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RESUMO
O presente trabalho apresenta uma síntese da obra do pintor Victor
Meirelles de Lima (A Primeira Missa no Brasil), como também, uma
análise das diversas culturas no ensino-aprendizagem, no
desenvolvimento da cidadania, na preservação de valores éticos e
morais, e nas relações sociais. Verifica-se, a necessidade da escola e
dos professores/educadores reverem o currículo educacional e suas
práticas pedagógicas, as quais devem contemplar à valorização para
com a diversidade sociocultural de cada aluno que chega até a escola,
de forma a reconhecer a “bagagem” e as experiências acumuladas,
que os educandos trazem para o contexto escolar. O objetivo geral da
pesquisa é analisar a influência das diversas culturas no ensino-
aprendizagem e na construção de identidades a partir das diferenças.
O objetivo específico é aprofundar o conhecimento e o conceito sobre
a diversidade cultural na escola e na sociedade. O procedimento
metodológico é de natureza qualitativa desenvolvida através de
pesquisa bibliográfica exploratória. Através dos resultados do
assunto investigado, foi possível compreender, que a diversidade
cultural é a relação do “eu” com o “outro”, isto é, do respeito para com
as diferenças individuais, coletivas, locais, regionais e nacionais. O
desafio analisado contemporaneamente concentra-se, na ausência de
atividades pedagógicas culturais diversificadas no contexto formal e
não formal. Analisa-se, que falta uma formação crítica, reflexiva para
professores e gestores educacionais. Nota-se ainda, que a má
formação não efetiva o processo de aprendizagem, de cidadania,
ética, moral, e de coletividade. O que precisa ser modificado, não é a
cultura dos discentes, mas, a cultura da escola, a qual muitas vezes,
segue um padrão tradicional, passivo, e totalmente fragmentado,
“desligado” da realidade social.
1. INTRODUÇÃO
O estudo realizado tem por objetivo analisar a obra do pintor Victor
Meirelles de Lima (A Primeira Missa no Brasil), como também, a
importância das diversas culturas no ensino-aprendizagem, no
desenvolvimento da cidadania e na preservação de valores éticos e
morais.
Analisando tais fatos, pode-se afirmar que não tem lógica a escola ou
a sociedade querer focar apenas uma cultura para ensinar valores,
modos, costumes, crenças entre outros, pois isso é alienar crianças,
jovens e adultos em processo de desenvolvimento e conhecimento. É
fundamental, entendermos, que não existe apenas uma cultura, mas
sim, diversas culturas produzidas exclusivamente pelas pessoas.
Focar uma cultura em si, é se fechar para as demais, certamente, é
viver sem saber a amplitude dos conhecimentos humanos, dos
valores de cada povo, e das tradições das mais diversas culturas
existentes. O antropólogo Claude Lévi – Strauss, citado por Castro
(2000), define cultura como:
Essa ordem, que é a ordem humana por definição, tem por princípio e
fundamento as regras que produzimos e sobre as quais alicerçamos
a possibilidade de sermos humanos. Sem regras, seríamos incapazes
de produzir ordem e sentido para nossas ações e pensamentos e,
consequentemente, para a realidade que vivemos e produzimos. Sem
elas, não seríamos a espécie de homem que somos. (PASSADOR,
2001, p. 62).
Artigo VII – Todos são iguais perante a lei e tem direito, sem qualquer
distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção
contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e
contra qualquer incitamento a tal discriminação. (ONU, 1948).
O que precisa ser mudado não é a cultura dos alunos, mas a cultura
da escola, que é construída com base em um único modelo cultural, o
hegemônico, apresentando um caráter monocultural. A educação
multicultural é um movimento reformador destinado a realizar
grandes mudanças no sistema educacional. Concebe como a
principal finalidade da educação multicultural favorecer que todos os
estudantes desenvolvam habilidades, atitudes e conhecimentos
necessários para atuar no contexto da sua própria cultura étnica, no
da cultura dominante, assim como para interagir com outras culturas
e situar-se em contextos diferentes dos de sua origem.
3. METODOLOGIA
Na procura de analisar e obter resultados qualitativos sobre a
importância das diversas culturas no ensino-aprendizagem, no
desenvolvimento da cidadania e na preservação de valores éticos e
morais, a realização e conclusão desde trabalho fundamentou-se em
pesquisa bibliográfica exploratória, realizada na biblioteca do
município de Bela Vista da Caroba – PR, e na biblioteca Universitária
do Polo de Capanema – PR, da Faculdade Internacional de Curitiba
(FACINTER). Onde, utilizou-se de (livros de metodologia científica,
obras literárias e didáticas, artigos científicos, dicionários, revistas,
jornais etc.). Na pesquisa identificou a necessidade da escola,
juntamente com os professores e a comunidade escolar em geral,
desenvolver práticas de ensino-aprendizagem diversificadas e
concretas, baseadas na realidade sociocultural dos educandos que a
instituição de ensino recebe na busca de valorizar cada cultura de
cada discente que chega até a escola trazendo histórias, crenças,
tradições, opiniões, sonhos, alegrias e sofrimentos. Como também, é
preciso que a diversidade cultural, seja dialogada em casa pelos pais
para com seus filhos, na busca de construir consciência do quanto às
diferenças são importantes e necessárias para a vida em sociedade,
assim como o respeito aos valores éticos e morais de cada pessoa.
REFERÊNCIAS
ABRAMOWICZ, Anete. Trabalhando a diferença na educação infantil.
São Paulo: Moderna, 2006.
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RESUMO
A Lei nº. 10639/03 alterou a Lei nº. 9394/96, a LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional), tornando obrigatória a inclusão nos currículos da Educação Básica a
História e Cultura Africana e Afro-brasileira. As Diretrizes Curriculares Nacionais, emanadas
pelo Conselho Nacional de Educação, ampliaram as discussões, incluindo a educação das
relações étnico-raciais. O que se pretende é analisar como se deu a educação da população
negra e afro-descendente ao longo do tempo e como se estabelecem hoje nas escolas as
relações Étnico-Raciais e o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira. A partir daí,
verificar qual a proposta da SEED (Secretaria de Estado da Educação) Paraná para o
tratamento da temática étnico-racial e de que forma os educadores tem internalizado essas
propostas. Finalizando, aponta-se para os caminhos possíveis para a implementação da lei nas
escolas da rede pública estadual.
1
Artigo orientado pela Profª. Drª. Fátima Maria Neves, da Universidade Estadual de Maringá.
fatimauem@hotmail.com
2
Pedagoga do Colégio Estadual Enira Moraes Ribeiro – EFMP, Paranavaí – PR, Professora PDE,
Turma 2007. prof_elvira@hotmail.com.
2
INTRODUÇÃO
Um foco de origem dos movimentos sociais negros é resultante das ações sociais de luta pela
abolição do escravismo criminoso e da insatisfação dos resultados práticos da abolição. [...]
Outra origem que deve ser considerada ao aparecimento destes movimentos sociais no meio
negro foi o conjunto de políticas imigratórias européias que se configuravam como políticas
3
racistas contrárias aos interesses e à estabilidade social, econômica e política das populações
negras. Além destas organizações de protesto e formulação direta de luta política devemos
considerar a existência de instituições culturais e religiosas que defendem, de certa maneira, a
consolidação de uma expressão cultural negra. (CUNHA JUNIOR, 2008: p. 3)
Muitas vitórias foram conquistadas, sendo uma delas a aprovação da Lei 10639/03,
que altera a Lei nº. 9394/96, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
tornando obrigatório o ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira na Educação
Básica. A Lei 10639/03 introduziu na LDEN a obrigatoriedade do ensino de história e cultura
africana afro-brasileira. Em março de 2008, entrou em vigor a Lei 11.465/08, que novamente
alterou o Art. 26-A da LDBEN, acrescentando a obrigatoriedade do estudo de História e
Cultura Indígena, juntamente com o estudo de Historia e Cultura Africana e Afro-brasileira.
Contudo há que se ressaltar que a Lei 10639/03 continua em vigor, mesmo com o advento a
Lei 11.645/08, e desse modo, como este trabalho se refere apenas à história e cultura africana
e afro-brasileira, será usada como referência a Lei 10639/03, sem desconsiderar as
modificações produzidas pela nova legislação.
A lei foi um passo importante e teve na seqüência a aprovação das Diretrizes
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino da História e Cultura
Africana e Afro-Brasileira pelo Conselho Nacional de Educação, traduzindo os princípios da
lei de forma a colaborar para a sua implementação nas escolas. No entanto, sabe-se do
desconhecimento dos professores em relação aos conteúdos exigidos pela lei.
“Todos são iguais perante a lei” é o que garante o Art. 5º da Constituição Federal,
prevendo não haver desiguais, mas diferentes. A escola é uma das instituições que deve
contribuir para o cumprimento da norma constitucional e para a mudança do quadro vigente,
sendo de sua competência respeitar matrizes culturais e construir identidades. Para tanto, faz-
se necessário repensar conceitos e verdades arraigados nos educadores.
Para isto, o parecer do Conselho Nacional de Educação, nas questões introdutórias,
esclarece que
procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da educação, à demanda da população
afrodescendente, no sentido de políticas ações afirmativas, isto é, políticas de reparações e de
reconhecimento e valorização de sua história, cultura e identidade. Trata ele de política
curricular, fundada em dimensões históricas, sociais, antropológicas oriundas da realidade
brasileira, e busca combater o racismo e as discriminações que atingem particularmente os
negros. Nesta perspectiva, propõe a divulgação e produção de conhecimentos, a formação de
atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico-
4
têm sido esquecidos os temas e as fontes históricas que poderiam nos ensinar sobre
experiências educativas, escolares ou não, dos indígenas e dos afro-brasileiros. O estudo, por
exemplo, da conquista da alfabetização por esse grupo; dos detalhes sobre a exclusão desses
setores das instituições escolares oficiais, dos mecanismos criados para a escolarização oficial;
da educação dos quilombos; da criação de escolas alternativas; da emergência de uma classe
média negra escolarizada no Brasil; ou das vivências nas primeiras escolas oficiais que
5
aceitaram negros são temas que, além de terem sido desconsiderados no relato da história
oficial da educação, estão sujeitos ao desaparecimento. (CRUZ, 2005: p. 22-23).
Por muito tempo, não se perguntou, por exemplo, sobre a educação dos negros, dos indígenas
ou sobre as especificidades da educação feminina nos diferentes momentos do passado. Hoje,
essas questões são fundamentais para o entendimento do que foi, do que é a educação
brasileira. Mesmo assim muitos ainda teimam em não querer enxergar que são profundamente
diferentes as histórias da educação do homem e da mulher, da criança e do adulto, do negro,
do branco, do indígena e do judeu... Enxergar o “outro” continua exigindo um grande esforço
principalmente para os que não ocuparam o lugar dos que pouco puderam falar ou escrever ao
longo da história (LOPES e GALVÃO, 2001: p. 41).
Através desta investigação, observamos que este ideal de brancura induz o sujeito negro, aqui
representado pelos alunos não-brancos, à rejeição de sua cor e de suas características físicas
raciais, como pudemos captar durante as entrevistas e na análise de redações (IDEM: p. 108).
Eliane Cavalleiro, por sua vez, pesquisou, no ano de 1998, a realidade escolar de uma
escola municipal de educação infantil na cidade de São Paulo. A pesquisadora trabalhou em
duas etapas. Primeiramente observou, em três salas de aula, alguns procedimentos de crianças
e adultos diante da diversidade racial, valores atribuídos pelos professores de educação
infantil aos seus alunos e os valores atribuídos pelas crianças a seus pares; atitudes e práticas
evidenciadoras da presença de discriminação e preconceito na pré-escola. Em uma segunda
etapa foram entrevistados profissionais da escola, alunos e familiares, a fim de levantar os
efeitos das relações sociais na vida dos entrevistados e na sociedade brasileira.
A reflexão sobre os dados coletados levou a pesquisadora a concluir que o espaço
escolar reproduz o modelo de beleza branca/européia, fazendo com que as crianças negras
recusem as características raciais do grupo negro.
“É, eu disse para ela (a professora) que eu não queria ser preta, eu queria ser como a Angélica.
Ela é bonita.” (CAVALLEIRO, 2001: p.146).
10
As pesquisas revelam o que o currículo não mostra: as relações raciais na escola não
são harmoniosas e necessitam ser modificadas, sob pena de continuarem produzindo e
reproduzindo desigualdades, a partir da inferiorização dos grupos não brancos.
Por outro lado, a história e cultura africana e afro-brasileira ainda está pouco presente
nos currículos escolares. Segundo Circe Bittencourt (2005), a concepção de História ensinada
é a de que indígenas e negros não possuem história, apenas influenciaram ou contribuíram
para a vida cultural brasileira, principalmente por meio de hábitos alimentares, música,
eventos esportivos.
Não se conta sobre os movimentos de resistência e de luta contra a escravidão
ocorridas no Brasil, como as revoltas dos Malês, da Balaiada, da Chibata, dos Búzios, nem
sobre a formação dos quilombos (SANTOS, 1997: p.78).
No entanto, muitos historiadores fazem a crítica de que a História do Brasil seja
ensinada na perspectiva de um passado único e homogêneo, ignorando os diferentes setores
sociais e étnicos da sociedade brasileira, atribuindo tal construção ao mito da democracia
racial criado para fundamentar a homogeneização cultural e omitir as diferenças e
desigualdades sociais. (BITTENCOURT, 2005: p 198-199).
O principal problema encontrado no processo de ensino de História Africana é relativo
aos preconceitos que se têm sobre a África. Para Henrique Cunha Júnior, “a imagem do
africano na nossa sociedade é a do selvagem acorrentado à miséria. Imagem construída pela
insistência e persistência das representações africanas como a terra dos macacos, dos leões,
dos homens nus e dos escravos” (CUNHA JR, 1997: p. 58).
Portanto, faz-se urgente aprofundar o conhecimento sobre a história e cultura africana
e afro-brasileira para compreendê-las no contexto da história geral da humanidade.
11
No Paraná, algumas ações e políticas têm sido implementadas pela SEED, desde a
aprovação da Lei 10639/03, a partir das discussões das entidades do Movimento Negro e da
APP-Sindicato. Constituiu-se uma comissão para discussão e encaminhamentos referentes à
temática das relações étnico-raciais na escola e o ensino de História e Cultura Afro-brasileira
e Africana. Resultou daí a elaboração de dois cadernos temáticos visando a divulgação da Lei
e das Diretrizes Curriculares Nacionais editadas pelo Conselho Nacional de Educação
(Parecer nº 003/2004, de 10 de março de 2004), das Normas Complementares elaboradas pelo
Conselho Estadual de Educação, bem como divulgar experiências desenvolvidas sobre a
temática nas escolas públicas estaduais.
Ao prefaciar o caderno temático “Educação para as Relações Étnico-Raciais”, a então
Superintendente de Educação, Drª. Yvelise Freitas de Souza Arco-Verde, explicita o
pensamento da SEED:
Tais conteúdos não se constituem como temas transversais, pois não são assuntos a serem
esporadicamente trabalhados na forma de projetos ou apenas durante dias específicos como o
Dia da Consciência Negra, são, sim, conforme indicam nossas Diretrizes, conteúdos que
devem ser trabalhados em todas as disciplinas da matriz curricular e assim devem estar
contemplados no Projeto Político-Pedagógico de cada instituição de ensino (ARCO-VERDE,
2006: p.7).
sociedade cada vez mais excludente, seletiva e contraditória (Orientações para a Organização
da Semana Pedagógica, 2008: p. 6).
Sem dúvida, com estas atribuições a escola serviria de cortina de fumaça para camuflar as
reais condições estruturais sob as quais a sociedade e cada sujeito em si está condicionado.
Portanto, agrava-se o fato de pensar que, pedagogicamente, a pedagogia de projetos é tomada
como possibilidade de ensino, encobrindo a sistemática pontual que encerra em si mesma.
[...]
O modelo de organização curricular proposto pelos PCN, com base na pedagogia do aprender
a aprender, descentrou os conteúdos historicamente constituídos nas disciplinas escolares, por
meio dos quais a escola trabalha com o conhecimento para dar destaque a outros conteúdos,
chamados por Sacristan (2000) de ‘nebulosos e pouco claros’. (Idem, 2008: p. 8)
Por meio destes conteúdos estruturantes o professor deve discorrer acerca dos problemas
contemporâneos que representam demandas sociais concretas, alguns deles, inclusive, foram
estabelecidos em lei, tais como a inclusão das temáticas de História e Cultura Afro-Brasileira e
da História do Paraná (p. 33).
O professor de Geografia deve estar atento à Lei nº 10639/03, tornando obrigatório abordar
conteúdos que envolvam a temática da história e cultura afro-brasileira e africana que podem
ser vistas nas diferentes séries do Ensino Fundamental e Médio e relaciona-las aos conteúdos
estruturantes de forma contextualizada. O trabalho pedagógico com esta temática pode ser
feita, por exemplo, por meio de mapas, maquetes, textos, imagens, fotos que tragam
conhecimentos específicos tais como: a composição da população brasileira e miscigenação
dos povos; a distribuição espacial da população afrodescendente no Brasil e no mundo; as
contribuições do negro na construção cultural da nação brasileira; as migrações do povo
africano no tempo e no espaço; o trabalho e renda dos afrodescendentes.; a configuração
espacial do continente africano (Diretrizes de Geografia, p. 48).
matemáticas são percebidas por meio de diferentes teorias e práticas, das mais diversas áreas
que emergem dos ambientes culturais. (Diretrizes de Matemática, p.26)
A Educação Física traz como objeto de estudo a cultura corporal Quando trata sobre
cultura corporal e diversidade as diretrizes rezam que
Diante do que evidenciam as diretrizes, pode-se aferir que ainda não concretizam plenamente
a proposta da SEED.
“Em capacitações realizadas na escola estudei sobre as relações étnico-raciais muito pouco.
Este curso contribuiu para adquirir conhecimento e desconstruir alguns mitos que são tão
fortes que surgem dificuldades para articular nossas informações” ( V.B.)
“O curso foi de grande importância, pois eu não tinha conhecimento de alguns assuntos
abordados nos encontros. Gostei de conhecer um pouco mais sobre as relações étnico-raciais e
cultura africana.” (E. V.)
“Eu não tinha a mínima noção da cultura africana, da sua importância para a construção do
povo brasileiro. Comecei a entender a História Africana e por que é tão importante que ela
seja ensinada nas escolas, universidades e movimentos sociais. (R. L.)
16
Quando Henrique Cunha diz “A África é do outro lado da rua e nos falta coragem para
atravessá-la” está dizendo a mais pura verdade. E também que a nossa pobreza foi
conseqüência de uma dominação escravista e racista que nos empobreceu sistematicamente
nos dois lados do Atlântico – me abre a cabeça para entender um pouco mais sobre as relações
étnico-raciais”. (S. C.)
“Achei que a contribuição que o curso trouxe no meu caso, foi poder analisar mais
intimamente a questão racial, não somente com relação aos outros, mas também a mim
mesmo. Isto poderá me ajudar certamente na minha relação com todos: professores e alunos,
nas relações do dia-a-dia, me tornando mais consciente.” (R. L)
“O curso foi muito importante para a minha formação docente. Pois a cada dia vivemos
diferentes situações em sala de aula e com o curso me sinto um pouco mais preparada para
resolver situações de preconceito.” (V. B.)
“O curso teve contribuições teóricas e fortalecimento de idéias e parâmetros para a prática
educativa. Como educadora posso refletir sobre as desigualdades sociais e contribuir para
desenvolver uma nova cultura, novas relações.” (V. B.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realidade apresentada por meio dos estudos, reflexões e depoimentos mostra que a
escola reproduz as discriminações e preconceitos da sociedade nas suas relações sociais. Por
outro lado, existe um reconhecimento das desigualdades étnico-raciais e o desejo de
transformá-las por grande parte dos educadores, tanto daqueles que estão nas escolas quanto
os que estão na SEED, responsáveis pela gestão de políticas educacionais.
Também fica evidente que a maioria dos educadores, por não ter usufruído de tal
formação, não conhece questões relacionadas à África, nem a trajetória dos africanos e afro-
descendentes no Brasil, o que impossibilita trabalhar história e cultura africana e afro-
brasileira coerentemente, sem folclorismos.
Diante desta constatação, aponta-se para a necessidade de uma política de formação
mais intensa, que chegue a todos os educadores da rede pública estadual. Além disso, faz-se
necessário o acompanhamento sistemático dos Projetos Político-Pedagógicos e Propostas
Curriculares das escolas. A instituição de algum concurso (premiação) para professores que
apresentem trabalhos significativos com seus alunos poderia ser um incentivo a mais para a
concretização de políticas educacionais voltadas para a superação do racismo.
O presente trabalho se propôs a mostrar como é tratada a temática pela Lei nº
10639/03 pela SEED e como os professores e pedagogos têm interiorizado as propostas de
implementação. Descortina-se, a partir desta reflexão, um campo profícuo de pesquisa para se
desvendar como se dá a concretização das diretrizes curriculares nas práticas escolares da rede
pública estadual do Paraná.
18
REFERÊNCIAS
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Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
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Marília Pinheiro Machado de Souza, Lygia Lumina Pupatto, Domenico Costella e Maria
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20
______. Diretrizes Curriculares de Química para o Ensino Médio. Curitiba: SEED, 2008.
Disponível em http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/diaadia/diadia/arquivos/File/livro_e
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Disponível em http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/diaadia/diadia/arquivos/File/livro_e
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______. CGE. Orientações para a organização da semana pedagógica 28, 29 e 30/07/2008.
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RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAS, HISTÓRIA, CULTURA AFRICANA E AFRO-
BRASILEIRA NA EDUCAÇÃO PÚBLICA: DA LEGALIDADE À REALIDADE1
RESUMO
A Lei nº. 10639/03 alterou a Lei nº. 9394/96, a LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional), tornando obrigatória a inclusão nos currículos da Educação Básica a
História e Cultura Africana e Afro-brasileira. As Diretrizes Curriculares Nacionais, emanadas
pelo Conselho Nacional de Educação, ampliaram as discussões, incluindo a educação das
relações étnico-raciais. O que se pretende é analisar como se deu a educação da população
negra e afro-descendente ao longo do tempo e como se estabelecem hoje nas escolas as
relações Étnico-Raciais e o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira. A partir daí,
verificar qual a proposta da SEED (Secretaria de Estado da Educação) Paraná para o
tratamento da temática étnico-racial e de que forma os educadores tem internalizado essas
propostas. Finalizando, aponta-se para os caminhos possíveis para a implementação da lei nas
escolas da rede pública estadual.
1
Artigo orientado pela Profª. Drª. Fátima Maria Neves, da Universidade Estadual de Maringá.
fatimauem@hotmail.com
2
Pedagoga do Colégio Estadual Enira Moraes Ribeiro – EFMP, Paranavaí – PR, Professora PDE,
Turma 2007. prof_elvira@hotmail.com.
2
INTRODUÇÃO
Um foco de origem dos movimentos sociais negros é resultante das ações sociais de luta pela
abolição do escravismo criminoso e da insatisfação dos resultados práticos da abolição. [...]
Outra origem que deve ser considerada ao aparecimento destes movimentos sociais no meio
negro foi o conjunto de políticas imigratórias européias que se configuravam como políticas
3
racistas contrárias aos interesses e à estabilidade social, econômica e política das populações
negras. Além destas organizações de protesto e formulação direta de luta política devemos
considerar a existência de instituições culturais e religiosas que defendem, de certa maneira, a
consolidação de uma expressão cultural negra. (CUNHA JUNIOR, 2008: p. 3)
Muitas vitórias foram conquistadas, sendo uma delas a aprovação da Lei 10639/03,
que altera a Lei nº. 9394/96, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
tornando obrigatório o ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira na Educação
Básica. A Lei 10639/03 introduziu na LDEN a obrigatoriedade do ensino de história e cultura
africana afro-brasileira. Em março de 2008, entrou em vigor a Lei 11.465/08, que novamente
alterou o Art. 26-A da LDBEN, acrescentando a obrigatoriedade do estudo de História e
Cultura Indígena, juntamente com o estudo de Historia e Cultura Africana e Afro-brasileira.
Contudo há que se ressaltar que a Lei 10639/03 continua em vigor, mesmo com o advento a
Lei 11.645/08, e desse modo, como este trabalho se refere apenas à história e cultura africana
e afro-brasileira, será usada como referência a Lei 10639/03, sem desconsiderar as
modificações produzidas pela nova legislação.
A lei foi um passo importante e teve na seqüência a aprovação das Diretrizes
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino da História e Cultura
Africana e Afro-Brasileira pelo Conselho Nacional de Educação, traduzindo os princípios da
lei de forma a colaborar para a sua implementação nas escolas. No entanto, sabe-se do
desconhecimento dos professores em relação aos conteúdos exigidos pela lei.
“Todos são iguais perante a lei” é o que garante o Art. 5º da Constituição Federal,
prevendo não haver desiguais, mas diferentes. A escola é uma das instituições que deve
contribuir para o cumprimento da norma constitucional e para a mudança do quadro vigente,
sendo de sua competência respeitar matrizes culturais e construir identidades. Para tanto, faz-
se necessário repensar conceitos e verdades arraigados nos educadores.
Para isto, o parecer do Conselho Nacional de Educação, nas questões introdutórias,
esclarece que
procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da educação, à demanda da população
afrodescendente, no sentido de políticas ações afirmativas, isto é, políticas de reparações e de
reconhecimento e valorização de sua história, cultura e identidade. Trata ele de política
curricular, fundada em dimensões históricas, sociais, antropológicas oriundas da realidade
brasileira, e busca combater o racismo e as discriminações que atingem particularmente os
negros. Nesta perspectiva, propõe a divulgação e produção de conhecimentos, a formação de
atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico-
4
têm sido esquecidos os temas e as fontes históricas que poderiam nos ensinar sobre
experiências educativas, escolares ou não, dos indígenas e dos afro-brasileiros. O estudo, por
exemplo, da conquista da alfabetização por esse grupo; dos detalhes sobre a exclusão desses
setores das instituições escolares oficiais, dos mecanismos criados para a escolarização oficial;
da educação dos quilombos; da criação de escolas alternativas; da emergência de uma classe
média negra escolarizada no Brasil; ou das vivências nas primeiras escolas oficiais que
5
aceitaram negros são temas que, além de terem sido desconsiderados no relato da história
oficial da educação, estão sujeitos ao desaparecimento. (CRUZ, 2005: p. 22-23).
Por muito tempo, não se perguntou, por exemplo, sobre a educação dos negros, dos indígenas
ou sobre as especificidades da educação feminina nos diferentes momentos do passado. Hoje,
essas questões são fundamentais para o entendimento do que foi, do que é a educação
brasileira. Mesmo assim muitos ainda teimam em não querer enxergar que são profundamente
diferentes as histórias da educação do homem e da mulher, da criança e do adulto, do negro,
do branco, do indígena e do judeu... Enxergar o “outro” continua exigindo um grande esforço
principalmente para os que não ocuparam o lugar dos que pouco puderam falar ou escrever ao
longo da história (LOPES e GALVÃO, 2001: p. 41).
Através desta investigação, observamos que este ideal de brancura induz o sujeito negro, aqui
representado pelos alunos não-brancos, à rejeição de sua cor e de suas características físicas
raciais, como pudemos captar durante as entrevistas e na análise de redações (IDEM: p. 108).
Eliane Cavalleiro, por sua vez, pesquisou, no ano de 1998, a realidade escolar de uma
escola municipal de educação infantil na cidade de São Paulo. A pesquisadora trabalhou em
duas etapas. Primeiramente observou, em três salas de aula, alguns procedimentos de crianças
e adultos diante da diversidade racial, valores atribuídos pelos professores de educação
infantil aos seus alunos e os valores atribuídos pelas crianças a seus pares; atitudes e práticas
evidenciadoras da presença de discriminação e preconceito na pré-escola. Em uma segunda
etapa foram entrevistados profissionais da escola, alunos e familiares, a fim de levantar os
efeitos das relações sociais na vida dos entrevistados e na sociedade brasileira.
A reflexão sobre os dados coletados levou a pesquisadora a concluir que o espaço
escolar reproduz o modelo de beleza branca/européia, fazendo com que as crianças negras
recusem as características raciais do grupo negro.
“É, eu disse para ela (a professora) que eu não queria ser preta, eu queria ser como a Angélica.
Ela é bonita.” (CAVALLEIRO, 2001: p.146).
10
As pesquisas revelam o que o currículo não mostra: as relações raciais na escola não
são harmoniosas e necessitam ser modificadas, sob pena de continuarem produzindo e
reproduzindo desigualdades, a partir da inferiorização dos grupos não brancos.
Por outro lado, a história e cultura africana e afro-brasileira ainda está pouco presente
nos currículos escolares. Segundo Circe Bittencourt (2005), a concepção de História ensinada
é a de que indígenas e negros não possuem história, apenas influenciaram ou contribuíram
para a vida cultural brasileira, principalmente por meio de hábitos alimentares, música,
eventos esportivos.
Não se conta sobre os movimentos de resistência e de luta contra a escravidão
ocorridas no Brasil, como as revoltas dos Malês, da Balaiada, da Chibata, dos Búzios, nem
sobre a formação dos quilombos (SANTOS, 1997: p.78).
No entanto, muitos historiadores fazem a crítica de que a História do Brasil seja
ensinada na perspectiva de um passado único e homogêneo, ignorando os diferentes setores
sociais e étnicos da sociedade brasileira, atribuindo tal construção ao mito da democracia
racial criado para fundamentar a homogeneização cultural e omitir as diferenças e
desigualdades sociais. (BITTENCOURT, 2005: p 198-199).
O principal problema encontrado no processo de ensino de História Africana é relativo
aos preconceitos que se têm sobre a África. Para Henrique Cunha Júnior, “a imagem do
africano na nossa sociedade é a do selvagem acorrentado à miséria. Imagem construída pela
insistência e persistência das representações africanas como a terra dos macacos, dos leões,
dos homens nus e dos escravos” (CUNHA JR, 1997: p. 58).
Portanto, faz-se urgente aprofundar o conhecimento sobre a história e cultura africana
e afro-brasileira para compreendê-las no contexto da história geral da humanidade.
11
No Paraná, algumas ações e políticas têm sido implementadas pela SEED, desde a
aprovação da Lei 10639/03, a partir das discussões das entidades do Movimento Negro e da
APP-Sindicato. Constituiu-se uma comissão para discussão e encaminhamentos referentes à
temática das relações étnico-raciais na escola e o ensino de História e Cultura Afro-brasileira
e Africana. Resultou daí a elaboração de dois cadernos temáticos visando a divulgação da Lei
e das Diretrizes Curriculares Nacionais editadas pelo Conselho Nacional de Educação
(Parecer nº 003/2004, de 10 de março de 2004), das Normas Complementares elaboradas pelo
Conselho Estadual de Educação, bem como divulgar experiências desenvolvidas sobre a
temática nas escolas públicas estaduais.
Ao prefaciar o caderno temático “Educação para as Relações Étnico-Raciais”, a então
Superintendente de Educação, Drª. Yvelise Freitas de Souza Arco-Verde, explicita o
pensamento da SEED:
Tais conteúdos não se constituem como temas transversais, pois não são assuntos a serem
esporadicamente trabalhados na forma de projetos ou apenas durante dias específicos como o
Dia da Consciência Negra, são, sim, conforme indicam nossas Diretrizes, conteúdos que
devem ser trabalhados em todas as disciplinas da matriz curricular e assim devem estar
contemplados no Projeto Político-Pedagógico de cada instituição de ensino (ARCO-VERDE,
2006: p.7).
sociedade cada vez mais excludente, seletiva e contraditória (Orientações para a Organização
da Semana Pedagógica, 2008: p. 6).
Sem dúvida, com estas atribuições a escola serviria de cortina de fumaça para camuflar as
reais condições estruturais sob as quais a sociedade e cada sujeito em si está condicionado.
Portanto, agrava-se o fato de pensar que, pedagogicamente, a pedagogia de projetos é tomada
como possibilidade de ensino, encobrindo a sistemática pontual que encerra em si mesma.
[...]
O modelo de organização curricular proposto pelos PCN, com base na pedagogia do aprender
a aprender, descentrou os conteúdos historicamente constituídos nas disciplinas escolares, por
meio dos quais a escola trabalha com o conhecimento para dar destaque a outros conteúdos,
chamados por Sacristan (2000) de ‘nebulosos e pouco claros’. (Idem, 2008: p. 8)
Por meio destes conteúdos estruturantes o professor deve discorrer acerca dos problemas
contemporâneos que representam demandas sociais concretas, alguns deles, inclusive, foram
estabelecidos em lei, tais como a inclusão das temáticas de História e Cultura Afro-Brasileira e
da História do Paraná (p. 33).
O professor de Geografia deve estar atento à Lei nº 10639/03, tornando obrigatório abordar
conteúdos que envolvam a temática da história e cultura afro-brasileira e africana que podem
ser vistas nas diferentes séries do Ensino Fundamental e Médio e relaciona-las aos conteúdos
estruturantes de forma contextualizada. O trabalho pedagógico com esta temática pode ser
feita, por exemplo, por meio de mapas, maquetes, textos, imagens, fotos que tragam
conhecimentos específicos tais como: a composição da população brasileira e miscigenação
dos povos; a distribuição espacial da população afrodescendente no Brasil e no mundo; as
contribuições do negro na construção cultural da nação brasileira; as migrações do povo
africano no tempo e no espaço; o trabalho e renda dos afrodescendentes.; a configuração
espacial do continente africano (Diretrizes de Geografia, p. 48).
matemáticas são percebidas por meio de diferentes teorias e práticas, das mais diversas áreas
que emergem dos ambientes culturais. (Diretrizes de Matemática, p.26)
A Educação Física traz como objeto de estudo a cultura corporal Quando trata sobre
cultura corporal e diversidade as diretrizes rezam que
Diante do que evidenciam as diretrizes, pode-se aferir que ainda não concretizam plenamente
a proposta da SEED.
“Em capacitações realizadas na escola estudei sobre as relações étnico-raciais muito pouco.
Este curso contribuiu para adquirir conhecimento e desconstruir alguns mitos que são tão
fortes que surgem dificuldades para articular nossas informações” ( V.B.)
“O curso foi de grande importância, pois eu não tinha conhecimento de alguns assuntos
abordados nos encontros. Gostei de conhecer um pouco mais sobre as relações étnico-raciais e
cultura africana.” (E. V.)
“Eu não tinha a mínima noção da cultura africana, da sua importância para a construção do
povo brasileiro. Comecei a entender a História Africana e por que é tão importante que ela
seja ensinada nas escolas, universidades e movimentos sociais. (R. L.)
16
Quando Henrique Cunha diz “A África é do outro lado da rua e nos falta coragem para
atravessá-la” está dizendo a mais pura verdade. E também que a nossa pobreza foi
conseqüência de uma dominação escravista e racista que nos empobreceu sistematicamente
nos dois lados do Atlântico – me abre a cabeça para entender um pouco mais sobre as relações
étnico-raciais”. (S. C.)
“Achei que a contribuição que o curso trouxe no meu caso, foi poder analisar mais
intimamente a questão racial, não somente com relação aos outros, mas também a mim
mesmo. Isto poderá me ajudar certamente na minha relação com todos: professores e alunos,
nas relações do dia-a-dia, me tornando mais consciente.” (R. L)
“O curso foi muito importante para a minha formação docente. Pois a cada dia vivemos
diferentes situações em sala de aula e com o curso me sinto um pouco mais preparada para
resolver situações de preconceito.” (V. B.)
“O curso teve contribuições teóricas e fortalecimento de idéias e parâmetros para a prática
educativa. Como educadora posso refletir sobre as desigualdades sociais e contribuir para
desenvolver uma nova cultura, novas relações.” (V. B.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realidade apresentada por meio dos estudos, reflexões e depoimentos mostra que a
escola reproduz as discriminações e preconceitos da sociedade nas suas relações sociais. Por
outro lado, existe um reconhecimento das desigualdades étnico-raciais e o desejo de
transformá-las por grande parte dos educadores, tanto daqueles que estão nas escolas quanto
os que estão na SEED, responsáveis pela gestão de políticas educacionais.
Também fica evidente que a maioria dos educadores, por não ter usufruído de tal
formação, não conhece questões relacionadas à África, nem a trajetória dos africanos e afro-
descendentes no Brasil, o que impossibilita trabalhar história e cultura africana e afro-
brasileira coerentemente, sem folclorismos.
Diante desta constatação, aponta-se para a necessidade de uma política de formação
mais intensa, que chegue a todos os educadores da rede pública estadual. Além disso, faz-se
necessário o acompanhamento sistemático dos Projetos Político-Pedagógicos e Propostas
Curriculares das escolas. A instituição de algum concurso (premiação) para professores que
apresentem trabalhos significativos com seus alunos poderia ser um incentivo a mais para a
concretização de políticas educacionais voltadas para a superação do racismo.
O presente trabalho se propôs a mostrar como é tratada a temática pela Lei nº
10639/03 pela SEED e como os professores e pedagogos têm interiorizado as propostas de
implementação. Descortina-se, a partir desta reflexão, um campo profícuo de pesquisa para se
desvendar como se dá a concretização das diretrizes curriculares nas práticas escolares da rede
pública estadual do Paraná.
18
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22
IDENTIDADE E DIFERENÇA NOS ESPAÇOS EDUCATIVOS
INFANTIS
Edmacy Quirina de Souza macy.souza@hotmail.com
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Brazil
Nilson Fernandes Dinis ndinis@ufscar.br
Universidade Federal de São Carlos, Brazil
Revista Práxis Educacional, vol. 17, núm. 44, pp. 423-442, 2021
INTRODUÇÃO
Imagem 1
Creche Fúlvia Rosemberg.
Fonte: Elaborada pelos autores
As tensões entre identidade e diferença no interior da escola, onde a diferença é
vista como uma ameaça, algo indesejável, têm colocado o outro (aquele que é diferente
de mim) numa posição de erradicação da alteridade.
As escolas, certamente, ainda vivem sob a égide da colonização, pois, além de
considerar a brancura como a identidade normal, valorizam o gênero masculino. Por que
o palhaço e os bonecos que exibem as vogais no corpo são masculinos? Em que lugar
estão as meninas? A escola que, no início, separou católicos de protestantes, adultos de
crianças, ricos de pobres (LOURO, 2013), negros de brancos, também separa meninos de
meninas, privilegia a cultura branca e masculina. O impacto dessas escolhas sobre a
identidade da criança é devastador.
Com as imagens projetadas nesses cartazes, a escola aponta aqueles que deverão
ser modelos e permite que os sujeitos se reconheçam (ou não) nesses modelos. É preciso
tornar visível, além da cultura e da imagem de crianças negras, mais meninas e negras,
estas que foram ocultadas na história e continuam sendo ocultadas nas gravuras e cartazes.
Uma escola que deixa emergir a diferença no seu cotidiano pedagógico contribui para a
desconstrução das fixações da brancura e do sexismo, permitindo que a cultura apareça
como uma prática para dar sentido à educação e ao mundo.
O cartaz da Imagem 2, que se encontra em um muro situado no fundo da creche,
mostra duas crianças brincando, uma negra e uma branca. Podemos inferir que existe a
representação da diversidade e a contemplação da diferença por aparecer a criança negra
nesse contexto de negação de imagens de pessoas negras. Observamos, porém, que o
garoto negro está empurrando a menina branca. Quem sabe, caracterizando o filho do
empregado, empurrando a sinhazinha? Ele não poderia estar em outro balanço, brincando
também?
Imagem 2
Creche Moysés Kuhlmann Jr
Fonte: Elaborado pelos autores.
As imagens contribuem para alargar as diferenças, pois a diferença, como a
identidade, não é um fato da natureza, o que acontece em uma perspectiva de base
essencialista; ao contrário, elas são construídas nas relações sociais e de poder que
atravessam os sujeitos. Trabalhar com a diferença é apontar para a sua não neutralidade.
Estas exposições (painéis, imagens) não podem ser consideradas como produtos
naturais ou desinteressados; elas são um artefato social, histórico, que está entrelaçado
numa relação de poder e de luta pela manutenção da dominação étnico-racial
eurocêntrica.
Na Imagem 3, há um grupo de crianças negras brincando de roda e, ao fundo,
na Imagem 4, duas figuras de crianças desenhadas no muro da escola. É possível
notarmos, nesta gravura, as características fenotípicas das figuras, uma situação que se
constitui realidade comum nas escolas. Percebemos a questão da diferença como algo
dado e fixo. É natural que as imagens tenham traços fenotípicos de pessoas brancas,
enquanto as crianças sejam negras, pois elas precisam ver como funciona a realidade e
precisam se adequar a ela. O diferente se constitui na criança negra, e não nas imagens
brancas, e esta diferença, vista de modo exótico, só poderá ser representada nas imagens
folclóricas, como a imagem lendária do Saci Pererê. Silva (2013) assegura que parece ser
desejo nosso aparar as arestas do outro para torná-lo um mesmo, para fazê-lo caber em
nossa normatividade, uma vez que o estranho e o diferente sempre nos trazem algo de
inquietante.
Imagem 3
Pré-Escola Tomaz T. da Silva
Fonte: Elaborado pelos autores
Imagem 4
Pré-Escola Tomaz T. da Silva
Fonte: Elaborado pelos autores
Para Silva (2012, p. 74), “parece ser fácil definir a ‘identidade’ pelo aquilo que se
é”, ou seja, quando se diz sou negro/a, tenho o nariz achatado, largo, estou afirmando a
diferença, não sou branco/a, não tenho o nariz afilado. “As afirmações sobre diferença só
fazem sentido se compreendidas em sua relação com as afirmações sobre
identidade” (ibid. p. 75), e vice-versa.
A identidade e a diferença estão ligadas a relações de poder, haja vista não haver
um fundamento único para esses constructos. São construções históricas e discursivas que
se manifestam num embate constante de jogo de forças, pois são, na maioria das vezes,
“contraditórias ou não resolvidas” (HALL, 2004, p. 12), em razão das intensas e
constantes interpelações dos sistemas sociais e culturais.
A identidade e a diferença nas instituições educativas vão além das questões de
tolerância e respeito para com a diversidade cultural, pois a presença apenas desses
“nobres sentimentos impedem que vejamos a identidade e a diferença como processos de
produção social, como processos que envolvem relações de poder” (SILVA, 2012, p. 96).
A tolerância aqui é entendida para além do suportar, associado ao politicamente correto.
Muito mais do que tolerar deve-se promover condições para expor essas diferenças e criar
possibilidades de múltiplas respostas para as mesmas.
Avtar Brah (2006), ao problematizar o conceito de diferença, compreende-o como
categoria analítica e destaca quatro diferentes modos de ser conceituada: diferença como
experiência; diferença como relação social; diferença como subjetividade e diferença
como identidade.
Essas quatro categorias surgem em momentos e contextos variados, mas o
interessante é notar que elas estão presentes nas escolas. A primeira, a diferença como
experiência, está fortemente ligada ao feminismo, ao dar "voz coletiva às experiências
pessoais das mulheres" (BRAH, 2006, p. 359), explorando as experiências individuais.
"A experiência não reflete de maneira transparente uma realidade pré-determinada, mas
é uma construção cultural" (ibid., p. 360), o lugar de formação do sujeito. Sabemos que
os sujeitos são constituídos por meio das várias experiências, e estas, por serem diferentes,
muitas vezes, são inferiorizadas, relegadas.
Sobre a segunda maneira de conceituar a diferença, Brah (2006, p. 362) a destaca
como sendo a diferença uma relação social. Defende a maneira como a diferença é
“constituída e organizada em relações sistemáticas através de discursos econômicos,
culturais e políticos e práticas institucionais articulados e instituídos por diferentes
regimes de poder”. Esta diferença pode ser entendida como as trajetórias históricas e
contemporâneas das circunstâncias materiais e práticas culturais que produzem as
condições para a construção das identidades de grupo. Essa diferença se reverbera quando
legados da escravidão, do colonialismo ou do imperialismo são invocados.
Para Silvério (1999, p. 157), a escravidão moderna
Foi motivada economicamente, justificada religiosamente e naturalizada
pela ciência do século XIX. No momento em que a colonização se torna a
alternativa de exploração econômica, a ‘inferioridade’ dos povos
colonizados estava ‘comprovada’ cientificamente, cabendo, portanto, à
cultura europeia com o apoio de seu aparato bélico e militar cumprir sua
missão civilizatória.
Como um espaço atravessado por divisões sociais (gênero, etnia, classe, idade)
que influenciam na constituição identitária do sujeito, a escola continua não apenas a
produzir e a reproduzir diferentes sujeitos, como a multiplicar os desiguais. Projetos de
regeneração e profilaxia social foram arquitetados conforme o pressuposto de que
determinados sujeitos fogem aos modelos de “normais” e disciplinados. A
disciplinaridade e seus resultados são vistos como naturais e necessários, e o espaço
escolar, como espaço de regeneração, de formar corpos dóceis e produtivos.
A seguir, a Imagem 5, registrada na Creche Fúlvia Rosemberg, a qual atende a
crianças de um (01) a três (03) anos de idade. Ao fundo, há duas bonequinhas sentadas
no morango, que são denominadas maçãzinha (cabelo loiro) e moranguinho (cabelo
marrom) e que, socialmente, poderíamos classificá-las como brancas. Notamos que as
crianças que frequentam a creche são negras (Imagem 6). Esta imagem está colada na
janela que dá acesso à secretaria da instituição. Observamos, bem ao fundo da Imagem
05, dentro da secretaria, a ilustração de uma garota branca colada ao mural.
Imagem 5
Creche Fúlvia Rosemberg
Fonte: Elaborado pelos autores
Imagem 6
Creche Fúlvia Rosemberg
Fonte: Elaborado pelos autores.
A escola "impõe, a sim mesma, o dever de fazer de cada um de nós alguém;
alguém com uma identidade bem definida pelos cânones na normalidade, os cânones que
marcam aquilo que deve ser habitual, repetido, reto, em cada um de nós" (FERRÉ, 2011,
p. 196). A diferença se constitui no ‘‘desvio, a inclinação até o não idêntico e nos afasta
da identidade’’.
Podemos destacar as múltiplas identidades e diferença pelas quais o sujeito é
atravessado. O que é uma criança? Uma criança negra? Uma criança menina? Uma
criança bonita? Uma criança brasileira? Nordestina? Baiana? Essas identidades são
constituídas a partir do outro, de um ideal de criança, de beleza, de brasileiro, ou melhor,
são estabelecidos com base em um modelo. E qual o modelo? Como a pessoa branca
constrói a pessoa negra (FANON, 2008) de forma incompleta, quem constrói a criança e
a mulher é o homem branco e, geralmente, as constrói de forma imperfeita - a mulher é a
histérica; a criança, a pequena selvagem; a pessoa negra, a degenerada - pois ele, o homem
branco, o eurocêntrico, o colonizador, o civilizado só enxerga a si mesmo e o outro como
não igual, como não humano. Nesse sentido, reduz-se a diferença a nichos homogêneos
e deixa marcada a diferença como resultado da história e das relações de poder. A outro,
ao diferente, cabe ser respeitado e, até aceito, sem jamais ser enfrentado em sua potência.
É por inúmeras maneiras que o racismo aflora no sistema educacional - na
ornamentação do espaço, na distribuição das imagens que compõem as salas, os
corredores e as portas. O espaço escolar converteu-se em um espaço homogêneo e
hierarquizado e de controle dos processos de ensino aprendizagem sob o qual se corrigem
e normalizam os sujeitos. Existem muito poucas gravuras com as quais a criança preta ou
parda (criança negra) possa se identificar. “Suas crenças, conhecimento, destrezas e
valores são ignorados” (SANTOMÉ, 2012, 165).
Na Imagem 7, registrada na Escola Stuart Hall, que atende a crianças de 4 e 5 anos
de idade (pré-escola), aparecem as gravuras de duas crianças brancas e uma criança negra
e, à frente, um grupo de nove alunos/as todos com características de crianças negras.
Talvez sejam declaradas da cor parda. Não há crianças loiras nesta sala de aula. No painel,
as duas crianças brancas estão juntas, e a criança negra encontra-se afastada por uma
árvore, no outro extremo do painel. Isso seria apenas uma coincidência, ou estaria
relacionado ao isolamento da pessoa negra, à sua segregação, à sua exclusão?
Imagem 7
Pré-Escola Stuart Hall
Fonte: Elaborado pelos autores.
Por outro lado, podemos refletir sobre a presença de um personagem negro em
meio a um número maior de personagens brancos. Se não existe criança loira, por que
tanta necessidade de a representar? Isso faz-nos lembrar de comerciais televisivos, seja
de crianças, seja de adultos, em que as empresas exibem imagens de pessoas brancas de
olhos azuis ou verdes e, ao final do comercial, aparece rapidamente uma pessoa negra,
como se para justificar o não racismo da empresa - “Olha aí, colocamos uma pessoa negra
no comercial, não somos racistas”.
É possível ver que as crianças negras aparecem como ameaça à ordem social; são
os inimigos da sociedade, os desprivilegiados, que não devem ser expostos. As escolas
incorporaram temas como diversidade e diferença e corroboram os documentos oficiais
e políticas públicas, mas, por outro lado, encaram a centralidade de personagens
brancos/as com naturalidade. Ostentam a não superação do etnocentrismo e manifestam
um discurso eurocêntrico, que condiciona o campo pedagógico.
Vejamos mais alguns exemplos (Imagens 8 e 9) que ilustram esse discurso. Numa
sala de pré-escola, é costume o/a professor/a ter um varal em que são penduradas as
atividades com prendedores de roupas. Acreditamos que a professora resolveu enfeitar os
prendedores com rostinhos de crianças, para ficar mais organizado e bonito, mas fez isso
com cabecinhas de crianças brancas. Não conseguimos visualizar nenhuma cabecinha
com características de criança negra nos prendedores, embora a sala seja composta de
mais de vinte crianças negras. Nesta sala, só conseguimos autorização para fotografar
essas três crianças. Vejamos a imagem da direita, em que as cabecinhas aparecem de
forma mais visível.
Imagem 8
Pré-Escola M. Narodowski
Fonte: Elaborado pelos autores
Imagem 9
Pré-Escola M. Narodowski.
Fonte: Elaborado pelos autores.
Segundo Silva (2012), as estratégias pedagógicas para lidar com a identidade e a
diferença têm se pautado em três categorias, assim classificadas: liberal, terapêutica e a
de inspiração pós-estruturalista. Mas existe uma que se encontra no lugar intermediário
entre a primeira (liberal) e a segunda (terapêutica).
A estratégia liberal, ao trabalhar com a diversidade, estimula e cultiva o
sentimento de boa vontade. Segundo essa estratégia, a diversidade é constructo da
natureza, é porque “nasceu assim”; Deus os criou desse jeito, e, por isso, devem ser
respeitados ou tolerados, pois eles não têm culpa de ser como são. O problema é que essa
abordagem “deixa de questionar as relações de poder e os processos de diferenciação que,
antes de tudo, produzem a identidade e a diferença” (SILVA, 2012, p. 98).
A estratégia terapêutica posiciona a diversidade como boa e natural, mas atribui a
rejeição da diferença e do outro a distúrbios psicológicos e, que por isso, as atitudes e os
comportamentos preconceituosos e discriminatórios devem ser tratados, pois constituem
desvio de condutas. A pedagogia e o currículo devem proporcionar atividades e exercícios
de conscientização para que os/as estudantes mudem os seus comportamentos e as suas
atitudes (idem).
A estratégia intermediária baseia-se na intercalação entre as duas primeiras e,
conforme Silva, é a mais comum na rotina escolar e no currículo. Ela “consiste em
apresentar aos estudantes e às estudantes uma visão superficial e distante das diferentes
culturas”. Para ela “o outro aparece sob a rubrica do curioso e do exótico” e não há
questionamento das relações de poder que envolvem a identidade e a diferença, pois isso
é feito de forma distante para não causar “nenhum risco do confronto e dissonância”
(SILVA, 2012, p. 99).
E, por fim, a abordagem pós-estruturalista, segundo a qual a pedagogia e o
currículo tratam a identidade e a diferença como questões políticas e produções culturais
sedimentadas nas relações de poder e, por isso, não são fixas e imutáveis. “Antes de
tolerar, respeitar e de admitir a diferença, é preciso explicar como ela é ativamente
produzida” (idem).
Independente da estratégia utilizada, a pedagogia, o currículo, os/as professores/as
precisam colocar tais temáticas no centro dos discursos da escola, com vistas a equacionar
uma política de alteridade com seus múltiplos modos de endereçamentos2, pois não existe
uma estratégia certa, ou melhor, em todas correm-se riscos. Como os modos de
endereçamento “erram” seus públicos, o currículo, a pedagogia, as estratégias de ensino
também podem errar. Os sujeitos e as identidades são múltiplos; de forma análoga, as
estratégias podem ser múltiplas, sem garantias de sucesso.
O poder de endereçamento
Imagem 10
Creche Maria Bujes
Fonte: Elaborado pelos autores.
Se a escola fabrica sujeitos, subjetividades, identidades; se a disciplina é
produtiva, então como se dão essas construções na educação infantil? Observamos que o
processo de fabricação dos sujeitos é continuado e geralmente muito sutil. Porém, se
Admitirmos que a escola não apenas transmite conhecimentos, nem
mesmo apenas os produz, mas que ela também fabrica sujeitos, produz
identidades étnicas, de gênero, de classe; se reconhecemos que essas
identidades estão sendo produzidas através de relações de desigualdade,
se admitirmos que a escola está intrinsecamente comprometida com a
manutenção de uma sociedade dividida e que faz isso cotidianamente,
com nossa participação ou omissão; se acreditamos que a prática escolar
é historicamente contingente e que é uma prática política, isto é, que se
transforma e pode ser subvertida; e, por fim, se não nos sentimos
conformes, então certamente, encontramos justificativas não apenas
para observar, mas, especialmente, para tentar interferir na continuidade
dessas desigualdades (LOURO, 2012, p. 89-90).
A escola precisa valorizar uma estética negra que extrapole o glamour da TV. A
estética negra necessita se propagar nos telejornais e novelas brasileiras, e não apenas no
carnaval carioca, em que a mulher negra exibe a sua sensualidade. Precisa ser
incorporada, no cinema, aos desenhos animados, na literatura infantil, nos muros e
paredes das escolas.
Vale questionar por que os sujeitos, a raça, a sexualidade sempre são
caracterizados, discutidos como isso ou aquilo, verdadeiro ou falso, legal ou ilegal, vez
que as pessoas negras e as brancas, o mundo e o submundo, o normal e o patológico estão
sempre separados por uma linha imaginária. Nos discursos racializados, tudo o que não
pode ser pensado em termos científicos, civilizados, desenvolvidos cairá no colonialismo
do sem lei e sem regra, um estado de natureza que caracteriza a dominação patriarcal e
colonial hegemônicas.
Vemos que a escola reproduz esse paradigma quando separa alunos/as fortes e
fracos/as, como a sociedade também opera nessa lógica quando, binariamente, separa
homem e mulher, hetero e homo, criança e adulto, negro/a e branco/a, europeu/ia e
africano/a e/ou latino/a, enfim. Os discursos da escola, como inclusiva e aberta, que
integra harmonicamente as diferenças, caem por terra diante de todas as imagens
mostradas no decorrer deste capítulo. Os regimes de verdade constroem esse “outro”
(negro/a) como objeto colonial.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
______. Quem precisa de identidade. In: SILVA, Tomaz Tadeu da (org). Identidade e
diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, p. 103-133, 2012.
KOSSOY, Boris. Fotografia & história. São Paulo: Ateliê Editorial, 2012.
LOURO, Guacira Lopes. A escola e a pluralidade dos tempos e espaços. In: COSTA,
Marisa Vorraber. Escola Básica na virada do século: cultura, política e currículo. São
Paulo: Cortez, p. 73 - 106, 2002.
MANGUEL, Alberto. Lendo imagens: uma história de amor e ódio. São Paulo:
Companhia das Letras, 2001.
SILVA, Antonio Luiz da. Pluralidade e diversidade: pensar sobre a diferença e a sua
emergência na escola. Revista Lugares de Educação, Bananeiras/PB, v. 3, n. 6, p. 197-
213, Jul.-Dez., 2013. Disponível em: Disponível
em: http://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/rle/article/download/15801/9360. Acesso em
09 jul. 2020.
INCLUSÃO
De acordo com o Mini-dicionário Aurélio (2004), incluir (inclusão) significa:
1Conter ou trazer em si; compreender, abranger. 2Fazer tomar parte; inserir, introduzir.
3Fazer constar de lista, de série, etc; relacionar.”
Para Monteiro (2001): “[...] A inclusão é a garantia, a todos, do acesso contínuo
ao espaço comum da vida em sociedade, uma sociedade mais justa, mais igualitária, e
respeitosa, orientada para o acolhimento a diversidade humana e pautada em ações
coletivas que visem a equiparação das oportunidades de desenvolvimento das
dimensões humanas (MONTEIRO, 2001, p. 1).”
De acordo com Mantoan (2005), inclusão: “É a nossa capacidade de entender e
reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e compartilhar com pessoas
diferentes de nós. A educação inclusiva acolhe todas as pessoas, sem exceção. É para o
estudante com deficiência física, para os que têm comprometimento mental, para os
superdotados, para todas as minorias e para a criança que é discriminada por qualquer
outro motivo. Costumo dizer que estar junto é se aglomerar no cinema, no ônibus e até
na sala de aula com pessoas que não conhecemos. Já inclusão é estar com, é interagir
com o outro.”
Em se tratando de educação partimos do pressuposto de que inclusão é a ideia de
que todas as crianças têm o direto de se educar juntos em uma mesma escola, sem que
esta escola exija requisitos para ingresso e não selecione os alunos, mas, sim, uma
escola que garanta o acesso e a permanência com sucesso, dando condições de
aprendizagem a todos os seus alunos.
Tudo isso é possível na medida em que a escola promova mudanças no seu
processo de ensinar e aprender, reconhecendo o valor de cada criança e o seu estilo de
aprendizagem, reconhecendo que todos possuem potencialidades e que estas
potencialidades devem ser desenvolvidas.
Quando pensamos em uma escola inclusiva, é necessário pensar em uma
modificação da estrutura, do funcionamento e da resposta educativa, fazendo com que a
escola dê lugar para todas as diferenças e não somente aos alunos com
necessidades especiais. A fim de mudar a sua prática educativa, a escola deverá
desenvolver estratégias de ensino diferenciadas que possibilitem o aluno a aprender e se
desenvolver adequadamente. De acordo com Carvalho (2000, p. 111) “A proposta
inclusiva pressupõe uma ‘nova’ sociedade e, nela, uma escola diferente e melhor do que
a que temos.” E diz ainda, “Mas aceitar o ideário da inclusão, não garante ao bem
intencionado mudar o que existe, num passe de mágica. A escola inclusiva, isto é, a
escola para todos deve estar inserida num mundo inclusivo onde as desigualdades não
atinjam os níveis abomináveis com os quais temos convivido.”
A escola é o espaço primordial para se oportunizar a integração e melhor
convivência entre os alunos, os professores e possibilita o acesso aos bens culturais.
Portanto é preciso que a escola busque trabalhar de forma democrática, oferecendo
oportunidades de uma vida melhor para todos independente de condição social,
econômica, raça, religião, sexo, etc. Todos os alunos têm direito de estarem na escola,
aprendendo e participando, sem ser discriminado ou ter que enfrentar algum tipo de
preconceito por motivo algum.
Segundo Haddad (2008) “[...] o benefício da inclusão não é apenas para crianças
com deficiência, é efetivamente para toda a comunidade, porque o ambiente escolar
sofre um impacto no sentido da cidadania, da diversidade e do aprendizado.” Na
Constituição Federal (1988) a educação já era garantida como um direito de todos e um
dos seus objetivos fundamentais era, “promover o bem de todos, sem preconceitos de
origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” No (artigo
3º, inciso IV) da Constituição Federal (1988), como também no artigo 205, a educação é
declarada como um direito de todos, devendo ela garantir o pleno desenvolvimento da
pessoa, o seu exercício de cidadania e a qualificação para o trabalho.
A educação inclusiva é reconhecida como uma ação política, cultural, social e
pedagógica a favor do direito de todos a uma educação de qualidade e de um sistema
educacional organizado e inclusivo. À escola cabe a responsabilidade em atender as
diferenças, considerando que para haver qualidade na educação é necessário assegurar
uma educação que se preocupe em atender a diversidade.
Segundo Mantoan (2005, p.18), se o que pretendemos é que a escola seja
inclusiva, é urgente que seus planos se redefinam para uma educação voltada para a
cidadania global, plena, livre de preconceitos e que reconhece e valoriza as diferenças.
A educação inclusiva visa desenvolver valores educacionais e metodologias que
permitam desenvolver as diferenças através do aprender em conjunto, buscando a
remoção de barreiras na aprendizagem e promovendo a aprendizagem de todos,
principalmente dos que se encontram mais vulneráveis, em contraposição com a escola
tradicional, que sempre foi seletiva, considerando as diferenças como uma anormalidade
e, desenvolvendo um ensino homogeneizado Carvalho (2000).
Corroborando a afirmação de Carvalho, Araújo (1988, p. 44) diz: “[...] a escola
precisa abandonar o modelo no qual se esperam alunos homogêneos, tratando como
iguais os diferentes, e incorporar uma concepção que considere a diversidade tanto no
âmbito do trabalho com os conteúdos escolares quanto no das relações interpessoais. É
preciso que a escola trabalhe no sentido de mudar suas práticas de ensino visando o
sucesso de todos os alunos, pois o fracasso e o insucesso escolar acabam por levar os
alunos ao abandono, contribuindo assim com um ensino excludente.”
A educação inclusiva, dentro de um processo responsável, precisa garantir a
aprendizagem a todas as pessoas, dando condições para que desenvolvam sentimentos
de respeito à diferença, que sejam solidários e cooperativos. De acordo com Mantoan,
(2008, p.2): “Temos de combater a descrença e o pessimismo dos acomodados e
mostrar que a inclusão é uma grande oportunidade para que alunos, pais e educadores
demonstrem as suas competências, poderes e responsabilidades educacionais. As
ferramentas estão aí, para que as mudanças aconteçam, urgentemente, e para que
reinventemos a escola, desconstruindo a máquina obsoleta que a dinamiza, os conceitos
sobre os quais ela se fundamenta os pilares teórico-metodológicos em que ela se
sustenta.”
Em busca de uma escola de qualidade, objetivando uma educação voltada para a
emancipação e humanização do aluno, é fundamental que o sistema educacional prime
por uma educação para todos, onde o enfoque seja dado às diferenças existentes dentro
da escola. Uma tarefa nada fácil, que exige transformações acerca do sistema como um
todo e mudanças significativas no olhar da escola, pensando a adaptação do contexto
escolar ao aluno. Com o objetivo de construir uma proposta educacional inclusiva e
ressponsável é fundamental que a equipe escolar tenha muito claro os princípios
norteadores destaproposta que devem estar calcados no desenvolvimento da
democracia.
De acordo com o documento Diretrizes Nacionais para a Educação Especial
(2001, p. 23) os princíppios norteadores de uma educação inclusiva são:
- Preservação da dignidade humana;
- Busca de identidade;
- Exercício de cidadania.
DIVERSIDADES RELIGIOSAS
Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua religião. Para
odiar, as pessoas precisam aprender; e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas
a amar.
O respeito à diversidade é um dos valores de cidadania mais importantes, sendo
fundamental valorizar cada pessoa, independente de qual religião pertença, tendo
consciência de que cada uma teve e tem sua contribuição ao longo da história. Assim, as
diferentes expressões religiosas devem ser consideradas na escola, especialmente na
escola pública.
Para melhor entender este novo universo conceitual e de conteúdo, Silva (2004,
p. 140) esclarece dizendo, “Ensino de religiões, estudo de diversidades, exercícios de
alteridade: estes sim podem ser conteúdos trabalhados na escola pública. Da mesma
forma que o professor de literatura faz referência a diversas escolas literárias; da mesma
forma que o professor de História enfatiza diversos povos, assim o ensino de religiões
deve enfatizar diversas expressões religiosas, considerando que as religiões fazem parte
da aventura humana.“
A escola precisa valorizar os fenômenos religiosos como patrimônio cultural e
histórico, buscando discutir princípios, valores, diferenças, tendo em vista a
compreensãodo outro. Por isso é importantíssimo que o professor trabalhe com os
alunos atitudes de tolerância e respeito às diferenças desenvolvendo um trabalho com a
diversidade religiosa. E ele pode estar utilizando-se das aulas de Ensino Religioso para
estar fazendo este trabalho ou de quaisquer outras situações em suas áreas de
conhecimento, tomando o cuidado em refletir com os alunos o maior número possível
de expressões religiosas existentes na sociedade, buscando garantir o direito de livre
expressão de culto, evitandose o proselitismo ou intolerância religiosa.
Ao estar abordando estas questões religiosas, especialmente nas aulas de Ensino
Religioso, é preciso que se tome o cuidado para não realizar catequese dentro da
escola,
pois a escola pública não é confessional e, portanto, não pode se reduzir a
nenhum tipo específico de religião, o que pode causar crime de discriminação. Segundo
a LDB 9394/96, em seu artigo 33º podemos encontrar o seguinte esclarecimento, “O
Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do
cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas do ensino
fundamental, assegurando o respeito a diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas
quaisquer formas de proselitismo.” (BRASIL, 1996) A liberdade religiosa é um dos
direitos fundamentais da humanidade, como afirma a Declaração Universal dos Direitos
Humanos (1948) em seu art. XVIII:
Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este
direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa
religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou
coletivamente, em público ou particular.( NACÕES UNIDAS, 1948.)
A própria Constituição Brasileira (1988) em seu art. 5º, inciso VI diz: “É
inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos
cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas
liturgias.” (BRASIL,1998, p. 5).
É preciso cuidar para que não seja realizado dentro da escola discriminação
quanto as diversidades religiosas existentes mantendo equilíbrio e imparcialidade, em
busca de uma educação de qualidade. É um grande desafio para a escola pública levaros
alunos a reflexão sobre a diversidade de nossa cultura, marcada pela religiosidade.
Segundo Heerdt, (2003, p. 34) Ӄ fundamental que as escolas incentivem os
educandos a conhecer a sua própria religião, a ter interesse por outras formas de
religiosidade, valorizando cada uma e respeitando a diversidadereligiosa, sem nenhum
tipo de preconceito.”
A escola pública deve trabalhar no sentido de ampliar os limites quanto aos
vários tipos de culturas religiosas, desmontando os preconceitos, fazendo com que todos
sejam ouvidos e respeitados, pois intolerância religiosa é desrespeito aos direitos
humanos. De acordo com o Código Penal Brasileiro constitui crime (punível com multa
e até detenção), zombar publicamente de alguém por motivo de crença religiosa,
impedir ou perturbarcerimônia ou culto, e ofender publicamente imagens e outros
objetos de culto religioso.
Assim, cada cidadão precisa assumir a postura do respeito pelo ser humano,
independente de religião ou crença, tendo consciência de que cada pessoa pode
fazer sua opção religiosa e manifestar-se livremente de acordo com os princípios de
cada cultura.
Sugestões de filmes que abordam a temática: Fé; Marcelino pão e vinho; 21
gramas; Baraka; Deus é brasileiro.
DIVERSIDADES DE GÊNERO
DIVERSIDADES DO CAMPO
DIVERSIDADE INDÍGENA
Uma outra diversidade verificada no interior da escola pública, que vem sendo
muito valorizada atualmente é com relação à educação escolar indígena. Os indígenas
também clamam por processos educacionais que lhes permitam o acesso aos
conhecimentos universais, mas que valorize também suas línguas e saberes tradicionais.
A Constituição de 1988 reconheceu o direito dos índios (autóctones) de permanecerem
índios e de terem suas tradições e modos de vida respeitados. Em seu art. 210 fica
assegurado aos povos indígenas o direito de utilizarem suas línguas maternas e
processos próprios de aprendizagem buscando transformar a instituição escolar em um
instrumento de valorização e sistematização de saberes e práticas tradicionais, ao
mesmo tempo em que possibilita aos índios o acesso aos conhecimentos universais e a
valorização dos conhecimentos étnicos.
A partir da Constituição de 1988 e mais fortemente na LBB 9394/96 os
indígenas passaram a ser reconhecidos legalmente em suas diferenças e peculiaridades.
A LDB 9394/96 (1996) estabelece em seu artigo 78, que aos índios devem ser
proporcionadas arecuperação de suas memórias históricas, a reafirmação de suas
identidades étnicas e a valorização de suas línguas e ciências. Aos índios, suas
comunidades e povos devem ser garantidos o acesso às informações, conhecimentos
técnicos e científicos da sociedade nacional e das demais sociedades indígenas e não-
índias. O Plano Nacional de Educação (2001) estabelece objetivos e metas para o
desenvolvimento da educação escolar indígena diferenciada, intercultural, bilíngüe e de
qualidade. Muitas ações em relação à educação escolar dos indígenas já foram
realizadas, porém ainda se percebe um quadro desigual, fragmentado e pouco
estruturado de oferta e atendimento educacional aos índios.
A diversidade dos povos indígenas precisa ser considerada de fato, exigindo
iniciativas diferenciadas por serem portadores de tradições culturais específicas. A
escolarização dos indígenas precisa acontecer a partir do paradigma da especificidade,
da diferença, da interculturalidade e da valorização da diversidade linguística
desenvolvendo assim, ações culturais, históricas e lingüísticas.
Os indígenas precisam ser respeitados e incluídos nos sistemas de ensino do
país, tendo a sua diversidade étnica valorizada e que entre os indígenas e não indígenas
haja um diálogo tolerante e verdadeiro. A proposta é por uma educação escolar indígena
diferenciada, que possibilite a inclusão deste grupo no sistema educacional, tendo
respeitadas as suas peculiaridades. Por isto, muitos investimentos têm sido realizados
com relação a educação escolar dos indígenas, principalmente em relação aos
professores, capacitando professores indígenas que conhecem a realidade, a história e a
cultura do seu grupo ao longo de todo o processo histórico brasileiro. A questão da
educação escolar indígena é uma grande evolução e conquista.
Muitas reflexões e muitas ações ainda precisam ser desencadeadas com o
objetivo de valorização e preservação da cultura indígena, propiciando o
reconhecimento dos indígenas como sujeitos da história e que a eles devem ser
garantidos o acesso aos direitos de qualquer cidadão.
Sugestões de filmes que abordam a temática: Pocahontas; Dança com os lobos;
Pirinop – meu primeiro contato; Dança da ema; A semente da vingança; Estratégia
Quando se trabalha diretamente com linguagem constata-se de modo muito
evidente, a existência de formas diferentes no falar; são variações (variantes) que
obedecem diferentes fatores: regional, de gênero, situacional, sociocultural etc. No
entanto, a escola prioriza o trabalho com a Norma Padrão- NP. As outras formas de
falar não recebem tanta atenção no ensino sistematizado.
Ocorre a exclusão com a linguagem oral e escrita, pois, existe um parâmetro
para orientar o exercício linguístico, mas que acaba por ser adotado como padrão entre o
certo e errado. Quem não fala e não escreve de acordo com a NP é discriminado
socialmente e sofre sansões negativas.
A linguagem é, sem sombras de dúvidas, a grande ponte que liga o “eu”ao “tu”,
o “eu” ao “diferente de mim” (ao outro). Um forte e poderoso instrumento para os que
acreditam num mundo mais harmônico, melhor para todos, sem distinções. Porém, para
que isso ocorra, reiteramos, é necessário entendê-la, reconhecer o seu poder nas relações
sociais e observá-la em toda sua plenitude.
E que isso não fique limitado a alguns profissionais, mas seja parte da bagagem
cultural de todos os que trabalham com educação, inclusive dos nossos educandos. A
escola tem a função de ensinar seus educandos, por meio dos seus professores, a
dominar a NP, porque ela é exigida pela sociedade. O que a escola e os professores não
podem e não devem fazer é promover a discriminação de quem não exerce a NP, por
não entender ainda que é por meio dela que se organiza determinadas relações sociais e
que ela é utilizada como meio de acessibilidade à ampliação da capacidade de
comunicação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
______. Declaração Mundial sobre Educação para Todos: plano de ação para
satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem. UNESCO, Jomtiem/Tailândia,
1990.
HEERDT, Mauri Luiz, Coppi. Paulo de. Como Educar Hoje? reflexões e propostas
para uma educação integral. São Paulo : Mundo e Missão,2003. p. 34,69,70,
SANTOS. Rafael dos (orgs.). Multiculturalismo: mil e uma faces da Escola. 3. ed. Rio
de Janeiro: DP&A, 2002. p. 140.
CULTURA BRASILEIRA: DA DIVERSIDADE À DESIGUALDADE
Francisco Porfírio
https://brasilescola.uol.com.br/sociologia/cultura-brasileira-diversidade-
desigualdade.htm
Apesar de ser um país com uma vasta constituição cultural, o Brasil apresenta
elementos que atestam a desigualdade social entre as diversas culturas que o constituem.
RESUMO
O presente trabalho científico busca averiguar a posição que os tratados internacionais, especial-
mente os de direitos humanos, assumem no ordenamento jurídico pátrio. Para tanto, faz, inicial-
mente, um arrazoado histórico relativo à evolução do Direito Internacional Público e o status quo
atual. Após analisar a posição que os tratados comuns ocupam no direito nacional, passa ao estudo
do tema central, isto é, os tratados internacionais sobre direitos humanos. Nese ponto, disserta de-
tidamente a respeito da evolução do entendimento do Supremo Tribunal Federal relativo ao tema,
verificando as várias teorias utilizadas pelos ministros em suas decisões. Após contrapor, à sequên-
cia, a posição do STF com a da doutrina mais moderna, faz uma ponderação final crítica a respeito
do posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre a temática abordada.
Palavras-chave:Direito Internacional Público. Tratados Internacionais. Tratados internacio-
nais de direitos humanos.
ABSTRACT
This scientific work aims to investigate the position that international treaties, especially human ri-
ghts, assumes in the national law. Therefore, it initially a historical rationale for the development of
the Public International Law and the current status quo. After examining the position that ordinary
treaties occupy in national law, it passes to the study of the central theme, i.e., international human
rights treaties. At this point, carefully lecture on the evolution of the understanding of the Supre-
me Court on the issue by checking the various theories used by ministers in their decisions. After
counter, the sequence, the position of the STF with the most modern doctrine, makes a final critical
weighting about the positioning of the Supreme Court on the theme.
Keywords:Public International Law. International Treaties. International human rights trea-
1 Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS. Pós-graduando em Direito do Estado pela Uniritter Laureate Universi-
ties. Mestrando em Fundamentos da Integração Jurídica pela UFRGS. Advogado.
2
Revista Direito e Humanidades
tic affair (ou da não ingerência), que cerceava a atuação hierarquia existente entre leis nacionais e tratados inter-
do direito internacional, perante os Estados soberanos; nacionais, dos quais o Brasil faça parte, deixando tal in-
evoluindo para a ideia do international concern, segundo cumbência à doutrina e jurisprudência (Mazzuoli, 2008).
a qual a proteção a direitos básicos do ser humano torna-
-se uma questão de direito internacional (Gomes, 2011). A questão é inegavelmente complexa e sua solução
Essa nova realidade transmite a ideia de que o bem comum passa por definições conceituais que vão ganhar sig-
internacional se coloca acima do bem comum nacional, e nificação mediante um processo cognitivo subjetivo. O
o Estado nacional deixou de ser uma sociedade autossu- STF evoluiu o seu posicionamento, tendo alterado-o de
ficiente e fechada, necessitando de integração com os de- maneira importante nos últimos anos. Para o estudo do
mais países da sociedade internacional. A própria ideia de tema, far-se-á uma divisão: primeiro, estudar-se-ão os
soberania, que no século XVI era conceituada por Bodin tratados internacionais comuns para, após, realizar-se
como um “poder absoluto e perpétuo de uma República”, a análise dos tratados internacionais sobre direitos hu-
transformou-se, nas palavras de Néstor Pedro Sagüés, em manos, que são o principal escopo do presente artigo.
“una potestad relativa, cada vez más recortada” (Gomes,
2011). Assim, a mitigação da soberania ocorre no mes-
mo ritmo em que a sociedade internacional se fortalece.
3. DOS TRATADOS INTERNACIO-
NAIS COMUNS
O entendimento tende para um caminho dialógico, no
qual haja uma constante conversação entre as duas ju- Primeiramente, abordaremos a hierarquia dos tratados in-
risdições (Gomes, 2011). O precursor de tal ideia é o ternacionais comuns – isto é, aqueles que não versam so-
alemão Erik Jayme, que em seu Curso geral de Haia, bre direitos humanos – no ordenamento jurídico brasileiro.
em 1995, chamou de “diálogo das fontes” (dialogue des
sources) a tentativa de conciliar duas fontes de direito dis- A doutrina a propósito da matéria é extremamente con-
sonantes, a fim de que formassem algo novo, com base troversa. Os entendimentos variam desde a ideia de
em tal “conversa”. Ainda que a referida teoria tenha sido que o tratado internacional não pode suplantar lei ordi-
concebida inicialmente para o campo do direito interna- nária (segundo adeptos da teoria dualista e a monista
cional privado, não há impedimento algum em estendê- nacionalista) até o pensamento daqueles doutrinado-
-la ao campo de atuação do Direito Internacional Público. res que defendem o status supraconstitucional dos tra-
tados internacionais, visto que seriam normas que se
Segundo a teoria de Jayme, à solução de antinomias inserem no conceito de jus cogens internacional (adep-
que surgem no cotidiano jurídico não são mais suficien- tos da teoria monista internacionalista) (Sagüés, 1999).
tes os métodos hermenêuticos tradicionais da revo-
gação por derrogação tácita ou ab-rogação de norma Assim considerando, caberia a pergunta: o que ocorre se
incompatível (Miragem, 2012). As diversas fontes de uma lei brasileira ofende um tratado internacional comum,
direito, tais como os direitos constitucionais, fundamen- ratificado pelo Brasil? Novamente, a solução é complexa.
tais, humanos, leis, códigos, tratados etc., “não mais se Para alguns, seria o caso de inconstitucionalidade, por vio-
excluem, ou não mais se revogam mutuamente; ao con- lação indireta da constituição (transgressão da escala hie-
trário, elas falam umas às outras e os juízes são leva- rárquica) (Sagüés, 1999). Outros consideram que se trata
dos a coordenar estas fontes escutando o que as fon- pura e simplesmente do tradicional controle de legalidade
tes dizem” (Jayme, 2012). Desta feita, surge uma nova das leis nacionais. De outra banda, há a posição de Ma-
proposta de perspectiva, acerca da relação entre as zzuoli, que considera ser o caso do controle de supralega-
mais diversas fontes que o direito tem a si, imanentes. lidade, expressão criada por ele para conceituar aqueles
tratados que estão acima da normatividade ordinária, mas
Em termos de fontes de direito internacional, os tratados abaixo da Constituição Federal, o que, na prática, teria
internacionais ocupam hoje um lugar de proeminência os mesmos efeitos do controle de legalidade, visto que
no plano jurídico mundial, constituindo a principal fonte só poderia ser feito de maneira difusa (Mazzuoli, 2008).
de obrigação do direito internacional (Piovesan, 2010).
Posta em evidência a discussão doutrinária, cumpre
Na realidade brasileira, a Constituição da República Fe- esclarecer de que maneira a corte suprema brasileira
derativa do Brasil, promulgada em 1988, após o perío- vem divisando a questão. Diferentemente do que ocor-
do ditatorial, garante a adoção de direitos e garantias re com os tratados que versam sobre direitos humanos
oriundos de tratados internacionais de que a República (como se verá no próximo ponto), a maioria dos ministros
brasileira for parte15. Entretanto, a CRFB/88, não consig-
nou expressamente em nenhum de seus dispositivos a do Supremo mantém o clássico posicionamento conser-
15
Art. 5º, § 2º da CRFB: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos prin-
cípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.”. BRASIL. Constituição
(1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.
4
Revista Direito e Humanidades
vador da Corte, no sentido de que os tratados internacio- dos princípios regedores das relações internacionais do
nais ratificados pelo Brasil têm status de lei ordinária20. Brasil o da prevalência dos direitos humanos (inciso II, do
artigo 4º, da CRFB/88), garantindo, em âmbito constitu-
Desse modo, o poder para fazer tratados pelo Estado cional endógeno, a vedação à tortura ou tratamento hu-
brasileiro (treaty-making power) ainda hoje é subordina- mano degradante (inciso III do artigo 5º). Dispôs-se que
do à Constituição da República, levando à conclusão de “as normas definidoras dos direitos e garantias funda-
que “[n]enhum valor jurídico terá o tratado internacional, mentais têm aplicação imediata” (parágrafo 1º do art. 5º).
que, incorporado ao sistema de direito positivo interno,
transgredir, formal ou materialmente, o texto da Carta Quanto à relação de direitos integrantes do nosso orde-
Política.”21 Assim, a Constituição acaba sendo um limite namento jurídico, o parágrafo 2º do art. 5º dispõe que “os
material aos tratados internacionais firmados pelo Brasil, direitos e garantias expressos nesta Constituição não ex-
em que pese que tal afirmação esteja desconforme com cluem outros decorrentes do regime e dos princípios por
o que o Direito Internacional Público estabelece. Quanto ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a
ao confronto entre tratados internacionais gerais e leis or- República Federativa do Brasil seja parte.” Por sua vez, a
dinárias, segundo o STF, continuariam sendo resolvidos Emenda Constitucional 45, de 2004, fez mais dois adendos
pelos clássicos métodos de especialidade e anterioridade. de parágrafos ao artigo 5º, formulando, no parágrafo 3º, a
ideia de que “tratados e convenções internacionais sobre
4. DOS TRATADOS SOBRE DIREI- direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do
Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos
TOS HUMANOS votos dos respectivos membros, serão equivalentes às
emendas constitucionais.” e, no parágrafo 4º, enunciando
Cumpre destacar, em princípio de discussão, que a Cons- que “O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal
tituição Federal de 1988 representou um marco na história Internacional, a cuja criação tenha manifestado adesão”.
brasileira. Após o fim do período ditatorial, o Brasil cami-
nhava rumo a uma nova ordem jurídico-social, marcada No quadro geral de integração de normas de direito interna-
por um processo de redemocratização e de institucionali- cional com a Constituição Federal de 1988, o parágrafo 3º
zação dos direitos humanos. Concomitantemente, o Esta- do art. 5º eleva os tratados sobre direitos humanos a uma
do brasileiro aderia e ratificava cada vez mais instrumentos categoria superior às demais normas internacionais, mo-
jurídicos internacionais relativos à proteção dos direitos tivo pelo qual os direitos humanos devem ser vistos como
humanos, tanto no âmbito do sistema das Nações Unidas alvos de prerrogativas constitucionais no ordenamento ju-
quanto no sistema Interamericano de direitos humanos. rídico brasileiro. Ainda que assim não fosse, há que se con-
siderar que esses direitos, ditos humanos, estão no mais
Nesse contexto, a Constituição brasileira de 1988 contém alto patamar da hierarquia normativa, por serem aqueles
diversos dispositivos que dão vida a essa nova posição que tutelam os bens jurídicos que o ser humano tem a si
do Brasil, relativa aos direitos humanos, sendo conside- inarredáveis e, se extirpados do homem, não mais assim
rada como o “documento mais abrangente e pormeno- poderemos chamá-lo. Justifica-se a importância da defe-
rizado sobre os direitos humanos jamais visto no Brasil” sa dos direitos humanos em face de crimes de lesa-huma-
(Piovesan, 2010), estando entre as Constituições mais nidade, pois eles violam não só o direito das vítimas, mas
avançadas no mundo nesta matéria. A dignidade da pes- a própria “consciência da humanidade” (Jardim, 2011).
soa humana foi alçada a um dos fundamentos da Repú-
blica Federativa brasileira24. Estabeleceu-se como um Reconhecida a peculiaridade inerente à proteção dos
20
Neste sentido: “os tratados concluídos pelo estado federal possuem, em nosso sistema normativo, o mesmo grau
de autoridade e de eficácia das leis nacionais”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida Cautelar na Ação Direta
de Inconstitucionalidade nº 1347. Relator: Min. Celso de Mello, Brasília, DF, 05/09/1995, Diário da Justiça, Brasília,
DF, 1º dez. 1995; e “Tratados e convenções internacionais – tendo-se presente o sistema jurídico existente no Brasil
(RTJ 83/809) – guardam estrita relação de paridade normativa com as leis ordinárias editadas pelo Estado brasileiro.
A normatividade emergente dos tratados internacionais, dentro do sistema jurídico brasileiro, permite situar esses atos
de direito internacional público, no que concerne à hierarquia das fontes, no mesmo plano e no mesmo grau de eficácia
em que se posicionam as leis internas do Brasil. A eventual precedência dos atos internacionais sobre as normas infra-
constitucionais de direito interno brasileiro somente ocorrerá – presente o contexto de eventual situação de antinomia
com o ordenamento doméstico –, não em virtude de uma inexistente primazia hierárquica, mas, sempre, em face da
aplicação do critério cronológico (lex posterior derogat priori) ou, quando cabível, do critério da especialidade.” BRASIL.
Supremo Tribunal Federal. Extradição nº 662 (Peru). Relator: Min. Celso de Mello, Brasília, DF, 28/11/1996, Diário da
Justiça, Brasília, DF, 13 jun. 2003.
21
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Mandado de Injunção nº 772. Relator: Min. Celso de
Mello, Brasília, DF, 24/10/2007, Diário da Justiça, Brasília, DF, 20 mar. 2009.
24
Cf. art. 1º, III da CRFB.
5
Revista Direito e Humanidades
direitos humanos, o sistema jurídico brasileiro adotou – ensão do desenvolvimento jurisprudencial da corte.
expressamente pelo art. 5º, parágrafo 3º da CRFB, intro- A temática tinha uma interpretação do STF, no sentido de
duzido pela EC 45/04, como dito anteriormente – o posi- que a Convenção Americana de Direitos Humanos não
cionamento segundo o qual os direitos humanos possuem era aplicável à legislação brasileira, no presente caso,
uma hierarquia superior aos demais (“privilégio hierárqui- uma vez que a Convenção teria status de lei ordinária,
co”, segundo Carlos Weis, 2006), conforme se depreen- não podendo, portanto, contrariar a Constituição Federal,
de da leitura sistemática do conjunto ordenamental bra- a qual permite a prisão civil por dívida, no caso do de-
sileiro. Nessa senda, colocam-se como parcial exceção positário infiel. Nesse sentido podemos citar como exem-
à regra de incorporação de tratados internacionais os plos o HC 73.044/SP, julgado em 1996, e o HC 72.131,
relativos a direitos humanos, divergindo quantos aos de- julgado em 1995, nos quais o STF, por maioria (no HC
mais no tangente à integração, eficácia e aplicabilidade. 72131, a votação teve quatro votos contrários), decidiu
que a prisão civil do depositário infiel era constitucional33.
Entretanto, o criticado29 parágrafo 3º do art. 5º da CRFB
não logrou êxito em pôr termo às discussões a respeito Contudo, cabe ressaltar que, anteriormente à reforma
da hierarquia das normas internacionais de direitos hu- constitucional que acrescentou o § 3º no art. 5º da CRFB
manos. Segundo parte da doutrina humanista, a redação (EC 45/04), o próprio STF já sinalava a necessidade de
trazida pela EC 45/2004 não levou em consideração a uma maior hierarquia normativa dos tratados sobre direi-
doutrina e jurisprudência internacional relativa ao tema, tos humanos. É o que podemos depreender de trecho da
tendo aumentado ainda mais a controvérsia a respeito ementa do HC 81.319/GO, de 2002, que também tratava
do status das normas ratificadas pelo Estado brasilei- sobre a questão da prisão do depositário infiel, in verbis:
ro, na temática dos direitos humanos (Mazzuoli, 2011).
É irrecusável que os tratados e convenções interna-
Assim, criou-se um intricado quadro, em que coexistem cionais não podem transgredir a normatividade subor-
três tipos de hierarquia de normas internacionais, peran- dinante da Constituição da República nem dispõem de
te as de direito interno: a das normas internacionais que força normativa para restringir a eficácia jurídica das
não versam sobre direitos humanos (trabalhadas no ponto cláusulas constitucionais e dos preceitos inscritos no
anterior); as normas internacionais de direitos humanos, texto da Lei Fundamental (...). Revela-se altamente
ratificadas pelo Estado brasileiro, que não passaram pelo desejável, no entanto, “de jure constituendo”, que, à
procedimento do parágrafo 3º do art. 5º da CRFB31; e os semelhança do que se registra no direito constitucio-
tratados internacionais sobre direitos humanos que passa- nal comparado (Constituições da Argentina, do Para-
ram pelo quórum previsto no 3º do art. 5º da CRFB32. Para guai, da Federação Russa, do Reino dos Países Bai-
cada uma dessas normas há um diferente grau hierárqui- xos, e do Peru, v.g.), o Congresso Nacional venha a
co, havendo entendimentos nos mais diversos sentidos. outorgar hierarquia constitucional aos tratados sobre
direitos humanos celebrados pelo Estado brasileiro34.
4.1– Do posicionamento do STF
Atendendo ao clamor por uma maior atenção aos tratados
Para analisar a evolução do posicionamento do STF, de direitos humanos, a inserção do § 3º no art. 5º da CRFB,
em relação à colocação dos tratados internacionais feita pela EC 45/04, deixa claro que não há mais dúvidas
sobre direitos humanos no direito nacional, usare- de que os tratados internacionais sobre direitos humanos,
mos o exemplo paradigmático da prisão do deposi- aprovados no rito do referido parágrafo, têm força constitu-
tário infiel, que muito tem a contribuir para a compre- cional. Contudo, os demais tratados sobre direitos huma-
nos não aprovados, segundo aquele procedimento ,conti-
29
Grande parte dos doutrinadores de direitos humanos vê com olhos críticos tal emenda, acreditando que ela veio
para tumultuar ainda mais a estrutura hierárquica dos tratados sobre direitos humanos. Cf. VENTURA, Deisy. A Inter-
pretação Judicial da Lei de Anistia Brasileira e o Direito Internacional. Revista Anistia Política e Justiça de Transição /
Ministério da Justiça. Brasília, nº 4, jul./dez. 2010. p. 203.
31
Para Rezek, “é sensato crer que, ao promulgar esse parágrafo na Emenda constitucional 45, de 8 de dezembro de
2004, sem nenhuma ressalva abjuratória dos tratados sobre direitos humanos, outrora concluídos mediante processo
simples, o Congresso constituinte os elevou à categoria dos tratados de nível constitucional”. REZEK, José Francisco.
Direito Internacional público: curso elementar. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 103. Por outro lado, o Ministro Gil-
mar Mendes, no voto do Rext 466.343/SP, entendeu que a referida Emenda acabou representando “uma declaração
eloquente de que os tratados internacionais já ratificados pelo BRASIL. anteriormente à mudança constitucional, e não
submetidos ao processo legislativo especial de aprovação no Congresso Nacional, não podem ser comparados às
normas constitucionais.” BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n.466343 de São Paulo. Relator:
Min. Cezar Peluso, Brasília, DF, 03 dez. 2008, Diário da Justiça, Brasília, DF, 5 de jun. 2009.
32
Até hoje, somente foi aprovado segundo o rito do § 3º do art. 5º da CF, a Convenção Internacional sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência (Dec. 6.949, de 25.8.2009).
6
Revista Direito e Humanidades
nuariam, segundo tal posição do STF, no nível das normas STF representa um avanço no âmbito dos direitos humanos.
legais ordinárias, no nosso ordenamento jurídico interno.
A referida posição, todavia, não é unânime no pró-
Todavia, esse entendimento foi reformado para mais bem prio tribunal constitucional. Em voto divergente, o Min.
se coadunar com a ordem jurídica constitucional e o pa- Celso de Mello considerou que os tratados de direi-
norama jurídico internacional, a partir da decisão do Re- tos humanos, em si mesmos considerados, possui-
curso Extraordinário 466.343/SP, em dezembro de 2008, riam força de norma constitucional, diante da previsão
a qual consubstanciou que os tratados internacionais do art. 5º, § 1º e 2º da Constituição Federal. Esse en-
de direitos humanos valem mais do que a lei e menos tendimento vai ao encontro das aspirações da doutri-
que a Constituição, estando no nível supralegal no País. na humanista, bem como da consolidada jurisprudên-
cia dos tribunais internacionais de direitos humanos36.
Desse modo, a posição que hoje adota o Supremo, ca-
pitaneada pelo Min. Gilmar Mendes, leva em conside- O Min. Joaquim Barbosa, por sua vez, entendeu por reco-
ração a importância que o tópico dos direitos humanos nhecer a hierarquia constitucional da Convenção America-
possui, entretanto, não os coloca imediatamente em nível na sobre Direitos Humanos, no julgamento do AI 601.832,
constitucional. Para assumir o status de norma consti- por conta do disposto no §3º do art. 5º, afirmando que “a
tucional, contudo, necessitam passar pelo procedimen- Corte deve evoluir do entendimento então prevalecente
to previsto no art. 5º, § 3º da Constituição, quando, en- (...) para reconhecer a hierarquia constitucional da Conven-
tão, passarão a formar o “bloco de constitucionalidade”. ção.”37 Assim, o ministro Barbosa, ainda que por argumen-
tos distintos do ministro Celso de Mello, reconheceu o status
O Min. Gilmar Mendes, no voto proferido no RE 466.343/ normativo constitucional dos tratados de direitos humanos,
SP, destacou existirem quatro correntes principais a res- ao interpretar extensivamente o § 3º do art. 5º da CRFB.
peito do status normativo dos tratados internacionais so-
bre direitos humanos, a saber: supraconstitucional; cons- Como se pode notar, a posição adotada pelo STF utiliza com
titucional; supralegal e status de lei ordinária. A seu ver, no imperícia o direito internacional, autorizando-se a dizer, no
contexto observado hodiernamente, há “a abertura cada mesmo sentido em que Deisy Ventura o faz, que o “STF
vez maior do Estado constitucional a ordens jurídicas su- aplica pouco e mal o Direito Internacional” (Ventura, 2010).
pranacionais de proteção de direitos humanos”, restando, Esse fato é o que leva a doutrinadora citada, com base
portanto, evidente que os tratados internacionais sobre di- na doutrina de Marcelo Neves (2009) e Bruce Ackerman
reitos humanos merecem tratamento privilegiado. Dessa (1996), a afirmar que a postura do STF é de “provincianis-
maneira, adotou o ministro a tese da supralegalidade, se- mo jurídico”, visto que desconsidera os grandes avanços
gundo a qual os tratados e convenções sobre direitos hu- da doutrina e jurisprudência internacionais (Ventura, 1991).
manos seriam infraconstitucionais, “porém, diante de seu
caráter especial, em relação aos demais atos normativos 4.2 – Da posição doutrinária
internacionais, também seriam dotados de um atributo de
supralegalidade”35. Apesar de não atender plenamente às O entendimento esposado pelo Supremo Tribunal Fe-
expectativas humanistas e à evolução constatada na juris- deral é, de certo modo, conservador e desatende às
prudência das cortes internacionais sobre direitos huma- expectativas do constitucionalismo moderno. A dou-
nos, é inegável que a adoção desse posicionamento pelo trina dominante, por sua vez, vem discutindo a matéria
33
Cabe colacionar trecho da ementa do HC 73.044, elucidativo para entender a posição adotada então pelo STF: “Os
compromissos assumidos pelo Brasil em tratado internacional de que seja parte (§ 2º do art. 5º da Constituição) não
minimizam o conceito de soberania do Estado-povo, na elaboração da sua Constituição; por essa razão, o art. 7º,
nº 7, do Pacto de São José da Costa Rica, (“ninguém deve ser detido por dívida”: “este princípio não limita os man-
dados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar”) deve
ser interpretado com as limitações impostas pelo art. 5º, LXVII, da Constituição”. BRASIL. Supremo Tribunal Federal.
Habeas Corpus n.73.044. Relator: Min. Mauricio Correa, Brasília, DF, 19 mar. 1996, Diário da Justiça, Brasília, DF, 20
set. 1996. O entendimento de que os tratados internacionais de direitos humanos possuem status normativo de lei
ordinária é observado, contudo, desde o julgamento do Recurso Extraordinário nº 80.004, de 1977.
34
Idem. Habeas Corpus nº 81.319. Relator: Min. Celso de Mello, Brasília, DF, 24 abr. 2002, Diário da Justiça, Brasília,
DF, 19 ago. 2005.
35
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 466.343, de São Paulo. Relator: Min. Cezar Peluso,
Brasília, DF, 03 dez. 2008, Diário da Justiça, Brasília, DF, 5 de jun. 2009. Cumpre ressaltar que essa tese já havia
sido defendida no ano de 2000, pelo Ministro Sepúlveda Pertence, no voto do RHC 79-785-RJ.
36
É o que se vê no voto do Ministro proferido no RE 466.343/SP: “Após muita reflexão sobre esse tema (...), inclino-
-me a acolher essa orientação, que atribui natureza constitucional às convenções internacionais de direitos humanos
[...].” Ibidem.
7
Revista Direito e Humanidades
37
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 601.832. Voto do Min. Joa-
quim Barbosa, Brasília, DF, 17 mar. 2009, Diário da Justiça, Brasília, DF, 3 abr. 2009.
42
Cf. art. 5º, § 2º da CRFB.
45
Em suas palavras: “[...] se a Constituição estabelece que os direitos e garantias nela elencados ‘não excluem’
outros, provenientes dos tratados internacionais, ‘em que a República Federativa do Brasil seja parte’, é porque ela
própria está a autorizar que esses direitos e garantias internacionais constantes dos tratados de direitos humanos
ratificados pelo Brasil ‘se incluem’ no nosso ordenamento jurídico interno, passando a ser considerados como se es-
critos na Constituição estivessem. É dizer, se os direitos e garantias expressos no texto constitucional ‘não excluem’
outros, provenientes dos tratados internacionais em que o Brasil seja parte, é porque, pela lógica, na medida em que
tais instrumentos passam a assegurar outros direitos e garantias, a Constituição ‘os inclui’ no seu catálogo de direitos
protegidos, ampliando o seu ‘bloco de constitucionalidade’.
46
Ibidem. p. 50 et. seq.
8
Revista Direito e Humanidades
Com tudo isso em mente, ressalta-se novamente a falta ______. ______. Arguição de Descumprimento de Precei-
de compromisso de nossa Suprema Corte com os instru- to Fundamental n. 132, Relator: Min. Ayres Britto, Brasília,
mentos internacionais que o Brasil ratificou. O caminho DF, 5 mai. 2011, Diário da Justiça, Brasília, DF, 14 out. 2011.
que se deve seguir aqui é o da relação dialógica entre
as fontes de direito, de acordo com a doutrina interna- ______. ______. Arguição de Descumprimento de Pre-
cionalista moderna. A nova ordem mundial apresenta ceito Fundamental nº 153, Brasília, DF, 29 de abril
um novo paradigma, segundo o qual os países devem 2010. Diário da Justiça, Brasília, DF, 6 de agosto 2010.
se conectar, dentro da sociedade internacional na qual
se inserem, pugnando cada vez mais pela cooperação ______. ______. Extradição nº 662 (Peru). Rela-
e compromisso com uma ordem jurídica supraestatal. tor: Min. Celso de Mello, Brasília, DF, 28/11/1996,
Diário da Justiça, Brasília, DF, 13 jun. 2003.
Não basta tão somente que os países se declarem au-
tossuficientes e utilizem como único parâmetro de ______. ______. Extradição nº 954 (Itália). Rela-
aferição de validade das leis a Constituição nacio- tor: Min. Joaquim Barbosa, Brasília, DF, 17 mai.
nal. Neste novo cenário mundial, o diálogo não deve 2005, Diário da Justiça, Brasília, DF, 24 mai. 2005.
se operar unicamente entre as fontes de direito, mas
também entre a jurisprudência das cortes; no pre- ______. ______. Habeas Corpus nº 73.044. Re-
sente caso, a jurisprudência do STF deve se conec- lator: Min. Mauricio Correa, Brasília, DF, 19 mar.
tar dialogicamente com a jurisprudência da Corte IDH. 1996, Diário da Justiça, Brasília, DF, 20 set. 1996.
Todo esse esforço deve colocar em evidência o prin- ______. ______. Habeas Corpus nº 81.319. Re-
cípio que mais demonstra essa nova ordem mundial: o lator: Min. Celso de Mello, Brasília, DF, 24 abr.
princípio pro homine, ou o da norma mais favorável ao 2002, Diário da Justiça, Brasília, DF, 19 ago. 2005.
homem. O referido princípio, que já foi aplicado pelo
STF em determinadas situações, representa o mais ______. ______. Habeas Corpus nº 91.361. Re-
alto grau de evolução do direito, em relação à prote- lator: Min. Celso de Mello, Brasília, DF, 23 set.
ção dos direitos humanos. Quando o aludido for colo- 2008, Diário da Justiça, Brasília, DF, 6 fev. 2009.
cado no lugar que merece, estaremos diante de uma
nova realidade jurídica, na qual os direitos humanos ______. ______. Habeas Corpus nº 96.772 de São
representam uma verdadeira preocupação do Estado. Paulo, Relator: Min. Celso de Mello, Brasília, DF,
09/06/2009, Diário da Justiça, Brasília, DF, 21 ago. 2009.
Relator: Min. Gilmar Mendes, Brasília, DF, 17 jun. tia Política e Justiça de Transição / Ministério da
2009, Diário da Justiça, Brasília, DF, 13 nov. 2009. Justiça. Brasília, nº 4, p. 196-227, jul./dez. 2010.
CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e te- WEIS, Calos. Direitos Humanos Contem-
oria da Constituição. 6ª ed. Coimbra: Almedina, 1993. porâneos. São Paulo: Malheiros, 2006.