. Distraído com a situação, não
notei que atraímos olhares curiosos.

Afasto-me rapidamente, devolvendo aos expectadores uma expressão


cortante e mortal. Camilly permanece calada e encarando o nada a sua frente.

— Senhor posso registrar a ocorrência? — Catarine empurra a cadeira e


fica em pé atrás do balcão.

— Sim, e você — aponto para a senhorita encrenca. — Vem comigo. —


Limpo a garganta. — VOCÊS NÃO TÊM O QUE FAZER? — grito
dispersando os policiais.

Enfio as mãos nos bolsos da calça, viro de costas, e com passadas largas
entro na minha sala. Encosto no batente e a espero entrar também. Assim que
atravessa a porta, fecho e tranco passando a chave. Puxo a cadeira e faço
gesto para que se sente. Calada, muda, e sem reclamar, ela senta cruzando as
pernas sensualmente para me atormentar. Aposto que está fazendo de
propósito querendo me desestabilizar, mas dessa vez não. Desvio o olhar,
suando frio. Dou a volta por trás do seu corpo, indo até à mesa e sento-me.
Desconfortável, inquieto, e queimando por dentro apoio os cotovelos na
madeira maciça, e encaro seu rosto diabólico.

Algo está diferente. Por que não ergueu a cabeça ainda? Essa não é uma
atitude típica de Camilly Carter.

— O que está errado? Quer dizer, além do fato de se meter em uma briga
na rua, e estar em uma delegacia só de pijama.

— É só que me lembrei do meu... — Calando-se imediatamente não


termina a frase. — Não é da sua conta, delegado. Vai pegar meu depoimento
ou não? Tenho coisas para fazer. Pode ser?

Agora sim, essa é a Camilly que conheço. Ousada, agressiva,


determinada, gostosa. BRIAN. FOCO.

— Conte como aconteceu, quero detalhes. — Digito o código do sistema,


e anoto cada palavra minuciosamente.

Erguendo os braços, ela puxa seus cabelos para cima e faz um coque,
prendendo-os. Alguns fios escapam contornando o rosto, deixando-a ainda
mais sensual. Engulo em seco, observando seus movimentos. Como se
notasse o efeito que causa sobre mim, desliza as mãos pelo pescoço.

PALAVRAS, DEPOIMENTO, SISTEMA.

Tento ao máximo voltar minha atenção para a tela do computador, mas


meus olhos são traidores e não desviam dessa tentação. É isso, estou sendo
colocado a prova, só pode.

— Pronto isso é tudo pode ir — concluo o mais rápido possível.

— Já acabou?

— Sim — respondo.

— Então, vou indo. Obrigado Brian.

O som do meu nome saindo dos seus lábios arrepia os pelos da minha
nuca. Levanto da cadeira, e passo por ela para abrir a porta.

— Por favor, não entre em mais confusão.

— Olha aqui, você não manda em mim, ok? — responde nervosa.

Que caralho é esse? Só quero ajudar essa ingrata. Avanço alguns passos
em sua direção enquanto ela recua para trás até encostar-se à parede. Espalmo
uma mão de cada lado da parede, encurralando-a no meio dos meus braços.
Aproximo o rosto do seu para que possa sentir minha respiração. Encaro
dentro dos seus olhos, e agora quem está engolindo em seco não sou eu.

— Você não vai se meter em encrenca de novo, senão te coloco em uma


cela e deixo dormir lá. Entendeu?

— Eu não...

Interrompo-a.

— Entendeu Camilly Carter? — digo entre dentes.

Como não reparei antes que suas irises têm rajadas de cor verde? E assim
de perto seu perfume é ainda mais gostoso. Mas essa demônia consegue
puxar a merda para fora do meu controle.

— Si... Sim... Entendi — gagueja.

Abro um sorriso de canto, e desço o nariz até a curva do seu pescoço,


roço suavemente contra a pele, inalando seu cheiro. Ofegante, sinto Camilly
se remexer.

PORRA! PORRA!

Subo os lábios até sua orelha, e sussurro.

— Ótimo. — Para brincar de gato e rato é preciso de dois indivíduos,


senhorita Carter. — Agora vai, tenho coisas importantes para fazer.

Puxo os braços e inclino o corpo para trás, mas Camilly agarra a frente da
minha camisa me puxando de encontro ao seu corpo. Esfregando os seios no
meu peito, ela sorri descaradamente.

— É bem sexy seu lado mandão. Mas, não preciso de você, cuide da sua
vida, Brian.

Ficando nas pontas dos pés, ela roça os lábios nos meus delicadamente.
Em segundos me segurando, em seguida me empurrando para longe.

— Adeus!

Sem dizer nenhuma palavra a vejo sair da sala rebolando a bunda, os


cabelos escapando do coque e cobrindo suas costas.

Essa mulher vai ser minha perdição.


Atravesso a porta de saída da delegacia, e sinto os raios de sol tocando
minha pele. Fecho os olhos e respiro fundo em uma tentativa de acalmar meu
coração que bate acelerado. Minhas mãos tremem em conjunto com o resto
do corpo, esse delegado é louco. Como se atreve a me tratar daquele jeito?
Primeiro se faz de difícil, depois se rende por inteiro, mas corre igual diabo
foge da cruz, e agora, quer bancar o preocupado? Senhor Delegado Brian
Garcia está precisando de tratamento psicológico, maluco.

Flashs de consciência atingem meus pensamentos, e noto que acabei


vindo até o lugar que mais tenho receio e medo, a polícia. Assassina, fugitiva,
e com identidade falsa, no mínimo trinta anos de reclusão. Quando decidi que
iria cursar a faculdade de direito, Josefy não entendeu o porquê, já que seria
sua herdeira e responsável por administrar seus bens, mas uma mulher
prevenida vale por duas, precisava saber tudo sobre leis e os riscos que corro
caso me encontrem. Por fim, gostei do curso.
Caminhando rapidamente me afasto do prédio da polícia.

Sem carteira, dinheiro, carro, e de pijama, ando pelas ruas de ova York.
Devia ter pedido carona para os policiais, mas não iria dar o gostinho para
aquele ogro rir de mim logo após dizer que não preciso de cuidados. Pelo
menos estou fazendo o exercício da semana inteira, nota mental, nada de
academia.

Depois de uma hora andando a pé, algo me diz que deveria ter engolido
meu orgulho. Meus pés estão em bolhas e as pernas latejando. Força Camily,
você já passou por coisas muito pior que isso. De longe vejo uma praça,
acelero os passos e sento no primeiro banco que encontro.

Exausta tombo a cabeça para trás apoiando na madeira, e encaro o céu


estrelado. Recordo-me das noites que adormeci ao relento sentindo frio, fome
e medo. Acho que nunca serei grata o suficiente a Josefy. Às vezes me
questiono por que demorei tanto tempo para fugir daquele monstro? Medo?
Covardia? Não ter dinheiro? Apoio? Família? Spencer sempre jogava na
minha cara que não tinha como sobreviver sem ele, suas agressões verbais
eram tão fortes quanto às físicas. Para ser sincera acho até que eram as
verbais que doíam mais, minando minha capacidade como ser humano. Dia
após dia, a pessoa falando o quanto se é inútil, imprestável, indesejável, se
torna sua verdade. Infelizmente. Sinto lágrimas rolando por minha face.

Ainda posso ouvir sua voz asquerosa embriagada gritando e me


chamando de vadia inútil. Como em um filme as lembranças da nossa última
noite invadem minha cabeça.

— Camilly? — Levanto a cabeça ao ouvir uma voz grossa e máscula


chamando meu nome.
Meus olhos sobem lentamente encarando um par de tênis, subindo as
panturrilhas a mostra que por sinal são grossas e definidas, e continua
percorrendo as coxas escondidas atrás de um shorts de tecido leve, seguido de
um abdômen marcado na regata justa ao corpo, até chegar ao rosto.

UAU! Luca Ricci

— Professor? — questiono boquiaberta com o que vejo em pé na minha


frente.
— Luca, por favor. Estamos fora da faculdade, e você já está em fase de
conclusão do curso. Acredito que tais formalidades não são necessárias no
momento.

— Ok. Desculpe.

Cabelos castanhos claros, olhos azuis, alto, forte, viril. Quem diria que
alguém com esse porte físico é professor de faculdade? Nunca tinha reparado
o quanto é bonito esse danado. Esquece. Foca. Esquece. Já basta seu rolo com
o delegado. Espera, por que pensei naquele ogro? Reviro os olhos
impaciente. Nem longe aquele homem me dá paz.

— O que faz sentada aqui? Essa área não é muito boa para uma mulher
ficar, ainda mais sozinha.

Ok. Atitude machista ou seria somente um alerta? Justo hoje o mundo


inteiro resolveu me proteger?

— Meu dia foi longo prof... — Limpo a garganta. — Luca.

— Quer conversar, estou com tempo.

Antes que possa responder que não quero falar mais sobre o assunto,
Luca senta ao meu lado e puxa a coleira do seu cachorro para mais perto dele.
Afagando a cabeça peluda do animal, ele sorri mostrando suas covinhas.
Tudo bem, não posso negar uma boa conversa para um homem que gosta de
animais e tem covinhas fofas no rosto.

Conto desde a hora que deixei o trabalho na faculdade até o momento de


ir parar na delegacia, obviamente pulando os detalhes sobre Brian. Então,
algo inédito acontece. Luca Ricci, professor conceituado na área de direito
em uma das faculdades mais importantes do país, começa gargalhar alto no
meio da rua.

Encaro-o assustada e com olhos arregalados. Em quatro anos nunca tinha


escutado esse som. Fim do mundo? Apocalipse?

— Você pulou no homem igual macaco e de pijama?


— Sim — digo envergonhada.

— Agora entendi o porquê ainda está com a mesma roupa — diz entre
risos.

— Sabe, não tem é engraçado. — Por um momento permanecemos em


silêncio. — Está bem, é engraçado, sim.

Continuamos conversando sobre o ocorrido e como o namorado agrediu a


jovem. Quem diria que depois de um dia horrível, encontraria consolo com o
professor mais temido de todos.

O tempo corre rapidamente quando se está em boa companhia.

— Nossa, a conversa está ótima, mas tenho que ir para casa. Só saí para
dar uma volta com o Cookie, tenho que voltar.

— Ah sim, claro. Sua esposa deve estar preocupada.

— Não sou casado. Achei que sabia disso depois de passar todos esses
anos comigo.

— Digamos que você não é o professor mais sociável do campus. Nem


namorada? — Droga, isso não é da minha conta. Para de ser curiosa.

—Não, nem namorada, só o Cookie.

Interessante, e intrigante. Solteiro, bonito, estabilizado financeiramente.


Por que não tem no mínimo uma namorada? Será que ele é gay e esconde por
causa da faculdade? Não, acho que não. Só se fosse muito idiota para minar a
própria felicidade por causa de opinião alheia.

— Bom, estou indo. Até mais senhorita Carter.

Droga, mil vezes droga. Preciso dele, na verdade do dinheiro dele para
chegar em casa. Será como um pequeno empréstimo. Respiro fundo e faço
minha melhor expressão de maior abandonada.

— Luca, é, sabe. Eu falei que minhas coisas ficaram no carro, né? Não
tenho como terminar de chegar em casa, pode me ajudar?

— Estou sem carteira aqui também, mas meu apartamento é à três


quadras daqui. Acompanha-me vou pegar o carro e te levo em casa.

— Não precisa, não quero dar trabalho.

— Trabalho nenhum. Vamos?

De sapo para príncipe encantado? Qual princesa fez essa mágica, porque
tenho certeza de que não foi eu.

Andamos lado a lado até em frente ao prédio. Cortês me convida para


beber um café, mas recuso imediatamente. Sei que não à segundas intenções,
mas melhor prevenir. Além do mais os vizinhos podem ver, e o que vão
pensar do professor, com a aluna, sozinhos no apartamento? Não me importa,
porém Luca tem carreira e não quero prejudicá-lo.

Encosto na parede ao lado da entrada do edifício e espero que minha


carona retorne.

Não demora para o sedan preto sair da garagem subterrânea e estacionar


na guia próxima de onde estou esperando. Avanço alguns passos, mas para
minha surpresa, Luca desce do carro e vem em minha direção, sorrindo.
Gentilmente abre a porta do passageiro. Alguns movimentos e gestos me faz
lembrar Spencer, logo que começamos namorar.

Que isso Camilly? Parece que estou ficando louca, Luca e Spencer não
tem nada a ver um com o outro. Talvez esteja acostumada a lidar com
homens iguais a Brian Garcia. Grosso, indiferente. Cretino. Sai da minha
cabeça.
Agradeço, e sento no banco. Puxo o cinto de segurança com força.

— Deixa que ajudo.

Curvando o corpo por cima do meu, ele alcança o cinto e o puxa. Sinto a
fragrância da sua colônia, o calor emanando da pele.

— Droga — resmungo alto.

— O que foi? Machuquei você?

— Não, só estou pensando alto. Desculpe — disfarço.

Com tantos perfumes para comprar na cidade de Nova York, ele e Brian
precisam usar a mesma fragrância? É castigo só pode. Inquieta, me remexo
no banco para que ele saia logo. Não posso e nem quero lidar com outro
homem no momento. Sem graça, Luca se afasta e se ajeita no próprio banco,
enquanto liga o carro.

Seguimos o percurso no mais pleno silêncio. Aquela atmosfera amigável


se perdeu pelo caminho. Só quero chegar em casa, tomar banho e me jogar na
minha cama.

Em frente do prédio, abro a porta pronta para descer. Mas sinto minha
consciência pesada. Ele foi tão gentil, e nem por um momento hesitou em me
ajudar. Então, antes que eu desça, decido agradecê-lo da forma correta.

— Obrigada por tudo, pela companhia, a carona. Posso pagar um café


para você qualquer dia desses? — Abro um sorriso.

— Será um prazer, senhorita Carter. — Posso ver o brilho nos seus olhos.
Homens.

— Combinado, até mais.


Despeço-me, e desço do sedan sem olhar para trás.
Giro a chave destrancando a porta do meu apartamento. Empurro com o
pé para que feche. Na parede do lado direto toco o interruptor para acender as
luzes da sala e copa. Silêncio é tudo que preciso depois de um dia infernal. E
eu que achei que tudo ia ficar bem depois desse maldito casamento. Mas não,
aquela diaba sempre aparece para me provocar.

Tiro a jaqueta e a jogo em cima do sofá, em seguida abro o coldre peitoral


puxando para fora dos meus braços enquanto caminho em direção ao quarto.
Atravesso a entrada indo até o armário com cadeado onde guardo minhas
armas, e outras coisas com numeração da polícia. Tranco-os deixando em
segurança.

Arrastando os pés, exausto. Sento na beira da cama, abro botão por botão
da camisa deixando que caía no chão. Esfrego um pé no outro para tirar as
botas, e deito de costas encarando o teto pálido. Abro os braços e fecho os
olhos sentindo o peso dos problemas que assolam minha vida.

Não consigo evitar pensar naquela mulher. Como pode sair na rua de
pijama, é maluca? Enfrentar aquele desgraçado sozinha, se caso estivesse
armado? Confesso que admiro sua coragem, mas não quer dizer que não a
considere uma doida, e corajosa. Será que ela chegou bem em casa?

Depois de conseguir raciocinar com a cabeça de cima, procurei por ela


nas redondezas, já que provavelmente não tinha dinheiro, mas não a
encontrei. Talvez devesse ligar para saber se está tudo bem. Não, melhor não.
Camilly pode considerar isso como um sinal de interesse da minha parte.

Quer saber? Vou espiar da rua mesmo, ela não precisa saber que estive lá.
É isso.

Levanto rapidamente da cama e enfio os pés dentro dos sapatos, pego a


camisa e a coloco novamente. Saio apressadamente levando somente a chave
do carro e carteira com documentos pessoais.

Estaciono o carro na rua de trás para que não correr o risco de ser
reconhecido. Em frente ao seu prédio, me escondo em meio as árvores do
outro lado da rua e aguardo por meia hora. Impaciente, decido subir até seu
apartamento. Avanço dois passos em direção à rua, quando vejo um carro
sedan encostando. Recuo novamente voltando para o mesmo lugar. Então,
para minha surpresa Camilly desce do sedan cheia de sorrisos para o homem
no volante.
Quem é esse? Nunca o vi. Não me fode, não faz nada de tempo estava me
chupando no banheiro, agora, está com esse cara? Fecho as mãos em punho
apertando com força.

E por que ainda está usando esse pijama? Devia ter rasgado quando
surgiu oportunidade. Quer dizer que estava até essa hora na rua com esse
homem. E eu preocupado, é para aprender não ser idiota Brian. Está claro que
ela não precisa de você, quer dizer, proteção. Aguardo o momento do beijo
de despedida, mas ela não o beija. Despede-se de forma gentil, mas sem
intimidades ou qualquer gesto de afeto. Isso quer dizer que não é alguém
importante.
Logo vejo Camilly subindo os degraus da entrada, a bunda rebola
acompanhando o movimento do seu quadril. O babaca continua parado
dentro do carro observando a fachada do prédio. Nem pense nisso, acabo com
você antes mesmo de chegar ao elevador. Continuo esperando, e não demora,
a carona da senhorita encrenca ir embora.

Nervoso, salto do esconderijo andando de um lado para outro. Enfio as


mãos nos bolsos da calça, e começo resmungar sozinho no meio da rua.

— Vou subir. — Decido.

Atravesso a rua rapidamente, subo os degraus pulando de dois em dois até


chegar ao hall, seguindo para o elevador. Aperto o número do andar do
apartamento. Essa mulher precisa ouvir um bom sermão de como deve se
proteger.

Respiro fundo, o elevador abre as portas no andar, e desço no corredor.


Caminho lentamente até chegar em frente ao seu apartamento.

“Brian não faça isso, será um grande erro.”

— Só vou falar o que está engasgado desde o casamento, nada mais.

Levanto a mão fechada e bato na madeira da porta três vezes seguida.


Ouço sua voz pedindo que aguarde, engulo em seco. Estou com as frases
formadas na ponta da língua para dar uma correção, quando ela abre a porta
usando somente uma toalha enrolada no seu corpo.

Meus olhos percorrem seu corpo de cima abaixo. Os cabelos úmidos


grudados na sua pele, a boca entreaberta, a respiração acelerada. O conjunto
da obra me atingi em cheio, descendo diretamente para meu pau.

Lembranças da noite do casamento invadem meus pensamentos,


nublando qualquer capacidade de raciocínio.

— O que você quer Brian? — questiona rudemente.

Encaro dentro dos olhos castanhos. Sei que vou me arrepender, mas que
se foda.

Avanço alguns passos e enlaço sua cintura com meus braços, puxando
seu corpo para mais perto. Surpresa, Camilly me encara calada.

— Provar você — respondo entre dentes.

Desço a boca de encontro a sua tomando seus lábios em um beijo ardente.


Nossas línguas se tocam em uma brincadeira sensual e deliciosa. Minhas
mãos descem por suas costas e agarro sua bunda suspendendo-a no ar. Suas
pernas enrolam em volta da minha cintura. Ando dentro do apartamento com
ela pendurada no meu corpo, e sinto quando esbarramos na mesa. Separo
nossos lábios e abro um sorriso malicioso.

Inclino o corpo para frente, deitando-a contra a madeira maciça.

Puxo o nó que prende a toalha. Eroticamente encaro seu corpo nu. Os


seios fartos de bicos rosados e duros implorando atenção. Salivando, deslizo
a língua na ponta dos bicos, lambendo suavemente. Abocanho de uma vez
chupando com força. Revezo de um para o outro. Camilly se contorce
gemendo embaixo de mim.

Percorro sua barriga com uma mão descendo até tocar sua boceta. Meus
dedos esfregam o clitóris inchado e desejoso. Sem pudor ou delicadeza, enfio
dois dedos no seu centro úmido. Fodendo-a, entrando, saindo.

— Brian. — Meu nome escapa dos seus lábios como súplica.

Afasto a boca e começo trilhar um caminho de beijos por seu abdômen.


Seguro suas pernas e as arrasto para ficar mais próxima da beirada da mesa.
Seus olhos me encaram cheios de luxúria. Pisco sorrindo.

Ajoelho-me ficando no meio das pernas. Beijo a junção da virilha


roçando minha barba por fazer contra sua boceta. Louco de excitação,
começo lamber sua boceta molhada. Seu sabor é como néctar dos deuses.
Sugo o clitóris, roçando os dentes. Os gemidos de Camilly se tornam cada
vez mais alto me instigando. Lambendo, chupando, sugando com a língua e
revezando com os dedos. Entrando, saindo, forte, rápido.
Não paro até sentir a boceta se contraindo, pronta para gozar. Continuo
chupando e fodendo com os dedos, então, sinto o líquido quente na minha
boca. O corpo de Camilly se contorce em espasmos. Sugo até a última gota.

Satisfeito, fico em pé e recuo dois passos para trás. Abro o botão da calça
deixando cair nos joelhos. Duro, e pronto para me enterrar dentro dela, ando
em sua direção, mas sou impedido quando Camilly toca meu peito com o pé.

— Chega.

— O que? — questiono atordoado.

— Estamos quites, chupei você aquele dia, agora, me devolveu. Pode ir


embora.

— Está brincando? — Só pode ser brincadeira dessa demônia.

— Não. Pode sair, por favor.

Paralisado, sem calça e de pau duro no meio da sala, sou dispensado.


Respiro fundo contando até cem. Sem esboçar qualquer reação, fico
encarando essa mulher descer da mesa, pegar a toalha e se enrolar novamente
cobrindo o corpo.

— Você é uma ... — digo entre dentes.

— Uma o quê? Cuidado senhor delegado.

Esfrego as mãos na barba subindo até a cabeça, bagunçando os cabelos.

— Bata a porta quando sair. — Piscando diabolicamente, ela caminha em


direção ao corredor indo para o quarto.

Juntando o que sobrou de dignidade, ergo a calça com as mãos trêmulas.


Saio do apartamento pisando duro, e faço questão de bater à porta com força
para que saiba que estou indo embora.
Assim que ouço o som da porta batendo sei que estou sozinha, e em
segurança. Solto a respiração lentamente tentando recobrar o juízo que me foi
roubado enquanto estava em cima daquela mesa. Confesso que fui pega de
surpresa, jamais passou por minha cabeça que o delegado conservador
poderia invadir o apartamento e fazer tais coisas. Fecho os olhos, e
lembranças invadem meus pensamentos. Seu olhar faminto percorrendo meu
corpo, como um animal selvagem e sedento. Sinto minha pele arrepiar. Levo
as mãos até o nó da toalha e o aperto com força. Ainda estou desejosa e
pulsando de desejo por aquele ogro.

— Camilly se controla se controla — repito alto.

Balanço a cabeça, braços e pernas, exercitando os músculos tensos. Quer


saber, acho que preciso de outro banho urgentemente. Entro no banheiro e
abro a água gelada.

Algo está me deixando intrigada, por que Brian veio até meu apartamento
daquele jeito? Será que estava bêbado? Sempre relutou contra minhas
investidas, com aquele papo de viver em luto eterno. E hoje, quer sexo
quente? Ele não estava no seu juízo perfeito tenho certeza.
Além do mais está achando que aqui é igual drive-thru? Vem, tem
atendimento rápido qualquer dia da semana, e vai embora? Não senhor
delegado. Quero distância de problemas. Foi bom enquanto durou, mas
acabou o flerte.

Desligo o chuveiro, puxo a toalha do suporte enrolando no corpo. Fecho o


box e ando até ficar em frente a pia, encaro o reflexo no espelho.

— Mantenha distância da polícia, Cindy — resmungo.

Sento na cama assustada com o despertador. Pego o celular do criado e


desligo o alarme. Deito novamente aproveitando mais alguns minutos que
ainda tenho de folga.

Obrigo-me levantar, sonolenta vou em direção ao closet. Empurro cabide


por cabide em busca da roupa ideal para a reunião. Gostaria de saber por que
sempre marcam essas reuniões tão cedo? Separo uma saia lápis e uma blusa
branca de seda. Em alguns minutos já estou pronta nos meus saltos quinze
com uma leve maquiagem colorindo o rosto. Confiro a pasta com os
documentos mais uma vez. Encaixo a bolsa debaixo do braço e pego a chave
do carro.

O trajeto até o escritório dos advogados responsáveis pela administração


da pequena fortuna de Josefy, não demora mais que vinte minutos.
Mensalmente nos reunimos para apresentar lucros, gastos, enfim, extratos
analíticos da conta. Isso foi um dos motivos por optar pelo curso direito,
posso cuidar de tudo sozinha sem depender de ajuda de terceiros. Mesmo
sendo amigos da falecida, ainda não confio cem por cento.

Estaciono em frente à luxuosa casa com uma placa dourada indicando


qual tipo de serviço é prestado. Desço do carro e deslizo as mãos por minha
saia ajeitando as dobras do tecido. Com alguns passos atravesso a porta dupla
da entrada. Uma linda jovem vem em minha direção. Trocaram de
recepcionista novamente?

— Olá, bom dia. Tenho horário agendado com Antony.

— Bom dia senhorita Camilly. Pode me acompanhar, por favor.

Sigo andando atrás da moça até chegarmos a frente à porta. Com leves
batidas na porta informa que estou aguardando. Ouço a voz grossa do
advogado pedindo que entre. Sorrindo, agradeço a recepcionista e empurro a
porta de madeira.

Após analisar os relatórios mensais, encerremos a reunião. Despeço-me,


junto os papéis e os guardo na pasta. Levanto, aperto as mãos dos advogados.

— Senhorita, minha esposa convidou-a para jantar em casa.

Sorrio para Estefan com sentimento de gratidão estampado no rosto.

— Obrigada Estefan, mas hoje não posso. Diga que me sinto honrada
com convite, Madine é muito gentil. Tenho outro compromisso importante,
fica para à próxima. Isso é tudo senhores, até breve.

Aceno tchau enquanto atravesso a porta de vidro do escritório indo em


direção à calçada. Os raios de sol estão fracos com a chegada com
crepúsculo. Caminho lentamente até onde o carro encontra-se estacionado.
Aperto o alarme destravando as portas, e logo sento no banco atrás do
volante. Dirijo pelas ruas por mais vinte minutos.

Dentro do vestiário da academia, abro o armário pegando minha roupa de


ginástica. Essas reuniões sempre me trazem lembranças dolorosas do
passado. Josefy minha salvadora, e o como acreditava que estava no limite,
que ele aquele seria meu fim. E então, recebi ajuda de um anjo salvador.
Preciso extravasar.
Encaixo as luvas de boxes nas mãos, ando no tatame até o saco de areia.
Ergo os punhos como o professor ensinou, e começo socá-lo.

— Oi Cami, tudo bem? Dia difícil?

Ergo a cabeça, o suor escorre da minha testa percorrendo o pescoço,


descendo até o meio dos meus seios.

— Oi Suzana, um pouco. E você? Muito trabalho na promotoria, não a


vejo faz tempo — respondo, e dou mais um soco.

— Pois é me obrigaram pegar uns dias de folga, mas estou com um caso
grande nas mãos. Estou bem animada. Quer treinar comigo?

— Hum, gostei da ideia.

— Só um minuto — concordo balançando a cabeça, e espero Suzana


colocar as luvas.

Então, começamos nosso treino. Soco, desvio, chute, desvio. Não demora
muito para desistirmos. Sentamos no chão respirando fundo. Continuamos
conversando assuntos aleatórios, mas nada íntimo o suficiente para nos
considerarmos amigas. Digamos que somos colegas. Depois de uma boa
conversa, seguimos nossos rumos opostos.

Encosto no balcão da recepção aguardando a atendente para fazer o


pagamento da mensalidade. Distraída não percebo quando o instrutor se
aproxima por trás, sua respiração quente toca minha nuca, e
involuntariamente giro o corpo quase acertando um soco no seu nariz, por
sorte, ele é mais rápido e treinado que eu.

— Ohhh. Calma aí mocinha. Agressão física é contra regras.

— Desculpa, desculpa. Quem mandou chegar de mansinho. — Arqueio a


sobrancelha.

— Você não reclamava quando te pegava por trás antigamente.

— Antigamente, disse bem.


— Ingrata. Mas não foi sobre isso que queria falar com você.

— Pode falar.

— Ontem um homem veio lhe procurar aqui na academia. Fez várias


perguntas, inclusive seu endereço e telefone, achei estranho e falei que não
podíamos dar essas informações. É algum rolo seu?

— Não, eu não, estou... — Espera, será que foi aquele ogro do Brian?
Penso comigo. Não, para que se daria todo esse trabalho. — E como era esse
homem?

— Bem vestido, bonito, disse que conhece você muito bem.

— Não faço ideia de quem seja, pode ser um novo admirador. — Pisco
sorrindo.

— Você ainda vai encontrar alguém para domar a fera.

— Vai sonhando queridinho.

Faço o pagamento, e finjo não dar importância para o fato de alguém


estar me procurando. Talvez tenha sido o delegado mesmo, levando em
consideração o jeito que apareceu em casa, poderia ser. Não sei, algo está
errado. Do lado de fora da academia, pego o celular do bolso e digito uma
mensagem.

“Você me procurou na academia? Virou stalker?” — Enviada.

“Não sei do que está falando, andou bebendo senhorita”? Cuidado


pode acabar na cama de um desconhecido.”

— Que filho da p... — Respiro fundo.

“Há há há. Obrigada pelo conselho, mas a única cama que quero é a
minha. Adeus seu ogro. PS: Sua chupada é péssima.”

Desligo o aparelho antes de ler a resposta. Ponto para mim, com certeza
certo delegado deve estar esbravejando nesse momento. Jamais vou admitir
que quero mais, e mais, e que ele é gostoso.

Aquela boca, o cheiro do seu corpo forte e sexy, sua língua deliciosa.

FOCO CAMILLY, FOCO.

O lugar desse homem é no passado, foi só uma experiência e nada mais.


Agora, senão foi ele, quem está me procurando? E por quê?
Passaram-se sete dias desde que fui até o apartamento daquela mulher.
Acho que finalmente entendeu que tudo entre nós foi um erro grotesco, e que
não deveria se repetir jamais. Quer saber, estou aliviado. Ela segue a vida
dela e eu sigo a minha, somos dois estranhos na grande cidade de Nova York.

Puxo o nó da gravata afrouxando o colarinho. Ouço batidas na porta, e


peço que entre. Catarine empurra lentamente à porta apontando primeiro a
cabeça. Faço um gesto com a mão pedindo que entre. Não sei por que, mas
estou de péssimo humor ultimamente.

— Senhor, estou com alguns arquivos para levar ao departamento de


descarte. Gostaria de analisar mais algum dos processos? — Catarina se
aproxima da mesa com várias pastas nas mãos.

— Deixe aqui. — Empurro alguns papéis abrindo espaço em cima da


mesa. — Até o fim do dia devolvo, mas acredito que já analisamos o que era
necessário.
— Sim senhor. Obrigada. — Despede-se e antes de sair da sala, gira o
corpo e se aproxima novamente. — A promotora pediu que entrasse em
contato com ela assim que possível.
— Ok.

Abaixo a cabeça puxando uma pasta de documentos, e escuto quando a


porta se fecha indicando que estou sozinho novamente. Apoio os cotovelos
na madeira e esfrego com os dedos meus olhos cansados e sonolentos, dobrar
o plantão para quarente e oito horas não é fácil. Mas, ultimamente a nossa
área está com o maior índice de violência, assaltos e furtos.

Respiro fundo e lembranças surgem em meus pensamentos em pequenos


fragmentos de memória. Quando Sheron ainda estava viva, em dias ruins,
sempre era recebido com massagem, carinho, conforto. Não era preciso dizer
nenhuma palavra, ela me conhecia com tanta profundidade que apenas um
olhar bastava.

— Sheron — resmungo suspirando.

O celular vibra dentro da gaveta causando um grande ruído. Considero a


hipótese de simplesmente ignorar a chamada, mas pode ser algo importante.
Então, abro a gaveta e vejo o nome PROMOTORA saltando na tela.

Caralho esqueci-me de retornar à ligação. Pego o aparelho e atendo


rapidamente.

A voz feminina e sensual da promotora soa alto do outro lado da linha.

— Boa tarde. Sim, tudo bem. Estou ciente do caso e aguardando mais
informações da perícia. Sim, envio assim que obtiver o resultado. Ok. O quê?
Café? Bom, eu não gosto... — Sou interrompido com argumentos válidos
antes mesmo de rejeitar o convite. — Tudo bem, às sete horas. Até mais.

Se arrependimento matasse estaria morto nesse momento. Por que aceitei


o convite? Tudo bem que é somente um café com uma colega de trabalho,
mas não gosto de socializar, ainda mais com outras mulheres.

Qual é Brian, é uma porra de café. Ela não está querendo levar você para
o banheiro e chupar seu pau igual Camilly. Inferno, essa mulher é um
demônio. Como posso lembrar isso quando estou pensando em café?
Ótimo Brian Garcia está totalmente focado, ou seria obcecado por aquela
devassa com corpo de deusa e lábios macios. Maldita, como pode me
expulsar da sua casa daquele jeito, quem pensa que é? Quebrei minha
promessa para em seguida ser rejeitado. Três banhos frios não foram
suficientes para baixar a porra do meu pau.

Decido sair mais cedo, e ir visitar o túmulo de Sheron para refrescar


minha memória do porquê não me envolvo com outras mulheres e
especialmente diabas como Camilly Carter.

Em frente ao cemitério, estaciono próximo a uma banca de flores. Desço


e aperto o alarme travando o carro. Sigo em direção à florista, escolho um
lindo buquê de rosas amarelas. Caminhando na estrada de tijolos, observo os
nomes das lápides. Tantas pessoas perderam seus entes queridos assim como
eu.

Aproximo-me do túmulo de Sheron. Sinto uma dor forte no peito


misturado ao turbilhão de sentimentos. Angústia, saudade, tristeza. Pode
passar o tempo que for continuarei amando-a. Não se esquece de um grande
amor. Agacho, fecho os olhos recitando mentalmente o quanto me faz falta.
Coloco as flores em cima da lápide. E antes que me torne mais patético, me
despeço.

Nostálgico e cansado, sigo para casa. Dentro do apartamento, tomo uma


chuveirada antes de deitar para um cochilo. Com a toalha enrolada na cintura,
me jogo na cama. Mas, a cada vez que fecho os olhos, só consigo lembrar a
expressão no rosto de Camilly quando estava no meio de suas pernas.

Bruxaria, só pode. Não é normal, será que estou ficando doente? Talvez
devesse procurar por terapia. Admita. Você quer aquela mulher, só não quer
dar o braço a torcer. Orgulho ferido meu chapa, orgulho ferido.
Resmungando viro de lado na cama e sou vencido pelo cansaço.
Sento na cama assustado com o som do alarme ecoando pelo quarto.
Levanto rapidamente indo em direção ao armário. Escolho camisa polo e
calça jeans, estilo esporte e nada formal, até porque, isso não é um encontro,
e sim, uma boa xícara de café e nada mais.

Pontualmente às sete horas estou em frente à cafeteria aguardando


Suzana. De longe vejo quando uma bela mulher se aproxima com seus saltos.
Assim que a promotora me vê, abana a mão com grande sorriso nos lábios.
Com passadas longas alcanço-a e cumprimento de forma gentil. Seguro a
porta para que entre, e deixo que escolha a mesa que gostaria de se sentar,
para minha surpresa, a escolhida é a mais afastada de todos, localizada no
canto. A garçonete encosta na nossa mesa com seu aparelho nas mãos para
anotar nosso pedido.

Começamos conversar sobre assuntos aleatórios enquanto bebemos


nossos capuccinos. Agradável, educada, bem diferente de uma e outra que
conheço. Mas algo detém minha atenção.

ELA... ELE. Quem é ele?

Como sempre com o dom de estragar tudo e perturbar minha vida,


Camilly entra na cafeteria acompanhada de outro homem. Enquanto Suzana
continua falando sobre seus gostos peculiares, semicerro os olhos na direção
do casal do outro lado do cômodo. De onde conheço esse homem? Ah claro,
o cara do carro. Como poderia esquecer o dia que fui enxotado. Só consigo
ouvir a voz da promotora de longe.

Encaro os lábios carnudos daquela diaba, tentando fazer leitura labial já


que o papo está tão animado. A cada palavra que escapa da boca do seu
acompanhante, ela sorri alegremente e aperta a mão no braço do homem.

Bato o pé impaciente no chão. Sorrindo, o homem levanta e ajeita sua


cadeira para mais perto dela. Trinco o maxilar cerrando os dentes.
Lentamente vejo o rosto do senhor perfeito se aproximando. Não resisto ao
impulso ficando de pé em um salto. Furioso com o sangue fervendo nas
veias, piso fundo, marchando na direção deles.

Paro ao lado da mesa, e seguro o braço de Camilly puxando seu corpo


frágil para cima e longe desse cretino.

— Brian? — chama meu nome, me encarando assustada.

— Vem comigo — digo entre dentes.

— Você está louco, me solta — resmunga tentando desvencilhar.

— Ei solta ela, senão vai ter problemas. — Então, o senhor perfeito quer
falar de problemas?

— Não é da sua conta. — Encaro-o.

— Solta ela.

— Não se meta. — Puxo o corpo de Camilly de encontro ao meu, enlaço


sua cintura com o braço e a conduzo para a saída.

Sinto a brisa tocando meu rosto. Mesmo do lado de fora da cafeteria, me


sinto possessivo. Ela é minha, e só minha. Como aquele desgraçado ousa
tocar no que é meu? Devia ter quebrado sua cara.

— Brian me solta, está louco. Você bebeu? — Enquanto resmunga se


contorce tentando fugir.

— Por que deixou outro homem tocar você?

— Que homem? Do que está falando? Me solta.

Tudo acontece em fração de segundos. O acompanhante de Camilly, surgi


na nossa frente e tenta tirá-la dos meus braços. Gritos, discussão, e logo
temos olhares curiosos observando a situação. Fecho os punhos pronto para
socar a cara metida desse desgraçado.

— PAREM. CHEGA — Cami grita ficando entre mim e seu amigo. —


Luca, por favor, vá embora. Depois nos falamos.

— Mas...
— Vou ficar bem, vai, por favor.

— Escutou? Vaza — replico por cima do que falou me sentindo vitorioso.

Um a zero para o delegado aqui. Babaca, devia prendê-lo por desacato à


autoridade, assédio sexual. Quem ele pensa que é? Luca? Isso é nome de
homem? Combina muito bem com a cara dele.

Seguro na mão de Camilly e entrelaço nossos dedos, saio andando na rua,


e a levo junto até acharmos um lugar tranquilo para conversarmos.

— Me solta, me solta — resmunga puxando a mão.

Sem opção, faço um ato impensável. Paro, seguro sua cintura e a


suspendo no ar jogando seu corpo por cima do ombro. Bárbaro, sim. Mas ela
vai ouvir o que tenho para dizer.

— Brian seu maluco — grita dando tapas nas minhas costas.

Sorrindo satisfeito, continuo andando pelas ruas com seu corpo frágil
pendurado.
Sinto um misto de raiva e desejo enquanto estou sobre seu ombro. Seu
jeito másculo e ciumento no momento me deixou furiosa. Não posso negar
que desejo tanto esse homem que chego a arrepiar só de lembrar quando
esteve com sua boca no meu centro úmido. Mas quem ele pensa que é? Não é
meu namorado, muito menos dono das minhas vontades, sou livre e
desimpedida para sair com quiser.

— Brian me coloca no chão, agora, entendeu? Agora — resmungo


socando suas costas, mas não deixo de notar os músculos tencionados, e sua
bunda.

Só pode ser brincadeira Camilly Carter. Praticamente sequestrada por um


ogro selvagem e ainda tem a capacidade de admirar a bunda dele? Não tem
amor próprio, não? Ok. Brian é gostoso, além do mais não sou cega. A
lembrança dos momentos que passamos juntos me enlouquece
constantemente. Talvez essa seja a melhor solução, provar da fruta proibida e
seguir em frente. Como diz o ditado: Tudo que é proibido é mais gostoso.
Você não tem jeito.

Observo os passos reduzindo a velocidade, e em seguida entramos em um


beco escuro, e afastado das pessoas que transitam pelas ruas noturnas de
Nova York. Roçando seu corpo ao meu, Brian me desce lentamente. Minhas
mãos descem tocando seu peito. Consigo sentir os músculos por baixo do
fino tecido da camisa. Respiro fundo procurando um motivo para correr e
fugir dessa armadilha sexy e sensual que esse delegado me colocou. Mas, sua
respiração ofegante perto do meu rosto, causando arrepios me diz que correr
não irá adiantar. Será como adiar o inevitável.

Encaro dentro dos olhos castanhos. Desejo, paixão, luxúria, fome. Esse
animal enjaulado está faminto e olhando dentro dos olhos da sua presa. E a
presa? Bom, está disposta a ser devorada. Deixar a brasa pegar fogo e
incendiar.
Sem dizer nenhuma palavra, continuo descendo as mãos por seu corpo.
Brian segura na minha cintura avançando alguns passos me fazendo recuar
até encostar-me à parede. Não consigo desviar meus olhos, seu queixo
quadrado com a barba por fazer, seus lábios, cada contorno do rosto másculo
e viril. Mordo os lábios, e as lembranças do banheiro, e da mesa me atingem
me cheio.

Alcanço o botão da sua calça, e sem pudor ou vergonha, abro-o. Puxo o


zíper para baixo e enfio uma mão por dentro da cueca. Seguro seu pau longo
e grosso na palma da mão e envolvo-o com os dedos. Movimento devagar
subindo e descendo por sua extensão. Meu delegado tomba a cabeça
encaixando-a na curva do meu pescoço. Seus lábios mordem suavemente o
lóbulo da orelha. Fecho os olhos sentindo as carícias e não paro de fazer
movimentos.

— Minha perdição — Brian sussurra.

— Quero você — respondo gemendo.

Em fração de segundos e com um único movimento o delegado vira meu


corpo, colocando-me de frente para a parede de tijolos. Espalmo as mãos no
alto, indicando que sou inteiramente dele. E como se entendesse o gesto.
Pressiona seu corpo contra o meu, enquanto suas mãos agarram firmes meus
seios, acariciando, apertando os bicos sensíveis e desejosos de atenção por
cima da blusa. Provocando-o, ondulo o corpo contra o dele esfregando a
bunda contra sua ereção.
É como se não existisse mais ninguém no mundo, uma atmosfera somente
nossa. Conexão palpável e enlouquecida de prazer.

Suas mãos descem por minha barriga contornando a lateral do meu corpo
até tocar as coxas. Ofego alto, contorcendo-me. As pontas dos seus dedos
tocam a pele levando a borda da saia junto me deixando exposta. As mãos
deslizam por minha bunda, e sinto seu agarre me trazendo de encontro ao seu
quadril. Esfrego contra a ereção.

Com um puxão o tecido da desfaz caindo no chão. Brian gira meu corpo
me fazendo ficar de frente. Sou suspensa no ar. Enlaço sua cintura com as
pernas, e sem aviso, sinto seu pau entrando na minha boceta úmida. Grosso,
grande e duro entrando ferozmente.

Envolvo seu pescoço com os braços, e vou rebolando o quadril. A cada


investida sinto-o entrar mais fundo, mais forte. Seus lábios deslizam por meu
pescoço com a barba roçando, me marcando. Entrando, saindo, forte,
devagar, o sinto por todo meu corpo. O calor emanando me faz ficar em
chamas. Respiração ofegante, gemidos, sussurros, o som do choque dos
nossos corpos.

Agarro os cabelos macios, e abraço-o trazendo sua boca até meus seios.
Senti-lo sugando meus seios por cima do tecido me entorpece. Com os olhos
fechados perdida no turbilhão de sensações, sinto que não quero que acabe
nunca.

Mais algumas arremetidas, entrando, saindo, e sou levada ao sentir minha


boceta contraindo. Atingida por um orgasmo intenso e prazeroso. Não
consigo conter os gemidos e muito menos de gritar o nome do meu delegado.

— BRIAN — grito, gemendo.

Sua boca cobre a minha abafando os gemidos. E sem parar, beijando-me


ferozmente chega ao ápice. O líquido quente escorre por minha boceta.
Ofegantes e saciados, encaramo-nos. Quero beijar sua boca gostosa e pedir
uma segunda rodada, mas meus instintos pensam ao contrário. Remexo-me
inquieta até descer do colo. Calado Brian não tenta me impedir, mas não
desvia os olhos dos meus movimentos.
Procuro no chão o que sobrou da calcinha, e como imaginava não tem
condições de usá-la novamente. Não tenho coragem de encará-lo depois do
que aconteceu. E por essa atitude Brian está tão chocado quanto eu. A melhor
coisa é ir embora e pronto. Comi da fruta proibida, agora acabou.

— Camilly? — ele chama meu nome.

— Hum? Ah eu tenho que ir estou atrasada.

— Temos que conversar.

— Não, não temos — respondo de forma indiferente. — Ergue a calça,


senhor delegado.

— Sobre o que acont... — Enquanto ergue o zíper, interrompo-o antes


que possa argumentar sobre a situação.

— Não foi nada demais, não é como se eu nunca tivesse transado. Relaxa
delegado.

Com expressão de fúria, ele avança na minha direção, segura meu braço
me puxando para mais perto.

— Não divido, entendeu?

— Está louco, cuidado policial. — Impulsiono o corpo para trás


escapando da sua mão.

Antes que possa falar mais alguma coisa, viro de costas acenando tchau
fingindo ser indiferente. Quero correr até estar segura e dentro do quarto.
Caminho rapidamente até o ponto de táxi mais próximo.

Em frente ao prédio, pago o taxista com algumas notas que levei para o café.
Por sorte não as perdi do bolso da saia, mas em compensação o celular ficou
no beco, eu acho. Como pude perdê-lo? Todos meus dados estão salvos,
conta bancária, advogados e mais algumas coisas que não podem ser vistas
por ninguém, ainda mais pela polícia.

Subo as escadas pulando os degraus. Digito a senha na porta, e entro no


meu local seguro. O silêncio é como bálsamo para os ouvidos, já bastam
meus pensamentos gritando dentro da cabeça. A cada piscada revejo os olhos
castanhos me encarando.

— AHHHHHHH — grito sozinha. — Idiota você é uma idiota. Foi só


sexo, isso, e só dessa vez. Agora esquece, não quero vê-lo nunca mais. —
Esfrego as mãos no rosto. — Meu celular. DROGA. DROGA. DROGA. —
Desabo sentando no sofá.

Calma, muita calma. Fui meticulosa quando coloquei senha em todos os


aplicativos e informações usando contas duplas e programas para esconder
qualquer evidência. Além do mais, Brian não está me investigando. Não tem
lógica tentar invadir minha privacidade. Para ele é só um simples celular com
mensagens, assim espero.
Amanhã irei atrás de recuperá-lo. Porque hoje, mereço algo forte e quente
para me fazer esquecer a burrada que acabei de fazer.

Levanto arrastando comigo a pouca dignidade que me resta, e pego uma


garrafa de bebida na geladeira. Sem copos. Abro a tampa e viro o gargalo na
boca. Só quero dormir e deixar o dia de hoje no passado.
Por que não consigo esquecer o sabor dos lábios de Camilly? Consigo
senti-los como se tivesse acabado de tocá-los com a ponta da língua.
Aquela... Aquela... Porra! Sinto-me tão frustrado que não consigo falar seu
nome. Como pude ser tão idiota e deixar que me seduzisse desse jeito,
prometi a Sheron que jamais iria trair sua memória, e o que fiz? Transei como
um adolescente apaixonado no beco com uma mulher que até alguns meses
atrás era totalmente desconhecida para mim.

Apoio os cotovelos na mesa, e esfrego os olhos tentando aliviar a


ardência que se instalou depois de quarenta e oito horas de plantão. Não
quero ficar em casa remoendo o que aconteceu, pelo menos na delegacia
ocupo a cabeça com coisas úteis.

O som agudo e estrondoso soa alto dentro da gaveta, me faz abrir os


olhos. Confuso percorro o olhar por cima da mesa confirmando se é meu
celular, mas algo me faz lembrar um pequeno detalhe. Aquele demônio de
saia justa, desesperada para fugir depois de usar e abusar do meu corpo
deixou seu aparelho cair no chão. Exatamente há três dias. Tenho duas teorias
sobre isso. Primeiro, ela não sabe onde o perdeu e não faz ideia que está
comigo, ou prefere perder o celular ao invés de me procurar.
Abro a gaveta e o pego nas mãos. Dez chamadas perdidas e quinze
mensagens de textos não lidas. Nossa definitivamente a vida dela é bem
agitada. Enquanto seguro-o uma nova mensagem salta na tela exibindo uma
prévia do texto.

“Não se esqueceu do nosso jantar, não é? Hoje na sua casa?”

Apertando o celular na mão, levanto rapidamente afastando a cadeira para


longe.

— Jantar? — resmungo entre dentes. — Não perdeu tempo.

Deslizo o dedo na tela tentando desbloqueá-la. Esse babaca merece uma


explicação lógica sobre o tipo de mulher que ele está querendo se envolver.
Tento mais uma vez, e outra, mais outra inutilmente.

BRIAN isso não é da sua conta. Cuida da sua vida e esquece isso.

Como posso esquecer o que aconteceu entre nós, além do mais, ser usado
para sexo casual não é divertido quando ambas as partes não estão de acordo.
E se pedisse ao Ethan para codificar o celular e mudar o código de acesso?
Não seria difícil para ele, e depois do casamento do Dylan e seu papo sobre
seu GANDALF, fico enojado só de lembrar-me desse assunto, é como se me
devesse um favor por aturá-lo.

Batidas na porta me puxa de volta para o mundo real. Balanço a cabeça


negativamente para meu comportamento. Qual é? Sou homem, não um pivete
apaixonado e possessivo. Jogo o aparelho dentro da gaveta novamente e a
fecho com força.

— Entra — respondo.

Parker, nosso detetive da divisão de narcóticos entra com passos longos e


rápidos segurando um envelope branco.

— Trouxe o resultado toxicológico do caso Avenues. Como


imaginávamos conclusão positiva. É a mesma substância que encontramos na
jovem da overdose.
— Precisamos encontrar quem está repassando essa nova substância.
Tenho a sensação de que isso é só fase de teste antes que comecem a
comercializar na área geral. O que pode ser melhor do que essa molecada
cabeça oca para provar uma droga nova sem saber os efeitos colaterais.

— Exato. Porém, temos que tomar cuidado. Não queremos problemas


com os alunos daquela escola. Sabe aquilo lá cheira a dinheiro a quilômetros
de distância.

— Por isso mesmo. O avião está dentro da famosa propriedade privada.

— Isso porque os pais pagam milhares de dólares para manter educação e


segurança dos filhos, e veja só, mal sabem que o problema está mais perto do
imaginam.

— Vou solicitar um mandado para pegarmos as filmagens das câmeras de


segurança. Quem sabe encontramos algo que nos ajude.

— Ok.

Desde o dia da cafeteria não tive coragem de falar com Suzanna.


Abandonei-a sem pudor na cafeteria em meio a uma cena de ciúmes patética.
Envergonhado é como me sinto. Posso mandar flores como pedido de
desculpas, mas, e se ela entender minhas intenções de forma errônea? Bom,
preciso achar um jeito de me desculpar. Levá-la para jantar seria o ideal.
Nada de mandar recados, sou homem suficiente para encará-la.

Tiro o telefone do gancho e digito o número da promotoria. Após cinco


toques desisto da ligação, e desligo. Abro o sistema e começo digitar os casos
pendentes que aguardam resultados de autópsias, exames de sangue entre
outras informações. Estico o pescoço de para o lado e depois para o outro
estralando os nervos tensionados. Ergo os olhos e confirmo o horário no
relógio de parede. É companheiro, está na hora de ir de para casa descansar.

Levanto, estico as pernas alongando os músculos. Pego o casaco do encosto


da cadeira e o jogo por cima do ombro. Despeço-me dos policiais do plantão
noturno e como sempre antes de partir deixo algumas orientações para
possíveis situações de emergências. Atravesso a porta dupla da entrada, e
sigo em direção ao estacionamento. Aperto o alarme destravando o carro,
assim que sento atrás do volante abro os botões que prendem o coldre com a
pistola. Puxo debaixo do banco a caixa preta de veludo com o símbolo da
polícia na tampa, e guardo minha arma.

Decido desviar o caminho antes de ir para casa. Encosto o carro em frente


ao cemitério. Como esperado os portões estão fechados para visitação. Mas
só o fato de estar próximo ao lugar onde Sheron está enterrada já me
conforta. Se ela pudesse ver tudo que aconteceu, o que me diria? Ficaria
brava? Iria me xingar? Não. Era doce, delicada, educada como uma flor,
jamais faria isso com qualquer pessoa, ainda mais comigo.

E agora? Estou envolvido com uma mulher que mais parece um trator
demolidor. Arrastando tudo e todos que estiver em sua frente. Que mudança
nada sútil não acha senhor Brian Garcia? Fecho os olhos fazendo minhas
preces, mas sou interrompido ao ouvir meu nome sendo chamado no rádio.
Respondo prontamente. Assalto com vítimas sendo feitas de refém. Recebo
as coordenadas do endereço no GPS do carro. Acelero pelas ruas de Nova
York até o ponto indicado. De longe vejo as luzes vermelhas e azuis
iluminando à noite.

Com dificuldade me aproximo do local. Pessoas curiosas e prontas para


filmar e ganhar likes com a desgraça alheia se instalam na calçada, o que
acaba dificultando nosso trabalho. Maldição.

Encontro com os policiais da delegacia e peço informações sobre a atual


situação. Roubo ao caixa eletrônico que por fim deu errado, e em uma
tentativa frustrada para escapar fez reféns. Duas mulheres e uma criança.

— Onde está o negociador? — questiono observando ao redor todos os


pontos estratégicos.

— Ainda não chegou senhor.


— Por que está demorando tanto?

— Disse que chegaria há cinco minutos.

— Em cinco minutos ele pode matar todo mundo, cadê o alto-falante.

Pego o alto-falante nas mãos, avanço alguns passos entre a multidão,


passo por baixo da faixa de contenção entrando no campo de visão do
meliante.

— Meu nome é Brian Garcia, sou delegado. E quero conversar com você.
OK. Vamos manter a calma e chegar a um acordo.

— NÃO QUERO ACORDO — berra o homem escondido atrás de uma


pilastra, mas ainda consigo vê-lo através do vidro.

— Eu sei que está com medo, assustado. Não esperava que fosse dar
errado, não é? E, também sei que não quer machucar ninguém, por isso
escolheu esse horário para não ter pessoas, estou certo?

— SIM. SÓ QUERIA O DINHEIRO — grita o bandido.

— É eu sei. O que acha de soltar essas pessoas para podermos conversar?


Deixe-me entrar e podemos resolver tudo.

— NÃO.

— Qual é? Quer machucar crianças e mulheres? Sei que não é desse tipo.

— Você não me conhece babaca.

— Não mesmo, mas sei que está desesperado por isso está fazendo isso.
Se soltá-las prometo fazer algo por você, mas só se soltar essas pessoas.

Ergo as mãos para cima, e dou um giro trezentos e sessenta para que o
assaltante tenha visão que não estou armado. Sinalizo disfarçadamente com
os dedos um código secreto da polícia, indicando para o atirador se
posicionar e aguardar meu comando.
Caminhando lentamente sigo em direção à porta de entrada do banco.
Uma a uma, as pessoas que eram mantidas reféns são liberadas.

Sozinhos, instigo que o homem me fale o porquê agiu dessa forma.


Analisando sua aparência física e o descontrole mental posso presumir que
não é um assaltante experiente, me arrisco que essa é a primeira tentativa de
roubo.

Bingo!

Ouço atentamente os relatos financeiros que a família está vivenciando,


tento controlar a situação para não acontecer nenhum agravante. A cada
palavra que sai da boca do homem, nota-se o quanto está assustado e confuso,
em casos assim me arrependo de manter o rádio ligado após final de turno.

Aproveito um descuido e avanço sobre ele, tirando a arma de suas mãos e


o imobilizando no chão. Recito o código penal dos direitos civis enquanto
aguardo os demais se aproximarem.

Nada como terminar uma noite de trabalho.

Peço para os responsáveis cuidarem de tudo. Preciso de banho, cama e


dormir.
Fecho os olhos absorvendo a sensação da água tocando minha pele.
Cretino, nem ao menos se deu o trabalho de devolver meu celular. Com
certeza está esperando que o procure, sinto informar senhor delegado, não vai
rolar. O lado bom de ter dinheiro é o que se pode fazer quando tem os
contatos certos. Paguei um hacker para invadir o Iclode do celular e consegui
recuperar tudo. Arquivos, senhas. Infelizmente não pude apagar o que já
estava salvo no aparelho, jamais o delegado irá imaginar o que tem naquele
celular, sorte para mim e azar o dele.

Ainda consigo sentir seu cheiro, o toque quente das suas mãos. Esse ogro
quer me enlouquecer. Mas, ok já provei da fruta proibida, preciso variar o
cardápio. Talvez devesse dar uma chance para Luca, ele é sexy, charmoso, e
sua companhia é muito agradável, ao contrário de alguns que conheço.

— Sai da minha cabeça BRIAN — grito sozinha dentro do banheiro. —


Foco Camilly.

Termino o banho e decido correr no Central Park. Coloco roupa de


ginástica, tênis e prendo o cabelo em um rabo alto. Mente sã, corpo são.
Demorei tanto tempo para colocar minha vida nos eixos e não posso estragar
tudo por uma atração sem importância.
Dentro do elevador ouço os murmúrios dos outros condôminos sobre
vandalismo e violência. Baixo o volume da música que toca na playlist para
tentar entender o que está acontecendo, mas todos estão inteirados do assunto
o que os leva falar em um código que só eles entendem perfeitamente.

Despeço-me saltando do elevador, no hall de entrada. Desço os degraus e


mais à frente um grupo de pessoas cercam a lateral do prédio. Por um
momento pondero ignorar a situação já que não é da minha conta, mas a
curiosidade fala mais alto. Disfarçando me aproximo entrando na roda, ergo
os olhos e vejo a pichação na parede em grandes letras garrafais.

“Até que a morte nos separe.”

Sinto o ar fugindo dos pulmões, é como se tivesse levado um soco na


boca do estômago. Cambaleando, desnorteada, recuo alguns passos para trás.
Arrepiada e com calafrios percorrendo meu corpo. Sustentar-me em pé é
impossível, e lentamente sento no chão. Respiro fundo para não ter uma crise
de pânico, mas tudo que me vem à cabeça é Spencer. Impossível. Eu o matei,
ele está morto, tenho certeza.

Meus olhos ardem enquanto enchem d’água. Engulo seco em segurando


as lágrimas. Nada de show na frente da vizinhança. Discrição, tenho que
manter tudo em ordem.

— A senhorita está bem? — Ouço uma voz chegando por trás.

— Ahh sim, estou bem. Acho que foi só uma vertigem — respondo
enxugando as lágrimas com os dedos.

— Tudo bem.

— Obrigada. — Apoio as mãos no chão sustentando o corpo para que


possa levantar.

Agradeço novamente ao segurança do condomínio. Envergonhada,


assustada. Definitivamente nada de corrida por hoje. Quero me esconder no
quarto, dentro do meu espaço seguro.
Vários dias se passaram desde a pichação na parede. Após todos esses
anos acreditei que era forte o suficiente para enfrentar qualquer coisa. Mas,
fiquei tão assustada com aquela frase, que não sai de casa para nada ficando
isolada com medo. Patética, medrosa, covarde. Não sou mais a Cindy, sou
Camilly. Aquela mulher ficou no passado, mas por que tenho a sensação de
que ainda não acabou? Deitada na cama encaro o teto branco e cálido.

O som do celular vibrando em cima do criado mudo, me traz de volta dos


devaneios e suposições que invadiram meus pensamentos nesses últimos
dias. Pego o celular e o nome ALYSSA salta na tela, deixo chamar e antes
que ela desligue, atendo.

— Oi Aly. Sim, estou bem. Não, não é nada. Hã? Também estou com
saudades do meu afilhado. É, sabe que não quero atrapalhar o casal vinte,
vocês casaram não faz muito tempo. Humm. Lua de mel. Hoje? Tudo bem
irei sim. Está bem, até.

Encerro a chamada e jogo o celular em meio aos travesseiros. Jantar


especial com essa família linda, não tem como negar. Abro o armário em
busca do que vestir. Vestido? Calça? Saia? É tantas opções, algo mais
simples e casual. Espera, e se Brian estiver lá também? Devia vestir algo
provocante e esfregar naquela cara de ogro o que ele está perdendo.

Quer saber? Por que estou preocupada com o que ele pensa? Mas, isso
não quer dizer que não posso me divertir, não é?

Procuro o celular no meio dos lençóis, e assim que encontro envio uma
mensagem.

“Aly, será só nós?” — Envio e aguardo a resposta.

“Brian também virá, algum problema?”

Satisfeita com a resposta, abro um grande sorriso maléfico no rosto.


“Não. Até. Beijos”.

Com um pulo salto da cama e corro em direção ao cabideiro para escolher


qual será a tortura dessa noite. Passando um a um, opto por um tubinho preto
que se ajusta perfeitamente as curvas do meu corpo, ressaltando os seios e a
bunda. Brian Garcia, não importa o quão ogro e sério você possa ser, sei que
sente atração por mim e se posso usar isso ao meu favor, por que não, não é?

Depois de um banho longo e demorado me sinto revigorada. Deslizo o


tecido do vestido por minhas pernas e o ajusto no corpo. Nos pés uma
sandália de salto alto. Seco os cabelos alisando-os, e para completar aplico
maquiagem leve e natural no rosto. É engraçado ao mesmo tempo assustador
pensar que enquanto era casada com Spencer me sentia um farrapo humano, e
naquela época não conseguia entender porque tinha tanto ciúmes, já que me
achava a mulher mais feia do mundo, e hoje me olhando nesse espelho
consigo notar o quanto estava enganada. Balanço a cabeça tentando esquecer
as lembranças dolorosas daquela época sombria.

Ele está morto, não pode fazer mais nada. E quer saber, Spencer? Você
nunca foi homem para mim, e hoje sei bem disso. Cretino.

Pego a bolsa de cima da cama, apago a luz do quarto e fecho a porta.

Os sons dos saltos ecoam pelo corredor do prédio, aperto o botão do


elevador e aguardo. A porta dupla de metal se abre revelando vários
moradores dentro. Cumprimento-os sorrindo e entro no meio. Posso sentir os
olhares na minha direção, e até mesmo os murmúrios. Fofoqueiros. Aposto
que estão pensando onde estou indo, ou se vou encontrar algum homem, para
não dizer coisas piores. Infelizmente o julgamento alheio sempre vem antes
da verdade.

Mantenho a postura de desinteressada até chegarmos ao subsolo. Salto do


elevador, e antes que a porta se feche, viro, e aceno tchau com um grande
sorriso vitorioso no rosto. Sigo para a vaga onde o carro está estacionando.
Destravo as portas e sento atrás do volante.

Acelerando nas ruas Nova York, sem medo, vergonha, nada. Cindy não
existe mais e não posso deixar alguém que está morto interferir novamente na
minha vida. Tenho que me controlar para não colocar tudo a perder. Prometi
a Josefy que iria ser feliz, plena, e assim o farei.

Em trinta minutos estou em frente à casa de Dylan e Alyssa. Parada em


frente ao jardim, encaro as flores, a fachada da casa, alguns brinquedos de
Dominic jogado pelo quintal. A típica casa da família feliz. Só posso ficar
agradecida por minha amiga ter superado seu passado. Quem sabe será, não
é?

Ouço passos se aproximando, e antes mesmo de virar o corpo sou


atingida por uma fragrância amadeirada masculina. Fecho os olhos e sinto
meu sangue agitar nas veias, provocando arrepios.

Brian. Seu nome é o primeiro pensamento.

O vejo passar por mim sem ao menos me cumprimentar. Não consigo


falar nenhuma palavra nem mesmo para brigar e dizer o quanto ele é um
cretino arrogante. Encaro suas costas, descendo até a bunda, e nossa que
homem. Mordo os lábios, e flashs daquela noite invadem nitidamente minha
cabeça. Respiro fundo me xingando mentalmente.

FOCO CAMILLY. FOCO MULHER. Mantenha essa calcinha intacta e


as pernas fechadas.

— Cami? — Alyssa me chama da varanda.

— Ah oi, estou indo. — Por sorte não o vejo mais, já entrou na casa.

Cumprimento Dylan que está sentado no sofá com Dom no colo. Estendo
os braços para o pequeno, e o pego no colo. Beijo suas bochechas rosadas
brincando com meu afilhado e ignorando a existência desse Sherek metido a
príncipe encantado.

— Ca, pode vir aqui, por favor — Aly me chama da cozinha.

— Claro. — Entrego Dom para o pai.

Quase piso com meus saltos no pé de Brian, mas desisto. Seria


infantilidade demais pisar nos seus pés, não que ele não mereça. Sem contar
que ele perceberia que estou com raiva, o que iria gerar sentimento de
autoconfiança.

Na cozinha ajudo lavando os legumes, picando a verdura, enquanto


conversamos sobre a nova vida de casada.

— Está bem mesmo? Estou achando que você um pouco pálida.


Emagreceu, aconteceu alguma coisa? — sou questionada e sinto como se
estivesse sendo analisada da cabeça aos pés.

— Sim, fique tranquila. Fiquei presa uns dias em casa, estava cansada,
sonolenta, acho que acumulei cansaço extra — respondo secando um prato.

— Sonolenta? Nunca foi de dormir muito.

— É também estranhei, e sobre o peso, estou sem apetite, um pouco


enjoada. — Minha boca responde mais rápido do que meu cérebro possa
processar.

— VOCÊ ESTÁ GRÁVIDA? — Alyssa grita alto empolgada.

— O QUÊ? — grito mais alto ainda, surpresa com sua pergunta.

Paralisada com as palavras presas na garganta não consigo responder.


Vamos Camilly, explique que isso é impossível. Mas, contar a verdade nesse
momento, iria gerar mais perguntas.

— Você está grávida, Camilly? — A voz grossa e firme de Brian surge


por trás dos meus ouvidos.

Giro-me lentamente na sua direção. Seus olhos estão arregalados em


contraste com a expressão assustada e ao mesmo tempo, séria que está
estampada no rosto.

Abro a boca para falar que não, mas estou perplexa com a situação. E
quando você acha que não pode piorar, está enganado, sempre pode.

— Quem é o pai? — Dylan surge na porta.


Solto o prato e o guardanapo em cima da bancada, ergo as mãos
sinalizando que não, afobadamente. Todos me encaram aguardando uma
resposta abro e fecho a boca duas vezes procurando o melhor jeito de contar
que não tenho útero e jamais poderei ser mãe. É, mais um presente especial
do senhor Spencer.

— EU NÃO ESTOU GRÁVIDA. NÃO POSSO SER MÃE — grito


colocando para fora uma verdade do meu passado.

Todos preferem a verdade sempre, mas ela pode ser tão dolorosa quanto a
mentira.
Encaro Camilly após sua grande revelação. Suas mãos estão tremendo, a
voz falha por nervosismo, ansiedade. Porra! Como fui burro. Transei com ela
naquele beco sem ao menos usar preservativo. E agora observando sua
expressão chorosa, percebo o quanto me comportei como um canalha. Nunca
liguei para saber se estava bem, não devolvi o celular, a tratei como uma
qualquer. Depois de anos ela foi à primeira mulher que realmente conseguiu
me tirar daquele buraco negro. Será que ainda tenho tempo para redimir?
Sinto-me tão mal por tudo.

— Ela já disse que não está grávida, vamos esquecer esse assunto —
disfarço passando entre Cami e Alyssa.

— Ok sem bebezinho, mas e essa aparência de doente? Já foi ao médico?


— questiona Aly.

— Não, não fui. — A demônia de saia responde saindo da cozinha.

Encho o copo com água e bebo em um único gole. Confesso que senti
minhas pernas amolecerem com a mínima hipótese de ser pai. Mas estou
curioso do porquê ela não pode ser mãe. E pela expressão de surpresa de
todos incluindo sua amiga, significa que também não sabia disso. Segredo.
Sempre achei essa mulher misteriosa, e como sempre meu faro de
investigador não estava errado.

Sinto olhares sobre mim, e viro de costas. Dylan me encara com os olhos
semicerrados. Engulo em seco, suando. Será que deixei transparecer que
temos algo? Quer dizer TIVEMOS no passado.

— O que foi? — pergunto rudemente.

— Nada, só estou olhando para o meu grande amigo Brian Garcia.

O peso do meu nome completo saindo por seus lábios me causa calafrios.
Cacete ele sabe. Abro um meio sorriso de canto de boca, disfarçando. Pego a
colher de cima da pia e tiro a tampa da panela fingindo provar a comida.
Como esperado Aly entra na brincadeira para quebrar o clima tenso que se
instalou naquele pequeno cômodo.

Durante o jantar era notável a mudança de humor da Camilly. Cabisbaixa


e com poucas palavras, sempre falando o mínimo possível ou até mesmo
respondendo só quando perguntavam. Feridas profundas quando tocadas
doem na alma. Sento ao seu lado no pequeno sofá de dois lugares. A intenção
de ficar próximo parece não ser notada. Definitivamente não está bem.
Duvido que perdesse a oportunidade de se esfregar em mim tirando uma
lasquinha.

Esfrego minha perna na sua, e sinto a fragrância doce do seu perfume.


Respiro fundo controlando a respiração acelerada. Por um momento tenho o
vislumbre do seu corpo delineado, a bunda empinada para mim, enquanto
fodia sua boceta úmida e deliciosa. Apertada, macia, sensível ao meu toque.
Essa mulher misteriosa é minha perdição. Tem-me por completo em suas
mãos, mas para minha sorte ainda não sabe disso.

— Obrigada pelo jantar Aly, tenho algumas coisas para fazer, quero
dormir cedo. Boa noite. — Cami se levanta e despede-se.

Dou um pulo ficando em pé rapidamente. Não quero esperar mais nem


um minuto para conversarmos sobre nossa situação.
— Também estou indo — respondo atraindo olhares curiosos.

— Vocês dois, juntos? — Dylan aponta para mim e depois para ela.

— Claro que não, até parece. — Consigo respirar novamente, assim que
responde quebrando qualquer desconfiança.

Despeço-me e saio primeiro para não levantar suspeitas. Conversar em


frente dessa casa seria o mesmo que assinar o atestado de culpa. Então, vou
esperar no seu prédio, mais precisamente na sua porta. Quero surpreendê-la.

Encosto na parede ao lado da porta do apartamento. Ansioso, confiro


mais uma vez no relógio. Jurava que ela dirigia rápido, e justo hoje está
dirigindo igual uma tartaruga.
Ouço o som do elevador parando no andar, a porta se abre e não demora
em Camilly surgir praticamente arrastando os pés. Sinto um aperto no peito
de vê-la desse jeito, e não resisto ao impulso. Corro até ela, e a puxo para
dentro dos meus braços envolvendo-a em um abraço apertado. Acaricio a
cabeça sentindo a suavidade dos seus cabelos.

— Brian? — questiona surpresa e paralisada.

— Shii. Deixa-me abraçar você.

— Por quê? O que aconteceu? Você bebeu? Eu acho que...

Antes que conclua sua frase cheia de teorias, seguro seu rosto entre as
mãos e tomo seus lábios em um beijo apaixonado. Minha língua invade sua
boca explorando-a. Aperto forte sua cintura puxando-a para mais perto,
colando nossos corpos. Os seios roçam contra meu peito, me deixando
excitado. Não resisto e esfrego o quadril contra a sua perna para que possa
sentir.
— Olha o que faz comigo — sussurro contra os lábios.

— Brian — geme baixo.

Suas mãos descem por minha barriga indo em direção ao botão da calça.
Não consigo detê-la. Quero fodê-la e ouvir gemendo, suplicando por mais.
Seguro na sua bunda e impulsiono para cima suspendendo-a no ar. Camilly
enrola as pernas na minha cintura. Avanço alguns passos e aperto o botão do
elevador, abrindo rapidamente as portas de metal, entramos. Clico no botão
de emergência e travo-o.

Bato as costas dela contra a parede fria em seguida desço-a do meu colo
para deslizar as mãos por seu corpo. Sorrindo mordo seus lábios e puxo
devagar. Minha boca desliza por seu pescoço, e continuo descendo até os
deliciosos seios. Seguro seu bico inchado por cima do tecido com os dentes,
os gemidos ressoam dentro do elevador.

Deslizando os dedos por suas pernas ergo a barra do vestido até o quadril.
Afasto-me, e pisco sorrindo. Ajoelho-me lentamente, coloco sua perna por
cima do ombro dando acesso a sua boceta, puxo sua calcinha fio dental e não
perco tempo. Roço a barba por fazer no centro úmido, em seguida a língua.
Lambendo, sentindo o sabor da sua umidade.

Chupo deliciosamente o clitóris pulsante. Tomado por um desejo


violento, chupo, lambo, fodo essa mulher que virou meu mundo de cabeça
para baixo. Sussurros, gemidos abafados me enlouquecem. Continuo
chupando.

— Oh Brian vou gozar — gemendo, Cami se contorce.

De supetão levanto me afastando, termino de abrir a calça deixando cair o


jeans aos meus pés. Puxo seu corpo ao mesmo tempo levantando-a no colo.
Encaixada no meu quadril, enterro meu pau dentro da sua boceta.

Apoio a cabeça na curva do seu pescoço. Movimento-me rapidamente


entrando e saindo, fodendo-a com força. A cada estocada seus gemidos estão
mais altos. Mordo sua pele sensível marcando-a.
Entrando, saindo, cada vez mais rápido. A pressão da sua boceta inchada
aperta meu pau, provocando a melhor sensação do mundo.

“Você me tem, Camilly Carter. Sou seu, completamente seu. Seja


minha, quero você.” Repito mentalmente como uma súplica desesperada.

Invisto mais algumas vezes, e não resisto. Derramo o líquido quente


dentro da sua boceta, mas não paro de mexer o quadril até senti-la atingir o
orgasmo.

Suados, ofegantes, saciados.

Ergo a cabeça e encaro seus lindos olhos castanhos. A conexão é mútua e


instantânea. Destino gosta de pregar peças nas pessoas, e dessa vez ele se
superou.

Ofegante e ainda encarando seu rosto.

— Vamos conversar — digo.

Com os olhos arregalados, ela permanece calada. Seu hálito, a respiração


acelerada, seu peito sobe e desce rapidamente. Tenho a ligeira impressão que
ainda não processou o que acabou de acontecer.

— O quê? — questiona confusa.

Vagarosamente a desço fazendo tocar os pés no chão. Recuo alguns


passos para trás dando-lhe espaço. Com as bochechas coradas, ela desce a
barra do vestido ainda desnorteada. Aproveito para fazer o mesmo, subo a
calça me recompondo.

— Você é mesmo um cretino — resmunga de cabeça baixa.

— Eu? Falei para conversamos sobre isso.

— Conversar? Não temos nada para falar. — Furiosa, aperta o botão


destravando o elevador.

Assim que as portas se abrem, como uma onça brava Camilly sai pisando
duro pelo corredor. Não posso deixar passar, dessa vez não. Acelero os
passos até alcançá-la. Seguro seu braço e giro-a fazendo ficar de frente para
mim.

Cerro os dentes trincando o maxilar. Encarando-a.

— PORRA. QUERO VOCÊ. QUERO FICAR COM VOCÊ.


ENTENDEU? — grito em mais pleno e alto som.
Meu coração bate acelerado a ponto de o sangue bombear os meus
ouvidos prejudicando minha audição. Só posso ter entendido errado. Sua
respiração está tão ofegante e consigo sentir sua mão trêmula e suada. Não é
possível que seja verdade. Senhor delegado quer pregar uma peça em mim?
Brincar comigo?

— O que foi? Você bebeu escondido na casa da Aly? Só pode ser isso —
respondo prontamente, tentando disfarçar.

— Não, não bebi. É a verdade.

— Não temos nada em comum. Entendeu? Logo você ganha suas asas de
anjo do pau oco, e eu? Bom, não acho que irei ganhar nada parecido.
Incompatibilidade sabe o que é isso? E me solta. — Impulsiono o corpo para
trás para escapar de suas mãos.

— Aqui não é lugar para discutimos sobre isso, vamos entrar.

— Não, vamos ficar aqui mesmo. Eu, não quer... — E novamente o


espírito de homens das cavernas possuí o corpo do delegado.

Sou pega de surpresa ao ser suspendida no ar e jogada por cima do seu


ombro como um saco de batatas. É a segunda vez que esse homem faz essa
palhaçada, não terá uma terceira, eu mato-o antes disso. Como se nada
estivesse acontecendo, Brian caminha pelo corredor até ficar em frente à
minha porta.

— A chave Camilly — pede com a voz rouca e sensual.

— É sério, vou abrir um processo como atentado ao pudor, delegado —


digo entre dentes.

— Fique à vontade, agora, a chave. Não me faça revistá-la.

Quando estiver com meus pés no chão, vou chutar em um lugar esse
delegado desaforado que irá chorar um mês de dor. Quem ele pensa que é?
Está achando que sou a santificada da Sheron? Ogro, abusado. Mesmo contra
vontade, aponto para a bolsinha. Sinto quando a abre e em seguida o barulho
da chave encaixado na fechadura. A porta se abre revelando o apartamento na
mais completa escuridão.

— Agora pode me soltar, por favor.

Atendendo ao pedido, Brian me solta lentamente fazendo meus seios


roçarem contra o abdômen musculoso, definido e gostoso. Foco Cami, foco.
Sentindo o chão embaixo dos pés, me afasto rapidamente recuando alguns
passos para trás, desnorteada com a situação e no escuro, esbarro com o sofá
me fazendo cair deitada entre as almofadas. Logo as luzes são acesas, a
claridade agride momentaneamente meus olhos me obrigando a fechá-los.

— Você está bem? — Brian questiona enquanto abaixa ao meu lado.

Quero gritar que não, não está tudo bem. Não quero relacionamento, não
quero me apaixonar, não quero nada com ele, não posso me envolver com
alguém da polícia. É como dar um tiro no próprio pé. Tudo seria questão de
tempo até descobrirem a verdade sobre o meu passado. A morte de Spencer,
o sangue que mancha minhas mãos de assassina.

— Vai embora, Brian. Vai, sai, não quero falar sobre isso, não agora. Por
favor, estou implorando me deixa em paz. — Permaneço com os olhos
fechados com medo de fracassar na minha decisão de expulsá-lo.

Não demora muito para ouvir o som da porta se fechando. Respiro


aliviada por estar sozinha no apartamento. Abro os olhos lentamente, e
agradeço a Deus pelo silêncio. Levanto-me do sofá, tiro os sapatos
empurrando longe com os pés. A única coisa que tenho certeza nesse mundo
é que não sou cardíaca. Primeiro confessar que não posso ter filhos, o sexo
maravilhoso no elevador e a declaração do delegado. Quanto sou capaz de
suportar?

Quando foi que ficou tão fraca Camilly Carter? Esqueceu por tudo que
passou ao lado daquele desgraçado? Espancada por anos, agredida,
humilhada. Sinto meu sangue ferver nas veias recordando as lembranças
traumatizantes, aquela não era eu, era Cindy.

Com passos largos caminho pelo apartamento até chegar à geladeira.


Abro-a e pego uma latinha de cerveja. Preciso aliviar a tensão nervosa, e ter
uma boa-noite de sono. Amanhã será um novo dia e tudo isso ficará para trás.

Sinto algo quente tocando meu rosto, abro os olhos lentamente e percebo
que já amanheceu, os raios de sol estão banhando o quarto. Sento na cama,
ainda estou usando a roupa da noite anterior. No chão várias latinhas
espalhadas, acho que bebi um pouco demais, mas tudo bem. Obrigando-me
fico em pé, arrasto as pernas até o banheiro. A cada passo sinto pontadas na
cabeça indicando a ressaca. Tomo um banho longo e demorado, deixando à
água morna cair na cabeça por vários minutos.

Decido ir para a academia, suar faz bem além de livrar meu organismo do
excesso de álcool. Coloco a roupa de ginástica e preparo suco desintoxicante.
Enquanto bebo sentada na mesa, ouço o som da campanha tocando.

— Só pode ser brincadeira. Essa hora? — Confiro o horário no relógio de


parede.
Contra minha vontade, mas seguindo a praxe de boas maneiras. Levanto e
sigo até a porta. Fico nas pontas dos pés e não consigo ver ninguém através
do olho mágico. Então, destranco a porta. Olhando de um lado para o outro
no corredor não encontro ninguém e para minha surpresa aos meus pés no
chão, tem um lindo buquê de rosas amarelas.

— Rosas? — resmungo baixo, antes de pegá-lo.

Brian é a primeira pessoa que me vêm à cabeça. Mas como ele sabe que
rosas amarelas é minha flor preferida. Pensando bem, essa flor era preferida
da Cindy, não minha, e como ele poderia saber disso se nunca comentei com
ninguém.

Calafrios percorrem meu corpo arrepiando minha pele. O sentimento de


medo, misturado com pânico me invade. Seu nome surge em meus
pensamentos, e é como um soco no estômago.

SPENCER!

Nos primeiros anos de casado aquele monstro trazia todos os sábados rosa
amarelas. Dizia que comprava para ajudar uma senhora que vendia próximo
ao seu trabalho. Na verdade, sentia raiva toda vez que ele chegava com
aquele buquê sorrindo como se fosse perfeito. Sorria agradecida, fingindo
empolgação.

Tremendo e com dificuldade para respirar, jogo longe o arranjo de flores.


Bato a porta trancando-a. Desesperada, ando de um lado para outro dentro do
apartamento.

— Não pode ser... Ele está morto. Eu matei você. Não, de novo não... Por
favor, me deixa em paz — sussurro, esfregando uma mão na outra.

Ele está morto, eu o matei. Lágrimas descem por meu rosto molhando
minha pele. Não consigo descrever o que estou sentindo. É como se o mundo
perfeito entrasse em colapso. Mesmo morto esse homem quer acabar comigo,
me destruir. O que eu faço? Não posso envolver ninguém, não tenho para
quem pedir ajuda, nem conselhos.
Minhas pernas fraquejam me colocando de joelhos prostrados.

— MALDITO — grito.

Deito no chão, puxo os joelhos na altura do abdômen e o abraço. O


pânico tomou conta do meu ser, nublando qualquer capacidade de raciocínio.
Por hora, só quero chorar e me lamentar de não ter morrido junto com
Spencer.

Desperto com o som do celular tocando em cima da mesa. O apartamento


está na mais plena escuridão. Após horas chorando, o desgaste emocional foi
tão grande que acabei adormecendo. Assustada, ajoelho e vou engatinhando
até a mesa. Minhas mãos vasculham em cima do móvel de madeira em busca
do aparelho. Encontro-o e continua tocando incansavelmente.

O nome BRIAN salta na tela, e não sei exatamente o porquê, mas me


sinto aliviada. Respiro fundo e atendo.

— Oi. Não, estava dormindo. Por incrível possa parecer, estou feliz que
me ligou delegado. Desculpe por ontem, fui pega de surpresa com tudo que
aconteceu. Sim... Você não facilita em nada. O quê? Eu não sou
complicada... Olha aqui seu ogro. Não fale assim comigo. Mas o quê? —
Elevo a voz. — Ok. Estou esperando.

Nesse momento ver um rosto familiar e confiável irá me ajudar superar


essa situação louca. Não posso me esconder novamente, tenho que reagir e
descobrir quem fez isso. Aproveito e uso o brilho do celular para iluminar o
caminho até o interruptor de luz. E como esperava, estou sozinha e ficando
paranoica.

Enquanto procuro o que vestir para receber o príncipe ogro, relembro


todos os eventos que estão acontecendo. Primeiro um homem procurando
informações sobre mim, naquela época achei que poderia ser o Brian, mas me
enganei. Depois a frase “Até que a morte nos separe” Spencer sempre falava
isso usando de ameaça, e agora, essas rosas amarelas. Não é aleatório,
alguém está brincando comigo. Se ele está morto há tantos anos, quem
poderia? Espera!

Eu o matei, não matei? Seria possível ter resistido e estar me caçando?

Não, impossível. Quem iria sobreviver a tiros queima roupa? Meus olhos
arregalam-se quase saltando da órbita. O próprio demônio. Sim, Spencer
pode estar vivo e mais que determinado a dar fim na minha vida.

Dessa vez, dois podem brincar. Aquela mulher inocente, frágil, não existe
mais. Antes que acabe comigo, te mando para o inferno definitivamente.
Salto para fora do elevador no andar do apartamento de Camilly.
Conforme me aproximo vejo que ao lado da porta tem um buquê de rosas
amarelas jogado no chão. Abaixo e pego. Será dela? Quem ousaria ficar
mandando flores para a mulher de outra pessoa, mas pensando bem, se
tratando de Camilly nada é impossível e seus admiradores. Mas, agora, as
coisas irão mudar.

Toco a campainha, e aguardo. Assim que a porta se abre, seus lábios


carnudos se curvam em um grande sorriso fazendo meu coração bater
acelerado. Sem pensar em mais nada, rapidamente avanço alguns passos para
frente e envolvo sua cintura com o braço puxando o frágil corpo de encontro
ao meu. Tomo sua boca em um beijo apaixonado com minha língua
invadindo, explorando e saboreando.

O perfume adocicado da sua pele invadi meu nariz, provocando reações


por meu corpo, inclusive na parte mais baixa, deixando-o pronto para possuí-
la. Quero mais, quero estar dentro dela, ouvir os gemidos, senti-la por inteiro.
Mas para minha decepção sou afastado rápido demais.

— Calma aí, tigrão. Temos muito que conversar. — Espalma as mãos no


meu peito criando distância entre nós.

Seus olhos percorrem ao redor caindo diretamente no buquê que estou


segurando, no desespero de tomá-la esqueci completamente de questionar
sobre o presentinho.

— Por que está segurando isso? Onde encontrou? Foi você que mandou?
— São muitas perguntas, e posso sentir por seu tom de voz que as flores não
agradaram.

— Não, e encontrei caído perto da porta, achei que podia... — Sou


interrompido por dedo selando meus lábios.

— Jogue fora, por favor. Não quero falar sobre isso.

Balanço a cabeça concordando, em situações de risco e perigo iminente


como uma mulher irritada, é melhor calar-se e concordar com tudo. Sigo
Camilly até o sofá, e sentamos lado a lado. Ela está estranha, tensa, calada,
sinto que tem algo errado. Será que está com problemas? Alyssa certa vez me
contou que não sabia muito sobre o passado da sua amiga, que ela não falava
sobre isso, nem família, nada. Era como se sua vida fosse recente. Mas aquele
dia no jantar contou algo importante e que lhe causou muito sofrimento, o
fato de não poder ser mãe.

— Você está bem? — questiono me aconchegando entre as almofadas.

— Sim, estou. Vamos direto ao ponto, sabe que odeio enrolar. Você gosta
de mim, e diz que quer ficar comigo, é isso? — Uou essa é a mulher forte e
decidida que conheço.

— Quero, e sim gosto de você. — A resposta podia ter sido um pouco


melhor, Brian seu babaca.

— Hum. Não sei se quero, fico confusa. Sinto-me estranha, perdida,


quero ser protegida e cuidada por você. Entende? Estar com você me faz
frágil. E não sei se gosto disso.

— Eu cuido, protejo e amo você — respondo de forma sincera.


— Tenho segredos.

— Não me importo.

— Você não me conhece, não sabe do que sou capaz.

— Quero conhecer, e saber de tudo.

— Eu quero fugir de você, desse sentimento.

— Eu também, mas tudo me traz até aqui.

— Tem certeza? — Seus olhos castanhos estão marejados me encarando.

— Quero você, Camilly Carter — sussurro coçando o queixo com barba.

— Seu ogro abusado.

Sou pego de surpresa, quando ela levanta o corpo e senta por cima do
meu quadril, enlaçando as mãos por trás do pescoço, uma perna de cada lado,
distribuindo beijos por meu rosto.

— Tenho regras. Primeiro não pergunte sobre o passado, quando estiver


pronta falaremos sobre isso. — Balanço a cabeça positivamente. — Segundo
não quero ser vigiada, não sou prisioneira. Ok? — resmungo, mas concordo.
— Terceiro quero manter isso em segredo por enquanto, por favor.

— Espera, por que segredo? — questiono.

— Estamos nos conhecendo, esqueceu que até esses dias você era o viúvo
que chorava pela falecida esposa? Ah e tem mais uma coisa, por favor, pare
de ficar chorando por Sheron enquanto estiver comigo. É insensível pedir
isso, mas vamos viver o presente.

— Concordo de viver o presente, mas sobre o segredo.

— Por favor, por pouco tempo — súplica, segurando meu lábio inferior
com os dentes e soltando devagar para me persuadir.
— Ok. Concordo. Agora, que concordei com tudo. Somos namorados,
certo?

— Sim.

— Preciso matar a saudade da minha namorada.

Seguro na cintura e levanto deitando-a no sofá. Encaixo-me no meio das


suas pernas e me perco nos prazeres que só essa demônia de saia pode me
proporcionar.

Um mês de namoro. Nunca imaginei que chegaria a namorar uma pessoa


como ela. Confesso que ela me surpreende em atitude, inteligência. Sempre
escutei o ditado que não se julga um livro pela capa, e nunca levei a sério.
Acreditava que ela era só mais um rosto bonito, fútil, mas me enganei
completamente. É uma mulher doce, gentil, inteligente e a cada dia ao seu
lado tenho certeza de que valeu a pena esperar por todos esses anos.

— Senhor, tem uma ocorrência de tentativa de homicídio. — Catarine


entra na minha sala.

— Já avisaram o detetive Parker?

— Sim, ele está indo, mas achei que gostaria de saber que é senhorita
Jeniffer, lembra-se? Foi até o marido levar a medida protetiva.

— Desgraçado. Ele fez de novo? — Semicerro os dentes.

— Sim.

— Onde ele está? — Levanto da cadeira, e pego minha arma de dentro da


gaveta encaixando no coldre.

— Foragido, mas temos algumas dicas dos possíveis locais onde ele
possa estar escondido.

— Estou saindo, mande os endereços no celular. — Despeço-me da


policial.

Devia ter matado esse maldito quando tive oportunidade. Sigo até a
garagem da delegacia, e entro no carro. Ligo o rádio na frequência para
acompanhar as demais ocorrências. Não demora em chegar à mensagem
contendo os endereços. Dirijo pelas ruas de Nova York, conferido os locais e
não encontro nada. Sinto-me frustrado e impotente mediante a situação.

Estaciono em uma rua qualquer e faço uma ligação para a promotora


Suzana solicitando uma ordem de busca e prisão para esse cretino. Quero seu
rosto estampado em todos os lugares até o encontrarmos, agressor de merda.
Encerro a chamada.

“Jantar as oito, não se atrase. Beijo.” — Recebo uma mensagem de


Camilly.

Em momentos como esse, ela é como um bálsamo. Antes que possa


responder, o celular ressoa uma nova mensagem de número desconhecido.

“Olá delegado. Você sabe quem é essa mulher que se envolveu? Sabe
do que ela é capaz? Vou dar um conselho. SE AFASTE DELA, ou terá
consequências”.

Permaneço com o celular nas mãos tentando digerir a mensagem, ou seria


ameaça? É sobre Camilly, ok. Mas, o que ela fez que a torna tão perigosa a
ponto de enviarem uma mensagem dessas? Ou pode ser esses malditos exs
querendo atrapalhar nosso relacionamento.

— Uhhhrr — resmungo furioso.

Não sei como reagir, ou o que pensar. Devo questioná-la diretamente?


Não, melhor não. Primeiro tenho que saber quem mandou isso. Pode ser só
uma brincadeira de mau gosto. Com algumas horas ainda para o jantar,
retorno à delegacia. Encaminho a mensagem para o departamento de
investigação cibernética e solicito que rastreiem quem enviou a mensagem e
qualquer outra informação.

Enquanto aguardo, aquelas palavras não saem da minha cabeça. Que seu
passado é sombrio já desconfiava, e não estava me incomodando até agora.
Como posso estar em um relacionamento assim? Batidas na porta me traz de
volta dos meus pensamentos.

— Brian, a mensagem foi enviada de celular descartável. Não tem como


rastrearmos. — Parker entra na sala com o relatório nas mãos.

— Porra — resmungo, passando as mãos na cabeça.

— O que está acontecendo? Posso ajudar?

— Não, mas sei com quem tenho que falar.

Ajeito o coldre com a arma, e coloco o casaco por cima cobrindo-o.


Camilly e eu teremos uma longa conversa, e não adianta fugir. Quero saber
tudo, e porque estão me ameaçando. Isso não é brincadeira, ninguém iria
comprar um celular descartável só para brincar.

Desculpe, mas hoje, você não irá jantar com Brian Garcia, e sim, com o
delegado Brian.
Termino de preparar o molho sugo, enquanto coloco a massa para
escorrer dentro da pia. Ainda sobra uma hora para tomar banho e me preparar
para recebeu meu ogro metido a príncipe. Desde que entramos em acordo e
começamos a nos relacionar, percebi o quanto Brian pode ser cavalheiro, e
sensível. Para alguém rude, grosseiro, ele até que me surpreendeu.

Enrolo o cabelo fazendo um coque alto para não atrapalhar os dotes


culinários que não tenho, mas não importa, quero deixar tudo o mais perfeito
possível. Não é como se precisasse da aprovação de ninguém, só quero dar
meu melhor.

Ouço a campainha tocando. Afasto-me do fogão, surpresa. Confiro mais


uma vez o horário no relógio de parede antes de abrir a porta.

Sigo receosa até a porta, e abro. Sou surpreendida ao dar de topo com
Brian e sua expressão fria e assustadora. Avanço alguns passos e fico nas
pontas dos pés e beijo de leve seus lábios, mas ele continua na mesma
posição, paralisado.

— Está tudo bem? — Recuo, me afastando.


— Sim, boa noite. — Desviando de mim, e totalmente indiferente, entra
no apartamento.

— Tem certeza? — pergunto andando atrás dele.

— Sim — responde rudemente.

— Ok. Estou com a comida no fogo, vou tomar banho, pode cuidar para
mim?

— O banho pode esperar, quero conversar com você.

— Hum?

Suas fortes mãos seguram meus braços me puxando para mais perto.
Confusa, encaro os belos olhos castanhos e inexpressivos. Esse não é Brian o
namorado, e sim, o delegado Garcia. Na mais simples hipótese de ter sido
descoberta me causa calafrios, acelerando os batimentos do coração.

— Quem é você? — questiona com a voz fria e cortante.

— O quê? — retruco com outra pergunta.

— Perguntei quem é você?

Sinto como se tivesse levado um soco no estômago. O ar foge dos meus


pulmões causando uma dor insuportável no peito. O que eu faço?

— Do que está falando? Andou bebendo senhor delegado. — Tento


disfarçar descontraindo a tensão que paira no ar.

— Por que estou recebendo mensagens falando sobre você? Tem algo que
eu deva saber?

— Mensagens? — Começo rir debochadamente. — Não sei nada sobre


isso, mas sei que se você não me largar, vou te chutar daqui. Me larga, agora.

Mensagens? Droga! Não consigo pensar com toda essa tensão, preciso me
livrar dele primeiro antes de decidir o que fazer. Sempre soube que se
envolver com a polícia acabaria desse jeito, mas fui teimosa e contra tudo que
acreditava por causa de uma paixão idiota, e agora, estou a ponto de ser
descoberta. Burra, burra, burra.

— Só quero entender o que tudo isso significa, Camilly. — A cada


piscada, sinto que estou sendo analisada. Brian está investigando minhas
reações.

— Vai embora, sai daqui, agora. — Impulsiono o corpo para trás fugindo
de suas mãos e criando uma distância segura entre nós.

— Ainda não acabamos nossa conversa. — Brian avança dois passos,


enquanto recuo mais dois.

— Acabamos. Não vai sair? Então, saio eu.

Agindo impulsivamente, passo por ele desviando da tentativa de me


segurar e sigo para a porta. Corro rapidamente pelo corredor até a escada do
prédio. Desço pulando os degraus para chegar à rua e o mais longe possível
dele. Preciso de espaço, e mais, tenho que entender o que todos esses sinais
significam. Na calçada em frente ao prédio, confiro mais uma vez a fachada
antes de começar correr.

Minha cabeça está uma bagunça, pensamentos desordenados. É como se


estivesse fugindo novamente do Spencer. A cada passo as lembranças
daquela noite surgem claramente na minha frente. Quanto mais eu corro,
mais sinto que estou sendo perseguida, vigiada, caçada.

Sentada no banco da praça, tombo a cabeça para trás vislumbrando o céu


estrelado. Minutos, horas, estou perdida com o tempo. Ainda não me
conformo como aquele homem consegue mesmo depois de morto mexer
comigo.

— Camilly? — Ouço uma voz masculina me chamando.


— Luca. Oi — respondo com um breve sorriso.

— Por que sempre nos encontramos desse jeito?

— O quê?

— Você na praça, olhando as estrelas. Pelo menos não está de pijama


dessa vez.

— Ah, oh. É verdade. — Sinto-me que preciso me desculpar novamente


pelo episódio da cafeteria. — Eu... Não me desculpei direito aquele dia na
cafeteria... Sabe me perdoe.

— Não precisa, não sabia que seu namorado era tão ciumento. Devia ter
sido mais cuidadoso.

— Ele não era meu namorado na época. Mesmo assim, desculpe.

— Tudo bem, vamos esquecer isso. — Pisca para mim, sorrindo.

Luca se senta ao meu lado no banco, e começamos conversar. Ouço


atentamente sobre como desenvolveu sua carreira na área criminalista, até
quando decidiu que ser professor. Não contenho algumas gargalhadas
descontraídas enquanto escuto os erros primários que cometeu no início.
Permito-me esquecer de tudo ao meu redor para ter uma conversa agradável
com o meu amigo. Os problemas, os sinais, Brian. Não quero pensar nisso.

— Bom, já está tarde. Quer beber algo? Vinho, talvez? Confesso que
minha adega é ótima. — Sou convidada para ir até sua casa, mas e depois?
Sei bem o que ele espera depois, mas não estou disponível.

— Obrigada, mas tenho que voltar.

— Tem certeza? Não parece que quer voltar. Sabe que pode contar
comigo sempre, até mesmo se precisar de um lugar para ficar.

Sorrio sem graça, e desconfortável. Se tivéssemos nos conhecido


informalmente em outra época, seria o convite perfeito. Maduro, educado,
inteligente, o estereótipo de homem perfeito, totalmente ao contrário daquele
ogro. Infelizmente não mandamos no coração.

— Obrigada Luca. Vou me lembrar disso.

Despeço-me e saio apressadamente, os pelos da minha nuca se arrepiam.


É como se conseguisse sentir os olhos do professor me encarando.

Enquanto caminho retornando para casa, milhares de coisas passam por


meus pensamentos. Fugir, mentir, terminar o namoro, ou contar a verdade.
Fugir é o que me parece mais certo de se fazer, mas com certeza só iria piorar
a situação. Os negócios da Josefy são todos nessa cidade. Como diz o ditado
“A ocasião faz o ladrão”, primeiro vou analisar como estará a receptividade
do delegado depois de horas sozinho, e depois decido o que realmente fazer.
Conforme me aproximo do prédio, fico nauseada de ansiedade e nervoso.
Esfrego as mãos na camiseta tentando secá-las do suor. Dou o primeiro passo
para subir a escadaria da entrada, quando um vulto passa por trás de mim.
Viro-me rapidamente, mas não vejo nada. Desconfiada, permaneço paralisada
no mesmo lugar. Engulo em seco. Respiro fundo e subo pulando os degraus
para entrar no hall. Digito a senha para abrir a grande porta de vidro, e entro.
Em segurança, encosto o rosto no vidro e observo a rua buscando algum
sinal, se realmente tinha uma pessoa me vigiando.

— Você voltou — grito pulando assustada com a voz grossa pairando por
trás.

Levo as mãos ao coração que bate acelerado.

— Quer me matar, não faça mais isso — repreendo-o.

— Onde estava?

— Podemos conversar dentro do apartamento, por favor. — Pego na sua


mão e o puxo para o elevador. Ainda estou com a sensação de estar sendo
vigiada.

Mantenho distância de Brian. Lembro-me bem o que fizemos na última


vez que estivemos dentro do elevador, e não posso perder o foco fazendo
sexo quente com essa tentação de homem. Não demora em descermos no
andar, ando rapidamente até a porta, e ele me segue para dentro.

Nunca achei que diria isso, mas está na hora de alguém saber a verdade.
O fardo é pesado demais para carregar sozinha, e não sei explicar, mas sinto
que posso confiar no delegado. Sintomas de paixão louca e desenfreada?
Talvez. Estou cansada de viver com medo, quero ser livre de verdade.

Aponto para o sofá e peço que sente. Sem desviar os olhos, Brian faz o
que pedi. É como se estivesse preparado para pular em cima de mim caso eu
tentasse fugir de novo. Mordo os lábios para conter a vontade de rir. Puxo
uma cadeira e a arrasto até sua frente, e sento cruzando as pernas.

— Vou te contar tudo Delegado Garcia. Mas me prometa que irá ouvir
até o final sem me interromper.

— Sim, prometo — responde ansioso.

Respiro fundo, engolindo em seco. Fecho os olhos por um momento


criando coragem para abrir a caixa de pandora. Abro os olhos, encarando-o.

— Eu me chamo Cindy Foster...


Algo inimaginável acontece me pegando de surpresa. Mantenho a postura
séria e firme, mas ao ouvir o seu verdadeiro nome saindo dos seus lábios é
algo que me causa calafrios. Tento não esboçar nenhuma reação enquanto
ouço atentamente sua explicação. Em seu rosto posso ver as marcas embaixo
dos olhos indicando noites em claro, minha demônia de saia esteve sofrendo
calada e sozinha.

— Você não vai... Falar... Nada? — gagueja.

— Continua, quero saber de tudo, tudo, entendeu? — Apoio os cotovelos


nos joelhos.

Não é como se já não soubesse de tudo. Desde que estou com celular de
Camilly estava desconfiado. Primeiro o fato dela não tentar recuperar o
aparelho, qualquer mulher mesmo furiosa teria ido buscar. Segundo mesmo
orientando as pessoas a ser cautelosas com informações pessoais, ninguém
teria tantos sistemas de segurança com códigos codificados. No começo
fiquei curioso somente pelas mensagens que chegavam de outras pessoas,
mas quando enviei para o departamento crimes virtuais para desbloquearem o
celular e fiquei impressionado com o relatório enviado.
Mas, não quis alertá-la sobre isso, uma relação é baseada em confiança.
Toda história tem sempre dois lados e quero saber qual é o lado de Camilly
antes de julgá-la. Então, aguardei até quando pude.

Permaneço calado escutando os detalhes sórdidos de sua antiga relação


abusiva, detalhes que nos laudos criminais não constavam. A cada palavra
sinto meu coração bater acelerado, as mãos trêmulas e suando. Eu mesmo
quero matar esse desgraçado. Não suporto homens covardes agressores de
mulheres. Sua voz está fraca, estrangulada na garganta, e nos olhos lágrimas
insistem em rolar molhando o rosto marcado. Engulo em seco diante dessa
cena. Quero abraçá-la e oferecer conforto, acalentando toda sua dor.

— Fala alguma coisa, por favor — súplica com a cabeça baixa encarando
o chão.

Só consigo pensar nas maneiras que gostaria de matar esse filho da puta
maldito. Fecho os olhos por um momento e consigo visualizar nitidamente
Spencer agredindo minha mulher. Quando se está há tanto tempo trabalhando
com vítimas de agressões físicas, é fácil idealizar como tudo aconteceu.
Antes já era difícil, agora, então, com a confirmação, é dez vezes pior.

— Onde ele está? — questiono.

Sei que essa não é atitude que ela está esperando, mas só quero matá-lo,
mandar sua alma para o inferno de uma vez por todas.

— Eu o matei, entendeu? Matei. — Sua voz vacila.

— Tem certeza?

— O que quer dizer com tem certeza? E por que não está surpreso com
tudo que contei Brian? — Encara-me confusa.

— O que quer que eu faça, te prenda? — Elevo a voz irritado.

— Sim... Não... Quer dizer, é o que se espera de um delegado diante de


uma assassina.

— Como sabe que é uma assassina? Vejo só um caso de legítima defesa,


não assassinato.

— Eu sei, você acha que estudei direito para quê? Mas me fale a verdade
Brian. Porque não está assustado, surpreso. Você já sabia de tudo?

— Não é... — Ela ergue sua mão me interrompendo.

— Você sabia e não disse nada, por quê? POR QUÊ? — grita alto.

— Estava esperando você contar, mas essa mensagem foi totalmente


ameaçadora. Não tinha como esperar, seria como dar sorte ao azar. Desculpe-
me.

— Fiquei dias sofrendo, noites sem dormir com medo. Fugi por cinco
anos da polícia e de qualquer coisa que pudesse revelar minha verdadeira
identidade para você descobrir em pouco tempo. Como soube?

Explico minuciosamente como invadimos seus arquivos pessoais.


Sentada no sofá com as pernas cruzadas, não consigo evitar percorrer os
olhos por suas coxas torneadas. Sem dizer nenhuma palavra, ela se levanta e
caminha até a geladeira e pega uma latinha de cerveja.

Na época reavaliei o caso por contra própria. Spencer é de uma família


conhecida e rica. Não foi noticiado nenhum assassinato na família ou
qualquer outro tipo de escândalo. O que torna tudo ainda mais estranho. No
arquivo constava que a esposa Cindy Foster estava desaparecida depois de
um sequestro relâmpago. Agora, por que a família ocultaria tal informação?
Seria possível esse cretino estar vivo?

— Está pensando demais senhor delegado.

— Camilly não consta a morte do Spencer nos arquivos. E você foi dada
como desaparecida.

— O quê?

— Sim.

Quero ajudar em tudo que puder para resolver sua situação com a justiça
e poder viver tranquilamente. Com a latinha na mão, encostada na bancada da
cozinha ela me encara sem entender a minha linha de raciocínio. Muitas
emoções em uma única noite.

Levanto rapidamente e sigo em sua direção. Suavemente tiro a latinha de


sua mão depositando-a em cima da mesa. Envolvo os braços na fina cintura e
a suspendo no ar pegando-a no colo. Caminho até o quarto, e subo na cama.
Não quero sexo, só quero ficar com ela na segurança nos meus braços.

Deito-a e pairo por trás agarrado ao seu corpo. Beijo o topo da cabeça,
acariciando os cabelos. O som suave da respiração ressoa pelo quarto. Em
segurança, Camilly dorme por hora aconchegada.
Enquanto vigiava seu sono, inúmeras teorias rondaram meus
pensamentos. E a cada peça que se encaixou nesse quebra-cabeça leva
diretamente a Spencer estar vivo e espreitando. Agora, que sei em detalhes,
não vou deixá-la sozinha nesse apartamento como uma presa fácil. Ela irá
para minha casa, ou seria melhor eu vir para cá.
Ainda não me desfiz das coisas de Sheron e isso pode incomodá-la. Sinto
que estou pronto para deixar minha falecida esposa partir, mas não tive tempo
de pensar nisso ultimamente.

Meus olhos começam pesar me deixando sonolento, mas sou desperto


com o som da campainha tocando. Puxo o corpo para fora da cama quase
caindo no chão para não acordar a dorminhoca. Com passadas rápidas
alcanço a porta e a abro. No chão outro buquê de rosas amarelas contendo um
cartão.

Agacho e o pego nas mãos e leio no cartão a palavra “VADIA


TRAIDORA”

Agindo por impulso e sem pensar em nada, corro em direção a escada


saltando os degraus para chegar ao térreo mais rápido. A pessoa que fez a
entrega não pode estar tão longe. Em fração de minutos estou no hall de
entrada do prédio. Atravesso a porta dupla de vidro saindo na rua. Giro o
corpo em volta olhando para todos os lados procurando o entregador, mas
não encontro nada. Somente pessoas transitando, crianças, nada parecido com
o que estou procurando. Decepcionado retorno ao apartamento, e ao
encontrar o buquê o escondo antes que Camilly que veja.
Digito o número de celular do Ethan.

— Fala aí grande B. Quanto tempo cara, já estava com saudade dessa voz
sensual.

— Cara você não tem jeito. Preciso de um favor. E não, não estava com
saudade.

— Oh louco assim fere meus sentimentos sinceros, sabe como é, Gandalf


vai ficar magoado. Mas fala aí no que posso ajudar.

Peço para Ethan instalar um sistema de monitoramento online 24hs sem


Camilly saber, e discretamente para não levantar quaisquer suspeitas.
Acertamos os detalhes, e encerro a chamada. Como combinado no dia da
instalação terei que manter dona encrenca fora de casa.

— Brian? — A voz sonolenta, feminina e deliciosa me chama.

Guardo o celular no bolso da calça, e sigo até o quarto. Seus cabelos


negros estão espalhados no travesseiro, deitada de lado deixando em
evidência os fartos seios e as curvas da sua bunda. Essa mulher mexe com
meu psicológico, acordando o vulcão adormecido. Respiro fundo engolindo
seco.

— Com quem estava falando? — Rola na cama ficando com a barriga


para cima.

— Hum? O quê? — Meus olhos percorrem por seu corpo.

— Telefone, com quem estava falando?

— Ah... Era trabalho, nada importante. Mas, tenho algo muito mais
importante para fazer, agora.

Sorrindo maliciosamente, ela desliza as mãos por seus seios.

— O que delegado?

Sem tirar os olhos dela, dou a volta na cama ficando nos pés. Subo
lentamente até estar por cima do seu corpo. Minha boca desliza no seu
pescoço, beijando, lambendo, mordendo e assim continuo descendo. Por cima
do tecido mordo seu seio direito segurando o bico nos dentes, e soltando
lentamente.

Gemendo e ondulando seu corpo por baixo do meu, indica que está tão
desejosa quanto eu. Sempre pronta, desço uma mão até o elástico da calça e o
empurro para baixo enfiando a mão por dentro. Meus dedos acariciam seu
clitóris fazendo círculos e não resisto à tentação, e enfio os dedos na sua
boceta sentindo a umidade.

Ninguém vai machucar essa mulher enquanto estiver vivo. Ela é minha, e
só minha.
Sinto-me aliviada por poder dividir o fardo do passado com Brian, mas
não consigo evitar aquela sensação de insegurança. A última vez que me abri
e confiei em alguém acabei sendo espancada até quase a morte por Spencer.
Obviamente são pessoas totalmente opostas. Tenho que relaxar e aproveitar a
oportunidade que estou recebendo.

Encarando a janela do quarto noto os primeiros raios de sol nascendo. O


nascer do sol é um fenômeno lindo de se presenciar. Rolo o corpo para o lado
e dou de frente com o Brian que dorme tranquilamente. Por um momento
vislumbro os traços do seu rosto másculo e forte. Sorrindo, deslizo a ponta do
dedo suavemente contornado sua pele. Sou obrigada concordar que tenho
muita sorte, pude conhecer pessoas maravilhosas. Josefy, Brian, meus
advogados. Todos me acolheram independentemente da situação.

Arrasto as pernas para fora da cama devagar para não o acordar. Nas
pontas dos pés ando pelo quarto procurando o moletom de corrida. Troco-me
e calço o par de tênis. Primeiro a corrida matinal e depois irei comprar café
da manhã. Deixo um bilhete em cima do criado mudo. Como esperado, ainda
tem poucas pessoas nas ruas. Começo o exercício correndo até chegar à praça
central e assim continuo até completar o ciclo de voltas. Exausta, respiro
fundo sentindo o suor escorrendo no meio das minhas costas.
As palavras de Brian sobre Spencer ainda estar vivo invadem meus
pensamentos. Seria possível que estou fugindo de um crime que não cometi?

Enquanto sigo o caminho para a cafeteria, penso em várias teorias. Talvez


só esteja sendo paranoica igual certo delegado. Mas se levar em consideração
como era a família daquele cretino nada é impossível.

Em frente à Starbucks, empurro a porta dupla e entro no estabelecimento.


Pego a senha, sento-me na poltrona e aguardo a enorme fila para fazer meu
pedido. A todo instante pessoas entram e saem com seus copos em mãos e
sorrisos nos lábios. Café quentinho pela manhã pode mudar o dia de qualquer
pessoa.

De repente sinto meus cabelos da nuca se arrepiarem. É como se alguém


estivesse me observando. Já tive essa mesma sensação alguns dias atrás.
Disfarçadamente olho de um lado para outro, mas não vejo ninguém ou nada
suspeito. Minhas mãos ficam trêmulas. Sinto uma pressão no meu estômago
que se torna uma dor aguda levando embora o ar dos pulmões. Respiro fundo
contando até três.

— Agora, não, por favor — sussurro baixo.

O primeiro ano da minha nova vida foi caótico e assustador. Pesadelos,


tremores, terror noturno e crises de pânico. Muitas e muitas vezes, acordei
durante à noite gritando e chorando. Após meses de sessões de terapia e
medicamentos apropriados, consegui controlar esse pânico que tomava conta
do meu corpo. Por mais hipotética que seja a ideia de Spencer estar vivo e
disposto a me perseguir, me faz perder o controle das minhas emoções.

Fecho os olhos por alguns segundos tentando me concentrar e abafar


qualquer pensamento negativo que estaria me impedindo de controlar essa
crise. Ouço longe uma voz feminina chamando o número da senha que estou
segurando. Reúno toda a força possível e sigo em direção ao balcão. Engulo
em seco encarando a atendente. Faço o pedido, e puxo as notas de dinheiro
do bolso da calça. Pago-a e vou para o lado aguardar a entrega. Deslizo as
mãos pelo rosto descendo até o pescoço. Meus batimentos cardíacos estão tão
acelerados que sinto as veias pulsando sobre a minha pele.
Ergo a cabeça e vejo através do espelho no teto um homem com boné
logo atrás de mim. Sua cabeça está baixa, e seu rosto escondido pela aba.
Semicerro os olhos encarando-o. O queixo quadrado com essa covinha no
meio me parece familiar. Viro-me lentamente para ficar de frente. Mas como
se percebesse meus movimentos o homem se vira também.

Avanço dois passos pequenos em sua direção. Preciso ver seu rosto, não é
possível que seja ele, não pode ser ele. Antes que alcance o homem, sou
chamada pela balconista com os copos. Desisto por um momento, pego o
pedido, e quando procuro dentro da cafeteria não o encontro.

Alucinações? Estou com tanto medo, que estou alucinando?

Saio da Starbucks e vou andando para casa.

A cada passo que dou na calçada, ouço o som de outra pessoa ritmando
com o meu. Paro e viro para trás e não vejo ninguém. Balanço a cabeça,
rindo. Maluca.

— Se controla Camilly — repito para mim mesma.

Continuo andando, e o barulho ainda permanece. Faço mais uma tentativa


e paro de andar, e novamente o som some. Droga estou sendo seguida e para
piorar o celular ficou em casa. Não posso nem ao menos pedir ajuda.

Não sou o homem aranha, mas meu sensor de perigo está gritando alto
dentro da minha cabeça e faço a única coisa que posso. Abandono os copos
deixando cair no chão, e começo correr desesperadamente. Flashs de todas as
vezes que fugi correndo daquele cretino surgem diante dos meus olhos. É
como se tivesse de volta no passado. Sua voz gritando meu nome, enquanto
tentativa fugir pelas ruas.

Nada, não vejo nada que está na minha frente atravessando ruas com
carros em movimentos, esbarrando nas pessoas. Só quero fugir, me esconder.
Buzinas, gritos de maluca, nada disso é capaz de me fazer parar.

Desesperada, e cega, esbarro em um algo duro e sólido que quase me


derruba no chão senão fosse por braços fortes rodeando minha cintura.
Permito-me parar a louca e desenfreada tentativa de fugir. Ergo os olhos e
sou surpreendida ao me encontrar envolvida pelo professor Luca.

Ofegante, respiro fundo.

— Luca?

— Você está bem? Aconteceu alguma coisa? — questiona com expressão


de assustado estampado no rosto.

— Eu... Eu... — Minhas pernas fraquejam assim como todo o resto,


levando a mais plena escuridão.

Abro os olhos lentamente, e sinto fisgadas na cabeça. Sento, e olho ao


redor.

— Onde estou? — Levanto, desconfiada.

— Você acordou, se sente melhor?

Giro a cabeça em direção da voz, e vejo Luca com uma bandeja nas
mãos.

Professor?

— Onde estou? Como vim parar aqui? — questiono, recuando alguns


passos.

— Oh sim. Esbarrou comigo na rua e parecia não estar bem, tanto que
desmaiou. Não sabia o que fazer, então, a trouxe para minha casa. Trouxe
suco para você. — Deposita a bandeja em cima da cama.

— Há quanto tempo estou aqui?

— Algumas horas. Como estava sem celular, não sabia se tinha alguém
para ligar. Desculpe.
Camilly ele é um homem de bem. Seu professor e sempre foi gentil e
solicito com você. Só quis ajudar, ingrata. Sorrindo me aproximo de onde
deixou o copo e o pego. Bebo um gole do suco de laranja para me acalmar.
Respondo suas perguntas de forma simples e prática sem dar detalhes.

Ando pelo quarto para manter certa distância, já que o senhor delegado
irá surtar quando souber onde estou. Faço perguntas para engrenar a
conversa. No canto do quarto noto uma prateleira com muitas molduras de
fotos, me aproximo.

Fotos da faculdade, supostamente amigos, praticando esportes, mais uma


em especial chama minha atenção. Duas crianças brincando na piscina e uma
grande casa no fundo.

— É você? — aponto para os garotos.

— Sim, e meu meio irmão — responde com tom de voz diferente.

— Irmão? Pensei que fosse filho único, quer dizer, na faculdade sempre
falaram isso. Sabe fofocas.

— Sei. Sou irmão por parte de pai. Digamos que sou o bastardo da
família.

— Sério? Achei que só existisse isso em novelas. — Não consigo conter


a risada.

— A vida imitando a arte. O contato com a família do meu pai sempre foi
o mínimo. Sua esposa não me aceita, mas a única coisa boa de tudo isso é que
meu irmão sempre me apoiou.

— Hum. E olhando bem, vocês até se parecem um pouco.

— Você acha, Camilly?

— Acho sim. — Seus olhos azuis me encaram com profundidade me


causando calafrios. — É então, tenho que ir embora, uma pessoa está me
esperando. Obrigada por tudo, você está se tornando meu salvador, sempre
aparece nas horas difíceis.
— Sempre estou por perto. — Sorri para mim.

— Sim — respondo desconfortável.

Despeço-me, saindo de sua casa, porém aquela foto ficou cravada na


minha memória. Duas crianças brincando, por que tenho a impressão de que
os conheço?
Desperto sentindo o espaço vazio ao meu lado na cama. Ergo a cabeça
vasculhando ao redor e atento a qualquer ruído. E para minha surpresa o
apartamento se encontra no mais pleno silêncio. Coço o queixo sentindo a
barba arranhar as pontas dos dedos. Sei que Camilly tem o hábito de correr
todas as manhãs. Sonolento, alongo o corpo esticando todos os músculos e
esbarro a mão no bilhete de cima do criado mudo. O pego e leio, então,
levanto e vou direto para o banheiro.

Embaixo do chuveiro fecho os olhos deixando a água limpar a pele e


junto à alma. Desde que estou namorando minha marrenta, não fui mais
visitar o túmulo de Sheron. No fundo sei que ainda tenho receio, e sinto como
se estivesse traindo-a. Muitos anos preso em um luto, talvez essa sensação
seja só resquícios da dor que enfrentei no passado. Sua morte ainda é como
um espinho cravado no meu coração pode cicatrizar mais nunca sumir por
completo.

Termino o banho rapidamente. Paro em frente a pia do banheiro e encaro


meu reflexo no espelho.

— Qual é Brian? Você nunca foi de fugir das coisas — digo para a
imagem do homem refletida.
Desisto de fazer a barba, enrolo a toalha na cintura e retorno para o
quarto. Abro a porta do armário onde já guardo algumas peças de roupa e
coloco uma calça jeans e uma camisa. Confiro o relógio de parede. Cami está
demorando mais que o normal, a fila para o café deve estar imensa.

Inquieto ando de um lado para outro. Decido fazer algo importante antes
de tomar o café. Encaixo o coldre com minha arma, o distintivo e chave do
carro. Saio rapidamente do apartamento. Desço até a garagem. Dentro do
carro dirijo pelas ruas indo em direção ao cemitério. Não demoro muito para
estacionar em frente à floricultura. Compro um buquê das flores favoritas de
Sheron. Com passos lentos entro naquele lugar de silêncio e paz, mas
também muita dor e saudade para quem ficou. Minhas pernas pesam
toneladas, e me obrigo arrastá-las até o local onde a minha falecida esposa
está enterrada.

Em frente a sua lápide, leio seu nome e a mensagem descrita. Sinto meus
olhos encherem d’água. Abaixo e coloco o buquê em cima do gramado.
Fecho os olhos, respirando fundo e faço algo que já devia ter feito a muito
tempo. Confesso para Sheron meus sentimentos por Camilly e o desejo de
construir uma família ao lado daquela mulher louca. Ajoelho e imploro por
seu perdão. Permaneço com os olhos fechados e perdidos em pensamentos
até que o celular vibra no bolso da calça e me traz a lucidez novamente.

Limpo a garganta e puxo o celular do bolso. O nome do detetive Parker


salta na tela.

— Brian — respondo a ligação.

Ouço atentamente os detalhes do resultado que chegou do laboratório


sobre a nova fórmula que estão comercializando na escola.

— Estou indo agora para a delegacia. Ok. — Encerro a chamada.

Antes de entrar no carro, digito uma mensagem para Camilly informando


que estou indo para o trabalho e peço desculpas antecipadamente por não
esperar por ela. Tenho certeza de que isso irá me custar alguns dias sem sexo.
Aquela demônia de saia sabe como me castigar direitinho. Sorrio com a ideia
do castigo. Maluca que conseguiu me trazer de volta a vida.
Juntamente com Parker e mais alguns detetives de outros departamentos,
analisamos minuciosamente um plano de abordagem e os componentes dessa
nova droga e os possíveis efeitos colaterais aos jovens que consumirem em
grande quantidade. Distraído na sala de reunião, esqueço o celular na sala,
dentro da gaveta.

Batidas na porta chama nossa atenção. Peço que entre, e a policial


Catarine surge com o telefone nas mãos.

— Delegado é uma ligação para o senhor. Ethan, e disse ser importante.

Ao escutar seu nome sinto um calafrio percorrendo meu corpo junto com
o nome de Camilly que surge imediatamente em meus pensamentos. Pego o
aparelho e atendo imediatamente.

— O que foi Ethan? Ela está bem? — questiono.

— Cara você é o pior amigo do mundo, só eu que ligo. Estamos em uma


relação unilateral, isso me magoa.

— Fala logo porra, não estou para brincadeira.

— Calma aí delegado, respira. Seguinte, as câmeras captaram sua


namorada saindo de manhã como todos os dias, mas isso já faz quatro horas e
ainda não voltou para o apartamento. Achei estranho, pode não ser nada, mas
achei melhor alertá-lo.

— PORRA — berro e soco a mesa, atraindo olhares curiosos. — Estou


indo para casa, fique atento a qualquer movimento suspeito.

Sem pensar duas vezes, deixo tudo e todos para trás. Semáforos
vermelhos, pare, nada conseguiria me deter. No percurso da delegacia até o
apartamento só consigo imaginar que algo ruim aconteceu. É como se a
história estivesse se repetindo. Não posso perder Camilly.

Estaciono o carro de qualquer jeito, abro a porta e desço correndo até a


entrada do prédio. Em frente ao elevador vejo seu pequeno corpo.
Impulsivamente a abraço por trás puxando-a para dentro dos meus braços. A
fragrância do seu shampoo invade minhas narinas me embriagando e
causando alívio.

— Brian? Você me assustou. — Ela tenta se afastar, mas a abraço mais


apertado.

— Por favor, só fica aqui.

Preciso de mais alguns minutos para me recuperar do susto e me livrar da


culpa que estou sentindo. Como pude ser tão omisso quanto a sua segurança
quando tem um desgraçado perseguindo-a.

— Brian, por favor, me solta. — Remexendo-se afrouxo os braços


deixando que saia.

Limpo a garganta, recuperando o fôlego. Engulo em seco enquanto


analiso sua expressão abatida e cansada. E por que está chegando à casa
somente agora? O que aconteceu para deixá-la desse jeito.

— Onde você estava? — questiono diretamente.

— O quê? — rebate a pergunta.

— Quanto tempo você correu? Por que está chegando só agora, Camilly?

— Quem deveria fazer as perguntas sou eu, não concorda? — Seus olhos
castanhos me encaram ferozmente.

— Não tente desviar da pergunta. Quatro horas correndo por aí,


aconteceu alguma coisa? Por que não me ligou? — Não consigo ser imparcial
quando se trata da segurança da mulher que amo.

— Porque não nasci colada a você. Sou adulta e sei cuidar de mim mesma
— responde rudemente, o que só confirma minhas suspeitas. Ela está
escondendo o que realmente aconteceu.

A porta do elevador se abre, e entramos. O clima dentro daquele espaço


pequeno é tenso e angustiante. Avanço alguns passos em sua direção, mas ela
recua se afastando ainda mais. Com os braços cruzados sobre o abdômen,
Cami encara o chão.

Não demora em chegarmos no nosso andar, como se precisasse fugir da


minha presença, ela salta do elevador a passos rápidos. Não perco tempo para
acompanhá-la, mas esbarro em um corpo paralisado encarando a parede
escrita com letras em vermelho.

“VOCÊ VAI MORRER. NÃO TEM COMO FUGIR”.

Entro na sua frente cobrindo a visão de tais palavras. Puxo seu corpo para
junto do meu.

— Não leia, vai ficar tudo bem — digo afagando sua cabeça.

— O que é isso? — questiona com a voz chorosa e abafada por lágrimas.


— Por quê? Por que Brian?

Sinto seu corpo amolecer e desabar diante dos meus olhos. Seguro-a nos
braços e a suspendo a pegando no colo.

— Camilly? Camilly? — chamo, encarando a palidez de sua pele.

Chuto a porta do apartamento com força até se abrir. Entro desesperado e


deito o corpo desacordado dela no sofá. Sento ao seu lado chamando seu
nome várias vezes. Assustado e sem saber o que fazer para acordá-la, pego o
celular e ligo para um amigo médico pedindo ajuda.

Sigo as orientações de como proceder sem casos de emergência, enquanto


aguardo sua chegada.

— Acorda amor, por favor — suplico ajoelhado ao seu lado.

Entrelaço nossos dedos, segurando suas mãos frias.


Abro os olhos ainda sonolentos. Ergo a cabeça olhando ao redor,
desnorteada na escuridão. Sinto algo segurando minha mão, e logo percebo
que é a mão de Brian entrelaçada. Uma pontada aguda na cabeça me faz
vacilar e deitar novamente. Suspiro baixo sentindo a dor latejante e flashs de
memória invadem meus pensamentos. A parede tingida em vermelho, o
homem na cafeteria me perseguindo. Se antes existiam quaisquer dúvidas de
que Spencer poderia estar vivo, agora, já não tenho mais. Quem mais iria me
perseguir e transformar minha vida em um inferno? Mas porque depois de
todos esses anos? Por que só agora?

— Brian? — chamo seu nome puxando a mão levemente.

Mas, não tenho resposta, só o ressonar da sua respiração. Desisto de


acordá-lo, e rolo para o lado na cama, escorregando sorrateiramente para fora
da cama. Ando nas pontas dos pés para não fazer barulho e com dificuldade
no escuro encontro a porta. Deslizando através da parede encontro o
interruptor, acendo a luz que ilumina o apartamento. Fico surpresa ao
encontrar em cima da mesa vários medicamentos. Tenho vagas lembranças
de alguém me medicando. Então, não foi um sonho.
Balanço a cabeça negativamente e o gosto amargo daquelas palavras
descem por minha garganta me fazendo engolir em seco.

Achei que nunca mais iria precisar de ajuda, mas estava enganada. Não
sou mais a Cindy Foster. Aquela mulher lamentável, medrosa e que não tinha
uma única nota de dólar na carteira. Dois podem jogar esse jogo Spencer, se
prepare.

Pego o celular, e digito um número de telefone. A cada toque me sinto


mais e mais ansiosa.

— Olá, sou eu. Sim, faz muito tempo. Não achei que viria usar seus
serviços novamente. É eu sei. — Mordo os lábios sorrindo da piada feita do
outro lado da linha. — Não, não senti sua falta. Claro que não, sempre fomos
amigos. Então, sem gracinhas. Preciso de ajuda, pode me ajudar, por favor?
— Mudo o tom de voz o deixando sensual. — Ok. Somente um café. Preciso
que investigue uma pessoa para mim, encontre tudo desde o nascimento até
agora. Luca Ricci. Advogado e professor de faculdade. Não demora —
agradeço e encerro a chamada.

Sinto muito, meu delegado mais tenho meus próprios meios, a polícia não
me protegeu anos atrás, quem garante que será diferente dessa vez. E se o
falecido resolveu brincar de zumbi e levantar do túmulo, irei mandá-lo de
volta para o inferno.

— Com quem você estava falando? — A voz de Brian surge por trás do
meu corpo.

Giro lentamente pensando qual seria a desculpa que iria dar para fugir do
seu interrogatório. Mas, sou pega de surpresa com um homem sexy, só de
cueca, encostado no batente com os braços cruzados. Boquiaberta encaro
aquela visão deliciosa. Deslizo a língua por entre os lábios umedecendo-os.

Como se fosse uma leoa selvagem pronta para pular em cima de sua
presa, ando em sua direção sensualmente. O que pode ser melhor para distrair
um homem do que sexo. Ainda mais um como Brian Garcia, totalmente viril
e insaciável.
— Não era ninguém. — Aproximo-me e fico nas pontas dos pés, e
sussurro no seu ouvido. Mordo sua orelha devagar.

— Camilly... Camilly... — ofega fungando. — Isso é uma tentativa de


desviar o foco?

— Não, isso é desejo. — Deslizo as mãos por seu peito nu descendo até a
barriga.

Seu corpo estremece em contato com meu toque. Aproveito a


oportunidade de distração para me divertir e esquecer os problemas pelo
menos por alguns momentos.

Deslizo os lábios lambendo seu pescoço juntamente com as mãos que


alcançam o elástico da cueca. Puxo-o para baixo expondo seu pau duro.
Sorrindo maliciosamente, o seguro entre as palmas da mão apertando firme.
Faço movimentos acariciando a cabeça com as pontas dos dedos, a cada
investida sua respiração fica mais ofegante e irregular. Minha boca e mãos
aproveitam cada centímetro daquele corpo musculoso.

Com um movimento rápido, Brian segura minha cintura girando meu


corpo me colocando de rosto contra a parede. Mordo os lábios em
antecipação.

— Safada. Quer enganar seu homem com sexo? — ronrona contra minha
nuca, enrolando os dedos no meu cabelo.

— Funcionou? — resmungo.

— Sempre funciona. — Puxa minha cabeça para trás causando uma


prazerosa dor.

Maliciosamente, esfrego o quadril contra o seu, e posso sentir o quanto


está duro. Espalmando uma mão contra minha barriga me puxa para mais
perto. Sua boca desliza pelo meu ombro. A barba por fazer arranha minha
pele causando arrepios me fazendo estremecer. Com a outra mão sobe por
minha coxa erguendo a barra da camisola até chegar à calcinha puxando para
baixo. Seus dedos tocam meu clitóris. Gemendo, ofego me contorcendo.
— Brian... Brian... — sussurro.

Seus joelhos afastam minhas pernas, dando-lhe espaço e acesso ao meu


centro úmido. Empino ainda mais a bunda e com uma única investida seu pau
grosso e duro invade minha boceta, me preenchendo por completo. Ergo uma
perna, e logo sua mão agarra minha coxa mantendo-a no lugar firmemente.
Fecho os olhos sentindo seu pau entrando e saindo, entrando e saindo, cada
vez mais forte e rude, me enlouquecendo. Pressionada entre a parede e seu
corpo, me sinto protegida. Tento movimentar o quadril mais é impossível
acompanhar as investidas. Cada vez mais rápido, duro, forte, estocando
várias vezes na minha boceta. Sinto contrações e não resisto. Gozo
deliciosamente. Não demora e sinto o líquido quente escorrendo, indicando
que ele também atingiu o orgasmo. Apoiando sua testa nas minhas costas, ele
sussurra algumas palavras que não consigo entender.

— Banho? — questiono.

— Segunda rodada, depois banho.

Sorrindo, sou suspensa e carregada no colo por fortes braços até o


banheiro.

Sentada na cama observo os movimentos de Brian enquanto se veste para


ir até a delegacia. Após discutirmos por horas, ele concordou em ir trabalhar
e me deixar em casa, mas sob a condição de manter porta trancada e não sair
sozinha em hipótese alguma e qualquer movimento suspeito entrar em
contato. E claro como preciso que ele saía de casa, acabei concordando com
suas regras absurdas. Desde quando não posso sair? Essa fase de ser submissa
já acabou há muito tempo. Suas justificativas são viáveis, mas não posso
simplesmente ficar sentada esperando Spencer bater na minha porta
novamente.

Despedimo-nos, e assim que ouço o som da porta se fechando. Pego o


celular conferindo se chegaram mensagens.
Capitão T já foi mais rápido. Quanto tempo é preciso para investigar a
vida de um simples professor, ou talvez não seja tão simples assim. Entediada
preparo uma refeição.
Involuntariamente meus olhos conferem a cada minuto no relógio, tenho
a sensação de estar enlouquecendo. Não posso perder o controle novamente,
isso pode custar a minha vida.

Sento no sofá com o prato em mãos, quando o celular começa vibrar.


Levanto rapidamente abandonando tudo para atender à ligação. E como
esperado o nome CAPITÃO T salta na tela.

— Fala. Não posso sair por enquanto. Sério? Ok. Ok. Aonde nos
encontramos? Combinado em uma hora estarei lá. Acho bom não se atrasar.
Mentira, você sempre se atrasou. Tchau. — Encerro a chamada.

Escolho a roupa para o encontro e em minutos estou pronta. Encaro-me


no espelho mais uma vez ajeitando o vestido. Faz alguns anos que não o
encontro pessoalmente, mas sempre mantivemos contato através de
mensagens e ligações.

Jhon Halls. Filho do melhor amigo da minha querida Josefy. Por ser uma
senhora sozinha e com uma grande fortuna, ela sempre manteve conexões
com vários tipos de pessoas para garantir sua segurança. Jhon, criou uma
nova identidade para mim junto de um passado com histórico confirmado. Se
você quer algo impossível, peça ao Capitão T.

Abro a porta olhando para todos os lados antes de sair do apartamento.


Acelero os passos até o elevador, para minha sorte não demora em que ele
pare no meu andar. Desço até a garagem, e cautelosamente entro no carro.
Acelero, e sigo em direção do endereço.

Vinte minutos depois, estou estacionando em frente ao pub. Lugar


distante do centro, discreto, próprio para deixar os clientes à vontade.
Empurro a porta e o ouço o som do sino tocando. Ergo a cabeça procurando-
o.

— Olá senhorita. — Uma voz sussurra perto da minha orelha.


Sorrindo, viro rapidamente. E como sempre, sua expressão maliciosa
ainda está lá. Talvez faça parte do seu charme de mercenário.

— Como vai Capitão T. — Estendo a mão para cumprimentá-lo.

Segura minha mão e a ergue até os lábios e a beija suavemente.


Galanteador, bonito, educado, interessante, muitas qualidades para fazer
qualquer mulher se apaixonar.
Sentado na sala de reuniões junto com os outros investigadores
debatemos estratégias de abordagem e chegamos à possibilidade de infiltrar
alguém aos arredores das escolas para capturarmos o vendedor. Sinto o
celular vibrando no bolso da calça e sem hesitar atendo a ligação. A voz de
Ethan do outro da linha acelera os batimentos do meu coração fazendo minha
se arrepiar. Impaciente, levanto rapidamente.

Ouço que Camilly saiu de casa aproximadamente há uma hora. Andando


de um lado a outro na sala e sentindo o ar faltar em meus pulmões, tento
raciocinar aonde ela poderia ter ido após prometer que não sairia de casa.

Como pode ser tão imprudente? O que está passando naquela cabeça
teimosa e sem responsabilidade. Está mais que provado que aquele maníaco
retornou das profundezas do inferno, e ela quer ficar andando por aí como se
nada estivesse acontecendo, é isso mesmo? Serei obrigado mantê-la em uma
cela?

— Não queria chegar a esse ponto, mas não tenho escolha. Ative o
rastreador do carro dela, e me mande à localização — peço ao nerd do FBI.
— Sim, tenho certeza. Ela é a única culpada em mentir para mim. Ok. Estou
esperando.
Peço um momento aos meus companheiros de investigação, e sigo para a
cozinha. Encho um copo com água e sorvo em grandes goles, enquanto
respiro fundo. Recuperar a paz depois dessa ligação é quase impossível.

— PORRA! — Soco a pequena mesa, causando ruídos estrondeantes.

— Está tudo bem? — Parker surge na porta com a expressão de


assustado.

— Sim. Vamos terminar nossa reunião — respondo friamente.

Todos notam minha falta de concentração, e assim finalizamos a reunião


o quanto antes. Agradeço silenciosamente a compreensão dos parceiros, já
que só consigo pensar o que vou fazer com aquela demônia de saia. Espero
que ela tenha um bom motivo.

Ansioso, nervoso e impaciente aguardo à ligação daquele maluco com a


localização. Meus olhos, se mantém fixo no relógio de parede contando cada
segundo. Cada minuto que se passa sem ter quaisquer informações é
angustiante, mas para minha sorte Ethan é rápido, eficiente. Ouço o celular
vibrando em cima da mesa, atendo à ligação no primeiro toque, e do outro
lado da linha posso sentir o sarcasmo engraçado na voz do nerd ao perceber
que estou desesperado. Anoto o endereço, e desligo tão rápido quanto atendi
a chamada. Encaixo a arma no coldre, junto com celular e pego o distintivo.
Atravesso a porta dupla da delegacia rapidamente indo em direção ao carro.
Em fração de segundos estou dirigindo em direção ao pub.

O que diabos ela foi fazer em um lugar como esse?

— Camilly... Camilly... Está brincando com fogo — resmungo sozinho.

Conforme me aproximo do endereço posso ver seu carro estacionado.


Mas o que detém minha atenção não é exatamente o carro. Enquanto procuro
lugar para estacionar noto um homem usando roupas pretas e boné cobrindo
o rosto encostado no prédio do outro lado da rua encarando diretamente o
pequeno restaurante. Impaciente para verificar de perto, estaciono de
qualquer jeito alguns quarteirões antes. Desço batendo a porta e acelero os
passos em direção ao possível suspeito, porém ao notar minha presença, ele
disfarça enfiando as mãos no bolso e segue em direção contrária.

Por um momento pondero correr atrás dele, mas sob qual afirmação iria
persegui-lo?

Sou obrigado deixá-lo ele ir embora. Agora, tenho um assunto mais


importante.

Subo os degraus da varanda do tal pub. Através do vidro da entrada


consigo ver as mesas com seus clientes, e mais à frente Camilly e um
homem. Fecho as mãos em punho sentindo o sangue ferver agitado nas veias.
Respiro fundo tentando me acalmar, mas é inútil. Empurro a porta com força
tocando o sino e atraindo olhares curiosos. Marcho em direção ao casal que
conversa animadamente. A cada passo tenho pensamentos sangrentos de
como mataria aquele desgraçado que ousa sorrir descaradamente para minha
mulher. Encosto ao lado de Camilly e cruzo os braços sobre o abdômen.

Seus olhos arregalados e a expressão de surpresa no rosto deixa evidente


que ela pretendia não me contar o que está fazendo aqui, e com outro homem.

— O que você está fazendo aqui? E quem é esse? — questiono com a voz
fria e cortante como navalha.

— Brian... É... — Ela se engasga nas palavras, o que me faz fungar alto.

— Jhon, sou Jhon amigo dela, e você? — O filho da mãe estende a mão
para me cumprimentar como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Espera. Quer dizer que ela não contou que tem namorado? Isso é um
encontro amoroso?

— Delegado Brian Garcia, namorado dela. — Aceito seu cumprimento e


aperto com força sua mão.

— Oh. Quer dizer que alguém conseguiu domar a fera. E é delegado,


Cami? — questiona sorrindo em direção a ela.

Pensamentos homicidas invadem minha cabeça. Meios de arrancar aquele


sorriso sacana do rosto desse safado. Ou até mesmo esses olhos maliciosos.
Controle-se, Brian. Espero uma resposta por parte da diaba, mas não vem.
Muda, permanece em silêncio assim como bandido pego no flagra.

Descaradamente, puxo uma cadeira e me sento. Revezo olhares entre eles,


mas o clima tenso se instalou provocando repentino silêncio. Para quem
estava sorrindo e flertando até alguns minutos atrás, calou-se muito rápido.

— Sim, sou delegado. Algum problema com isso Jhon?

— Não, claro que não. Só fui pego de surpresa — responde enquanto leva
a xícara de café à boca.

— Surpresa? Entendi — resmungo.

— Brian, ele é um amigo antigo. E sabe sobre mim, pedi sua ajuda por
isso veio ao meu encontro. É só isso. — Camilly invade a conversa
justificando seu ato.

— Ajuda? — retruco. — Ajuda com o quê?

— É só que... — Interrompo-a antes de concluir a frase.

— Tudo bem, entendi. Novamente você não confia em mim.

— Delegado calma aí. Não precisa ser tão duro com nossa Cami. — Jhon
interrompe.

O que? NOSSA? Eu ouvi direito, ele disse NOSSA?

— Nossa? — repito resmungando.

— É, sabe, nossa. — Sinto que está debochando da situação, desgraçado.

Levanto rapidamente afastando a cadeira para trás. Impulsivamente vou


em sua direção e o seguro pela gola da camisa puxando seu corpo para perto.
Encaro dentro dos seus olhos. Semicerro os olhos trincando o maxilar. Não
ouço nada, só meu sangue bombeando rápido. Quero ensinar uma lição para
esse cretino. Seus lábios se movimentam, mas ignoro completamente
qualquer coisa que saia da sua boca.
Camilly me puxa pelo braço em uma tentativa inútil de nos afastar.

— Brian, solta ele. Brian, por favor. Brian. — Repete meu nome várias
vezes.

Em um momento de lucidez, observo em volta e vejo como as pessoas


nos encaram assustadas. Nunca fui o monstro, sempre sou aquele que ajudo
as pessoas. Então, solto sua gola empurrando-o de volta para a cadeira. Lanço
último olhar na direção da mulher que amo, e antes que possa ser impedido
saio apressadamente do pub.

Pisando duro, caminho até onde estacionei o carro. Desativo o alarme e


sento atrás do volante. Encosto a cabeça no assento com os olhos fechados.
Não posso ficar perto dela nesse momento com a cabeça quente. Poderia falar
coisas das quais iria me arrepender depois. Ofegante, pego o celular e digito o
número de Ethan.

— Preciso das filmagens de segurança do pub. Sim, aquele lugar. Não,


não quero falar o que ela estava fazendo lá — ele me interroga curioso como
sempre. — Quer morrer? Então, só faz seu serviço. Okay.

Posso estar sendo neurótico, mas algo me diz que aquele homem estava
vigiando o casal maravilha, mais especificamente a Camilly. Spencer seria
tão descuidado a ponto de se aproximar de tal forma? Talvez. Esperou tantos
anos para se vingar, achei que seria mais frio e calculista, ou estou errado?
Acho que preciso de uns dias de férias. Viajar alguns dias, conhecer pessoas.
Fazer novos amigos. Envio uma mensagem no grupo de investigadores da
delegacia.

“Estarei fora por dois dias, quaisquer ocorrências de emergência peço


que as encaminhe ao detetive Parker. Celular ligado.”

Só preciso pegar em casa meu passaporte, algumas peças de roupas, e


dinheiro. Estou me sentindo como um novato indo em busca da sua primeira
cena de crime.

Se Spencer pode invadir nosso espaço, também posso invadir o dele.


Cabisbaixa não tenho coragem suficiente para erguer a cabeça ou até
mesmo ir atrás de Brian. Seria hipocrisia da minha parte dizer que não
entendo sua atitude. Mas, infelizmente não posso ficar sentada em casa,
esperando que ele resolva todos os meus problemas. Posso ajudar e irei fazer
isso mesmo que meu coração esteja sangrando por dentro, por tê-lo
desapontado.

Sorrindo como se nada tivesse acontecido, Jhon aponta para a cadeira


indicando que eu sente novamente. Envergonhada com os olhares em nossa
direção cogito a hipótese de ir embora. Preciso saber mais sobre o professor,
posso estar sendo paranoica, mas não sei, tenho uma sensação estranha em
relação a ele. Respiro fundo, engulo em seco, ajeito a cadeira e me sento.

Capitão T empurra por cima da mesa o envelope branco. Percorro os


olhos ao redor do pub e puxo o envelope para minhas mãos abrindo-o.
Atentamente leio as informações e como suspeitava é tudo muito vago e
inconsistente. Sem histórico escolar, dados familiares, namoradas, nada. Seu
passado é como um livro com páginas em branco. É como se Luca começasse
viver após seus vintes anos, logo após entrar na faculdade.

— Só isso? — questiono irritada. — Você já foi mais eficiente, sabia? —


provoco-o.

— Ei. Não tenho culpa se o homem é um fantasma. E por que não contou
para sua família que estava namorando?

— Você não é minha família, eu hein?! — Balanço o envelope no ar, e


vejo quando duas fotos caem no chão.

— Magoado. — Jhon leva as mãos até o coração.

Reviro os olhos e abaixo para pegar as fotos. E para minha surpresa uma
delas é a mesma que estava na estante de Luca. Encaro-a. Tenho certeza de
que conheço, já vi essa criança em algum lugar.

— Ah essa informação não está no relatório. São irmãos que se


reencontraram depois de adultos, separados por herança. E eu achando que só
acontecia em drama mexicano essas coisas.
A segunda foto revela dois homens usando bonés e roupas idênticas,
enquanto conversam em um local afastado. Pressiono os olhos para
aproximar ainda mais a imagem e imediatamente reconheço um deles.
Surpresa sinto minhas mãos ficarem trêmulas, e o ar fugir dos pulmões.

— Esse homem... Ele... Ele... — É como se as palavras estivessem presas


na garganta.

— Você o conhece? — Jhon questiona.

— Ele estava me vigiando na cafeteria esses dias, quer dizer, acho que é
ele. Esse boné, o queixo. Só pode ser ele.

— Então, quer dizer que o seu professor está lhe vigiando? Será que ele
sabe de algo? Camilly tem algo muito errado nisso, deveria tomar cuidado.

Diz o ditado que quem está na chuva é para ser molhar, certo? Decido
contar para o capitão tudo que está acontecendo. Desde a mensagem para
Brian quanto até a pichação do prédio e as flores. Ouço sua teoria e conselhos
sobre como devo agir, e incrivelmente Jhon apoia o delegado sobre me
manter em cárcere privado. Continuamos conversando por mais meia hora.
Dentro do carro aceno com a mão me despedindo do capitão, já que ele fez
questão de me acompanhar.

Abro a porta do apartamento. Vazio e silencioso, o que indica que meu


delegado não voltou para casa depois do ocorrido. Entro, e tranco a porta
rapidamente. Vasculho todos os cômodos confirmando que não tem nenhum
invasor, só então, relaxo sentando no sofá. Disco o número do celular de
Brian várias vezes inutilmente.

— Brian vai me ignorar, seu ogro — resmungo alto.

Quer saber, não fiz nada de errado. Não é como se fosse um encontro
amoroso. E ele nem pode reclamar já que sempre está se lamentando em cima
do túmulo da falecida. Sei muito bem que sempre que visita o túmulo da
falecida volta se sentindo culpado, como se namorar comigo fosse errado.
Pois bem, se quiser que me procure. Minha fase de implorar para um homem
ficou no passado. Ando pelo apartamento tirando a roupa. Aproveito a
oportunidade de estar sozinha e tomo um banho longo e demorado.

Enrolo a toalha na cabeça e outra no corpo, então, tenho uma ideia. Deito
na cama inalando a fragrância do lençol, e faço uma ligação.

— Boa tarde, Antony. Sim. Preciso que faça algo por mim. Sim, sim.
Quero que contrate alguém para seguir vinte e quatro horas uma pessoa. Não,
não estou envolvida em problemas, bom, por enquanto. — Ouço o som da
sua risada nervosa. — Obrigada. Vou enviar os dados por mensagem e assim
que conseguir o investigador me comunique. Ok. — Encerro a chamada.

Luca, Luca. Por que está me seguindo? O que quer de mim? E a pergunta
mais importante. Quem é você?

Exausta tanto fisicamente quanto psicologicamente, rolo para o lado na


cama e não demoro a adormecer. Sonolenta, abro os olhos no cômodo escuro.
Já anoiteceu. Levanto procurando o interruptor acendendo as luzes. Por que
Brian não chegou ainda? Infantil. Provavelmente irá ficar de plantão na
delegacia me deixando sozinha como punição. Dou de ombros, e pego alguns
ingredientes na geladeira para preparar uma refeição.

Não consigo conter a frustração de estar sendo ignorada e tento ligar para
seu celular e novamente cai direto na caixa postal o que me deixa ainda mais
irritada. Ah mais quem ele pensa que é para fazer isso? Procuro na agenda o
número da recepção do distrito, e faço a ligação.

Ao terceiro toque, ouço a voz feminina.


— Catarine, certo? Sou Camilly a namorada do delegado Brian. Oh sim,
estou bem. Posso falar com Brian, por favor. O QUÊ? — Elevo o tom de voz
com sua resposta. — Acho que está enganada, ele não me disse nada sobre
isso. Como foi viajar. Ah compreendo, obrigada.

— DESGRAÇADO — grito ao finalizar a chamada. — Cretino, vou


matar você seu ogro. Ahhhhhhh como viaja sem me falar nada.

Esbravejo andando de um lado para o outro. Ergo o cabelo em um coque,


abano meu rosto com o guardanapo que está queimando em brasas. Se eu
pudesse por minhas mãos naquele cretino, arrancaria sua pele lentamente e
jogaria álcool por cima. Que atitude infantil, imatura. Só porque estava em
um local público com Jhon? Precisava mesmo Brian Garcia?

Termino de preparar a comida, mas sinto o sabor amargo da saliva ao


engolir. Ah ele vai ter o que merece quando retornar. Isso não vai ficar assim.
Lavo a louça, mas não consigo parar de pensar em meios de matá-lo. Meu
celular vibra com a chegada de uma mensagem, corro até ele esperando ser
do delegado, e o nome Antony aparece como prévia na tela.

Leio a mensagem contendo os dados do investigador que a partir de agora


será a sombra do professor Luca.

Dizem que você atrai aquilo em que está em seus pensamentos, ou seria
falando do diabo aparece o rabo. Sou surpreendida ao chegar outra
mensagem, mas o que chama minha atenção é quem a enviou.

“Luca Ricci”
“Olá, tudo bem? Gostaria de sair para tomar uma bebida?”

Bebida? Claro, vou sair beber com um possível psicopata perseguidor.


Sinto muito professor, mas não.

Respondo cordialmente para não levantar quaisquer suspeitas.

“Oi, sim e você? Infelizmente, hoje, não posso. Tenho compromisso


importante. Agradeço o convite.”

Com o coração batendo acelerado, aguardo. Espero alguns minutos e para


meu alívio não tenho resposta.

Definitivamente ele está me vigiando de perto. Será que sabe que estou
sozinha em casa nesse momento? Que o dispensei descaradamente? O quanto
tenho que ficar preocupada? Realmente as pessoas são imprevisíveis. Bonito,
educado, inteligente, quem iria suspeitar que fosse um stalker.

A palavra Stalker me causa calafrios, arrepiando minha pele. Encaro o


corredor escuro, e por algum motivo não sinto que estou segura. Levanto em
um pulo, e confiro as fechaduras das portas e janelas.

Brian onde você está? Eu vou matar você seu ogro cretino.
Estaciono o carro em frente à antiga casa de Camilly. Consigo recriar a
cena na minha cabeça do dia que ela fugiu correndo após ser agredida por
aquele desgraçado. Sinto que estou suando frio com as mãos trêmulas. Tenho
vontade de matá-lo, aliás, não só ele, todos esses agressores de merda que
abusam da vulnerabilidade alheia. Abro a mochila e pego a câmera. Caminho
na rua disfarçando enquanto faço várias fotos da vizinhança. Bairro simples
com muitas árvores, poucas pessoas circulando nas ruas, brinquedos
espalhados nos jardins, diria que se parece com uma comunidade tradicional.
O que me incomoda ainda mais, lugares como esses geralmente os vizinhos
frequentam a casa um do outro. Como nunca relataram os abusos?

Continuo por mais alguns quarteirões, e vejo mais a frente uma mulher
brincando com um bebê no jardim. Puxo a aba do boné escondendo meu
rosto. Ela me encara desconfiada, então decido voltar para o carro até o cair
da noite para invadir essa prisão abandonada.

Enquanto aguardo, percorro as ruas da cidade até chegar à casa da família


de Spencer. Ergo os vidros do carro, e monto vigia observando a entrada e
saída dos moradores. Realmente o desgraçado tem muito dinheiro, agora
entendo o porquê, Camilly esteve com tanto medo por todos esses anos.
Sinto o celular vibrando dentro do bolso da calça, e seu apelido carinhoso
salta na tela. Não posso atender, senão serei obrigado explicar a viagem e o
porquê partir sem falar nada para ninguém. E ainda estou furioso com aquele
tal Jhon. Amigo o cacete, sorrindo daquele jeito para ela na minha frente e a
chamando de “nossa”. Esse cara não tem medo de morrer, a primeira vez ele
ganhou como cortesia, mas na segunda não ofereço garantias.

A porta da garagem se abre e o modelo de carro “Audi A4 na cor


chumbo”, sai para a rua. Os vidros são escuros assim como os meus, mas ao
passar tenho um leve vislumbre da pessoa que está no volante, e tenho
certeza de que é o maldito que estava dirigindo. Encarando-o através do
retrovisor, com certa distância começo seguir seu carro.

— Onde você está indo, desgraçado? — resmungo sozinho.

Em vinte minutos rodando pela cidade, Spencer estaciona em frente a um


restaurante. Abro o porta-luvas e pego o pequeno binóculo. Desço uma
pequena parte do vidro para que possa observar o que irá acontecer lá dentro.
O filho da mãe anda como se estivesse desfilando, trajando roupa esporte
fino. Tenho que confessar que sua aparência física é razoável, típico
cavalheiro para atrair mulheres.

Consigo ter a visão clara do salão. Spencer caminha entre as mesas e


segue diretamente para uma jovem que está sentada sozinha. Outra vítima?
Para um cadáver você está muito vivo. Pergunto-me por que Camilly nunca
tentou limpar essa bagunça provando que o ex-marido não estava morto?
Trauma? Medo? Não sei.

A jovem se levanta sorrindo e o cumprimenta com um beijo no rosto.


Controlo à vontade de ir até eles e esmurrá-lo para proteger a sua mais nova
vítima. Observo-os durante o almoço. A atmosfera que os envolve é de um
casal feliz e apaixonado. Mãos se tocando suavemente, sorrisos, olhares.
Agora, por que esse infeliz está indo atrás da minha mulher quando já está
envolvido com outra pessoa? O que ele quer dela? Vingança por ter levado
uns tiros? Impossível, tenho certeza de que ele sabe que a lei sempre estará
do lado da vítima.

Remexo-me no banco, sinto minhas pernas dormentes de ficar na mesma


posição por muito tempo. Respiro aliviado quando os vejo se levantarem.
Conversando, o casal se despede na calçada, seguindo cada um para seu
carro. Que tipo de relação é essa?

Do mesmo jeito que saiu de sua casa, Spencer retorna. Sem desviar um
centímetro do caminho, entra na garagem. O fato de ele estar vivo seria
suficiente para prendê-lo. Mas infelizmente Camilly cometeu alguns erros
que em um julgamento seria massacrada. Tiro algumas fotos da mansão para
registro. Entediado e sonolento, encosto a cabeça no assento, e fecho os olhos
por alguns minutos, sendo levado pelo cansaço, adormeço.

Desperto na mais plena escuridão. Acendo a luz de teto do carro, e


confiro a hora no relógio de pulso. Ansioso, dirijo de volta para a antiga casa.
Guardo na mochila algumas ferramentas para arrombar a porta ou a janela.
Encaixo a alça no ombro, e salto para fora. Na calçada olho para todos os
lados garantindo que não tenha nenhuma testemunha, e corro até a lateral da
casa. Puxo o capuz do moletom cobrindo o boné, com cuidado e atento,
caminho até a porta de trás. Empurro fazendo força tentando arrombar, mas o
barulho pode chamar atenção. Desisto da ideia, enfio a mão no bolso da
mochila e pego um grampo de metal longo e fino. Enfio no buraco da
fechadura, giro para os lados tentando encontrar o ponto principal da tranca.
Ouvir aquele som de click é como música para meus ouvidos. Giro a
maçaneta, e a porta se abre.

Concordo que isso não é atitude de um delegado, mas o que posso fazer?

Guardo o grampo, e pego a lanterna. Ilumino os cômodos escuros. Nas


pontas dos pés circulo a casa inteira. Mas parece que alguém andou fazendo
mudanças. Móveis, cortinas, nada, não tem nada. Paredes brancas sem
nenhuma mancha. Quarto vazio, sem carpetes, armários, é como se ninguém
nunca tivesse morado ali. Como já suspeitava, estamos lidando com um
criminoso frio, calculista, e atento aos detalhes. Permaneço no local por mais
alguns minutos, e desisto de encontrar alguma prova substancial.

Retorno para o carro, e sigo direto para o hotel. Preciso de banho, comida.
E depois, continuarei vigiando a casa daquele maldito.
Enrolo a toalha na cintura, esfrego as mãos no cabelo derrubando as gotas
de água umedecendo meu peito nu. Em cima da cama o celular vibra
descontrolado. Consigo visualizar o nome de quem está ligando. Deslizo uma
mão por meu abdômen, considerando se devo atender ou não.
Impulsivamente, atendo a ligação.

— Brian eu vou matar você, seu cretino. Onde você está? — Camilly
grita do outro lado, não deixando qualquer oportunidade de explicação.

Fecho os olhos ouvindo sua voz sensual, e imagino furiosa na minha


frente. Sua face deve estar corada, e os olhos brilhantes de fúria, deixando-a
ainda mais sexy.

— Continua — sussurro, com a mão descendo para dentro da toalha até


segurar meu pau.

— O quê? Delegado está me ouvindo? Você não...

— Sim — resmungo ofegante, interrompendo-a.

Não sei por que demorei tanto tempo para encontrar essa mulher, minha
demônia de saia. Respirando fundo ao telefone, posso escutar o som dos seus
movimentos. Sutil como um tiro de bazuca, relata o que está fazendo e onde
suas mãos estão tocando.

Envolvo meu membro com os dedos apertando na palma da mão. A cada


gemido me instiga ainda mais. Faço movimentos subindo e descendo pela
extensão do pau, acariciando a cabeça rosada e inchada.

— B R I A N — Cami sussurra sensualmente.

— PORRA — resmungo, repetindo os movimentos com mais força.

Preciso estar dentro dela, sentir seu cheiro, roubar os gemidos com a
minha boca. O vislumbre das suas pernas abertas para mim, invade meus
pensamentos roubando o que me restava de sanidade. Com mais algumas
investidas subindo e descendo, alcanço o ápice espirrando meu gozo nos
lençóis.

Mantenho-a no telefone até que consiga gozar também. Saciados


momentaneamente.

— Brian onde você está? — questiona recuperando o folego.

— Tenho que desligar, explico tudo depois. — Encerro a chamada.

Realmente isso foi imprevisível. Quem diria que sexo por telefone pode
ser tão prazeroso. Precisamos praticar mais vezes. Pensando bem, prefiro
sentir pele na pele, meu pau entrando no seu centro apertado. Porra se
controla Brian. Tenho algo importante para fazer. Foco delegado.
Exatamente dois dias depois que Brian viajou sem dar nenhuma
explicação plausível. E para piorar a situação fui fraca e cedi ao telefone. Não
posso me culpar por ficar louca todas as vezes que ouço aquela voz rouca,
grossa, chamando meu nome. Estou com saudades e preocupada. Sequer
imaginei que Brian também iria ao meu encontro com o Capitão e, mais, que
iria ter aquela atitude infantil. Mas, algo está martelando dentro da minha
cabeça. Como ele sabia onde eu estava? Ninguém sabe do John, nem mesmo
Alyssa que morou comigo tantos anos.

Várias teorias rondaram nas últimas horas sobre isso, e a única conclusão
é que o delegado está me monitorando para não dizer vigiando. Brian Garcia
teve a ousadia de me vigiar descaradamente e, além do mais, fazer um
escândalo em público?

Semicerro os olhos encarando o reflexo no espelho do banheiro. Fecho os


olhos por alguns segundos relembrando o que foi dito sobre o professor Luca.
Então, ele é mesmo como um fantasma assim como suspeitava. Tenho que
descobrir o porquê, dele estar sempre atrás de mim. Qual o nosso ponto de
ligação. Muitos acreditariam que está apaixonado, mas sei que não é só isso.
O modo como me encara quando não estou olhando é diferente. Seu rosto
assume uma máscara de pura simpatia. Sinto calafrios percorrendo meu
corpo, como se fosse um alerta de perigo. Talvez se pudesse ver aquela foto
novamente, ou interrogá-lo sutilmente sobre sua família.

Mas como posso fazer isso? Pode ser perigoso ficar sozinha com ele,
ainda mais que não sei quais seus reais motivos. John poderia me ajudar com
isso, ficar do lado de fora da casa vigiando.

Saio do banheiro indo em direção à cozinha. Pego o copo do armário,


abro a geladeira e o encho com suco de laranja.

Brian não ficaria nada feliz com essa ideia, levando em consideração que
ele simplesmente sumiu como fumaça no ar. Por que tenho que dar satisfação
do que faço ou deixo de fazer? Desculpe delegado.

Alcanço o celular de cima da mesa, digito o número de telefone do


capitão T, e aguardo. Com três toques, ouço a voz do outro lado.

— Preciso de um favor. Sim, de novo. Você sempre reclamou desse jeito,


acho que está ficando velho capitão. — Som de vidro quebrando me faz
pensar o que ele estaria fazendo enquanto fala comigo. — Não, não precisa
ser hoje. Amanhã iremos à casa do Luca, quero chegar mais perto do inimigo
— gritos e resmungos prendem minha atenção. — O que foi isso? —
questiono, e ouço uma resposta ríspida e grosseira. — OK, não preciso saber
disso. Até mais.

Josefy sempre me alertou para tomar cuidado com John, apesar de o seu
rosto ser sensual, suave, e sua boca repleta de palavras dóceis. É perigoso,
mortal.

Termino o café da manhã, porém aguardo a mensagem resposta de Luca


sobre almoçarmos na casa dele. Em uma de nossas conversas Luca deixou
escapar que gostava de cozinhar, na época não dei importância, mas agora,
posso usar isso a meu favor. Confiro mais uma vez o celular, e nada. Por que
está evitando que vá até sua casa? Será que percebeu o quanto estava
desconfortável na última vez que nos encontramos?

Levanto da mesa e, coloco o prato, copo sujo, dentro da cuba na pia.


Impaciente, ando de um lado a outro dentro do apartamento.

— E se ele não responder? Mas por que não responderia? — resmungo


alto.

Encosto no batente da janela encarando a movimentação da rua. Pessoas


circulando na calçada. Não contenho e sorrio ao imaginar que nunca
saberemos o que cada pessoa enfrenta no seu dia-a-dia, só elas mesmas que
sabem. Guerras travadas internamente. Suspiro pesadamente.

Continuo parada perdida em pensamentos, e me permito esquecer a atual


realidade. Não sei ao certo quantos minutos se passaram, mas sinto o celular
vibrando em minhas mãos. Ansiosamente confiro a tela, e o nome Luca
aparece piscando. Abro a mensagem.

Venha até minha casa, irei cozinhar para você.

Será um prazer.

Após responder à mensagem, dou vários gritos e pulos de alegria. Espero


encontrar algo útil já que estou entrando no campo inimigo. Ligo
imediatamente para John acertando os últimos detalhes.

Minhas mãos estão trêmulas, suando. Como o capitão pode se atrasar em


uma situação como essa? Esperar carona não é comigo, mas não é necessário
irmos em carros separados. Da janela vejo seu carro estacionando em frente
ao prédio. Acelero os passos até a porta. Respiro fundo, entrando no
elevador.

Dentro do carro, sentada no banco do passageiro, não consigo conversar.


É como se as palavras estivessem presas na garganta. De canto de olho
observo o capitão. Descontraído, assobiando enquanto segura o volante
despreocupadamente. Queria ter todo esse controle emocional.

— Está nervosa? Quer beber uma dose de uísque? É bom para relaxar os
nervos.

— Não, não quero chegar bêbada.

— Sim senhorita.

— John — chamo seu nome.

— O quê? — responde sem desviar os olhos da rua.

— Você nunca pensou em se casar, ou ter uma família. Viver sozinho


pode ser triste.

— Que tipo de pergunta é essa? Mas, não. Minha vida não tem espaço
para uma segunda pessoa.

— Entendi. Quando tudo isso acabar, quero ter uma família de verdade.

— Uou. Nunca achei que iria confessar algo tão óbvio. Vai conseguir.
Não esqueça, a cada dez minutos de me enviar algum sinal pelo celular.

— Obrigada.

— Somos família.

A palavra família soa como música para meus ouvidos. No fundo sempre
quis ser amada, protegida por alguém, e mesmo esse sentimento me tornando
frágil e passível de homens maníacos como Spencer, quero recomeçar de
verdade, ao lado de Brian.

Delegado Garcia, era para você estar aqui me ajudando. Eu espero que
tenha uma ótima explicação, senão irei parar atrás das grades por homicídio.
Encosto a cabeça no vidro da janela sentindo meu coração bater acelerado
com a lembrança da ligação. Safado, soube me seduzir direitinho.

— Chegamos.

Em frente à casa do professor, desço do carro. John avança algumas ruas


para esconder seu BMW X5.
Deslizo as mãos no tecido da blusa desfazendo as dobras, balanço a
cabeça ajeitando os cabelos. Olho para todos os lados conferindo a
vizinhança. Sinto-me a protagonista de filme de ação, ou seria de terror?

Subo os degraus da entrada até o interfone. Aguardo alguns segundos, e


ouço o som da porta sendo destravada. Meu coração bate acelerado como se
fosse sair pela boca. Vamos lá Camilly, foco, foco. Lembre-se, fique atenta.
Tenho que analisar cada centímetro possível da casa.

Sou recepcionada por Luca. Ele pode ser malvado, mas não tem como
negar que é bonito e charmoso. Quando sorri no lado direito do rosto nasci
uma covinha extremamente sensual. Estendo a mão para cumprimentá-lo.
Sorrindo, ele retribui o gesto.

Entro na sala, conversando descontraída. Percorro os olhos até a estante


onde tinha as fotos, mas sou pega de surpresa ao notá-la vazia.

— Sente-se, por favor. Quer beber algo? — aponta para o sofá.

— Água.

— Água? — questiona confuso.

— Sim, não estou bem do estômago.

— Entendi.

A cada movimento tenho a sensação de também estar sendo analisada.


Estamos brincando de gato e rato, professor? Não demora em a campanha
tocar. Inquieta, cruzo as pernas. Teremos companhia no almoço? E por que
não fiquei sabendo disso?

Rapidamente, Luca abre a porta, revelando uma linda mulher.

Ele tem namorada?

Usando botas de cano acima dos joelhos colando a pele em contraste com
o vestido rosa bebê delineando suas curvas. Bonita, sexy. Engulo seco me
sentindo inferior. Qual é Camilly, você não está aqui para ser bonita, e sim,
para descobrir o que esse maluco quer com você. Recomponha-se mulher.

— Camilly, essa é Sheron — Levanto e sigo em direção ao casal.

— Sheron? — Esse nome me faz lembrar a falecida. — Muito prazer.

— Espero não estar atrapalhando Luca querido. — Esse querido soou


vulgar, que tipo de mulher.

— Claro que não cunhada. Fique à vontade.

Cunhada? Quer dizer que seu irmão voltou? Reunião de família.

— Seu irmão não pode vir, parece que teve alguns problemas, mas virá
em breve.

— Estou ansioso para reencontrá-lo.

Esse assunto de irmão, essa atmosfera de suspense me incomoda.


Trocando olhares suspeitos, mudam de assunto. Será que são amantes?
Professor pegando a cunhada? Foco, foco, esqueci isso.

— Então, Sheron. O que faz da vida, quer dizer, trabalha? Estuda? —


Tenho vontade de arrancar minha língua por fazer essa pergunta.

— Oh não, não trabalho. Comecei estudar recentemente. Fiquei alguns


anos morando fora do país, sabe, fugindo do meu ex-marido.

— Sério? — Finjo estar interessada na sua vida fútil.

— Sim, era muito possessivo. Não podia trabalhar estudar, nada, enfim.
Só me livrei dele.

Uau, vaca fria. Não que concorde com a atitude do marido, mas como
pode falar abertamente para uma estranha.

— Entendi, fez bem.

Encaro-a mais perto, os olhos, a boca, tenho a sensação de conhecê-la de


algum lugar. Impossível reconheceria essa vulgaridade toda de qualquer jeito.
Puxo assunto com Luca para evitar encará-la, mas é difícil.

— Tenho a sensação de que conheço você de algum lugar. — Não


acredito que tive coragem de falar isso, boca nervosa.

— Acho impossível querida. Como disse retornei a pouco, e fiz várias


plásticas fora do país. Você é muito bonita, se nos conhecêssemos com
certeza diria.

— Ah sim, verdade.

O clima se torna tenso, pesado. Mesmo Luca desviando o assunto


diversas vezes, é impossível controlar as perguntas. Pelo jeito Sheron tem
muito o que me falar, assim como eu também tenho. É como se esperássemos
por esse momento.

Quem é essa mulher? E por que me incomoda tanto?


Piso fundo no acelerador nas vias principais, percorrendo as ruas como se
estivesse estrelando um filme da franquia, velozes e furiosos. Estava em
frente da casa de Spencer, quando recebi a ligação de Ethan. Aquela maluca
não consegui ficar quieta por alguns dias? Tenho certeza de que aquele tal de
John está envolvido.

— Droga... Droga... — resmungo alto.

Ainda quero descobrir a identidade da mulher que o aguardava no


restaurante. Se for uma possível vítima tenho que alertá-la o quão perigoso é
se relacionar com esse desgraçado. Não quero que nenhuma mulher passe por
tudo que Camilly passou. Tenho que colocar esse cretino atrás das grades. Só
quero ver se na cadeia, ele irá ser tão valentão. Agressores, estupradores de
mulheres e de crianças, têm um destino cruel aguardando dentro daquelas
barras de metal.

Com uma mão no volante, uso a outra para pegar o celular. Aperto o
número um da discagem automática. Novamente o celular da diaba só chama,
caindo diretamente na caixa postal. Essa mulher quer me matar? Desfilar
pelas ruas de Nova York, mesmo sabendo que tem um psicopata
perseguindo-a. Vamos ter uma longa conversa sobre isso. E dessa vez, irei
algemá-la se for preciso. Continuo acelerando o mais rápido que posso.
Estaciono em frente ao nosso prédio, e como esperado, não tem ninguém
no apartamento. Quer dizer que está fazendo, não sei o que por aí, há algumas
horas. Decido aguardar dentro do carro. Ser pega em flagrante deve causar
alguma reação negativa sobre ela. Ajeito-me no banco, ergo o vidro fumê,
cruzo os braços, encosto a cabeça no assento, e aguardo.

Bato o pé no assoalho, impaciente. Onde se meteu senhorita Carter?


Tento mais uma vez ligar em seu celular. Se algo me deixa nervoso, é o fato,
da pessoa não atender o celular, ainda mais, quando essa pessoa corre risco
de vida. Tudo bem posso estar exagerando sobre o risco de vida, mas não
sabemos qual será o próximo passo daquele desgraçado. O fato dele já ter
uma nova namorada, e mesmo assim, continuar perseguindo sua ex, o torna
perigoso.

Talvez, Spencer esteja sendo movido pela raiva, afinal, Camilly atirou
nele. Mas, quantas vezes ele espancou-a? Deveria ficar elas por elas. Sei que
em sua cabeça de louco, sente-se injustiçado, como se fosse a vítima. Assim
que retornar para a delegacia, irei solicitar que Judith trace um perfil
psicológico de Spencer. Pode haver mais vítimas escondidas.

Através do retrovisor, vejo uma BMW X5, estacionando. Semicerro os


olhos encarando o motorista. BINGO! Bastardo, desgraçado. A porta do
passageiro se abre, e para minha decepção, a mulher que amo, salta para fora.
Eu vou matar esse cretino.

Desço do carro, fungando, furioso. Encaro o rosto de Camilly, que ao me


ver, empalidece. Gostaria de dizer “olá docinho”, mas faço o contrário.
Seguro no trinco da porta com força, e agarro o homem pela camisa. Puxo-o
com força várias vezes, até que, sua única opção é soltar o cinto de
segurança. Jogo seu corpo no chão, e monto por cima de suas pernas. Ouço a
voz feminina de longe. Infelizmente tenho um defeito muito grave. Perco
alguns sentidos básicos quando estou irado, por exemplo, a capacidade de
entender as palavras pronunciadas em meio a uma briga. O sangue ferve nas
veias, acelerando o coração, impossibilitando que ouça quaisquer coisas,
além do meu próprio sangue bombeando rapidamente.

— Por que você estava com minha mulher? — esbravejo, aproximando o


rosto do seu.

— Por quê? — Responde, sorrindo debochadamente.

Seguro a gola da sua camisa, apertando tão forte que posso sentir a dor
nas pontas dos dedos. Quero acabar com a raça desse cretino.

— Brian... Solta ele, por favor. — Sinto as mãos de Camilly puxando


meu braço.

— Está tudo bem, querida. — John, retruca, sempre com aquele sorriso
no rosto. Talvez devesse quebrar seus dentes para aprender manter a boca
fechada.

— Você quer morrer, não é? — questiono entre dentes.

— Tanto faz senhor delegado.

Ao contrário do que esperava, ele não reage. Só fica deitado no chão,


observando. O que me deixa ainda mais nervoso. Preferia que brigasse,
reagisse, assim, poderia devolver o favor. Caralho. O solto e, me afasto.

— Vou te contar tudo — Camilly resmunga, abraçando-me pela cintura.

— Quero saber tudo. Entendeu? — Beijo o topo da sua cabeça, inalando a


fragrância de morango dos seus cabelos.

— Já que o casal de pombinhos se acertou, tenho que ir embora. Preciso


trabalhar.

Lanço um olhar de desaprovação em sua direção, fazendo nascer um


sorriso de canto em seus lábios. Tenho que admitir que o bastardo tem
coragem. Mas, porque, tenho a sensação de que é mais perigoso do que
aparenta ser? Segredos, muitos segredos.
Sentado no sofá, apoio os cotovelos nos joelhos, encarando-a. Camilly
permanece sentada na poltrona a minha frente. Percebo que está nervosa,
engolindo em seco. Limpo a garganta, sinalizando o quanto estou impaciente.

— Estou esperando.

— É... Então. — Seus lábios carnudos, umedecidos, se abrem.

Só consigo imaginar como seria ter sua boca em volta do meu pau,
sugando-me. Fecho os olhos rapidamente e, respiro fundo. Nada de sexo,
agora, você só precisa saber o que aconteceu. Concentre-se Brian. PORRA! É
quase missão impossível pensar em outra coisa com essa tentação tão
próxima. Vamos lá, pense em animais fofinhos. Coelhinhos, cachorrinhos,
gatinhos. ARRGGHH... Isso não vai funcionar, nunca.

Mudo de posição, encosto no sofá, para criar alguns centímetros a mais


de distância. O cheiro do perfume adocicado, atingi minhas narinas. Caralho!
Levo a mão até o rosto e, esfrego os dedos no nariz.

— Hum. Pode falar — resmungo baixo.

Então, ouço atentamente todos os detalhes da missão investigativa.


Desde, quando começou desconfiar de Luca, a foto em sua casa, o passado
fantasma, incluindo o dia de hoje.

— Mas Brian. Tem algo que está me incomodando. Quando estava na


casa de Luca, chegou uma mulher estranha dizendo ser namorada do seu
irmão. — Cruza as pernas, ressaltando as curvas das pernas.

FOCO, DELEGADO. Repito mentalmente, encarando-a.

— Além do fato de estar na casa do perseguidor, sozinha, e sem eu saber


de nada. O que a incomodou tanto?

— Por um momento tive a impressão de conhecê-la, mas, ela disse que


seria impossível, pois tinha feito muitas plásticas fora do país. Sheron, seu
nome é, Sheron.

A junção de palavras que saem da sua boca, formando o nome Sheron.


Atingi-me como um tiro no peito. Engulo em seco, sem demonstrar qualquer
reação. Paralisado, perdido em pensamentos e, lembranças. O sorriso da
falecida surge diante dos meus olhos em pequenos flashs, imagens do nosso
primeiro encontro, casamento, momentos felizes que se perderam com sua
morte.

— Brian? Brian? Está tudo bem?

Não consigo responder. Sinto como se as palavras estivessem presas na


garganta, sufocando-me. Não pode ser, é impossível, ela está morta. Eu fiz o
velório, seu caixão desceu para dentro daquele buraco sombrio, e escuro.
Chorei, permaneci de luto por anos. Não tem a mínima possiblidade de ser a
mesma pessoa.

— Brian? Você está achando que é sua falecida esposa? Só pode ser
brincadeira. — De canto de olho, vejo quando Cami levanta-se. — Vai
embora, agora. Volta para sua casa.

— Eu... Eu... — Engasgo.

— Agora — grita, alterando a voz.

Infelizmente, tenho que concordar. Estou sem argumentos para justificar


minha reação. Sem coragem de olhar em seus olhos, despeço-me de cabeça
baixa. Bato a porta ao sair do apartamento.

Deixo o carro estacionado, e opto por caminhar. Enfio as mãos no bolso,


tentando recobrar a sanidade. A cada passo, cada minuto, me convenço que é
uma mera coincidência, nada mais. Sheron nunca faria isso comigo, ou com
outra pessoa. Era uma alma bondosa, gentil. Impossível. Definitivamente,
não é ela.

Pego o celular no bolso da calça e, faço uma ligação para o nerd do FBI,
Ethan.

— E aí. Sim, estou bem. Não, não era nada demais. Preciso que faça um
favor. — Reclamando do outro lado da linha, ouço o barulho do pacote sendo
aberto. — Você só come? Vai acabar com as veias entupidas. OK. Cuidando
da minha vida. Luca Ricci. Preciso que encontre tudo sobre esse nome. OK.
OK. Pago seu almoço. Sim, bem caro. Até mais.

Encerro a chamada, e não contenho a gargalhada. Como pode alguém


comer tanto quanto ele? Quando nos conhecemos através de Dylan, a
primeira impressão foi de um garoto infantil, e sem noção. Estava enganado,
por baixo daquela máscara inocente, tem um homem inteligente, sagaz, que
ganhou meu respeito como pessoa e profissional.

Continuo caminhando, e quando percebo, estou em frente à cafeteria


Starbucks. O cheiro impregnado faz meu estômago roncar de fome. Na
euforia de chegar logo em casa, acabei não comendo nada durante o dia
inteiro. Café é uma boa ideia. Empurro a porta dupla, e entro. Devido ao
horário, não tem tantas pessoas, deixando várias mesas vazias. Sigo em
direção ao balcão e, faço o pedido. Entrego o cartão para atendente
finalizando a compra. Com o ticket em mãos, procuro onde me sentar,
enquanto aguardo a entrega.

Percorrendo a tela do celular em busca de novas mensagens, e de canto de


olho, vejo a porta se abrindo, mas continuo com os olhos focados na tela.
Indeciso, pondero se devo mandar mensagem, ou não para Camilly. Respiro
fundo, e de repente algo me deixa paralisado, inerte.

Esse perfume, a fragrância amadeirada.

Ergo a cabeça com os olhos arregalados. Procuro dentro da loja, a pessoa


que possivelmente estava usando esse perfume. Descontrolado, levanto,
quase derrubando a cadeira. Acelero os passos até o balcão.

— Moça, moça, com licença. A pessoa que estava aqui, agora. Era
homem, mulher? — questiono a atendente.

— Ah, mulher — responde.

Impulsivamente, saio correndo da cafeteria, deixando tudo para trás.

Corro na calçada como se fosse louco, encarando cada pessoa que circula
ao meu lado, em busca daquele cheiro. Mais à frente, sou surpreendido com o
carro de Spencer estacionado de pisca-alerta aceso, quer dizer parada rápida.
E mais ainda, quando uma mulher, abre a porta do passageiro, e entra. Tenho
um pequeno vislumbre do maxilar feminino

Acelero o ritmo dos passos, para alcançá-los, mas é uma tentativa inútil.
Eles escapam, bem diante dos meus olhos.

— PORRA! Porra. Porra — esbravejo.

Será a mesma mulher que estava com ele no restaurante? E por que estava
usando o mesmo perfume de fragrância exclusiva de Sheron?

Desenvolver perfumes era um dos hobbies preferidos da minha falecida


esposa. Essa em especial, foi criada para usar quando estivesse comigo. Eu
mesmo ajudei escolher as misturas de fragrâncias, reconheceria esse cheiro
em qualquer lugar. Primeiro, surge uma mulher com o mesmo nome, agora, o
perfume. O que está acontecendo nessa porra?

Esse maldito quer brincar com minha cabeça? Acha que pode me
desestabilizar para deixar o caminho livre para ele? Eu vou acabar com você,
desgraçado.

Está na hora do delegado Brian Garcia, agir diretamente.

Disco o número quatro da agenda, caindo diretamente na chamada com


detetive Parker.

— Sim, sou eu. Cheguei hoje. Parker quero que reúna nossa equipe. Sim,
temos um caso especial. Chego à delegacia em meia hora. Ok. — Desligo a
ligação.

Eu não vou facilitar sua vida, Spencer. Prepare-se, vou descobrir tudo
sobre você, e sua família. O jogo de verdade, acabou de começar.
— Cretino — resmungo, jogando a almofada na porta.

Essa mulher mesmo depois de morta ainda permanece entre nós. Brian
não consegue se controlar só de ouvir seu nome, posso estar sendo egoísta,
mas isso me incomoda demais. Ciúmes? Não sei. Talvez seja infantilidade da
minha parte, ter ciúmes de uma pessoa que morreu há tantos anos. Sinto
como se nada superasse o amor que ele sentiu por ela. A santa, virgem,
imaculada, Sheron. Perfeita, dedicada, a esposa perfeita para aquele ogro
metido a príncipe encantado.

Nunca irei superar as qualidades daquela mulher. Além do mais, não


quero me tornar submissa, ficar o dia inteiro dentro de casa, limpando,
cozinhando, enquanto o delegado fica por horas e horas na delegacia. Já
passei por situação similar uma vez, e não, não irei aceitar isso para minha
vida novamente. Se quiser ficar comigo, será do meu jeito. Cindy, aquela que
aceitava tudo, morreu no dia em que fugiu de casa.

Ergo os cabelos em um rabo alto. Sigo até o armário, pego roupas de


ginástica. Encaro o reflexo no espelho analisando de cima, abaixo, meu
corpo. Nunca mais irei mudar por ninguém.
— Por ninguém, entendeu Brian Garcia? — repito corajosamente.

A sala é banhada pela luz da lua, indicando que já é noite. Acendo o


lustre da sala, e saio do apartamento deixando o celular em cima da mesa.
Encaixo os fones de ouvido, e aperto o play do MP4.

Dentro do elevador, sinto olhares curiosos em minha direção. Moro faz


um bom tempo no mesmo lugar, mas sempre que os vizinhos me encontram
tenho a sensação de que sou uma nova moradora. Balanço a cabeça
negativamente. Possivelmente estão falando sobre minhas roupas, não posso
ouvi-las, mas consigo ler os movimentos dos seus lábios e as expressões
faciais. Reviro os olhos, respirando fundo. Infelizmente o mundo está repleto
de juízes, e júri. Sempre apostos para julgar qualquer pessoa, usando como
base suas roupas, ou aparência.

Como diz o ditado, quem vê cara, não vê coração.

Spencer sempre foi o exemplo de marido na frente de todos. Carinhoso,


dedicado, gentil e amoroso. E entre quatro paredes? Era quando sua
verdadeira face surgia. Como alguém pode usar uma máscara durante a vida
inteira? Atormentei-me por tantos anos, acreditando que o tinha matado, e
agora? Por que tenho que me esconder, usando um nome falso? Não sou uma
assassina, foragida da lei. Quero meu nome, a identidade roubada por aquele
cretino.

Assim que a porta do elevador se abre, sou a primeira a saltar para fora.
Em frente ao prédio, estico os braços, em seguida as pernas, alongando o
corpo.

Corro através das árvores na praça central, percorrendo as ruas das


proximidades. Respiro, inspiro, lentamente. O ar entrando e saindo dos meus
pulmões se parecem como facas cortando a pele. Exausta, ofegante, e sem
forças para continuar, decido me sentar em um banco para me recuperar das
horas exaustivas de treino, antes de retornar para casa.
Os pelos do meu braço arrepiam-se. Aquela estranha sensação de estar
sendo vigiada. Luca? Só pode ser brincadeira, como esse homem sabe de
todos os meus passos, não é possível. Giro a cabeça para todos os lados,
procurando o possível perseguidor. Nada, ninguém, além das crianças com
seus familiares brincando no parque.

Devia ter trazido o celular. Fico cega, surda, e burra, quando me sinto
acuada e com medo. Nesse fatídico momento estou com muito medo.
Disfarçando encarando o céu estrelado. Agora que já estou recuperada, posso
correr até chegar em casa, ou pelo menos onde tem mais pessoas, caso
precise de ajuda. É isso, vamos correr Camilly.

Conto até três, e me levanto de supetão, correndo descontroladamente.

Os músculos das coxas repuxam a cada vez que meus pés tocam o chão.
Mas, não paro de correr, continuo focada, desviando das pessoas na calçada.
Correndo, correndo, porém, esbarro em algo sólido, duro, que quase me joga
no chão, senão fosse por fortes braços segurando minha cintura. Surpresa,
assustada, e envergonhada por ter topado com alguém, ergo a cabeça
lentamente.

NÃO PODE SER. Recito mentalmente.

Paralisada, estômago doendo, olhos arregalados, e o ar faltando nos


pulmões. Essa sou eu nesse exato momento, encarando o rosto de Spencer.
Continuo sem qualquer reação presa dentro dos seus braços. Meu corpo
treme incontrolavelmente.

Devo gritar? Pedir ajuda? Correr? Fingir que não o conheço? O que faço?

Engulo em seco, recuando alguns passos para trás, libertando-me de


qualquer contato físico. Sorrindo gentilmente, Spencer também se afasta.
Tenho certeza deque me reconheceu, mas porque não fala nada?

— Eu... Eu... É... — Engasgo com as palavras, sufocando minha voz.

— A senhorita está bem? — O timbre de sua voz me traz dolorosas


lembranças.
Espera. Senhorita? Ele está fingindo que não me conhece? Por quê? Meu
deus, Spencer não mudou nada. Continua com sua aparência elegante. E essa
voz doce capaz de seduzir qualquer mulher inocente. Tudo bem, também
consigo fazer isso. Eu consigo.

— Desculpe, estava distraída. O senhor está bem? — Engulo a saliva


sentindo o sabor amargo do medo.

— Estou obrigado pela preocupação. — Sorrindo, Spencer ajeita o


casaco.

Quero revirar os olhos, e dizer tudo que venho engolindo amargamente.


Xingá-lo, socar seu rosto fingido, cretino, desgraçado. Brian sempre tinha
razão, ele estava vivo, isso prova que quem está me amedrontando é
realmente esse bandido. Mas, por quê? Se estava vivo, porque veio ao meu
encontro somente, agora? O que está planejando nessa cabeça diabólica?

— Com licença, tenho que ir. Mais uma vez, obrigada — agradeço.

Desvio do seu corpo, contornando na direção contrária. Minhas pernas


mal obedecem ao comando para andar. Trêmulas e moles como se fossem
gelatinas. Dou as costas para aquele que jurava estar morto e enterrado. Será
que estou estrelando um filme de mortos vivos? The walking dead? Porque
não fui informada que sou a protagonista de um triller de terror.

— Até breve, senhorita. — Ouço longe sua voz, respondendo.

Até breve? Até breve? Sério, Spencer?

Acelero os passos criando firmeza nas pernas, conforme me distancio. A


cada passo, olho para trás confirmando se ele está me seguindo.
Provavelmente já sabe onde moro e tudo sobre minha vida.

Subo dos degraus do hall de entrada do prédio, correndo. Aperto o botão


do elevador, enquanto aguardo, ando de um lado para outro, encarando a
porta. É como se Spencer fosse surgir me agarrando os cabelos, jogando-me
no chão. Sou invadida por lembranças.

Era aniversário de casamento. Raras ocasiões me permitia ser iludida.


Acreditar que Spencer me amava que tudo era um engano, culpando seu
temperamento. Preparei uma linda mesa de jantar, fiquei durante horas
cozinhando seu prato preferido, tudo para agradá-lo. Escolhi o vestido mais
bonito que tinha no meu armário, até mesmo, borrifei o perfume que ele
tanto gostava. Com tudo pronto, sentei no sofá para esperar sua chegada do
trabalho. Uma hora de atraso, duas horas, três horas. Preocupada com meu
marido, tentei ligar diversas vezes no celular, mas sempre caía diretamente
na caixa postal. Senti o medo tomar conta, roubando minha sanidade.

Desesperada, decidi esperar por ele no jardim de casa. Queria saber se


estava tudo bem, só precisava do meu marido. Mas, infelizmente, aquilo que
era para ser uma noite magica, acabou se tornando um pesadelo.

Spencer estacionou o carro em cima do jardim, abriu a porta


tropeçando-nos próprios pés, embriagado. Corri junto dele para ajudá-lo.
Quando seus olhos se encontraram com os meus, pude ver a sombra do
diabo refletido. Furioso, enrolou a mão em um nó apertado puxando meus
cabelos, me arrastando para dentro. A mesa pronta, foi chão abaixo, junto
com pratos, comida, tudo que tinha em cima. E eu? Espancada, agredida
fisicamente, verbalmente, aguentei calada, meu corpo sendo abusado
sexualmente por esse monstro.

Lágrimas escorrem dos meus olhos. Respiro fundo, e levo as mãos até as
bochechas, secando-as. O som da porta do elevador me traz de volta ao
presente. Entro rapidamente, e sinto um grande alívio ao ver a porta se
fechando. Observo o contador no painel, desejando que fosse mais rápido.

Calma Cami, calma.

Salto no andar, e sou surpreendida com a presença do delegado. Brian


está encostado no batente com as mãos no bolso. Sem vergonha, ou qualquer
pudor, corro até o homem que amo. Lanço-me contra seu corpo, envolvendo
os braços ao redor da sua cintura. Sinto sua fragrância amadeirada, máscula.
Sem fazer qualquer pergunta, ele também abraça meu corpo, beijando o topo
da minha cabeça.

Encosto o rosto no seu peito, ouvindo o bater do coração. Ficamos juntos,


abraçados, não sei ao certo por quanto tempo, mas não precisei dizer nada,
era como se ele entendesse que naquele momento, só queria sentir a
segurança.

— Brian. — Finalmente consigo falar.

— Vamos entrar? — Afasta-se, segura minha mão, levando-me para


dentro do apartamento.

— Eu trombei com Spencer — sussurro.

— O QUÊ? — questiona alterado, enquanto senta no sofá.

— Sim. Literalmente trombei com ele. Fingiu que não me reconheceu.

— Você vai me explicar isso direito, mas desde já, saiba que, sem
chances de sair sozinha de casa outra vez. Agora, senta aqui e me conta tudo.
— Bate na perna, me puxando para me sentar no seu colo.

Passo um braço por trás do seu pescoço, beijo os lábios suavemente,


esquecendo qualquer problema ou medo. Então, começo contar para ele da
minha corrida alucinante.
✽✽✽

— Corre irmão. — Ouço a voz de Luca me chamando ao longe. Continuo


em uma corrida frenética e alucinada.

Meus pés doem dentro do tênis apertado, mas o medo de sermos pegos é
maior que qualquer dor. A cada passo, viro para trás conferindo se meu irmão
está me seguindo. Não devíamos ter roubado chocolates da venda, mas,
estávamos com fome. Agora, pagamos o preço por tal ato.

Em um piscar de olhos, sinto uma mão se encaixando a minha, me


puxando para frente. Sorrindo, encaro o rosto da pessoa que mais amo
mundo. Corremos por quilômetros, sem saber ao certo se ainda nos
perseguiam. Escondidos entre às árvores, no nosso reino encantado especial,
abrimos a embalagem do doce.

— Luca, mamãe vai ficar brava com a gente — resmungo ofegante, e


receoso.
— Ela não precisa saber, não é Spencer.

Sou somente alguns minutos mais novo que Luca, mas ele sempre foi o
mais inteligente, esperto e bonito. Mamãe afirma que somos idênticos, mas
discordo. Como posso ser parecido com ele? Não sei jogar futebol, muito
menos consigo escalar uma árvore alta. Acho que isso é conversa de mãe.

— E se o dono da venda contar para ela? — Pergunto mordendo a


deliciosa barra de chocolate.

— Negamos. Spencer será nossa palavra, contra a daquele velho gordo.

— Tenho medo.

— Você é um menino, ou uma marica? — Luca segura na gola da minha


camiseta com uma expressão furiosa.

— Sou meni... Menino — gaguejo.

— Isso. Ninguém pode nos separar irmãozinho. Nascemos juntos, vamos


morrer juntos. Certo?

— Certo — concordo acenando com a cabeça.

Conforme os anos se passaram, Luca se tornava mais e mais violento,


algumas vezes até mesmo comigo. Mentia sempre que algum novo hematoma
surgia em meu corpo. Não queria que mamãe, ficasse brava com o irmão.
Tinha certeza de que era uma fase passageira, ele iria voltar a ser o meu
amigo.

Em nosso aniversário de doze anos, ganhamos de presente um filhote de


cachorro. Devido minha alergia, não podíamos ter animais, mas queria tanto,
e após suplicar, papai amoleceu, e nos deu o filhote. Branco, peludinho, suas
lambidas faziam cócegas na pele. Pude perceber no rosto do meu irmão que
não ficou feliz com a chegada de floquinho. Não entendia o porquê de rejeitar
o animalzinho.

Como todos os anos, reunimos amigos, familiares em uma festa para


comemorar nosso aniversário. Decidi que seria melhor para floquinho ficar
em meu quarto, já que teria muitas crianças e poderiam machucá-lo. Levei
comida, água e sua caminha para que ficasse confortável até meu retorno.
Estava feliz, queria sorrir o tempo inteiro. Finalmente tinha ganhado um
presente valioso.

Estávamos brincando no jardim, quando ouvimos um barulho estranho,


mais parecido com um grito estrangulado. Giramos a cabeça na direção do
som, e para minha total surpresa, era do meu quarto. Assustado, encarei a
varanda por alguns segundos, e antes que pudesse ter qualquer reação,
floquinho foi empurrado do alto. Seu pequeno corpo, peludo, caiu inerte no
chão. Então, começaram os gritos de pânico, pessoas correndo em nossa
direção para nos socorrer. Só conseguia chorar ajoelhado ao lado do meu
filhote. Por um momento tive a certeza de que vi Luca na sacada, logo após a
queda.

Ele teria matado nosso cachorro? Não é possível. Queria acreditar nessa
mentira.

Calei-me diante dos nossos pais, porém a dúvida me corroía por dentro. E
foi dito como uma fatalidade a queda de floquinho. Por dias, chorei, sentindo
remorso por deixá-lo sozinho no quarto. Só pensei no seu bem estar, e isso
causou sua morte. Afastei-me de Luca e aos poucos uma lacuna se criou entre
nós. Aquele sentimento, o elo incrível que tínhamos, não existia mais. Tinha
medo de que pudesse fazer algo pior. Trancava todas às noites a porta do
quarto antes de dormir, e rezava que ele não me procurasse.

Muitas, e muitas foram as brigas em casa. Gritos de mamãe, papai


brigando com Luca, ameaçando mandá-lo para longe se não mudasse o
comportamento agressivo. Inúmeras sessões de terapia, médicos estrangeiros
que alegavam ser um comportamento da adolescência que passaria.
Remédios controlados. Podia notar as olheiras arroxeadas dos meus pais,
exaustos. Até que um dia não houve mais nada. Sem saber como reagir, e
ajudar Luca, o enviaram para um colégio militar, acreditando que no
momento seria o melhor para ele. E assim, nos separaram. Quebraram o elo
que carregávamos desde o nascimento.

O mais triste de tudo isso? Não pude me despedir, e dizer que mesmo
assim ainda o amava, e sempre estaria do seu lado.
Fecho a porta do carro, encosto a cabeça no assento do carro. Como essa
vadia pode fingir que não me reconheceu? Desgraçada. Continua a mesma
dissimulada de sempre.

— Maldita — resmungo socando o volante várias vezes.

Controlei-me para não agarrá-la pelo pescoço. Fingir que estava tudo
bem, que ela era uma mera estranha foi um sacrifício enorme para mim.
Encarar seus olhos castanhos, brilhantes. Luca estava certo esse tempo todo.
Ela seguiu com sua vida normalmente, mesmo depois de descarregar a arma
em cima do seu marido. Não tem remorso por matar alguém? Por quase me
matar?

— Vadia. Vadia. Deve estar transando com todos os homens de Nova


York. Era disso que gostava lembro muito bem — converso sozinho.

Quantas vezes cheguei exausto do trabalho, e Cindy estava no jardim se


exibindo para os vizinhos. Oferecendo-se como uma qualquer. Então, era
obrigado dar o que ela queria. Sua boca gritava, gemia, mas no fundo sabia
que estava gostando e querendo mais. Não entendo o porquê ficava brava
comigo. Foder sua boceta com força, era prazeroso, e como dizem tapas de
amor não dói.

Duvido que aquele delegado de merda, consegue satisfazer uma mulher


como Cindy. Talvez devesse ensiná-lo como se deve tratá-la.

Sinto o celular vibrando dentro do bolso da calça. Enfio a mão para pegá-
lo, e o nome “Sheron” surge na tela. Trinco o maxilar, bufando baixo. O que
esse encosto quer comigo? Estávamos juntos até quase agora.

— Fala — atendo. — Não Sheron, não encontrei com Camilly. — Minto


descaradamente. — Hum. Não lhe devo satisfação. Sim, sei que nos
conhecemos desde o ensino médio, e daí? Não estou mentindo, acredite se
quiser. Era só isso? Então, tchau. — Encerro a chamada, desligando na sua
cara.

Alguns anos atrás, enquanto fazia uma viagem de negócios, encontrei por
acaso com Sheron. Essa mulher foi minha primeira namorada aos dezesseis
anos. Fiquei comovido com sua história, o quanto era infeliz ao lado do tal
delegado Brian. Por fim, aceitei ajudá-la se livrar do marido. Aluguei uma
pequena casa, próxima a minha com Camilly, e a mantive por perto como
amante. Era divertido tê-la por perto, mas confesso que seu velório, realmente
foi hilário. Enfim, nosso envolvimento se tornou perigoso para meu
casamento, então, dei dinheiro para que viajasse para fora do país.

Não preciso, não quero nenhuma relação. Preciso estar limpo para receber
de volta minha esposa. Eu sei que ela ainda está chateada, e não entende a
profundidade dos meus sentimentos por ela. Que outro homem perdoaria sua
mulher depois de tudo que fez? Em minha opinião, é mais do que prova de
amor, é renunciar a si mesmo.

Inquieto, me ajeito no banco, sentindo algo se agitar abaixo do quadril.


Estou excitado, desejoso por fodê-la. Olho para todos os lados conferindo a
proximidade das pessoas, e descaradamente enfio uma mão dentro da calça.
Seguro meu pau, acariciando a cabeça. Fecho os olhos recordando da
respiração ofegante que exalava por seus lábios há pouco tempo.

Com a outra mão, aperto o nome de Luca no celular. Logo que ouço sua
voz, faço um pedido.

— Quero que entre na casa dela, destrua tudo. Faça parecer com um
assalto, mas quero uma calcinha usada como presente. Pode fazer isso? —
Continuo tocando-me. — Obrigado irmão.

Jogo o aparelho em cima do banco do passageiro. Perdido em lembranças


eróticas, não paro de movimentar a mão. Subindo, descendo, cada vez mais
rápido, até explodir em êxtase e gozo.

— Minha você é minha — repito.


Respiro fundo atento aos detalhes do suposto encontro casual. Claro, que
aquele psicopata planejou tudo nos mínimos detalhes para desestruturá-la.
Conheço bem esse perfil. Como agressor, sempre utilizou de meios de tortura
contra vítima, que, no caso era sua própria esposa. Agressão física,
psicológica. Esse cretino está querendo brincar com minha mulher, envolvê-
la na sua teia. Mas, dessa vez, eu vou acabar com esse desgraçado.

Finjo que estou calmo para não causar alvoroço, piorando a situação. O
sangue se agita nas minhas veias. Minha vontade é ir de encontro e estourar
sua cara a ponto de deixá-lo irreconhecível. Queria ver se é tão machão com
um homem, ou, se bate só em mulheres. Covarde, filho da puta. Tento
controlar os pensamentos homicidas que rondam minha cabeça.

Afago seus cabelos, puxando sua cabeça apoiando na curva do meu


pescoço. Camilly está gelada, a pele pálida e, mãos trêmulas. Por mais que
tente transparecer que é forte com tudo que está acontecendo, sei que está
sofrendo e com medo. A sensação de impotência me mata aos poucos. Se ao
menos tivéssemos provas que Spencer forjou a própria morte, mas não, só
temos suposições criadas pela vítima que atirou no suposto esposo. Nenhum
juiz aceitaria um caso como esse.

— Você deveria tomar banho. Vou preparar um chá — digo, enquanto


beijo suavemente seu rosto.

— O que seria de mim sem você?

— Não sei, e não quero saber, já que, não vai se livrar desse delegado tão
fácil. Agora vai. — Ajudo-a levantar e dou um tapa na sua bunda.

Sorrindo maliciosamente, ela caminha em direção ao quarto. Não consigo


desviar os olhos do quadril rebolando de um lado a outro, vidrado,
enfeitiçado. Meu pau se agita dentro da cueca, por um momento perco a
capacidade de raciocínio, bom, com a cabeça de cima. Com muito esforço,
desvio os olhos e, penso em coelhinhos fofinhos, antes que pule em cima
dela, assim como um animal e sua presa.

Junto as pernas espremendo as bolas, que, nesse momento devem estar


azuis, com certeza, e espero até ouvir o som do chuveiro ligado. Vislumbro o
corpo torneado da minha morena, cada curva, molhado.

— PORRA! FOCO... FOCO... — Bato com a palma da mão no rosto três


vezes.

Levanto do sofá, ajeito o saco dentro da cueca e, com o pau duro, ando
pela sala em busca do celular. Tenho certeza de que se Camilly me
encontrasse assim, iria saber aproveitar muito bem, mas, tenho que trabalhar.
Primeiro trabalho, prazer depois. Apesar de que uma rapidinha seria no
máximo dez minutos.

— Foco — repito baixo.

Coloco a água para ferver, enquanto percorro as mensagens do celular e,


até agora, nada de útil. Só informações vagas, e coisas que sabemos. Essa
família é mais esperta do que aparenta. Deve ter conta no paraíso fiscal, não é
possível que sejam pessoas de bem, cobrindo as atitudes do cretino do filho.

— Brian? Você vai dormir aqui? — Cami grita do quarto.


Tudo que eu mais queria era dormir grudado, ou melhor, dentro dela a
noite inteira. Mas, quero voltar para delegacia, preciso conversar com
detetive Parker.

— Hoje não princesa. Tenho que voltar para a deleg... — Sou calado por
uma visão maravilhosa.

Camilly, encostada no batente da porta, usando seu roupão branco,


semiaberto. Sorrindo abertamente, enquanto gira o cordão que devia mantê-lo
fechado. Boquiaberto, avanço em sua direção como louco.

Aproximo-me, agarro sua cintura com os braços e a suspendo no ar. Meus


lábios encaixam aos seus em um beijo feroz e apaixonado. Suas pernas
enlaçam minha cintura, pendurando-se. Ando de fasto alguns passos, esbarro
na mesa. Desço a boca por seu pescoço, e continuo percorrendo a língua até
tocar os bicos entumecidos. Circulo carinhosamente, e os abocanho com os
lábios, sugando, chupando.

Ondulando o quadril contra o meu, ela se contorce excitada. Abro de vez


o roupão, deixando seu corpo nu exposto. Desço uma mão acariciando sua
barriga, percorrendo o caminho até o centro úmido. Gemendo, joga o corpo
para trás com os olhos fechados. Sem pudor, ardendo de desejo, penetro os
dedos dentro da sua boceta escorregadia, molhada, pulsante. Entrando,
saindo, roçando no seu clitóris inchado, o cheiro de sexo preenche a cozinha,
inebriando nossos sentidos.

Seguro suas pernas empurrando para o meio da mesa, apoio nos meus
ombros. Posso ver os brilhos naqueles olhos castanhos, ansiosa, desejando e
prevendo meus movimentos. Deslizo a língua suavemente por sua fenda,
saboreando o néctar da sua excitação. Subo e desço diversas vezes. Sugo com
força o clitóris, o som dos gemidos é como uma doce melodia. Penetro
novamente os dedos na sua boceta fodendo-a com força junto com minha
boca que brinca deliciosamente, lambendo, chupando.

Desesperada, em pleno êxtase. Agarra-se em meus cabelos puxando. Mas


não paro. Quero satisfazer essa tentação, essa demônia de saia que virou meu
mundo de cabeça para baixo. Quero amar, foder, abraçar, cuidar, quero ela
para mim, sempre comigo.
— Oh Brian vou gozar — resmunga entre sussurro-os

Não demora, e sinto o líquido quente na ponta da minha língua, junto com
espasmos do corpo ondulando por cima da mesa. Ergo os olhos apreciando a
melhor vista de todas. Engulo até a última gota e, afasto-me. Recuo alguns
passos para trás, ofegante e com as bochechas coradas, Camilly tenta se
recuperar do orgasmo.

Vê-la aberta e exposta daquele jeito, querendo mais, me enlouquece. Mas,


ela está merecendo um castigo por sair diversas vezes, sem me avisar se
colocando em risco. Além de ficar andando com aquele tal de capitão, quem
no inferno tem apelido de capitão?

Deslizo a língua por entre os lábios limpando os resquícios.

— Vem cá vem — me chama com a voz rouca.


— Tenho que ir para delegacia — respondo desdenhando.

— O quê? Só pode ser brincadeira. — Senta rapidamente, puxando as


abas do roupão.

— Não. Falamo-nos depois, e não saia de casa. Estou falando sério. —


Beijo sua testa me despedindo.

Mais que depressa, pego a carteira, celular e chave do carro. Saio do


apartamento com passos rápidos, antes que pudesse ser atacado por uma
cadeira voadora. Pude ver a fumaça saindo das suas narinas, irei pagar bem
caro por isso, tenho certeza de que ela não deixará passar batido essa afronta,
mas por hora, valeu a pena.

Estaciono em frente à delegacia. Noto uma movimentação estranha na


entrada. Desconfiado, e curioso, me aproximo. Desvio de algumas pessoas
que gritam alteradas umas com as outras. Quero saber que zona é essa na
minha jurisdição. Catarine grita por cima pedindo calma, enquanto outros
policiais também tentam apaziguar a situação. Minha equipe se esforça para
resolver os problemas quando não estou presente, reconheço o esforço do
meu pessoal.

Junto os dois dedos na boca, e assovio alto, forte.

— QUE PORRA É ESSA? — Altero o tom de voz, atraindo atenção para


mim. — O que está acontecendo aqui?

Novamente se instala o caos, todos querendo explicar de uma vez.


Respiro fundo, pensando em como resolver a situação. Talvez jogar todos
dentro de uma cela e deixar que se matem, é uma hipótese. Não, melhor não.

— Quero que uma pessoa fale por vez, ou vou prender todo mundo.
Entenderam?

Sento na minha mesa, organizo a entrada de um por um na sala para que


pudesse ouvir o relato do acontecido. Tudo começou com uma briga, e no
desenrolar, uma patrulha pegou os arruaceiros no flagra, além, de
perturbarem a ordem pública, estavam em posse da nova droga que estamos
investigando. Os garotos, sentados ao lado dos pais, empurraram um para
outro, alegando que não eram os portadores da substância. Infelizmente,
menores se sentem coagidos em frente aos familiares, o que, acaba
atrapalhando a investigação. Peço para que os pais esperem na sala ao lado.

Conduzo a conversa com os garotos de forma descontraída, e em uma


linguagem menos formal para ganhar confiança. Após meia hora, como
esperado, tenho a informação de quem vendeu a droga para eles.

— É... Eu... Tirei uma foto da vendedora. Sabe, ela era muito gostosa. —
Sou surpreendido por um dos meninos.

— Cara, que babaca. — O amigo resmunga.

— Posso ver essa foto? — Peço sutilmente para não o assustar.

E quem se assusta no final, sou eu. A mulher na imagem é a mesma que


estava no restaurante com Spencer. Aquela que achei ser sua nova vítima.
Dou zoom na imagem, aproximando o rosto. Ela tem algo familiar. Envio a
foto para meu celular, e encerro o interrogatório. Como parte do acordo,
decido não fichar os garotos, mas deixo como alerta que não terá uma
segunda vez.

Coloco a imagem no banco de dados da polícia, buscando alguma


informação sobre a possível traficante. E nada, nunca foi presa, ou procurada.
Qual a ligação do Spencer com essa droga? Além de agressor, é traficante?
Aparentemente é engomadinho demais para fazer tal coisa. Encaminho uma
mensagem para Ethan com a foto da mulher, se tem alguém que pode
descobrir, é ele.

Acho que preciso fazer uma visita na casa do professor Luca, se ele tem
uma ligação com aquele louco maldito, e ele está em Nova York, pode ser
que vá até sua casa. E mais, leve a mulher junto. Saio da sala trancando a
porta. No caminho para saída, encontro com o detetive Parker em frente à
máquina de café.

— Pegue dois, e vem comigo. — Faço gesto com a cabeça indicando a


porta.

Parker é um dos responsáveis pelo caso do novo entorpecente. E essa


mulher é a possível traficante, nada mais justo que o detetive me ajude a
pegá-la.
Será uma noite bem agradável dentro do carro.
Como esse cretino se atreve ir embora e, me deixar desse jeito? Está
louco? Isso não vai ficar assim, espero que esteja ciente que darei o troco e
com juros. Frustrada, decido tomar banho para apagar o fogo que ainda
queima dentro do meu corpo. Com os olhos fechados, embaixo da água
morna, é como se pudesse sentir sua boca entre minhas pernas, a barba por
fazer arranhando a pele sensível. Sinto um arrepio percorrendo o corpo, indo
diretamente até minha boceta, ainda desejosa por estar com ele. Brian se
tornou um vício. Depois de tudo que passei não acreditava que encontraria
alguém que pudesse preencher o espaço sombrio que tomava conta da minha
vida. Por mais confiante que demonstrasse ser, sempre tive medo de ser
descoberta pela polícia, e presa por homicídio.

Homicídio. É engraçado pensar nessa palavra, e confesso que me sinto


uma tola diante da situação. Por que nunca confirmei a morte de Spencer?
Com dinheiro, advogados, poderia ter resolvido esse problema há muito
tempo. Josefy teria me apoiado sob quaisquer circunstâncias. Teria
respondido por tentativa de homicídio, mas, poderia alegar legitima defesa,
levando em consideração o histórico de agressão, laudos médicos, e provas
concretas que era a vítima de um agressor violento. Quanto mais penso sobre
isso, tenho a certeza de que o trauma psicológico é maior do que esperava. O
medo de confrontar o agressor, relembrar os momentos dolorosos e
humilhantes, diante de outras pessoas, nos enfraquece. Não importa o quanto
se ache forte, ou melhor, se faça de forte, por dentro você está despedaçada,
em frangalhos implorando por socorro.

Involuntariamente, levo as mãos até a barriga. Fecho os olhos, e as


lembranças da noite que perdi meu bebê invadem violentamente meus
pensamentos. Odiava Spencer, mas dentro do meu ventre tinha uma vida.
Claro, que os médicos que estavam de plantão naquela noite, e prestou o
atendimento, não acreditaram que tinha sido uma queda da escada. Seus
olhares na minha direção me encaravam com pena e desconfiança. Queria
contar a verdade, dizer que tinha sido espancada, que precisava de ajuda, mas
no interior do meu ser, me obrigava acreditar na mentira, em uma história
deturpada de alguém que caiu e se machucou gravemente. E, agora? Spencer
tirou algo importante que jamais poderá ser reparado. Pressiono os lábios,
contendo o som do choro que insiste em escapar por entre os lábios.

Aos poucos as pernas cedem, colocando-me ajoelhada no chão frio.


Desgraçado, maldito, roubou anos da minha vida, tirou minha dignidade, e
agora, o que mais quer de mim? Já tirou tudo, tudo. Poderia me deixar em
paz.

— Por favor — suplico sozinha no banheiro.

Não sei ao certo quanto tempo fiquei prostrada no chão. Apoio às mãos
na parede e, levanto lentamente sentindo as dores nos joelhos. Engulo os
soluços de desespero, e termino o banho.

Enrolo a toalha em volta do corpo, e em frente ao espelho encaro o


reflexo de uma mulher com olheiras, olhos inchados e avermelhados.

— Como esse cretino ainda pode me abalar tanto? — resmungo.

Bato dois ovos no prato preparando a omelete. Sinto-me aliviada, depois


de colocar para fora tudo que estava preso dentro do meu peito. Estou com
fome, e preocupada com aquele delegado metido a príncipe encantado que
não mandou nenhuma mensagem desde que saiu daquele jeito, cretino.

Torradas, omelete, suco de laranja. Refeição completa. Puxo a cadeira e


me sento, pego a torrada e passo geleia de morango, levando a boca para
mordê-la, mas sou interrompida pela campainha tocando. Reviro os olhos,
bufando baixo. Não posso ao menos comer sossegada? Continuo sentada na
esperança que a pessoa desista, e não toque mais, mas é inútil. Resmungando,
levanto e sigo em direção à porta. Nas pontas dos pés, espio através do olho
mágico, e para minha surpresa, Capitão T.

Destranco a trava de segurança, e abro. Encosto no batente, esticando o


braço impedindo sua entrada.

— O que faz aqui? — questiono, desinteressada.

— Uou. É assim que recebe os amigos, senhorita? — Sorri expondo suas


covinhas sensuais.

— Não, mas na última vez, não deu muito certo.

— Ah tá, tá, que seja. Então, não quer saber o que tenho aqui. — Ergue o
envelope pardo no ar.

Droga! Se deixá-lo entrar terei problemas com Brian, mas, preciso saber o
que tem lá dentro. Com certeza é algo importante, senão, ele não iria se der o
trabalho de vir até aqui.

— Okay. Você venceu.

Afasto-me recuando alguns passos, dando-lhe acesso. Enquanto passa por


mim, consigo sentir a fragrância amadeirada do seu perfume. Agora, entendo
o porquê tantas mulheres se jogam aos pés dele. Pobres coitadas, não sabem
na furada que estão entrando.

— Atrapalhei alguma coisa? — aponta para a mesa com minha comida.

— Sim, atrapalhou, mas o que tem a? — Faço gesto pedindo que sente no
sofá.
— Veja você mesma. — Estica o envelope para mim.

Rapidamente abro o papel quase o rasgando no processo. Dentro contém


dois documentos com título de “certidão de nascimento”. Revezo olhares
entre os papéis, e John. Sem entender o que está acontecendo, leio
atentamente o que está escrito.

“Nome, local de nascimento, data, hora, nome dos pais, mas o principal
GEMELAR um Luca, e GEMELAR dois Spencer”

Gêmeos? Gêmeos? Não pode ser. Luca e Spencer, irmãos? Não, isso é
falso. É uma brincadeira de muito mau gosto. Impossível, eu saberia se ele
tivesse um irmão, ainda mais gêmeo.

— É falso, John. Spencer não tem um irmão. Convivi com ele tantos
anos, e ninguém nem mesmo a família falou sobre isso. E Luca? Meu
professor? Isso não está certo.

Descontrolada, ando de um lado a outro balançando os papéis no ar.


Como isso pode ser verdade? Quer dizer, é uma conspiração contra mim?
Isso não é a porra de um filme que planejam a vingança por anos.

— Calma querida. Quer um chá?

— Não, não quero chá. John onde conseguiu isso?

— Revelo o milagre, jamais o santo. Sinto muito. Assim que se acalmar,


vou contar tudo que sei sobre esse irmão.

— Conte-me, agora. — Sento ao seu lado no sofá.

Ouço atentamente cada detalhe, desde o nascimento dos gêmeos, até o


momento da separação na adolescência. Porém, não consigo entender como a
família escondeu esse segredo por tantos anos, de tudo e todos. Mesmo que o
filho fosse rebelde, porque mandá-lo para longe, e apagar sua vida como se
nunca tivesse existido. Tenho a sensação de que tem algo mais por trás disso
tudo.

— É uma família muito estranha.


— John, pode descobrir a verdade sobre o filho? — questiono.

— Posso, mas vai levar um tempo. E tem um custo, sabe disso.

— Eu pago — respondo prontamente.

Agindo impulsivamente, pulo do sofá e corro até o quarto. Com a chave


do carro, e celular em mãos, despeço-me do capitão, que me encara sem
entender nada.

— Ei. Onde está indo?

Ouço sua voz de longe me chamando. Mas, não dou a mínima atenção,
tenho algo mais importante para fazer.

Dirijo pelas ruas de Nova York, porém as imagens das certidões de


nascimento não saem dos meus pensamentos. É claro, Luca comentou sobre
ser o irmão bastardo da família. Como pude ser tão tola? E essa mulher, a
Sheron. Namorada do Spencer?

Estaciono o carro em frente à casa de Luca. As luzes da sacada estão


apagadas, na mais completa escuridão. Será que não está em casa?
Determinada a descobrir mais sobre seu passado, desço do carro, e vou em
direção ao portão de entrada. Mas, sou surpreendida por alguém me
agarrando pela cintura e cobrindo minha boca com uma mão. Debato-me na
tentativa de fugir, balanço as pernas, braços, e ainda assim, sou arrastada para
longe.

Spencer. Spencer. É ele, ele vai me matar, agora?

Ouço o som de uma porta de carro e uma segunda voz masculina, mas
estou tão desesperada que não ter qualquer raciocínio logico, é impossível.
Meu agressor, gira o corpo me jogando no banco de trás, e entra ao meu lado,
batendo a porta com força. Pronta para gritar, chutar, arranhar, morder, o que
fosse necessário para sobreviver.

— Mas, que porra você acha que está fazendo, Camilly?

Engulo em seco ao reconhecer a voz do meu querido delegado. No banco


da frente, firmo os olhos e reconheço o detetive Parker da equipe de
investigação especial da delegacia.

— Eu que pergunto, por que estão aqui? — Tento desviar a atenção.

— Não vem com essa. Por que veio até a casa desse cara?

— Eu... Eu... — gaguejo. — Descobri uma coisa muito importante. —


Limpo a garganta.

— Pode começar falar, sabe que está encrencada. — Posso sentir seus
olhos fuzilando-me.

Abro um sorriso amarelo, sem graça. Conto em detalhes tudo que


descobri através das informações de John. Perplexos, paralisados,
permanecem sem reação por alguns minutos, porém surge uma questão.

— Como Luca não se parece com Spencer se são gêmeos? — Parker,


questiona.

— Estava pensando isso agora mesmo — Brian responde com expressão


confusa.

— Eu acho que sei. — Atraio a atenção para mim. — Aquela mulher, no


dia que nos encontramos me disse que fez várias cirurgias plásticas fora do
país. Luca deve ter feito a mesma coisa.

— Hum. Bem pensado. Não é à toa que amo essa mulher. — Delegado
sorri, deslizando as pontas dos dedos por meu braço.

Conversamos por horas, e mesmo após Brian insistir que eu deveria


voltar para casa, convenci que devia participar da tocaia. O sol apontava no
horizonte indicando que o dia estava amanhecendo, quando o carro de Luca,
encostou em frente ao prédio. Abaixamos as cabeças para não sermos
descobertos. A sensação é de estar participando de um filme do 007 espião. A
adrenalina, o sangue bombeando rápido.

Parker, discretamente, ergue sua câmera fotográfica, registrando o


momento que Luca, e para nossa surpresa, Sheron, e Spencer descem do
carro. Ao vê-los juntos, sinto um calafrio arrepiando os pelos da minha nuca.
É como ver um filme de terror.

E essa mulher, ahh essa mulher.


Encontrar Camilly em frente à casa de Luca foi uma grande surpresa,
minha vontade era torcer aquele lindo e sexy pescoço. Colocando-se em risco
mesmo quando pedi que não saísse de casa. Essa mulher nunca irá me ouvir,
age sempre por conta própria colocando sua vida em risco. Por outro lado,
entendo que deseja se ver livre dessa situação de merda. Após anos lidando
com casos de agressões domésticas, posso compreender as feridas que
marcam as almas dessas mulheres. Porém, conseguir informações sobre esse
trio de criminosos no momento é mais importante que discutir a relação com
Camilly.

Permanecemos escondidos dentro do carro observando a movimentação.


Parker com sua câmera registra à entrada da casa. Quer dizer que é como
suspeitávamos, mas somente fotos dos três juntos não serve como prova ou
qualquer outra evidência, precisamos de provas concretas. De canto de olho
posso ver o quanto a mão de Camilly está tremula, e sua respiração
descompensada. Infelizmente qualquer passo em falso que dermos,
colocamos a nossa operação em risco. Não temos opção, se não, aguardar e
continuar vigiá-los.

Luca abre a porta-malas com a chave do carro, e retira uma pequena mala
de mão. Ambos conversam gesticulando. A mulher, chamada Sheron.
Aparentemente não mostra interesse na conversa, já que não desvia os olhos
da tela do celular. Provavelmente seduzindo jovens para usarem suas drogas,
maldita.

— O que vamos fazer? — Cami, esfrega as mãos impacientemente.

— Por enquanto, nada. Não temos nada, só pessoas conversando na rua.

— Senhor. E aquela mala, pode estar com a nova substância para venda
— Parker, comenta.

O clima dentro do carro é tenso, exaustivo, sufocante. A sensação de


impotência é esmagadora. Temos uma traficante, um agressor de mulheres e
um cúmplice que ainda não sabemos do que é capaz. Entre todos eles o meu
maior receio é esse irmão gêmeo. Por qual motivo foi afastado de sua
família? E por que mudou completamente seu rosto com cirurgias plásticas?
Pessoas normais não trocam de rostos como se mudassem de roupa. É um
processo longo e doloroso.

Spencer, pega a mala das mãos de Luca, abre o zíper e confere o que está
dentro. Fecho os olhos torcendo para que pegue o material na mão expondo
para nós, mas é só um desejo inútil. Sorrindo, ele puxa a carteira do bolso, e
entrega uma quantia em dinheiro para seu irmão.

Após exatos vinte minutos, despedem-se. Cada um segundo um caminho


diferente. Sheron em um táxi, Spencer em outro, e Luca entrando em sua
casa.

— Vamos instalar escuta na casa desse desgraçado.

— Mas, sem um mandado, senhor? — Parker questiona.

— Não vamos conseguir um mandado só com o que temos, precisamos


achar um jeito de entrar e instalar o equipamento.

— Eu posso ajudar. — Cami, levanta a mão timidamente.

— Como? — questiono.
— Posso entrar na casa dele, e instalar. Tenho certeza de que ele não
desconfiaria de mim, além do mais, sou a única que posso me aproximar sem
levantar quaisquer suspeitas.

Como é que é? Acho que não estou escutando muito bem, ela quer entrar
na casa desse desgraçado, instalar o equipamento correndo o risco de ser
pega, e deus lá sabe o que pode acontecer? Definitivamente essa mulher não
tem juízo.

— NÃO — respondo prontamente, sem deixar espaço aberto para


diálogo.

— Brian, querido. Pensa bem, ele não irá me fazer mal, por enquanto.
Vocês podem esperar do lado de fora, e qualquer coisa anormal, peço ajuda.
Por favor.

— É senhor, concordo com a senhorita. — O detetive apoia o argumento


de desmiolada de saia.

— Ainda assim, é perigoso — retruco, quase cedendo.

Encaro através da janela para fora do carro, mas consigo sentir os


olhares em minha direção. Digamos que cedi por pura pressão, só que ainda
não gosto nem um pouco disso. Combinamos nos mínimos detalhes como
seria a suposta operação. O mais engraçado é notar o quanto Camilly está
animada.

Entrego a chave do meu carro para o detetive, e sigo cautelosamente até


onde Cami havia estacionado. Entramos, olhando ao redor a todo o momento.
Permaneço calado, é como se as palavras tivessem fugido, não tenho o que
falar, pior, não quero conversar. Já perdi um amor, sei como é a dor de se
perder alguém que ama, e agora, isso. Colocá-la em risco, de frente ao
inimigo, me traz sentimentos que não consigo descrever.

— Vai dar tudo certo. — Ela segura por cima da minha mão que segura o
câmbio de marcha.

Engulo em seco, acenando com a cabeça positivamente, mas nem por um


momento ouso olhar em sua direção. Encarar os olhos castanhos, e não ser
capaz de garantir que tudo acabará bem, me mata por dentro. A todo o
momento, desvio das suas tentativas de puxar assunto. Fugindo como
covarde, ligo o rádio do carro, preenchendo o silêncio com música.

Estacionamos em frente ao seu prédio. Respiro fundo.

— Posso ir embora com seu carro, amanhã cedo o devolvo sem falta —
digo com a cabeça baixa.

— O quê? Como assim? Você vai embora? Por que não vai dormir em
casa? — Posso sentir em seu tom de voz que está surpresa, assustada.

— Só quero ficar sozinho. Por favor, entenda.

— Faça como quiser delegado — retrucando, salta rapidamente batendo a


porta com força.

Por vezes quando esse sentimento de medo tomava conta da minha alma,
corria para o cemitério, buscar consolo no túmulo de Sheron. Mas, desde que
senti o cheiro do perfume da cafeteria, tenho uma sensação estranha sobre
isso. Não contei para ninguém, é muito pessoal, e com certeza diriam que
estou louco. Impossível outra pessoa ter produzido a mesma fragrância.
Confesso que cheguei a pensar que ela estava viva, mas como poderia? Qual
seria a explicação para forjar a própria morte? Éramos felizes, tínhamos uma
boa vida, sua única reclamação era minha falta de tempo devido ao trabalho
na delegacia.

Guardo o carro na garagem, abro a porta da cozinha, e entro na casa


silenciosa. Em alguns momentos o silêncio é o melhor conselheiro para
colocar os pensamentos em ordem. Acendo o interruptor, jogo a chave em
cima da mesa. Encosto na pia, e olho ao meu redor. Muitas das coisas que
permanecem na casa foram escolhidas por Sheron. Na realidade, tudo. As
cores das paredes, móveis, enfeites, cortinas. A sensação de traição pulsa
dentro do meu peito me sufocando.

Impulsivamente, chuto a cadeira para longe. Encaro a geladeira repleta de


imãs coloridos. Agarro-os, jogando na parede, estilhaçando-os em pedaços.

— Desgraçada — digo entre dentes.

Corro até o quarto de hóspedes, onde as caixas com roupas e, pertences


da falecida estão guardados. Uma a uma, entulho no quintal criando uma
pilha. Levando junto às cortinas, almofadas, roupas de cama.

Sinto olhares curiosos dos vizinhos. Claro, devem estar pensando que
enlouqueci de vez. Só posso dizer “cuidem das suas vidas de merda”.

Retorno para dentro da casa, recolhendo todas as fotos, porta-retratos,


jogando junto da pilha. Não quero mais nada, nada que faça me lembrar do
passado. E como último ato triunfal, despejo álcool por cima das caixas.

— Se você estiver viva — penso alto, resmungando.

Acendo o fósforo, e o encaro queimando por alguns segundos antes de


jogá-lo. Como esperado, as chamas se alastram. A fumaça sobe, nublando o
céu estrelado. Cruzo os braços sobre o abdômen. Sinto-me livre, liberto de
uma culpa do passado.

De canto de olho, vejo algumas pessoas da vizinhança se aproximando.


Coloco o melhor sorriso no rosto, e finjo que está tudo bem. Explico que
estou dando fim em alguns materiais que não eram mais de utilidade, justifico
criando uma desculpa esfarrapada. E como bom homem, e vizinho exemplar,
todos aceitam as justificativas, e retornam para o conforto dos seus lares.

Engraçado. E se eu estivesse queimando um corpo? Poderia ser um


assassino que ninguém jamais suspeitaria, porque sou simpático e tenho boa
conduta. Infelizmente como diz o ditado “não se julga um livro pela capa”.
Só que é exatamente assim que funciona. Empurro com um pequeno galho
algumas fotos que caíram longe do fogo. Talvez devesse estar me sentindo
horrível por estar queimando as coisas dela, mas definitivamente, estou muito
bem.
Enfio a mão no bolso da calça para pegar o celular que está vibrando. Na
tela consta como “número desconhecido”. Receoso, atendo a ligação.

— Brian. Alô. — Só consigo ouvir a respiração da pessoa do outro lado


da linha. —Quem é você? Posso te ouvir.

— Eu posso te ver — responde uma voz feminina.


O timbre dessa voz, sotaque. Reconheço imediatamente. Giro em volta
com o celular na orelha, se comportando como louco tentando encontrá-la.
— Sheron? — respondo no telefone.
Repito seu nome várias vezes, porém só ouço o som da chamada sendo
encerrada.
Por que Brian não atende o celular? Desde que me deixou em casa, senti
que algo estava errado. Seus olhos pareciam vagos, perdidos em
pensamentos. Nunca vi o delegado daquele jeito. Será que novamente está
escondendo alguma informação de mim? Acho que não, estamos juntos nessa
com o mesmo propósito. Talvez devesse o deixar ter essa noite para
descansar, e colocar os pensamentos em ordem. Em algum momento da vida
precisamos de um tempo sozinho.

Preparo uma caneca de chá de camomila para acalmar os nervos, sento no


sofá, soprando suavemente a fumaça que sobe. Coloco as pernas curvadas por
cima das almofadas, e encaro a janela. Os primeiros raios de sol despontam
batendo na mesa de canto da sala. Sinto dores nos ombros de ficar curvada
dentro do carro durante a noite inteira. Realmente ser policial não é uma
tarefa fácil. Mas, não consigo esquecer aqueles três juntos, e mais, como
Luca pode ser irmão do Spencer. Essa é uma informação quase impossível de
digerir. Convivi tantos anos com aquele homem, e nunca se quer mencionou
ter um irmão, e gêmeo.

E por que seu irmão criou uma identidade nova, inclusive, rosto novo
também? É como se estivesse fugindo, escondendo-se.
Coloco a caneca no chão, aconchegando-me ainda mais entre as
almofadas, causando uma sensação de conforto no meu corpo. Minhas
pálpebras começam pesar, e a cada piscada sinto que estou mais perto de
apagar completamente. Assim que descansar um pouco, irei até a casa de
Brian checar se está tudo bem preciso ter certeza de que meu ogro metido a
príncipe encantado se encontra em perfeito juízo.

“O cheiro forte de desinfetante atingi meu nariz de cheio. Abro os olhos e


a primeira coisa que vejo é o teto branco com flores coloridas. Assustada,
sento na cama. A colcha estampada cobre o lençol branco do colchão. Os
mesmos móveis, aquela maldita porta do banheiro. Ergo os braços,
percorrendo os olhos por meu corpo. Por que estou com essa camisola? Isso
é um pesadelo. Camilly, não é real, não pode ser real.

— Querida... Cindy, meu amor. — A voz rouca e embriagada de Spencer,


me causa pânico.

Tento levantar, mas não consigo. Minhas mãos, e pés, estão amarrados
com cordas, prendendo-me no lugar. Não posso fugir. O som dos seus passos
se aproximando do quarto, faz com que meu coração bata acelerado. Quero
gritar por socorro, implorar por ajuda, mas quem viria ao meu socorro?

— Cindy... Você está usando a camisola que mandei?

Puxo desesperadamente as cordas em uma tentativa inútil de fuga,


causando hematomas nos pulsos e sangrando-os. De repente a porta se abre
revelando o agressor. Porém, não é Spencer, e sim seu irmão, Luca.
Confusa, atordoada com a situação, não sei o que fazer, além de ficar
paralisada. Seus olhos azuis me observam com intensidade. Quero cobrir as
partes expostas do corpo. Abro a boca para suplicar, mas é como se as
palavras tivessem presas na garganta.

Encostado no batente da porta, lentamente Luca puxa o cinto da calça.


Reconheço muito bem aquele cinto, Spencer tentou me enforcar com ele
inúmeras vezes durante o sexo, mas por que Luca tem um igual?
Como um leão prestes a pular em sua presa, ele caminha em direção da
cama. Roço a bunda no colchão tentando criar uma distância, mas a cada
centímetro que recuo, Luca avança sobre a cama. Ajoelhado “na minha
frente, estala o cinto sorrindo maliciosamente.”

Desperto em um pulo. Minhas mãos estão trêmulas, respiração ofegante,


tenho a sensação de que o coração irá saltar para fora do peito. Que pesadelo
infernal foi esse? Literalmente essa situação está mexendo mais que o normal
com o meu psicológico. Com a blusa grudando nas costas devido ao suor,
decido tomar banho.

Embaixo do chuveiro, deixo a água morna levar embora quaisquer


resquícios daquele pesadelo. Por mais que não queira lembrar-me do sonho,
algo me deixou intrigada. Tantos detalhes, por que o cinto? E por que Luca
usava o cinto do Spencer? O jeito que engatinhou subindo na cama é muito
semelhante ao seu irmão. Aquele olhar, não sei. Devo estar ficando louca, só
pode.

Estaciono em frente à casa de Brian. No jardim um monte de cinzas, e


algumas brasas ainda queimando. O que aconteceu aqui? Desço do carro, e
me aproximo cuidadosamente. Posso ver que são restos de fotos, e outras
coisas que não consigo reconhecer. Desconfiada, sigo para a porta da frente.
Olho para todos os lados, conferindo se vejo suspeito, mas a vizinhança de
Brian é basicamente composta por idosos, totalmente pacato.

Bato na porta uma, duas, na terceira vez, chamo seu nome e não tenho
resposta. Preocupada, seguro na fechadura e a abro. Para minha surpresa não
estava trancada. Empurro cautelosamente, e entro.

— Brian? Você está aí?

Ao meu redor os móveis da sala em pedaços espalhados pelo chão, é


como se tivesse passado um furacão dentro da casa.

— Brian? Brian? — Cada cômodo que avanço, encontro o mesmo


cenário. Tudo destruído em pedaços.

Sinto o ar faltando dos meus pulmões. Para a casa estar desse jeito,
alguém pode ter vindo atrás do meu delegado. Será que o levaram, ou pior,
matou ele. Encosto na parede recuperando o fôlego. Não está na delegacia
porque já falei com Parker, a casa desse jeito. Spencer descobriu tudo e para
se vingar, pegou Brian.

— Brian — sussurro em uma última tentativa frustrada.

— Estou aqui. — Sua voz fraca, soa vinda do final do corredor.

Acelero os passos na direção, empurro a porta rapidamente, e a partir


daquele momento meu mundo desmorona.

No canto do quarto na junção de duas paredes, vejo um grande homem


sentado no chão, com os braços envoltos dos joelhos encostado ao peito.
Com a cabeça baixa entre as pernas. A mesma roupa do dia anterior, suja,
com manchas vermelhas de sangue. Conforme me aproximo, vejo que suas
mãos estão machucadas e sangrando. Ajoelho-me ao seu lado, percorrendo os
olhos por seu corpo em busca de algo mais grave, mas aparentemente
somente as mãos.

Afago seus cabelos, na tentativa de consolá-lo.

— Brian. O que aconteceu aqui? Por que está assim?

— Ela... Ela... Sheron...

— Qual delas? — questiono, já que esse nome parece bem popular


ultimamente.

— Está viva. A minha esposa, está viva — responde soluçando, entre


lágrimas.

Não sei o que me deixa mais chocada, o fato de a falecida estar viva, ou
de ver um homem como o delegado Brian Garcia, chorando de soluçar.

— Eu... — Não tenho palavras para confortá-lo nesse momento.

Mas, como aquela mulher desgraçada, sem coração, pode fingir a própria
morte? Que tipo de pessoa ela é? Sempre ouvi o quanto era doce, gentil,
delicada. É uma cretina. Quero arrancar seus olhos e fritar igual bolinho de
queijo. Maldita, eu vou acabar com a vida dela, assim como ela acabou com a
vida do homem que amo por tantos anos. A culpa por sua morte corroeu a
alma do delegado por tantos anos. Quantas vezes ele chorou no túmulo vazio
dessa vadia.

— Vai ficar tudo bem, eu prometo. — É só o que consigo dizer no


momento.

Sento no chão, e continuo acariciando seus cabelos, enquanto ouço seu


desabafo, e sinto a dor, decepção que assola seu coração partido. Não sei ao
certo quanto tempo passou, mas consigo convencê-lo a deitar no que sobrou
da cama para descansar. Permaneço no quarto até que pegue no sono.

Para não acordá-lo, saio da casa indo até o jardim. Digito o número do
celular do detetive Parker. Assim que atende à ligação explico tudo que
aconteceu, e peço que venha ao nosso encontro para me ajudar. Mediante a
situação que a casa se encontra, não quero correr o risco de ele ter outra crise
e se machucar mais gravemente.

Enquanto espero, confiro da porta do quarto se ele ainda está dormindo.


Os sinais arroxeados embaixo dos seus olhos, a boca pálida em contraste com
a pele, me faz sentir náuseas só de imaginar o quanto sofreu, a dor imensa
que sentiu ao descobrir a verdade.

Como ela pode fazer isso? Por que não pediu simplesmente o divórcio? O
mais estranho nisso tudo é que não estou surpresa.

É como se estivéssemos estrelando um filme de zumbi, onde os mortos


ressuscitam para acabar com a vida dos vivos. Mas, como em todos os filmes
desse gênero, os zumbis sempre terminam com um tiro na cabeça.

Sheron e Spencer deveriam ter continuado no buraco que estavam


escondidos.
✽✽✽

Alguns anos atrás...

Não suporto os olhos de Spencer me encarando depois da morte daquele


fedorento. É como se eu tivesse empurrado o animal da varanda. Talvez tenha
feito, mas foi mero acaso. O peludo ficava em cima dos meus pés, impedindo
que andasse abanando pateticamente aquele rabo. Qual é? Seu dono é outro,
não precisa fingir simpatia por mim. Spencer é o queridinho, delicado,
atencioso da família, não eu.

O brilho dos seus olhos, o rabo balançando, a música alta tocando na


festa, estava me sufocando. Precisava fugir daquele lugar, aliviar a tensão que
percorria meu corpo, ou, caso contrário iria enlouquecer. Só que infelizmente
o animal decretou sua sentença de morte urinando em cima do meu tênis.
Com as mãos fechadas em punho, considerei a hipótese de torcer o seu
pescoço até ver sua vida se esvaindo em minhas mãos. Infelizmente isso teria
consequências, atraindo atenção dos nossos pais. Nada como um pequeno
acidente para dar fim em um problema.

Sem pensar duas vezes, chutei o Floquinho para fora da varanda jogando-
o no gramado do jardim. Nos meus lábios, um sorriso triunfante. Claro, meu
irmão iria sofrer momentaneamente, já que tinha criado afeição, mas tenho
certeza de que logo mal se lembrará desse animal inútil.

Depois do evento especial da noite, os convidados se retiraram pouco a


pouco, deixando a casa bagunçada e vazia. Empregados circulavam por todos
os lados recolhendo a imundícia dos porcos visitantes. Não entendo o porquê
meus pais fazem isso para agradar essa gente. Pessoas mesquinhas,
interesseiras, bêbadas, que não perde a oportunidade para falar da vida alheia.

Meus pais já subiram para o quarto, Spencer chorando desesperadamente


também se recolheu, deixando seu irmão gêmeo sozinho em nosso dia tão
especial. Logo eu que faço tudo por ele, mas, não serei egoísta. Vou deixar
que chore por uma noite desabafando sua perda.

Circulo pela casa, analisando cada empregado. Alguns velhos, outros


jovens, embaixo dos olhos marcas de cansaço, sinal de vida miserável.

Sem sono, entediado, decido mergulhar na piscina com roupa e tudo.


Deixo o corpo leve, flutuando, enquanto permaneço com os olhos fechados.
O silêncio é maravilhoso, é como se estivesse em outro mundo. Por que as
pessoas precisam complicar tanto as coisas? É tudo tão simples. Por exemplo,
já cansei de ouvir a mesma história sobre a gestação conturbada da minha
mãe. Sobre como o médico pediu ao papai para escolher, a mulher ou os
filhos. E claro, nossa querida e salvadora, não desistiu de nós.

Ficamos enclausurados em incubadoras durante quatro meses sendo


alimentados por sonda, lutando para vivermos. Spencer foi o primeiro a
receber alta e vir para casa, talvez seja esse o motivo dele ser o preferido,
chegou primeiro ganhando espaço.

Ouço ruídos próximos a borda da piscina, abro os olhos e giro o corpo,


afundando imediatamente. Bato os pés e os braços, subindo por cima da água.
Cuspo o sabor de cloro que havia engolido, encarando quem diabos quase me
matou de susto.
— Oh desculpe. Vi o senhor boiando, achei que tinha acontecido alguma
coisa. — A jovem trajando roupa de empregada se justifica timidamente.

— Quem é você? Nunca a vi na casa — questiono, nadando até a escada


da saída.

— Sim, sou contratada do Buffet, senhor.

— Não me chame de senhor, pareço velho para você? — respondo


rudemente.

— Não, me perdoe.

Balanço os cabelos úmidos voando gotículas de água em tudo a minha


volta. Encarando-a mais de perto, noto o volume dos seus seios salientes no
uniforme apertado. A pele pálida, em contraste com os cabelos negros. Os
fios soltos do seu coque, causa um efeito sexy que detém minha atenção.
Lábios carnudos. Como seria tê-la em minhas mãos. Manusear uma obra-
prima, e perfeita. Não ganhei nada de presente de aniversário que fosse do
agrado, mas acho que o universo conspirou ao meu favor enviando essa doce
garota como brinde na minha vida fodida.

Com passos lentos me aproximo da moça.

— Qual seu nome?

— Hilary.

— Olá Hilary, sou Luca, filho do dono da casa. Essa bela festa foi para
mim e meu irmão.

— Sim. Tenho que terminar de ajudar os outros, com licença.

Não posso deixar essa oportunidade escapar por entre os dedos, além do
mais, quem vai acreditar em uma empregadinha que seduziu o filho de uma
família rica.

— Tem algumas caixas na casa da piscina que precisam ser levadas


também, alguém do buffet deixou por lá. Vamos, vou ajudar você.
— Imagina, não precisa se incomodar posso pegá-las sozinha.

— Incomodo algum, já estou aqui. E depois trocarei de roupa. — Abro


um sorriso doce e inocente.

Faço gesto apontando com as mãos para frente, indicando para ir em


frente. Andamos em volta da piscina saindo por trás do jardim seguindo até a
casa de máquinas. Aproximo o corpo do seu, e empurro a porta de madeira. O
som de madeira rangendo cria um clima especial para a ocasião. Desvio de
Hilary, indo diretamente até o interruptor acendendo a luz.

A expressão em seu rosto ao notar que não tem nada dentro do pequeno
cômodo, além da bomba de limpeza, é impagável, excitante. Antes que possa
correr, gritar ou qualquer outra reação. Seguro seus braços puxando-a para
dentro. Cubro a boca com uma mão, e com um pé chuto a porta fechando-a.

Sinto a respiração ofegante, os batimentos cardíacos acelerados. Arrasto o


frágil corpo para o canto mais escuro, dificultando uma tentativa inútil de
fuga. Lágrimas escorrem dos olhos, umedecendo a pele de porcelana. Com o
outro braço, envolvo seu pescoço apertando com força. Presenciar suas
pernas debatendo-se, seu corpo agitado, faz meu pau ficar ereto, desejoso por
possui-la.

Em minutos, como boneca posso manuseá-la como quiser. Mas ainda


respira viva. Qual a graça transar com um cadáver? Empurro o corpo no
chão, batendo sua cabeça no maquinário. Espero não a ter matado, só quero
um pouco de diversão, depois pode ir embora aproveitar sua vida medíocre.

Abro o botão da sua calça, descendo o tecido até os pés junto com a
calcinha de algodão. Salivando, encaro sua boceta lisa, preciosa.
Rapidamente, desato o cinto de couro, abaixando calça, cueca, tudo que
estava no caminho. Separo as pernas com joelho, ficando entre elas. Enfio o
pau dentro do seu centro apertado. Como um animal selvagem, invisto
inúmeras vezes, cada vez mais forte. Agarro seus seios por cima do tecido
apertando, esmagando com os dedos. A cada arremetida, o cinto balança
atrapalhando. Por um momento paro de me movimentar, e o puxo do cós,
jogando de lado.
Distraído, sou pego de surpresa ao vê-la abrindo os olhos. Hilary
despertou totalmente desnorteada, com sangue escorrendo por sua testa.
Assim que recobra complemente o senso, faz menção de gritar por socorro.
Encaro-a pensando em uma solução, e ao notar o cinto, sei o que devo fazer.
Rapidamente, o pego e enrolo em volta do pescoço da jovem. Uso a fivela
para prendê-la. Seguro com as duas mãos o material de couro puxando com
força. Suas mãos se debatem contra meu corpo, porém fraca com o
machucado, é impossível escapar. Excitado, continuo investindo contra sua
boceta. A sensação de estrangulá-la e fodê-la ao mesmo tempo é um prazer
que jamais imaginei sentir na vida.

Fecho a porta da casa de máquina, e não consigo conter o sorriso de


satisfação no rosto. Saltitante, sigo até o quarto dos meus pais, bato na porta,
acordando o casal perfeito dos seus doces sonhos. Okay. Ambos me olharam
como um monstro, assim que contei sobre Hilary. Mas como sempre a
omissão entre pais e filhos falou mais alto.

Sem ao menos me despedir do meu irmão, sou enviado para um colégio


interno, longe da minha família e sobre supervisão vinte e quatro horas por
dia.

E o corpo da empregada? Não sei, ninguém nunca mais falou sobre isso.
Fui enviado para o exílio, como se nunca tivesse existido. Sendo tratado
como um animal enjaulado por anos, até que um belo dia recebi uma visita
inesperada.

Meu querido irmão gêmeo, Spencer e seu convite de casamento.


Abro os olhos cercado pela escuridão, ao longe ouço vozes que reconheço
imediatamente. Ergo o tronco, levantando o corpo, e sinto uma pontada
aguda na cabeça. É como se estivesse de ressaca sem ao menos ter bebido.
Apoio os cotovelos no colchão e me sento lentamente. Uma vertigem faz com
que o mundo gire em trezentos e sessenta graus. Esfrego os olhos com as
pontas dos dedos, sentindo algo úmido e pegajoso tocando minha pele. Aos
poucos, relembro tudo que aconteceu.

A fogueira no quintal, os móveis sendo destruídos por minhas mãos, mas


o que me faz tremer internamente causando calafrios na minha espinha é
saber que ela está viva. Não quero nem mesmo pronunciar seu nome, se vê-la
pessoalmente sou capaz de estrangulá-la. Como pode fazer isso comigo?
Sempre fui um marido honesto, fiel, devotado, idolatrava aquela vadia, para
quê? O remorso corroeu-me por dentro durante anos, a culpa que carregava
como um fardo pesado em meus ombros. Tudo foi inútil? Meu sofrimento, a
tristeza que consumia os dias nebulosos.

— Oh você acordou. — Camilly entra no quarto, desviando dos destroços


e senta-se. — Estava ficando preocupada, íamos levá-lo para a emergência se
não acordasse logo.
— Nós? — questiono ainda confuso.

— Eu senhor. Como está se sentindo? — Parker surge na porta com


expressão de preocupação estampada no rosto.

— Não posso dizer que estou me sentindo bem, mas estou melhor. —
Deito de costas no colchão encarando o teto.

Enquanto detetive Parker e Camilly conversam comigo, só consigo


pensar que isso parece um pesadelo na qual irei acordar em breve. Não ouço
uma única palavra do que estão falando, é como se estivesse surdo, apenas
ruídos. Quero ficar sozinho e refletir sobre a situação, e o principal, como
agir mediante aos fatos. Entender o que a levou fingir a própria morte.

Será que a obrigaram a fazer isso? Ameaçada? Essa possibilidade é


totalmente viável devido a minha profissão. É uma explicação plausível.
Somente Sheron poderá me contar a verdade escondida por trás disso tudo.

— Vou buscar algo para comer. — Parker recua alguns passos.

— Não estou com fome. Gostaria de ficar sozinho, por favor.

— O quê? Sem chance, não vou deixá-lo aqui. — Cami responde


prontamente com os olhos arregalados.

— Por favor, estou bem, só preciso de um tempo. Confie em mim —


suplico.

Resmungando, com passos firmes indicando o quanto está furiosa, ela


segue em direção à saída sem ao menos olhar para mim. Sei que terei sérios
problemas com minha demônia de saia, mas também sei que no fundo
entende meus sentimentos.

Sozinho, somente com a luz da lua iluminando através das janelas,


vagueio pela casa. Quem estou querendo iludir, essa mulher me abandonou.
Tantos anos e nem uma tentativa de contato. E por que retornar, agora?
Alguma coisa aconteceu para retornar depois de tanto tempo, e mais,
expondo-se abertamente. Somente uma mente doentia teria capacidade de
arquitetar um plano maquiavélico. Devo esperar que ela venha ao meu
encontro, ou caçá-la como a criminosa que se tornou?

Com as pernas dormentes, cambaleando, sigo em direção ao banheiro.


Abro o chuveiro, e entro embaixo d’água de roupa. Sinto a ardência em
minhas mãos, e deixo que a água lave quaisquer resquícios. Seguro nas
lapelas da camisa e puxo com força estourando os botões que voam longe ao
chão. Jogo o tecido de qualquer jeito no box, repetindo o mesmo movimento
com a calça, e os sapatos.

Ergo a cabeça com os olhos fechados, flashes de memórias invadem meus


pensamentos. O velório, sua família, as inúmeras coroas de flores que amigos
enviaram. Era como um palco de circo para essa desgraçada.

— Maldita — berro em plenos pulmões.

Você vai desejar estar morta de verdade quando encontrá-la. Esposa


dedicada uma porra. Agora, relembrando eventos antigos, por vezes estava
nos cantos em ligações suspeitas ou trocando mensagens, mas sempre
acreditei na sua palavra que se tratava de amigas. Só pode ser brincadeira.
Fez toda essa merda por causa de outro homem?

Deslizo a mão na parede em busca do interruptor. Acendo a luz. Termino


o banho, sentindo o sabor amargo da traição na saliva. Pego a toalha do
gancho, e enrolo na cintura. As gotículas do cabelo pingam umedecendo o
peito nu. Em frente a pia, encaro o reflexo de um homem derrotado,
humilhado, envergonhado. Os olhos marejados, avermelhados como
consequências do sofrimento infringido. Como pude perder minha dignidade
tão rápido. Estou me sentindo péssimo, sem coragem de encarar as pessoas,
inclusive a mulher que amo, aquela que rejeitei por devoção a memória de
uma esposa maravilhosa que nunca existiu.

Balanço a cabeça negativamente, incrédulo do quanto estou deplorável.


Logo eu, o grande delegado Brian Garcia, conhecido por ser inabalável
destemido. Mas juro que essa mulher vai pagar muito caro por isso. Ainda
seminu caminho pela casa. Vislumbro o resultado do meu ataque de fúria. É,
serei obrigado comprar móveis novos, e dessa vez, será do jeito que eu gosto.
Como costumavam dizer “há males que vem para o bem”.
Com passadas lentas, sigo em direção do quarto. Empurro os destroços do
armário do caminho para conseguir chegar até a parte onde se encontra as
camisas, e as calças. Alcanço uma troca de roupa, e encontro um par de
sapatos jogado embaixo da cama. Está tudo no mais perfeito caos.

Carteira? Celular? Procurá-los nessa bagunça, é o mesmo que tentar


encontrar uma agulha no palheiro. Decido caminhar na rua aproveitando o
que ainda resta de tempo da noite. Bato a porta com força, já que a fechadura
está estourada assim como as demais portas da casa.

Enfio as mãos nos bolsos da calça, enquanto ando lentamente pela


calçada, observando o céu estrelado, as casas que compõe a vizinhança.
Algumas com brinquedos espalhados pelo jardim, outro com casinhas para
animais. Como nunca reparei nos pequenos detalhes de um lugar que moro há
tantos anos? Será que fui sempre tão omisso com as coisas que ao meu redor.
Provavelmente foi por isso que consegui ser feito de idiota, estar sempre
ocupado demais cuidando das vidas de outras pessoas e esquecendo-se da
minha própria. Plantões atrás de plantões na delegacia, investigações, casos
especiais. No fundo acho que quem estava morto para o mundo, era eu.
Engraçado pensar que dentro dessas casas existem famílias, que
depositam confiança na polícia. Permaneço andando sem rumo até a saída do
condomínio, levando-me diretamente a uma das vias principais. Do lado de
cima da ponte, posso ver os carros correndo na pista debaixo.

Não tenho certeza de quanto tempo caminhei perdido em pensamentos,


mas vejo uma pequena praça, e me sento no banco. Meus pés latejam dentro
dos sapatos, os músculos das pernas repuxam devido ao excesso de
exercícios. Apoio os braços no encosto do banco, deixando-os estirados.
Inclino a cabeça para trás, e encaro o céu. Distraído, ouço ruídos das folhas
secas sendo pisadas, finjo que não estou notando que alguém se aproxima
lentamente. Pegar o inimigo de surpresa é sempre a melhor opção.

De canto de olho, vejo de atravessado uma figura usando roupas pretas, e


touca cobrindo o rosto. Levanto rapidamente, pegando o indivíduo de forma
inesperada.

Assustado, a figura pequena, magra e esguia, corre entre as árvores,


tentando fugir. Essa pessoa estava me seguindo, não posso deixar que fuja
sem antes explicar o porquê. Continuamos em uma corrida alucinada,
frenética. Desviando dos empecilhos, pulando troncos caídos. Sinto o ardor
do ar em meus pulmões, estar sem comer, dormir, me deixou debilitado. Mas,
ao longe vejo que a pessoa se distância mais e mais, até o ponto de não
conseguir enxergá-la.

Curvo o corpo, apoiando as mãos nos joelhos. Respiro fundo, engolindo


em seco. Aguardo até sentir que estou no controle das minhas pernas
novamente. Preciso do meu celular, e ir até a delegacia. Talvez Ethan consiga
rastrear a localização da chamada que recebi de Sheron.

Sheron... Sheron...

Como se uma luz acendesse dentro da minha cabeça iluminando a


escuridão. Relembro vividamente a conversa que tive com Camilly dias atrás
que resultou em uma briga por ela citar o nome da morta viva. A mulher na
casa de Luca também chamava Sheron, será possível que tenham ligação?

É muita coincidência. Estava bem diante dos meus olhos, e eu


completamente cego. Sheron, Luca e Spencer. Por quê? Qual o segredo que
os une?
.
Não consigo dormir só de imaginar que Brian ficou naquela situação
deplorável, é como se tivesse sido abandonado por todos. Mas só fiz o que foi
pedido. Consigo imaginar a dor que está sentindo, a decepção, só quem
sofreu algo similar consegue realmente entender tal sentimento.

Levo as mãos até o pescoço, respirando fundo. É como se estivesse


sufocando. Só irei ficar em paz quando encontrá-lo, e tiver certeza de que
está bem. Nunca acatei nenhuma de suas ordens, e não será agora. Ouviu
Brian Garcia?

Pego a bolsa, chave do carro, e prestes a sair do apartamento, ouço a


campainha tocando. Resmungo impaciente. Para chegar a momentos
inconvenientes só pode ser John. Sigo com passos largos e rápidos até a
porta, e sem conferir através do olho mágico, abro-a.

— Luca? — sussurro totalmente surpresa.

— Olá Camilly.

Encaro-o sem reação, paralisada. Meu coração bate acelerado, e


institivamente percorro os olhos por seu corpo até o cós da calça conferindo o
cinto de couro. Engulo seco ao notar a semelhança, não pode ser o mesmo.
Existem milhares iguais a esse nas lojas. Sempre foi Spencer, não o Luca.

— Está tudo bem? — Ele balança a mão no ar próximo ao meu rosto.

Assustada, recuo alguns passos para trás, escondendo o rosto atrás do


ombro. Gesto que antiga Cindy fazia sempre que estava prestes a ser
agredida, com medo.

— Eu... Eu... esto... Estou bem. Desculpe. — Enfim consigo responder,


tremendo a voz.

— Podemos conversar por um momento, prometo que serei breve. É algo


que ficou faltando na finalização da sua graduação.

No fundo da minha alma, quero sair correndo para longe desse homem.
Vê-lo sorrindo na minha frente é aterrorizante, sinto tanto medo, me sinto
fraca. Mas, não posso rejeitar sua visita, só iria gerar desconfiança, o que
poderia tornar a situação ainda mais perigosa. Forçando um sorriso simpático
no rosto, aponto com a mão para dentro do apartamento, indicando que entre.

Respiro fundo, engolindo em seco. Posso sentir o suor das minhas mãos
trêmulas. Você consegue, é só fingir que está tudo bem, seja cordial, sorria.
Força.

— Quer beber alguma coisa? — questiono, enquanto observo


atentamente Luca circulando a sala do apartamento.

— Pode ser água, por favor — responde encarando a janela que dá acesso
à escada de incêndio.

Até mesmo sua voz me causa calafrios. Por um momento, analiso seu
corpo por trás, as costas, os ombros largos são parecidos. Claro, sua maluca
ele é gêmeo. Acho que estou paranoica com essa história de serem irmãos.
Durante dois anos foi meu professor, tutor na faculdade, será que sempre
soube que era a esposa de Spencer? Provavelmente igual a vilão de filme,
planejando a vingança fria e calculista durante anos.

Abro a porta da geladeira, pego a jarra com água e despejo dentro do


copo. Avanço alguns passos em sua direção para entregá-lo, mas de repente
Luca gira a cabeça com um amplo sorriso no rosto detendo totalmente minha
atenção.

— Você — resmungo sussurrando, enquanto deixo o copo cair no chão


partindo em estilhaços por todos os lados.

O mundo ao meu redor começa girar em trezentos e sessenta graus, me


deixando desnorteada. A cada vez que pisco, a lembrança das covinhas uma
em cada bochecha de Spencer surge diante dos meus olhos. Mas, por que
Luca as tem no mesmo lugar? Sempre foi ele? Qual o jogo doentio do qual
estava participando?

Cambaleando, com as pernas mole como gelatina. Afasto-me o suficiente


para chegar até o sofá. O ar foge repentinamente dos pulmões, faço força
tentando respirar, mas não consigo. Minha visão embaça pouco a pouco, até
ser levada completamente pela escuridão.

Desperto, sentindo uma forte dor na cabeça. Impulsiono o corpo para


frente na tentativa de sentar, mas é inútil. Forço os braços, e sinto que algo
prendendo os pulsos. Balanço a cabeça, fechando os olhos apertados para
recobrar a consciência. O pouco que consigo ver de onde estou deixa óbvio
que não estou mais no meu apartamento. Quero gritar por socorro, mas tenho
medo de quem irá responder por esse pedido. Talvez se ficar quieta, possa
acordar desse pesadelo, e ver que tudo não passou de um sonho ruim. Por
favor, por favor.

— Oh acordou, querida. — Luca se aproxima do divã que estou


amarrada.

— O que está acontecendo? Onde estou?

— Também senti saudades meu amor.


— Do que está falando, por favor, me solta — suplico, segurando as
lágrimas.

— Tem ideia do quanto me segurei durante esses dois anos? Só assistindo


de longe você flertando com outros homens. Queria matá-los lentamente um
a um. E você, mocinha. Sabe muito bem o que merecia.

— Luca, eu juro, não sei do que está falando. Olha, se me soltar, finjo que
nada aconteceu e esqueço tudo isso.

Sorrindo maleficamente, ele debruça seu corpo por cima do meu,


aproximando sua boca da orelha.

— Eu me lembro de tudo — sussurra mordendo o lóbulo da orelha.

Náuseas, tremor, dor de estômago, coração acelerado. Inúmeras são as


reações quando percebo que sempre foi o Luca, e não Spencer. Aquele
monstro, os olhos ferozes, queimando em chamas, nunca foi de Spencer, e
sim dele. Não consigo conter as lágrimas que escorrem dos meus olhos
umedecendo minha pele.

— Era você, sempre foi você — grito, alterada.

E como há muitos anos não acontecia, sou agredida com uma tapa no
lado esquerdo do rosto. Engulo em seco, erguendo a cabeça, enquanto sinto a
face queimando com a marca dos dedos de sua mão.

— Não querida, ainda é casada com meu irmão. Existe uma série muito
famosa no Brasil, qual era o nome mesmo? Ah “dona flor e seus dois
maridos”.

— O que isso quer dizer? — questiono confusa, ou talvez, não querendo


entender a realidade.

— Como pode não notar a diferença? Spencer tem uma cicatriz nas costas
de quando éramos crianças e caiu da árvore. E eu, não.

— O quê? — Não Deus, por favor, não.


— Eu e Spencer sempre compartilhamos tudo, desde a barriga da nossa
mãe. Qual seria a lógica se não compartilhássemos a mesma mulher.
Confesso que meu gêmeo é fraco, por vezes quis desistir de tudo, até mesmo
queria dar-lhe flores, mas mulheres como você não merece nada disso. Uma
vadia que não conseguia nem mesmo distinguir o marido.

Não tenho palavras para responder, não consigo reagir, gritar, chorar,
nada. Estou em choque, paralisada. Apoio à cabeça no encosto, encarando a
parede branca. Cada segundo que passa a voz de Luca se torna mais distante,
abafada, até que não ouço quaisquer ruídos ao meu redor. Minha mente se
perde em um espaço paralelo, cálido, límpido, puro.

“Brian vem ao meu encontro, tomando-me em seus braços. Rodeados de


girassóis, com o sol brilhando. Minha pele se aquele com os raios de sol.
Sinto-me livre, em paz.”

Alguém segura os braços com força chacoalhando meu corpo. Ergo os


olhos, encarando-o. Spencer está em minha frente, observando-me. É como
se pudesse enxergar sua alma, porém, espero que ele possa perceber o que fez
comigo.

— Trouxe algo para você comer, e beber. — Senta-se ao meu lado.

Agindo impulsivamente, não penso duas vezes, e cuspo no seu rosto.


Surpreso, com minha atitude levanta-se rapidamente, limpando o rosto com
as mãos.

— Vagabunda. — Surgindo de trás do Divã, Luca corre em minha


direção, acertando outra tapa no meu rosto.

Descontrolada, deixo escapar por entre os lábios gargalhadas histéricas.

— Então, qual dos dois levou os tiros?

Posso ver que os peguei de surpresa. Claro, queriam uma Camilly


chorando e implorando como a antiga Cindy. Mas, nem que me matem, vou
ceder. Se for preciso vou esconder minha mente no meu precioso jardim de
girassóis. Podem fazer o que quiser comigo, com meu corpo, mas minha alma
e mente, são MINHAS. Spencer avança alguns passos para frente, porém, o
irmão o impede de prosseguir.

— Estou esperando, quem foi o sortudo? — digo entre gargalhadas.

Lentamente, Luca abre botão por botão da camisa mostrando o abdômen


com as cicatrizes daquela fatídica noite.

— Até que ficou charmoso. — Pisco sorrindo para os gêmeos.

— Hum, confesso que estou surpreso como se tornou corajosa. Quero ver
quanto tempo vai durar toda essa coragem.

Se pudesse lhe mostraria o dedo do meio, com certeza. Mas infelizmente


estou amarrada nessa droga de lugar. Oh meu Deus, isso tinha que acontecer
justo agora. Brian acabou de descobrir da defunta morta viva. Preciso achar
um jeito de fugir, vamos lá, pense Camilly.

Perdida em pensamentos, distraída. Percebo tarde demais, quando


Spencer se aproxima com uma seringa na mão. Contorço o corpo, tentando
impedi-lo, só sinto a agulha entrando na veia do pescoço, roubando minha
consciência em fração de segundos.
Assim que retorno para casa, procuro entre os destroços meu celular.
Preciso fazer algumas ligações, e depois tenho uma linda mulher a quem
devo desculpas por ter se comportado como um babaca. Levando em conta a
situação, acho que tinha o direito de me comportar feito idiota, afinal, enterrei
uma mulher viva.
Ouço o som do aparelho tocando, sigo o barulho atentamente pela casa. A
cada passo o som fica mais alto indicando que estou próximo, até que o
encontro embaixo dos estilhaços do armário da cozinha. O nome “Ethan”
salta na tela brilhando, e iluminando o cômodo escuro.
— Brian — atendo rapidamente.
As únicas palavras que meu cérebro consegue processar imediatamente é
“Camilly sequestrada”.
— Oh, alô, você ainda está aí? Caralho, o cara me deixou falando
sozinho.
— Ainda estou aqui — respondo. — Estou indo para o apartamento dela,
pode me encontrar lá? Ah leve seu equipamento. — Encerro a chamada.
Desgraçados, filhos da puta, como ousam tocar na minha mulher? Pior,
sequestrá-la. No passado maltratá-la era fácil, abusando de sua fragilidade,
mas hoje, estão mexendo com uma leoa, e digo mais, estão mexendo comigo.
Ninguém toca no que é meu e saí impune, vou fazer esses merdas pagarem
bem caro por tudo que estão fazendo. Logo mais adiante encontro a carteira
junto com a chave do carro.
Acelero pelas ruas de Nova York desesperadamente. Não consigo evitar
pensar que ela está sob o domínio daqueles malucos, e o que podem estar
fazendo nesse momento. Eu vou meter uma bala na cabeça de cada um desses
gêmeos, cadeia é pouco para esses cretinos.
Estaciono em frente ao prédio, e antes mesmo de entrar em seu
apartamento, vou em busca do síndico solicitando as imagens das câmeras de
vigilância, tanto as internas, quanto as externas. Relutante o homem no
primeiro momento quis negar, mas depois de ver o meu distintivo cooperou
facilmente. Enquanto, aguardo as imagens, sigo para o apartamento de
Camilly. A porta está entre aberta, às luzes apagadas. Atento, acendo as
lâmpadas iluminando o cômodo. No chão próximo à janela, estilhaços de
vidro espalhados. Vasculho o quarto, banheiro, tudo permanece no mesmo
lugar, nada foi levado. Suas roupas jogadas em cima da cama são como um
tiro no meu peito. Sinto uma dor forte, aguda, quase mortal. Onde está a
minha demônia de saia? Se eu soubesse que isso iria acontecer, não teria a
deixado sozinha. E novamente a culpa está me corroendo por dentro.
Pego o vestido sentindo a textura do tecido entre os dedos.
— Eu vou te encontrar — sussurro baixo.
—Opa, já está chorando de saudades de mim. Qual é cara, isso pega mal.
Ethan surge na porta do quarto com sua mala preta na mão, e no ombro
uma mochila. Não contenho a risada. Esse cara é foda. Inteligente, boa pinta,
e sempre disposto a ajudar, seja com seu trabalho ou animando alguém como
eu. Aproximo-me, e dou uma tapa na sua nuca para deixar de ser abusado.
Ando de um lado para outro, quase abrindo um buraco no carpete,
enquanto espero o nerd conectar todos seus equipamentos. Cada minuto é
importante para a vida de Camilly. Esfrego uma mão na outra tentando conter
os tremores. Estou com medo, não posso perder o amor da minha vida.
— Vai demorar? — questiono, sentindo o tremor percorrendo o corpo
inteiro.
— Mais dois minutos. Não ia falar nada não, mas irmão, você vai estrelar
algum filme de zumbi? Está acabadinho, precisa de produtos de beleza. Se
quiser posso indicar alguns.
— Ethan — repreendo com o olhar.
— Desculpa aí, mas só disse verdades.
Cruzo os braços fechando o rosto na expressão mais assustadora possível.
Se não precisasse tanto de sua ajuda, com certeza, ele estaria sem a cabeça
nesse instante. A tela do computador se abre solicitando dados pessoais com
códigos de verificação da agência do FBI. Rapidamente, o nerd preenche os
dados abrindo várias informações pessoais de Luca e Spencer. Como já
sabemos, o passado de um deles é como de um fantasma sem dados, sem
informações, nada. Talvez se buscássemos por casos antigos, arquivados,
encontrássemos algo que seja útil. Mas, antes precisamos analisar os vídeos
da câmera pessoal que instalei, sem Cami saber para própria segurança.
Avanços as horas de gravação para aproximadamente o horário que ela
foi embora da minha casa naquele dia. Não tenho paciência para assistir
sentado, enquanto seguimos as horas. Confiro no relógio, já faz mais de meia
hora que solicitei ao síndico as filmagens. Explico a Ethan, e decido ir
novamente até o apartamento do homem buscar pessoalmente.
Subo até seu andar de escada, na tentativa frustrada de gastar a energia
que circula por meu corpo me deixando temoroso, fraco. Em frente à sua
porta, bato várias vezes, e não tenho resposta. Pronto para arrombar a
fechadura, ouço o barulho da tranca se abrindo. O síndico não abre a porta
por inteira, deixando-a semiaberta. Estende a palma da mão com um pequeno
pen-drive.
— É a gravação dos últimos dois dias — explica, entregando-me.
Agradeço, desconfiado da sua atitude. Sinceramente não estou
preocupado, agora, com o que esse baixinho barrigudo estava escondendo em
seu apartamento. Só preciso das imagens.
Assim que atravesso a porta do apartamento, Ethan salta da cadeira em
minha direção. Palavras confusas saem de sua boca apontando para a tela do
notebook. Faço gestos com as mãos pedindo que se acalme, porém quando
vejo que ele estava tentando dizer, quem fica sem palavras, estático,
paralisado, sou eu.
Spencer com Camilly desmaiada em seus braços enquanto caminha
livremente pelo corredor do prédio. Agora, sorri para a câmera com olhar
triunfante, foi o que me fez perder o controle. Chuto a cadeira para longe, o
sofá, tudo que está ao meu alcance sendo estilhaçados por meu ataque de
fúria, ou seria, pânico, medo?
Aproximo-me da mesa novamente, e o nerd entra na frente com os braços
abertos protegendo seu equipamento.
— Aqui não — diz me encarando seriamente.
Seu olhar duro, firme, penetrante, me faz recobrar o pouco de sanidade
que ainda me resta.
Conectamos o pen-drive que nos foi dado pelo síndico. Seguimos o
mesmo processo, analisando minuto a minuto, hora a hora. De repente,
trocamos olhares como naqueles filmes policiais, quando surge alguma pista
valiosa. No mesmo horário da gravação de Ethan que mostra o desgraçado
roubando minha mulher, na gravação do prédio a imagem continua igual, sem
nenhuma alteração, tanto as imagens internas, quanto as externas e da
garagem. Ou a câmera do nerd tem poderes especiais e capta imagens
sobrenaturais, ou esse homem mentiu para mim descaradamente. Quem
acertar a resposta ganha um doce.
— Filho da puta — resmungo, enquanto saio correndo do apartamento.
Ouço passos logo atrás de mim, e sei que Ethan está me seguindo caso
seja necessário de ajuda. Só consigo pensar em como vou torcer aquele
pescoço gordo de mentiroso.

Bato uma, duas, três, na quarta vez faço força arrombando a fechadura.
Que se danem protocolos e processo. Irrompemos dentro do apartamento, e
somos surpreendidos ao encontrá-lo vazio. Procuramos em todos os cômodos
e não encontramos nada. No quarto onde estava instalado o sistema de
vigilância dos condôminos, computadores destroçados, o cretino tentou
apagar quaisquer evidências do crime que cometeu. Ethan me chama do
quarto no final do corredor, com as portas do armário abertas, conferimos que
tudo foi levado na fuga, inclusive suas roupas.
Spencer sabia muito bem que não podíamos usar imagens de uma câmera
clandestina caso seja levado ao tribunal, ainda mais, sendo do FBI. Iria
prejudicar a carreira do meu amigo.
— MALDITO — berro.
Respiro fundo, conto até cem, mas o impulso de vingança, e desespero é
tão grande que mal posso controlar. Sem dizer nenhuma palavra, me afasto
de Ethan e saio correndo para nosso apartamento. Pego a carteira, e chave do
carro. Eu sei muito bem quem vai me dar algumas explicações.
Estaciono o carro de qualquer jeito pegando duas vagas dos alunos da
faculdade. Com passos largos, praticamente corro para dentro do prédio da
faculdade de direito onde Camilly fez seu curso. Desvio dos jovens no
corredor, procurando a sala daquele filho da mãe. Tenho certeza de que aos
olhos dos estranhos, pareço um homem descontrolado com expressão de
maluco, talvez esteja mesmo, doido para acabar com a vida desses gêmeos.
De longe, vejo quando Luca encosta no batente da porta conversando
com um jovem. A raiva me deixa completamente cego, e sem pensar duas
vezes, impulsivamente corro em sua direção. Conforme me aproximo, fecho
a mão em punho, e soco diretamente no seu rosto fazendo-o cambalear e cair
de costas no chão.
Gritos, seguidos de vozes, comoção entre os alunos. Nada disso é capaz
de me fazer parar. Sento-me por cima do seu quadril, agarro a gola da sua
camisa manchada de sangue, e soco novamente, e outra vez.
— ONDE ELA ESTÁ? — grito, aproximando o rosto.
Confesso que fico surpreso ao notar o sorriso de maníaco em seus lábios.
Luca está se divertindo com o espetáculo. Desgraçado, posso matá-lo, mas
jamais irá me contar onde ela está.
— Acabou senhor delegado — retruca deslizando a língua entre os lábios
lambendo o sangue.
Impressionado com sua loucura, solto sua camisa, levanto e recuo alguns
passos para trás. Antes que vire caso de polícia, e complique ainda mais as
coisas. Corro para a saída mais próxima, fugindo da cena como um perfeito
criminoso.
✽✽✽

Cruzo as pernas sentada na poltrona em frente ao divã onde a vadia


dorme tranquilamente, corrigindo, dorme dopada. Luca insistiu que mantê-la
inconsciente será melhor por enquanto, e sinceramente, eu quero que ela
morra. Ladra de homem alheio, pois é essa vadia roubou dois homens que
amei.
Primeiro Spencer, agora, Brian. Para ser sincera o delegado ela pode
engolir com distintivo e tudo, não me importo nem um pouco. Homem
patético, cansativo, ausente, omisso. Quem quer viver com uma pessoa que
diz “amém” para tudo. Infelizmente, só depois de casados percebi esse gravo
defeito, quem tinha os culhões em casa, era eu, a mulher.
Os primeiros anos de casado era atraente, e fofo sua atitude submissa,
mas com o passar do tempo se tornou tedioso, enjoativo. Aquela vidinha
medíocre, sem graça. Sexo? Cada quinze dias quando o importantíssimo
senhor delegado conseguia umas horas de folga. Que mulher quer ser casada
com um homem assim? Esse tipinho pelo jeito quer, encaro o corpo mole em
cima do divã. Confesso que fiquei surpresa que Brian, aceitou uma mulher
como essa. Com atitude, vários parceiros sexuais, e pior, um passado
aterrorizante. Trocou uma santa falecida, por uma vagabunda viva. Talvez me
sinta decepcionada com a substituição.
Mas não posso negar que encontrar Spencer na cafeteria da Starbucks foi
um milagre em minha vida. Fazia anos que não nos víamos, desde a época da
faculdade quando ele começou a namorar Cindy. Levanto da poltrona, me
aproximo lentamente do divã. O som do salto alto ecoa no cômodo.
— Sabia que você roubou o Spencer de mim? — Finjo indignação e levo
as mãos em direção do coração. — Ah não sabia, claro. Ele nunca falou de
mim, por que iria falar, não é?
Porque contaria que eu era filha da empregada que o consolava todos os
dias, enquanto chorava de saudade do seu irmão gêmeo. Ou que fui seu
primeiro beijo, a primeira transa. Sempre à primeira em sua vida. Esforcei-me
para conseguir uma bolsa e entrar na mesma faculdade que ele, só para
ficarmos juntos. Então, você apareceu. Destruiu meus sonhos, acabou com
tudo que havia planejado, o futuro perfeito ao lado do amor da minha vida. A
cada dia que passava, Spencer se afastava mais e mais de mim, correndo
sempre em sua direção. Cretina, enfeitiçou meu homem com essa pose de
santa que não engana ninguém.
Fui obrigada desistir de tê-lo para sempre. Então, foi quando conheci o
delegado Brian Garcia. Estava desolada, triste, cabisbaixa, andando sem
rumo na praça central, porém esbarrei em algo sólido, firme, e com uma
fragrância de perfume delicioso. Como um anjo brilhante de asas douradas,
me cativou por completo. Tinha que esquecer o passado e seguir em frente.
Decidida a me despedir de Spencer, mudar de faculdade e seguir adiante,
investi no relacionamento. Mas jamais imaginei que ao saber que estava
namorando meu amigo de infância teria tal atitude.
Cada um seguia com seus respectivos relacionamentos, mas a cada
oportunidade transávamos escondidos. A emoção, a adrenalina percorrendo o
corpo, deixava tudo mais interessante. De repente algo aconteceu, e ele
mudou. Evitou-me colocando um ponto final em qualquer coisa que existia
entre nós.
Casei-me com Brian, e ele com essa vadia traidora. Como teve coragem
de atirar no próprio marido. Eu só fingi estar morta para fugir de um
casamento fadado ao fracasso, mas não quis matar ninguém.
Enfim, depois de encontrar Spencer na cafeteria após tantos anos,
percebemos que ainda tínhamos aquelas faíscas incendiando por dentro.
Encontramo-nos por meses, pobre delegado. Acreditava que estava na aula de
pilates, mas na verdade estava me contorcendo de prazer na cama, com outro
homem. A cada encontro tramávamos os detalhes do plano de minha morte.
Adorava cada minuto ao seu lado, poder desabafar e contar o quanto estava
entediada ao lado daquele homem. E o mais engraçado que Spencer se dizia
satisfeito com o casamento fracassado.
Eu sentia que escondia alguma coisa de mim, por trás de tudo isso tinha
um segredo. Sempre soube do seu irmão Luca, e como era rebelde, agora, o
verdadeiro motivo por ter sido expulso de casa foi uma incógnita para todos.
Hoje, claro, sei o que fez, e que foi ele que nos separou no passado. Repulsa,
nojo, ranço, é o que sinto sempre que penso na situação dos irmãos dividirem
a mesma mulher, isso é doentio.
Mas, como poderia negar um favor à pessoa que pagou o legista do
necrotério, e que comprou um cadáver com características físicas iguais as
minhas, e mais, deu-me dinheiro e uma identidade nova. Quando me
procurou explicando seu plano de vingança, concordei sem relutar, mesmo
sabendo que isso poderia custar minha liberdade. Mas, forjar a própria morte
ainda não é crime nos Estados Unidos, então, tudo bem.
Respiro fundo revirando os olhos. Decido que preciso de um calmante, já
que tenho que vigiar essa criatura horrenda.
Pego de dentro da bolsa um comprimido vermelho, jogo na boca, e
engulo. Uma mulher precisa fazer de tudo para sobreviver, e digamos que,
agora, sou uma empreendedora de sucesso na Itália. Sento novamente na
poltrona, estico as pernas e encosto as costas no acento. Fecho os olhos
sentindo o efeito do entorpecente percorrendo minhas veias sanguíneas,
atingindo diretamente o cérebro. A sensação de ter a alma fora do corpo é
maravilhosa, excitante. Pisar nas nuvens de algodão, flutuando. Como
poderia impedir que os jovens de NY provassem essa deliciosa mistura.
— Sheron? Está drogada, idiota? — Luca puxa meu braço, fazendo-me
levantar.
Cambaleando, sorrindo, feliz. Sinto uma felicidade contagiante com meu
corpo anestesiado, como se nada pudesse me machucar nesse momento.
— Talvez — respondo com sotaque arrastado.
Embalo o corpo ao som da música que provavelmente somente eu estou
ouvindo. Balanço os braços sensualmente. Avanço alguns passos em direção
ao grande professor Luca Ricci. Espalmo as mãos por cima da sua camisa
tocando seu peito. Vejo que há algo estranho com seu rosto, mas
sinceramente isso não me importa nem um pouco.
Sorrindo maliciosamente, desço a mão até o cinto da calça, abrindo-o.
Enfio uma mão por dentro da cueca, segurando seu pau. Sua respiração
acelera ofegante. Está gostando, cretino. Afasto-me, curvo o corpo no braço
da poltrona erguendo o quadril para o alto. Abro as pernas, como um convite.
Selvagem, bruto, Luca avança sobre mim, rasgando a calcinha que estava no
caminho. De forma crua, sem pudor, enfia seu pau com força na minha
boceta, preenchendo-me. Com uma mão agarra minha nuca, enrolando os
cabelos em seus dedos, fodendo-me como um animal. O prazer chega a ser
doloroso.
Encaro Camilly do outro lado da sala, e não consigo conter o sorriso. Se
você pode ter meus homens, por que não posso ter os seus?
Excitado, investindo contra o quadril cada vez mais forte, morde meu
ombro. Ardência é quase insuportável. Algo escorre por minha pele,
umedecendo-a. Acho que ganharei uma nova cicatriz. Mas quem se importa?
Fecho os olhos absorvendo os efeitos do comprimido, e quando percebo Luca
já gozou.
Uau o sexo foi inesquecível. Devo contar o quanto foi entediante, ou
mantenho a postura de mulher satisfeita. Agora, entendo o porquê esse fode
mal foi abandonado. Encaro onde está o sinal da mordida. O que é isso?
Canibalismo. Mais um pouco arrancava um pedaço da minha pele. Maluco.
Finjo que ainda estou desacordada e sou obrigada a assistir a cena
repugnante de Luca e aquela mulher transando na minha frente. Oh meu
deus, como não liguei os pontos antes, essa Sheron é a falecida enviada de
volta do inferno. É a divindade que Brian fazia questão de enaltecer. Será que
meu delegado já sabe disso? Se souber deve estar ainda mais destroçado. A
mulher que ele tanto admirava, é uma puta, viciada, traficante de drogas.
Sinto que as minhas pernas estão dormentes de ficar parada na mesma
posição por muito tempo. Abro um olho, conferindo o perímetro.
Disfarçadamente as movimento, mudando de posição sutilmente. Não sei o
que podem fazer comigo se descobrirem que já estou acordada novamente.
Spencer já era louco suficiente, mas loucura em dose tripla é demais para que
eu possa lidar sozinha.
Tenho que escapar desse lugar, mas como? Como me livrar desses
abutres. Talvez se fizesse o jogo deles, aceitasse ser uma boa menina,
enquanto procuro meios para fugir. É arriscado, mais quais opções tenho?
Descaradamente, sussurro o nome de Spencer. Abro os olhos lentamente,
engolindo em seco, fingindo estar com dor. Na verdade, meu corpo inteiro
está doendo, mas tenho que me manter forte. Antes de dar o bote, a cobra
sempre arma o ataque. Gemendo, me contorço no divã, atraindo a atenção
desejada.
— Água, por favor — suplico.
— Alguém resolveu ser mais educada, gosto assim. — Luca surge por
trás do sofá, sorrindo.
Sorria cretino, sorria enquanto ainda tem todos os dentes na boca.
Conforme se aproxima observo marcas em seu rosto, machucados. Quero
comemorar e gritar “esse é meu delegado”. Só o fato de ele saber quem me
raptou, me inspira confiança, e ter ainda mais esperança de que logo estarei
livre desses malucos.
— Por favor. — Esforço-me para não gargalhar da sombra roxa e dos
cortes por cima do nariz de Luca.
Pisco os olhos inocentemente. Fazendo gestos com o rosto, deslizando a
língua por entre os lábios, umedecendo-os. Porque sinto como se estivesse
seduzindo um adolescente precoce punheteiro. Credo. Seus olhos brilhando
intensamente encarando o decote da minha blusa. Além de ser agressor,
sequestrador, é depravado. Devia continuar comendo a Barbie na nuvem de
algodão colorido que ela se encontrava. Tenho certeza de que Sheron achou
que estava transando com unicórnio, mas não querida, é só um jumento
mesmo.
Como um cachorrinho adestrado, se retira da sala acatando o pedido. Sou
surpreendida com sua atitude. Hum, então, qual dos dois era o mais violento?
Quando penso que era compartilhada, meu estômago embrulha com ânsia de
vômito. Não demora em que ele retorne com uma bandeja em mãos, com
água, suco, e mais alguns alimentos. Jogo um ossinho, agora, por bom
comportamento. Desgraçado. Queria arrancar esse sorriso triunfante do seu
rosto com as unhas. Arrasto o corpo, apoiando-me nos cotovelos, até quase
ficar sentada. A cadela adestrada não tira os olhos de mim, acompanhando
cada movimento. Não sei como consegue piscar com esses cílios postiços
pesando um quilo cada lado.
Retraio o corpo, assim que Luca senta ao meu lado no divã. É como se
fosse um instinto natural de defesa. Ergo os pulsos amarrados, indicando que
preciso que solte as mãos.
— Nem em sonhos, querida.
— E como vou comer, estou faminta. — Balanço o pulso próximo ao seu
rosto. — Prometo não tentar fugir, não sou burra. Por favor — imploro
usando tom de voz doce.
Antes que a Barbie falsificada abra a boca para protestar, o psicopata
chamado Luca Ricci querido e adorado professor, lança um olhar feroz
silenciando-a. Queria saber qual o segredo, ou mais, o que os une para
trabalharem juntos. Sheron ressuscitou, Spencer e Luca abriram o leque
contando a verdade sobre o passado. Por que estão juntos? Encarando dentro
dos meus olhos, pude ver o reflexo em suas retinas. É uma paixão louca e
obsessiva. Como se estivesse fazendo um grande gesto de caridade desamarra
minhas mãos. Esfrego os pulsos, observando as marcas avermelhadas por
causa da braçadeira de plástico. Arrasto a bunda para o lado, criando certa
distância.
— Aqui está. Coma. — Coloca a bandeja em cima do meu colo.
Balanço a cabeça positivamente, agradecendo. Se soubesse que estou me
segurando para não enfiar esse garfinho de plástico no seu olho, não iria
sorrir tanto. Cabisbaixa, enfio o garfo lentamente na boca, a cada garfada,
percorro os olhos na sala contando portas, janelas, e as demais possibilidades.
— É sua comida preferida, não é? — Engulo em seco ao sentir sua mão
tocando minha testa para afastar uma mecha de cabelo.
— Sim.
Pego o copo de suco, sorvendo um grande gole. Eis que então tenho uma
ideia arriscada. Finjo uma crise de tosse, derrubando o suco nas roupas de
Luca. Como se tivesse levado um tiro, ele se levanta rapidamente
esbravejando alto. Quando era meu professor sempre esteve impecável com
seus trajes, sabia que teria essa reação exagerada. Coloco a bandeja no sofá, e
prontamente, me coloco de joelhos implorando perdão.
— Perdão, desculpe, foi sem querer. Perdoe-me, por favor — suplico
ironicamente.
Posso sentir a fúria exalando do seu corpo, com certeza a mão está
coçando para me castigar como fazia anos atrás. Estou preparada para o que
vier desses psicopatas, mas dessa vez, não vou desistir sem lutar. Junto às
mãos, com a cabeça baixa, implorando.
— Aggrrhh. Vou me trocar, e não demoro — conversa com Sheron. —
Termine sua comida, não queremos ninguém morrendo de fome. Não tire os
olhos dela nem por um segundo entendeu? — repete as coordenadas.
— Sim senhor — responde rindo debochadamente.
Sem dizer mais nenhuma palavra, o nosso querido amigo, sai pisando
duro, reclamando do pequeno acidente. Ouço o som da chave girando da
fechadura da porta. Ainda com os tornozelos amarrados, levanto com
dificuldade, sentando novamente no divã. Preciso provocar a Barbie
siliconada, tenho que fazê-la vir até onde estou.
— Quer dizer que você é a segunda opção? — provoco-a.
— O quê? — Além de surda, é burra.
— Eu vi você e Luca a pouco, ele mal tocou sua pele. Segunda opção.
Comigo será diferente, você vai ver.
— Cala a boca vadia. Ele vai te dar uma surra.
— Não sei, está diferente, atencioso. Quem sabe você leva a surra, sua
vagabunda. Como pôde fingir estar morta? Bom, azar querida. Perdeu um
homem delicioso. Quando Brian me disse que tinha uma péssima esposa, não
acreditei, mas, olhando agora para você, uma drogada de merda.
E como esperado, Sheron investe sobre mim. Aproveito que está lenta e
drogada, ergo a bandeja jogando tudo que tinha em cima no chão,
estilhaçando o prato, copo. E acerto diretamente seu rosto com força.
Cambaleando para trás, ela cai de costas no chão desacordada. Procuro algo
cortante para liberar meus pés, mas só encontro cacos de vidro. Sem opção,
seguro firme na mão. Sinto a dor do vidro cortando a palma da mão, porém
não desisto. Invisto a ponta mais afiada cerrando a braçadeira de plástico. Em
poucos minutos estou livre.
Sheron surge por trás, se jogando por cima de mim. O vidro escapa da
minha mão voando para longe. Rolamos no chão uma sobre a outra. Então,
faço uma coisa que só vi em filmes até hoje, dou uma cabeçada em seu rosto,
fazendo-a recuar e sair de cima. O sangue escorre do nariz manchando sua
roupa falsificada.
— Opa. Alguém gastou com plásticas à toa. Desculpe — zombo
ironicamente.
— Sua vadia.
É, confesso que ela tem coragem. Jogando-se por cima de mim de novo,
desvio do ataque, e enrolo a mão no seu cabelo puxando-a para mais perto.
Enrolo o braço em volta do pescoço no golpe famoso “mata leão”. Okay,
não sou nenhum Mike Tyson, mas reúno forças. A perua se debate, gemendo,
balançando os braços. Sou pega de surpresa quando, Sheron apoia os pés no
chão impulsionando o corpo para trás, derrubando-nos.
Empurro o corpo de cima do meu, e rolo sentando-me no seu quadril.
Fecho os punhos, e sem dó e nem piedade, desfiro vários socos naquele rosto
plastificado. A cada golpe se vingando do meu homem.
De repente uma abelha pica atrás do meu pescoço, ou melhor, uma
seringa. Giro o corpo a tempo de ver Luca e Spencer lado a lado, encarando a
situação. Em fração de segundos sou levada pela escuridão.
Abro os olhos com dificuldade, e estaria mentindo se estivesse surpresa
por estar amarrada novamente. Spencer sentado na poltrona encara-me.
— Quando minha esposa ficou tão feroz?
— Sua esposa? Engraçado, achei que era do Luca — respondo sentindo a
saliva amarga descendo pela garganta.
— Jogo duplo de manipulação não funciona comigo. Cindy, quer dizer,
Camilly.
— E quem está jogando? Por que tudo isso depois de tantos anos? Qual o
plano. E credo, qual é com a Sheron? Ela e Luca mais cedo estavam sabe. —
Faço expressão de nojo.
— Em alguns dias estaremos fora do país, começaremos do zero. Você,
meu irmão e eu Nossa família feliz.
— Espera? O quê? Vocês são loucos, eu não vou, prefiro morrer.
Debato-me rolando para fora do divã caindo diretamente no chão.
Gritando, chorando, repito incansavelmente que não vou à lugar nenhum.
Suas longas pernas se aproximam de mim, e sou suspensa em seus braços.
— Você não tem opção.
Posso ver dentro dos seus olhos que ele realmente acredita que está
fazendo o certo. Que somos uma família. Eu sei que em algum lugar lá
dentro, Spencer tem um pouco de sanidade, se não fosse o irmão
influenciando-o. Quem sabe se ele não teria sido um bom homem.
A cada minuto que se passa, sinto como se isso me afastasse cada vez
mais da Camilly. Desde o seu sequestro já se passaram 44 horas. Todos
sabem que após 48 horas do rapto a porcentagem de encontrar a vítima é
reduzida em uma grande porcentagem. Respiro fundo, andando de um lado
para outro. A sensação de impotência é angustiante, sufocante, desesperador.
Depois de socar aquele desgraçado fui repreendido por minha atitude
imprudente. Naquele momento não pensei em nada, só em matar aquele
cretino, mas isso pode ter custado um alto preço para a mulher que amo.
Espero que não tenham encostado em um fio de cabelo dela, senão, juro,
mato cada um deles.
Ethan continua trabalhando arduamente raqueando as câmeras de
segurança da cidade em busca do carro de Luca. Infelizmente, não tivemos
sucesso. O infeliz só vai de casa para a faculdade, e da faculdade para casa,
ao menos foi o que a câmera captou durante essas horas. Spencer, não se
locomove a alguns dias. Seu carro consta como na sua cidade natal,
dificultando consideravelmente nossa investigação.
Estou entrando em pânico, conheço muito bem esse sentimento. Quando
a Sheron morreu, ou melhor, forjou a própria morte, também passei por essa
crise, a dor de perder alguém que ama loucamente. Então, antes que surte na
frente do nerd do FBI, decido ir até à delegacia buscar ajuda dos detetives da
equipe especial de sequestro.
— Vou para a delegacia. — Pego a jaqueta de cima do sofá.
— Cara, promete que não vai mais atrás daquele mané. Se ele tivesse
prestado queixa, estávamos ferrados, sabe disso né? — Ethan aconselha-me,
abrindo um pacote de batata frita.
— Sim, sei. Vou pedir mais ajuda. E sem socar ninguém.
— Isso aí, bom garoto — responde, enfiando um punhado de salgadinho
na boca.
Como esse garoto sobrevive só com salgadinhos, refrigerantes, essas
porcarias nada saudáveis. Será que todo nerd se comporta desse jeito? Acho
que usam o cérebro demais e esquecem que precisam do corpo também.
Talvez uma consulta com nutricionista resolva isso. Nota mental.
“Obrigar Ethan procurar nutricionista”
Despeço-me, saindo porta a fora, caminhando pelo corredor, encaro as
paredes seguindo até o elevador. O síndico sumiu como fumaça. Detetive
Parker não conseguiu rastreá-lo. Não usou carro, ou até mesmo cartão de
crédito, o que significa que ganhou uma boa quantia em dinheiro para apagar
as filmagens.
Entro dentro da grande caixa de metal, aperto o botão da garagem, e a
lembrança do sorriso vitorioso nos lábios de Spencer, faz meu sangue ferver.
Cinco minutos, é tudo que preciso para acabar com a vida daquele merda.
Desço na garagem subterrânea, apeto o alarme do carro, e sigo em sua
direção.

Respirando fundo tento manter o controle mental e físico, enquanto dirijo


pelas ruas de Nova York. Aproximo-me do semáforo que fica vermelho
alguns segundos antes. Bato os dedos no volante, observando ao redor, giro a
cabeça para a direita, e vejo algo que me pega totalmente de surpresa.
Luca acompanhado de uma mulher no estacionamento do hospital, a
mesma mulher daquela noite que montamos vigia em frente à sua casa.
Ambos caminham em direção de um carro vermelho modelo esporte. Esse
carro não consta para nós nos registros, por isso não conseguimos localizá-
los. Se minhas suspeitas estiverem certas, essa é Sheron, a minha querida
esposa morta viva. Seu rosto está repleto de hematomas, inclusive o nariz.
O som de buzinas me traz de volta ao tempo real. O sinal está verde e
atrás de mim uma fila enorme de carros. Acelerando, dou a volta no
quarteirão da frente, estacionando em uma esquina que consigo ter ampla
visão do casal. Eles entram no carro, e saem do estacionamento. Mantenho
uma distância segura seguindo-os. Com certeza que estão indo até o cativeiro
onde escondem Cami. Chamo Parker no rádio, e explico o que está
acontecendo. Informo a placa do carro e peço que faça um levantamento
completo sobre a procedência.
Desviando dos carros na avenida, esgueirando atrás de outros, mas
sempre atento ao carro vermelho. Não tenho certeza de quanto tempo
permanecemos no mesmo caminho, porém, mudam a direção seguindo para
um bairro de classe baixa. População humilde, prédios deteriorados,
praticamente uma área abandonada pelos moradores. Vejo quando encostam
o carro em frente a uma casa com a fachada pintada de azul. O casal
maravilha desce do porsche, atravessam o pequeno portão, e entram na casa.
Rua deserta, casas abandonadas, difícil localização, lugar perfeito para
manter uma vítima de sequestro.
Estaciono o carro duas ruas para baixo, não posso deixar que percebam
minha presença. Não posso correr o risco de afugentá-los. Pego o celular, e
faço uma ligação.
— Parker encontrei, eu encontrei-a. Vou entrar. O quê? Não tenho tempo
de esperar reforços. Parker? É a Camilly que está lá dentro. Okay. Okay.
Concordo em esperar você. Vou enviar o endereço para o GPS do seu carro.
Controlo a vontade de louca de sair correndo e invadir aquele lugar, mas
seria perigoso levando em consideração que estão em maior número, além de
não saber se têm armas de fogo. Esfrego uma mão na outra contendo o suor
frio que se apoderou do meu corpo. Coração batendo acelerado, corpo
trêmulo, estou parecendo um policial iniciante em sua primeira missão. Na
realidade, na minha primeira operação não senti metade do que estou
sentindo agora, possivelmente porque não era a pessoa que amo correndo
risco de vida. Confiro no relógio mais uma vez, quantos minutos ainda
restam para Parker chegar? Espero que ele esteja pisando fundo naquele
acelerador, conheço bem como ele dirige, e a tartaruga ganha dele fácil em
uma corrida.
Faróis refletem no retrovisor, reconheço o rosto do detetive. Salto do
carro rapidamente encontrando-o no caminho. Explico novamente em
detalhes desde o início. Atentamente traçamos um plano. Eu sei que é loucura
invadir um cativeiro somente com duas pessoas, mas com diz o ditado “de
médico e louco, todo mundo tem um pouco”, bom, na realidade esses gêmeos
só têm de louco mesmo.
Circulamos em volta do quarteirão onde a casa está localizada,
verificando a possibilidade de uma invasão através dos fundos. Mas para
nossa infelicidade um prédio de dois andares faz fundo com o quintal.
Observamos que a casa vizinha da parte de trás tem um muro que se
pulássemos daria direto nos fundos de onde queremos chegar. Não preciso
dizer nenhuma palavra, Parker compreende meu olhar imediatamente.
Disfarçando como dois meliantes noturnos, invadimos o jardim de algum
morador do bairro. Junto as mãos para criar apoio para que o detetive possa
escalar o muro. Com um pouco de dificuldade, ele consegue subir, virando o
corpo para descer de costas. Seguro com força a bancada de tijolos,
impulsiono as pernas, pulando para através do muro. Ele me encara com os
olhos arregalados a me ver caindo ao seu lado.
— Não tenho culpa que não faz exercícios — sussurro dando de ombros.
Aproveitamos à noite escura para nos esgueirarmos nas sombras,
aproximando-nos de uma pequena janela, talvez banheiro? Não será o
suficiente para entrarmos por aquela abertura. Atentos, vigiando o perímetro,
me aproximo para ouvir o que estão falando. Não ouço nenhuma voz
feminina, somente de Luca e Spencer. Quando escuto as palavras fugir do
país, quero meter o pé em tudo e entrar atirando nesses filhos da puta.
Respiro fundo, porém, ao sentir a mão de Parker apertando meu ombro em
sinal de apoio, me acalma, consolando-me.
Faço gesto com as mãos indicando para que cada um circule um lado da
casa buscando alguma brecha que possamos usamos ao nosso favor. Puxo a
arma do coldre, mantendo-a em punho. Caminho com o corpo abaixado, até
me aproximar de outra janela. Consigo ver através do vidro a iluminação da
lâmpada acesa. Arrisco-me a colocar a ponta da cabeça para olhar, e então, eu
a vejo. Estou com acesso a cozinha, mas consigo vê-la, já que a porta se
encontra metade aberta.
Camilly está deitada em algo que se parece um sofá, seu corpo jogado,
imóvel. O que fizeram com ela? Escondo-me novamente, indo em busca do
detetive. Quando giro o corpo sou pego de surpresa ao sentir o cano de uma
arma diretamente apontada para minha testa.
— Temos convidados, inesperados, mas tudo bem. — Luca sorri.
PORRA! Fodeu tudo, e agora?
— Acorda vagabunda. — Ouço longe uma voz feminina me chamando.
— Anda logo tem visita — repete, enquanto segura meu ombro balançando-
me.
Abro os olhos sonolentos, com a visão embaçada, desnorteada das drogas
sonífera injetada constantemente. Forço o foco para reconhecer quem está
parado em pé próximo ao divã. Por um momento tenho a breve ilusão de ser
Brian, mas sei que não pode ser ele.
— Camilly? — A voz masculina me chama, agitando o sangue em
minhas veias. É como se tivesse levado um choque me deixando em alerta.
— Não fale com ela bastardo — Luca repreende o homem.
Arregalo os olhos, e tenho a certeza de que o meu delegado está na minha
frente. Não consigo evitar abrir um grande sorriso, queria correr para seus
braços, sentir o calor do seu corpo. Oh meu deus, como eu amo esse ogro
metido a príncipe encantado. A questão é o que ele está fazendo aqui, e pior,
algemado nas mãos desse maluco punheteiro. Abro a boca para falar, e antes
que possa sair qualquer palavra, Sheron desce uma tapa no meu rosto. Ergo a
cabeça sentindo a parte superior da minha face ardendo. Encaro seus olhos, e
os hematomas que deram o contraste perfeito com sua cara feia.
— Isso não é nada, igual isso — aponta para o nariz quebrado
Deslizo a língua por entre os lábios com ar superior, debochado.
— Ficou melhor assim, garanto.
— Sua vadia, eu vou te matar.
A Barbie plastificada avança sobre mim sentando-se por cima do meu
quadril. Vamos lá sua vagabunda covarde, bater em uma mulher amarrada é
fácil. Com seu corpo na minha frente não consigo visualizar onde Brian está
com Luca, mas consigo ouvir a voz que faz com que meu coração bata
acelerado, pedindo que a lacraia pare. É difícil ter qualquer reação quando se
tem uma arma apontada para a cabeça. Tenho medo de que o delegado entre
em pânico e faça algo, conheço bem esse ogro. Quando se sente acuado, vira
bicho, por vezes agindo irracionalmente. Percorro os olhos pela sala em
busca do outro gêmeo, Spencer, mas não o encontro.
Se pudesse nesse momento não sei se estaria beijando ou batendo no
senhor Brian Garcia, como pode vir sozinho sabendo do que esse trio é capaz.
Espera, ele já sabe que a Sheron é a Sheron?
Fechando a mão repleta de anéis com pedras preciosas nos dedos, a vadia
se prepara para socar-me. Talvez devesse dar outra cabeçada nessa horrorosa
e terminar a plástica mal feita, mas tenho certeza de que Brian iria intervir
causando maiores problemas. Fecho os olhos, respiro fundo para levar o
golpe.
— Sheron? Eu sei que é você. — Brian chama atenção da morta viva.
Enquanto abro um olho permanecendo com o outro fechado. — Sinceramente
não quero saber por que fez isso comigo, muito menos os motivos.
O quê? Como assim não quer saber os motivos? Oi? Vagabunda morta
viva, eu quero saber os motivos, pode contar tudo, anda, confessa. Não tem
cabimento “não quer saber os motivos”. Que isso homem, tem que saber
SIM, e ainda processar essa mocreia. Você sofreu anos chorando por uma
pessoa que estava viva, dando mais que chuchu na cerca, drogando
adolescentes, amiga íntima do Dr. Rey aquele renomado cirurgião plástico. E
você? Chorando, idolatrando. Achei até que tinha um altar escondido no
quarto com uma foto dessa cretina.
— E quem disse que devo alguma satisfação para você. Mesmo assim
vou contar o motivo que forjei minha morte. — Sheron desce de cima de
mim, andando em direção de Brian e Luca. — Brian Garcia, você sempre foi
um substituto, amei um único homem durante minha vida inteira, e chama
Spencer. Aquele sim é homem e sabe me satisfazer. Cansei da vidinha
patética que levávamos, tédio puro, precisar fugir de você, do seu grude.
Sufocante.
— Você foi má — Luca se intromete na conversa, sorrindo.
Sheron? Spencer? Amantes? Meu Deus, cada minuto que passa tenho a
sensação de que estou protagonizando uma novela mexicana, só falta
aparecer a “Paola e o Carlos Daniel Bracho”.
Vejo claramente que Brian engole em seco, contendo suas emoções, e o
temperamento tempestuoso. O que já acho um milagre. Se pudesse voaria na
garganta dessa maldita e a faria engolir cada palavra, imagino como ele deve
estar se sentindo por dentro ouvindo tudo isso, a dor da traição.
Aproveito o momento de distração, e puxo os pulsos por debaixo da
almofada tentando soltá-los. Spencer na última vez não apertou a braçadeira
tanto quanto seu irmão, deixando até mesmo meus pés livres, devido aos
ferimentos nos tornozelos. Eu sei que em algum lugar, bate um coração, bem
no fundo, fundo mesmo.
Continuo forçando, a cada movimento sinto a dor da pele sendo rasgada
pela braçadeira, mas não importa desde que consiga soltar as mãos.
— Agora que já respondi sua não pergunta. Tenho algumas coisas para
acertar com essa aqui.
— Essa aqui, por acaso sou eu? — respondo ironicamente, assim que
sinto que estou com os pulsos livres.
Sorrindo com os lábios vermelhos e borrados nos cantos, ela avança sobre
mim. Antes que possa me alcançar desvio, e a seguro com força nos braços
jogando-a por cima do divã, fazendo com que caia no chão.
Brian ameaça avançar em nossa direção, porém é impedido pelo gêmeo
psicopata que força o cano da arma em sua cabeça.
— Vamos apreciar o show. Talvez devêssemos apostar o que acha?
— Você é louco — Brian responde apreensivo.
— É já me falaram isso diversas vezes.
Pulo por cima do divã e caindo por cima de Sheron, grudo com as duas
mãos nos seus cabelos, puxando com força enquanto bato sua cabeça contra o
chão.
— ESSA AQUI TEM NOME — grito. — CAMILLY, ENTENDEU?
Os anos de academia aprendendo defesa pessoal serviram para alguma
coisa. Imobilizo a Barbie com as pernas de um jeito que ela não possa fugir.
Ergo uma mão e sem dó e nem piedade desço no seu rosto.
— Esse é por tudo que fez com meu delegado. MEU. — Dou ênfase no
meu.
Respiro fundo, enquanto ela se debate debaixo do meu corpo tentando
escapar. Suas mãos grudam nos meus cabelos, e sinto o couro cabeludo
ardendo, mas não é o suficiente para me impedir.
— Esse é por mim, sua vagabunda. — Invisto mais uma tapa do outro
lado do rosto.
Ouço a risada histérica do gêmeo malvado, então, tenho uma ideia.
Levanto lentamente me afastando do que sobrou da morta viva. Com a
respiração ofegante, giro o corpo ficando frente a frente com os dois homens.
— Solta ele que vou com vocês para onde quiser — proponho.
— Camilly está louca? — Brian esbraveja.
—Você não manda em mim — respondo asperamente.
Antes que ele abra a boca para responder, avanço alguns passos chegando
a Luca. Apoio às mãos no seu peito, inflando seu ego de macho alfa. De
canto de olho, encaro o meu ogro na esperança de que ele perceba o sinal.
Surpreso ao notar que estou encarando-o, pisca os olhos. Realmente espero
que ele tenha compreendido.
Desço a mão pela barriga de Luca em direção ao cós da calça, abro o
botão, abaixando o zíper, e então, seguro suas bolas e as apertos como se
fosse massinha de modelar. Alguém gosta de ovos fritos? Brian usa um
golpe, segurando o pulso do cretino, torcendo em seguida. A arma salta para
longe.
Jogo-me no chão para pegá-la, mas sinto alguém segurando minha perna.
Sheron. A vadia tenta me conter de pegar a arma, enquanto Luca e Brian
entram em uma luta corporal. Balanço as pernas tentando acertar seu rosto.
— Me solta vadia — grito.
— Eu vou matar você — responde com aquela voz esganiçada.
— Vem tentar mocreia, acabo com você antes. — Enfim consigo acertar
o chute no seu rosto.
Quando acho que tudo acabará bem assim que estiver em posse da arma,
sou pega de surpresa. Sabe a expressão “sempre pode piorar”, pois é.
Spencer entra pela porta, com as mãos para cima, e logo atrás o detetive
Parker com sua pistola apontada em direção à cabeça do filho da mãe.
GAME OVER, fim de jogo trio maravilha.
Pego o revólver do chão, e aponto em direção do Luca separando a briga.
Brian instintivamente corre em minha direção me abraçando, desesperado.
Então, tudo acontece em fração de segundos. Sheron levanta-se rapidamente
se jogando em cima do detetive para defender o amor da sua vida. Não temos
tempo suficiente de reagir no momento que Spencer saca a arma do cós da
calça e dispara diretamente no coração do detetive.
Grito alto, assustada ao ver o corpo caindo no chão ensanguentado.
Seguro o braço de Brian tentando impedi-lo, senão ao invés de um, teríamos
dois corpos.
— Não — sussurro.
Erguemos as mãos rendidas. Esse é o nosso fim, mas se for para viver
com esses malucos, prefiro morrer.
— Testando... Teste... Ah está funcionando. Seguinte bando de maluco.
Estão cercados na parada, então, podem soltar meu BFF, e sua demônia de
saia. Camilly palavras de Brian viu. E por favor, vamos acelerar que estou
com fome e fico de péssimo humor.
Sem entender nada do que está acontecendo, troco olhares com Brian.
Ergo uma sobrancelha deixando claro que ele está encrencado por causa do
apelido.
— Ethan? — Brian e eu falamos juntos.
Quem mais falaria desse jeito? Nosso herói será um nerd do FBI,
comedor de salgadinhos, viciado em refrigerante?
Sabe quando você está assistindo um filme de ação, onde tudo acontece
muito rápido e você pensa que isso seria impossível de acontecer na vida
real? Pois, então, sim, pode acontecer realmente. Trouxe meu companheiro e
amigo Parker para uma emboscada que custou sua vida. Meu temperamento
explosivo, e a ansiedade de resgatar Camilly me cegaram completamente. A
saliva desce com um gosto amargo garganta abaixo. Não consigo desviar os
olhos do corpo do detetive, aparentemente o tiro não acertou diretamente o
coração, não sou especialista nisso, mas de ferimentos à bala, eu entendo. Se
conseguirmos um resgate urgente, sua vida poderia ser salva. Temos que sair
daqui de qualquer jeito.
Ouvir a voz daquele nerd maluco ao alto falante, me traz sentimentos de
esperança e pânico ao mesmo tempo. Como ele pretende nos tirar daqui?
Bom, Dylan me disse uma vez que Ethan é um bobo disfarçado, que no fundo
ele é um agente exemplar, além de ser o hacker mais experiente da agência
do FBI.
As expressões de surpresa estampada no rosto desses malditos psicopatas
não têm preço. Esse é o problema de pessoas como eles, não pensam nas
consequências, estão dispostos a viver ou morrer para conseguirem o que
tanto almejam. Mas dessa vez eles não terão a minha mulher. Vou lutar até o
último minuto para tê-la ao meu lado. Guerreira, forte, determinada, corajosa,
merece ter o seu felizes para sempre.
Recuo lentamente alguns passos para trás, levando Cami junto comigo.
Sheron desesperada anda de um lado para outro chorando, suas pernas estão
cambaleando devido ao uso excessivo de entorpecentes, e da surra que levou.
Spencer, troca olhares com Luca, a cumplicidade de um com o outro é
impressionante em nível de se tornar assustador. Como em todos os casos de
gêmeos, sempre tem um dominante e o dominado, obviamente o professor é
aquele que planeja, e o idiota do irmão, conclui os planos colocando em
prática.
O que mais me assusta, deixando-me totalmente em alerta é a frieza com
que Luca está lidando com a situação. Mantendo os braços cruzados sobre o
peito, encara Spencer. Estende sua mão para pegar a arma que o irmão usou
para atirar no detetive. Minha vida passa diante dos meus olhos, tenho a
certeza de que seremos mortos, baleados, antes mesmo de sermos resgatados,
mas então, ele aponta a arma.
Mantendo o cano da arma apontado na direção de oposto, dispara um tiro
certeiro na cabeça de Sheron. Boquiaberto, paralisado, sem qualquer reação,
diante dos meus olhos vejo a mulher que devotei minha vida por tantos anos,
morrer. Seria ironia do destino, sua “suposta” morte foi desse mesmo jeito,
um tiro no crânio a “vida imitando a arte”. Puxo Cami para dentro dos meus
braços, abraço-a apertado. Minhas mãos tremem junto com o restante do
corpo, perdido em misto de sentimentos, sensações.
— PORRA! — Ethan grita do alto falante. — Se esse tiro foi no meu
BFF, cara, você tá muito fodido. Eu vou enfiar meu pé onde o sol não bate,
até sair na garganta, sacou?
Reviro os olhos, amparando minha mulher que treme de medo.
Impotente, incompetente, irresponsável. Devia ter escutado o conselho do
Parker e chamar reforços. Mas como Ethan sabia onde estávamos?
— Ei... Ei... Você largue-a, agora. — Spencer se aproxima, agarrando
Camilly pelos braços puxando-a. Resisto firme, impedindo que a tire de mim.
— Eu se fosse você iria cooperar, ou quer acabar como eles — Luca
aponta para os corpos caídos no chão com um sorriso diabólico nos lábios. —
Melhor, talvez devêssemos matar os dois, podemos superar esse amor, não é
irmão?
— Com certeza, irmão — responde.
Desesperado, e aguardando o plano tático da polícia que cercou a casa do
lado de fora. Abro os braços, soltando-a. Ela ergue a cabeça sorrindo
timidamente, tentando me confortar. Como pode pensar em mim, sendo que
devia estar preocupada com ela mesma. Porra, Ethan. Arromba tudo nerd do
caralho.
Vejo lágrimas rolando pelo rosto de Camilly encarando os corpos
esvaindo em sangue no chão. Spencer mantendo-a presa contra seu corpo. De
repente, suas pernas amolecem e os belos olhos brilhantes se fecham. A
escuridão leva minha demônia de saia. Ela desmaia justo nos braços de um
maníaco. Era para eu estar amparando seu corpo frágil, não esse desgraçado.
Erguendo-a, joga o corpo por cima do ombro.
— Seguimos com o plano irmão? — Spencer questiona Luca.
Mas sinto que algo está errado. Andando de um lado para o outro, esfrega
o cano da arma contra a testa. Os olhos arregalados, sem quaisquer resquícios
de sorriso irônico no rosto. Droga, alguém perdeu o controle. É agora, Ethan,
você tem que fazer algo meu amigo.
— Boa noite, aqui quem está falando é Dener. Sou o negociador
responsável para resolvermos tudo da melhor maneira possível. Estou
disposto a ouvir atentamente quais as exigências para negociarmos. — Até
que enfim colocaram uma pessoa responsável para nos ajudar.
Luca para de andar, olhando ao redor da sala. Encara seu irmão que
carrega o corpo desmaiado de Camilly.
— Vamos usá-la para sair daqui.
— Como?
Aproveito o momento de distração, avançando alguns passos, me
aproximando lentamente. Não tenho ideia de como irei fazer, pretendo me
jogar em cima do mais louco de todos e roubar sua arma. Antes que possa
reagir, ouvimos novamente a voz do negociador. Infelizmente com esses dois
é inútil esse tipo de abordagem.
— Dê-me ela — Luca pede ao seu irmão.
— Eu posso carregá-la. Deixe que eu a leve, por favor — súplica.
Estou próximo o suficiente para lançar-me em cima dele, quando, sou
surpreendido com o cano apontado para mim novamente.
— Eu se fosse você não faria isso, delegado. Ou estouro os miolos dessa
linda mulher. — Vira a cabeça em direção a Camilly.
— OK. — Ergo as mãos rendido, recuando alguns passos para trás.
Obedecendo ao irmão, entrega para ele a minha mulher. Ele agarra seus
cabelos erguendo a cabeça dela, fazendo-a despertar. Assustada, com olhos
arregalados, em uma tentativa desesperada de fugir, corre para longe, e antes
que possa avançar centímetros, é puxada pelos cabelos de volta aos seus
agressores. Os dedos enrolados em um punhado de cabelos, ergue sua cabeça
chegando seu rosto próximo ao dela. Seu nariz, roça na pele do delicado
pescoço. Fecho a mão em punho, só Deus sabe o quanto quero matá-lo.
Luca ordena para que Spencer coloque a braçadeira em meus punhos. E o
cretino faz questão de apertar com força a ponto de cortar a pele. Encaro
dentro dos seus olhos, procurando qualquer sinal de humanidade, mas não
encontro nada.
— Plano B, irmão.
Abrindo a gaveta da escrivaninha, Spencer pega outro revólver. Puxa-me
pelo braço colocando-me em sua frente como escudo, e seu irmão faz o
mesmo com Camilly. Eu sempre estive do lado de fora esperando as pessoas
saírem para negociar, e agora, sou refém de dois merdas psicopatas.
Seguimos pelo corredor com passos lentos, até a porta da entrada principal.
Giro a maçaneta, abrindo-a. E como esperado o circo está armado. Viaturas
com suas lanternas acesas girando em vermelho e azul, policiais armados,
esgueirando atrás dos carros, e Ethan ao lado do negociador.
Avanço para fora com as mãos para cima, e logo atrás Spencer com a
arma nas minhas costas. Claro que na academia para se tornar policial, você
passa por esse treinamento de resgate/vítima. Assim que criamos uma
distância, Luca também se revela com sua refém.
Como de praxe, todos pedem para ficarem calmos, falam sobre negociar,
não fazer nada precipitado e blá blá blá... Sinceramente não sei até onde esses
dois pretendem ir, estão cercados, com dois mortos dentro da casa. Serão
caçados até no inferno.
— Quero um carro, ou mato ela — Luca grita me surpreendendo. — E
que não tenha nada na frente impedindo o carro de sair, entenderam?
Esses malditos não se dão por vencidos nunca? Não iram se render, a
morte é a única coisa que poderá pará-los. Faço alguns gestos com os dedos,
e com os olhos. Instruindo os policiais. Desarmar Spencer é fácil, o medo é
por Camilly. A loucura transborda daquele homem.
Em poucos minutos o carro solicitado, se encontra em frente à rua com a
passagem liberada. A chave é jogada aos pés da refém, que se abaixa
lentamente para pegar. Luca ultrapassa seu irmão, deixando-o para trás.
Spencer, e eu, seguimos a passos rápidos. Vejo quando Dener dá o sinal para
o atirador de elite que estava em cima do prédio vizinho, disparar contra
Spencer. Não tenho tempo de impedi-lo, silencioso, certeiro e mortal. Um tiro
limpo diretamente na cabeça.
Luca gira a cabeça a tempo de ver o irmão caindo com o furo na testa.
Seu grito de dor é alto, estrondoso, animalesco. Lágrimas escorrem molhando
o rosto avermelhado de raiva.
— Spencer? — ele chama o nome pela última vez.
Girando o tambor da arma apontada para Camilly, seu dedo ameaça
apertar o gatilho. Ao invés de atirar, ele abre a porta do passageiro,
empurrando-a para dentro, e entrando junto passando por cima de suas
pernas. O cretino é esperto.
Antes de fechar a porta, ele encara-me com seus olhos azuis, brilhando
por vingança.
— Você acabou de assinar a sentença de morte dela. — Com uma
cotovelada direto no rosto, ele desmaia Cami.
Corro em direção do carro, mais é tarde demais. Acelerando como louco,
escapa levando minha vida junto com ele.
Desperto sentindo meu rosto latejando, abro os olhos lentamente. Por um
instante me sinto desnorteada, perdida, sem saber o que realmente está
acontecendo. Os faróis dos carros da direção oposta atingiram diretamente
minhas retinas, causando certo desconforto. Respiro fundo, recuperando o
controle das minhas funções motoras, então, sou atingida com as lembranças
recentes. Não tenho coragem de olhar para o lado e encarar Luca, prefiro
fingir que não estou ao seu lado. Disfarçadamente, consigo ver que em seus
olhos estão injetados de ódio, estão frios, e distantes. É como se estivesse
dirigindo no piloto automático.
Considero a hipótese de falar com ele, mas tenho medo de sua reação.
Spencer, nossa. Durante todos esses anos permaneci escondida, usando uma
nova identidade porque acreditava ter cometido assassinato. E no fundo,
quem levou os tiros foi esse psicopata cretino que ainda está na minha frente.
Será que algum dia Spencer realmente me amou? Desde início existia esse
acordo entre eles? E ainda tem aquela plastificada. Bom, aquela voltou para
cova, lugar de onde nunca deveria ter saído.
— Acordou. — Sua voz é fria, ríspida.
— Sim. Luca, por favor, me deixe ir.
— Não — responde sem ao menos pensar.
— Está dando tudo errado, por favor. Sheron, Spenc...
Sou interrompida com o cano da arma apontada na minha boca.
— Se falar do meu irmão de novo, mato você de uma forma dolorosa.
Entendeu?
Balanço a cabeça, concordando. Seu humor sarcástico, cheio de confiança
e arrogância não existe mais, estou lidando nesse exato momento é com a sua
verdadeira personalidade, o psicopata maluco. Ele abaixa a arma, colocando-
a no seu colo.
— Porra — berra, ao olhar através do retrovisor.
Logo atrás do carro, uma grande moto nos segue. Não posso ver quem
está pilotando por causa do capacete, mas quem quer que seja, está no
encalço. Piscando o farol da moto sinaliza para Luca estacionar, mas claro
que simplesmente ignora, acelerando ainda mais. Como louco desvia dos
automóveis que dirigem na velocidade permitida da pista, ultrapassando-os.
Puxo o cinto de segurança, atando ao corpo. Seguro firme nas bordas do
banco. Meus olhos não desviam do velocímetro. Pairando ao lado da janela
de Luca, a pessoa conduzindo a moto buzina várias e várias vezes. Não sei
quem é mais maluco o da moto, ou do volante. Não demora muito tempo para
que o som de sirenes da polícia seja ouvido se aproximando de nós. Encaro a
arma no seu colo, considerando pegá-la. Droga, Camilly. Se algo der errado
você está morta, levando em consideração a atual situação de qualquer jeito
posso acabar morta.
Ajeito-me no banco, preparando para dar o bote, quando uma viatura
encosta do meu lado acompanhando a velocidade do carro de Luca. Surpresa
posso ver através do vidro que é o meu delegado, o ogro metido a príncipe
encantado. Girando o volante, joga o carro em cima da viatura, quase tirando
Brian da pista fazendo com que colidisse nas guias do acostamento. O
motoqueiro reduz a velocidade, para se aproximar da viatura conferindo se
está tudo bem.
Até quando essa loucura vai continuar? Pessoas podem se ferir, ou morrer
por minha causa. Tudo começou comigo, e deve acabar comigo. Reúno
coragem que não sabia que tinha, abro o cinto de segurança, conto até dez
mentalmente e, pulo por cima da cambio indo para suas pernas. Seguro a
arma, e antes que possa me afastar, Luca acotovela meu rosto me deixando
zonza.
— CHEGA — grito alto.
Grudo no volante com as mãos girando-o para todos os lados, fazendo o
carro costurar na pista de um lado para o outro. Luca tenta me empurrar, mas
não desisto, e em uma última tentativa de detê-lo, giro o volante por inteiro.
Então, em fração de segundos minha vida inteira passa diante dos meus
olhos, enquanto sou arremessada de um lado a outro dentro do carro. A cada
vez que o automóvel capota rodando no asfalto sinto que estou mais perto do
fim.
É como se fosse em câmera lenta, objetos sendo arremessados para fora
através das janelas, estilhaços de vidros espirrando no rosto cortando a pele.
Minha cabeça batendo contra o teto, o banco, a dor pulsante no corpo dos
ossos sendo moídos. Até que de repente não sinto mais nada. Nem dor, medo,
angústia, todo o sofrimento se vai junto com minha consciência.

— Cami, amor, acorda, por favor. Cadê essa ambulância? — Ouço longe
a voz de Brian, mas não consigo abrir os olhos.
Sua voz vem e vai, vem e vai. A escuridão quer me levar por completo,
mas resisto me agarrando a boas lembranças dos momentos que vivenciei.
Abro os olhos com dificuldade e vejo que estou deitada no chão, e mais
alguns metros o carro capotado. Ethan se esforça para tirar Luca de dentro do
carro, mas suas pernas ficaram presas na lataria da porta.
— Brian? Cara isso aqui tá feio, está vazando gasolina por tudo. Não
tenho como tirar ele daqui, os bombeiros devem estar chegando — grita o
nerd motoqueiro.
— Sai daí, vem para cá. Deixe esse maldito.
Levo uma mão até a cabeça e algo pegajoso gruda nos meus dedos, sinto
no rosto, nos braços. Brian debruça o corpo por cima do meu, chorando,
pedindo perdão. Quero dizer que não tem nada para se perdoar, que não foi
sua culpa, mas a cada movimento é como se facas fossem enfiadas sob minha
pele. Ethan se agacha, segura meu pulso medindo os batimentos cardíacos.
E então, somos surpreendidos com uma grande explosão. Luca que ainda
estava dentro do carro, explode queimando seu corpo junto com o que sobrou
da lataria do automóvel, colocando ponto final na sua loucura. O choque de
vê-lo morrer queimado me faz desmaiar novamente.

Ouço batidas na porta, não é possível que seja outra visita. Além do mais o
horário de visita do hospital já acabou.
— Pode entrar. — Puxo o lençol cobrindo a perna engessada.
Quem mais conseguiria enrolar as enfermeiras do que o nosso querido
John. Balanço a cabeça sorrindo, onde esse cretino estava quando precisei
dele? Capitão T já tem suas próprias batalhas, e demônios internos para lidar.
— Fiquei sabendo que acabou com o maluco. Garota esperta. — Coloca o
buquê de flores em cima do criado mudo.
— Eu se fosse você ficaria com os olhos bem abertos de agora em diante
— ameaço sorrindo.
— Uh que medo. Terá que esperar eu voltar do Brasil para cumprir sua
ameaça.
— Brasil? O que vai fazer lá?
— Está querendo saber demais, gatinha.
— Entendi, sem perguntas.
Explico nos mínimos detalhes como aconteceu, desde a surra na morta
viva que agora está morta, até o acidente de carro. E como Ethan foi genial ao
instalar um localizador no celular do seu amigo sem ninguém saber. Mas algo
me deixou intrigada. Brian tentou entrar em contato com os pais dos gêmeos
malucos e, só então, descobrimos que sofreram um acidente de carro fatal.
Muito cômodo para os filhos, já que herdaram toda a herança. Será que estou
sendo paranoica e, imaginando coisas?
Peço para que John me ajude levantar da cama. Estou no hospital há
quase dez dias. Algumas fraturas, costelas quebradas, hematomas pelo corpo,
nada muito grave. Ficar deitada o dia inteiro é entediante. Agendei uma
reunião com meus advogados no dia seguinte e quero saber se estou no
mínimo apresentável. Apoiando-me, John caminha lentamente ao meu lado
até o banheiro.
Quando encaro o reflexo no espelho, tenho a sensação de ter voltado no
tempo. Na época que olhos inchados, roxos, cortes nos lábios, faziam parte
da rotina.
— Essa não é mais você — repito para mim mesma.
Despeço-me do capitão, com direito a abraço e tudo, já que não sei se
voltará vivo ou quando irei vê-lo novamente. A enfermeira chefe entra no
quarto com a bandeja e os medicamentos. O líquido injetado na seringa em
prazo de minutos me faz dormir tranquilamente.
Os primeiros raios de sol atravessam a janela banhando minha cama.
Abro os olhos preguiçosamente. Chamo a enfermeira através da campainha
solicitando meu café da manhã. Tenho que me preparar para os advogados. A
porta se abre e um delegado afoito entra rapidamente segurando uma enorme
caixa nas mãos.
— Oi amor, o que é isso? — cumprimento-o com um beijo suave nos
lábios.
— É para você. Ia dar quando saísse do hospital, mas não aguento mais
esperar.
— Mas é bem grande — respondo desconfiada.
— Ethan e Parker disse que vai gostar.
— Por falar no detetive, quando ele terá alta?
— Ainda não temos certeza. O homem passou pelo fio da navalha, mais
alguns centímetros e aquela bala teria perfurado seu coração. Pura sorte do
detetive. Vai abrir ou não?
— Okay. Okay. Ansioso.
Puxo as abas da caixa de papel, e de repente, bexigas rosa e branca sobem
até o teto com linhas penduradas a uma placa, com os dizeres:
“Casa comigo?”
Levo as mãos cobrindo a boca, tento controlar as lágrimas que insistem
em descer umedecendo minha pele. É como um sonho, a princesa que
encontrou seu ogro metido a príncipe encantado. Talvez como “Fiona &
Sherek”? Hã, não. Somos mais bonitos.
— Então, fala alguma coisa. — Agitado anda de um lado para outro.
— SIM. SIM. SIM. Mil vezes sim. Seu grosseirão.
Abraço-o, beijando seus lábios entre sorrisos e lágrimas.
Salva de palmas chama nossa atenção. Em frente à porta do quarto as
enfermeiras da ala, batem palmas comemorando com os olhos marejados.
E viva o amor verdadeiro. Mas se esse delegado acha que pode mandar
em mim depois do casamento terá sérios problemas. Você é o delegado Brian
Garcia, mas quem manda aqui, SOU EU.
✽✽✽

Três anos depois ...


Abro mais as pernas apoiando um pé no ombro de Brian. Suas mãos
seguram com força minhas coxas, enquanto sua boca chupa minha boceta. A
língua circula o clitóris, segurando-o com os dentes provocando aquela dor
prazerosa. Gemo alto me contorcendo na cama, agarro os lençóis, delirando
com o misto de sensações.
— Vem amor, vem — imploro.
Ele ergue a cabeça sorrindo maliciosamente, desliza a língua por entre os
lábios degustando do sabor. Mordo os lábios, levando as mãos até os seios,
acariciando-os, apertando os mamilos rígidos, provocando-o. Seu corpo
musculoso, delicioso, posiciona-se entrando no meio das minhas pernas. O
pau rígido, excitado, esfrega na entrada da boceta, me atiçando, me fazendo
ficar louca de desejo.
Com uma única investida, sinto seu membro duro, grosso, entrando fundo
no centro úmido. Enlaço o quadril com as pernas, os movimentos de vai e
vem entrando e saindo. Preenchendo-me por inteira, roço as unhas por suas
costas marcando meu homem como uma gata selvagem. A boca sugando os
seios, entrando, saindo, e logo atinjo o orgasmo, em seguida Brian jorrando
seu líquido quente dentro de mim.
— Amor não quero cortar o clima, mas hoje é o dia de conhecermos a
Nicole e o Dexter.
— Vamos, não quero atrasar no primeiro dia com nossos filhos.
Enquanto Brian toma banho, preparo nosso café da manhã. Por que será
que ele demora mais que eu no chuveiro? Ah se eu pego esse homem
brincando com a mão, corto-a fora.
Prontos, sentamos no sofá aguardando a assistente social. A campainha
toca, e levantamos juntos. Acho que estamos ansiosos demais com esse
processo de adoção. Abro a porta, ouvimos atentamente as orientações sobre
como devemos nos comportar enquanto estivermos no orfanato. Com a
autorização em mãos, seguimos até a casa que as crianças moram
recentemente.
Quando decidimos adotar uma criança, passamos por um longo e rígido
processo de aprovação. Primeiramente queríamos somente um filho, e então,
Nicole nos foi apresentada. Sua mãe era dependente química, deixando o
bebê de poucos meses aos cuidados do filho mais velho, Dexter de apenas
nove anos.
Antes de tomar qualquer decisão, discutimos sobre como seria adotar
duas crianças de uma vez. E assim como eu, meu marido concordou que não
seria justo separarmos os dois irmãos. Sabemos que será um longo caminho
para percorrer até ganharmos a confiança, o amor. Compramos uma grande
casa com um enorme jardim, vários quartos, em um bairro sossegado e
familiar. Queremos paz, e criar nossos filhos com muito amor.
Conforme nos aproximamos do orfanato, sinto aquele frio na barriga.
Minhas mãos estão suando. Brian está sério e concentrado, mas sei que no
fundo está tão nervoso quanto eu. Claro, o grande delegado Garcia, jamais
iria demonstrar quaisquer fraquezas. Encaro através da janela a grande casa
de fachada envelhecida. Puxo uma de suas mãos entrelaçando nossos dedos.
Ele está suando. Abro um grande sorriso para o homem sentado ao meu lado.
Esse que escolhi para ser o pai dos meus filhos, meu marido e entregar
completamente minha vida.
Estacionamos o carro em frente ao jardim, algumas crianças brincam em
um parquinho mais à frente sobre os cuidados de duas acompanhantes. Desço
do carro e respiro fundo. Ainda não acredito que podemos levar nossos filhos
hoje para casa se quisermos. Tudo dependera de como seremos recebidos
pelas crianças.
Em seguida uma senhora desce a escadaria principal vindo ao nosso
encontro. Cumprimentamos com apresentações formais e entregamos o
documento da assistente social com a autorização. Conversamos durante
alguns minutos sobre formalidades, ouvimos atentamente orientações de
como devemos nos comportar mediante à dificuldade de adaptação.
Acompanhamos a senhora Augustine para dentro da casa. Somos
apresentados a cada cômodo, como esperado de uma instituição pública
internamente as mobílias são antigas e reformadas. A sala de TV com um
aparelho antigo e tela pequena. Essas crianças já sofrem tanto e ainda não
podem ter o mínimo de conforto? Agendarei uma reunião com Estefan e
separarei uma quantia em dinheiro para fazer uma doação.
Continuamos em frente por um longo corredor repleto de portas.
Augustine, explica que é os quartos das crianças. E na última porta, sentimos
o coração batendo mais rápido, forte, como se estivéssemos correndo uma
maratona. Eles estão lá dentro.
Aperto a mão do meu ogro, e então, a porta se abre revelando nossos
filhos.
Meus olhos ficam marejados, e respiro fundo segurando à vontade de
chorar. Não quero constrangê-los. Nunca, jamais, sonhei que teria filhos,
depois de tudo que aconteceu no passado. Balanço a cabeça positivamente
para a diretora, que sorri de volta concedendo a permissão.

Dexter está sentado ao lado de Nicole, com algumas peças de encaixar


nas pequenas mãos. Aproximo-me lentamente,
— Posso sentar aqui? — peço ao irmão.
Desconfiado, encarando através de mim, ou melhor, quem está atrás. Viro
a cabeça e faço gesto com a mão pedindo que Brian se aproxime. Seus olhos
castanhos estão arregalados, acho até que vi uma lágrima. Dexter acena que
SIM com a cabeça. Sento-me próximo a ele. Nicole levanta de repente, e
anda em direção ao delegado. Não consigo conter a risada que escapa por
meus lábios.
Ela estende os braços para cima, em um gesto pedindo que ele a pegue no
colo. Paralisado e sem reação, Brian me encara.
— Pega ela amor, pega.
Aquela cena diante dos meus olhos é como um sonho. Desengonçado,
mas carinhosamente, o ogro metido a príncipe encantado, enfim, virou um
príncipe. Augustine sugere que Brian e Nicole andem pela casa para se
conhecerem melhor, e criar um vínculo. Aceno tchau balançando a mão no
ar.
O garoto permanece com a cabeça baixa sem coragem de olhar nos meus
olhos. É como se estivesse com medo. Não gosto nem de imaginar os
horrores que deve ter presenciado quando estava junto de sua mãe biológica.
— Hum também gosto de quebra cabeças. Quando eu era criança, montei
um bem grandão. — Abro os braços mostrando o tamanho. — Você também
gosta?
Esfregando uma mão por cima da outra, Dexter, respira fundo.
— Sim, senhora.
— Oh não precisa me chamar de senhora, sou Camilly. É um prazer
conhecê-lo.
— Vou sentir falta da minha irmã. Poderei visitá-la algum dia? —
questiona com a voz tímida.
— Como assim? Você também vai conosco. Nós quatro seremos uma
família maravilhosa.
— Sério?
Sua atitude muda completamente, e só, então, posso ver seus lindos olhos
ao erguer a cabeça com um grande sorriso no rosto. Faço perguntas em tom
de brincadeiras, e timidamente aos poucos consigo fazer com que ele
converse comigo. Decidimos que todos nós estávamos prontos para ir para
casa... Não precisaríamos de mais visitas de adaptação, tínhamos nos
conectado de coração e alma.
Em questão de dias Nicole já nos chamava de papai e mamãe. Como
orientação pedagógica, Dexter participou de algumas consultas com uma
terapeuta, mas o meu menino é forte, e esqueceu completamente o seu
passado assustador. Sei que um dia ele também irá nos chamar de papai e
mamãe, mas tudo ao seu tempo.

Mais dois anos depois...


Termino de cortar os legumes para a salada. Alyssa tempera a carne para
que possa levar aos churrasqueiros, quer dizer, aqueles que se acham o
máster chef. Brian e Dylan conversam próximos à churrasqueira, usando
aqueles bonés que só tem aba na frente para cobrir o rosto. Não é como se
estivessem jogando golfe, mas não
podemos falar nada, já que segundo eles não entendemos do assunto.
Coloco a salada em cima da mesa, enquanto minha amiga entrega a tigela
com a carne para seu marido. Entramos e saímos de casa preparando a mesa
com pratos, talheres, e o restante da comida.
Dexter, Dominic, e Nicole, correm em volta da grande árvore que tem no
jardim com as armas de jato d´água nas mãos. Não tem nada melhor que
receber amigos, aproveitando o clima quente do verão.
— DOMINIC vem aqui, agora — Alyssa grita com seu filho.
Rapidamente minha amiga vai ao encontro do seu menino, que insiste em
tentar subir na árvore. Por um breve momento vislumbro a cena diante dos
meus olhos. Duas famílias unidas. Crianças correndo, amigos, amor,
companheirismo.
E enfim, meu feliz para sempre

✽✽✽

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