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FISIOLOGIA ARTICULAR

À minha mulher

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A. I. KAPANDJI
Ex-Interno dos Hospitais de Paris
Ex-Chefe de Clínica-Auxiliar dos Hospitais de Paris
Membro da Sociedade Francesa de Ortopedia e Traumatologia IS.O.F.C.O. T.}
Membro da Sociedade Francesa de Cirurgia da Mão (G.E.M.)

FISIOLOGIA ARTICULAR
ESQUEMAS COMENTADOS DE MECÂNICA H.UMANA

VOLUME 11I
5ª edição

TRONCO E COLUNA VERTEBRAL

I. - A COLUNA VERTEBRAL EM CONJUNTO


11.- A CINTURA PÉLVICA E AS ARTICULAÇÕES SACROILÍACAS
111.- A COLUNA LOMBAR
IV. - A COLUNA TORÁCICA E A RESPIRAÇÃO
V. - A COLUNA CERVICAL

Com 397 desenhos originais do autor

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Este livro pertence ao Sistema de Bibliote-
cas da UCB U",8ra Sd entregue nos pra-
zos prev,stosou qUándo solfcitado o aluno
será responsável pelo livro e em caso de
danificação ou jlarda davirá rajM'~'

y
- EDITORIAL MEDICA-

C panamerícana =:> ~r
MALOINE
Título do original em francês
PHYSIOLOGIE ARTICULAIRE. 3. Tronc et Rachis
© Éditions MALOINE. 27, Rue de I'École de Médecine. 75006 Paris.

Tradução de
Editorial Médica Panamericana S.A.
Revisão Científica e Supervisão por Soraya Pacheco da Costa, fisioterapeuta

ISBN (do volume): 85-303-0045-9


ISBN (obra completa): 85-303-0042-4
© 2000 Éditions MALOINE.
27, rue de I'École de Médecine. 75006 Paris.

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

K26f
v.3
Kapandji, A. I. (Ibrahim Adalbert)
Fisiologia articular, volume 3 : esquemas comentados de
mecânica humana / A. I. Kapandji ; com desenhos originais
do autor; [tradução da 5.ed. original de Editorial Médica
Panamericana S.A. ; revisão científica e supervisão por Soraya
Pacheco da Costa]. - São Paulo: Panamericana ; Rio de
Janeiro: Guanabara Koogan, 2000
: 397 i!.

Tradução de: Physiologie articulaire, 3 : tronc et


rachis
Inclui bibliografia UNIVERSIDADE CATOIICA
Conteúdo: v.3. Tronco e coluna vertebral: A coluna DE BRASILIA

vertebral em conjunto - A cintura pélvica e as articulações SI.teml) de Bibliotecas


sacroilíacas - A coluna lombar - A coluna torácica e a
respiração - A coluna cervical
ISBN 85-303-0045-9

I. Mecânica humana. 2. Articulações - Atlas. 3.


Articulações - Fisiologia - Atlas. I. Título.

00-1625. CDD 612.75


CDU 612.75

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Impreso en Espana
PREFÁCIO À EDIÇÃO EM PORTUGUÊS

Passaram mais de vinte e cinco anos desde o momento em que se escreveram estes três volu-
mes de Esquemas Comentados de Fisiologia Articular obtendo grande sucesso entre os leitores de
todo tipo, estudantes de medicina e fisioterapia, médicos,jisioterapeutas e cirurgiões. O fato de que
continue atual se deve ao particular caráter destas obras, cujo objetivo é D ensino do funcionamento
do Aparelho Locomotor de maneira atratim, privilegiando a imagem diante do texto: o princípio é
explicar uma única idéia através do desenho, o qual permite uma memorização e uma compreensão
definitivas. O fato de que estes livros não tenham competidor sério demonstra nitidamente o seu valor
intrínseco. Na verdade, é a clareza da representação espacial do funcionamento dos músculos e das
articulações o que faz com que seja tão evidente: estes esquemas não integram unicamente as três
dimensões do espaço, mas tarnbém uma quarta dimensão, a do Tempo, porque a Anatomia Funcional
está viva e, conseqÜentemente, móvel- isto é, inscrita no Tempo. Isto diferencia a Biomecânica da
Mecânica propriamente dita. ou Mecânica Industrial. A Biomecânica é a Ciência das estruturas evo-
lutivas, que se modificam segundo os contratempos e evoluem em função das necessidades, capazes
de renovar-se constantemente para compellSar o desuso. É uma mecânica sem eixo materializado,
móvel inclusive no percurso do movimento. As suas superfícies articulares integram um jogo mecâni-
co que seria por completo impossível na mecânica industrial, porém lhe outorga possibilidades adi-
clOnazs.
Eis aqui o espírito que impregna estes volumes, ao mesmo tempo que deixa a porta aberta aos
outros métodos de ensino para o futuro. Este é, na ~'erdade, o segredo da sua perenidade.

A. I. KAPANDJI
ADVERTÊNCIA DO AUTOR À QUINTA EDIÇÃO

A partir de sua primeira edição, há sete anos atrás, este livro. inspirado principalmente por
Duchenne de Boulogne, o "grande precursor" da Biomecânica, permaneceu fiel a si mesmo, exceção
feita por algumas pequenas correções. Neste momento, na oportunidade do aparecimento da quinta
edição, achamos necessário incluir modificações importantes, em especial no que se refere à mão. De
fato, o rápido desenvolvimento da cirurgia da mão exige um incessante aprofundamento quanto ao
conhecimento de sua fisiologia. Este é o motivo pelo qual, à luz de recentes trabalhos, temos escrito e
desenhado novamente tudo relacionado ao polegar e ao mecanismo de oposição: a função da articu-
lação trapézio-metacarpeana na orientação e rotação longitudinal da coluna do polegar se explica de
maneira matemática a partir da teoria das articulações de dois eixos tipo cardan; assim mesmo, se es-
clarece afunção da articulação metacarpofalangeana no "bloqueio" da preensão de grandes objetos
e, enfim, a função da articulação inteJialangeana na "distribuição" da oposição do polegar sobre a
polpa de cada um dos quatro dedos. A riqueza na variedade de preensão e preensões associadas às
ações está ilustrada com novos. desenhos. Temos apeJieiçoado a definição das distintas posições fun-
cionais e de imobilização. Por fim, como objetivo de estabelecer um balanço funcional rápido da mão,
propõe-se uma série de provas d~ movimentos, as "preensões mais ação" que, melhor do que as 1,'a-
lorações analíticas da amplitude de cada uma das articulações e da potência de cada mzísculo,faci·
litam uma apreciação sintética do valorddutilização da mão.
No final do livro suprimimos alg~{ns modelos obsoletos ou que não oferecem muito interesse,
e substituímos por um modelo da mão que ;explica, neste caso de maneira satisfatória, a oposição do
polegar. '. ~ ..
Em resumo, este é um livro renovado e enriquecido em profundidade.
ÍNDICE

A COLUNA VERTEBRAL EM CONJUNTO

A coluna vert~bral, eixo mantido 12


A coluna vertebral, eixo do corpo e protetora do eixo nervoso 14
As curvaturas da coluna vertebral em conjunto 16
A aparição das curvaturas da coluna vertebral 18
Constituição da vértebra padrão 20
As curvaturas da coluna vertebral 22
Estrutura do corpo vertebral 24
As divisões funcionais da coluna vertebral 26
Os elementos de união intervertebral 28
Estrutura do disco intervertebral 30
O núcleo comparado com uma patela 32
O estado de pré-compressão do disco e a auto-estabilidade da articulação discovertebral 34
A migração de água no núcleo 36
As forças de compressão sobre o disco 38
Variações do disco segundo o nível 40
Comportamento do disco intervertebral nos movimentos elementares 42
Rotação automática da coluna vertebral durante a inflexão lateral 44
Amplitudes globais da flexão-extensão da coluna vertebral 46
Amplitudes globais da inflexão lateral da coluna vertebral em conjunto 48
Amplitudes globais da rotação da coluna vertebral em conjunto 50
Avaliação clínica das amplitudes globais da coluna vertebral 52

A CINTURA PÉLVICA E AS ARTICULAÇÕES SACROILÍACAS

A cintura pélvica no homem e na mulher 56


Arquitetura da cintura pélvica 58
As superfícies articulares da articulação sacroilíaca 60
A faceta auricular do sacro 62
Os ligamentos da articulação sacroilíaca 64
A nutação e a contranutação 66
As diferentes teorias da nutação 68
A sínfise púbica e a articulação sacrococcígea 70
Influência da posição sobre as articulações da cintura pélvica 72

A COLUNA LOMBAR

A coluna lombar em conjunto 76


Constituição das vértebras lombares 78
O sistema ligamentar na coluna lombar 80
8 ÍNDICE

Flexão-extensão e infiexão da coluna lombar 82


Rotação na coluna lombar 84
A articulação lombossacral e a espondilolistese 86
Os ligamentos ílio-lombares e os movimentos na charneira lombossacral 88
Os músculos do tronco em corte horizontal 90
Os músculos posteriores do tronco 92
Papel da terceira vértebra lombar e da décima segunda vértebra dorsal 94
Os músculos laterais do tronco 96
Os músculos da parede abdominal: o reto abdominal e o transverso do abdome 98
Músculos da parede abdominal: o oblíquo interno e o oblíquo externo 100
Músculos da parede abdominal: o contorno da cintura 102
Músculos da parede abdominal: a rotação do tronco 104
Músculos da parede abdominal: a flexão do tronco 106
Músculos da parede abdominal: a retificação da lordose lombar 108
O tronco como estrutura inflável 110
Estática da coluna lombar em posição ortostática 112
Posição sentada e de decúbito 114
Amplitude de flexão-extensão da coluna lombar 116
Amplitude de inclinação da coluna lombar 118
Amplitude de rotação da coluna dorsolombar 120
O forame de conjugação e o colo radicular 122
Diferentes tipos de hérnia discal 124
Hérnia discal e mecanismo de compressão radicular 126
O sinal de Lasegue 128

A COLUNA TORÁCICA E A RESPIRAÇÃO

A vértebra torácica padrão e a décima segunda torácica 132


Flexão-extensão e inflexão lateral da coluna torácica 134
Rotação axial da coluna torácica 136
As articulações costovertebrais 138
Movimentos das costelas ao redor das articulações costovertebrais 140
Movimentos das cartilagens costais e do esterno 142
As deformações do tórax no plano sagital durante a inspiração 144
Mecanismo dos músculos intercostais e do músculo triangular do esterno 146
O diafragma e o seu mecanismo 148
Os músculos da respiração 150
Relação de antagonismo-sinergia entre o diafragma e os músculos abdominais 152
A circulação aérea nas vias respiratórias 154
Os volumes respiratórios 156
Fisiopatologia respiratória - Os tipos respiratórios 158
O espaço morto 160
A distensibilidade torácica 162
Mobilidade elástica das cartilagens costais 164
ÍNDICE 9

Mecanismo da tosse - Fechamento da glote 166


Os músculos da laringe e a proteção das vias aéreas durante a deglutição 168

A COLUNA CERVICAL
A coluna cervical em conjunto 172
Constituição esquemática das três primeiras vértebras cervicais 174
As articulações atlantoaxiais 176
A fiexão-extensão nas articulações atlantoaxiais e atlantoodontóides 178
Rotação nas articulações atlantoaxiais e atlantoodontóides 180
As superfícies da articulação atlantooccipital 182
A rotação nas articulações atlantooccipitais 184
A inclinação lateral e a fiexão-extensão na articulação atlantooccipital - 186
Os ligamentos da coluna suboccipital 188
Os ligamentos suboccipitais 190
Constituição de uma vértebra cervical 194
Os ligamentos da coluna cervical inferior 196
Flexão-extensão na coluna cervical inferior 198
Os movimentos nas articulações uncovertebrais 200
A orientação das faces articulares - O eixo misto de rotação-inclinação 202
Os movimentos combinados de inclinação-rotação na coluna cervical inferior 204
Determinações geométricas dos componentes de inclinação e de rotação 206
Modelo mecânico da coluna cervical 208
Os movimentos de inclinação-rotação no modelo da coluna cervical 210
Comparações entre o modelo e a coluna cervical durante os movimentos de inclinação-rotação 212
As compensações na coluna suboccipital 212
Amplitude articular na coluna cervical 216
Equilíbrio da cabeça sobre a coluna cervical 218
Constituição e ação do músculo estemocleidomastóideo 220
Os músculos pré-vertebrais: o longo do pescoço 222
Os músculos pré-vertebrais: os retos anteriores maior e menor da cabeça e o reto lateral 224
Os músculos pré-vertebrais: os escalenos 226
Os músculos pré-vertebrais em conjunto 228
A fiexão da cabeça e do pescoço 230
Os músculos da nuca 232
Os músculos suboccipitais 234
Ação dos músculos suboccipitais: inclinação e extensão 236
Ação rotatória dos músculos suboccipitais 238
Os músculos da nuca: o primeiro e o quarto planos 240
Os músculos da nuca: o segundo e o terceiro planos 242
A extensão da coluna cervical pelos músculos da nuca 244
Sinergia-antagonismo dos músculos pré-vertebrais e do estemocleidomastóideo 246
As amplitudes globais da coluna cervical 248
Relações entre o eixo nervoso e a coluna cervical 250
Relações entre as raízes cervicais e a coluna vertebral 252
10 FISIOLOGIA ARTICULAR
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 11
12 FISIOLOGIA ARTICULAR

A COLUNA VERTEBRAL, EIXO MANTIDO

A coluna vertebral é o eixo do corpo e deve só um membro inferior, a pelve bascula para o
conciliar dois imperativos mecânicos contraditó- lado oposto e a coluna vertebral está obrigada
rios: a rigidez e aflexibilidade. Ela consegue esta a seguir um trajeto sinuoso: num primeiro mo-
façanha graças à sua estrutura mantida. De fato mento, convexo na zona lombar para o lado do
(fig. 1-1), a coluna vertebral em conjunto pode ser membro em descarga, a seguir, côncavo na zo-
considerada como o mastro de um navio. Este na dorsal e por último, convexo. Os tensores
mastro, apoiado na pelve, continua até a cabeça e, musculares regulam a sua tensão de forma au-
no nível dos ombros, suporta uma grande verga tomática para restabelecer o equilíbrio. Tudo
transversal: a cintura escapular. Em cada nível isto acontece sob a influência do sistema ner-
existem tensores ligamentares e musculares dis- voso central. Portanto, neste caso, se trata de
postos como se fossem maromas, isto é, unindo o uma adaptação ativa graças ao ajuste perma-
mastro à sua base de implantação, a pelve. Na nente do tônus dos diferentes músculos da pos-
cintura escapular encontra-se um segundo siste- tura pelo sistema extrapiramidal.
ma de maromas que constitui um losango de eixo Aflexibilidade do eixo vertebral é devido
vertical maior e de eixo transversal menor. Na po- à sua configuração por múltiplas peças super-
sição simétrica, as tensões estão equilibradas em postas, unidas entre si por elementos ligamen-
ambos os lados e o mastro é vertical e retilíneo.
tares e musculares. Deste modo, esta estrutura
Na posição de carga de peso unilateral pode deformar-se apesar de permanecer rígida
(fig. 1-2), quando o peso do corpo recai sobre sob a influência dos tens ores musculares.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 13

Fig.1-1 Fig.1-2
14 FISIOLOGIA ARTICULAR

A COLUNA VERTEBRAL, EIXO DO CORPO


E PROTETORA DO EIXO NERVOSO

Na verdade, a coluna vertebral constitui o ção lombar, a coluna vertebral, que suporta o pe-
pilar central do tronco (fig. 1-3). De fato, se na so de toda a parte superior do tronco, recupera
sua porção dorsal (corte b) a coluna vertebral se uma posição central, constituindo uma proemi-
aproxima do plano posterior que se localiza a um nência na cavidade abdominal.
quarto da espessura do tórax, na sua porção cer- Além desta função de suporte do tronco, a
vical (corte a), a coluna vertebral se situa mais coluna vertebral desempenha um papel prote-
para o centro, no terço da espessura do pescoço. tor do eixo nervoso (fig. 1-4): o canal verte-
Na sua porção lombar (corte c), a coluna verte- bral que começa no nível do forame occipital,
bral é totalmente central, visto que se localiza na aloj a o bulbo raquidiano e a medula espinhal,
metade da espessura do tronco. Esta diferença de de modo que constitui um protetor flexível e
localização é devido às diferentes razões que va- eficaz deste eixo nervoso. Esta proteção não
riam segundo o nível. Na sua porção cervical, a deixa de ter a sua contrapartida, visto que, em
coluna vertebral suporta o crânio e deve situar-se certas condições e em determinados pontos,
o mais próximo possível do seu centro de gravi- tanto o eixo nervoso quanto os eixos vertebrais
dade. Quanto à sua porção dorsal, os órgãos do que saem dele podem entrar em conflito, como
medias tino, especialmente o coração, deslocam a veremos mais adiante, com a sua camada pro-
coluna vertebral para trás. Contudo, na sua por- tetora vertebral.

I
~
---

3. TRONCO E COLUNA VERTEBR.t\L 15

1/2 ~
c

Fig.1-3 Fig.1-4
16 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS CURVATURAS DA COLUNA VERTEBRAL EM CONJUNTO

Considerada em conjunto, a coluna verte- 2. a Iordose IOI)1bar, de concavidade poste-


bral é retilínea vista de frente ou de costas nor;
(fig. 1-5). Contudo, em algun s indivíduos po- 3. a cifose dorsal, de convexidade posterior;
de encontrar-se uma curvatura transversal sem
que, por isso, se possa afirmar que ela seja 4. a Iordose cervical, de concavidade pos-
uma curvatura patológica, evidentemente sem- terior.
pre que a mesma permaneça dentro de limites Quando o indivíduo está em equilíbrio nor-
estreitos. mal, na posição de pé, a parte posterior do crâ-
Pelo contrário, no plano sagital (fig. 1-6) a nio, as costas e os gIúteos são tangentes a um
coluna vertebral apresenta quatro curvaturas, plano vertical; por exemplo, uma parede. A im-
que são, de baixo para cima: portância das curvaturas é evidenciada pelas se-
1. a curvatura sacraI, fixa devido à sol- tas, que marcam as distâncias entre este plano
dadura definitiva das vértebras sacrais. vertical e o vértice das curvaturas. Estas setas
Esta curvatura é de concavidade ante- serão definidas mais adiante com relação a cada
flor; segmento vertebral.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBR.'\L 17

Fig.1-6 Fig.1-5
18 FISIOLOGIA ARTICULAR

A APARIÇÃO DAS CURVATURAS DA COLUNA VERTEBRAL

Durante a filogênese, isto é, no percurso Durante a ontogênese, isto é, no percurso


da evolução da espécie humana a partir dos do desenvolvimento do indivíduo (fig. 1-8, se-
pré-hominídeos, a passagem da posição qua- gundo T.A. Willis), se pôde comprovar como, no
drúpede à posição bípede (fig. 1-7) levou à re- caso da coluna lombar, ocorre a mesma evolu-
tificação e depois à inversão da curvatura lom- ção. No primeiro dia de vida (a), a coluna lom-
bar, inicialmente côncava para a frente; deste bar é côncava para a frente. Com cinco meses
modo apareceu a lordose lombar côncava para (b), a curvatura continua sendo ligeiramente
trás. De fato, a retroversão pélvica não "absor- côncava para a frente; e somente aos treze meses
veu" totalmente o ângulo de retificação do a coluna lombar se toma retilínea. A partir dos
tronco; ainda persiste um certo ângulo que a três anos (d) se pode apreciar uma ligeira lordo-
curvatura da coluna lombar deve anular. As-
se lombar que vai se consolidar aos 8 anos (e) e
sim, se explica esta lordose lombar que, por adotar sua curvatura definitiva aos 10 anos (f).
outra parte, varia segundo os indivíduos, de-
pendendo do grau de anteversão ou de retro- Deste modo, a evolução do indivíduo é pa-
versão da pelve. ralela à evolução da espécie.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 19

Fig.1-7

a
b
c
d

Fig.1-8
20 FISIOLOGIA ARTICULAR

CONSTITUIÇÃO DA VÉRTEBRA PADRÃO

Quando uma vértebra padrão se decom- geralmente nas duas partes ao mesmo tempo.
põe nas diferentes partes que a constituem (fig. Contudo, é importante constatar que estas
1-9), se pode comprovar que é composta por diferentes partes que constituem a vértebra se
duas partes principais: o corpo vertebral pela relacionam no sentido vertical. Deste modo, ao
frente e o arco posterior por trás. longo de toda a coluna vertebral, se estabelecem
Numa vista "desarmada" (a), o corpo verte- três colunas (fig. 1-10):
bral (1) é a parte mais espessa da vértebra: em
- pela frente, uma coluna principal forma-
geral, ela tem uma forma cilíndrica menos alta
da pelo empilhamento dos corpos verte-
que larga, com uma face posterior cortada. O ar-
brais;
co posterior (2) tem a forma de uma ferradura. A
ambos os lados deste arco posterior (b) se fixa o - por trás do corpo vertebral, duas colu-
maciço elas apófises articulares (3 e 4); de moelo nas secundárias constituídas pelo em-
que se delimitam duas partes (c): por um lado, se pilhamento das apófises articulares. Os
localizam os pedículos (8 e 9) pela frente elo ma- corpos vertebrais estão unidos entre si
ciço elas articulares; e pelo outro, se situam as pelo disco intervertebral; enquanto as
lâminas (10 e 11) atrás do maciço das apófises apófises articulares estão unidas por ar-
articulares; por trás, na linha média, se fixa a ticulações de tipo artródia. Em cada ní-
apófise espinhosa (7). Este arco posterior assim vel existe um forame vertebral delimita-
constituído une-se (d) à face posterior do corpo do pela frente pelo corpo vertebral e por
vertebral pelos pedículos. Além disso, a vértebra trás pelo arco posterior. A sucessão de
completa comporta as apófises transversas (5 e todos estes forames vertebrais confor-
6) que se unem com o arco posterior quase no ma, ao longo de todo o eixo vertebral, o
nível do maciço das apófises articulares. canal vertebral, formado alternadamen-
Esta vértebra padrão se localiza em todos te por partes ósseas, em cada vértebra, e
os níveis da coluna vertebral, claro que com im- por partes ligamentares, entre as vérte-
portantes modificações que podem ver-se tanto bras no nível do disco intervertebral e
no corpo vertebral quanto no arco posterior, e dos ligamentos do arco posterior.

I
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 21

a
5
c

Fig.1-9
d
e

Fig.1-10
22 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS CURVATURAS DA COLUNA VERTEBRAL

A presença de curvaturas da coluna verte- ser medido num modelo anatômico: consiste na
bral aumenta a sua resistência aos esforços de relação existente entre o comprimento alcança-
compressão axial. Os engenheiros puderam de- do pela coluna vertebral do platô da primeira
monstrar (fig. 1-11) que a resistência de uma co- vértebra sacral até o atlas e a altura entre o pla-
luna com curvaturas é proporcional ao quadra- tá superior de SI e o atlas. Uma coluna vertebral
do do nÚmero de curvaturas mais um. Portanto, com curvaturas normais (a) tem um índice de
se tomarmos como referência uma coluna retilí- 95%; os limites máximos da coluna vertebral
nea (a), cujo número de curvaturas é igual a O, e normal são 95 e 96%. Uma coluna vertebral com
considerarmos a sua resistência como uma uni- curvaturas acentuadas (b) possui um índice de
dade, numa coluna com uma só curvatura (b), a Delmas inferior a 94%. Isto significa que o seu
sua resistência é o dobro da primeira. Numa co- comprimento é nitidamente maior do que a sua
luna com duas curvaturas (c) a sua resistência é altura. Contudo, uma coluna vertebral com cur-
cinco veces maior do que a da coluna retilínea. vaturas pouco pronunciadas (c), isto é, quase re-
Por último, no caso de uma coluna com três cur- tilínea, possui um índice de Delmas superior a
vaturas móveis (d), como a coluna vertebral com 96%. Esta classificação anatômica é muito im-
a sua lordose lombar, a sua cifose dorsal e a sua portante, visto que existe uma relação entre ela e
lordose cervical, a sua resistência é dez vezes o tipo funcional. De fato, A. Delmas demonstrou
maior do que a da coluna retilínea. que a coluna vertebral com curvaturas pronun-
Pode-se medir a importância das curvaturas ciadas é de tipo funcional dinâmico, enquanto a
da coluna vertebral pelo índice raquidiano de coluna vertebral com curvaturas pouco acentua-
Delmas (fig. 1-12). Este índice somente pode das é de tipo funcional estático.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 23

N=O
R=1 I I N=1
R=2

b d
Fig.1-11

Fig.1-12

[
24 FISIOLOGIA ARTICULAR

ESTRUTURA DO CORPO VERTEBRAL

o corpo vertebral tem a estrutura de um os- Em corte sagital (fig. 1-15), aparecem no-
so curto (fig. 1-14); isto é, urna estrutura em vamente as mencionadas trabécu1as verticais,
concha com uma cortical de osso denso envol- porém também existem dois sistemas de fibras
\'endo o tecido esponjoso. A cortical da face su- oblíquas denominadas fibras em leque. Por um
perior e da face inferior do corpo vertebral deno- lado (fig. 1-16), um leque que tem origem no
mina-se platô vertebral (m). Ele é mais espesso platô superior para expandir-se, através dos dois
na sua parte central onde se encontra urna por- pedículos, em direção à apófise articular supe-
ção cartilaginosa. A periferia forma urna borda rior de cada lado e à apófise espinhosa. Por ou-
(fig. 1-13), o filete marginal (r). Este filete deri- tro lado (fig. 1-17), um leque que tem origem no
va do ponto de ossificação epifisária que tem a platô inferior para expandir-se, através dos dois
forma de um anel e se une ao resto do corpo ver- pedículos, em direção às duas apófises articula-
tebral aos 14 ou 15 anos de idade. As alterações res inferiores e à apófise espinhosa.
de ossificação deste núcleo epifisário constituem O entrecruzamento destes três sistemas tra-
a epifisite vertebral ou doença de Schauerrnann. beculares estabelece pontos de grande resistência,
Em um corte vértico-frontal do corpo ver- mas também um ponto de menor resistência, e
tebral (fig. 1-14), distinguem-se com nitidez, de em particular um triângulo de base anterior onde
cada lado, corticais espessas, em cima e embai- somente existem trabéculas verticais (fig. 1-18).
xo, o platô tibial coberto por urna camada carti- Isto explica a fratura cuneiforme do corpo
laginosa e no centro do corpo vertebral trabécu- vertebral (fig. 1-19): de fato, sob um esforço de
Ias de osso esponjoso que se distribuem segun- compressão axial de 600 kg, a parte anterior do
do linhas de força. Estas linhas são verticais e corpo vertebral sofre um esmagamento: é uma
unem o platõ superior e o inferior, ou horizon- fratura por esmagamento. Para esmagar por
Tais que unem as duas corticais laterais, ou tam- completo o corpo vertebral e fazer com que "o
bém oblíquas, unindo o platõ inferior com as muro posterior" ceda (fig. 1-20), é preciso uma
corticais laterais. força de compressão axial de 800 kg.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 25

- Fig.1-14

Fig.1-16

Fig.1-19 Fig.1-20
26 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS DIVISÕES FUNCIONAIS DA COLUNA VERTEBRAL

Em uma vista lateral da coluna vertebral amarelo e o intere~pinhoso. A mobilidade des-


(fig. 1-21, segundo Bruguer) se podem distinguir te segmento motor é responsável pelos movi-
com facilidade as diferentes divisões funcionais. mentos da coluna vertebral.
Pela frente (A) localiza-se o pilar anterior que Existe uma ligação funcional entre o pilar
tem o papel fundamental de suporte. Por trás, o anterior e o pilar posterior (fig. 1-22) que fica
pilar posterior (B) onde se encontram, como já assegurada pelos pedículos vertebrais. Se consi-
vimos, as colunas articulares que são sustenta- derarmos a estrutura trabecular dos corpos ver-
das pelo arco posterior. Enquanto o pilar anterior tebrais e dos arcos posteriores, se pode compa-
desempenha uma função estática, o pilar poste- rar cada vértebra com uma alavanca de primeiro
rior (B) desempenha uma função dinâmica. grau, denominada "interapoio", onde a articula-
Em sentido vertical, a disposição alterna- ção interapofisária (1) desempenha o papel de
da das peças ósseas e dos elementos de união ponto de apoio. Este sistema de alavanca permi-
ligamentar permite distinguir, segundo Sch- te o amortecimento dos esforços de compressão
morl. um segmento passivo (I) constituído pe- axial sobre a coluna: amortecimento indireto e
la própria vértebra e um segmento motor (II) passivo no disco intervertebral (2), amorteci-
cujo contorno, na figura, está representado por mento indireto e ativo nos músculos dos canais
um traço negro espesso. Este segmento motor vertebrais (3), tudo isso pelas alavancas que ca-
compreende, de diante para trás: o disco inter- da arco posterior forma. Portanto, o amorteci-
vertebral, o forame intervertebral, as articula- mento das forças de compressão é ao mesmo
ções interapofisárias e, por último, o ligamento tempo passivo e ativo.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 27

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Fig.1-22
28 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS ELEMENTOS DE UNIÃO INTERVERTEBRAL

Entre o sacro e a base do crânio, a coluna 1. o ligamento.amarelo (3), muito denso e


vertebral intercala vinte e quatro peças móveis; resistente, que se une ao seu homólogo
numerosos elementos ligamentares asseguram a na linha média ~ se insere, acima na face
união entre estas diferentes peças. profunda da lâmina vertebral da vértebra
Num corte horizontal (fig. 1-23) e em vista suprajacente e, abaixo na margem supe-
rior da lâmina vertebral da vértebra sub-
lateral (fig. 1-24), se podem distinguir estes ele-
mentos fibrosos e ligamentares: jacente;

Em primeiro lugar, os anexos do pilar an- 2. o ligamento interespinhoso (4), que se


terior: prolonga para trás pelo ligamento supra-
espinhoso (5). Este ligamento supra-es-
1. o ligamento vertebral comum anterior (1),
pinhoso é pouco individualizado na por-
que se estende da base do crânio até o sa-
ção lombar: ao contrário, ele é muito ní-
cro, na face anterior dos corpos vertebrais;
tido no ramo cervical;
2. o ligamento vertebral comum posterior (2)
3. na extremidade de cada apófise transver-
que, na face posterior dos corpos verte-
sa se insere, a cada lado, o ligamento in-
brais, se estende do processo basilar do oc-
tertransverso (10):
cipital até o canal sacral. Entre estes dois
ligamentos de grande extensão, em cada 4. por último, nas articulações interapofisá-
nível, a união fica assegurada pelo disco rias, existem potentes ligamentos intera-
intervertebral (D), que consta de duas par- pofisários (9) que reforçam a cápsula
tes, uma, periférica, o anel fibroso, consti- destas articulações: ligamento anterior e
tuído por camadas fibrosas concêntricas (6 ligamento posterior.
e 7), e outra, central, o nÚcleo pulposo (8). O conjunto destes ligamentos assegura uma
Numerosos ligamentos anexos do arco união extremamente sólida entre as vértebras,
posterior asseguram a união entre dois arcos dando uma grande resistência mecânica à colu-
vertebrais adjacentes: na vertebral.
-------------------------------------~~-----~~~~---~-~~~~ ~~~~~

3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 29

9
2

10
3
4

Fig.1-23

Fig.1-24
30 FISIOLOGIA ARTICULAR

ESTRUTURA DO DISCO INTERVERTEBRAL

A articulação entre dois corpos vertebrais Uma parte periférica, o annllllls fibroSllS
adjacentes é uma anfiartrose. Ela está consti- (A) ou anel fibroso, conformado por uma sucessão
tuída pelos dois platôs das vértebras adjacen- de camadas fibrosas concêntricas, cuja obliqüida-
tes unidas entre si pelo disco intervertebral. A de é cruzada quando se passa de uma camada pa-
estrutura deste disco é muito característica. ra a camada vizinha, tal como está representado na
De fato, ela está formada (fig. 1-25) por duas parte esquerda (a) do esquema; na sua parte direi-
partes. ta (b), também se pode constatar que as fibras são
Uma parte central, o núcleo pulposo verticais na periferia e que, quanto mais se aproxi-
(N), que é uma substância gelatinosa que deri- mam do centro, mais elas são oblíquas. No centro,
va embriologicamente da corda dorsal do em- em contato com o núcleo, as fibras são quase ho-
brião. Trata-se de uma gelatina transparente, rizontais e descrevem um longo trajeto helicoidal
composta por 88% de água, portanto muito hi- para ir de um platá ao outro. Deste modo, o núcleo
drófila, e quimicamente formada por uma fica fechado num compartimento inextensível en-
substância fundamental à base de mucopolis- tre os platôs vertebrais, por cima e por baixo, e o
sacarídios. Nesta substância foram identifica- anel fibroso. Este anel constitui um verdadeiro te-
dos condroitino-sulfato misturado com proteí- cido de fibras, que no indivíduo jovem impede
nas, certo tipo de ácido hialurônico e ceratos- qualquer exteriorização da substância do núcleo.
sulfato. Do ponto de vista histológico, o nú- Ele se encontra comprimido no seu pequeno com-
cleo contém fibras colágenas e células de as- partimento, de tal modo que quando o disco é sec-
pecto condrocítico, células conjuntivas e raras cionado horizontalmente se pode apreciar a saída
aglomerações de células cartilaginosas. Não se da substância gelatinosa do núcleo por cima do
encontram vasos nem nervos no interior do plano da secção. O mesmo fenômeno também po-
núcleo. Contudo, o núcleo é septado por tratos de ser comprovado quando se realiza um corte sa-
fibrosos que partem da periferia. gital da coluna vertebral.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 31

Fig.1-25

a Fig.1-26
32 FISIOLOGIA ARTICULAR

o NÚCLEO COMPARADO COM UMA PATELA

Fechado sob pressão no seu compartimen- Movimentos de rotação de um dos platás


to, entre dois platás vertebrais, o núcleo pulposo com relação ao outro (fig. 1-30).
tem uma forma parecida com uma esfera. Por- Movimentos de 'deslizamento ou de CÍ-
tanto, numa primeira aproximação, se pode con-
salhamento de um platá sobre o outro através
siderar que o núcleo se comporta como uma bo-
da esfera. Resumindo, este tipo de articulação
linha intercalada entre dois planos (fig. 1-27).
Este tipo de articulação denominada "patela" oferece uma grande possibilidade de movi-
permite três espécies de movimento. mentos, exatamente seis graus de liberdade:
flexão-extensão, inclinação de cada lado, des-
Movimentos de inclinação:
lizamento sagital, deslizamento transversal,
- inclinação no plano sagital: neste caso rotação direita e rotação esquerda; porém cada
observa-se uma flexão (fig. 1-28) ou movimento é de escassa amplitude. Os movi-
uma extensão (fig. 1-29); mentos de grande amplitude só podem ser ob-
- ou inclinação no plano frontal: inflexão tidos graças à soma de numerosas articulações
lateral. deste tipo.
UO - SISTEMA DE BI8110lHlS

3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 33

Fig.1-27

Fig.1-29
Fig.1-28

Fig.1-30
34 FISIOLOGIA ARTICULAR

o ESTADO DE PRÉ-COMPRESSÃO DO DISCO E A AUTO-ESTABILIDADE


DA ARTICULAÇÃO DISCOVERTEBRAL

As pressões exercidas sobre o disco inter- se considera uma viga (B), em cuja parte infe-
vertebral são importantes, principalmente quan- rior se introduz um cabo metálico fortemente
to mais próximo estiver do sacro. tenso entre as duas extremidades, se constitui
Considerando inicialmente as forças de uma viga pré-tensa que com o mesmo peso vai
compressão axial, se pode determinar que, quan- deformar-se em uma seta f2 nitidamente infe-
do o platô vertebral exerce uma força sobre o rior à setafz.
disco intervertebral, a pressão que o núcleo re- A pré-tensão do disco intervertebral lhe
cebe equivale à metade da carga aumentada em permite, do mesmo modo, resistir melhor às for-
50% e a pressão exercida sobre o anel equivale ças de compressãô e de inflexão. Quando, com a
à outra metade diminuída em 50%. Assim sen- idade avançada, o nú~leo perde as suas proprie-
do, o núcleo suporta 75% da carga e o anel 25%. dades hidrófilas, a sua pressão interna diminui e
De modo que, no caso de uma pressão de 20 kg, o estado de pré-tensão tende a desaparecer, o
ela se distribui em 15 kg sobre o núcleo e 5 kg que explica a perda de flexibilidade da coluna
sobre o anel. vertebral senil.
Contudo, o núcleo atua como distribuidor
Quando um disco é submetido a uma pressão
da pressão em sentido horizontal sobre o anel axial assimétrica (fig. 1-33), o platô vertebral su-
(fig. 1-31). Em simples posição de pé, no disco perior sofre uma inflexão para o lado com mais car-
Ls-S1, a compressão vertical que se exerce sobre ga, deslocando-se um ângulo de oscilação a. As-
o núcleo se transmite pela periferia do anel em
sim, a fibra AB' estará tensa na posição AB, embo-
28 kg por centímetro linear e de 16 kg por cen-
ra simultaneamente, a pressão máxima do núcleo
tímetro quadrado. Estas forças aumentam de do lado da seta vai exercer-se sobre esta fibraAB de
maneira considerável quando a coluna vertebral
modo que a leve de novo à sua posição inicial. Es-
se sobrecarrega. Naflexão anterior do tronco, a
te mecanismo de auto-estabilidade está ligado ao
pressão por centímetro quadrado ascende a 58
estado de pré-tensão. Observar, então, que o anel e
kg quando a força por centímetro linear atinge
os 87 kg. Durante o esforço de retificação estas o núcleo formam juntos um par funcional cuja efi-
cifras aumentam até 107 kg/cm2 e 174 kg por cácia depende da integridade de ambos os elemen-
centímetro linear. As pressões podem alcançar tos. Se a pressão interna do núcleo diminui ou se a
valores mais altos se a retificação se realiza com capacidade de contenção do anel desaparece, este
uma carga. Neste caso, as citadas pressões se par funcional perde a sua eficácia imediatamente.
aproximam dos valores do ponto de ruptura. O estado de pré-tensão explica também as
A pressão no centro do núcleo não é nula, reações elásticas do disco, demonstradas pela
inclusive quando o disco não suporta nenhuma experiência de Hirsch (fig. 1-34): quando se im-
carga. Esta pressão se deve ao estado de hidro- põe bruscamente uma sobrecarga (S) sobre um
filia, que faz com que ele aumente de volume disco previamente carregado (P), podemos ob-
dentro do seu compartimento inextensível. servar como a espessura do disco passa por um
Deste modo se cria um estado de "pré-ten- valor mínimo e depois por um valor máximo,
são". Na tecnologia do cimento, se denomina seguindo uma curva oscilante, que se amortece
pré-tensão (fig. 1-32) a um estado de tensão instantaneamente. Se a sobrecarga é excessiva, a
prévia criado numa viga que deve suportar uma intensidade desta reação oscilante pode chegar a
earga. Se uma viga homogênea (A) recebe um destruir as fibras do anel. Assim se explica a de-
peso, se pode observar como ela toma uma in- terioração do disco após sofrer forças violentas
curvação de valor fI denominada seta. Se então repetidas.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 3S

A B

1 1 ~ . ~

T T'

--- ~
-:::=;::::::::-
--=======I=======:=o=--

Fig.1-32
F

Fig.1-31 Fig.1-33

Fig.1-34
36 FISIOLOGIA ARTICULAR

A MIGRAÇÃO DE ÁGUA NO NÚCLEO

o núcleo repousa sobre a parte central do do de manhã que de noite, a flexibilidade verte-
platô vertebral, parte cartilaginosa, porém com bral também é maior no começo do dia.
numerosos poros microscópicos que comuni- A pressão de embebição do núcleo é con-
cam o compartimento do núcleo com o tecido siderável, visto que, segundo Chamley, pode al-
esponjoso situado debaixo do platô vertebral. cançar os 250 mm Hg. Com a idade, este estado
Quando uma pressão importante é exercida so- de embebição diminui ao mesmo tempo que a
bre o eixo da coluna vertebral, como no caso da hidrofilia, provocando uma diminuição do esta-
influência do peso do corpo na posição de pé do de pré-compressão. Isto explica a diminuição
(fig. 1-35), a água contida na substância cartila- tanto de estatura quanto de flexibilidade verte-
ginosa do núcleo passa através dos forames do bral nos anciões.
platô vertebral ao centro dos corpos vertebrais.
Hirsch demonstrou que, aplicando uma
Se esta pressão estática é mantida durante todo
o dia, nas últimas horas da noite o núcleo está carga constante sobre um disco vertebral (fig.
1-37), a diminuição da espessura do disco não é
nitidamente menos hidratado que no início da
linear, mas sim, exponencial (primeira parte da
manhã: então, se pode deduzir que a espessura
do disco diminui sensivelmente. Para um indiví- curva), o que sugere um processo de desidrata-
ção proporcional ao volume do núcleo. Quando
duo normal, esta perda de espessura acumulada
a carga é retirada, o disco recupera a sua espes-
sobre a altura total da coluna vertebral pode
sura inicial, porém, também neste caso, a curva
atingir os 2 em.
não é linear, mas exponencial inversa (segunda
Ao contrário, durante a noite, em decúbito parte da curva), e a restauração total da espessu-
sllpino (fig. 1-36), os corpos vertebrais não so- ra inicial do disco precisa de algum tempo. Se
frem a pressão axial exercida pela ação da gravi- estas cargas e descargas do disco se repetem
dade, mas somente a do tônus muscular, muito com muita assiduidade, o disco não tem tempo
relaxado também pelo sono. Neste momento, a de recuperar a sua espessura inicial. Igualmente,
hidrofilia do núcleo atrai a água que retoma dos se as cargas e descargas se repetem de maneira
corpos vertebrais para o núcleo. Assim, o disco muito prolongada, embora se espere o tempo
recupera a sua espessura inicial. De modo que necessário de recuperação, o disco não recupera
somos mais altos pela manhã que pela noite. Co- a sua espessura inicial. Neste caso se constata
mo o estado de pré-compressão é mais acentua- um fenômeno de envelhecimento.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 37

Fig.1-35 Fig.1-36

i-U---
I ESPESSURA
DO
DISCO

Carga constante

Fig.1-37
38 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS FORÇAS DE COMPRESSÃO SOBRE O DISCO

As forças de compressão sobre o disco A diminuição da altura do disco não é a


são mais importantes à medida que se aproxi- mesma, depende de o disco estar intato ou lesa-
mam do sacro. Isto é compreensível porque o do (fig. 1-39). Considerando um disco sadio em
peso do corpo aumenta com a altura supraja- repouso (A), com uma carga de 100 kg, se pode
cente (fig. 1-38). No caso de um homem de 80 observar como ele se aplaina 1,4 mm, ao mesmo
kg se calcula que a cabeça pese 3 kg, os mem- tempo que se alarga (B). Se a um disco já lesa-
bros superiores 14 kg e o tronco 30 kg. Se se do a mesma carga de 100 kg é aplicada, a altura
estima que no nível do disco LS-Si a coluna diminui 2 mm (C), e se comprova que depois de
vertebral suporta apenas 2/3 do peso do tron- a carga ter sido retirada, a recuperação da sua
co, ainda se alcança uma carga de 37 kg, isto é espessura inicial é incompleta.
aproximadamente a metade do peso do corpo Este achatamento progressivo do disco le-
(P). Também devemos acrescentar o tônus dos sado não deixa de repercutir nas articulações in-
mÚsculos paravertebrais (Mi e M2), necessário terapofisárias (fig. 1-40): quando a espessura do
para manter a estática e o tronco ereto. Se, disco é normal (A), as relações das superfícies
além disso, somamos o peso de uma carga (E) çartilaginosas no nível das articulações interapo-
e a intervenção de uma sobrecarga brusca (S), fisárias são normais: a interlinha é paralela e re-
se pode compreender perfeitamente que os dis- gular. Quando a altura do disco diminui (B), as
cos mais inferiores da coluna lombar estejam relações articulares interapofisárias se alteram e
submetidos a forças que ultrapassam, às vezes, a interlinha se entreabre para trás. Esta distor-
a sua resistência, principalmente nas pessoas ção articular é por si mesma, e depois de algum
de idade. tempo, um fator de artrose.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 39

DISCO SADIO DISCO LESADO


SOB CARGA SOB CARGA

A B c

Fig.1-39

A B

Fig.1-40

Fig.1-38

r
40 FISIOLOGIA ARTICULAR

VARIAÇÕES DO DISCO SEGUNDO O NÍVEL

A espessura do disco não é a mesma em to- gem posterior, ela mesma ocupando 3/1 O.
dos os níveis vertebrais (fig. 1-41). Na coluna A sua situação corresponde exatamente
lombar (b) o disco é mais espesso, visto que ao eixo de mobilidade (seta branca);
mede 9 mm de altura. Na coluna dorsal (a), ele • no caso da coluna dorsal (fig. 1-43), a
mede 5 mm de espessura e na coluna cervical localização do núcleo é a mesma com
(c), a sua espessura é de 3 mm. Porém, muito relação, tanto à margem anterior quanto
mais importante do que a sua altura absoluta é a à margem posterior do disco. O núcleo,
noção de proporção do disco com relação à altu- em si, ocupa 3/1 O, mas a sua situação
ra do corpo vertebral. De fato, esta proporção dá com relação ao eixo de mobilidade é es-
uma idéia perfeita da mobilidade do segmento tar deslocado para trás: a seta branca que
vertebral, visto que se constata que, quanto representa o eixo passa nitidamente pela
maior ele seja, mais importante será a sua mo- frente do núcleo;
bilidade: em ordem decrescente se pode com-
• no caso da coluna lombar (fig. 1-44), o
provar que a coluna cervical (c) é a mais móvel,
núcleo se localiza a 4/10 da margem an-
visto que possui uma relação disco-corpórea de
terior do disco e a 2/1 O da margem pos-
2/5, depois vem a coluna lombar (b), um pouco
terior, mas ele ocupa apenas 4/1 O; ou se-
menos móvel que a cervical e que possui uma
ja, uma supeifície maior que correspon-
relação disco-corpórea de 1/3. Por último, o me-
de a forças axiais mais importantes. Co-
nos móvel dos três segmentos da coluna é o to- mo no caso da coluna cervical, a sua si-
rácico (a); sua relação disco-corpórea é de l/S.
tuação corresponde exatamente à do ei-
Em cortes sagitais dos diferentes segmen- xo de mobilidade (seta branca).
tos da coluna vertebral, se pode observar que o Para Leonardi, o centro do núcleo se locali-
nÚcleo não se localiza exatamente no centro do
za em uma distância igual a da margem anterior
disco; dividindo a espessura ântero-posterior do da vértebra que do ligamento amarelo. Ele cor-
disco em dez partes iguais, o núcleo se situa: responde nitidamente a um ponto de equilíbrio,
• no caso da coluna cervical (fig. 1-42) a como se a potência dos ligamentos posteriores
4/10 da margem anterior e a 3110 da mar- "puxasse" o núcleo para trás.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 41

1/5 1/3 2/5

CERVICAL

DORSAL
c
b

Fig.1-41

Fig.1-42 Fig.1-43

4 2
10
Fig.1-44
42 FISIOLOGIA ARTICULAR

COMPORTAMENTO DO DISCO INTERVERTEBRAL


NOS MOVIMENTOS ELEMENTARES

Consideramos, em primeiro lugar, os movi- são. Aparece novamente o mecanismo de auto-


mentos no eixo da coluna vertebral (fig. 1-45). estabilização devido à ação conjugàda do par
Antes de qualquer esforço (A), já vimos que núcleo-anel.
existe uma tensão prévia nas fibras do anel, sob Durante as forças de injiexão lateral (fig.
a pressão do núcleo, definindo o estado de pré- 1-48), a vértebra superior se inclina para o lado
tensão.
da inflexão, o núcleo é deslocado para o lado da
Quando uma força de alongamento axial convexidade da curva, daí a auto-estabilização.
(B) se exerce sobre o disco, os p1atôs vertebrais Durante os .movimentos de rotação axial
tendem a separar-se, o que aumenta a espessura (fig. 1-49), as fibras do anel, cuja obliqüidade se
do disco; ao mesmo tempo, a sua largura diminui opõe ao sentido do movimento da rotação, en-
e a tensão das fibras do anel aumenta. O núcleo, tram em tensão. Inversamente, as fibras das ca-
que está ligeiramente achatado em estado de re- madas intermédias, cuja obliqüidade é inversa,
pouso, toma uma forma mais esférica. O alonga- se distendem. A tensão é máxima nas camadas
mento diminui a pressão no interior do núcleo, o centrais cujas fibras são as mais oblíquas; neste
que constitui a base do tratamento das hérnias caso, o núcleo está fortemente comprimido e sua
discais por alongamento vertebral: ao puxar o ei- tensão interna aumenta proporcionalmente com
xo da coluna vertebral, a substância gelatinosa da o grau de rotação. Entende-se, então, que o mo-
hérnia discal reintegra o seu compartimento ori- vimento que associa a flexão e a rotação axial
ginal no núcleo. Contudo, não sempre se obtém tenha tendência a rasgar o anel fibroso ao mesmo
este resultado e se pode imaginar que, por efeito tempo que, aumentando a sua pressão, expulse o
da contração das fibras centrais do anel, a pres- núcleo para trás através das fissuras do anel.
são interna do núcleo aumenta.
Durante as forças estáticas sobre uma vér-
Quando se aplica uma força de compressão tebra ligeiramente oblíqua (fig. 1-50), a força
axial (C), o disco se achata e se alarga, o núcleo vertical (F) se decompõe em:
se achata, a sua pressão interna aumenta de ma-
neira notável e se transmite lateralmente em di- • uma força N perpendicular ao platô ver-
reção às fibras mais internas do núcleo; deste tebral inferior;
modo, a pressão vertical se transforma em forças • e uma força T paralela a este platô verte-
laterais e a tensão das fibras do anel aumenta. bral.
Vejamos agora as compressões assimétri- A força N encaixa a vértebra superior sobre
caso Durante os movimentos de extensão (fig. a inferior, enquanto a força T faz com que ela se
1-46), a vértebra superior se desloca para trás, deslize para a frente, colocando as fibras oblí-
o espaço intervertebral diminui na parte de trás quas sob tensão, alternadamente, em cada cama-
e o núcleo se projeta para a frente, de modo que da fibrosa.
se situa sobre as fibras anteriores do anel au-
Em resumo, se pode constatar que, seja
mentando a sua tensão e levando a vértebra su-
qual for a compressão exercida sobre o disco in-
perior à sua posição inicial. tervertebral, esta se traduz sempre por um au-
Durante a jiexão (fig. 1-47), a vértebra su- mento da pressão interna do núcleo e da tensão
perior desliza para a frente e o espaço interver- das fibras do anel; porém, graças ao desloca-
tebral diminui na margem anterior; o núcleo se mento relativo do núcleo, a entrada em tensão
'desloca para trás de modo que se situa sobre as das fibras é diferente, o que situa o sistema na
fibras posteriores do anel, aumentando a sua ten- sua posição inicial.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 43

B A c
Fig.1-45

Fig.1-46

Fig.1-48 Fig.1-50 Fig.1-49


44 FISIOLOGIA ARTICULAR

ROTAÇÃO AUTOMÁTICA DA COLUNA VERTEBRAL


DURANTE A INFLEXÃO LATERAL

Quando a coluna vertebral se flexiona late- concavidade; como o disco é cuneiforme, a sua
ralmente, se pode constatar como os corpos ver- substância comprimida tem a tendência de esca-
tebrais giram sobre si mesmos de modo que a par-se pelo lado mais aberto; isto é, em direção
sua linha média anterior se desvia em direção à à convexidade, daí a rotação.
convexidade da curva. Isso se pode observar ni- Esta sobrepressão se indica na figura 1-52 A
tidamente numa radiografia de frente tomada em com o sinal + e a seta indica o sentido da rotação.
inflexão lateral (fig. 1-51): as imagens dos cor-
pos vertebrais perdem a sua simetria e a linha Por um mecanismo inverso, os ligamentos
das apófises espinhosas (traços espessos) se des- da convexidade, que se encontram em tensão
loca para a concavidade. No esquema, uma vér- devido à inflexão lateral, têm a tendência a des-
tebra foi desenhada de acordo com seu aspecto locar-se em direção à·linha média procurando o
osteológico para que a sua orientação possa ser caminho mais curto. Isto fica patente na figura
entendida e assim possa permitir a interpretação 1-52 A, pelo sinal - no nível de um ligamento
dos aspectos radiológicos. Numa vista superior intertransverso e a seta indicando a direção do
(fig. l-52 A), se pode constatar como, nesta po- movimento.
sição de rotação, a apófise transversa da conca- Note-se que estes dois mecanismos são sinér-
vidade se projeta em todo o seu tamanho, en- gicos e contribuem, cada um da sua maneira, para a
quanto a apófise transversa da convexidade se rotação no mesmo sentido dos corpos vertebrais.
projeta em tamanho reduzido. Além disso, as in-
Esta rotação é fisiológica, porém, em cer-
terlinhas apofisárias da convexidade estão toma-
tos casos, determinadas alterações da estática
das em fileira pelo feixe radiológico, enquanto
vertebral causadas tanto por uma má distribui-
as apófises articulares da concavidade se proje-
ção das tensões ligamentares quanto por desi-
tam de frente, assim como o pedículo vertebral.
gualdades do desenvolvimento, determinam
Como explicar esta rotação automática uma rotação permanente dos corpos vertebrais.
dos corpos vertebrais? Principalmente por dois Neste caso, existe uma escoliose que associa
mecanismos: a compressão dos discos e a entra- uma incurvação ou uma inflexão permanente da
da em tensão dos ligamentos. coluna vertebral a uma rotação dos corpos ver-
O deito da compressão dos discos pode ser tebrais. O exame clínico pode revelar esta rota-
bem demonstrada graças a um modelo mecâni- ção (fig. 1-54). De fato, num indivíduo normal
co fácil de realizar (fig. 1-53): pegamos algumas (A), a flexão anterior do tronco determina um
rolhas de cortiça e borracha de espuma para que perfil simétrico com relação à coluna vertebral.
sejam cortadas em cunha a fim de construir os Num indivíduo com escoliose (B), a flexão ante-
discos intervertebrais; colamos as duas cunhas e rior do tronco determina um perfil assimétrico
traçamos uma linha no meio, sobre a sua face com uma corcova dorsal proeminente do lado da
anterior; então é suficiente inclinar o modelo pa- convexidade da incurvação vertebral. Isto repre-
ra um lado para apreciar a rotação dos corpos senta a rotação permanente dos corpos verte-
vertebrais do lado oposto, perfeitamente visível brais. Deste modo, o fenômeno fisiológico transi-
graças à separação dos diferentes segmentos da tório da rotação automática dos corpos vertebrais
linha média de uma vértebra da outra. A inflexão passa a ser patológico quando se associa perma-
lateral aumenta a pressão no disco do lado da nentemente à incurvação da coluna vertebral.
3. TROXCO E COLUNA VERTEBRAL 45

Fig.1-52

Fig.1-51

Inclinação

Fig.1-54 Fig. 1-53


46 FISIOLOGIA ARTICULAR

AMPLITUDES GLOBAIS DA FLEXÃO-EXTENSÃO DA COLUNA VERTEBRAL

Considerada no seu conjunto entre o sacro Na coluna lombar:


e o crânio, a coluna vertebral constitui o equiva- - a flexão (FL) é de 60°;
lente de uma articulação com três graus de li-
berdade: permite movimentos de flexão-exten- - a extensão (EL) é de 35°;
são, inclinação lateral à esquerda e direita e ro- Para o conjunto da coluna dorsolombar:
tação axial. As amplitudes destes diferentes mo-
- a flexão (FDJ é de 105°;
vimentos elementares, embora muito escassa em
cada nível da coluna vertebral, são globalmente - a extensão (EDL) é de 60°;
muito importantes em função do número de ar- Na coluna cervical:
ticulações vertebrais.
- a flexão (Fc) é de 40°;
Os movimentos de flexão-extensão se rea-
lizam no plano sagital (fig. 1-55). A referência, - a extensão (Ec) é de 75°;
ao nível do crânio, é o plano mastigatório: se Portanto, aflexão total da coluna vertebral
pode imaginar com facilidade uma folha de pa- (FT) é de 110°.
pelão fortemente apertada entre as mandíbulas.
O ângulo formado pelo plano mastigatório entre Enquanto a extensão total da coluna verte-
bral (ET) é de 140°.
as duas posições extremas (AT) é de 250°. Esta
amplitude deve ser considerada se vemos que o Estas cifras são dadas a título orientativo;
resto das articulações do corpo somente tem os autores ainda não estão de acordo sobre a
180° de amplitude máxima. Naturalmente, estes amplitude dos diferentes segmentos da coluna
250° representam uma amplitude extrema nos vertebral. Por outro lado, estas amplitudes va-
indivíduos especialmente flexíveis. riam consideravelmente segundo os indivíduos
As amplitudes segmentares podem ser me- e a idade. De modo que aqui vemos as ampli-
didas em radiografias de perfil. tudes máximas.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 47

Fig.1-55
48 FISIOLOGIA ARTICULAR

AMPLITUDES GLOBAIS DA INFLEXÃO LATERAL


DA COLUNA VERTEBR>\L EM CONJUNTO

o movimento de inflexão lateral também A inflexão lateral da coluna lombar é


denominado inclinação da coluna vertebral se de 20°.
realiza no plano frontal (fig. l-56). Este movi- A inflexão lateral da coluna dorsal é
mento é fácil de medir com precisão nas radio- de 20°.
grafias de frente; baseando-se no eixo das vérte-
A infiexão lateral da coluna cervical é
bras, ou na direção do platõ superior da vértebra
de 35° a 45°.
implicada. No crânio se pode tomar como ponto
de referência a linha bimastóidea, que passa pe- A infiexão ou inclinação total da coluna en-
lo vértice de ambos os mastóides. tre o sacro e o crânio é, então, de 75 a 85°.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 49

Lombar
20°

Fig.1-56
50 FISIOLOGIA ARTICULAR

AMPLITUDES GLOBAIS DA ROTAÇÃO


DA COLUNA VERTEBRAL EM CONJUNTO

As amplitudes de rotação são difíceis de se causas desta limitação do movimento de rota-


avaliar, visto que resulta impossível fazer radio- ção axial.
grafias no plano transversal e as tomografias axi-
A rotação axial na coluna dorsal (fig. l-58)
ais realizadas para o estudo dos órgãos não têm
é muito mais acentuada: 35°, visto que está favo-
a precisão necessária para medir a rotação das
recida pela disposição das apófises articulares.
vértebras. Pode-se medir a rotação total da colu-
na vertebral fixando a pelve e contando o grau A rotação axial na coluna cervical (fig.
de rotação do crânio. l-59) é muito ampla, visto que alcança de 45 a
Recentemente, os autores norte-america- 50°. Pode-se constatar como o atlas realiza uma
nos, Greggersen e Lucas, puderam medir de ma- rotação aproximada de 90° com relação ao sacro.
neira muito precisa as rotações elementares to- A rotação axial entre a pelve e o crânio
mando como pontos de referência agulhas metá- (fig. 1-60) alcança ou ultrapassa ligeiramente
licas inseridas por anestesia local nas apófises os 90°. De fato, existem alguns graus de rota-
espinhosas. Trataremos novamente deste tema ção axial na atlantooccipital, porém, como
quando estudarmos a coluna dorso lombar. freqüentemente a rotação axial é menor na
A rotação axial na coluna lombar (fig. l-57) coluna dorsolombar, a rotação total mal al-
é muito escassa: 5°. Mais adiante, veremos as cança os 90°.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 51

Fig.1-57 Fig.1-58 Fig.1-59

II

Fig.1-60
52 FISIOLOGIA ARTICULAR

AVALIAÇÃO CLÍNICA DAS AMPLITUDES GLOBAIS


DA COLUNA VERTEBRAL

No caso da flexão-extensão e da inflexão nos quadris. Um método mais preciso consiste


lateral, as medidas exatas da amplitude global da em medir o ângulo b de extensão total da colu-
coluna vertebral só podem ser tomadas sobre ra- na e a seguir subtrair o ângulo de extensão da
diografias do conjunto da coluna vertebral. coluna cervical isolado (esta última amplitude se
Contudo, a amplitude global dos movimen- mede com o tronco vertical e a cabeça girada pa-
tos da coluna vertebral pode ser avaliada clinica- ra trás); no indivíduo um bom teste de extensão
e de flexibilidade vertebral é o movimento deno-
mente pelos movimentos "testes".
minado "ponte"; porém este, evidentemente,
Para mensurar a fiexão da coluna dor- não é um movimento teste que possa ser utiliza-
solombar (fig. 1-61), se pode: do em qualquer caso.
- medir o ângulo a entre a vertical e a lin- Para avaliar a "inclinação lateral da coluna
ha que une a margem ântero-superior do dorsolombar (fig. 1-63), se mede no indivíduo
trocanter maior (1) e o ângulo do acrô- visto de costas o ângulo a constituído pela ver-
mio (2); este ângulo inclui também uma tical e a linha que une o extremo superior do su-
amplitude de flexão do quadril; co interglúteo e a apófise espinhosa de e7• Con-
- ou localizar o nível alcançado pela mar- tudo, seria mais exato medir o ângulo b forma-
gem dos dedos (d) ao realizar uma fle- do pela vertical e a tangente da curvatura verte-
xão de tronco em posição ortostática bral no nível de C7• Um meio prático mais sim-
com os joelhos estendidos; neste caso, a ples, mais imediato, consiste em localizar o ní-
flexão também inclui uma amplitude de vel n alcançado pelos dedos da mão do lado da
flexão do quadril. Esta localização pode inclinação: por cima do joelho, no seu nível ou
ser realizada, medindo em centímetros a abaixo dele.
distância d dos dedos até o solo, ou bem Para avaliar corretamente o movimento de
situando o nível n dos dedos com rela-
rotação axial da coluna vertebral, se deve obser-
ção aos membros inferiores: patela, me- var ao indivíduo de cima (fig. 1-64); para imobi-
tade da perna, garganta do pé ou dedos; lizar a pelve, o sujeito deve sentar-se numa ca-
- ou medindo com uma fita métrica flexí- deira de encosto baixo, segurando a pelve e os
vel a distância que separa a apófise es- joelhos, o plano de referência é o plano frontal
pinhosa de C7 da primeira espinhosa sa- (F), que passa pela parte superior (O) do crânio.
cral, primeiro em extensão e depois em A rotação da coluna vertebral dorsolombar se
flexão. No esquema, este alongamento avalia pelo ângulo a formado pela linha dos om-
da distância C7-S1 é de 5 em. bros EE' e o plano frontal.
Para medir a extensão da coluna dorso- A amplitude total de rotação da coluna ver-
lombar (fig. 1-62) se pode avaliar o ângulo a en- tebral se mede pelo ângulo de rotação (b) do pla-
tre a vertical e a linha que une a margem ântero- no biauricular e do plano frontal. Também se po-
superior do trocanter maior e o ângulo do acrô- de medir o ângulo de rotação (b') constituído
mio em máxima extensão. Porém esta medida pelo plano de simetria da cabeça (S') e o plano
integra novamente um certo grau de extensão sagital (S).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 53

Fig.1-63 Fig.1-62 Fig.1-61

Fig.1-64
54 FISIOLOGIA ARTICULAR
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 55
56 FISIOLOGIA ARTICULAR

A CINTURA PÉLVICA NO HOMEM E NA MULHER

A cintura pélvica forma a base do tronco. de constatar cOmo a feminina é muito mais lar-
Ela também constitui o suporte do abdome e ga e muito mais extensa: o triângulo em cujo
conforma a união entre os membros inferiores e interior se inscreve possui uma base mais ampla
o tronco. Trata-se de um anel ósteo-articular que o da pelve masculina.
fechado, composto por três peças ósseas e três Por outra parte, ela também tem menos al-
QJ1iculações.
tura que a pelve masculina: a altura do trapézio
As três peças ósseas são: inscrito é menor.
- os dois ossos ilíacos, pares e simétricos; Por último, proporcionalmente, a abertura
- o sacro, ímpar e simétrico, bloco verte- superior (linha espessa contínua) é mais larga e
bral constituído pela união de cinco vér- mais aberta na mulher que no homem.
tebras sacrais. Esta diferença na morfologia da cintura
As três articulações, de escassa mobilida- pélvica se relaciona com a função da gestação e,
de, são: principalmente, com a do parto, visto que o feto
e especialmente a sua cabeça que é a parte mais
- as duas articulações sacroilíacas que
unem o sacro a cada um dos ossos ilíacos; volumosa, num primeiro momento se situa por
cima da abertura superior da pelve através da
- a sínfise pÚbica, que une ambos os ossos qual ele deve passar no momento oportuno para
ilíacos pela frente. encaixar-se numa escavação e a seguir abrir-se
A cintura pélvica tem, em conjunto, a for- caminho pela abertura inferior da pelve. Portan-
ma de um funil com uma grande base superior to, as articulações da cintura pélvica desem-
que conecta a cavidade abdominal com a pelve penham uma função na estática do tronco em
através da abertura superior. No caso da cintura posição ortostática e também um papel impor-
pélvica, o dimorfismo sexual se aprecia nitida- tante no mecanismo do parto, como veremos
mente; de fato, quando se compara a pelve mas- mais adiante ao falar da fisiologia da articulação
culina (fig. 2-1) com a feminina (fig. 2-2), se po- sacroilíaca.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 57

Fig.2-1

Fig.2-2
58 FISIOLOGIA ARTICULAR

ARQUITETURA DA CINTURA PÉLVICA

A cintura pélvica, considerada em conjunto, Além disso,. o sacro se encontra encaixa-


transmite forças entre a coluna vertebral e os do entre as duas asas ilíacas no plano transver-
membros inferiores (fig. 2-3): o peso (P) que a sal (figs. 2-4 e 2-5). De fato, cada asa ilíaca
quinta vértebra lombar suporta se reparte em pode ser considerada como um braço de ala-
duas partes iguais em direção às asas do sacro pa- \"anca (fig. 2-4) cujo ponto de apoio (O) e 02)
ra depois, através das espinhas ciáticas, dirigir-se estaria localizado nas articulações sacroilíacas
até a cavidade cotilóide. Neste ponto, a resistên- e cuja resistência e potência estariam situadas
cia do chão é recebida ao peso do corpo (R) nas extremidades superiores e inferiores. Por
transmitido pelo colo do fêmur e pela cabeça fe- trás, os potentes ligamentos sacroilíacos (LI e
moral; uma parte desta resistência fica anulada
pela resistência oposta, no nível da sínfise púbica
L) representariam a resistência e, pela frente,
a potência de cada um dos braços de alavanca
após ter atravessado o ramo horizontal do púbis.
estaria representada pela sínfise pÚbica desen-
° conjunto destas linhas de força constitui volvendo uma força de aproximação SI e S2'
um anel completo representado pela abertura
Quando se produz um deslocamento da
superior da pelve. Existe um sistema trabecular
sínfise púbica (fig. 2-5), a diástase dos dois pú-
para dirigir estas forças através do anel pélvico
(ver volume li, pág. 28). bis (S) permite a separação das superfícies ilía-
cas das articulações sacroilíacas e, como neste
Devido à sua largura, mais ampla em cima caso o sacro não está fixo, pode deslocar-se pa-
que embaixo na sua parte articular, se pode con-
ra a frente (d) e dJ
siderar o sacro como uma cunha (triângulo tra-
cejado em escuro) que se incrusta verticalmente Desse modo, se entende a total interdepen-
entre as duas asas ilíacas. Unido a elas por liga- dência dos diferentes elementos do anel pélvico:
mentos, o sacro está mais apertado entre as asas qualquer ruptura de continuidade num ponto re-
quanto maior for o peso exercido sobre ele: tra- percute em todo o anel, comprometendo a sua
ta-se de um sistema de autobloqueio. resistência mecânica.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 59

R Fig.2-3 R

s
Fig.2-5
60 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS SUPERFÍCIES ARTICULARES DA ARTICULAÇÃO SACROILÍACA

Se vemos uma articulação sacroilíaca (fig. face auricular do osso coxal e cuja su-
2-6) aberta, como se fosse um livro, de modo perfície tem uma conformação inversa:
que as duas peças ósseas pivotem em tomo de Na linha axial'desta superfície existe uma
um eixo vertical (a, b, c), podemos comprovar depressão limitada por duas cristas alon-
nitidamente a correspondência das duas super- gadas, o conjunto se incUI\"aseguindo um
fícies articulares: arco de círculo cujo centro se localiza no
- a face auricular do osso coxal (A), situa- nível do primeiro tubérculo sacro (marca-
da na parte póstero-superior da face inter- do com uma cruz) no qual se inserem po-
na do osso ilíaco, logo atrás da linha ino- tentes ligamentos da articulação. Fara-
minada, que constitui uma parte da aber- beuf afirmou que a superfície auricular do
tura superior da pelve. Esta superfície tem sacro estava conformada como um trilho
a forma de meia-lua de concavidade pós- oco, que corresponde exatamente à super-
tero-superior; está recoberta com cartila- fície do trilho oCllpado do osso ilíaco.
gem e é, em conjunto, bastante irregular, Contudo, estas duas superfícies estão longe
porém Farabeuf afirmou que parecia um de ter a regularidade descrita e se realizamos
trilho ocupado: de fato, no eixo maior três cortes horizontais (fig. 2-7) corresponden-
desta superfície discorre uma crista alon- tes aos níveis a, b e c da figura 2-6, se pode
gada que separa duas depressões; esta constatar que, apenas na parte média (b) e na
crista se incurva sobre si mesma seguindo parte superior (a) da face auricular do sacro
um arco de círculo, cujo centro se situa existe uma depressão central. Ao contrário, na
aproximadamente na tuberosidade ilíaca sua parte inferior (c), a face auricular do sacro é
ou pirâmide (marcada com uma cruz) convexa na sua parte central. De tudo isso se po-
que, como se poderá comprovar mais de deduzir a dificuldade que existe para realizar
adiante, constitui a inserção dos potentes uma projeção radiológica da interlinha sacro-
ligamentos da articulação sacroilíaca; ilíaca, dependendo da parte que se deseje explo-
- a superfície auricular da asa sacra rar, a projeção deverá ser oblíqua de fora para
(B), cujas margens se superpõem aos da dentro, ou de dentro para fora.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 61

Fig.2-6

Fig.2-7 c

b
62 FISIOLOGIA ARTICULAR

A FACETA AURICULAR DO SACRO

A faceta auricular do sacro pode apresentar tância é superior, no homem, à do segmento cra-
grandes variações morfológicas dependendo niano. A angulação de ambos os segmentos po-
de cada indivíduo. A. Delmas demonstrou a de alcançar no homem o ângulo reto, enquanto
existência de uma correspondência entre o tipo nos primatas esta face está muito pouco incurva-
de coluna vertebral e a morfologia do sacro e da da sobre si mesma:
sua faceta auricular (fig. 2-8). Weisel analisou, através de traçados carto-
Quando as curvaturas da coluna vertebral gráficos, o relevo da fáceta auricular do sacro, de-
são muito acentuadas (A), o que corresponde a monstrando (fig. 2-9) que a aurícula é geralmen-
um tipo dinâmico, o sacro está muito horizontal te mais longa e estreita no sacro que no osso ilía-
e a faceta auricular está muito incurvada sobre co e que se observa constantemente uma depres-
si mesma e ao mesmo tempo muito côncava. As- são central na união dos dois segmentos (marca-
sim sendo, a articulação sacroilíaca está dotada dos com o sinal-) e duas elevações perto das ex-
de uma grande mobilidade que lembra à de uma tremidades de cada segmento (marcadas com o
diartrose; se trata de um tipo especialmente evo- sinal +). No osso ilíaco, a disposição é recíproca,
luído, "sobreadaptado", que corresponde a um mas não exatamente simétrica. Desse modo, exis-
grau extremo de adaptação à marcha bípede. te uma elevação na união dos dois segmentos que
corresponde ao tubérculo de Bonnaire.
Quando as curvaturas da coluna vertebral
são pouco acentuadas (B), o que corresponde a Weisel também desenvolveu uma teoria
um tipo estático, o sacro está quase vertical e a pessoal sobre a disposição dos ligamentos desta
faceta auricular está muito alongada vertical- articulação sacroilíaca com relação às forças que
mente e muito pouco angulada sobre si mesma; recebe. Classifica estes ligamentos em dois gru-
por outro lado a sua superfície é quase plana. pos (fig. 2-10):
Esta morfologia da faceta auricular, muito dife- - um grupo cranial (Cr), de direção lateral
rente da que foi descrita por Farabeuf, corres- e dorsal, que se oporia ao componente FI
ponde a uma articulação de pouca mobilidade do peso do corpo (P) exercido sobre a fa-
que lembra à de uma anfiartrose; este aspecto ce superior da primeira vértebra sacral.
que se observa amiúde nas crianças aproxima-se Estes ligamentos agiriam durante o des-
ao encontrado nos primatas. locamento do promontório para a frente;
Seja como for, A. Delmas demonstrou que - um grupo caudal (Ca), de direção cra-
a evolução dos primatas até o homem se acom- nial, que se oporia ao componente F 2
panha de um alongamento e um alargamento do perpendicular ao plano da face supe-
segmento caudal da faceta auricular cuja impor- rior da primeira vértebra sacral.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 63

Dinâmico Estático

A c B

Fig.2-8

Fig.2-9 Fig.2-10
64 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS DA ARTICULAÇÃO SACROILÍACA


(Os números de referência são comuns às três figuras)

Numa vista posterior da pelve (fig. 2-11), se estão torcidas sobre si mesmas e se inserem
podem observar, por uma parte, os ligamentos abaixo na tuberosidade isquiática e no lábio in-
ílio-Iombares: terno do ramo ascendente do ísquio. Assim, a
- o fascículo superior do ligamento ílio- grande incisura ciática fica dividida por estes
lombar (1); dois ligamentos sacrociáticos em dois orifícios:
um orifício superior, pelo qual o músculo pira-
- o fascículo inferior do ligamento ílio-
midal sai da pelve, e um orifício inferior, orifí-
lombar (2). cio de saída do obturatório interno.
Do lado direito da figura se distingue o pla-
Em vista ant~rior (fig. 2-12), se encontram de
no médio dos ligamentos ílio-sacrais. De cima
novo os ligamentos ílio-lombares (1 e 2), os liga-
para baixo:
mentos sacrociáticos ~aior (7) e menor (6), porém
- o ligamento ílio-transverso sacro (3); também se encontra o ligamento sacroilíaco ante-
- os ligamentos ílio-transversos conjuga- rior, constituído por dois fascículos denominados
dos (4) descritos por Farabeuf, divergem freios de nutação superior e inferior:
da extremidade posterior da crista ilíaca e - umfascículo ântero-superior (8);
terminam nos tubérculos conjugados. - umfascículo ântero-inferior (9).
O primeiro ligamento ílio-transverso conju- A figura 2-13 mostra a articulação sacroilíaca
gado se estende da tuberosidade ilíaca, situada por direita, com seus ligamentos, aberta pela rotação em
trás do vértice da pirâmide, até o primeiro tubér- tomo a um eixo vertical; deste modo, se pode obser-
culo conjugado. var o osso ilíaco (A) por sua face interna e o sacro
O segundo ligamento ílio-transverso conju- (B) por sua face extema. Assim se pode entender:
gado, de Zaglas, se fixa no segundo tubérculo - o enrolamento dos ligamentos ao redor da
conjugado. articulação sacroilíaca e as condições nas
O terceiro e o quarto ligamentos ílio-trans- quais entram em tensão durante a nutação e
versos conjugados se estendem da espinha ilíaca a contranutação;
póstero-superior até o terceiro e o quarto tubércu- - a direção oblíqua para baixo, para a frente e
los conjugados. para dentro dos freios da nutação (8 e 9) a
No lado esquerdo está representado o plano partir do osso ilíaco (A). A partir do sacro
ligamentar superficial (5), leque fibroso que se (B) são oblíquos para cima, para a frente e
estende da margem superior do osso ilíaco até os para fora;
tubérculos póstero-internos. - do mesmo modo se encontram de novo os
Entre a parte inferior da margem externa do ligamentos mo-transversos conjugados (5);
sacro e a grande incisura ciática se estendem dois - os ligamentos sacrociáticos menor (6) e
importantes ligamentos: os ligamentos sacrociá- maior (7);
ticos maior e menor:
- o ligamento axial (representado por uma
- o ligamento sacrociático menor (6) oblíquo zona branca nas duas metades do desen-
para cima, para dentro e para trás, se esten- ho) constitui o plano profundo dos liga-
de da espinha ciática até a margem lateral mentos sacroilíacos e se fixa por fora na
do sacro e do cóccix; tuberosidade ilíaca, principalmente na pi-
- o ligamento sacrociático maior (7) atravessa râmide, e por dentro nas duas primeiras
obliquamente a face posterior do menor. Inse- fossas crivadas do sacro. Também se de-
re-se em cima, ao longo de uma linha que vai nomina interósseo ou ligamento vago, e
da margem posterior do osso iliaco às duas pri- para os autores clássicos representa o eixo
meiras vértebras do cóccix. As suas vértebras em tomo do qual se realizam os movi-
oblíquas para baixo, para a frente e para fora mentos do sacro; daí o seu nome.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 65

5 4

Fig.2-11
8

Fig.2-12

A B

Fig.2-13
66 FISIOLOGIA ARTICULAR

A NUTAÇÃO E A CONTRANUTAÇÃO

Antes de se analisarem os movimentos da rior (8) e ântero-inferior (9) do ligamento sacro-


articulação sacroilíaca convém lembrar que a ilíaco anterior.
sua amplitude não é muito grande e, além disso, O movimento' de contranutação (fig.
é variável segundo circunstâncias e indivíduos, 2-14) realiza deslocamentos inversos: o sacro,
o que explica as contradições existentes entre os ao pivotar em tomo do ligamento axial se endi-
diferentes autores quanto às teorias da função reita, de modo que o promontório se desloca pa-
desta articulação e à importância que estes mo-
ra cima e para trás (S) e a extremidade inferior
vimentos podem ter na fisiologia do parto. Estes do sacro e o vértice inferior do cóccix se deslo-
movimentos foram descritos pela primeira vez
cam para baixo e para a frente (dJ O diâmetro
por Zaglas em 1851 e por Duncan em 1854. ântero-posterior da abertura superior da pelve
aumenta uma distância SI' enquanto o diâmetro
Definiçãoe mecanismossegundo a teoria clássica ântero-posterior da abertura inferior da pelve di-
Durante o movimento de nutação (fig. minui uma distância di' Por outro lado, as asas
ilíacas se separam e as tuberosidades isquiáticas
2-15), o sacro gira em tomo do eixo representa-
se aproximam. O movimento de contranutação é
do pela cruz preta e constituído pelo ligamento
limitado (fig. 2-13) pela tensão dos ligamentos
axiaI. de tal modo que o promontório se desloca
sacroilíacos, distribuídos no plano superficial
para baixo e para a frente (S) e o vértice do sa-
cro e a extremidade do cóccix se deslocam para (5) e no plano profundo (4).
trás (d2). Assim, o diâmetro ântero-posterior da A título informativo, a variação do diâme-
abertura superior da pelve diminui uma distân- tro ântero-posterior da abertura superior da pel-
cia S:, enquanto o diâmetro ântero-posterior da ve pode variar de 3 mm para Bonnaire, Pinard e
abertura inferior da pelve aumenta uma distân- Pinzani, até 8 a 13 mm para Walcher. A amplitu-
cia d2• Simultaneamente (fig. 2-16), as asas ilía- de de variação do diâmetro ântero-posterior da
cas se aproximam enquanto as tuberosidades is- abertura inferior da pe1ve pode variar de 15 mm
quiáticas se separam. O movimento de nutação para Borcel e Femstrom a 17,5 mm para Thoms.
é limitado (fig. 2-13) pela tensão dos ligamentos Weisel confirmou recentemente o deslocamento
sacrociáticos maior (7) e menor (6) e dos freios transversal das asas ilíacas e das tuberosidades
de nutação, a saber: os fascículos ântero-supe- isquiáticas.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 67

Fig.2-14

Fig.2-16
68 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS DIFERENTES TEORIAS DA NUTAÇÃO

Na teoria clássica de Farabeuf (fig. 2-17) guindo uma distância d que afetaria do
que se acaba de descrever, o movimento de bás- mesmo modo ao promontório sacro e ao
cula do sacro se realiza ao redor do eixo consti- vértice do sacro;
tuído pelo ligamento axial (O), o deslocamento - uma outra hipótese retoma a idéia da ro-
é angular e o promontório se desloca para baixo tação (fig. 2-20), porém desta vez ao re-
e para a frente ao redor de um arco de círculo de dor de um eixo pré-auricular O" situa-
centro O retroauricular.
do abaixo e pela frente do sacro. A loca-
Na teoria de Bonnaire (fig. 2-18), o movi- lização deste centro de rotação variaria
mento de báscula do sacro se realiza ao redor de de um indivíduo a outro, e, inclusive no
um eixo O', que passa pelo tubérculo de Bon- mesmo indivíduo dependendo do tipo
naire, na união dos dois segmentos da aurícula de movimento realizado.
sacra. O centro deste movimento angular bascu- A variedade destas teorias faz supor a difi-
lante do sacro é, então, auricular. culdade para se analisarem os movimentos de
Contudo, os estudos de Weisel permitem pouca amplitude, assim como a possibilidade de
propor outras duas teorias: diferentes tipos de movimentos variando segun-
do os indivíduos.
- uma teoria de translação pura (fig. 2-
19), onde o sacro se deslizaria ao longo Contudo, estas noções não têm o caráter abs-
do eixo da porção inferior da aurícula. trato que poderia ser-lhes atribuídas, visto que es-
Trata-se então de uma translação se- tes movimentos intervêm na fisiologia do parto.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 69

Fig.2-19 Fig.2-20
70 FISIOLOGIA ARTICULAR

A SÍNFISE PÚBICA E A ARTICULAÇÃO SACROCOCCÍGEA

A sÍnfise púbica é uma anfiartrose, de pou- subpúbico se pode observar com facilidade num
ca mobilidade, quase nula. Contudo, no final da corte sagital (fig. 2-22). A força destes meios de
gestação e durante o parto, a embebição aquosa união fazem da sínfise púbica uma articulação
das partes moles permite pequenos movimentos muito sólida, difícil de deslocar. Em traumatolo-
de deslizamento e a separação de um púbis com gia, esta alteração é pouco freqüente, porém o
relação ao outro. Nos roedores, estes movimen- seu tratamento é geralmente difícil, o que se tra-
tos são de grande amplitude. ta de um fato surpreendente tratando-se de uma
Em corte horizontal (fig. 2-21), se distin- articulação que, em condições normais, carece
de mobilidade.
guem as extremidades ósseas dos púbis a cada
lado da linha média, cujas superfícies axiais es- A articulação sacrococcígea que une o sa-
tão cobertas por uma cartilagem e unidas por cro com o cóccix é uma anfiartrose. As suas su-
uma fibrocartilagem denominada ligamento in- perfícies articulares' são elípticas de eixo maior
terósseo. transversal.

Em vista interna (fig. 2-22), a superfície Em vista lateral (fig. 2-28), se pode obser-
articular do púbis aparece ovalada com um eixo var que a superfície sacra é convexa, enquanto a
maior oblíquo para cima e para a frente, coberta superfície do cóccix é côncava. Os meios de
pelo tendão de inserção do músculo reto do ab- união estão constituídos por um ligamento inte-
dome (1); a articulação é bloqueada pela frente rósseo, análogo a um disco inter\"ertebral e por
por um ligamento anterior (3), muito espesso, ligamentos periféricos que se classificam em
formado por fibras transversais e reforçado por três grupos: anteriores, posteriores e laterais.
fibras oblíquas, perfeitamente visíveis em vista Em vista anterior (fig. 2-26), se pode ob-
anterior (fig. 2-25): expansão das aponeuroses servar o cóccix (1) formado por três ou quatro
de inserção do músculo oblíquo (8), expansão peças ósseas soldadas entre si, o sacro (2) e o li-
dos músculos reto anterior (7) e piramidal (2), garnento anterior:
expansão dos tendões de inserção do reto inter-
- na face anterior do sacro, os vestígios do
no e do adutor médio (9); todas estas fibras en-
ligamento vertebral comum anterior (3)
trelaçadas formam um tecido denso na face an-
terior da sínfise. que se prolongam pelo ligamento sacro-
coccígeo anterior (4);
Na face posterior (fig. 2-24) se pode ob-
- também se podem apreciar três ligamen-
servar o ligamento posterior da sÍnfise púbica
tos sacrococcígeos laterais (5, 6 e 7).
(5), membrana fibrosa que continua com o pe-
riósteo. Em corte vértico-frontal (fig. 2-23) se Em vista posterior (fig. 2-27), se podem
pode apreciar a constituição das superfícies arti- observar vestígios ligamentares sobre a crista
culares com a camada cartilaginosa (10) das su- sacra (8) que se prolongam pelos ligamentos sa-
perfícies púbicas, afibrocartilagem (11) e afina crococcígeos posteriores (9).
fenda (12) escavada na espessura deste ligamen- A articulação sacrococcígea é dotada de
to. A margem superior da sínfise é reforçada pe- movimentos de fiexão-extensão (fig. 2-28), que
lo ligamento superior (6), fascículo fibroso es- são principalmente passivos e que intervêm na
pesso e denso, e a margem inferior é reforçada defecação e no parto. De fato, no movimento de
pelo ligamento inferior (4) ou ligamento arquea- nutação, a extensão do cóccix (deslocamento pa-
do subpúbico no prolongamento do ligamento ra cima e para trás), que aumenta o diâmetro ân-
'interósseo, formando um arco de margem cor- tero-posterior da abertura inferior da pelve no
tante que redondeia o vértice do arco púbico. A momento da saída da cabeça fetal, pode ampliar
espessura e a solidez do ligamento arqueado e prolongar a báscula para trás da ponta do sacro.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 73

Fig.2-31

Fig.2-33
74 FISIOLOGIA ARTICULAR

I
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 75
76 FISIOLOGIA ARTICULAR

A COLUNA LOMBAR EM CONJUNTO

Vista de frente (fig. 3-1) numa radiografia, sínfise púbica, tem um valor médio de
a coluna lombar é retilínea e simétrica em rela- 60°;
ção à linha das apófises espinhosas (m); a espes-
sura dos corpos vertebrais, assim como a das - a seta de lordose lombar (s) pode ser
traçada a partir da corda da lordose lom-
apófises transversas decrescem regularmente de
baixo para cima. A linha horizontal (h), que per- bar que une a margem póstero-superior
corre a parte mais elevada das duas cristas ilía- da primeira vértebra lombar com a mar-
gem póstero-inferior da quinta vértebra
cas, passa entre L4 e Ls' As verticais (a e a') tra-
çadas da margem lateral da asa do sacro caem lombar. A seta representa o ponto máxi-
aproximadamente no fundo do cótilo. mo da curvatura, geralmente no nível da
terceira vértebra lombar. Esta seta é
Vista de perfil (fig. 3-2) numa radiografia, mais pronunciada quanto mais acentua-
se pode constatar a característica da lordose
da seja a lordose; pode ser nula quando
lombar e da estática da coluna descritas por De a coluna lombar é retilínea; inclusive
Seze:
pode estar invertida em certos casos,
~ o ângulo sacro (a) está constituído pela embora isto não seja freqüente;
inclinação do platô superior da primeira
vértebra sacra sobre a horizontal. O seu - a reversão posterior (r) representa a dis-
valor médio é de 30°; tância entre a margem póstero-inferior
da quinta vértebra lombar e a vertical
- o ângulo lombossacro (b), formado entre
que desce da margem póstero-superior
o eixo da quinta vértebra lombar e o eixo da primeira vértebra lombar. Esta dis-
do sacro, tem um valor médio de 140°; tância pode ser nula se a vertical se con-
o ângulo de inclinação da pelve (c), funde com a corda da lordose lombar.
constituído pela inclinação sobre a ho- Pode ser positiva se a coluna lombar se
rizontal da linha que se estende entre o desloca para trás; pode ser negativa se a
promontório e a margem superior da coluna lombar se desloca para a frente.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 77

Fig.3-1 Fig.3-2
78 FISIOLOGIA ARTICULAR

CONSTITUIÇÃO DAS VÉRTEBRAS LOMBARES

Em vista posterior de 3/4 de uma vértebra - a apófise articular superior (6) tem ori-
lombar (fig. 3-4) se podem apreciar os elemen- gem na margem superior da lâmina na
tos que a constituem; na figura 3-3 estes elemen- sua união com o pedículo; o seu plano é
tos estão dispostos em "peças": oblíquo para trás e para fora e apresenta
- o corpo vertebral (1), reniforme, é mais uma face articular coberta com cartila-
extenso na largura que no sentido ânte- gem, orientada para trás e para dentro;
ro-posterior; também é mais longo que - a apófise articular inferior (7) se desloca
alto e o seu contorno, profundamente da margem inferior do arco posterior,
escavado, tem a forma de um diábolo, próximo à união da lâmina com a apófise
menos atrás onde é quase plano; espinhosa. Dirige-se para baixo e para fo-
- as duas lâminas (2) são muito altas e se ra e possui uma face articular coberta
dirigem para trás e para dentro, porém o com cartilagem orientada para fora e pa-
seu plano é oblíquo para baixo e para ra a frente;
fora;
- entre a face posterior do corpo vertebral
- elas se unem por trás para constituir a e o arco posterior se encontra delimita-
apófise espinhosa (3), muito espessa e do o forame vertebral, que forma um
retangular, que se dirige diretamente triângulo quase equilátero.
para trás e se engrossa na sua extremi-
Algumas vértebras lombares apresentam
dade posterior;
certas características específicas: a apófise cos-
- as apófises costóides (4) incorretamente tiforme da primeira vértebra lombar é menos de-
denominadas apófises transversas, visto senvolvida do que a das outras lombares.
que na verdade se trata de remanescen-
A quinta vértebra lombar possui um corpo
tes de costelas, se implantam no nível
vertebral mais alto para a frente que para trás, de
das articulações e se dirigem obliqua-
mente para trás e para fora. Na face pos- tal modo que, visto de perfil, ela é czmeiforme ou
terior da base de implantação das apófi- tem a forma de um trapézio de base maior ante-
ses costiformes, se localiza o tubérculo rior. Quanto às apófises articulares inferiores da
acessório, que segundo alguns autores quinta vértebra lombar, elas se encontram mais
seria o homólogo da apófise transversa separadas entre si do que as das outras lombares.
das vértebras dorsais; Quando duas vértebras lombares se sepa-
- o pedíclllo (5), porção óssea curta que ram entre si verticalmente (fig. 3-5A), se pode
une o arco posterior com o corpo verte- entender como as apófises articulares inferiores
bral, se implanta na face posterior do da vértebra superior se encaixam por dentro e
corpo vertebral no seu ângulo súpero- por trás das apófises articulares superiores da
externo. Ele forma o limite superior e o vértebra inferior (fig. 3-5B). Assim sendo, cada
limite inferior dos forames interverte- vértebra lombar estabiliza a vértebra superior la-
brais; atrás, ele constitui a inserção do teralmente, graças aos ressaltos que as apófises
maciço das apófises articulares; articulares representam.

r
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 79

6 6

Fig.3-3

Fig.3-4

A Fig.3-5 B
80 FISIOLOGIA ARTICULAR

o SISTEMA LIGAMENTAR NA COLUNA LOMBAR

o sistema de união ligamentar se pode anali- Entre estes corpos vertebrais, o corte sagi-
sar corretamente através de um corte sagital (fig. tal (fig. 3-6) mostra o disco intervertebral com o
3-6), neste caso as lâminas do lado esquerdo estão anel fibroso (8) e o núcleo pulposo (9).
seccionadas; seja por um corte frontal (fig. 3-7) no No arco posterior, a união é assegurada pe-
nível dos pedículos, com a metade anterior in- los ligamentos segmentários:
cluindo a face posterior dos corpos vertebrais;
- cada lâmina está unida à seguinte por um
quanto à metade posterior do corte, após realizar
ligamento espesso, muito resistente, de
uma rotação de 180°, ele inclui a face anterior dos
cor amarela; se trata do ligamento ama-
arcos posteriores das vértebras lombares (fig. 3-8).
relo (U), cuja secção (12) pode ser ob-
Uma vértebra está separada acima. Observar que
servada na figura 3-6. Abaixo, se insere
em ambos os lados (figs. 3-7 e 3-8) se podem ver
na margem superior da lâmina subjacen-
os cortes correspondentes aos pedículos; os núme- te e acima na face interna da lâmina con-
ros de referência são comuns às três figuras.
tígua superior. A sua margem interna se
Em corte sagital (fig. 3-6) se podem distin- une à do seu homólogo do lado oposto
guir dois sistemas ligamentares: na linha média (fig. 3-8) e fecha o canal
- por um lado, ao longo de toda a coluna vertebral totalmente por trás (11); para a
vertebral, os ligamentos vertebrais co- frente e para fora. ela cobre a cápsula e
muns anterior (1) e posterior (5); o ligamento ântero-interno (14) das ar-
ticulações interapofisárias. Desse modo,
- e por outro, um sistema de ligamentos
a margem ântero-externa do ligamento
segmentários entre os arcos posteriores.
amarelo toca o contorno posterior do fo-
O grande ligamento vertebral comum rame intervertebra1;
anterior (1) é uma longa fita espessa e nacarada
- entre cada apófise espinhosa se estende o
que se estende do processo basilar do occipital
até o sacro, sobre a face anterior da coluna ver- potente ligamento interespinhoso (15)
que se prolonga para trás pelo ligamen-
tebral. Ele está constituído por longas fibras que
to supra-espinhoso (16), cordão fibroso
vão de uma extremidade à outra do ligamento e
que se insere no vértice das apófises es-
de fibras curtas arciformes que vão de uma vér-
pinhosas; na zona lombar ele quase não
tebra à outra. De fato, ele se insere na face ante-
se distingue do cruzamento das fibras de
rior do disco intervertebral (3). No nível das
inserção dos músculos dorsolombares;
margens ântero-superior e ântero-inferior de ca-
da corpo vertebral, existe um espaço descolável - entre os tubérculos acessórios das apófi-
ses transversas se estende a cada lado um
(4) onde os ostófitos se formam quando a artro-
se vertebral se constitui. ligamento intertransverso (17), bastan-
te desenvolvido na porção lombar.
O grande ligamento vertebral comum
posterior (5) constitui uma fita que se estende Em vista anterior do arco posterior (fig. 3-8),
do processo basilar até o canal sacro. As suas está descolada a vértebra superior graças à secção
duas margens estão recortadas, visto que, no ní- do ligamento amarelo (13); já entre a segunda e a
vel da face posterior de cada disco interverte- terceira vértebras, o ligamento foi ressecado com-
bral, as fibras arciformes (6) se inserem muito pletamente, deixando aparecer a cápsula e o liga-
longe lateralmente. Pelo contrário, o ligamento mento ântero-interno da articulação interapofisá-
não tem inserção nenhuma na face posterior do ria (14) e da apófise espinhosa.
corpo vertebral, do qual se mantém separado por O conjunto destes dois sistemas ligamenta-
um espaço percorrido pelos plexos venosos pe- res constitui uma união extremamente sólida,
rivertebrais. A parte côncava de cada recorte co- não apenas entre dois corpos vertebrais, mas
rresponde aos pedículos (10). também para o conjunto da coluna vertebral.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 81

4
15
3
6 14

7
16
5

8 11
9 12

Fig.3-6

8 13

10
10
14
17

11

Fig.3-7
82 FISIOLOGIA ARTICULAR

FLEXÃO-EXTENSÃO E INFLEXÃO DA COLUNA LOMBAR

Durante o movimento de flexão (fig. 3-9) o po, o ligamento vertebral comum anterior tam-
corpo vertebral da vértebra suprajacente se incli- bém entra em tensão (5). Pelo contrário, o liga-
na e se desliza levemente para afrente no senti- mento vertebral comum posterior se distende,
do da seta F, o que diminui a espessura do disco constatando-se' simultaneamente que as apófises
na sua parte anterior e aumenta a sua espessura articulares inferiores da vértebra superior se en-
na sua parte posterior. Deste modo, o disco in- caixam mais profundamente entre as apófises ar-
tervertebral toma a forma de cunha de base pos- ticulares superiores da vértebra inferior (3) en-
terior e o núcleo pulposo é deslocado para trás. quanto as apófises espinhosas entram em conta-
Assim, a sua pressão aumenta nas fibras poste- to entre si. Desta forma, o movimento de exten-
riores do anel fibroso; simultaneamente, as apó- são fica limitado pelos ressaltos ósseos do arco
fises articulares inferiores da vértebra superior posterior e pela tensão do ligamento vertebral
se deslizam para cima e têm a tendência de se- comum anterior.
parar-se das apófises articulares superiores da Durante o movimento de inflexão lateral
vértebra inferior (seta 1); portanto, a cápsula e (fig. 3-11), o corpo da vértebra suprajacente se
os ligamentos desta articulação interapofisária inclina para o lado da concavidade da inflexão e
estão tensos ao máximo, assim como todos os li- o disco se torna cuneiforme, mais espesso no la-
gamentos do arco posterior: o ligamento amare- do da convexidade. O núcleo pulposo se desloca
lo, o ligamento interespinhoso (2), o ligamento levemente para o lado da convexidade. O liga-
supra-espinhoso e o ligamento vertebral comum mento intertransverso do lado da convexidade
posterior. Em resumo, esta tensão limita o movi- (6) também entra em tensão e se distende do la-
mento de flexão.
do da concavidade (7). Uma vista posterior (12)
Durante o movimento de extensão (fig. mostra um deslizamento desigual das apófises
3-10), o corpo vertebral da vértebra supraja- articulares: do lado da convexidade, a apófise ar-
cente se inclina para trás e recua no sentido da ticular da vértebra superior se eleva (8), enquan-
seta E. Ao mesmo tempo, o disco intervertebral to do lado da concavidade ela desce (9). Existe
se afina na sua parte posterior e se alarga na sua assim, simultaneamente, uma distensão dos liga-
parte anterior, tornando-se cuneiforme de base mentos amarelos e da cápsula articular interapo-
anterior. O núcleo pulposo é deslocado para a fisária do lado da concavidade e, pelo contrário,
frente, o que provoca que as fibras anteriores do uma tensão destes mesmos elementos do lado da
anel fibroso entrem em tensão. Ao mesmo tem- convexidade.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 83

Fig.3-9 Fig.3-10

Fig.3-11 Fig.3-12
84 FISIOLOGIA ARTICULAR

ROTAÇÃO NA COLUNA LOMBAR

As faces articulares superiores das vérte- e 3-16), este movimento de rotação se realize
bras lombares estão orientadas para trás e para ao redor deste centro e deve acompanhar-se,
dentro (figs. 3-13 e 3-14, vista superior); elas obrigatoriamente, de um deslizamento do cor-
não são planas, mas sim, côncavas transversal- po vertebral da vértebra superior com relação
mente e retilíneas verticalmente. Geometrica- ao da vértebra subjacente (fig. 3-17). O disco
mente, elas estão talhadas sobre a superfície de intervertebral (D) não é, portanto, solicitado na
um mesmo cilindro cujo centro O se situa atrás torção axial, o que lhe daria uma amplitude de
das faces articulares, aproximadamente na ba- movimento relativamente grande, mas em ci-
se da apófise espinhosa (fig. 3-17). Nas vérte- salhamento; isto explica que a rotação axial na
bras lombares superiores (fig. 3-13), o centro coluna lombar seja limitada, tanto em cada ní-
deste cilindro se localiza quase imediatamente vel quanto no seu conjunto.
atrás da linha que une a margem posterior das Segundo os trabalhos de Grégersen e D.B.
apófises articulares, enquanto nas vértebras Lucas (ver pág. 121), a rotação total direita-es-
lombares inferiores (fig. 3-14), o cilindro tem querda da coluna lombar entre Lj e Sj seria de
um diâmetro muito maior, o que recua na mes- 10° e, supondo que a rotação segmentária esti-
ma medida o seu centro em relação ao corpo vesse eqüitativamente repartida, isto seria igual
vertebral.
a dois graus por cada parte, isto é, um grau a ca-
É importante o fato de que o centro deste da lado em cada nível. Portanto, podemos desta-
cilindro não se confunda com o centro dos pla- car que a coluna lombar não está conformada
tôs vertebrais, embora quando a vértebra supe- para realizar a rotação axial, limitada pela orien-
rior gira sobre a vértebra inferior (figs. 3-15 tação das faces articulares.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 85

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Fig.3-13
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.",.....---- ..•...••..
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Fig.3-14

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Fig.3-17

Fig.3-15 Fig.3-16
86 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ARTICULAÇÃO LOMBOSSACRAL E A ESPONDILOLISTESE

A charneira lombossacral constitui um pon- frente provocando uma espondilolistese. Portan-


to fraco do edifício vertebral. De fato (fig. 3-18), to, os únicos elementos que retêm a quinta lom-
devido à inclinação do platá superior da primei- bar sobre o sacro e-impedem que esta se deslize
ra vértebra sacra, o corpo da quinta lombar tem ainda mais são, por um lado, o disco lombossa-
a tendência de deslizar-se para baixo e para a cral cujas fibras oblíquas estão tensas e, por ou-
frente: o peso P pode ser decomposto em duas tro, os mÚsculos dos canais vertebrais, cuja con-
forças elementares, uma força N perpendicular tratura permanente é a origem das dores da es-
ao platá superior do sacro e uma força G parale- pondilolistese. Pode-se medir a magnitude do
la ao platô superior do sacro que desloca o cor- deslizamento para a frente pelo transbordamen-
po vertebral de Ls para a frente. A sólida união to da face inferior de Ls com relação à margem
do arco posterior de Ls impede este deslizamen- anterior do platô superior de SI.
to. Em vista superior (fig. 3-19) as apófises arti-
culares inferiores de Ls se encaixam entre as Nas radiografias de projeção oblíqua (3/4)
apófises articulares superiores da primeira sacra, (fig. 3-21) se distingue com nitidez o clássico
a força G' de deslizamento encaixa fortemente "cachorrinho", cujo focinho está constituído
as apófises articulares de Ls sobre as apófises su- pela apófise transversa; o olho, é o pedículo vis-
periores do sacro que resistem a ambos os lados, to obliquamente; a orelha, é a apófise articular
de acordo com uma força R. A transmissão des- superior; a pata dianteira é a apófise articular in-
tas forças se realiza através de um ponto de pas- ferior; o rabo, é a lâmina e a apófise articular
sagem obrigatório, localizado no istmo verte- superior do lado oposto; a pata traseira é a apó-
bral (fig. 3-20): denomina-se assim a porção do fise articular inferior do lado oposto; e o corpo,
arco posterior compreendida entre as apófises a lâmina do lado dos 3/4_ Um ponto importante
articulares superiores e as inferiores. Quando es- a considerar é que o pescoço representa exata-
te istmo se rompe ou se destrói, como está repre- mente o istmo vertebral: quando o istmo se
sentado aqui, podemos dizer que existe uma es- rompe, o pescoço do cachorro é seccionado; is-
pondilólise. Como o arco posterior não fica reti- to permite diagnosticar a espondilólise e procu-
do atrás nas apófises superiores do sacro, o cor- rar o·deslizamento de Ls apreciável numa radio-
po vertebral de Ls se desliza para baixo e para a grafia de perfil.

r-

I
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 87

Fig.3-18 Fig.3-20

Fig.3-21
Fig.3-19
88 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS ÍLIO-LOMBARES E OS MOVIMENTOS


NA CHARNEIRA LOMBOSSACRAL

As duas últimas vértebras lombares estão portanto, eles intervêm para limitar os mOVI-
unidas diretamente com o osso ilíaco pelos liga- mentos.
-
mentos ílio-Iombares (fig. 3-22, vista anterior).
Durante a inclinação lateral (fig. 3-23, vis-
Podem-se distinguir dois fascículos:
ta anterior) os ligamentos ílio-lombares entram
- o fascículo superior (1), também deno- em tensão do lado da convexidade e limitam a
minado fascículo ílio-transverso lombar
inclinação da quarta lombar sobre o sacro a 8°.
superior: ele tem origem no vértice da
Está claro que no lado da concavidade estes li-
apófise transversa da quarta vértebra
lombar, se dirige para baixo, para fora e gamentos se distendem.
para trás para se inserir na crista ilíaca; Durante a flexão-extensão (fig. 3-24, vista
- o fascículo inferior, também denomi- lateral, asa ilíaca supostamente transparente): a
nado ílio-transverso lombar inferior, ori- partir da posição neutra (tracejada), a orientação
gina-se no vértice e na margem inferior dos ligamentos permite entender que no percurso
da apófise transversa da quinta lombar, da fiexão o fascículo superior do ligamento ílio-
se dirige para baixo e para fora para se lombar entra em tensão, visto que se dirige obli-
inserir na crista ilíaca para a frente e pa- quamente para baixo, parafora e para trás. Pelo
ra dentro do fascículo superior. Às ye- contrário, no percurso da extensão, ele se disten-
zes, se distinguem dois pequenos fascí- de.
culos fibrosos mais ou menos individua-
lizados: Pelo contrário, durante a flexão (F) o fas-
• umfascículo estritamente ilíaco (2); cículo inferior do ligamento ílio-lombar se dis-
tende visto que se dirige levemente para a fren-
• um fascículo sacro (3), nitidamente te, contudo ele entra em tensão durante a exten-
vertical, que se dirige levemente para a
são (E).
frente e finaliza na parte antérior da ar-
ticulação sacroilíaca e na parte mais la- Em resumo, a mobilidade na chameira
teral da asa do sacro. lombossacral é muito limitada devido à potência
Estes ligamentos ílio-lombares entram em dos ligamentos aio-lombares. Em conjunto, eles
tensão ou se distendem dependendo dos mo\'i- limitam mais a inclinação lateral do que a fie-
mentos realizados pela chameira lombossacral; xão-extensão.
Fig.3-22

Fig.3-23

Fig.3-24
90 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS DO TRONCO EM CORTE HORIZONTAL

Um corte horizontal que passe pela terceira Os músculos da parede do abdome se dis-
vértebra lombar (fig. 3-25, parte inferior do cor- tribuem em dois grupos:
te) permite classificar os músculos do tronco em
- os músculos retos do abdome (13), si-
três grupos.
tuados pela frente, em ambos os lados
Os músculos do grupo posterior se distri- da linha média;
buem em três planos:
- os músculos largos do abdome que
• um plano profundo que contém:
são três e constituem a parede ântero-
- os músculos transverso-vertebrais (1), lateral do abdome, da profundidade à
que ocupam o ângulo diedro formado superfície se localizam:
entre o plano sagital das apófises es-
pinhosas e o plano frontal das apófises - o músculo transverso do abdome (10);
transversas, e que se amoldam estrei- - o oblíquo interno do abdome (11);
tamente com as lâminas vertebrais;
- o oblíquo e:rterno do abdome (12).
- o músculo grande dorsal (2), que co-
bre o anterior e o ultrapassa para fora; Pela frente estes três músculos conformam
- o músculo sacrolombar (3), massa umas aponeuroses que constituem a bainha dos
carnosa volumosa localizada por fora retos e a linha alva da seguinte maneira:
do grande dorsal; • a aponeurose do oblíquo interno se divi-
- e, por último, o músculo epiespinhoso de na margem lateral do músculo reto
(4), que se insere nas apófises espin- maior em duas lâminas: uma superficial
hosas e se situa por trás do transyerso- (14) e outra profunda (15) que envolvem
vertebral e do grande dorsal. o reto abdominal. Na linha média eles se
Estes músculos constituem uma massa volu- cruzam formando um rafe muito sólido: a
mosa que ocupa os canais vertebrais, em ambos linha alva abdominal (16);
os lados das apófises espinhosas; por este motivo • as lâminas anterior e posterior da bainha
denominam-se músculos paravertebrais ou mús- dos retos estão reforçadas atrás pela apo-
culos dos canais.
neurose do transverso e pela frente pela
• um plano médio conformado pelo serrá- aponeurose do oblíquo externo. Isto so-
til menor posterior e inferior (5); mente é válido no caso da parte superior,
• um plano superficial representado na re- mais adiante se poderá ver a disposição
gião lombar apenas por um músculo, o exata na parte inferior.
grande dorsal (6); que se insere na espes- Os músculos látero-vertebrais e os múscu-
sa aponeurose lombar (8) que se fixa, en-
los largos do abdome delimitam a cavidade ab-
tre outras, na linha das espinhosas; o cor-
dominal, em cujo interior sobressaem a coluna
po muscular (6) forma uma camada car-
lombar (20) e os grandes vasos pré-vertebrais
nosa que cobre toda a parte póstero-Iate-
(aorta e veia cava inferior). A cavidade abdomi-
ral da região lombar.
nal propriamente dita (18) é revestida pelo peri-
Os músculos látero-vertebrais são dois:
tônio que cobre a face posterior do músculo re-
- o quadrado lombar (8), camada mus- to abdominal, a face profunda dos músculos lar-
cular que se estende entre a última gos e a parede posterior onde os órgãos retrope-
costela, a crista ilíaca e o vértice das ritoneais estão presos, os rins, cobertos por uma
apófises tranversas; região adiposa retroperitoneal (19). Entre o pe-
- o psoas (9), que ocupa o ângulo diedro ritônio parietal e a parede do abdome se interca-
formado pelas faces laterais dos corpos la uma fina camada de tecido fibroso: a fáscia
vertebrais e as apófises transversas. transversal (17).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 91

13 14 15 16 17

18
12

11
20

10

19

3 2 7 5 4 9 6

Fig.3-25
92 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS POSTERIORES DO TRONCO

Os músculos posteriores do tronco se distri- pandindo fascículos terminais na face poste-


buem em três planos, da profundidade até a super- rior das dez últimas costelas, próximos a seu
fície. ângulo posterior. A seguir, estas fibras ficam
o plano profundo é constituído por múscu- substituídas pelas que ascendem até as apó-
fises transversas das cinco últimas cervicais
los vertebrais, que se aplicam diretamente contra a
coluna vertebral (figs. 3-26 e 3-27), daí sua deno- (ver figo5-89, pág. 243).
minação de músculos dos canais vertebrais, e seus Todos estes músculos se unem na sua parte
fascículos são mais curtos quanto mais profunda é inferior constituindo a massa comum (6), visível
a sua localização. Estes são: do lado direito da figura 3-27; as suas inserções se
- o transverso-vertebral (1), constituído por localizam na face. profunda de uma espessa lâmina
lâminas dispostas como as telhas de um tel- tendinosa que se confunde, na superfície, com a
hado; na figura, apenas uma dessas lâminas aponeurose do grand.e dorsal (7).
está desenhada segundo o conceito de O plano médio (fig. 3-27) é constituído por só
Winckler: as fibras se originam na lâmina de um músculo: o serrátil menor posterior e inferior
uma vértebra e, de forma oblíqua, para bai- (4), situado imediatamente detrás dos músculos dos
xo e para fora, se inserem nas apófises canais e coberto pelo plano do músculo grande dor-
transversas das quatro vértebras subjacen- sal. Ele se insere nas apófises espinhosas das três
teso Segundo o conceito de Trolard as fibras primeiras vértebras lombares e das duas últimas vér-
se originam nas lâminas e nas apófises es- tebras dorsais e forma fascículos oblíquos para cima
pinhosas das quatro vértebras suprajacentes e para fora que finalizam na margem inferior e na fa-
para inserir-se na apófise transversa da vér- ce externa das três ou quatro últimas costelas.
tebra subjacente (ver figo5-85, pág. 241); O plano superficial está constituído pelo
- os músculos interespinhosos (2), situados músculo grande dorsal (7) que se origina na espes-
em ambos os lados da linha média, unem sa aponeurose lombar; as suas fibras oblíquas diri-
as margens de duas apófises espinhosas gidas para cima e para fora cobrem todos os mús-
contíguas. No esquema somente está re- culos dos canais e dão origem às fibras musculares
presentado um par destes músculos; seguindo uma linha de transição oblíqua para bai-
- o epiespinhoso (3), fusiforme, localizado xo e para fora.
em cada lado dos interespinhosos e atrás O conjunto da aponeurose lombar forma um
dos transverso-vertebrais, se insere por losango de eixo vertical maior. As fibras muscula-
baixo nas apófises espinhosas das duas pri- res conformam uma camada muito extensa que en-
meiras vértebras lombares e das duas últi- volve a parte póstero-externa da base dorsal e fina-
mas dorsais para terminar nas apófises es- liza no úmero (ver volume I).
pinhosas das dez primeiras dorsais. Os fas- A ação dos músculos posteriores é essencial-
cículos mais curtos são os mais internos; mente a extensão da coluna lombar (fig. 3-28): to-
- o grande dorsal (5), longa banda muscular mando o sacro como ponto fixo, tracionam a coluna
localizada imediatamente por fora do lombar e dorsal para trás com força; por um lado, ao
epiespinhoso, ascende pela face posterior redor da chameira lombossacral, e por outro, ao re-
do tórax para fixar-se nas costelas até a se- dor da chameira dorsolombar. Além disso, eles acen-
gunda costela (fascículos laterais ou cos- tuam a lordose lombar (fig. 3-29) visto que consti-
tais) e nas apófises transversas das vérte- tuem as cordas parciais ou totais do arco formado
bras lombares e dorsais (fascículos internos pela coluna lombar. Portanto, não se pode afirmar
ou transversos (ver figo4-29, pág. 151»; que eles endireitem a coluna lombar, visto que eles a
- o sacrolombar ou z1io-costal (6), espessa puxam para trás e a incurvam.
massa muscular prismática situada por trás e Também se poderá ver mais adiante o papel
por fora dos músculos citados anteriormen- que desempenham estes músculos posteriores na
te, ascende pela face posterior do tórax, ex- expiração.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 93

Fig.3-26

Fig.3-29
Fig.3-28
94 FISIOLOGIA ARTICULAR

PAPEL DA TERCEIRA VÉRTEBRA LOMBAR


E DA DÉCIMA SEGUNDA VÉRTEBRA DORSAL

Os trabalhos de A. Delmas puseram em senta um ponto fixo para a ação dos músculos
evidência o valor funcional de determinadas dorsais. Portanto, éla desempenha um papel pri-
vértebras (figs. 3-30 e 3-31 segundo Delmas) mordial na estática vertebral devido à sua situa-
em posição ortostática. A característica cunei- ção no vértice da lordose lombar e porque os
forme da quinta vértebra lombar, que deve rea- seus platás são paralelos e horizontais entre si.
lizar a transição entre o sacro, mais ou menos Trata-se da primeira vértebra da coluna lombar
horizontal, e uma coluna vertebral vertical, é verdadeiramente móvel, visto que se pode con-
conhecida desde muito tempo atrás. Contudo, o siderar que a quarta e a quinta vértebras, muito
papel da terceira vértebra lombar começa ligadas ao osso ilíaco e ao sacro, constituem
recentemente a ser entendido (fig. 3-30). De fa- uma transição mais estática que dinâmica entre
to, esta vértebra possui um arco posterior mais a coluna vertebral e a pelve.
desenvolvido, visto que serve de substituto
muscular, por um lado entre os fascículos lom- Já a décima segunda vértebra dorsal
bares do grande dorsal procedentes do osso ilía- constitui o ponto de inflexão entre a cifose dor-
sal e a lordose lombar. Trata-se de uma vértebra
co que se insere nas apófises transversas de L3,
e por outro, ascendendo em direção à coluna chameira cujo corpo vertebral é relativamente
dorsal, os fascículos do epiespinhoso cuja inser- importante com relação ao arco posterior, detrás
ção mais baixa localiza-se exatamente na apófi- do qual os músculos dos canais passam forman-
se espinhosa de L3' Assim (fig. 3-31), os múscu- do uma ponte, sem fazer inserções notáveis. A.
los com inserção sacral e ilíaca deslocam a ter- Delmas a compara com "uma verdadeira patela
ceira lombar para trás, de modo que ela repre- do eixo vertebral".
Fig.3-30 Fig.3-31
96 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS LATERAIS DO TRONCO

o grupo de músculos laterais do tronco me (2) se insere em duas camadas musculares:


compreende dois músculos: o quadrado lombar por um lado, uma camada posterior que se fixa
e o psoas. nas apófises transversas das vértebras lomba-
O quadrado lombar (fig. 3-32, vista ante- res, e por outro uma camada anterior que se in-
rior) forma, como seu nome indica, uma camada sere nos corpos vertebrais da décima segunda
dorsal e das cinco vértebras lombares. Estas in-
muscular quadrilátera que se expande entre a úl-
tima costela, a crista ilíaca e a coluna vertebral, serções ocorrem nas margens inferiores e supe-
e apresenta por fora uma margem livre. Ele está riores das duas vértebras adjacentes, assim co-
constituído por três tipos de fibras (lado direito mo na margem lateral do disco compreendido
da figura): entre estas duas vértebras. Existem arcos tendi-
nosos que unem as áreas de inserção muscula-
- fibras que unem diretamente a última
costela à crista ilíaca (setas brancas); res. O corpo muscular fusiforme, achatado de
diante para trás, desce obliquamente para baixo
- fibras que unem a última costela com as e para fora, segue pela abertura superior da pel-
apófises transversas das cinco vértebras ve, se reflete sobre a margem anterior do osso
lombares (setas tracejadas verticalmen- coxal, ao nível da eminência ílio-pectínea e,
te); junto com o músculo ilíaco, termina no vértice
- fibras que unem as apófises transversas do trocanter menor.
das quatro primeiras vértebras lombares Quando o psoas toma a sua inserção sobre
à crista ilíaca (setas cinzas), e que estão o fêmur como ponto fixo e o quadril é bloquea-
na continuação das fibras que provêm do pela contração dos outros músculos periarti-
do transversovertebral (setas pretas) que culares, ele exerce uma potente ação sobre a co-
aparecem no espaço entre as apófises luna lombar (fig. 3-35), que realiza, ao mesmo
transversas.
tempo, uma inclinação para o lado da sua con-
Os três tipos de fibras do quadrado lombar tração e uma rotação para o lado oposto da con-
estão dispostos segundo três planos; o plano tração. Além disso (fig. 3-36), como este múscu-
mais posterior é formado pelas fibras diretas lo se insere no vértice da lordose lombar, ele
costoilíacas, cobertas pelas fibras transverso- realiza uma fiexão da coluna lombar com rela-
ilíacas e a seguir, pelas costotransversas (1). ção à pelve e uma hiperlordose lombar que apa-
Quando o quadrado lombar se contrai uni- rece nitidamente no indivíduo em decúbito supi-
lateralmente, ele produz uma inflexão do tronco no, com os membros inferiores estendidos sobre
do lado da sua contração (fig. 3-33), esta ação o plano de apoio (fig. 3-62, pág. 115).
está fortemente reforçada pela contração dos Em resumo, os dois músculos do grupo la-
músculos oblíquo interno (seta cinza oblíqua pa- teral inclinam o tronco para o lado da sua con-
ra baixo e para fora) e oblíquo externo (seta tra- tração, porém quando o quadrado lombar não
cejada oblíqua para baixo e para dentro). exerce nenhuma ação sobre a 10rdose lombar, o
O psoas se localiza na frente do quadrado psoas determina uma hiperlordose e uma rota-
lombar (fig. 3-34), o seu corpo carnoso fusifor- ção do tronco para o lado oposto.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 97

Fig.3-32
Fig.3-33

Fig.3-35
Fig.3-34 Fig.3-36
98 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS DA PAREDE ABDOMINAL:


O RETO ABDOMINAL E O TRANSVERSO DO ABDOME

Os dois músculos retos abdominais (fig. gos da parede ábdominal. Eles se inserem no vér-
3-37, vista de frente, e figo3-38, vista de perfil) tice das apófises tr,!-nsversasdas vértebras lomba-
constituem duas bandas musculares estendidas res por trás; as suas fibras musculares horizontais
pela face anterior do abdome, em um lado e ou- se dirigem para fora e diretamente para a frente e
tro da linha média. As suas inserções superiores rodeiam a massa visceral. Eles dão origem a fibras
ocorrem nos Y', 6~ e 7~ arcos anteriores e nas aponeuróticas seguindo uma linha paralela à mar-
cartilagens costais, assim como na apófise xifói- gem lateral dos retos abdominais. Esta aponeuro-
de. A espessa banda muscular que sai destas in- se de terminação do transverso se une à do lado
serções se estreita gradualmente, entrecortada oposto na linha média e, na sua maior parte, passa
por intersecções aponeuróticas (duas intersec- por trás do reto abdominal, participando, assim, na
ções acima do umbigo, uma na sua altura e ou- constituição da lâmina posterior da bainha dos re-
tra abaixo). A espessura do corpo muscular é tos. Contudo, debaixo do umbigo, a aponeurose
menor abaixo do umbigo para dar nascimento a do transverso passa pela frente do músculo reto
um potente tendão que se insere na margem su- abdominal, que a perfura para passar para trás. A
perior do púbis, na sínfise púbica, com expan- partir deste nível, marcado na face posterior do re-
sões em direção ao lado oposto e aos adutores. to abdominal pela arcada aponeurótica de Dou-
Os dois músculos retos abdominais estão sepa- glas, a aponeurose do transverso intervém na
rados na linha média por um espaço mais longo constituição da lâmina anterior da bainha dos re-
acima do umbigo que abaixo deste. Eles estão tos. Neste esquema também se pode constatar que
envolvidos por uma bainha aponeurótica forma- só as fibras da parte média são horizontais; as fi-
da pela aponeurose de terminação dos músculos bras da parte superior são oblíquas para cima e pa-
largos da parede abdominal. ra dentro, as fibras da parte inferior são oblíquas
Os músculos transversos (fig. 3-39, vista de para baixo e para dentro e as fibras mais baixas
frente, o transverso está representado apenas na terminam na margem superior da sínfise púbica e
metade esquerda, e figo3-40, vista de perfil) cons- do púbis participando, junto com as do oblíquo in-
tituem a camada mais profunda dos músculos lar- terno, da formação do tendão conjunto.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 99

Fig.3-37 Fig.3-38

Fig.3-39 Fig.3-40
100 FISIOLOGIA ARTICULAR

MÚSCULOS DA PAREDE ABDOMINAL:


O OBLÍQUO INTERNO E O OBLÍQUO EXTERNO

o oblíquo interno (figs. 3-41 e 3-42) cons- à margem lateral do reto abdominal; posterior-
titui a camada intermediária dos músculos lar- mente, será oblíqua para baixo e para trás. Esta
gos da parede abdominal. A direção geral das apofleurose participa da constituição da lâmina
suas fibras é oblíqua de baixo para cima e de fo- anterior da bainha dos retos e se entrecruza na
ra para dentro; ele se insere na crista ilíaca; as linha média com seu homólogo oposto de modo
suas fibras carnosas formam uma lâmina muscu- que contribui para a formação da linha alva ab-
lar localizada na parede lateral do abdome; algu- dominal. As fibras da nona costela que provêm
mas delas finalizam na décima segunda e déci- da digitação se inserem no púbis e enviam ex-
ma primeira costelas; outras terminam em uma pansões aponeuróticas em direção aos adutores
aponeurose contígua ao corpo muscular seguin- do mesmo lado e' do lado oposto. As fibras
do uma linha inicialmente horizontal, que sai do oriundas da digitação, que se origina na décima
vértice da décima primeira costela, que poste- costela, inserem-se no arco crural; estes dois
riormente se verticaliza ao longo da margem la- fascículos tendinosos delimitam o orifício su-
teral do reto abdominal; as fibras aponeuróticas
perficial do canal inguinal. triangular de vértice
finalizam na décima cartilagem costal e na apó-
súpero-extemo, e cuja base ínfero-externa está
fise xifóide, e contribuem para a formação da lâ-
constituída pelo púbis e a sua espinha onde a ar-
mina anterior da bainha dos retos; de modo que
cada crural se insere.
ele se entrecruza na linha média com seu homó-
logo oposto, constituindo a linha alva abdol7li- Da descrição destes músculos da parede ab-
flol. A parte inferior do oblíquo interno se insere dominal que constituem o grupo anterior dos
na parte lateral da arcada crural; as suas fibras músculos motores da coluna vertebral, convém
são horizontais e, a seguir, oblíquas para baixo e lembrar as seguintes noções:
para dentro; juntamente com as fibras do trans- - os músculos retos abdominais formam,
verso formam o tendão conjunto; elas finalizam
na parte mais anterior do abdome, duas
na margem superior da sínfise púbica e na es-
bandas musculares que agem a uma
pinha do púbis. Deste modo, o tendão conjunto
grande distância da coluna vertebral,
limita o orifício profundo do canal inguinal com
entre o orifício inferior do tórax, na sua
a parte interna da arcada crural.
parte anterior, e a cintura pélvica, tam-
O oblíquo externo (figs. 3-43 e 3-44) cons- bém na sua parte anterior;
titui a camada superficial dos músculos largos
da parede abdominal; a direção geral das suas fi- - os músculos largos formam três cama-
bras é oblíqua de cima para baixo e de fora para das sucessivas cujas fibras tomam a se-
dentro. As suas digitações carnosas se inserem guinte direção: transversal na camada
nas sete últimas costelas; elas se recobrem de profunda do transverso, oblíqua para ci-
baixo para cima e estão imbricadas com as digi- ma e para dentro na camada média do
tações do serrátil anterior; os fascículos muscu- oblíquo interno, oblíqua para baixo e
lares se situam na parede lateral do abdome e para dentro na camada superficial do
dão origem a uma aponeurose que segue uma oblíquo externo (ver figo 4-31, pág.
linha de transição inicialmente vertical, paralela 153).
Fig.3-42

Fig.3-44
102 FISIOLOGIA ARTICULAR

MÚSCULOS DA PAREDE ABDOMINAL:


O CONTORNO DA CINTURA

As fibras dos músculos longos, prolonga- quando a sua direção é paralela ao eixo que une
das pelas fibras das suas respectivas aponeuro- o centro de ambos os círculos, vamos obter
ses, formam um tecido, um verdadeiro espar- uma superfície cilíndrica. Ao contrário, se fa-
tilho ao redor do abdome (fig. 3-45). De fato, a zemos girar o círculo superior com relação ao
direção das fibras do oblíquo externo de um la- inferior (B), os fios permanecem tensos porém
do prolonga-se na direção das fibras do oblíquo tomam a direção oblíqua e a superfície que
interno do outro e vice-versa. De maneira que, "envolve" todas essas retas é uma hiperbolóide
considerados em conjunto, estes músculos oblí- de revolução cujo contorno fica talhado em
quos interno e externo constituem um tecido em forma de curva hiperbolóide. Este mecanismo
forma de losango em vez de retangular; as cos- permite compreender perfeitamente a forma da
tureiras diriam que este tecido está cortado em cintura, mais marcada quanto mais tensas este-
viés. Esta circunstância lhe permite estar adapta- jam as fibras oblíquas e, naturalmente, quanto
do ao contorno da cintura.
menos espesso for o panículo adiposo. Para re-
Uma demonstração permite ilustrar com construir o contorno da cintura, será necessário
facilidade este fato (fig. 3-46): se estendemos restabelecer a tonicidade dos músculos oblí-
uns fios ou elásticos entre dois círculos (A), quos do abdome.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 103

Fig.3-45

A
Fig.3-46
104 FISIOLOGIA ARTICULAR

MÚSCULOS DA PAREDE ABDOMINAL:


A ROTAÇÃO DO TRONCO

A rotação sobre o eixo vertebral é realiza- abdome (fig. 3-48). De fato, o seu trajeto enrola-
da pelos mÚsculos dos canais vertebrais e os do em espiral ao redor da cintura lhe proporcio-
mÚsculos largos do abdome. na uma grande eficácia, assim como suas inser-
ções à distância da coluna vertebral sobre a cai-
A contração unilateral dos músculos dos ca-
xa dorsal, o que mobiliza a coluna lombar e tam-
nais vertebrais exerce um leve efeito rotador, po- bém a coluna dorsal inferior. Para obter a rota-
rém a camada muscular mais profunda, a do trans-
ção do tronco para a esquerda (fig. 3-48), é ne-
verso-vertebral (fig. 3-47), tem uma ação rotado-
cessário que ajam, por um lado, o oblíquo exter-
ra muito mais acentuada: tomando como ponto fi-
no (OM) do lado direito, e por outro, o oblíquo
xo as apófises transversas subjacentes, o transver-
interno (Om) do lado esquerdo. É necessário
so-vertebral (TE) puxa a apófise espinhosa da vér-
destacar que estes dois músculos estão enrola-
tebra suprajacente para fora, determinando, assim,
dos no mesmo sentido ao redor da cintura (fig.
uma rotação para o lado oposto da sua contração.
3-49) e que as suas fibras musculares e aponeu-
No percurso da rotação do tronco, a ação róticas prolongam-se na mesma direção. Portan-
principal é realizada pelos mÚsculos oblíquos do to, na ação de rotação, eles são sinérgicos.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 105

Fig.3-47

Fig.3-49

Fig.3-48
106 FISIOLOGIA ARTICULAR

MÚSCULOS DA PAREDE ABDOMINAL:


A FLEXÃO DO TRONCO

Os músculos da parede abdominal são po- que une a apófise xifóide à sínfise púbica realiza
tentes fiexores do tronco (fig. 3-50). Situados pe- uma potente ação de flexão da coluna vertebral.
la frente do eixo vertebral, eles mobilizam o Ele está reforçado por dois músculos largos, o
conjunto da coluna vertebral para a frente sobre oblíquo interno (Om) e o oblíquo externo (OM)
as charneiras lombossacral e dorso lombar. A sua que unem o orifício inferior do tórax à margem
ação é muito importante, visto que ela se realiza superior da cintura pélvica; enquanto o reto ab-
através de dois grandes braços de alavanca: o dominal constitui um tensor direto, o oblíquo in-
braço de alavanca inferior, constituído pela dis- terno constitui um tensor oblíquo para baixo e
tância promontório-púbica, e o braço de alavan- para trás, e o oblíquo externo um tensor oblíquo
ca superior, representado pelo suporte que se para baixo e para a frente. Além disso, ambos
apóia na coluna dorsal inferior, constituído pela desempenham o papel de sustentadores quanto
distância dorso-xifóide; o reto abdominal (RA) mais oblíquos eles são.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 107

Fig.3-50
108 FISIOLOGIA ARTICULAR

MÚSCULOS DA PAREDE ABDOMINAL:


A RETIFICAÇÃO DA LORDOSE LOMBAR

A maior ou menor curvatura da coluna lom- guir uma retificação da lordose lombar. A partir
bar não depende apenas do tônus dos abdomi- deste momento, a ação extensora dos músculos
nais e vertebrais, mas também de certos múscu- dos canais lombares (L) pode conseguir a tração
los dos membros inferiores que estão unidos à para trás das primeiras vértebras lombares.
cintura pélvica. Na posição denominada "astê-
A contração dos músculos do plano toráci-
nica" (fig. 3-51 B), o relaxamento muscular pro-
voca um aumento de todas as curvaturas verte- co provoca a diminuição da cifose dorsal.
brais: hiperlordose lombar, acentuação da cifo- A ação dos músculos da coluna cervical,
se dorsal e da lordose cervical. Além disso, a como se poderá comprovar mais adiante, permi-
pelve bascula em anteversão: a linha que une a te obter, do mesmo modo, uma retificação da
espinha ilíaca ântero-superior à espinha ilíaca lordose cervicaL Em resumo, com a supressão
póstero-superior torna-se oblíqua para baixo e das curvaturas, a coluna vertebral é mais alta (is-
para a frente. O músculo psoas (Ps) flexiona a to corresponde a um ligeiro aumento do índice
coluna lombar sobre a pelve e aumenta a lordo- vertebral de Delmas) e, assim, o mesmo indiví-
se lombar que se agrava pela hipertonicidade do duo pode ganhar 1, 2 e inclusive 3 cm de altura.
músculo; esta atitude astênica é a que costumam
Esta é a teoria clássica, porém, recentemen-
adotar os sujeitos sem energia nem vontade. te, estudos "inclinométricos" demonstraram
Também se observam curvaturas da coluna ver-
(Klausen, 1965) que a coluna vertebral em con-
tebral parecidas nas mulheres, em estado avan-
junto comporta-se como um braço de guindaste,
çado de gestação, no qual a distensão dos mús-
em posição de saliente anterior. Os eletromio-
culos da parede abdominal, do mesmo modo que
gramas simultâneos dos músculos do plano pos-
o deslocamento do centro de gravidade para a
terior e dos abdominais (Asmussen e Klausen,
frente, devido ao desenvolvimento do feto, alte-
1962) põem em evidência que, em quatro de ca-
ram notavelmente a estática pélvica e vertebral.
da cinco indivíduos, a posição ortostática con-
A retificação das curvaturas vertebrais (fig. trolada pelo simples reflexo postural inconscien-
3-51 A) começa na pelve. A correção da antever- te somente precisa de uma contração tônica dos
são pélvica se obtém pela ação dos músculos ex- músculos do plano posterior. Quando o sujeito
tensores do quadril: a contração dos ísquio-ti- carrega a parte superior de sua coluna vertebral
biais (IT) e especialmente do glúteo maior (G) colocando um peso sobre sua cabeça ou levando
leva à báscula da pelve para trás e restabelece a peso nas mãos com os braços pendentes ao lon-
horizontalidade da linha biespinhosa. Assim, o go do corpo, o alpendre anterior da coluna ver-
sacro verticaliza-se e a curvatura da coluna ver-
tebral aumenta levemente, enquanto a lordose
tebrallombar diminui. lombar diminui e a cifose dorsal aumenta. Si-
O papel mais importante na correção da hi- multaneamente, o tônus dos músculos vertebrais
perlordose lombar corresponde aos músculos do aumenta para limitar o alpendre. Portanto, os
abdome, principalmente aos retos abdominais músculos abdominais não participam na estática
(RA) localizados do lado da convexidade da cur- vertebral inconsciente, o que não significa que
vatura lombar e que agem, como vimos anterior- não ajam durante a retificação consciente da lor-
mente, através de dois grandes braços de alavan- dose lombar, na posição de sentido por exemplo,
ca. Então, é suficiente contrair os dois glúteos ou no transporte de cargas pesadas na beira do
maiores e os dois retos abdominais para conse- alpendre ou saliente anterior.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 109

A B
Fig.3-51
110 FISIOLOGIA ARTICULAR

o TRONCO COMO ESTRUTURA INFLÁ VEL

Se na posição de inclinação para a frente cro e os discos da coluna lombar inferior (fig. 3-52
só considerarmos a ação dos músculos vertebrais B). De fato, se pode constatar que, durante os es-
(fig. 3-52), o cálculo das forças que se exercem so- forços de levantamento, se desenvolve instintiva-
bre o disco lombossacro demonstra que as forças mente uma "pressão abdominal". Em que consis-
são consideráveis. De fato, o peso da parte supe- te esta pressão abdominal também denominada
rior do tronco juntamente com a cabeça se aplica manobra de Valsalva? Simplesmente em que ela
no nível do centro de gravidade parcial (P) locali- associa o fechamento da glote e de todos os orifí-
zado justo na frente da décima dorsal. Este peso cios abdominais, transformando, assim, a cavida-
(P) recai na extremidade de um grande braço de de tóraco-abdominal numa cavidade fechada para
alavanca, cujo ponto fixo se situa no núcleo pulpo- a contração mantida dos músculos expiratórios e,
so de LS-Sj' Para equilibrar esta força, os múscu- especialmente, dos mlÍsculos abdominais. Deste
los vertebrais (E]), que agem sobre um braço de modo, a pressão aumenta notavelmente na cavida-
alav<:in",'ude 7 a 8 vezes mais curto, precisam de de tóraco-abdominal e a converte numa viga rígi-
uma força 7 a 8 vezes superior ao peso PI. Estas da situada na frente da coluna vertebral que trans-
forças podem ser reduzidas em função do ângulo mite as forças à cintura pélvica e ao períneo. A in-
de inclinação do tronco para a frente, que faz com tervenção desta estrutura inflável reduz bastante
que aumente o comprimento do braço de alavanca a compressão longitudinal nos discos: no disco
sobre o que age p]' De todos os modos, a força que TI2-LI ela decresce 50% e no disco lombossacro
se exerce sobre o disco lombossacro será igual à 30%. Por este motivo, a tensão dos músculos ver-
soma de p[ e de E[ e será mais acentuada quanto tebrais diminui 55%. Este mecanismo de hiper-
mais inclinado esteja o indivíduo para a frente e, pressão tóraco-abdominal é, portanto, muito útil
principalmente, considerando o peso que carrega para suavizar as forças que se exercem sobre a co-
nas mãos. luna vertebral; contudo, ele só age durante curtos
Calcula-se que para levantar uma carga de espaços de tempo. De fato, ele provoca uma ap-
10 kg, com os joelhos tlexionados e o tronco ver- néia absoluta e causa importantes alterações cir-
culatórias: hiperpressão no sistema venoso cefáli-
tical, a força E] desenvolvida pelos músculos ver-
tebrais seja de 141 kg. A mesma carga de 10 kg co, diminuição do retomo venoso ao coração, di-
levantada com os joelhos estendidos e o corpo in- minuição do volume de sangue contido nas pare-
des alveolares, aumento da resistência na circula-
clinado para a frente desenvolve uma força EI de
256 kg. Se esta mesma carga é levada com os bra- ção menor. Além disso, ele supõe a integridade
dos músculos da cinta abdominal e a possibilida-
ços estendidos para a frente, a força E] necessária
é de 363 kg. Neste momento, segundo os autores, de de um fechamento da glote e dos outros orifí-
a carga que o núcleo suporta oscilaria entre 282 e cios abdominais. Por último, a hiperpressão tóra-
726 kg podendo atingir os 1.200 kg, o que é niti- co-abdominal acompanha-se de uma derivação da
damente superior às cargas de ruptura dos discos circulação venosa de retomo pelos plexos venosos
vertebrais (800 kgantes dos 40 anos, 450 kg nos perivertebrais. Isto leva, por sua vez, a uma hi-
indivíduos de idade avançada). perpressão do líquido cefalorraquidiano. Esta si-
tuação não pode ser prolongada indefinidamente e
Dois fatos podem explicar esta aparente con- os esforços de levantamentos de cargas pesadas
tradição: por um lado, toda a força que se exerce só podem ser breves e intensos. Por conseguinte, a
sobre o disco intervertebral não é suportada unica- conclusão prática que se pode deduzir é que, para
mente pelo núcleo. Nachemson, determinando a diminuir a compressão nos discos intervertebrais,
pressão do interior do núcleo, demonstrou que, é preferível levantar as cargas com o tronco verti-
quando se exerce uma força sobre um disco, o nú- cal em vez de com o tronco inclinado para a fren-
cleo suporta 75% da carga e o anel 25%. te com um alpendre importante. Este é o conselho
Por outro lado, o tronco intervém em conjun- que deve ser dado aos indivíduos que sofrem de
to para suavizar a pressão sobre o disco lombossa- hérnias discais.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 111

FORÇAS SOBRE A CHARNEIRA LOMBOSSACRA


na posição de inclinação para a frente

Considerando a coluna
vertebral isolada

Coluna vertebral reforçada pelo tronco


ESTRUTURAINFLÁVEL

A compressão longitudinal diminui:


- 50% no disco T'2 -L,
- 30 % no disco LsS,
Fig.3-52 A tensão dos músculos vertebrais diminui 55%
112 FISIOLOGIA ARTICULAR

ESTÁTICA DA COLUNA LOMBAR EM POSIÇÃO ORTOSTÁTICA

Em apoio simétrico sobre os dois mem- (fig. 3-56), os músculos vertebrais são os pri-
bros inferiores, a coluna lombar, vista de perfil meiros a contrairem-se energicamente, depois
(fig. 3-53), apresenta, corno vimos anteriormen- os glúteos e, por último, os ísquio-tibiais e os só-
te, urna curvatura de concavidade posterior de- leos. No final da flexão, a coluna vertebral se es-
nominada lordose lombar. Vista de costas (fig. tabiliza unicamente pela ação passiva dos liga-
3-54), ela é retilínea; ao contrário, na posição mentos vertebrais (LR) que tornam a pelve co-
em apoio as simétrico (fig. 3-55) sobre um rno ponto fixo, cuja anteversão é retida pelos ís-
membro inferior, a coluna lombar apresenta quio-tibiais (IT).
urna concavidade para o lado do apoio, o que é Durante a retificação (fig. 3-57), os múscu-
devida a báscula da pelve, o quadril do lado do los intervêm na ordem inversa: em primeiro lu-
apoio está mais elevado que o quadril que não gar os ísquio-tibiais; em segundo lugar os glú-
suporta carga. Para compensar esta inflexão teos e em terceiro e último lugar, os lombares e
lombar, a coluna dorsal adota urna curvatura de os dorsais (E).
concavidade oposta, isto é, para o lado do mem-
Em posição ortostática retilínea (fig.
bro sem carga. Por último, a coluna cervical
3-58), o leve desequilíbrio para a frente é con-
adota uma curvatura de concavidade para o la-
trolado pela contração tônica dos músculos do
do do apoio; ou seja, no mesmo sentido da cur-
plano posterior, tríceps surais (T), ísquio-ti-
vatura lombar.
biais (IT), glúteos (G), músculos vertebrais
Os estudos eletrorniográficos de Brügger (E); os abdominais, pelo contrário, estão rela-
demonstraram que, durante a flexão do tronco xados (Asmussen).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 113

Fig.3-53 Fig.3-54 Fig.3-55

Fig.3-56 Fig.3-57 Fig.3-58


114 FISIOLOGIA ARTICULAR

POSIÇÃO SENTADA E DE DECÚBITO

N a posição sentada com apoio isquiático, o decúbito supino com os membros inferio-
na postura denominada da datilógrafa (fig. res estendidos (fig. 3-62) normalmente é a posição
3-59), sem apoio no espaldar, o peso do corpo mais usada para o repouso: a tração sobre o psoas
repousa unicamente sobre os ísquios, a pelve se provoca uma hiperlordose lombar e produz um oco
encontra em equilíbrio instável, solicitada em "debaixo dos rins".
anteversão, daí uma hiperlordose lombar e as Na posição de decúbito supino com os mem-
curvaturas dorsais e cervicais acentuadas: os
bros inferiores Bexionados (fig. 3-63), o relaxa-
músculos da cintura escapular, e especialmente mento dos psoas provoca uma retroversão pélvica e
o trapézio, que suporta a cintura escapular e os uma diminuição da lordose lombar: o "oco dos rins"
membros superiores, agem para manter a estáti- entra em contato com o plano de apoio, conseguin-
ca vertebral. A longo prazo, esta atitude causa do um melhor relaxamento dos músculos vertebrais
dores, conhecidas como a "síndrome das datiló- e abdominais.
grafas" ou síndrome dos trapézios.
Na posição denominada "relaxamento" (fig.
Na posição sentada com apoio ísquio-fe- 3-64), conseguida com almofadas ou assentos espe-
moral (fig. 3-60) denominada de cocheiro, o ciais, em que o plano de apoio torácico é côncavo,
tronco inclinado para a frente repousando com produz-se uma retificação da lordose lombar e da
os cotovelos sobre os joelhos, o apoio é obtido lordose cervical; um apoio debaixo dos joelhos fte-
através das tuberosidades isquiáticas e da face xiona os quadris, com o psoas e os ísquio-tibiais re-
posterior das coxas. A pelve está em anteversão laxados.
e o aumento da cifose dorsal provoca a retifica- Na posição de decúbito lateral (fig. 3-65), a
ção da lordose lombar. Se os membros superio- coluna vertebral segue uma curvatura sinuosa: con-
res agem como escoras, o tronco permanece es- vexidade lombar inferior, a linha das duas espinhas
tável com um mínimo esforço muscular e inclu- ilíacas póstero-superiores marcada pelas fossetas
sive é possível cair no sono. É uma posição de sacras e a linha dos ombros convergem por cima do
repouso dos músculos dos canais vertebrais, os indivíduo. A coluna dorsal apresenta uma curvatura
doentes afetados de espondilolistese adotam es- de convexidade superior. Com esta postura não po-
ta postura com freqüência, de maneira instinti- demos conseguir um relaxamento muscular geral e
va, visto que ela diminui o efeito de cisalhamen- ela pode provocar algumas dificuldades respirató-
to sobre o disco lombossacro e permite o relaxa- rias durante as anestesias.
mento dos músculos do plano posterior.
Quanto à posição de decúbito prono, ela tem
N a posição sentada com apoio ísquio-sa- todos os inconvenientes do decúbito dorsal (hiper-
cro (fig. 3-61), o tronco, totalmente girado para lordose lombar) agravados pelas dificuldades respi-
trás, repousa sobre o espaldar da cadeira e o ratórias devidas ao apoio sobre a caixa torácica e o
apoio se realiza com as tuberosidades isquiáti- abdome, que comprime a massa abdominal contra o
cas e a face posterior do sacro e do cóccix; a pel- diafragma, diminuindo o seu deslocamento e, final-
ve está em retroversão, a lordose lombar está re- mente, a possível obstrução das vias respiratórias
tificada, a cifose dorsal aumentada e a cabeça pelo plano de apoio, as secreções ou os corpos es-
pode cair para a frente sobre o tórax, ao mesmo tranhos. Contudo, muitas pessoas adotam esta pos-
tempo, a lordose cervical se inverte. Também é tura para dormir, embora a modifiquem em seguida.
uma posição de repouso que pode inclusive le- De maneira geral, uma mesma posição durante o so-
var ao sono, embora a respiração se torne difícil, no nunca se mantém durante muito tempo, a fim de
devido à flexão do pescoço e ao peso da cabeça permitir o relaxamento sucessivo de todos os grupos
sobre o esterno: esta posição reduz o desliza- musculares e, principalmente, o deslocamento dos
mento anterior de Ls e relaxa os músculos poste- pontos de apoio, visto que é sabido que permanecer
riores da coluna lombar, aliviando as dores da num mesmo ponto de apoio mais de três horas po-
espondilolistese. de produzir escaras por isquemia dos tegumentos.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 115

Fig.3-59

~~
Fig.3-60 Fig.3-62 ·:i,";~
.•.......• ••.

Fig.3-63

Fig.3-61

Fig.3-64

Fig.3-65
116 FISIOLOGIA ARTICULAR

AMPLITUDE DE FLEXÃO-EXTENSÃO DA COLUNA LOMBAR

As amplitudes de fiexão-extensão da colu- riormente. Por outra parte, a amplitude máxi-


na lombar variam dependendo dos indivíduos e ma de flexão-extensão se situa entre L4 e Ls:
da idade. Portanto, todas as cifras propostas são 24°, e a seguir, por ordem de amplitude decres-
casos particulares ou termos médios. Contudo, cente, vêm as interlinhas L3-L4 e LS-Sj todas
pode-se assumir (fig. 3-66): elas de 18° e, quase da mesma amplitude, as
- que a extensão, que se acompanha de interlinhas Lz-L3 de 12° e L[-LZ de 11°. Deste
urna hiperlordose lombar, tem urna am- modo, a coluna lombar inferior é, para estes
plitude de 30°; autores, muito mais móvel no plano da flexão-
extensão que a coluna lombar superior.
- que a flexão, que se acompanha de urna
retificação da lordose lombar, tem urna Corno seria de esperar, as amplitudes da
amplitude de 40°. flexãosão bem diferentes dependendo da idade
Os trabalhos de David e Albrook (fig. (fig. 3-67 B). Este quadro, segundo S.S. Tanz,
3-67 A) permitem conhecer a amplitude indi- permite constatar que a mobilidade da coluna
vidual de flexão-extensão em cada nível (colu- lombar decresce com a idade, sendo máxima en-
na da direita) e a amplitude total e acumulada tre os dois e os treze anos. A mobilidade máxi-
da flexão-extensão (coluna da esquerda): 83°; ma se situa na parte baixa do segmento lombar,
ou seja, bastante próxima dos 70° citados ante- principalmente no espaço L4-LS'
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 117

Fig.3-66

AMPLITUDE DE
FLEXÃO-EXTENSÃO
Total Individual

11

12

18

18

segundo DAVID e ALBROOK


J. Bone J. Surg.
B
A

Fig.3-67
118 FISIOLOGIA ARTICULAR

AMPLITUDE DE INCLINAÇÃO DA COLUNA LOMBAR

Como no caso da fiexão-extensão, a ampli- mente estável em torno dos 30° de 35 a 64 anos,
tude da infiexão lateral, também denominada depois diminui para 20°. Na idade média da vi-
inclinação, varia dependendo da idade e dos in- da, a amplitude total da infiexão entre a direita e
divíduos: contudo, pode-se afirmar (fig. 3-68) a esquerda é de 60°, o que é quase igual à ampli-
que, em média, a inclinação é de 20 a 30° de ca- tude total de fiexão-extensão da coluna lombar.
da lado. Não deixa de ser interessante destacar que a am-
S. Tanz estudou as amplitudes da inclina- plitude segmentária da inclinação no nível do
ção (fig. 3-69). Estas diminuem notavelmente disco LS-Sl é bastante limitada, visto que de 7°
com a idade, elas são máximas dos dois aos tre- na juventude diminui rapidamente a 2°, 1° e in-
ze anos, alcançando 62° de um lado e outro da clusive 0° em idade avançada. A amplitude má-
posição média; entre os 35 e os 49 anos, a am- xima se localiza entre L4-LS e, principalmente,
plitude é de apenas 31° de cada lado; diminui a entre L3 e L4 onde é de 16° na juventude para de-
29° entre os 50 e os 64 anos e a 22° entre os 65 pois permanecer relativamente estável ao redor
e 77 anos. Após ter sido muito importante até os dos 8° entre os 35 e os 64 anos e, por último, di-
treze anos, a infiexão lateral permanece relativa- minuir a 6° na idade senil.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 119

Fig.3-68

AMPLITUDE DE INCLINAÇÃO

DEPENDENDO DA IDADE
(segundo S.S: TANZ)

Fig.3-69
120 FISIOLOGIA ARTICULAR

AMPLITUDE DE ROTAÇÃO DA COLUNA DORSOLOMBAR

A amplitude de rotação segmentária e total de cada lado e, portanto, 1° de rotação em cada


na coluna lombar e na coluna dorsal, durante segmento em média. Na coluna dorsal, a rota-
muito tempo, foi uma grande incógnita. De fato, ção é notavelmente maior, porque alcança um
é muito difícil imobilizar a pelve e apreciar a ro- total, entre a rotação direita e a rotação esquer-
tação na extremidade dorsal da coluna vertebral, da, uma amplitude de 85° menos 10°, ou seja
visto que a cintura escapular é muito móvel so- 75°, e portanto, 37° de cada lado ou também, em
bre o tórax, podendo assim cometerem-se erros média, 3°4' de cada lado e por segmento. Obser-
facilmente. Foi necessário esperar os recentes var então que, apesar da presença da caixa torá-
trabalhos de 0.0. Oregersen e D.B. Lucas para cica, a rotação é quatro vezes maior na coluna
dispor de cifras viáveis. Estes autores decidiram dorsal em conjunto que na coluna lombar, noção
implantar agulhas metálicas sob anestesia local que se tratará mais adiante. A comparação das
em cada uma das apófises espinhosas da coluna duas curvaturas permite constatar que tanto na
dorsal e lombar para medir o seu deslocamento posição sentada como na posição ortostática, a
angular através de sensores eletrônicos altamen- amplitude total da rotação direita-esquerda é
te sensíveis. Assim, puderam medir a rotação da idêntica. Unicamente variam as proporções en-
coluna vertebral dorsolombar durante a marcha tre estas duas curvaturas; e especialmente a cur-
(fig. 3-70) e na sua amplitude total em posição vatura em posição ortostática mostra quatro
sentada e posição ortostática (fig. 3-71). pontos de inflexão, principalmente um ponto de
Durante a marcha (fig. 3-70), o lado es- inflexão na zona inferior da coluna lombar cuja
querdo do gráfico mostra que o disco Dj-DSper- rotação é mais ampla na citada posição. Parece
manece no lugar, enquanto a rotação é máxima que o mesmo acontece na zona de transição da
nas duas vértebras adjacentes (lado direito do chameira dorsolombar.
gráfico). Portanto, as maiores amplitudes de ro- Na prática, como é impossível implantar
tação se situam ao redor deste "espaço-pivô", di- agulhas nas apófises espinhosas dos indivíduos
minuindo em seguida, de maneira regular, para para medir a rotação da coluna vertebral dorso-
cima e para baixo, para reduzir-se notavelmente lombar, é necessário que nos contentemos com
na coluna lombar (0,3°) e na coluna dorsal supe- os antigos métodos clínicos; para o que é neces-
rior (0,6°). Portanto, a rotação da coluna lombar sário que o indivíduo esteja sentado (fig. 3-72),
é duas vezes menor que nas zonas menos móveis tentando que a linha dos ombros se mantenha es-
da coluna dorsal; vimos anteriormente as causas tável com relação ao tórax; daí se pede que ele
anatômicas desta limitação. realize uma rotação para um lado e depois para
Analisando a rotação total e máxima di- o outro, depois se mede o ângulo formado pela
reita-esquerda (fig. 3-71), Oregersen e Lucas linha dos ombros com o plano frontaL Neste ca-
põem em evidência uma leve diferença segundo so a amplitude é de 15 a 20°, embora não repre-
se tome a medida em posição sentada ou em po- sente a amplitude máxima de rotação unilateral
sição ortostática. A posição sentada dá amplitu- que, segundo Oregersen e Lucas, é de uns 45°.
des mais limitadas, visto que a pelve se imobili- Uma forma prática de fixar a cintura escapular
za com mais facilidade quando os quadris estão com respeito ao tórax consiste em situar os mem-
jlexionados. Quanto à coluna lombar isolada, a bros superiores horizontalmente sobre o cabo de
rotação total direita-esquerda para toda a coluna uma vassoura colocado nas costas no nível das
lombar é de apenas 10°, o que corresponde a 5° escápulas, marcando, assim, a linha dos ombros.
122 FISIOLOGIA ARTICULAR

o FORAME DE CONJUGAÇÃO E O COLO RADICULAR

É impossível terminar este capítulo de ana- vertebral (NE), situado em princípio no interior
tomia funcional da coluna lombar sem dar umas do saco dural (3), aproxima-se da parede medial
quantas noções sobre a fisiopatologia radicular deste (4) para perfurá-Ia no nível do colo radi-
muito abundante neste segmento vertebral. cular (5) que representa um ponto fixo, ponto de
Também são necessárias umas quantas no- passagem obrigatório do nervo vertebral onde fi-
ções de anatomia para compreender o mecanis- cará fixo pelo saco dural.
mo das lesões radiculares. Cada nervo vertebral Em vista superior (fig. 3-75), novamente se
(NE) sai do canal vertebral por um forame inter- encontram todas estas ligações entre o eixo ner-
vertebral (fig. 3-73). Este forame interverte- voso e o canal vertebral. A medula, envolvida
bral (2) (também chamado forame de conjun- pelo saco dural (4), está alojada no canal verte-
ção) é limitado pela frente pelo contorno poste- bral coberto pela frente pelo ligamento vertebral
rior do disco intervertebral (1) e a parte adjacen- comum posterior (12) e por trás pelo ligamento
te dos corpos vertebrais, abaixo, pelo pedículo amarelo (7). A face anterior das articulações in-
da vértebra subjacente (10); acima, pelo pedícu- terapofisárias (9) fica coberta por uma cápsula,
Ia da vértebra suprajacente (11); atrás, pelas ar- reforçada por um ligamento (8), por sua vez co-
ticulações interapofisárias (9), cobertas pela berto por um prolongamento do ligamento ama-
frente pela sua cápsula (8) e a margem lateral do relo (6). O nervo vertebral, que repousa sobre o
ligamento amarelo (6), que cobre a cápsula e pedículo da vértebra inferior, passa por um es-
avança levemente sobre o forame intervertebral. treito desfiladeiro entre o disco na frente, cober-
Na área do forame intervertebral, o nervo to pelo ligamento vertebral comum posterior, e a
vertebral deve perfurar o saco dural (fig. 3-74): articulação interapofisária atrás, coberta por um
esta vista em perspectiva mostra como o nervo prolongamento do ligamento amarelo.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 123

11
2
6
9
1
10

NE

Fig.3-73

12
Fig.3-74 4
10

9
7

Fig.3-75
124 FISIOLOGIA ARTICULAR

DIFERENTES TIPOS DE HÉRNIA DISCAL

Sob o efeito da pressão axial, a substância manecendo unida ao nÚcleo, pode ficar bloquea-
do núcleo pulposo pode fluir em diferentes dire- da debaixo do ligamento vertebral comum poste-
ções. Se as fibras do anel fibroso ainda forem re- rior (A); neste caso, ainda é viável a sua reinte-
sistentes, a hiperpressão pode provocar o afun- gração no compartimento do núcleo através de
damento dos platôs vertebrais. Trata-se então de trações vertebrais. Porém, com freqüência, ela
uma "hérnia intra-esponjosa" (fig. 3-76). afunda o ligamento vertebral comum posterior
Contudo, alguns estudos recentes demons- (B) e pode inclusive ficar livre no interior do ca-
nal vertebral. Trata-se da hérnia discal denomi-
traram que, a partir dos 25 anos, as fibras do anel
fibroso começam a se degenerar, podendo produ- nada "livre". Em outros casos, fica bloqueada
zir rasgaduras infrafasciculares entre as suas di- sob o ligamento vertebral comum posterior (C),
ferentes camadas. Então, sob a pressão axial, a e as fibras do anel fibroso se fecham detrás dela,
substância do núcleo poderia passar através das impedindo qualquer possibilidade de seu retor-
fibras do anel (fig. 3-77). Estas fugas de substân- no. E por último, outros casos que, após ter al-
cia nuclear podem ser concêntricas, embora cançado a face profunda do ligamento vertebral
amiÚde, sejam radiais. As fugas anteriores são as comum posterior, a hérnia pode deslizar para ci-
mais raras. Pelo contrário, as posteriores são ma, ou para baixo (D). Trata então de uma hér-
muito freqÜentes, principalmente no sentido pós- nia migratória subligamentar.
tero-Iateral. Deste modo, quando o disco se acha- Quando a hérnia discal alcança a face pro-
ta (fig. 3-78), uma parte da substância nuclear se funda do ligamento vertebral comum posterior,
difunde seja para a frente, seja para trás, poden- as suas fibras nervosas entram em tensão produ-
do atingir a margem posterior do disco e aflorar zindo dores lombares ou lombalgia; posterior-
debaixo do ligamento vertebral comum posterior mente, quando a hérnia comprime o nervo verte-
(fig. 3-79). Num primeiro momento, embora per- bral é a causa das radiculalgias.
3. TROKCO E COLUNA VERTEBRAL 125

Fig.3-76 A

Fig.3-77
c

Fig.3-78 Fig.3-79
126 FISIOLOGIA ARTICULAR

HÉRNIA DISCAL E MECANISMO DE COMPRESSÃO RADICULAR

Hoje parece, sem nenhuma dúvida, que a gamento anterior e pela parte lateral do liga-
hérnia discal se produz em três tempos (fig. 3- mento amarelo. A partir desse instante, a raiz
80). Todavia, a sua aparição só é possível se pre- comprimida vai manifestar o seu sofrimento
viamente o disco foi deteriorado por microtrau- com a aparição de dores nesse território e, in-
matismos repetidos e se, por outra parte, as fi- clusive, posteriormente, distúrbios dos reflexos
bras do anel fibroso começaram a se degenerar. (abolição do reflexo aquiliano se se tratar da
Em geral, a hérnia discal aparece após um esfor- compressão da raiz de S[ e distúrbios motores,
ço de levantamento de uma carga com o tronco na ciática paralisante).
inclinado para afrente: no primeiro tempo (A), Dependendo do nível onde a hérnia discal
a flexão do tronco para a frente diminui a altura
e a compressãô radicular se produzem, a sinto-
dos discos na sua parte anterior e entreabre o es-
matologia clínica será diferente (fig. 3-82):
paço intervertebral para trás. A substância nu-
quando a hérnia díscal se localiza no segmento
clear se projeta para trás, através das rasgaduras
L4-LS (1), ela comprime a quinta raiz lombar (Ls)
preexistentes do anel fibroso. No segundo tem-
e a radiculalgia correspondente afeta o seguinte
po (B), no início do esforço de levantamento, o
território: face póstero-lateral da coxa e do joel-
aumento da pressão axial achata todo o disco in-
tervertebral e desloca a substância do núcleo ho, face lateral da panturrilha, face dorsallateral
da garganta do pé e face dorsal do pé até o há-
violentamente para trás, que deste modo alcan-
luxo Quando a hérnia discal se localiza no seg-
ça a face profunda do ligamento vertebral co-
mento LS-Sl (2), comprime a primeira raiz sa-
mum posterior. No terceiro tempo (C), a retifi-
cral (SI) e a radiculalgia afetará a seguinte topo-
caçâo do tronco está praticamente finalizada, a
grafia: face posterior da coxa, do joelho e da
trajetória em ziguezague pela qual o pedículo da
panturrilha, calcanhar e margem lateral do pé até
hérnia discal passou se fecha novamente sob a
o quinto dedo. Contudo, é necessário corrigir es-
pressão dos platôs vertebrais e a massa consti-
tuída pela hérnia fica bloqueada debaixo do liga- ta sistematização, visto que a hérnia discal L4-LS
ao ficar mais perto da linha média pode compri-
mento vertebral comum posterior. Nesse preciso
momento é quando ocorre uma intensa dor na mir simultaneamente Lse S[ ou inclusive, às ve-
região lombar, normalmente denominada "dor zes, só SI' Se a exploração cirúrgica se limitar ao
de rins" e também lombalgia, que corresponde espaço LS-Sl pela topografia SI da radiculalgia,
ela corre o risco de não perceber a lesão situada
ao primeiro tempo da lombociatalgia. Esta lom-
no segmento superior.
balgia aguda inicial pode remitir espontanea-
mente, ou com tratamento, porém se se produ- a corte sagital (fig. 3-82) corrige o corte
zem episódios idênticos e repetidos, a hérnia transversal (fig. 3-81): de fato, neste último a
discal vai aumentar de volume e se protuirá ca- medula está representada. Na verdade, a medula
da vez mais para o canal vertebral, entrando, en- se detém no nível do cone terminal (CT), na se-
tão, em conflito com um dos nervos vertebrais, gunda vértebra lombar. Por baixo do cone termi-
uma das raízes do nervo isquiático (fig. 3-81). nal, dentro do saco dural, só existem raízes que
Por isso, a hérnia discal aparece geralmente na formam a "cauda eqüina" e que saem de duas
parte póstero-lateral do disco, no lugar onde o li- em duas pelos orifícios intervertebrais em cada
gamento vertebral comum posterior é menos es- nível. No nível de L4-LS'também existem quatro
pesso; deslocando progressivamente a raiz do pares de raízes no saco dural; no nível de LS-Sl'
nervo isquiático, até o momento que a parede as duas raízes de Ls saem para cima, de modo
, posterior do forame intervertebral a detém, isto que só ficam três pares de raízes no saco que ter-
é, a articulação interapofisária é coberta pela sua mina em forma de fundo de saco (D) na terceira
cápsula, que por sua vez é reforçada por um li- vértebra sacral.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 127

Fig.3-80

CT

Fig.3-81

Fig.3-82
128 FISIOLOGIA ARTICULAR

o SINAL DE LASEGUE

o sinal de Lasegue é uma dor provocada mente mais longo sobre a convexidade
pela tensão do nervo iSqlliático ou uma das suas de uma hérnia discal, uma elevação mo-
raízes. Se explora com o indivíduo em decúbito derada do membro inferior provocará
supino, elevando progressiva e lentamente o dor ao entrar em tensão. Trata-se do ver-
membro inferior estendido. A dor reproduz a dor dadeiro sinal de Lasegue que, geral-
isquiática que o doente sente de maneira espon- mente, aparece debaixo dos 60° de fle-
tânea; isto é, na topografia da raiz atingida. xão; de fato, acima dos 60° já não se tra-
Os trabalhos de Charnley demonstraram ta do sinal de Lasegue, porque a tensão
que as raízes se deslizam livremente através dos do nervo isquiático alcança o seu máxi-
forames intervertebrais e que no percurso da ele- mo aos'60°, Portanto, a dor ciática pro-
vação do membro inferior, com os joelhos esten- vocada pode aparecer numa elevação de
didos, as raízes se deslocam fora do forame inter- 10°, 15° oú 20° do membro inferior, o
vertebral num comprimento que pode alcançar que caracteriza um sinal de Lasegue a
12 mm no caso da quinta raiz lombar (fig. 3-87). 10, 15, 20 ou 30°, permitindo dar uma
Eis aqui como o sinal de Lasegue pode ser noção quantitativa.
interpretado: É necessário destacar um ponto em particu-
- quando o sujeito está em decúbito supi- lar: durante a elevação forçada do membro infe-
no, com os membros inferiores repou- rior com a perna estendida, a força da tração so-
sando sobre o plano de apoio (fig. 3-83), bre as raízes alcança 3 kg. Contudo, a resistên-
o nervo isquiático e suas raízes estão cia à tração destas raízes é de 3.200 kg. Se uma
perfeitamente distendidos; delas está bloqueada ou relativamente encurtada
por uma hérnia discal, uma manobra brusca po-
- quando o membro inferior se eleva com
de provocar uma ruptura dos axônios no interior
os joelhos flexionados (fig. 3-84), o ner-
da raiz, o que se traduz numa paralisia, com fre-
vo isquiático e as suas raízes ainda per-
manecem distendidos; qüência transitória, mas às vezes de regressão
lenta. Disto derivam-se duas precauções:
- porém, se o joelho se estende ou o mem-
bro inferior se eleva progressivamente - por um lado, realizar a manobra de La-
com os joelhos estendidos (fig. 3-85), o segue sempre com suavidade e com pre-
nervo isquiático é obrigado a percorrer caução, e deter a elevação do membro
um trajeto mais longo e conseqüente- enquanto a dor apareça;
mente é submetido a uma tensão cres- ~ por outro lado, não realizar jamais esta
cente. No indivíduo normal, as raízes se manobra sob anestesia geral, visto que
deslizam livremente pelo forame inter- a dor não pode indicar a interrupção do
vertebral e esta manobra não é dolorosa, movimento. Isto pode acontecer ao co-
só aparece dor na parte posterior da co- locar o paciente para a operação de hér-
xa no final da elevação, quando o mem- nia discal, quando em decúbito supino
bro inferior se aproxima da vertical (fig. se flexionam os quadris deixando os
3-86), devido à tensão dos músculos ís- joelhos estendidos. O cirurgião deve co-
quio-tibiais nos sujeitos que não têm locar sempre pessoalmente o seu pa-
muita flexibilidade. Trata-se de umfalso ciente e vigiar que a flexão de quadris se
sinal de Laseglle; acompanhe simultaneamente de uma
- ao contrário, quando uma das raízes fica flexão de joelhos, distende~do então o
bloqueada no forame intervertebral, ou nervo isquiático e preservando a raiz
quando deve percorrer um trajeto leve- bloqueada.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 129

~~~ ~ ';: -~ ~ ~_ [- --:: Fig.3-83

Fig.3-84

Fig.3-85

Fig.3-87
130 FISIOLOGIA ARTICULAR
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 131
132 FISIOLOGIA ARTICULAR

A VÉRTEBRA TORÁCICA PADRÃO E A DÉCIlVIA SEGUNDA TORÁCICA

A vértebra torácica padrão (fig. 4-2) é união das lâminas e dos pedículos, nas apófises
composta das mesmas partes que a vértebra articulares, se implantam as apófises transver-
lombar; contudo, existem grandes diferenças sas (9 e 11); que se dirigem para fora e leve-
morfológicas e funcionais. mente para trás, e apresentam uma extremidade
Numa vista "desarmada" (fig. 4-1), se pode livre e grossa, que contém uma face articular de-
reconhecer o corpo vertebral (1) cujo diâmetro nominadafóvea costal (10), na sua face anterior,
transversal é quase igual ao diâmetro ântero- que corresponde à tuberosidade costa!. As duas
posterior. Ele também é proporcionalmente mais lâminas se unem na linha média e originam uma
alto que o corpo das vértebras lombares; o seu apófise espinhosa (12), volumosa, longa e bas-
contorno anterior e lateral é muito escavado. Na tante inclinada para baixo e para trás, com só um
tubérculo no seu vértice.
parte póstero-lateral dos platôs vertebrais pode-
se observar uma face oval, talhada obliquamen- A associação de todos estes elementos for-
te e recoberta de cartilagem: se trata da fóvea ma a vértebra torácica padrão (fig. 4-2).
costal que vamos tratar mais adiante com as ar- A última vértebra torácica (décima segun-
ticulações costovertebrais. Na parte póstero-Ia- da torácica), vértebra de transição com a coluna
teral do corpo vertebral se implantam os dois pe- lombar, apresenta algumas particularidades:
dículos (2 e 3), a fóvea costal superior ultrapas-
sa, com freqüência, a raiz do pedículo. Por trás - em primeiro lugar, o seu corpo vertebral
deste, se implantam as lâminas vertebrais (4 e 5) só possui duas faces costais situadas na
que constituem a maior parte dos arcos posterio- parte póstero-Iateral do platá superior,
res. Estas lâminas são mais altas que largas e es- em direção à cabeça da décima segunda
tão inclinadas como se fossem telhas; perto do costela;
pedículo, a sua margem superior dá origem às - em segundo lugar, se as apófises articu-
apófises articulares superiores (6 e 7), que pos- lares superiores estão orientadas como
suem uma face articular ovalada, plana ou leve- as de todas as vértebras torácicas, para
mente convexa, recoberta transversalmente de trás e levemente para cima e para fora, as
cartilagem, orientada para trás, levemente para faces articulares devem corresponder às
cima e para fora; na parte inferior das lâminas, faces superiores da primeira vértebra
sempre perto do pedículo, se implantam as apó- lombar. Portanto, a direção é a mesma
fises articulares inferiores, das que só se pode que a das faces inferiores de todas as
apreciar aqui o processo direito (8). Na sua face vértebras lombares; isto é, orientadas
anterior elas apresentam uma face articular oval, parafora e para afrente e com uma cur-
plana ou levemente côncava, orientada trans- vatura transversal levemente convexa
versalmente para a frente e levemente para bai- que se inscreve numa mesma superfície
xo e para dentro. Estas faces se articulam com cilíndrica, cujo eixo se situa aproxima-
as faces superiores da vértebra subjacente. Na damente na origem da apófise espinhosa.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 133

11

6
5

12 8

10

Fig.4-1

Fig.4-2

Fig.4-3
134 FISIOLOGIA ARTICULAR

FLEXÃO-EXTENSÃO E INFLEXÃO LATERAL DA COLUNA TORÁCICA

o movimento de extensão entre duas vér- guIo igual ao ângulo de inclinação (i) com a
tebras torácicas (fig. 4-4) se acompanha de uma linha das apófises transversas nn' da vértebra
inclinação para trás do corpo vertebral da vérte- subjacente; a limitação do movimento está de-
bra superior. Simultaneamente, o disco inter- terminada, por um lado, pelo ressalto ósseo das
vertebral se estreita por trás e se alarga pela apófises articulares do lado da concavidade e,
frente que, como no caso da coluna lombar, ele por outro, pela tensão dos ligamentos amarelo e
projeta o núcleo pulposo para a frente. A limita- intertransverso do lado da convexidade.
ção do movimento de extensão está determina- Contudo: seria um erro considerar os movi-
da pelo ressalto das apófises articulares (1) e mentos da coluna torácica unicamente no nível
das apófises espinhosas (2), que estão bastante das vértebras; de fato, a coluna torácica se arti-
inclinadas para baixo e para trás, praticamente cula com a caixa torácica (fig. 4-7) e todos os
em contato. Por outro lado, o ligamento verte- elementos ósseos, cartilaginosos e articulares da
bral comum anterior (3) entra em tensão en- caixa torácica intervêm para dirigir e limitar os
quanto o ligamento vertebral comum posterior, movimentos isolados da coluna vertebral. Isto é
os ligamentos amarelos e os ligamentos interes- correto porque no cadáver se pode comprovar
pinhais se distendem. que a coluna torácica isolada tem uma maior
Já o movimento de ftexão entre duas vérte- mobilidade que quando ela está unida com a cai-
bras torácicas (fig. 4-5) se acompanha de uma xa torácica. Portanto, é necessário estudar as re-
abertura posterior do espaço intervertebral, com percussões que os movimentos realizados na co-
deslocamento do núcleo para trás. As superfícies luna torácica têm no tórax.
articulares das apófises articulares se deslizam Durante a inftexão lateral da coluna to-
para cima, e as apófises inferiores da vértebra su- rácica (fig. 4-8), do lado da convexidade da co-
perior têm a tendência de ultrapassar as apófises luna, o tórax se eleva (1), os espaços intercostais
superiores da vértebra inferior por cima. O movi- se alargam (3), o tórax se dilata (5) e o ângulo
mento de flexão fica limitado pela tensão do li- condrocostal da décima costela tem a tendência
gamento interespinhal (4), dos ligamentos ama- de se abrir (7). Do lado da concavidade da cur-
relos e das cápsulas das articulações interapofi- vatura da coluna, se observam os fenômenos in-
sárias (5) e pela do ligamento vertebral poste- versos: o tórax desce (2) e se retrai (6), enquan-
rior (6). Pelo contrário, o ligamento vertebral co- to os espaços intercostais se reduzem (4) e o ân-
mum anterior está distendido. gulo condrocostal se fecha (8).
O movimento de inclinação de duas vérte- Durante o movimento de ftexão da colu-
bras torácicas (fig. 4-6, vista posterior) se acom- na torácica (fig. 4-9), se abrem todos os ângu-
panha por um deslizamento diferente nas articu- los que articulam os diferentes segmentos do tó-
lações interapofisárias: do lado da convexidade, rax entre si e com a coluna vertebral: ângulo
as faces se deslizam como na ftexão, ou seja, pa- costovertebral (1), ângulo esternocostal superior
ra cima; do lado da concavidade, as faces se des- (2) e inferior (3) e ângulo condrocostal (4). Pelo
lizam como na extensão, ou seja, para baixo. A contrário, durante o movimento de extensão to-
linha das apófises transversas mm' forma um ân- dos estes ângulos se fecham.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 135

Fig.4-5
Fig.4-4
(i)

Fig.4-7
Fig.4-6

Fig.4-8 Fig.4-9
136 FISIOLOGIA ARTICULAR

ROTAÇÃO AXIAL DA COLUNA TORÁCICA

Como se realiza a rotação elementar de costal e, principalmente, condral. As citadas


uma vértebra sobre a outra na coluna torácica? deformações são as seguintes:
É bastante diferente da rotação na coluna lom- - aumento da concavidade costal do lado
bar. De fato (fig. 4-10), as articulações interapo- da rotação (1);
fisárias têm uma orientação totalmente diferen-
te. A interlinha também está incluída numa su- - diminuição da concavidade costal do la-
perfície cilíndrica, mas o eixo deste cilindro se do oposto (2);
situa aproximadamente no centro dos corpos - aumento da concavidade condrocostal
vertebrais (O). Durante a rotação de uma vérte- do lado oposto ao da rotação (3);
bra sobre a outra, o deslizamento das superfícies
- diminuição da concavidade condrocos-
nas apófises articulares se acompanha de uma
tal do lado da rotação (4).
rotação de um corpo vertebral sobre o outro, so-
bre o seu eixo comum; portanto, de uma rota- Por conseguinte, no percurso deste movi-
ção-torção do disco intervertebral e não de um mento, o esterno é submetido a forças de ci-
cisalhamento como é o caso na coluna lombar. salhamento e tem a tendência a se dirigir obli-
A rotação-torção do disco pode ter uma ampli- quamente de cima para baixo para seguir a rota-
tude maior do que o seu cisalhamento: a rotação ção dos corpos vertebrais. Contudo, esta obli-
elementar entre duas vértebras torácicas é, ao qüidade não deve ser muito pronunciada e é pra-
menos, três vezes maior que entre duas vérte- ticamente inapreciável na observação clínica;
bras lombares. radiologicamente também é muito difícil de se
evidenciar devido às superposições.
Contudo, esta rotação seria ainda maior se
a coluna torácica não estivesse estreitamente A resistência mecânica do tórax intervém,
unida ao tórax ósseo. De fato, cada segmento então, para limitar notavelmente a amplitude dos
vertebral arrasta o seu par de costelas corres- movimentos da coluna torácica; enquanto o tó-
pondente (fig. 4-11), mas o deslizamento de rax é flexível, como é o caso das pessoas jovens,
um par de costelas sobre o par subjacente está os movimentos da coluna torácica são muito
limitado pelo esterno, com o qual se articulam amplos mas, pelo contrário, quando com a idade
todas as costelas através das cartilagens cos- as cartilagens costais se ossificam e a elasticida-
tais. A rotação de uma vértebra estará acom- de condrocostal diminui, o tórax constitui um
panhada por uma deformação do par de coste- bloco quase rígido, com amplitudes que dimi-
las associadas à vértebra, graças à elasticidade nuem proporcionalmente.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 137

Fig.4-11

Fig.4-10
138 FISIOLOGIA ARTIClJLAR

AS ARTICULAÇÕES COSTOVERTEBRAIS

Em cada segmento da coluna torácica, um (13). A articulação costovertebral está reforçada


par de costelas se articula com as vértebras atra- por um ligamento radiado no qual se distinguem
vés de duas articulações por costela: a articula- três feixes: umfeixe superior (14) e umfeixe in-
ção costovertebral entre a cabeça costal e o dis- ferior (15), que se inserem no corpo das vérte-
co intervertebral e os corpos vertebrais; e a arti- bras adjacentes e umfeixe médio (16), que se in-
culação costotransversal entre a tuberosidade sere no anel fibroso (2) do disco intervertebral.
costal e a apófise transversa da vértebra subja- A articulação costotransversal também é
cente.
uma artródia constituída por duas faces ovala-
Numa vista de perfil (fig. 4-12), uma das das: uma no vértice da apófise transversa (18) e
costelas foi separada após terem sido secciona- a outra na tubérosidade costal (19). Esta articu-
dos os diferentes ligamentos, permitindo assim lação se completa com uma cápsula (20), mas
observar as superfícies articulares do lado verte- ela é especialmente reforçada por três ligamen-
bral. No segmento inferior, a costela permanece tos costotransversais:
no seu lugar com os seus ligamentos. - o ligamento costotransversal interósseo
Em vista superior (fig. 4-13), a costela do (23), bastante curto e resistente, que se
lado direito permanece no seu lugar, embora as estende da apófise transversa até a face
articulações estejam abertas; do lado esquerdo a posterior do colo da costela;
costela foi separada, depois de se seccionarem - o ligamento costotransversal posterior
os seus ligamentos. (21), banda retangular de 1,5 cm de
O corte vértico-frontal (fig. 4-14) passa pe- comprimento por 1 cm de espessura,
la articulação entre a cabeça costal e os corpos que se estende do vértice da apófise
vertebrais. Do lado oposto a costela foi separada transversa até a parte lateral da tuberosi-
depois de ter sido realizada a secção ligamentar. dade costal;
Descreveremos os elementos de maneira - o ligamento costotransversal superior
simultânea nas três figuras, cujos números de re- (24), bastante espesso e resistente, plano
ferência são comuns. e quadrilátero, de 10 mm de compri-
mento por 8 mm de espessura, que se es-
A articulação costovertebral é uma dupla tende da margem inferior da apófise
artródia; constituída do lado vertebral por duas transversa até a margem superior do co-
fóveas costais, uma na margem superior da vér- lo da costela subjacente.
tebra inferior (5), e a outra na margem inferior
da vértebra superior (6). Elas formam, entre si, Além disso, se descreve um ligamento cos-
um ângulo diedro perfeitamente visível no corte totransversal inferior que ocupa a face inferior
(fig. 4-14), cujo fundo está ocupado pelo anel fi- da articulação costotransversal.
broso do disco intervertebral. As superfícies co- Nestas figuras também se podem distinguir
rrespondentes da cabeça costal (12) são leve- os detalhes do disco intervertebral com o núcleo
mente convexas e formam, entre si, o mesmo ân- pulposo (1) e o anel fibroso (2), as articulações
gulo diedro que encaixa exatamente no das faces interapofisárias com as suas faces articulares (3)
vertebrais. e as suas cápsulas (4).
Um ligamento interósseo (8), que se origi- Em resumo, a costela se articula com a co-
na no vértice da cabeça costal entre as duas fó- luna vertebral através de duas artródias: uma
veas articulares, se fixa no disco intervertebral e artródia simples, a articulação costotransversal,
separa esta articulação, recoberta por uma cáp- e uma artródia dupla encaixada de forma mais
sula articular Única (9), em duas cavidades arti- sólida, a articulação costovertebral; ambas dota-
culares diferentes, uma superior e uma inferior das de potentes ligamentos.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 139

22 21 19 18 20

21
17
18

23

3
3
9
5
17 5
18 16

24 1

6
2
8
4
5
23
18 Fig.4-13
21 14
24
16
10
15
22

6 18
24
6
8
23
9
5

Fig.4-14
140 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS DAS COSTELAS AO REDOR


DAS ARTICULAÇÕES COSTOVERTEBRAIS

A articulação costovertebral, por um lado, deslocado para fora numa longitude l, que re-
e a articulação costotransversal, por outro, for- presenta o aumento do semidiâmetro transver-
mam um par de artródias mecanicamente uni- sal da base do tórax.
das (fig. 4-15), cujo movimento comum so- Pelo contrário, as costelas superiores (fig.
mente pode ser uma rotação ao redor de um ei- 4-15, lado direito da figura) se articulam através
xo que passe pelo centro de cada uma destas de um eixo yy' situado quase num plano frontal:
duas artródias. Assim, se pode descrever um o movimento de elevação da costela provoca um
eixo xx' que une o centro O da articulação cos- aumento bastante acentuado do diâmetro ântero-
totransversal com o centro O' da articulação posterior do tórax (a).
costovertebral. Ele serve de charneira para a
costela que, deste modo, fica "suspensa" na co- De fato (fig. 4-16), quando a extremidade
luna vertebral por dois pontos O e O'. A orien- anterior da costela eleva-se a uma altura h, ela
tação deste eixo com relação ao plano sagital descreve um arco de círculo que a desloca numa
determina a direção do movimento costal: nas longitude a para a frente.
costelas inferiores (lado esquerdo da figura) o Portanto, se pode concluir que durante a
eixo xx' se aproxima do plano sagital e, conse- elevação das costelas aparecem um aumento do
qüentemente, o movimento de elevação da cos- diâmetro transversal do tórax inferior e um au-
tela provoca, especialmente, um aumento do mento do diâmetro ântero-posterior do tórax su-
diâmetro transversal do tórax (1). De fato (fig. perior. Na parte média do tórax onde o eixo das
4-17), quando a costela gira ao redor deste ei- articulações costovertebrais se localiza aproxi-
xo, ela descreve um arco de círculo de centro madamente numa direção oblíqua a 45°, o au-
O; a sua obliqüidade diminui, e, ao tornar-se mento do diâmetro se produz tanto no sentido
mais transversal, o seu ponto mais lateral fica transversal quanto no sentido ântero-posterior.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 141

Fig.4-15

Fig.4-17

)
h

Fig.4-16
142 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOVIMENTOS DAS CARTILAGENS COSTAIS E DO ESTERNO

Até aqui consideramos somente o movi- neamente, o esterno se eleva e a cartilagem cos-
mento das costelas ao redor das articulações tal adota uma direção mais horizontal formando
costovertebral e costotransversal, mas também um ângulo a com sua posição inicial. Este movi-
se devem observar os movimentos das costelas mento angular da cartilagem costal com relação
com relação ao esterno e às cartilagens costais. ao esterno se realiza na articulação condroester-
Se compararmos uma vista superior do movi- na!. Além disso, ao mesmo tempo, se produz um
mento das costelas (fig. 4-18) com uma vista an- outro movimento angular na articulação con-
terior deste mesmo movimento (fig. 4-19), cons- drocostal. Mais adiante vamos falar disso.
tatamos que, enquanto a parte mais lateral da
costela se eleva a uma altura h' e se separa do ei- Durante a elevação da costela (fig. 4-18, la-
xo do corpo a um comprimento I, a extremidade do direito), o ponto m que produz o maior au-
anterior da costela se eleva a uma altura h e se mento de volume do diâmetro torácico é o mais
separa do plano de simetria a um comprimento afastado do eixo xx' . Esta constatação geométri-
l', sendo estes dois últimos comprimentos leve- ca explica o deslocamento do ponto m sobre a
mente maiores que os dois primeiros. Simulta- costela quando a obliqüidade do eixo xx' varia.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 143

Fig.4-18

Fig.4-19

----

r--
..
144 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS DEFORMAÇÕES DO TÓRAX NO PLANO SAGITAL


DURANTE A INSPIRAÇÃO

Se imaginarmos a coluna vertebral imutá- nal da cartilagem costal (ver pág. 164);
vel durante o movimento de inspiração (fig. 4- - quanto à décima costela, ela também
20) e considerando somente, por um lado, o pen- realiza um movimento de elevação ao
tágono deformável composto pela coluna verte- redor do seu centro (Q) e sua extremida-
bral e, por outro, a primeira costela, o estemo, a de anterior descreve um arco de círculo
décima costela e sua cartilagem costal, se po- CC';
dem constatar as seguintes deformações:
- neste movimento da décima costela e
- a primeira costela móvel ao redor da sua do estemo, a décima cartilagem costal
articulação costovertebral (O) se eleva e
a sua extremidade anterior descreve um passa da posição CB à posição C'B'
permanecendo aproximadamente para-
arco de círculo AA';
lela a si mesma. Isto determina, por
--esta elevação da primeira costela produz uma parte, o aumento do ângulo em C'
uma elevação do esterno, que passa da de um valor equivalente ao ângulo c
posição AB à posição A'B'; (observar que este ângulo c é igual ao
- neste movimento, o esterno não está ângulo C'QC, ou seja, ao ângulo de
exatamente paralelo a si mesmo, visto elevação da décima costela). Por outro
que, como vimos anteriormente, na lado, aparece um leve aumento do ân-
parte superior do tórax o diâmetro ân- gulo C'B' A' que corresponde à articu-
tero-posterior aumentava mais que na lação da décima cartilagem costal com
parte inferior. Disto se deduz que o ân- o estemo. Também neste caso, a aber-
gulo que formava com a vertical (ângu- tura do ângulo se produz graças a uma
lo a) se fecha levemente e simultanea- rotação da cartilagem sobre o seu eixo
mente se pode observar como o ângulo longitudinal. No nível de cada cartila-
OA'B' se fecha também levemente en- gem se produz uma rotação longitudi-
tre a primeira costela e o estemo. Este nal idêntica. Mais adiante analisaremos
fechamento do ângulo estemocostal se a sua utilidade com a elasticidade do
acompanha de uma rotação longitudi- tórax.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 145

8'

c
Fig.4-20
146 FISIOLOGIA ARTICULAR

MECANISMO DOS MÚSCULOS INTERCOSTAIS


E DO MÚSCULO TRIANGULAR DO ESTERNO

Numa vista posterior do tórax e da coluna ção das costelas e, portanto, se trata de
vertebral (fig. 4-21) se pode constatar a existên- um músculo inspirador;
cia de três tipos de fibras musculares:
- a ação dos intercostais internos (fig. 4-
- os pequenos músculos supracostais 23) se entende de maneira análoga, mas
(5), que, procedentes do vértice da apó- desta vez o músculo tem urna direção
fise transversa finalizam na margem su- paralela à pequena diagonal do paralelo-
perior da costela subjacente. Quando se grama. Quando o intercostal interno se
contraem, elevam esta costela; contrai (I), esta diagonal O' Aj diminui
- os músculos intercostais externos (E) um comprimento r', o que levará AI até
cujas fibras oblíquas para cima e para Az e BJ até Bz, sempre no suposto de que
dentro têm uma direção paralela à das,fi- o lado 00' permaneça imutável. A con-
bras do músculo supracostal. Estes mús- tração do intercostal interno produz a
culos intercostais externos são, como o descida das costelas e, portanto, se trata
supracostal, elevadores das costelas e de um músculo expirador. Parece que es-
portanto, inspiradores; te esquema de Hamberger, apesar de ter
- os músculos intercostais internos (I), sido contradito pelas experiências de ex-
cujas fibras são oblíquas para cima e pa- citação elétrica de Duchenne de Boulog-
ra fora, produzem a descida das costelas ne, se considera válido atualmente gra-
e portanto, a expiração. ças aos trabalhos eletromiográficos.
O esquema de Hamberger explica perfei- O triangular do esterno é um músculo ge-
tamente o mecanismo de ação dos músculos in- ralmente pouco estudado e normalmente es-
tercostais: quecido pela sua localização retroesternal (fig.
4-24). De fato, ele está totalmente situado na
-- a ação dos intercostais externos (fig. 4-
22) se entende quando se constata que a face posterior do esterno e as suas fibras, que
direção de suas fibras é a da grande dia- se inserem nas cartilagens da segunda à sexta
gona! do paralelograma OO'BA que as costelas, são oblíquas para baixo e para dentro.
costelas articuladas formam com a colu- A contração dos seus cinco feixes determina a
na vertebral e o esterno. Quando o inter- descida, com relação ao esterno, das cartila-
costal externo (E) se contrai, esta diago- gens costais correspondentes. Contudo, se po-
nal diminui um comprimento r, defor- de ver (fig. 4-19) que durante a inspiração a
mando o paralelo grama e, supondo que cartilagem costal se eleva e que, pelo contrá-
00' permaneça fixo, produz a rotação de rio, ela desce durante a expiração. Isto permi-
AI em Az e de BI em Bz: a contração do te deduzir que o triangular do esterno é um
intercostal externo provoca uma eleva- músculo expirador.

I-
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 147

Fig.4-21

o o

O' O'

Fig.4-22 Fig.4-23
148 FISIOLOGIA ARTICULAR

o DIAFRAGMA E O SEU MECANISMO

o diafragma forma uma cúpula músculo- do medias tino e, especialmente, a presença da


aponeurótica que fecha o orifício inferior do tó- massa das vísceras abdominais limitam este
rax e separa o tórax do abdome. Uma vista de descenso do centro frênico. A partir deste ins-
perfil (fig. 4-25) mostra como esta cúpula vai tante (fig. 4-27), o centro frênico se converte em
mais baixo por trás que pela frente e seu ponto ponto fixo (grande seta branca) e as fibras mus-
mais elevado está constituído pelo centro frêni- culares, que agem a partir da periferia do centro
co (1). Neste centro se originam os feixes de fi- frênico (seta branca pequena), passam a ser as
bras musculares (2) que se dirigem radialmente que elevam as costelas inferiores. De fato, se o
em direção ao contorno do orifício inferior do ponto P é considerado como fixo e a costela gi-
tórax e se inserem na face medial das cartilagens ra ao redor do centro O, o seu extremo descreve-
costais, nas extremidades da décima primeira e rá um arco de círculo AB enquanto a fibra mus-
da décima segunda costelas, nos arcos que unem cular correspondente vai encurtar-se a uma dis-
as extremidades das três últimas costelas e, por tância A'B. Ao elevar as costelas inferiores, o
último, na coluna vertebral, no nível dos corpos diafragma alarga o diâmetro transversal do tó-
vertebrais, por uns pilares (pilar esquerdo 3 e pi- rax inferior, mas, simultaneamente, através do
lar direito 4), nos arcos do psoas (7) e nos arcos estemo, eleva também as costelas superiores e,
do quadrado lombar(8). Isto pode ser apreciado conseqüentemente, alarga o diâmetro ântero-
muito melhor em vista anterior (fig. 4-26), onde posterior. Portanto, se pode afirmar que o dia-
se distinguem a face convexa do diafragma, na fragma é um músculo primordial da respiração,
parte superior da figura, e sua face côncava no visto que, por si mesmo, alarga os três diâme-
nível dos pilares. Também se podem distinguir tros do volume torácico:
os orifícios por onde passam o esôfago (6) aci- - alargamento do diâmetro vertical por
ma e a aorta (5) abaixo. Contudo, nestas figuras descenso do centro frênico;
não se visualiza o orifício da veia cava inferior
visto que não está representado. - alargamento do diâmetro transversal por
elevação das costelas inferiores;
Quando as fibras musculares do diafragma
se contraem, o centro frênico desce: deste mo- - alargamento do diâmetro ântero-poste-
do o diâmetro vertical do tórax se alarga, po- rior por elevação das costelas superiores
através do estemo.
dendo ser, o diafragma, comparado com um
êmbolo que se desliza no interior de uma bom- Assim, pode-se compreender a importância
ba. Contudo, a entrada em tensão dos elementos do diafragma na fisiologia da respiração.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 149

Fig.4-25 Fig.4-26

T9

o
Fig.4-27
[J
150 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS DA RESPIRAÇAo

Depois do que estudamos anteriormente, xo por cima e se inserem abaixo nos seis
podemos deduzir que os músculos da respiração primeiros arcos costais, deste modo,
podem ser classificados em duas categorias. Por eles têm uma disposição semelhante à
um lado, os músculos da inspiração, que ele- dos músculos supracostais de grande
vam as costelas e o estemo e, por outro, os mús- comprimento.
culos da expiração, que fazem baixar as coste-
Terceiro grupo: os músculos principais
las e o estemo. Além disso, nestas duas catego-
da expiração; Este grupo só está representado
rias se distinguem dois grupos, os mÚsculos
principais e os músculos acessórios, embora es- pelos músculos intercostais internos. De fato, a
tes últimos só ajam durante movimentos anor- expiração normal é um fenômeno puramente
malmente amplos ou potentes. passivo de retomo do tórax sobre si mesmo pela
simples elasticidade dos elementos ósteo-carti-
Então, podem-se distribuir os músculos da laginosos e do parênquima pulmonar. Portanto,
respiração em quatro grupos:
a energia necessária para a expiração é, na ver-
Primeiro grupo: os músculos principais dade, uma restituição da energia desenvolvida
da inspiração: são os intercostais externos e os na inspiração pelos músculos inspiradores e que
supracostais e, especialmente, o diafragma. é armazenada no nível dos elementos elásticos
Segundo grupo: os músculos acessórios do tórax e do pulmão. Mais adiante veremos o
da inspiração (figs. 4-28, 4-29 e 4-30): papel essencial que as cartilagens costais desem-
- os esternocleidomastóideos (1), os esca- penham neste mecanismo. Observar também
lenos anteriores (2), médios (3) e poste- que, na posição vertical, a gravidade intervém
riores (4); todos estes músculos somen- de maneira importante para fazer com que as
te são inspiradores quando tomam como costelas baixem pelo seu próprio peso.
ponto fixo a coluna cervical rígida pela Quarto grupo: os músculos acessórios da
ação de outros músculos (fig. 4-28); expiração. Não por ser acessórios, estes múscu-
- o peitoral maior (4) e o peitoral menor los deixam de ser importantes, nem extrema-
(5), quando estes dois músculos (fig. mente potentes, visto que condicionam a expi-
4-30) tomam a cintura escapular como ração forçada e o esforço abdominal.
ponto fixo e os membros superiores Os músculos abdominais (fig. 4-30), o reto
estão em abdução; abdominal (7), o oblíquo externo (8) e o oblíquo
- os feixes inferiores do serrátil anterior interno (9) fazem o orifício inferior do tórax bai-
(6) e do grande dorsal (10) quando ele xar com força.
toma os membros superiores, previa-
Na região tóraco-lombar (fig. 4-29) se en-
mente abduzidos, como ponto fixo;
contram outros músculos acessórios da expira-
- o serrátil menor posterior e superior (11); ção: a porção inferior do músculo sacrolombar
- as fibras superiores do sacrolombar (13), o grande dorsal (14), o serrátil menor pos-
(12), que tomam as cinco últimas apófi- terior e inferior (15) e o quadrado lombar (não
ses transversas cervicais como ponto fi- representado aqui).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 151

Fig.4-28

Fig.4-29

Fig.4-30
152 FISIOLOGIA ARTICULAR

RELAÇÃO DE ANTAGONISMO-SINERGIA ENTRE O DIAFRAGMA


E OS MÚSCULOS ABDOMINAIS

Já vimos previamente que o diafragma é um músculos abdominais por poliomielite, em que a


músculo inspirador e inclusive o principal mús- eficácia ventilatória do diafragma está diminuí-
culo inspirador e que, por outro lado, os múscu- da. Na vista de perfil (fig. 4-31), a direção das fi-
los abdominais são músculos expiratórios aces- bras dos músculos largos forma o desenho de
sórios extremamente potentes, visto que são ca- uma estrela de s~is pontas.
pazes de produzir a expiração forçada. Pois bem, Durante a expiração (fig. 4-32, vista de
estes mÚsculos que parecem ser antagonistas perfil e figo4-34, vista de frente), o diafragma se
são, ao mesmo tempo, sinergistas. Especialmen- relaxa, e a contração dos abdominais faz baixar
te, se pode dizer que a ação do diafragma seria o orifício inferior do tórax, diminuindo simulta-
muito menor se os abdominais não existissem.
neamente os diâmetros transvérsal e ântero-pos-
Qual é a relação entre o diafragma e os terior do tórax. Por outro lado, aumentando a
abdominais no percurso das duas fases da res- pressão intra-abdominal, os citados músculos
piração? deslocam a massa das vísceras para cima e fa-
Durante a inspiração (fig. 4-31, vista de zem o centro frênico subir, o que diminui o diâ-
perfil e figo4-32, vista de frente) a contração do metro vertical do tórax, ao mesmo tempo que
diafragma faz o centro frênico baixar, o que au- "fecham" os seios costodiafragmáticos. Os mús-
menta o diâmetro vertical do tórax; porém, em culos abdominais são, então, os antagonistas
seguida, a resistência ao alongamento dos ele- perfeitos do diafragma, visto que diminuem si-
multaneamente os três diâmetros do tórax.
mentos verticais do mediastino (M) intervém e,
especialmente, a resistência da massa das vísce- Portanto, o papel respectivo do diafragma
ras abdominais (D). Esta massa está mantida e dos músculos abdominais pode ser visto da
pela "cinta abdominal" constituída pelos poten- seguinte maneira (fig. 4-35): cada um destes gru-
tes músculos abdominais: os retos abdominais pos musculares se contrai de maneira permanen-
(RA), mas também os músculos transversos (T), te, embora o seu tônus evolua de maneira inver-
oblíquos internos (Om) e oblíquos externos sa. Durante a inspiração, a tensão do diafragma
(OM). Sem eles, o conteúdo abdominal seria aumenta, enquanto o tônus dos músculos abdo-
empurrado para baixo e para a frente, e o centro minais diminui. Pelo contrário, durante a expira-
frênico não poderia tomar um ponto fixo sólido ção, a tensão dos músculos abdominais aumenta,
que permitisse ao diafragma levantar as costelas enquanto o tônus do diafragma diminui. Deste
inferiores. Deste modo, a ação antagônico-si- modo, entre estes dois grupos musculares existe
nérgica dos músculos abdominais é indispensá- um equilíbrio móvel que se desloca perpetua-
vel para a eficácia do diafragma. Esta noção se mente num sentido ou no outro e que ilustra com
confirma na patologia, no caso das paralisias dos nitidez a noção de antagonismo-sinergia.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 153

INSP. INSP.

Fig.4-31 Fig.4-32

Fig.4-35

Fig.4-33 Fig.4-34
154 FISIOLOGIA ARTICULAR

A CIRCULAÇÃO AÉREA NAS VIAS RESPIRATÓRIAS

A experiência clássica de Funck (figs. das as dimensões do receptáculo aumentam si-


4-36 e 4-37) ilustra a circulação aérea nas vias multaneamente. Contudo, existe uma notável
respiratórias: se o fundo de um receptáculo é analogia com esta experiência (fig. 4-39), visto
substituído por uma membrana elástica herméti- que nela se encontra novamente o tubo vertical
ca e, por outro lado, se um balão de borracha se onde o ar penetra: a traquéia; o balão que se in-
comunica com o exterior através de um tubo que fla: os pulmões; e a membrana elástica que subs-
atravesse a tampa, se poderá realizar a insufla- titui o fundo do .receptáculo: o diafragma, embo-
ção ou a desinsuflação deste balão somente mo- ra este também aumente nos outros diâmetros.
bilizando o fundo elástico. De fato, se a mem- Contudo, dois pontos devem ser destacados:
brana elástica é puxada (fig. 4-37), a capacidade - por um lado, os pulmões ocupam todo o
total do receptáculo aumenta num volume suple- volume interior do tórax, e a união entre
mentar igual a V, ao mesmo tempo que a pressão as paredes torácicas e o pulmão, em si,
no interior dele diminui. A pressão atmosférica está assegurada pela pleura, cuja cavida-
é, então, superior à pressão interior e uma quan- de permanece virtual. De fato, em esta-
tidade de ar, cujo volume é exatamente igual ao do normal, as suas duas folhas permane-
volume V, penetra pelo tubo e infla o balão, o cem unidas e deslizam-se livremente
que realiza o mecanismo da inspiração. uma sobre a outra, o que constitui um
Pelo contrário, se soltamos a membrana elemento importante de eficaz solidez
elástica (fig. 4-36), esta volta à sua posição ini- mecânica entre os pulmões e a parede
cial e a capacidade total do receptáculo diminui torácica;
no mesmo valor V, o que aumenta a pressão no - durante a inspiração, a pressão intrato-
seu interior. O ar que se encontrava no balão se- rácica diminui e se toma negativa, não
rá expulso através do tubo. Trata-se do mecanis- só com relação ao ar exterior, mas tam-
mo da expiração. bém com relação à cavidade abdomi-
Assim, a respiração se baseia no aumento nal. Isto tem duas conseqüências: por
ou diminuição do volume da cavidade toráci- um lado, a penetração do ar pela tra-
ca (fig. 4-38). De fato, se partirmos da posição quéia até os alvéolos pulmonares e, por
inicial, na qual o tórax realiza um volume ovóide outro, a aceleração da circulação veno-
truncado com base ACBD, de diâmetro transver- sa de retorno para a aurícula direita
sal CD, de diâmetro ântero-posterior AB e de (AD). Portanto, a inspiração é um im-
diâmetro vertical SP, se pode considerar que a portante e excelente elemento de re-
ação dos músculos respiratórios e, especialmen- cheio do coração e, através da circula-
te a do diafragma, aumenta todos os diâmetros e ção menor, da chegada do sangue veno-
o transforma num ovóide maior truncado que so até a parede alveolar ao contato do
contém o ovóide anterior, de base A'B'C'D', de ar fresco que acaba de penetrar nela.
diâmetro ântero-posterior A'B' maior que CD e Assim, a inspiração assegura a circula-
de diâmetro vertical SP' maior que SP.A diferen- ção aérea e a circulação sangüínea
ça com a experiência de Fulk apóia-se em que to- pulmonar ao mesmo tempo.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 155

EXP. INSP.
G
t t J

Fig.4-37 Fig.4-39

Fig.4-38
156 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS VOLUMES RESPIRATÓRIOS

Denomina-se volumes respiratórios, ou vo- nominada volume residual (VR): meio


lumes pulmonares, a quantidade de ar que é pos- litro;
ta em movimento durante as diferentes fases da - a soma do volume residual e do volume
respiração e dos diferentes tipos respiratórios.
expiratório de reserva constitui a capaci-
Achamos conveniente esquematizar estes dade residual funcional (CRF): dois li-
diferentes volumes utilizando-se das pregas de tros;
um acordeão, para permitir que eles sejam com-
- por último, a soma da capacidade vital e
parados entre si.
do volume residual constitui a capaci-
Durante a respiração tranqüila, em re- dade pulmonar total: quatro litros.
pouso (fig. 4-40), os volumes respiratórios se
definem da seguinte maneira: Durante o esforço (fig. 4-41), os diferentes
volumes se distribuem de forma diferente na ca-
- o ar mobilizado entre uma expiração e pacidade pulmonar total:
uma inspiração normais representa o vo-
lume corrente (VC): meio litro. No grá- - o único que não varia é o volume resi-
fico, esta amplitude da respiração em re- dual visto que se trata de um ar impos-
pouso está representada pela faixa cinza sível de expulsar, seja qual for a força e
com o número 2 que contém as oscila- a intensidade dos movimentos respira-
ções do espirograma; tórios;
-- se uma inspiração normal é prolongada - contudo, à medida que se acelera a fre-
por uma inspiração forçada, uma quan- qüência respiratória, produz, em primeiro
tidade adicional de ar penetrará nos pul- lugar, um aumento do volume corrente
mões, o que representa o volume inspi- (VC) até um máximo e, a seguir, como a
ratório de reserva (VIR): um litro e freqüência respiratória continua aumen-
meIO; tando, o volume corrente tem a tendência
-. a soma deste volume inspiratório de re- a baixar levemente. Denomina-se débito
serva e do volume corrente constitui a ventilatório o produto da freqüência res-
capacidade inspiratória (CI): dois li- piratória pelo volume corrente. De tudo
tros; isso deduz-se que o débito ventilatório
- se após uma expiração normal se reali- acaba alcançando um máximo;
zar uma expiração forçada até o limite, - o volume expiratório de reserva au-
o volume expiratório de reserva menta de maneira notável, o que signi-
(VER) é expulso: um litro e meio; fica que a amplitude da respiração rápi-
- a soma do volume inspiratório de reser- da é mais próxima à dilatação máxima
va, do volume corrente e do volume ex- do tórax que durante a respiração em
piratório de reserva constitui a capaci- repouso;
dade vital (CV): três litros e meio; - a conseqüência do aumento do volume
- no final de uma expiração forçada e corrente e do volume de reserva expira-
completa, ainda subsiste nos pulmões e tório é a diminuição do volume inspira-
nos brônquios certa quantidade de ar de- tório de reserva (VIR).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 157

VOLUMES RESPIRATÓRIOS EM REPOUSO

CI

CV

db CRF

"lCJ
VR
o

Fig.4-40

VOLUMES RESPIRATÓRIOS DURANTE O ESFORÇO

I,
"
.,
••
VR
o

Fig.4-41
158 FISIOLOGIA ARTICULAR

FISIOPATOLOGIA RESPIRATÓRIA - OS TIPOS RESPIRATÓRIOS

Muitos fatores podem alterar a eficácia da - uma dilatação aguda do estômago (7),
ventilação. que dificulta o movimento do diafragma;
A experiência de Funck pode modificar-se - um meteorismo abdominal importante
(fig. 4-42): se se substitui uma parte da parede do (8), que, por oclusão, desloca o diafragma
receptáculo por outra membrana elástica; quando em direção ao tórax;
a membrana do fundo é puxada, esta membrana - uma paralisia frênica (fig. 4-44): com o
parietal se deprime a um volume v que se subtrai nervo frênico esquerdo inutilizado, a me-
do volume V. O balão se infla com um volume me-
tade esquerda da cúpula diafragmática fica
nor, igual a V-v. Isto ocorre em patologia quando paralisada e segue os movimentos deno-
se fratura uma costela após um forte traumatismo minados de respiração paradoxal: durante
do tórax: uma superfície mais ou menos grande de a inspiração, a cúpula esquerda se eleva
parede torácica deixa de seguir os movimentos e se em vez de baixar.
deprime durante a inspiração: se trata da respira-
A mecânica ventilatória pode ser modificada
ção paradoxal. O rendimento da ventilação dimi-
em grande medida com a posição do corpo:
nui, o que provoca um estado de dificuldade res-
piratória. Se uma ferida comunica a cavidade - em decÚbito supino (fig. 4-45), a massa
pleural com o exterior, o pulmão se retrai sobre si das vísceras desloca o diafragma para ci-
mesmo pela sua própria elasticidade, e, com cada ma, a inspiração é mais difícil, o volume
inspiração, o ar penetra na ferida: se trata de uma corrente é menor e é deslocado para a par-
trawnatopnéia, que causa uma grande dificuldade te superior do gráfico, em detrimento do
respiratória, a sobrevivência da pessoa só fica asse- volume inspiratório de reserva. Esta situa-
gurada, de maneira precária, pelo outro pulmão ção ocorre no percurso das anestesias ge-
com a condição de que ele seja suficiente. rais, e inclusive se agrava pelos anestési-
cos e os curarizantes, que diminuem a efi-
Neste esquema (fig. 4-43), todos os elemen-
cácia dos músculos respiratórios;
tos que alteram a hematose foram agrupados. Na
sua maioria, estes fatores são ventilatórios: - em decÚbito lateral (fig. 4-46), o desloca-
mento do diafragma aumenta mais no lado
- um pneumotórax (1), compressão gaseo-
do declive. Portanto, o pulmão inferior
sa originada por uma ferida pleuropulmo-
respira com maior dificuldade que o supe-
nar ou por uma ruptura de um brônquio
rior, situação agravada pela estase circula-
ou de uma bolha de enfisema: a pleura já
tória. Trata-se de uma posição especial-
não arrasta o pulmão;
mente temida pelos anestesistas.
- um hemotórax ou um hidrotórax, tam-
A mecânica ventilatória é diferente segundo
bém denominado pleurisia (2), acumula-
dos na base torácica. O pulmão se retrai a idade e o sexo (fig. 4-47): na mulher, a respira-
ção é de tipo costal superior: a amplitude máxima
sobre si mesmo (3) e perde toda a capaci-
dade funcional; se localiza na parte superior do tórax por aumento
do diâmetro ântero-posterior; na criança, é de tipo
- uma fratura costal (4); abdominal, enquanto no homem, é de tipo mista,
- uma atelectasia (5), exclusão ventilatória costal superior e inferior.
por obstrução bronquial: no esquema, o lo- Contudo, no ancião (fig. 4-48), as condições
bo superior esquerdo sofre uma atelectasia respiratórias estão modificadas pela cifose dorsal e
por obstrução do brônquio do lobo supe- pela hipotonia muscular: o aumento da curvatura
rior esquerdo; da coluna torácica superior leva à convergência das
- uma paquipleurite (6), engrossamento costelas superiores e à diminuição da amplitude
importante da pleura após uma pleurisia, dos seus movimentos. Deste modo, o lobo superior
pio tórax ou hemotórax, que forma uma ca- dos pulmões carece praticamente de ventilação, e a
mada esclerosada que comprime o pulmão respiração adota o tipo costal inferior e inclusive
e impede a sua expansão inspiratória; abdominal.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 159

Fig.4-42 Fig.4-44

Fig.4-43

Fig.4-48 Fig.4-47
160 FISIOLOGIA ARTICULAR

o ESPAÇO MORTO

Denomina-se espaço morto um volume de fossas nasais, da traquéia, dos brõnquios e dos
ar que não participa dos intercâmbios respira- bronquíolos. O volume de espaço morto é de
tórios. Na representação dos volumes respirató- 150 mI, o que sjgnifica que durante a respiração
rios através do acordeão (fig. 4-49), se o tubo de normal, quando se mobiliza unicamente o volu-
escape do ar se prolongar por um receptáculo de me corrente, apenas 350 ml chegam às paredes
grande volume (EM), o espaço morto aumenta alveolares e participam da hematose. Para au-
artificialmente. De fato, se somente se utiliza um mentar o rendimento é necessário acrescentar o
volume corrente de 0,5 litro e se o volume do tu- volume ventilado pela intervenção do volume
bo e do receptáculo adicionado é de 0,5 litro, a inspiratório ou expiratório de reserva ou dimi-
ventilação só deslocará o ar no interior do espa- nuir o volume do espaço morto, o que se pode
ço morto: nenhum volume de ar fresco penetra- obter com uma traqueotomia (T) que estabele-
rá no interior do acordeão. ce uma comunicação direta entre a traquéia e o
O exemplo do mergulhador (fig. 4-51) per- exterior e diminui o espaço morto em quase pe-
mite uma melhor compreensão. Pode-se imagi- la metade. Contudo, a traqueotomia não é um
nar um mergulhador unido à superfície só atra- ato inócuo, visto que priva a árvore respiratória
vés de um tubo pelo qual inspira e expira; se o das suas defesas naturais e a expõe a infecções
volume do tubo for igual a sua capacidade vital, broncopulmonares gra\'es.
em nenhum momento, apesar dos seus enérgicos No esquema de volumes respiratórios sim-
esforços, poderá inspirar ar fresco. Em cada mo- bolizados pelo acordeão (fig. 4-52), a traqueo-
vimento respiratório, ele inspirará o ar viciado tomia é representada pelos orifícios da base do
que enviou ao tubo. Deste modo, ele morrerá ra- tubo.
pidamente por asfixia, coisa que aconteceu du- Contudo, existe outro tipo de espaço morto
rante as primeiras tentativas de mergulho com (fig. 4-53), o espaço morto fisiológico (EM'):
escafandro. A solução consiste em administrar corresponde à exclusão sangüínea de um territó-
ar fresco pelo tubo e eliminar o ar expirado atra- rio pulmonar produzida por uma embolia pul-
vés de uma válvula fixa ao capuz. monar (EP). Este território sem irrigar será a se-
O espaço morto anatômico (fig. 4-50) re- de de uma ventilação aérea absolutamente inefi-
presenta o volume da árvore respiratória, isto é, caz, o que aumentará. na mesma proporção, o
das vias aéreas superiores, boca, incluídas as espaço morto anatõmico.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 161

VR
EP.

Fig.4-52

Fig.4-53

Fig.4-49 Fig.4-50

Fig.4-51
162 FISIOLOGIA ARTICULAR

A DISTENSIBILIDADE TORÁCICA

A noção de distensibilidade está diretamente - no volume V3, isto é, aos 70% da capaci-
relacionada com a elasticidade dos elementos dade pulmonar total, a pressão de origem
anatômicos do tórax e dos pulmões. parietal é nula e a pressão de relaxamen-
to torácico total é inteiramente devida à
Durante a expiração normal (fig. 4-54), o
elasticidade dos pulmões (as duas curvas
tórax e os pulmões tomam uma posição de equi-
P e T se cruzam nesse ponto);
, líbrio comparável à de uma mola que não esteja
nem comprimida nem esticada. Existe, então, um - em um volume intermediário V2, a pressão
equiltbrio de pressão entre o ar intra-alveolar e o de relaxamento da parede torácica isolada
ar atmosférico. é igual à metade exata da pressão de rela-
Através de um esforço muscular de expira- xamento pulmonar, de tal modo que a
pressão de relaxamento torácico total
ção forçada (fig. 4-55), se comprimem os ele-
equivale à metade da pressão de relaxa-
mentos elásticos do tórax. Se, para que ela seja
mento pulmonar;
expressa em uma imagem, submetemos a mola
representada pelo tórax a uma pressão, por exem- - convém destacar um último ponto: em
plo, de + 20 cm de água, a pressão intrapulmonar expiração máxima, os pulmões ainda não
será mais forte que a pressão atmosférica e o ar perderam a sua máxima elasticidade,
escapará pela traquéia, porém o tórax terá a ten- porque a curva P ainda está à direita do
dência de recuperar a sua posição inicial, como a zero de pressões; isto explica que, se dei-
mola terá a tendência de voltar à sua posição O. xarmos penetrar o ar nas pleuras, elas
ainda podem retrair-se até um volume
Pelo contrário, se um esforço de inspiração
mínimo Vp, onde perdem toda a força de
é realizado (fig. 4-56), o que poderia ser compa-
retração e, portanto, toda a pressão sobre
rado ao estiramento da mola, se criaria uma pres-
o ar que contêm.
são negativa intratorácica de -20 cm de água,
com relação ao ar atmosférico; isto determina a Por conseguinte, se pode considerar a elasti-
penetração do ar na traquéia, mas, devido à sua cidade total do tórax (fig. 4-58) como a associa-
elasticidade, o tórax tem a tendência a recuperar a ção de duas molas (A): uma mola grande (S) que
sua posição inicial. representa a parede torácica e uma mola pequena
(P) que representa os pulmões. A dependência
Estes fenômenos podem ser representados
funcional das molas à parede torácica através da
através de curvas de distensibilidade (fig. 4-57),
pleura equivale à associação conjunta de ambas as
que representam as variações da pressão intrato-
molas (B), para o que é preciso comprimir a mola
rácica em abscissas, em função das variações do
grande S e esticar a mola pequena P; a associação
volume torácico em ordenadas. Podem-se traçar
três curvas: destas duas molas equivale a uma só (C) que re-
presenta a elasticidade torácica total (T). Porém,
- a curva de relaxamento torácico total se a união funcional entre o pulmão e a parede to-
(T), em que a pressão nula corresponde rácica ficasse destruída, cada uma das duas molas
ao volume de relaxamento (VR); esta recuperaria a sua própria posição de equilíbrio
curva é o resultado da curva volu- (A). Voltando à noção de distensibilidade, repre-
me/pressão dos pulmões isolados (P) e senta a relação entre um volume de ar e a pressão
da curva volume/pressão da parede to- parietal necessária para que ele seja movido. No
rácica isolada (S); é de notar que o vo- gráfico (fig. 4-57), a distensibilidade representa o
lume de relaxamento corresponde a uma traçado da parte média da curva; então, podemos
igualdade de força entre a elasticidade constatar que a distensibilidade do pulmão isolado
parietal que desenvolve uma pressão Ps é maior que a distensibilidade da parede torácica
e a elasticidade pulmonar que desenvol- isolada, sendo a distensibilidade torácica total a
ve uma pressão de sinal oposta Pp; soma algébrica destas duas distensibilidades.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 163

A B

Fig.4-58
164 FISIOLOGIA ARTICULAR

MOBILIDADE ELÁSTICA DAS CARTILAGENS COSTAIS

Já vimos anteriormente (figs. 4-19 e 4-20) - a extremidade externa (5) tem a forma
que durante a inspiração as cartilagens costais de cone plano de diante para trás; este
realizam um deslocamento angular e uma torção cone se incrusta na extremidade anterior
ao redor de seu eixo longitudinal. Esta torção da costela, escavada em forma de cone
desempenha um papel importante no mecanis- ao contrário; também neste caso, a arti-
mo da expiração. De fato, quando o estemo se culação permite deslocamentos verticais
eleva durante a inspiração, devido à extremidade e laterais, mas nenhum movimento de
posterior das costelas que permanece unida com torção.
a coluna vertebral pelas articulações costo-ver-
Quando, durante a inspiração, a costela reali-
tebrais (fig. 4-59), as cartilagens costais reali-
za movimentos de descida com relação ao estemo,
zam uma rotação, representada pelas setas t e t' ,
a cartilagem costal sofre uma torção sobre o seu
sobre o seu eixo longitudinal. Ao mesmo tempo
eixo, equivalente a um ângulo t e se comporta co-
existem angulações (a) nas articulações con-
mo uma barra de torção. Este dispositivo, bem
drocostais e esternocondrais (para facilitar a
conhecido pelos engenheiros, se utiliza como mo-
compreensão, nesta figura o estemo é suposta- la amortecedora nos automóveis: se torcemos uma
mente fixo e a coluna vertebral móvel).
barra sobre o seu eixo longitudinal, a sua elastici-
Esquematicamente, estas articulações con- dade armazena a energia da torção e a restitui
drocostais e estemocondrais (fig. 4-60) são in- quando soltamos a barra. Do mesmo modo, a
crustações de cada uma das extremidades da energia dos músculos inspiradores se concentra
cartilagem costal: nas barras de torção das cartilagens costais duran-
- a extremidade interna (3) está encaixada te a inspiração e no momento do relaxamento dos
na margem do estemo (1) em ângulo citados músculos e só pela elasticidade destas
diedro (2), que recebe exatamente a ex- cartilagens, o tórax volta a sua posição inicial. As
tremidade da cartilagem, permitindo al- cartilagens são mais flexíveis e elásticas quanto
guns movimentos em sentido vertical, mais jovem é o sujeito; com a idade elas têm a ten-
porém nenhum movimento no sentido dência a ossificar-se, o que explica a perda de fle-
da torção; xibilidade torácica e respiratória dos anciões.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 165

Fig.4-59

2
3
4
6 5

Fig.4-60 Fig.4-61

r
!
166 FISIOLOGIA ARTICULAR
I
!

MECANISMO DA TOSSE - FECHAMENTO DA GLOTE I


iI
,
i
I
o ar que penetra nas vias respiratórias se quando a tensão dos abdominais é dolo-
filtra, se umedece e se aquece ao passar pelas rosa e, portanto, temida, a tosse ou não Ii
fossas nasais. Em princípio, ele não contém existe ou carece de toda eficácia; !
nenhuma partícula em suspensão quando chega - e por outro, o fechamento da glote, o
à traquéia ou aos brônquios. Contudo, se por que supõe a integridade do aparelho la- II
inadvertência se introduzem partículas estranhas ríngeo e da sua inervação. I
na árvore bronquial, um mecanismo muito efi-
caz as expulsará: a tosse. Assim, a tosse se en- A tosse é um ato reflexo, desencadeado por
carrega de expulsar os pacotes mucosos secreta- zonas sensitivas na bifurcação entre a traquéia e
dos pelos brônquios, que englobam as finas par- a pleura, cuja via centrípeta é constituída pelos
tículas estranhas para, a seguir, deslocá-Ias para pneumogástricos; os seus centros são bulbares;
as suas vias efetoras afetam não só os nervos la-
o orifício glótico pelo movimento incessante do
epitélio ciliado bronquial. ríngeos, os ramos do pneumogástrico, mas tam-
bém os nervos intercostais e abdominais. O seu
Qual é, então, o mecanismo da tosse? Po- mecanismo, extremamente delicado, pode ser
de-se explicar com três esquemas, visto que alterado com facilidade.
consta de três fases:
Já vimos anteriormente que o fechamento
1.3 fase (fig. 4-62): uma inspiração profun- da glote era um dos mecanismos indispensáveis
da denominada preparatória, que faz a maior para a produção da tosse. Como a glote se fe-
parte do volume inspiratório de reserva entrar na cha? Duas vistas esquemáticas superiores (figs.
árvore bronquial e nos alvéolos. Esta inspiração 4-65 e 4-66; os números das figuras são comuns
profunda tem o inconveniente de que pode arras- às da página seguinte) vão permitir compreender
tar os corpos estranhos, que passaram pela glo- o seu mecanismo: o orifício glótico visto da fa-
te, para os bronquíolos; ringe tem a forma de uma fenda triangular de
2.a fase (fig. 4-63): a entrada em tensão, na vértice anterior (fig. 4-65). As suas duas mar-
que intervêm dois fatores; por um lado, o fecha- gens estão constituídas pelas cordas vocais infe-
mento da glote e, por outro, a contração violen- riores (15), que vão da face posterior da cartila-
ta dos intercostais e de todos os músculos expi- gem tireóide (3) ao processo anterior ou proces-
radares acessórios e, especialmente, dos múscu- so vocal (25) das cartilagens aritenóides. Estas
los abdominais. No percurso desta segunda fase, cartilagens repousam na cartilagem cricóide (7)
a pressão intratorácica aumenta notavelmente; (cinza na figura) por duas articulações cujos ei-
3.3 fase (fig. 4-64): a expulsão. Enquanto os xos podem ser considerados verticais a O e O'.
músculos expiradores acessórios permanecem Quando os músculos cricoaritenóideos poste-
tensos, a glote se abre bruscamente e libera uma riores se contraem (13), as cartilagens aritenói-
violenta corrente de ar bronquial, que arrasta as des giram sobre o seu eixo O e O' e os proces-
partículas estranhas e os pacotes de muco, fa- sos vocais (25) se separam, o que abre a glote.
zendo-os passar pelo orifício glótico, para a fa- Ao contrário (fig. 4-66), quando os músculos
ringe, onde serão expectorados. cricoaritenóideos laterais se contraem (16), as
cartilagens aritenóides pivotam no outro senti-
Parece então que, para ser eficaz, a tosse do, os processos vocais (25) se aproximam da
deve fazer intervir:
linha média e as cordas vocais (15') entram em
- por um lado, uns músculos abdominais contato, fechando o orifício glótico.
eficazes. Sabemos que nos poliomielíti-
cos, cujos abdominais estão paralisados, (Os outros detalhes destes esquemas serão explica-
ou inclusive nos operados do abdome, dos na página seguinte.)
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 167

Fig.4-62 Fig.4-63 Fig.4-64

26

15

3
25

23
24

Fig.4-65 Fig.4-66
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 169

10 20
11
8 15
12
7 16
13 17
14
6

Fig.4-67 Fig.4-68 Fig.4-69

.. -- .........•....
24 --- .. - ." 26 ~
622 5
.. 11
21
8~ /~7 8 /
23

•...·1, I

Fig.4-70 Fig.4-71
170 FISIOLOGIA ARTICULAR
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 171
172 FISIOLOGIA ARTICULAR

A COLUNA CERVICAL EM CONJUNTO

Considerada em conjunto (fig. 5-1), a colu- platá superior da primeira vértebra to-
na cervical está constituída por duas partes ana- rácica.
tomica e funcionalmente diferentes: As vértebras cervicais são todas do mesmo
- a coluna cervical superior (1), também tipo, menos o atlas e o áxis, que são diferentes
denominada coluna suboccipital, que entre si e das outras vértebras cervicais. As arti-
contém a primeira vértebra cervical ou culações da coluna cervical inferior possuem
atlas, e a segunda vértebra cervical ou dois tipos de movimentos: por um lado, movi-
áxis. Estas peças esqueléticas estão uni- mentos de fiexão-extensão; e por outro, movi-
das entre si, além do occipital, por uma mentos mistos de inclinação-rotação.
complexa cadeia articular com três ei- Funcionalmente estes dois segmentos da
xos e três graus de liberdade; coluna cervical se completam entre si para reali-
- a coluna cervical inferior (2), que se zar movimentos puros de rotação, de inclinação
estende do platá inferior do áxis até o ou de ftexão-extensão da cabeça.

r
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 173

Fig.5-1
174 FISIOLOGIA ARTICULAR

CONSTITUIÇÃO ESQUEMÁ TICA DAS TRÊS PRIMEIRAS


VÉRTEBRAS CERVICAIS

Nestes esquemas estão representados, um (13 e 13') apresentam um orifício vertical (14)
debaixo do outro, no mesmo eixo vertical: o pelo qual ascende a artéria vertebral.
atlas (fig. 5-2), o áxis (fig. 5-3) e a terceira vér- A terceira vértebra cervical (fig. 5-4) é
tebra cervical (fig. 5-4), muito esquematiza- parecida com as quatro últimas vértebras cervi-
das.
cais; portanto, se trata de uma vértebra cervical
O atlas (fig. 5-2), anel mais largo transver- padrão: possui um corpo vertebral (19), parale-
sal que, sagitalmente, contém duas massas late- lepípedo retangular alongado transversalmente;
rais (1 e 1') ovaladas, de eixo maior oblíquo pe- a sua face superior comporta um platá vertebral
la frente e para dentro, com uma face articular superior (20) limitada lateralmente pelos pro-
superior (2 e 2') orientada para cima e para den- cessos unciformes (22 e 22'), cuja face articular
tro, côncava nos dois sentidos e articulada com está orientada para cima e para dentro e se arti-
os côndilos do occipital, e umaface articular in- cula com as superfícies situadas em ambos os la-
ferior que se dirige para baixo e para dentro, dos do platô inferior do áxis. A margem anterior
convexa de diante para trás e articulada com a do platô vertebral superior também possui uma
face superior do áxis (12 e 12'). O arco anterior superfície (21) orientada para cima e para dian-
do atlas (3) tem por face posterior uma face ar- te, que se articula com a face posterior de um bi-
tiCldar cartilaginosa ovalada (4) que se articula co que prolonga a margem anterior da vértebra
com a apófise odontóide do áxis (11). O arco suprajacente, neste caso o áxis. O platá verte-
posterior (5), em princípio plano de cima para bral inferior, prolongado para a frente e para
baixo, se alarga para trás na linha média, na qual baixo por um bico proeminente, é rodeado de
não existe apófise espinhosa, mas uma simples cada lado por duas faces articulares da articula-
crista vertical (6). As apófises transversas (7 e ção uncovertebral, orientadas para baixo e para
7') estão perfuradas para dar passagem à artéria fora.
vertebral (8), que escava um profundo canal (8') O arco posterior é formado pelas apófises
por trás das massas laterais. articulares (23 e 23'), cada uma das quais con-
O áxis (fig. 5-3) apresenta um corpo verte- tém uma face articular superior (24 e 24') que
bral (9) cuja face superior (10) recebe no seu se dirige para cima e para trás e se articula com
centro a apófise odontóide (11), também deno- a face articular inferior da vértebra suprajacente
minada processo odontóide, e que serve de pivô (neste caso a face articular inferior do áxis: 17)
para a articulação atlantoaxial; esta face superior e umaface articular inferior, invisível na figura,
também dá suporte a duas faces articulares (12 orientada para baixo e para diante e que se arti-
e 12') como se fossem ombreiras, que sobres- cula com a face articular superior de C4• Estas
saem lateralmente para fora do corpo vertebral e apófises articulares estão unidas ao corpo verte-
estão orientadas para cima e para fora; elas são bral pelo pedículo (25), o que suporta, em parte,
convexas de diante para trás e planas transver- a base da apófise transversa (26 e 26') que se fi-
salmente. O arco posterior (16) está constituído xa também na face lateral do corpo vertebral: ele
por duas lâminas estreitas (15 e 15'), oblíquas tem a forma de um canal de concavidade supe-
para trás e para dentro. A apófise espinhosa (18) rior, cujo fundo, próximo ao corpo vertebral,
comporta dois tubérculos, como o resto das es- apresenta um orifício onde a artéria vertebral so-
pinhosas cervicais. Por debaixo do pedículo (16) be; por último, ela acaba em dois tubérculos, um
) se fixam as apófises articulares inferiores (17 e anterior e outro posterior. As duas lâminas ver-
17') com as suas faces articulares cartilaginosas tebrais (27 e 27'), cujo plano é oblíquo para bai-
orientadas para baixo e para diante e que se arti- xo e para fora, se unem na linha média para dar
culam com as faces articulares superiores da ter- origem à apófise espinhosa (28), que contém
ceira cervical (24 e 24'). As apófises transversas dois tubérculos.
3. TRO:'-iCO E COLUNA VERTEBRAL 175

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Fig.5-4
21
22

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176 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS ARTICULAÇÕES ATLANTOAXIAIS

A união mecânica entre o atlas e o áxis es- Um corte parassagital nas massas laterais
tá assegurada por três articulações mecanica- do atlas (fig. 5-7) mostra as curvas e orientações
mente conectadas: das diferentes superfícies articulares:
- uma articulação axial, a atlantoodon- - curvatura da articulação atlantoodon-
tóide, onde a apófise odontóide serve de tóide, com a sua face articular odontói-
pivô e que se analisará na página 180; de (1) e a face articular do arco ante-
rior do atlas (2) (este está seccionado
- duas articulações laterais e simétricas,
as atlantoaxiais, que estabelecem a li- pelo plano sagital médio), situada num
círculo de centro Q atrás da apófise
gação entre a face inferior das massas
odontóide;
laterais do atlas e as superfícies articula-
res superiores do áxis. - aface articular superior das massas la-
terais do atlas (3) é côncava de diante
Numa vista em perspectiva do áxis (fig. 5-
para trás e se dirige diretamente para ci-
5) e em vista de perfil (fig. 5-6), se apreciam tan- ma. Articula-se com os côndilos do oc-
to a forma quanto a orientação desta face articu-
cipital;
lar superior (5) ovalada de eixo maior ântero-
posterior, convexa de diante para trás seguindo - a face articular inferior das massas la-
uma curva xx', mas retilínea em sentido trans- terais do atlas (4) é convexa de diante
versal, de modo que se pode considerar como para trás num círculo de centro O e de
talhada na superfície de um cilindro (C) cujo ei- raio de curva relativamente curto com
xo (Z) se dirigiria para fora e levemente para relação ao do círculo Q;
baixo, de tal maneira que a face articular esteja - a face articular superior do áxis (5) é
orientada para baixo e levemente para fora. O ci- convexa de diante para trás numa cur\"a
lindro, onde as duas faces articulares estão talha- de centro P com um raio quase igual ao
das, representado transparente, engloba a parte do círculo O. Portanto, as duas superfí-
lateral do áxis; que o extremo distal da apófise cies 4 e 5 repousam corno duas rodas,
transversa ultrapassa. urna sobre a outra; a estrela representa o
centro do movimento de flexão-exten-
Também se observa nestas duas figuras a
forma tão peculiar da apófise odontóide, quase são do atlas sobre o áxis (ver pág. 178);
cilíndrica, embora encurvada para trás e que - por último, a face articular inferior do
contém: pela frente, uma face articular (1) em áxis (6) que está orientada para baixo e
forma de escudo, levemente convexa em ambos para diante; embora ela seja quase pla-
os sentidos e que se articula com a face articu- na, ela apresenta, contudo, urna leve
lar do arco anterior do atlas; por trás, um canal curva de raio maior cujo centro R está
côncavo de cima para baixo e convexo transver- situado para baixo e para a frente. Arti-
salmente coberto com urna camada cartilagino- cula-se com a face articular superior das
sa, que se articula com o ligamento transverso. apófises articulares de C3•
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 177

Fig.5-5

3 z
2 Fig.5-6
1

4
5

Fig.5-7

R
+
178 FISIOLOGIA ARTICULAR

A FLEXÃO-EXTENSÃO NAS ARTICULAÇÕES ATLANTOAXIAIS


E ATLANTOODONTÓIDES

Supondo que, durante afiexão (fig. 5-8), as não é, então (fig. 5-7), nem o ponto P, centro da
massas laterais do atlas rodem sem deslizar-se curvatura da superfície superior do áxis, nem o
sobre as superfícies superiores do áxis, o ponto ponto Q, centro da curvatura da face articular
de contato entre estas duas superfícies convexas anterior da apófise odontóide, mas um terceiro
se deslocaria para diante e a linha que une o cen- ponto representado aqui por uma estrela e que se
tro da curva P com o ponto de contato destas projeta quase no centro da apófise odontóide
duas superfícies se deslocaria de PA a PA'; si- vista de perfil. Conseqüentemente, durante o
multaneamente, se poderia apreciar uma abertu- movimento de flexão-extensão, a face articular
ra acima, na articulação entre o arco anterior do inferior das massas laterais do atlas roda e se
atlas e a face articular anterior da apófise odon- desliza ao mesmo tempo sobre a superfície su-
tóide. perior do áxis, exatamente como os côndilos fe-
Do mesmo modo, durante a extensão (fig. morais rodam e se deslizam simultaneamente
5-9), se as massas laterais do atlas rodassem sem sobre as cavidades glenóides da tíbia.
deslizar-se sobre as superfícies superiores do Contudo, é preciso destacar a existência de
áxis, o ponto de contato entre estas duas super- um elemento deformável, neste caso o ligamen-
fícies convexas deveria deslocar-se para trás e a to transverso, que constitui a parte posterior da
linha que une o centro da curva P com o ponto articulação atlantoodontóide, e que permite cer-
de contato deveria deslocar-se de PB a PB': ao ta flexibilidade no funcionamento desta articula-
mesmo tempo, apareceria uma abertura inferior ção: este ligamento, incrustado no canal poste-
na articulação entre o arco anterior do atlas e a rior da apófise odontóide pode incurvar-se para
superfície anterior da apófise do áxis. cima durante a extensão, ou para baixo durante
N a verdade, o exame atento das radiogra- a flexão, como se fosse a corda de um arco. Tam-
fias de perfil mostra que esta abertura não exis- bém se pode entender por que a cavidade recep-
te (fig. 5-10): isto é devido à presença do liga- tora da apófise odontóide não é totalmente ós-
mento transverso (T) que mantém o arco ante- sea. Do mesmo modo que se podem encontrar
rior do atlas estreitamente unido com a apófise razões similares no caso do ligamento anular da
odontóide (ver pág. 180). O centro real do mo- articulação rádio-ulnar superior, que também é
vimento de flexão-extensão do atlas sobre o áxis uma articulação de tipo trocóide (ver volume I).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 179

Fig.5-8
F

Fig.5-10

Fig.5-9
180 FISIOLOGIA ARTICULAR

ROTAÇÃO NAS ARTICULAÇÕES ATLANTOAXIAIS


E ATLANTOODONTÓIDES

Acabamos de estudar a articulação atlanto- tilaginosas, uma na face posterior da


axial num corte de perfil; numa vista superior apófise odontóide (11) e a outra na face
com o atlas em conjunto (fig. 5-11) e em primei- anterior do ligamento transverso (12).
ro plano (fig. 5-12), permite entender a sua es- Durante o movimento de rotação, para a es-
trutura e o seu funcionamento durante a rotação. querda por exemplo, (fig. 5-12), a apófise odontói-
A articulação atlantoodontóide é uma tro- de (1) permanece fixa e o anel ósteo-ligamentar,
cóide com duas superfícies cilíndricas encaixa- formado pelo áxis e pelo ligamento transverso, gi-
das uma sobre a outra: ra em sentido imerso aos ponteiros de um relógio
- uma superfície cilíndrica maciça, a apó- ao redor de um centro que corresponde ao eixo da
fise odontóide (1), cuja forma não é to- apófise odontóide (assinalado na figura com uma
talmente cilíndrica, de modo que se po- cruz branca), a cápsula articular se distende para a
de adaptar a um segundo grau de liber- esquerda (8) e entra em tensão para a direita (9).
dade aos movimentos de flexão-exten- Simultaneamente, existe um deslocamento
são. Esta apófise odontóide apresenta nas duas articulações atlantoaxiais direita e es-
uma outra face articular nas suas faces querda, mecanicamente unidas: na rotação da
anterior (4) e posterior (11); esquerda para a direita (fig. 5-13) a massa late-
- a cavidade que recebe este cilindro ma- ral esquerda do atlas avança, enquanto a massa
ciço é um cilindro oco que envolve to- lateral direita recua; durante a rotação da direita
talmente a apófise odontóide e que está para a esquerda (fig. 5-14), ocorre o contrário.
formado pela frente pelo arco anterior Porém, como as superfícies superiores do
do atlas (2) e pelos lados pelas massas áxis são convexas de diante para trás (fig. 5-16),
laterais do atlas que comportam na sua o trajeto descrito pelas massas laterais do atlas
face interna um tubérculo muito pronun- não é retilíneo num plano horizontaL mas curvi-
ciado (7 e 7') onde se fixa um potente li- líneo de convexidade superior: quando o atlas
gamento que se estende transversalmen- gira ao redor do eixo vertical W, as suas massas
te para trás da apófise odontóide: o liga- laterais descrevem o trajeto xx· ou yy'.
mento transverso (6).
Se somente o círculo que contém a curvatura
Portanto, a apófise odontóide está incrusta- da face articular inferior das massas laterais do
da no interior de um anel ósteo-ligamentar, com atlas estivesse representado (fig. 5-15). se poderia
o qual entra em contato através de duas articula- constatar que, na sua posição média corresponden-
ções diferentes: te à rotação neutra, o círculo de centro O ocuparia
- pela frente, uma articulação de tipo sino- a sua situação mais elevada na superfície superior
vial (5) com uma cavidade articular e uma do áxis. Quando se desloca para a frente, este cír-
cápsula sinovial com duas pregas, uma à culo "desce" pela vertente anterior da superfície
esquerda (8) e outra à direita (9). Ela põe superior do áxis de 2 a 3 mm, enquanto o seu cen-
em contato a face articular anterior da tro só desce a metade (e/2); durante o deslocamen-
apófise odontóide (4) e a face articular to para trás o mesmo fenômeno se produz.
posterior do arco anterior do atlas (3); Portanto, durante a sua rotação sobre o áxis,
- por trás, uma articulação carente de o atlas se desloca verticalmente para baixo de 2 a
cápsula, situada no interior de um teci- 3 mm, de modo que o seu movimento é helicoidal;
do célulo-adiposo (10) que preenche o pois bem, por um lado, o passo desta hélice é mui-
espaço entre o anel ósteo-ligamentar e a to curto, e, por outro, existe uma hélice na rotação
apófise odontóide. Ela proporciona o para a direita e outra hélice de passo imerso na ro-
contato entre duas superfícies fibrocar- tação para a esquerda.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 181

7 4 5 3 2 1
4 9 10

11
12
Fig.5-11 6

Fig.5-12

I -
8 Fig.5-13 Fig.5-14

8/2 I'

Fig.5-16
182 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS SUPERFÍCIES DA ARTICULAÇÃO ATLANTOOCCIPITAL

Na verdade, existem duas articulações no secante horizontal; o ponto P é o centro da


atlantooccipitais, mecanicamente unidas, pares curvatura das faces no plano secante vertical; a
e simétricas, que relacionam as faces articulares figura mostra a esfera, supostamente transpa-
superiores das massas laterais do atlas com as rente, apoiando-se exatamente sobre as superfí-
superfícies dos côndilos occipitais. cies articulares superiores das massas laterais
do atlas.
Numa vista superior do atlas (fig. 5-17), as
faces articulares do atlas são ovaladas de eixo Uma vista posterior das articulações atlan-
maior oblíquo para a frente e para dentro, que tooccipitais (fig. 5-18), confirma que a curvatu-
convergem num ponto N, localizado na linha ra das superfícies condilares occipitais está si-
média, um pouco para diante do arco anterior do tuada na mesma superfície esférica cujo centro
atlas. Às vezes, estão retraídas na sua parte mé- O se encontra no interior do crânio, acima do fo-
dia e, inclusive, pode estar cada uma separada rame magno ou occipital. A articulação atlanto-
em duas faces diferentes. Cobertas com cartila- occipital pode, então, considerar-se uma enar-
gens, elas são côncavas em ambos os sentidos e trose, isto é, uma articulação de superfície esfé-
a curvatura é quase idêntica tanto num sentido rica (fig. 5-19) com três eixos e, portanto, com
quanto no outro. Portanto, pode considerar-se três graus de liberdade:
que estão compreendidas na superfície de uma - rotação axial ao redor de um eixo verti-
esfera (fig. 5-19) cujo centro O se situaria acima cal QO;
do plano das superfícies articulares e se projeta-
- flexão-extensão ao redor de um eixo
ria na intersecção do eixo de simetria e da linha
que une a margem posterior das duas faces arti- transversal que passa pelo centro O;
culares. Por outro lado, o ponto Q representa o - inclinação lateral ao redor de um eixo
centro da curvatura das faces articulares no pla- ântero-posterior PO.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 183

Fig.5-17

Fig.5-18 Fig.5-19
184 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ROTAÇÃO NAS ARTICULAÇÕES ATLANTOOCCIPITAIS

Quando o occipital gira sobre o atlas equivalem a outra rotação com o mesmo ângulo,
(fig. 5-20), ele participa de um movimento geral mas com diferente centro e fácil de construir.
de rotação do atlas sobre o áxis, que se realiza ao Numa vista superior (fig. 5-21) o atlas está re-
redor do eixo vertical que passa pelo centro da presentado em cinza-claro, o áxis, em cinza-es-
apófise odontóide. Contudo, esta rotação não é curo; se pode ver através do forame magno e so-
um fenômeno simples, visto que faz intervir a bre as faces articulares laterais do atlas (traceja-
tensão dos ligamentos e, em particular, a tensão do horizontal) as faces articulares dos côndilos
do ligamento lateral do ápice da odontóide (L): occipitais supostamente transparentes (tracejado
neste esquema onde o occipital (A) e as massas oblíquo). Durante os movimentos de rotação pa-
laterais do atlas (B) estão seccionados por um ra a esquerda, num ângulo â ao redor do centro
corte vértico-frontal, se representa uma rotação da apófise odontóide O, se pode observar um
para a esquerda do occipital sobre o atlas. Este deslocamento lateral do occipital de 2 a 3 mm
movimento se traduz pelo deslizamento para a para a esquerda, seguindo o vector V. Então, é
frente do côndilo direito do occipital sobre a fácil construir o centro real da rotação num
massa lateral direita do atlas (seta 1), porém, si- ponto P, situado levemente à direita do plano de
multaneamente, o ligamento occípito-odontóide simetria e na linha que une a margem posterior
lateral (L) se enrola ao redor da odontóide e en-
tra em tensão. Esta tensão vai deslocar o côndi- das superfícies das massas laterais do atlas. Por-
tanto, o centro real da rotação atlantooccipital se
10 direito do occipital para a esquerda (seta 2).
desloca entre dois pontos extremos, o ponto P
P0l1anto, a rotação para a esquerda se acom- no caso da rotação para a esquerda e o seu simé-
panha, ao mesmo tempo, de um deslocamento de trico P' no caso da rotação para a direita. Além
2 a 3 mm para a esquerda e de uma inclinação do disso, cabe destacar o interesse deste dispositi-
occipital para a direita. Por conseguinte, não exis- vo que faz recuar o centro real da rotação para
te uma rotação pura, mas uma rotação associada o centro do forame magno (traço espesso), de
a uma translação e a uma inclinação. tal modo que o eixo real do movimento de rota-
Pois bem, sabemos através da cinemática ção corresponde ao eixo anatômico da medula
que uma rotação associada e uma translação oblonga.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 185

Fig.5-20

Fig.5-21
186 FISIOLOGIA ARTICULAR

A INCLINAÇÃO LATERAL E A FLEXÃO-EXTENSÃO


NA ARTICULAÇÃO ATLANTOOCCIPITAL

Durante a inclinação lateral (fig. 5-22), Durante aflexão (fig. 5-23), os côndilos oc-
um corte vértico-frontal do occipital, do atlas, cipitais recuam sobre as massas laterais do atlas;
do áxis e da terceira vértebra cervical mostra simultaneamente, se pode observar como a esca-
que não existe nenhum deslocamento na arti- ma do occipital se afasta do arco posterior do
culaçâo atlantoaxial. Por um lado, a inclina- atlas e como este movimento se acompanha
ção se realiza somente entre o áxis e a terceira sempre de uma flexão na atlantoaxial, também
vértebra cervical e, por outro, entre o occipital se vê como o arco posterior do atlas se afasta do
e o atlas. Entre estes dois últimos existe pouca arco posterior do áxis. A flexão está limitada pe-
amplitude que se traduz por um deslizamento la entrada em tensão das cápsulas e dos ligamen-
dos côndilos occipitais para a direita na incli- tos posteriores (membrana occípito-atlóidea e o
nação para a esquerda e vice-versa. Neste caso ligamento cervical posterior).
uma inclinação para a esquerda está represen- Durante a extensão (fig. 5-24), os côndilos
tada, que mostra como o côndilo occipital es- occipitais se deslizam para a frente sobre as mas-
querdo se aproxima da apófise odontóide, mas sas laterais do atlas. Simultaneamente, a escama
não entra em contato com ela, visto que o mo- do occipital se dirige para o arco posterior do
vimento é limitado pela tensão da cápsula das atlas e como também existe uma extensão na
atlantooccipitais e, principalmente, pelo liga- atlantoaxial, o arco posterior do atlas se aproxi-
mento odontóide-occipitallateral direito. A in- ma do arco posterior do áxis. A extensão está li-
clinação total entre o occipital e a terceira cer- mitada pelo contato destes três elementos ósseos;
vical é de 8°, que se distribuem em 5° entre o durante os movimentos de extensão forçada, o
áxis e C3, e 3° entre o occipital e o atlas. arco posterior do atlas fica preso, como se esti-
Os movimentos de flexão-extensão do oc- vesse dentro de um quebra-nozes, pode fraturar-
cipital sobre o atlas se realizam pelo desliza- se entre o occipital e o arco posterior do áxis.
mento dos côndilos occipitais sobre as massas A amplitude total da flexão-extensão na ar-
laterais do atlas. ticulação atlantooccipital é de 15°.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 187

Fig.5-22

Fig.5-23 Fig.5-24
188 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS DA COLUNA SUBOCCIPITAL

Os ligamentos da coluna suboccipital são muito nu- do processo basilar até a margem superior e a fa-
merosos e potentes (fig. 5-25. corte sagital; os números de ce anterior do arco anterior do atlas;
referéncia são comuns até a figura 5-33).
- o ligamento atlantoaxoidiano anterior (16) prolon-
Vejamos, em primeiro lugar, os elementos ósseos: de ga o ligamento atlantooccipital anterior para baixo.
cima para baixo, o corte do processo basilar do occipital Estende-se da margem inferior do arco do atlas até
(b); o corte do arco anterior (e) do atlas e do seu arco pos- a face anterior do corpo do áxis. Deste modo se
terior (O; o corte sagital da apófise odontóide (g) prolon- constitui, pela frente da apófise odontóide e do liga-
gando para cima o corpo do áxis (k). Na apófise odontóide, mento occípito-odontóide médio e por trás dos liga-
a face articular anterior (h) em contato com a face articular mentos atlantooccipital médio e atlantoaxóideo mé-
posterior U) do arco anterior do atlas; a face articular pos- dio, um espaço célulo-adiposo que contém a articu-
terior (i). O resto do áxis está representado pela sua apófi- lação atlantoodontóide e a sua cápsula (17);
se espinhosa (n) e o corte de sua lâmina esquerda (o). De-
baixo do áxis, a terceira vértebra cervical com a secção sa- - o ligamento vertebral comum anterior (ligamento
gital do seu corpo vertebral (q). a sua apófise espinhosa (s) longitudinal anterior) (18) recobre todo este con-
e a secção parassagital da sua lâmina esquerda (r). Em junto pela frente e se insere na face inferior do
perspectiva, a fossa cerebelar por cima do forame magno e processo basilar do occipital, passa como se fosse
uma parte do côndilo occipital direito, assim como, abaixo, uma ponte, pela frente do arco anterior do atlas,
a metade direita do arco posterior do atlas, do áxis e de C,. onde não se insere, para fixar-se depois na face
anterior do corpo do áxis (18'). A seguir, se pro-
A seguir, vejamos os ligamentos: longa por toda a face anterior da coluna vertebral
- o ligamento occípito-odol1tóide médio (1). muito até o sacro para inserir-se, em cada nível, na mar-
curto e espesso, que se estende verticalmente en- gem anterior dos discos intervertebrais (18") e na
tre o processo basilar do occipital e o vértice da face anterior dos corpos vertebrais (18"').
apófise odontóide; Os arcos posteriores estão unidos pelos ligamentos
- o ligamento trans\'erso (3). visto em secção, em seguintes:
contato com a face articular posterior da apófise - o ligamento atlantooccipital posterior (19), tam-
odontóide (i):
bém denominado membrana atlantooccipital, une
- o ligamento occípito-trans\'erso (4). entre a mar- a margem posteri<;>rdo forame magno ao arco
gem superior do ligamento transverso e o proces- posterior do atlas. E o equivalente de um ligamen-
:'0 basilar do occipita!: to amarelo e apresenta um orifício por trás das
- o ligamento tral1s\'ersoaxoidiano (5). entre a mar- massas laterais do atlas, onde a artéria occipital
gem inferior do ligamento transverso e a face pos- penetra e por onde o primeiro nervo cervical sai;
terior do corpo do áxis. - o ligamento atlantoaxóideo posterior (21), mem-
Estes três ligamentos: tranS\'erso, occípito-transverso brana atlantoaxial, que une os arcos posteriores
e transversoaxoidiano formam o ligamento crucifol7ne. do atlas e do áxis como se fosse um ligamento
amarelo; atrás da articulação existe um orifício
- o ligamento occípito-axoidiano médio (7). por por onde sai o segundo nervo cervical;
trás do ligamento cruciforme, se estende do pro-
cesso basilar até a face posterior do corpo do áxis. - um ligamento interespinhal (22) une o arco poste-
Ele prolonga-se lateralmente pelos ligamentos oc- rior do atlas com a apófise espinhosa do áxis, e
cípito-axoidianos laterais, invisíveis neste corte; depois, por baixo, com as apófises espinhosas das
vértebras cervicais entre si;
- a cápsula da articulação atlantooccipital (9) se
pode observar no fundo. Ústa em perspecti\a; - o ligamento cervical posterior (23), septo fibroso
muito espesso, equivale a um ligamento supra-es-
- o ligamento vertebral comum posterior (ligamen-
pinhal; se insere, acima, na escama occipital, no
to longitudinal posterior) (12), situado atrás dos
nível da linha média, e separa as massas muscula-
ligamentos occípito-axoidianos médios e laterais,
res da nuca em duas metades direita e esquerda;
se insere no sulco do processo basilar e sobre a
margem inferior do áxis e se prolonga por toda a - a cápsula da articulação interapofisáría (24), entre
coluna até o canal sacra!: o áxis e a terceira cervical, limita o forame interver-
tebral por trás, por onde sai o terceiro nervo cervical;
~ o ligamento atlantooccipital anterior, localizado
na frente do ligamento occípito-odontóide médio, - um ligamento amarelo (29) une o arco posterior
formado por uma lâmina profunda (13) e uma lâ- do áxis com o arco posterior da terceira vértebra
mina superficial (14). se estende da face inferior cervical.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 189

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Fig.5-25
190 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS SUBOCCIPITAIS

Para compreender a disposição destes liga- - o ligamento occípito-transverso (4) foi


mentos, representamos em primeiro lugar uma vis- seccionado ao nível da margem superior
ta posterior da coluna cervical (fig. 5-26), após ter do ligamento transverso e deslocado pa-
realizado uma secção vértico-frontal no nível dos ra Cima;
arcos posteriores, que foram removidos. Encontra- - o ligamento transversoaxoidiano (5)
mos os mesmos elementos que no corte da página também foi seccionado e deslocado pa-
anterior. Além do mais, se podem observar: ra baixo.
- os côndilos occipitais (c); No plano médio (fig. 5-28) se distinguem:
- as massas laterais do atlas (d); - o ligamento cruciforme, intato (6),
- as articulações atlantoaxiais com a face constituído pelos ligamentos transver-
articular inferior das massas laterais do sos, occípito-transverso e transver-
atlas (1) e a face articular superior do soaxoidiano;
áxis (m); -lateralmente aparece a cápsula da arti-
- a secção do pedículo e da apófise articu- culação atlantooccipital (9) reforçada
lar do áxis (t); por fora pelo ligamento atlantooccipital
lateral (10);
Neste plano esquelético se fixam os seguin-
tes ligamentos: - no segmento subjacente, a cápsula da
No plano profundo (fig. 5-27): articulação atlantoaxial (11).
- o ligamento occípito-odontóide médio No plano superficial (fig. 5-29), se loca-
lizam:
(1);
- os dois ligamentos occípito-odontóide - o ligamento occípito-axial médio (7),
laterais (2); prolongado lateralmente pelos ligamen-
tos occípito-axiais laterais (8);
- o ligamento transverso (3), que se esten-
de lateralmente de uma massa lateral do - o ligamento vertebral comum posterior
atlas até a outra; (ligamento longitudinal posterior) (12).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 191

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9

11 8

12

Fig.5-28 Fig.5-29
192 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS SUBOCCIPITAIS
(continuação)

Na metade esquerda da página, representa- - os ligamentos occípito-axiais médio (7)


mos as vistas esqueléticas, enquanto na metade e lateral (8);
direita se acrescentaram os ligamentos. - a cápsula da articulação atlantooccipital
Numa vista esquelética anterior (fig. 5-30) (9) reforçada pelo ligamento atlantoocci-
se observam todos os elementos descritos ante- pitallateral (10). Por último, se pode ob-
riormente. servar como a artéria vertebral sobe pe-
Os ligamentos anteriores (fig. 5-31) com- los orifícios das apófises transversas e co-
preendem: mo se incurva para trás e depois para den-
tro para contornar a massa lateral do atlas
- o ligamento atlantooccipital anterior
por trás (25).
com o seu feixe profundo (13) e seu fei-
xe superficial (14), que recobre a cápsu- No lado esquerdo se representaram os liga-
la da articulação atlantooccipital (9); mentos posteriores:
- o ligamento atlantooccipital ântero-Ia- - o ligamento atlantooccipital pOSTerior
teral (15) o cobre pela frente; se estende (19), recoberto por um ligamento atlan-
obliquamente do processo basilar do oc- to-occipital lateral (20) que se estende
cipital até a apófise transversa do atlas; da escama occipital até a apófise trans-
versa do atlas;
--o ligamento atlantoaxial anterior (16) é
lateralmente a continuação da cápsula - o ligamento atlantoaxial posterior (21);
da articulação atlantoaxial (11); - os ligamentos interespinhais (22), reco-
- o ligamento vertebral comum anterior (li- bertos pelo ligamento cervical posterior,
gamento longitudinal anterior) (18) só es- que só estão representados na sua meta-
tá representado na sua metade esquerda; de esquerda;
- a cápsula da articulação entre o áxis e - por último, a cápsula da articulação en-
C; (23). tre o áxis e C3 (24);
Uma vista posterior dos elementos esquelé- - também se pode ver o primeiro nervo cer-
ticos (fig. 5-32) mostra os arcos posteriores do vical (26) saindo pelo orifício de penetra-
atlas, do áxis e de C3• entre os quais se pode ver ção da artéria vertebral e o segundo nervo
o canal vertebral e entre a escama do occipital e cervical (27), cujo nível posterior consti-
do atlas, o forame magno. tui o grande nervo occipital de Amold.
Na vista posterior dos ligamentos (fig. O nível posterior do terceiro nervo cervical
5-33), no lado direito, representamos os ligamen- (28) é um erro do desenho, visto que, na verda-
tos que recobrem a face anterior do canal verte- de, ele sai pelo forame intervertebral, isto é. pe-
bral (representados anteriormente na figo 5-29): la frente da articulação (24).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 193

'p 23 18

Fig.5-30 Fig.5-31

19 8 9 10
194 FISIOLOGIA ARTICULAR

CONSTITUIÇÃO DE UMA VÉRTEBRA CERVICAL

Uma vista póstero-superior de uma vérte- formando uma inclinação de 15°. A ex-
bra cervical (fig. 5-34) mostra as diferentes par- tremidade póstero-intema do sulco co-
tes que a constituem, representadas também nu- meça no forame Íntervertebral; a sua
ma vista "desarmada" (fig. 5-36): extremidade ântero-Iateral é flanqueada
- o corpo da vértebra (1) com o seu pla- por dois tubérculos, o anterior e o pos-
tõ superior (2) tem duas proeminências terior, nos quais se inserem os músculos
planas transversalmente de cada lado, os escalenos. Quanto ao seu fundo, ele é
processos unciformes (3 e 3'), ou uncus, perfurado pelo forame intervertebral pe-
entre os que se encaixam as faces articu- lo qual ascende a artéria vertebral. O
lares correspondentes ao platô inferior nervo cervical, após sair do canal verte-
da vértebra superior. Também se pode bral pelo foram e intervertebral, passa
observar a superfície (4) da borda ante- pelo sulco da apófise transversa, de mo-
rior do platô superior, assim como o bi- do que cruza perpendicularmente a arté-
co (5), que prolonga para baixo e para a ria vertebral para desembocar entre os
frente a margem anterior do platô infe- dois tubérculos da apófise transversa;
rior. Em conjunto, o platô superior é - a perfuração do fundo da apófise trans-
côncavo transversalmente e convexo de
versa faz com que esta pareça ter a sua
diante para trás e, através do disco inter- origem em duas raízes, uma que se fixa
vertebral, se articula com o platô infe-
diretamente no corpo vertebral e a outra
rior da vértebra suprajacente, platô con-
vexo transversalmente e côncavo de na apófise articular;
diante para trás. Este conjunto articular - as apófises articulares (9 e 9') estão si-
tem a forma de uma sela de montar a ca- tuadas para trás e para fora do corpo da
valo e, principalmente, permite movi- vértebra ao qual estão unidas pelos pedí-
mentos de flexão-extensão; os movi- culos (6 e 6'); elas suportam asfaces ar-
mentos laterais estão limitados pela pre- tindares das que se podem observar
sença dos processos unciformes que aqui as superiores (10 e 10'), que se ar-
"conduzem" os deslocamentos ântero- ticulam com as faces inferiores da vérte-
posteriores durante a flexão-extensão; bra suprajacente;
- na parte posterior da face lateral do cor- - o arco posterior completa-se com as lâ-
po vertebral se implantam, por um lado, minas (11 e 11') unindo-se na linha mé-
os pedículos vertebrais (6 e 6'), ponto dia ao nível da base da apófise espinho-
de origem do arco posterior e, por ou- sa (12) que é bífida;
tro, a raiz anterior da apófise transver-
- deste modo, o arco posterior está consti-
sa (7 e 7'). As apófises transversas cer-
tuído sucessivamente pelos pedículos,
vicais se caracterizam pela· sua forma e
as apófises articulares, as lâminas e a
orientação (fig. 5-35): escavadas como
apófise espinhosa;
se fosse um sulco de concavidade supe-
rior, se dirigem para a frente e para fo- - o forame intervertebral é limitado abai-
ra, num plano que forma um ângulo de xo pelo pedículo, para dentro pelo corpo
60° com o plano sagital; além do mais, vertebral e o processo unciforme e, por
elas são levemente oblíquas para baixo, fora, pela apófise articular.
3. TRONCO E COUJNA VERTEBRAL 195

Fig.5-34
10
3' 12

11

10'

9'

Fig.5-35 Fig.5-36
196 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS LIGAMENTOS DA COLUNA CERVICAL INFERIOR

Acabamos de ver os ligamentos, muito es- cápsula (6) que está representada aberta (6');
peciais, que unem as vértebras da coluna suboc- entre as lâminas vertebrais se estendem, de cada
cipital entre si; alguns deles seguem pela coluna lado, uns ligamentos amarelos (7); um deles es-
cervical inferior. tá representado seccionado (7').
Os elementos fibroligamentares que unem As apófises espinhosas (j) estão unidas en-
as vértebras cervicais inferiores podem ser vis- tre si pelos ligamentos interespinhais (8), pro-
tos detalhadamente num corte em perspectiva longados para trás por um ligamento supra-es-
(fig. 5-37) que mostra uma vértebra cervical sec- pinhal, muito bem individualizado na coluna
cionada no plano sagital com o seu platô supe- cervical num ligamento cervical posterior (9);
rior (a) e o seu processo unciforme (b); esta vér- nas suas duas faces se inserem o trapézio e o
tebra está unida com a vértebra subjacente pelo esplênio.
disco intervertebral, que no corte apresenta duas As apófises transversas, com os seus tubér-
partes bem visíveis: o anel fibroso (1) e o núcleo culos anterior (e) e posterior (f), estão unidas en-
pulposo (2). tre si pelos ligamentos intertransversos (10).
Pela frente dos corpos vertebrais se estende Podem-se observar na apófise transversa o
o ligamento vertebral comum anterior (ligamen- forame vertebral ou transverso (g) e os fora-
to longitudinal anterior) (3), por trás o ligamen- mes intervertebrais (y), limitados acima pelo
to vertebral comum posterior (ligamento longi- pedículo vertebral (h), por trás e por fora pelas
tudinal posterior) (4). Uma cápsula (5) comple- apófises articulares e pela articulação interapo-
ta as articulações uncovertebrais nos lados. fisária, pela frente e por dentro, pelo corpo ver-
As articulações interapofisárias põem em tebral, pelo disco intervertebral (1) e pelo pro-
contato as faces articulares (d), unidas por uma cesso unciforme (b).
3. TRONCO E COLl~A VERTEBRAL 197

b 5 d 6'

1
2

10 8

c
Fig.5-37
198 FISIOLOGIA ARTICULAR

FLEXÃO-EXTENSÃO NA COLUNA CERVICAL INFERIOR

Na posição neutra, os corpos vertebrais Durante o movimento de flexão, o corpo


(fig. 5-38, vista de perfil) estão unidos por um da vértebra suprajacente (fig. 5-42) se inclina e
disco intervertebral cujo núcleo está em posição se desliza para diante, o que diminui a espes-
estável e todas as lâminas do anel fibroso estão sura da porção anterior do disco intervertebral
submetidas à mesma tensão. Além do mais, as e desloca o núcleo para trás, fazendo com que
vértebras cervicais (fig. 5-39) entram em conta- as fibras posteriores do anel fibroso entrem em
to através das suas apófises articulares, cujas fa- tensão; este movimento de inclinação da vérte-
ces estão incluídas num plano oblíquo para bai- bra suprajacente está favorecido pela superfície
xo e para trás. Na parte baixa da coluna cervical do platô superior da vértebra subjacente, que
inferior, estas faces possuem no plano parassagi- deixa passar o bico do platô inferior da vérte-
tal uma leve curvatura côncava para a frente, que bra suprajacente. Como no caso da extensão, a
corresponde a um centro de curvatura (marcado flexão da vértebra suprajacente (fig. 5-43) não
com uma cruz) situado bastante longe para bai- se realiza ao redor do centro de curvatura das
xo e para a frente; devido à lordose cervical, os faces articulares, o que provoca, automatica-
centros de curvatura estão separados um com- mente, uma abertura entre estas faces: a face
primento um pouco maior do que separa o plano articular inferior da vértebra suprajacente se
das superfícies articulares. Mais adiante, na pá- desloca para cima e para diante, ao mesmo
gina 202, se poderá analisar o significado da tempo que se produz uma abertura para baixo
convergência destes eixos. e para trás, formando um ângulo y' igual ao
Durante o movimento de extensão, o cor- ângulo y de flexão e ao ângulo y" formado pe-
las medianas das faces articulares. O movimen-
po da vértebra suprajacente (fig. 5-40) se inclina
e se desliza para trás; o espaço entre os platôs to de flexão não é limitado pelos ressaltos ós-
vertebrais se estreita mais para trás que para seos, mas somente pelas tensões ligamentares:
diante, o núcleo pulposo se desloca levemente tensão do ligamento vertebral comum posterior
para diante e, deste modo, as fibras anteriores (ligamento longitudinal posterior), da cápsula
do anel fibroso entram em tensão. Este movi- da articulação interapofisária, dos ligamentos
mento de deslizamento para trás do corpo verte- amarelos, dos ligamentos interespinhais e do li-
bral não se realiza ao redor do centro de curva- gamento supra-espinhal ou ligamento cervical
tura das faces articulares e, conseqüentemente posterior. Nos acidentes de automóvel por cho-
(fig. 5-41), aparece uma abertura na articulação que traseiro ou dianteiro, a coluna cervical é,
interapofisária: de fato, a face articular supe- freqüentemente, bruscamente lançada, primei-
rior não só se desliza para baixo e para trás em ro em extensão e depois em flexão: se trata da
relação à face articular inferior, mas também lesão "em chicotada" que produz um alonga-
forma com esta um ângulo x' igual ao ângulo de mento e inclusive rupturas nos diferentes liga-
extensão x, encontrado novamente em x" o ân- mentos e, no extremo, uma luxação anterior
gulo formado pelas medianas das faces articula- das apófises articulares: as apófises articulares
res. O movimento de extensão é limitado pela inferiores da vértebra suprajacente se engan-
tensão do ligamento vel1ebral comum anterior cham no bico ântero-superior das apófises arti-
(ligamento longitudinal anterior) e, principal- culares da vértebra subjacente; este tipo de lu-
mente, pelos ressaltos ósseos: o choque da apó- xação com "enganchamento" das apófises ar-
tindares é muito difícil de reduzir e põe em pe-
fise articular superior da vértebra inferior sobre
rigo tanto a medula oblonga quanto a medula
, a apófise transversa da vértebra superior e, prin-
cipalmente, o contato dos arcos posteriores cervical, com risco de morte súbita, de quadri-
através dos ligamentos. plegia ou de paraplegia.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 199

Fig.5-40

EXT.

Fig.5-41
E
Fig.5-38
NEUTRA

Fig.5-42

Fig.5-43
200 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS NAS ARTICULAÇÕES UNCOVERTEBRAIS

Até agora estudamos os movimentos nas Durante os movimentos de inclinação


articulações interapofisárias e nos discos inter- (fig. 5-45), nestas articulações uncovertebrais
vertebrais, porém na coluna cervical existem, se produzem movimentos de abertura, cujo ân-
em cada segmento, duas pequenas articulações gulo â e â é igual ao ângulo de inclinação â que
suplementares: as articulações uncoverte- aparece novamente no ângulo formado pelas
brais. Em corte frontal (fig. 5-44), se pode ob- duas horizontais nn' e mm' que passam pelas
servar, entre os dois platás vertebrais, o disco apófises transversas. Também neste esquema
com o núcleo e o anel fibroso, mas o disco não se podem constatar o deslocamento do núcleo
chega até a margem da vértebra. De fato, no pulposo em direção à convexidade da curvatu-
platá superior sobressaem dois processos situa- ra e a tensão da cápsula da articulação unco-
dos no plano sagital, os processos unciformes, vertebral do mesmo lado.
cuja face articular interna, orientada para cima e Na verdade, os movimentos na articulação
para dentro, é recoberta de cartilagem e corres- uncovertebral são muito mais complexos: de fa-
ponde na margem Ínfero-Iateral do corpo verte- to, mais adiante poderemos comprovar como
bral suprajacente a uma face articular semilu- não existe movimento de inclinação, mas movi-
nar, orientada para baixo e para fora recoberta mentos de inclinação combinados com movi-
de cartilagem. Esta pequena articulação se en- mentos de rotação e de extensão. Portanto. nas
contra no interior de uma cápsula articular que articulações uncovertebrais existem aberturas
se confunde por dentro com o disco interverte- para cima e para baixo e também deslizamentos
braI.
para trás e aberturas para afrente. Isto é o que
Nos movimentos de flexão-extensão, os dois esquemas em perspectiva transparente
quando o corpo vertebral suprajacente se desliza (fig. 5-46 A e B) sobre vértebras muito esque-
para diante ou para trás, se produz um desliza- matizadas tentam fazer compreender. Seria
mento concomitante entre as faces das articula- conveniente que eles fossem vistos após ter-se
ções uncovertebrais. Os processos unciformes assimilado o mecanismo dos movimentos de
"conduzem" o corpo vertebral neste movimento. inclinação-rotação.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 201

Fig.5-44 Fig.5-45

A B
Fig.5-46
202 FISIOLOGIA ARTICULAR

A ORIENTAÇÃO DAS FACES ARTICULARES -


O EIXO MISTO DE ROTAÇÃO-INCLINAÇÃO

Os movimentos de inclinação e de rotação na o eixo misto de rotação-inclinação continua sen-


coluna cervical inferior estão detenninados pela do o eixo A da figura 5-47.
orientação das faces das apófises articulares, que Numa radiografia de perfil da coluna cervical
não permitem nem movimentos de rotação pura, (fig. 5-50) é fácil traçar a direção do plano das fa-
nem movimentos de inclinação pura. ces articulares:
De fato, se considerarmos uma vértebra de - estes planos a, b, c, d, e,f são oblíquos com
situação média, como por exemplo a quinta cer- relação à vertical;
vical (fig. 5-47), podemos comprovar que as suas
- porém, além disso, a sua obliqiiidade é
faces articulares superiores são planas e estão in-
crescente de baixo para cima: o plano f, que
cluídas num mesmo plano P oblíquo para baixo e
corresponde à interlinha C7-Tj, só tem uma
para trás. Por conseguinte, qualquer deslizamen-
to da quarta cervical que a ultrapasse só pode ser inclinação de 10° sobre a horizontal. Contu-
de dois tipos: do, o plano a da interlinha C2-C3 é inclina-
do de 40 a 45° sobre a horizontal. Portanto,
- seja um deslizamento global para cima, se existe um ângulo de 30 a 35° entre o plano
trata então de uma flexão ou deslizamento
global para baixo no caso da extensão;
f
da interlinha inferior e o da superior a.
Contudo, estes planos não convergem exata-
- seja um deslizamento desigual: uma das mente num mesmo ponto: existem certas irregula-
faces articulares de C4, por exemplo a es- ridades na progressão da obliqüidade de baixo pa-
querda, se eleva para cima e para diante ra cima; os três últimos planos (d, e, f) são quase
(seta a), enquanto a face articular direita paralelos, enquanto os três primeiros (a, b, c) são
vai para baixo e para trás (seta b). Deste muito convergentes.
modo, este deslizamento desigual no plano
P é uma rotação em tomo de um eixo A Por conseguinte, se traçarmos uma mediana
perpendicular ao plano P, eixo situado no em cada face articular, esta representaria a proje-
plano sagital e por isso, na mediana da lin- ção no plano sagital do eixo de rotação mista A, que
ha que une o centro das faces articulares de já vimos na figura 5-47. A obliqüidade destes eixos
Cs. A rotação de C4 ao redor do eixo A,
(1,2,3,4,5 e 6) também é regularmente crescente
oblíquo para baixo e para diante, faz com e se inscreve num ângulo de 30 a 35°, mas, fato im-
que se realize sobre Cs, ao mesmo tempo, portante, o eixo mais baixo (6) é quase vertical, o
um movimento de inclinação e de rotação, que implica uma rotação quase pura, enquanto o
ambos para a direita. Se trata neste caso de eixo mais elevado (1) está inclinado de 40 a 45° so-
um movimento misto de rotação-inclina- bre a vertical, o que implica uma igualdade entre a
ção que depende da obliqüidade do eixo A. inclinação e a rotação (ver pág. 206).
Os cortes horizontais realizados nas articula- Neste esquema (fig. 5-50), também está representada,
ções interapofisárias (fig. 5-48) mostram que as fa- com pequenas cruzes, a localização dos centros motores se-
gundo o diagrama de Penning, que corresponde à localiza-
ces articulares, nas partes superior e inferior, não
ção do eixo transversal de fiexão-extensão de cada uma das
são rigorosamente planas; elas apresentam uma le- vértebras suprajacentes. Notar que quanto mais baixo vamos
ve convexidade para trás em C6 e C7 (fig. 5-48 A), para a base da coluna cervical, mais se desloca o centro mo-
ou uma leve concavidade para trás em C3 e C.; (fig. tor para cima e para a frente do corpo vertebral. A posição
5-48 B). Isto não contradiz, de jeito nenhum, a de- destes centros motores não corresponde exatamente ao que
monstração anterior, visto que então se pode consi- poderia construir-se pela intersecção das medianas dos dois
elementos móveis da vértebra suprajacente, por uma parte, a
derar que o plano P (fig. 5-47) ficaria substituído por
mediana da sua face articular inferior, e, por outra, a media-
uma supelfície esférica de raio maior, cujo centro
na do seu platô inferior. Esta posição teórica está representa-
se localizaria no eixo A, seja para baixo da vértebra da no esquema por pequenas estrelas, enquanto os centros
no caso de C6 e C7 (fig. 5-49 A), seja para cima da motores se deduzem de decalques das radiografias de perfil,
vértebra no caso de C3 e C. (fig. 5-49 B); portanto, realizadas em posições extremas de flexão e de extensão.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 203

Fig.5-48

Fig.5-47

A
204 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS COMBINADOS DE INCLINAÇÃO-ROTAÇÃO


NA COLUNA CERVICAL INFERIOR

Acabamos de ver que, em cada segmento, a - no plano frontal (F), o componente de


rotação ao redor do eixo oblíquo realizava um mo- inclinação;
vimento misto de inclinação e de rotação. Se ago-
ra se considerar toda a coluna vertebral inferior - no plano sagital (S), o componente de
extensão;
entre C2 e TI, se pode comprovar que se acrescen-
ta um componente de extensão (fig. 5-51). De fa- - e no plano transversal ou horizontal
to, partindo de uma vértebra TI, situada exatamen- (H), o componente de rotação.
te no eixo, o movimento entre C7 e TI vai terminar
numa rotação-inclinação de C7 e o movimento en- Portanto, se pode afirmar que, além dos
tre C6 e C7, que parte de uma posição de inclina- movimentos de flexão-extensão, a coluna cer-
ção-rotação ocasiona desta vez, além de uma rota- vical só pode realizar movimentos sempre se-
ção e uma inclinação, também uma extensão e es- melhantes a si mesmos, estereotipados, movi-
te mecanismo vai acentuar-se de baixo para cima, mentos mistos de inc1inação-rotação-extensão,
de tal modo que se projetarmos o movimento mis- estando o componente de extensão, em certa
to da coluna cervical inferior em conjunto sobre os medida, automaticamente compensado por
três planos de referência, ou realizarmos radiogra- uma flexão na mesma coluna cervical inferior.
fias de frente e de perfil (infelizmente é impossível Ao contrário, se poderá ver que os outros com-
realizar radiografias transversais), se pode apre- ponentes só podem ser compensados na coluna
ciar como aparecem os seguintes componentes: cervical superior.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 205

Fig.5-51
206 FISIOLOGIA ARTICULAR

DETERMINAÇÕES GEOlVIÉTRICAS DOS COMPONENTES


DE INCLINAÇÃO E DE ROTAÇÃO

Para entender corretamente o mecanismo Além disso:


destes movimentos mistos se pode realizar uma
demonstração geométrica simples. KM
sen a = - onde KM = OK.sen a;
Um esquema no espaço (fig. 5-52) per- OK
mite imaginar os efeitos da rotação ao redor do
eixo UU', dirigido, como o eixo misto de incli- Ta d = -KL ou também Itg d = --- tg b
nação-rotação, obliquamente para baixo e para b KM sen a
diante. Este eixo se localiza no plano sagital, de-
terminado pelo eixo de referência vertical ZZ' e
pelo eixo de referência horizontal YY'; se dirige Esta demonstração é interessante porque
para a intersecção dos três eixos retangulares permite verificar os dois casos extremos:
vertical ZZ', sagital YY' e transversal XX'. Se 1. se o eixo UU' é vertical, o ângulo â é nu-
um segmento OK perpendicular ao eixo UU' gi- lo e, portanto, cos a = 1, portanto se de-
rar ao redor deste eixo, por exemplo, para a di- duz que tg c = tg b; de modo que c = b;
reita, ele toma a posição OL. Simultaneamente, o que significa que quando o eixo é ver-
a sua projeção O'M no plano horizontal toma a tical, toda rotação em tomo deste eixo
posição O·N e, do mesmo jeito que a sua proje- determina uma rotação pura sem nenhu-
ção O"K' no plano frontal toma a posiçã~ Illa inclinação;
S~~ determinar o valor dos ângulos K~L'
e MO'N em função do ângulo de rotação KOL e 2. pelo contrário, se o eixo UU' pudesse ser
horizontal (isto é impossível), sen a = 1,
da inclinação do eixo UU' sobre a vertical.
do que se deduz que tg d = tg b e d = b;
Esta demonstração pode realizar-se num o que significa que toda rotação em tor-
esquema simplificado (fig. 5-53), no qual apare- no ao eixo UU' horizontal seria uma in-
ce de novo o eixo UU' formando um ângulo â clinação pura.
com a vertical (v), um segmento OK em posição
Contudo, existe um caso intermediário de
de partida e OL em posição de chegada após
inclinação a 45° do eixo UU' sobre a vertical;
uma rotação de um ângulo b em tomo do eixo
neste caso, se demonstra da mesma maneira que
UU'. Faltam calcular 9 ângulo de rotação â e o
o ângulo J de inclinação é igual ao ângulo ê de
ângulo de inclinação d.
rotação.
Para os que estejam interessados por esta
demonstração matemática, eis aqui a seqüência Voltando à figura 5-52, se pode comprovar
do raciocínio: que quando a vértebra gira sobre a vértebra sub-
jacente, um ângulo I{ôt arrasta com ela o eixo
MN KL KL VI' porque se articula com a vértebra supraja-
tgc=- =- tg b = - onde cente. Então este eixo gira em V e, saindo do
2

OM OM OM plano sagital, passa a ser oblíquo em relação aos


três eixos de referência, o que explica que a par-
OM tir deste momento apareça um novo componen-
KL= OK.tg b; cos a = -- portanto te de extensão. Poderiam calcular-se os compo-
OK
nentes sucessivos nos seis segmentos; mas para
OM = OK.cos a resultado: isto necessitaríamos de usar um computador,
visto que as fórmulas incluiriam tangentes de
tg b tangentes de tangentes até o sexto grau. Portan-
tg c = cos a to, para entender estes movimentos é muito mais
simples recorrer a um modelo mecânico.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 207

Fig.5-52

Fig.5-53
208 FISIOLOGIA ARTICULAR

MODELO MECÂNICO DA COLUNA CERVICAL

Partindo destas concepções mecânicas e da • um eixo vertical situado no centro do


divisão funcional entre a coluna cervical superior platô do atlas;
suboccipital e a coluna cervical inferior, foi cria- • dois eixos perpendiculares entre si e
do um modelo mecânico (fig. 5-54) que permite em relação ao eixo vertical, visíveis no
pôr em evidência os diferentes tipos de funciona- esquema, que formam um cardão e que
mento das articulações da coluna cervical (I). representam, por um lado, o eixo de in-
Na coluna cervical inferior, isto é, entre clinação lateral da atlantooccipital, e,
C2 e TI, só se realizaram movimentos mistos de por outro, o eixo de flL ..•..
ão-extensão
inclinação-rotação, ao redor de eixos oblíquos nesta mesma articulação.
(ver pág. 210), respeitando a sua obliqüidade Em resumo, a coluna suboccipital repre-
anatômica e a sua disposição em relação aos senta uma cadeia articular de três eixos e
corpos vertebrais que, neste modelo, não apre- com três graus de liberdade assegurando a
sentam nenhuma articulação discal entre si; pe- união entre C1 e o occipital, representado neste
lo contrário, estes eixos constituem, por si só, os modelo por uma pequena placa horizontal, uni-
freios do movimento de inclinação-rotação. A da com os três planos principais de referência
eliminação deliberada dos movimentos de fle- da cabeça:
xão-extensão nesta parte do modelo permite que
os movimentos de inclinação-rotação apareçam - o plano sagital, em traços claros;
de maneira especialmente explícita. - o plano frontal, em branco;
A coluna cervical suboccipital foi realiza- - e o plano transversaL em traços escuros.
da segundo os equivalentes mecânicos; de fato, Este modelo permite entender como os dois
se pode distinguir:
segmentos da coluna se completam funcional-
- um eixo vertical que corresponde à mente; assim, no esquema se pode ver que o mo-
apófise odontóide e que permite, além vimento de inclinação-rotação à direita da co-
dos movimentos de rotação, alguns mo- luna cervical inferior se transfonna na coluna
vimentos de flexão-extensão do platá suboccipital num movimento de inclinação pu-
elíptico que representa o atlas, graças a ra, graças à eliminação dos componentes não
um jogo mecânico introduzido volunta- desejados.
riamente entre ele e o corpo de C2;
- um conjunto de três eixos ortogonais (llFar ser muito difícil de realizar segundo o método
de pouca amplitude que correspondem à de modelos para cortar e armar, este modelo foi elaborado
articulação atlantooccipital: para ser realizado em material plástico.
210 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MOVIMENTOS DE INCLINAÇÃO-ROTAÇÃO
NO MODELO DA COLUNA CERVICAL

Se observarmos agora detalhadamente a co- cessiva for aplicada em tomo dos seis eixos des-
luna cervical inferior (fig. 5-55), poderemos te modelo, se poderia ver como ele realiza, ao
apreciar que, funcionalmente, a cada corpo ver- mesmo tempo, um movimento de inclinação e de
tebral corresponde um arco posterior representa- rotação (fig. 5-56), cujos 50° correspondem à
do por uma pequena tábua inclinada para baixo e amplitude de rotação da coluna cervical inferior
para trás e provida de uma peça em forma de e também um leve componente de extensão que
cunha. Se esta figura é comparada com a figura 5- quase não é visível nestes esquemas.
50, se pode comprovar que o papel destas cunhas Assim sendo, notar a forma da face supe-
é o de reconstituir a convergência do plano das rior de C2 que representa funcionalmente a arti-
superfícies articulares e, portanto, realizar a lor- culação atlantoaxial:
dose cervical. Em cada um destes planos de su-
- a forma convexa de diante para trás
perfície articular se implanta perpendicularmen-
te o eixo oblíquo, representado neste caso por um que corresponde às faces articulares
parafuso, e que permite a articulação com a vér- superiores do áxis e permite movimen-
tebra suprajacente. Deste modo, esta vértebra su- tos de flexão-extensão do atlas (não re-
prajacente só pode ser deslocada, com relação à presentados aqui);
que está situada acima, nos movimentos de rota- - o eixo vertical que ultrapassa e repre-
ção ao redor deste eixo oblíquo, tal como se ex- senta funcionalmente a apófise odontói-
plicou na figura 5-50. Então, se uma rotação su- de e permite os movimentos de rotação.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 211

Fig.5-56

Fig.5-55
212 FISIOLOGIA ARTICULAR

COMPARAÇÕES ENTRE O MODELO E A COLUNA CERVICAL DURANTE


OS MOVIMENTOS DE INCLINAÇÃO-ROTAÇÃO

Se olharmos o modelo de frente (fig. 5-57) cumentos se pode deduzir que na coluna cervi-
durante um movimento de rotação pura, pode- cal existem, como já demonstraram Fick e We-
mos comprovar que o movimento de inclinação- ber no fim do século XIX, movimentos de incli-
rotação unívoco da coluna cervical inferior rea- nação sempre associados à rotação e que, por
liza uma inclinação total de 25°. outro lado, como manifestaram mais recente-
Se, além disso, se obtém urna radiografia, mente Penning e Brugger, os movimentos de in-
exclusivamente de frente, da coluna cervical no clinação da coluna cervical inferior são compen-
percurso de um movimento de rotação pura da sados pela coluna cervical suboccipital para
cabeça (fig. 5-58), encontramos novamente este conseguir a rotação pura e, vice-versa, os movi-
movimento de inclinação que se traduz ao nível mentos da coluna cervical inferior são compen-
do áxis numa inclinação exatamente igual a 25° sados pela coluna cervical suboccipital para
sobre a vertical. Da comparação destes dois do- conseguir uma inclinação pura (ver figo5-54).

AS COMPENSAÇÕES NA COLUNA SUBOCCIPITAL

Esta vista detalhada do modelo da coluna xo de flexão-extensão da articulação


cervical (fig. 5-59) em posição de rotação pura atlanto-occipital;
mostra perfeitamente a constituição mecânica da - este último (3) está sustentado por dois
coluna cervical superior, assim corno os compo- fiancos verticais (D') unidos com um
nentes compensadores que ela introduz para rea- platá horizontal (D) que gira sobre o
lizar o movimento de rotação pura. platá (E) graças a um eixo vertical (2)
De cima para baixo se podem observar: que representa o eixo de rotação da arti-
- o platá horizontal (A) que representa a culação atlantooccipital (oculto por C);
base do occipital; - o platá E, equivalente funcional do atlas,
- na sua parte inferior, os dois suportes é articulado com o áxis (F) por um eixo
frontais para o eixo ântero-posterior (4) vertical (1) que representa a apófise
de inclinação da articulação atlantoocci- odontóide e representado neste caso por
pital; um parafuso que não está totalmente
apertado, o que permite, além dos movi-
- este eixo (4) se articula com a peça in- mentos de rotação, movimentos de fie-
termediária (C), atravessada por um ei- xão-extensão sobre a face superior con-
. xo transversal (3), que representa o ei- vexa do áxis F.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 213

Fig.5-58

Fig.5-57
214 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS COMPENSAÇÕES NA COLUNA SUBOCCIPITAL


(continuação)

Em resumo, se não se distinguem os diferentes Durante o movimento de rotação pura da ca-


elementos desta coluna suboccipital anatomicamen- beça para a direita (fig. 5-59), a rotação adicional da
te, se podem localizar perfeitamente os seus equiva- coluna suboccipital para a direita está assegurada pe-
lentes funcionais: la ação dos músculos oblíquo externo, reto anterior
~ o áxis F com a sua apófise odontóide: eixo I; do lado direito e pelo oblíquo interno esquerdo. To-
dos eles são, ao mesmo tempo, extensores, portanto
~ o atlas E, que se articula com a apófise realizam simultaneamente a extensão descrita ante-
odontóide e a face superior do áxis; riormente. A contra-inclinação para a esquerda é
~ o occipital A, que sobrepuja um conjunto conseguida através do oblíquo interno, do reto late-
funcional de três eixos perpendiculares entre ral esquerdo e do reto anterior menor esquerdo. A
si, os da articulação atlantoaxial: o eixo de ação flexora destes dois últimos músculos está cons-
rotação (2), o eixo de flexão-extensão (3) e o tituída pelo componente extensor dos anteriores.
eixo de inclinação (4). Estes dois últimos Durante o movimento de inclinação pura da
formam um sistema de "cardão" entre si.
cabeça para a direita (fig. 5-54), o componente de
Descritos os elementos da coluna suboccipital, contra-rotação para a esquerda se obtém pela con-
vamos seguir com o seu funcionamento: para obter tração dos músculos oblíquo externo, retos poste-
a rotação pura, uma vez que a coluna cervical infe- riores maior e menor do lado esquerdo, a inclina-
rior tenha realizado o seu movimento de inclinação- ção adicional para a direita pela ação dos músculos
rotação, a cadeia suboccipital, com três eixos e três retos posteriores maior e menor do lado direito e
graus de liberdade, deve realizar três componentes: pelo oblíquo interno direito. Por último, o compo-
nente de extensão destes músculos, assim como a
- um componente de rotação para a direita,
extensão na coluna cervical inferior e a que apare-
ao redor dos eixos I e 2, que prolonga a co-
ceria pela contra-rotação pura para a esquerda estão
luna cervical inferior e se realiza em gran-
compostos pelos músculos flexores: reto anterior e
de parte na articulação atlantoaxial (ângulo
reto anterior menor direitos, e reto lateral direito.
â) e menos na articulação atlantooccipital
(ângulo b); Desse modo, este modelo mecânico permite
- uma extensão ao redor do eixo 3 de um ân- compreender a relação anatômica e funcional entre:
gulo ê que compensa a flexão que aparece- - por um lado, a coluna cervical inferior, do-
ria por causa da rotação pura para a direita tada de movimento de enrolamento ou de tor-
sobre o eixo I; ção, que associa inclinação, rotação, exten-
- e, por último, um leve componente de con- são, e é provida de músculos longos, oblíquos
tra-inclinação de ângulo cÍ ao redor do eixo para baixo, para fora e para trás, tal como o
4; de fato, a maior parte da inclinação da esplênio do pescoço, grande torácico, trans-
coluna cervical inferior já está neutralizada verso do pescoço, sacrolombar, angular da es-
graças à extensão ao redor do eixo 3. cápula e, em menor grau, os escalenos; todos
estes músculos estão dispostos de forma ideal
Anatomicamente, os movimentos se realizam na
para realizar este movimento unívoco;
coluna suboccipital graças à ação dos pequenos mús-
culos suboccipitais (ver pág. 234) que se poderiam - por outro lado, a coluna cervical superior,
denominar músculos "nônio", visto que a sua função que constitui uma cadeia articular de três ei-
principal é a de ajustar de forma correta os compo- xos e três graus de liberdade, ativada, entre
nentes compensatórios a fim de neutralizar os movi- outros, pela ação dos pequenos músculos su-
mentos não desejados e fazer com que apareça, no seu boccipitais, músculos "nônio ", visto que a
,estado puro, o componente desejado. Assim, existe sua contração antagonista e sinérgica conse-
uma notável analogia entre os músculos "nônio" e os gue, eliminando nas articulações suboccipi-
foguetes "nônio" que, devido à sua exata ação calcu- tais os componentes não desejados proceden-
lada, permitem controlar a posição de um veículo es- tes da coluna cervical inferior, com que apa-
pacial em relação a pontos fixos de referência. reça unicamente o movimento desejado.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 215

da I I
r:-=O
'lt..... / /\\\\\\\\
.,-"\ D'
C
3
D A
1 2 A
A E
B

{'~U\~

Fig.5-59
216 FISIOLOGIA ARTICULAR

AMPLITUDE ARTICULAR NA COLUNA CERVICAL

A comparação de radiografias de perfil du- (fig. 5-61), podemos ver a amplitude total de in-
rante os movimentos extremos de flexão-exten- clinação, que é, aproximadamente, de 45°.
são (fig. 5-60) permite conhecer: Além disso, traçando uma linha que une as duas
- a amplitude total de flexão-extensão da apófises transversas do atlas por um lado, e, por
coluna cervical inferior (ReI = de 100 a outro, uma linha que une a base das apófises
110°); mastóides, encontramos aproximadamente,
uma amplitude de 8° na inclinação lateral da co-
- a amplitude total de flexão-extensão do luna suboccipital; isto é, somente na articula-
conjunto da coluna cervical em relação ção atlantooccipital.
ao plano mastigatório (RT = 130°);
A amplitude de rotação é mais difícil de ob-
- por uma subtração simples podemos de- servar, principalmente no que diz respeito às rota-
duzir a amplitude de flexão-extensão na ções elementares (fig. 5-62). A rotação total da
coluna suboccipital (SQ = 20 a 30°).
Do mesmo modo, nas radiografias ante-
ri01-es, tomadas com uma inclinação da cabeça
r
cabeça é de 80 a 90° de cada lado. Dentro desta
amplitude, se atribuem 1 à articulação atlanto-
occipital e outros 12° à articulação atlantoaxial.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 217

Fig.5-60

Fig.5-61 Fig.5-62
218 FISIOLOGIA ARTICULAR

EQUILÍBRIO DA CABEÇA SOBRE A COLUNA CERVICAL

A cabeça está em equilíbrio (fig. 5-63) plica também que existe um tônus permanente
quando os olhos estão na posição horizontal. dos músculos da nuca que não permitem a que-
Nesta posição, o plano mastigatório (PM), re- da da cabeça para a frente: quando, durante o so-
presentado por um papelão apertado entre os no em posição de sentado, este tônus diminui, o
dentes, também é horizontal, do mesmo modo queixo cai sobre o esterno.
que o plano aUrlculo-nasal (AN), que passa pe- A coluna cervical não é retilínea: ela apre-
la margem superior do conduto auditivo externo senta uma curva côncava para trás, ou Iordose
e pela espinha nasal. cervical, que se caracteriza:
A cabeça realiza, no seu conjunto, uma al-
- pela sua corda (C), reta, que se estende
vanca de interapoio:
dos côndilos occipitais até os ângulos
- o ponto de apoio O se situa nos côndilos póstero-inferiores da sétima vértebra
occipitais; cervical;
- a resistência G é realizada pelo peso da - e pela sua flecha (f), perpendicular, tra-
cabeça contra o seu centro de gravidade çada do ângulo póstero-inferior da quar-
localizado perto da sela túrcica; ta cervical até a corda.
- a potência F está constituída pela força Quanto maior é a lordose cervical, mais
dos músculos da nuca que, em todo acentuada será a flecha; porém, ela será nula se
momento, devem contrabalançar o pe- a coluna cervical for retilínea, e inclusive pode
so da cabeça que tem a tendência de ser negativa quando na flexão, ela seja côncava
cair para a frente. para a frente. Pelo contrário, a corda é, normal-
Esta situação anterior do centro de gravida- mente, mais curta que o comprimento da coluna
de da cabeça explica a potência relativa dos cervical, e só é igual a este comprimento num
músculos posteriores da nuca em relação aos único caso: quando a coluna cervical é retilínea.
músculos flexores do pescoço. De fato, os exten- Neste caso, encontramos um índice cervical si-
sores lutam contra a gravidade, ao passo que os milar ao índice de Domas, que já foi menciona-
flexores, a força da gravidade os reforça. Isto ex- do no primeiro capítulo (pág. 22).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 219

AN

PM

Fig.5-63
220 FISIOLOGIA ARTICULAR

CONSTITUIÇÃO E AÇÃO DO MÚSCULO ESTERNOCLEIDOMASTÓIDEO

o músculo estemoc1eidomastóideo deveria tuída, para baixo e para a frente, pelo tendão co-
ser denominado, para ser mais correto, estemo- mum do estemooccipital e do estemomastóideo.
c1eidooccípito-mastóideo (ECOM), visto que es- Estes dois músculos formam um corpo camoso
tá constituído por quatro porções (fig. 5-75): fusiforme perfeitamente visível debaixo da pele.
- uma porção profunda, o cleidomastói- Os dois tendões direito e esquerdo limitam a
deo (Cm), que se estende do terço inter- fosseta supra-estemal.
no da clavícula até a apófise mastóide; A contração unilateral (fig. 5-65) do
- três porções superficiais que, quando se- ECOM determina um movimento triplo que as-
paradas, formam um N, mas que, na ver- socia a rotação da cabeça para o lado oposto da
dade, estão unidas umas com as outras, sua contração, a inclinação para o lado da sua
exceto na parte ínfero-medial, próxima contração e a extensão. Este movimento dirige o
à extremidade medial da clavícula, na olhar para cima e para o lado oposto da contra-
que se forma a fosseta de Sédilot através ção do músculo. Esta atitude da cabeça é carac-
da qual se transparece o cleidomastói- terística do torcicolo congênito, que, freqüente-
deo. Estas três porções são: mente, é devido ao encurtamento de um dos
• a cleidooccipital (Co), que recobre a ECOM.
maior parte do cleidomastóideo e cu- Mais adiante, veremos os efeitos da contra-
jas inserções se estendem longe, por
ção simultânea dos dois ECOM, que dependem
trás, sobre a linha curva superior do
do estado de contração do resto dos músculos da
occipital;
coluna cervical:
• a estemooccipital (Eo);
- se a coluna cervical permanece flexí-
• e a estemomastóide (Em); ambas se
vel, esta contração bilateral provoca
inserem por um tendão comum na
uma hiperlordose da coluna cervical
margem superior do manúbrio ester-
com uma extensão da cabeça e uma
nal. A estemooccipital se une com as flexão da coluna cervical sobre a colu-
inserções da cleidooccipital na linha
curva superior; quanto à estemomas- na torácica (ver figo 92);
tóideo, ela se fixa na margem superior - se, ao contrário, a coluna cervical se
e margem anterior da apófise mastói- toma rígida e retilínea devido à contra-
de. ção dos músculos pré-vertebrais, a con-
En conjunto, o ECOM forma uma banda tração simultânea dos ECOM provoca a
muscular larga, que se estende sobre a face ânte- fiexão da coluna cervical sobre a colu-
ro-Iateral do pescoço, oblíqua para baixo e para na torácica e umafiexão da cabeça pa-
a frente, cuja parte mais prominente está consti- ra afrente (ver figo 97).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 221

Fig.5-64

Fig.5-65
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 223

Ip

Fig.5-66
224 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS PRÉ- VERTEBRAIS: OS RETOS ANTERIORES MAIOR


E l\iIENOR DA CABEÇA E O RETO LATERAL

Estes três músculos estão situados na parte face anterior da massa lateral do atlas até o tu-
superior da coluna cervical (fig. 5-67). bérculo anterior da sua apófise transversa. A sua
O reto anterior maior da cabeça (ra) é, dos direção é oblíqua para baixo e para fora.
três, o mais próximo da linha média; entra em A contração simultânea dos dois músculos
contato com o seu homólogo oposto e se fixa na homólogos determina a fiexão da cabeça sobre a
face inferior do processo basilar pela frente do fo- coluna cervical ao nível da articulação atlantooc-
rame magno; além disso, ele recobre a parte supe- cipital. A sua contração unilateral determina um
rior do músculo longo do pescoço (Ip) e termina movimento triplo de fiexão, rotação e inclinação
em tendões diferentes em cada um dos tubérculos para o lado da sua contração. Estes movimentos
anteriores da terceira, quarta, quinta e sexta apó- se realizam na articulação atlantooccipital.
fises transversas cervicais. Ele é o motor da colu-
O músculo reto lateral (rI) é o mais supe-
na cervical suboccipital e da parte superior da co- rior dos músculos intertransversos; ele se insere
luna cervical inferior. A contração simultânea acima no processo jugular do occipital e por bai-
dos dois músculos retos anteriores determina a
xo no tubérculo anterior da apófise transversa do
fiexão da cabeça sobre a coluna cervical e a reti- atlas. Ele se localiza por fora do reto anterior me-
ficação da lordose da sua parte superior. A contra- nor e recobre a face anterior da articulação atlan-
ção unilateral determina a fiexão e a inclinação tooccipital. A sua contração bilateral determina a
da cabeça para o lado da sua contração. fiexão da cabeça sobre a coluna cervical; e a sua
O reto anterior menor da cabeça (ram) se contração unilateral, uma leve inclinação para o
localiza atrás e por fora do reto anterior maior e lado da sua contração. Estes dois movimentos se
se estende entre o processo basilar occipital e a realizam na articulação atlantooccipital.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 225

ri

ra

Ip

Fig.5-67
226 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS PRÉ- VERTEBRAIS:


OS ESCALENOS

Os músculos escalenos são três e se esten- O escaleno posterior (ep) se localiza por
dem sobre a face ântero-Iateral da coluna cer~ trás dos escalenos anterior e médio; ele se inse-
vical corno se fossem verdadeiras maromas re acima através de três lingüetas tendinosas nos
musculares (fig. 5-68); eles unem as apófises tubérculos posteriores das transversas da quarta,
transversas cervicais com a primeira e a segun- quinta e sexta cervicais. O seu corpo carnoso,
da costelas. plano transversalmente, se situa por fora e por
O escaleno anterior (ea), triangular de trás do escaleno médio, onde quase se confunde
vértice inferior, se fixa nos tubérculos anterio- com o outro. Ele se insere por um tendão plano
res da terceira, quarta, quinta e sexta apófises na margem superior e na face externa da segun-
da costela.
transversas cervicais através de quatro tendões;
as suas fibras musculares convergem num ten- Entre os escalenos anterior e médio passam
dão que se insere no tubérculo de Lisfranc, na os níveis de origem do plexo braquial e a arté-
face superior da extremidade anterior da pri- ria subclávia.
meira costela. A direção geral do corpo muscu-
A contração simétrica dos escalenos deter-
lar do escaleno anterior é oblíqua para baixo,
mina a fiexão da coluna cervical sobre a coluna
para a frente e para fora.
torácica e uma hiperlordose, com a condição de
O escaleno médio (em), situado por trás e que a coluna cervical não esteja rígida pela con-
em contato com o escaleno anterior, se fixa aci- tração do músculo longo do pescoço; visto que,
ma por seis lingüetas tendinosas nas apófises pelo contrário, a contração simétrica dos escale-
transversas das seis últimas vértebras cervicais, nos determina somente afiexão da coluna cervi-
na altura dos tubérculos anteriores e na margem cal sobre a coluna torácica (ver figo 5-93).
externa da corredeira transversa da segunda, ter-
A contração unilateral dos escalenos de-
ceira, quarta, quinta e sexta cervicais e na trans-
termina a inclinação (fig. 5-70) e a rotação da
versa da sétima. O corpo muscular, plano de
coluna para o lado da contração.
diante para trás, triangular de vértice inferior, se
dirige obliquamente para baixo, para fora e leve- Além disso, os escalenos são músculos ace-
mente para a frente para finalizar na face supe- sórios da inspiração, quando eles tomam corno
rior da primeira costela, bem atrás da corredeira ponto fixo as suas inserções cervicais, elevando
da artéria subclávia. as duas primeiras costelas.

-'

r
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 227

ri

Fig.5-68

lU
228 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS PRÉ-VERTEBRAIS EM CONJUNTO

Um esquema de frente, tomado de Testut A ação destes músculos intertransversos


(fig. 5-69) permite situar todos os músculos determina somente a inclinação da coluna para o
pré-vertebrais: lado da sua contração (fig. 5-70); esta ação está
- o músculo longo do pescoço com o seu reforçada pela contração unilateral dos múscu-
fascículo longitudinal (lpl), os seus fascí- los escalenos:
culos oblíquos ascendentes (lpoa) e os
seus fascículos oblíquos descendentes - o escaleno anterior (ea), desenhado in-
(lpod); teiro só na metade direita; enquanto na
- o reto anterior maior da cabeça (ra); metade esquerda só o seu tendão está re-
- o reto anterior menor da cabeça (ram); presentado, o que permite que o escale-
- o reto lateral (rl); no médio (em) apareça;
- os músculos intertransversos, que es-
- quanto ao escaleno posterior (ep), ele só
tão divididos em dois planos: os mús-
culos intertransversos anteriores (ita) sobressai do escaleno médio na sua par-
e os músculos intertransversos poste- te mais inferior, quando ele se insere na
riores (itp). segunda costela.

J
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 229

Fig.5-70

ep ep

ea

Fig.5-69
230 FISIOLOGIA ARTICULAR

A FLEXÃO DA CABEÇA E DO PESCOÇO

A flexão da cabeça sobre a coluna cervical - os músculos infra-hióides: tÍreo-hióide,


e a flexão da coluna cervical sobre a coluna to- esternoc1eido-hióide (ech), esternoti-
rácica dependem dos músculos anteriores. reóide (não representado aqui) e omo-
Na coluna cervical superior (fig. 5-71) os hióide (oh). A contração simultânea des-
músculos retos anteriores menor e maior (ra) de- tes músculos provoca a descida da man-
terminam uma flexão na articulação atlantoocci- díbula inferior; embora ela esteja blo-
pital. O músculo longo do pescoço (lPl e lpz) e o queada contra a mandíbula superior
reto anterior maior determinam aflexão das arti-
pela contração simultânea dos músculos
culações subjacentes e, muito importante, o lon-
go do pescoço determina o endireitamento e a mastigatórios, como o masséter (M) e o
retificação da coluna cervical (fig. 5-72). temporal (T), a contração dos músculos
supra- e infra-hióides provoca a fiexão
Longe da coluna cervical e, portanto dota-
dos de um braço de alavanca maior, os mâsculos da cabeça sobre a coluna cervical e a
anteriores do pescoço (fig. 5-73) agem como fiexão da coluna cervical sobre a coluna
potentes flexores da cabeça e da coluna cervical. torácica, ao mesmo tempo que aparece
Trata-se dos músculos supra- e infra-hióideos: um endireitamento da lordose cervical.
- o miloióideo (rnh) e o ventre anterior do Portanto, estes músculos desempenham
digástrico (não representado aqui) que um papel primordial na estática da colu-
unem o maxilar inferior ao osso hióide; na cervical.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 231

Fig.5-71

Fig.5-72 Fig.5-73
232 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS DA NUCA

Antes de estudarmos a fisiologia dos mús- • o angular da escápula (12);


culos da nuca é indispensável entender correta- Estes músculos estão estreitamente
mente a sua disposição através de um corte em unidos aos do plano profundo e se en-
perspectiva (fig. 5-74): neste caso, se trata de rolam ao seu redor como se fossem
uma vista póstero-direita da nuca, cujos múscu- uma polia (tese de Florent), de modo
los superficiais foram removidos, em parte, a que a sua contração possui um impor-
fim de se poderem ver os diferentes planos. tante componente de rotação;
A zona da nuca se compõe de quatro pla- • o plano superficial comporta:
nos musculares superpostos. Da profundidade
até a superfície se pode observar: - essencialmente o trapézio (15), que
nesta figura foi ressecado quase to-
- o plano profundo, diretamente aplica- talmente;
do aos ossos e articulações, contém:
- o esternocleidooccípito-mastóideo,
• os músculos motores pequenos da co-
que só forma parte da região da nu-
luna suboccipital, que se estendem
ca na sua porção póstero-superior.
entre o occipital, o atlas e o áxis:
Aqui ele está representado parcial-
- o retoposterior maior da cabeça (1); mente ressecado para mostrar as
- o retoposterior menor da cabeça (2); suas porções superficiais (14) e a
- os oblíquos externo (3) e interno (4); sua porção profunda cleidomastói-
dea (14').
• a porção cervical do transverso-es-
pinhoso (5); No fundo da região compreendida entre os
interstícios musculares, se podem apreciar as
• os músculos interespinhosos (6);
inserções superiores dos escalenos médio e pos-
- o plano dos complexos, em parte resse- terior (13).
cado, contém dois músculos:
Resumindo, além dos músculos do plano
• o complexo maior (7); profundo, a maior parte dos músculos da nuca
• o complexo menor (8); são oblíquos para baixo, para dentro e para trás,
No mesmo plano, mais para fora, se SI- estão unidos ao plano profundo e determinam si-
tuam: multaneamente a extensão, a rotação e a inclina-
ção para o lado da sua contração, isto é, exata-
• o transverso do pescoço;
mente os três componentes do movimento misto
• o torácico longo; da coluna cervical inferior ao redor dos eixos
• e a parte superior do sacrolombar (11); oblíquos (ver pág. 204). Pelo contrário, a cama-
- O plano do esplênio e do angular, tam- da superficial contém músculos de direção cruza-
bém em parte ressecado, compreende: da, no que diz respeito aos planos intermediários;
ou seja, oblíqua para baixo, para a frente e para
• o esplênio, dividido em duas partes:
fora e que, desta vez, não agem diretamente so-
• o esplênio da cabeça (9); bre a coluna cervical inferior, mas sobre o crânio
• e o esplênio do pescoço (10), do qual e a coluna suboccipital, onde determinam, como
uma das digitações de inserção no tu- os dos planos subjacentes, a extensão e a inclina-
bérculo posterior da terceira apófise ção para o lado da sua contração, apesar de ser
transversa foi respeitada (10'); as ou- com uma rotação para o lado oposto. Deste mo-
tras duas que se inserem no tubérculo do, eles são ao mesmo tempo sinergistas e anta-
posterior da primeira e da segunda gonistas dos músculos do plano profundo, aos
transversa foram seccionadas; que completam funcionalmente.

I
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 233

15

8
5

14
6
14'
7
12'

13

10'

14

14'

10

13'

12

11

Fig.5-74
234 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS SUBOCCIPITAIS

A fisiologia dos pequenos músculos suboc- posterior maior. Isto é devido ao fato de
cipitais é habitualmente desprezada; isto é devi- o arco posterior do atlas ser mais pro-
do ao fato de ela não ser considerada um com- fundo que a apófise espinhosa do áxis;
plemento da fisiologia da coluna cervical infe- - o oblíquo externo da cabeça (3), mús-
rior. Na verdade, o papel destes músculos "nô-
culo alongado, grosso e fusiforme, si-
nio" é primordial na atitude da cabeça, para
tuado acima e por fora do reto maior, se
acentuar os componentes desejados ou eliminar
estende da apófise espinhosa do áxis até
os componentes não desejados, a partir do movi-
mento unívoco da coluna cervical inferior. a face inferior e a margem posterior da
apófise transversa do atlas. A sua dire-
Antes de se considerar a sua fisiologia, é ção é oblíqua para cima, para fora e pa-
conveniente recordar a sua disposição anatômi- ra a frente. Portanto, ele está cruzado no
ca assimilando corretamente a sua direção no espaço com relação aos músculos retos,
espaço. Para isto, é necessário que eles sejam e especialmente no que diz respeito ao
considerados em vista posterior (fig. 5-75), e reto posterior menor da cabeça;
também em vista externa (fig. 5-76), além de
uma vista em perspectiva póstero-direita e infe- - o oblíquo interno da cabeça (4), mús-
rior (fig. 5-77). Deste modo se podem observar: culo curto, plano e triangular, situado
por trás da articulação atlantooccipital,
- o reto posterior maior da cabeça (1),
se estende da apófise transversa do atlas
músculo triangular de base superior, se
até o terço externo da linha curva inferior
estende da apófise espinhosa do áxis até
a linha curva inferior do occipital. A sua do occipital. A sua direção é oblíqua pa-
direção é oblíqua para cima e levemente ra cima e para trás. Ele está, praticamen-
para fora e para trás; te, situado no plano sagital, visto que ele
não se dirige para fora. A sua direção é
- o reto posterior menor da cabeça (2), paralela a do reto posterior menor e per-
também plano e triangular, mais curto e
pendicular a do oblíquo externo;
mais profundo que o reto posterior
maior, situado bem por fora da linha - os músculos interespinhosos (5) estão
média, ele se estende do tubérculo pos- situados em ambos os lados da linha
terior do atlas, sobre o seu arco poste- média, entre as apófises espinhosas cer-
rior, até o terço interno da linha curva vicais, por baixo do áxis; deste modo, os
occipital inferior. A sua direção é oblí- músculos retos posteriores maior e me-
qua para cima, levemente para fora e nor são equivalentes aos músculos inte-
mais diretamente para trás que o reto respinhosos.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 235

Fig.5-76 3

Fig.5-75

4
2
1
3

Fig.5-77

r
236 FISIOLOGIA ARTICULAR

AÇÃO DOS MÚSCULOS SUBOCCIPITAIS: INCLINAÇÃO E EXTENSÃO

Pela sua disposição, o oblíquo externo da termina a inclinação da cabeça (seta y) para o
cabeça desempenha um papel importante tanto na lado da sua contração, por mobilização na arti-
estática quanto na dinâmica da articulação atlan- culação atlantooccipital. Este ângulo de inclin~-
toaxial. De fato, uma vista de perfil (fig. ção í também pode ser medido pelo ângulo i '
5-78) mostra que, e levando as apófises transver- compreendido entre a linha horizontal das apó-
sas do atlas para trás, este músculo provoca, quan- fises transversas do atlas e a linha oblíqua das
do os dois oblíquos externos se contraem simetri- apófises mastóides. Certamente, o oblíquo in-
camente, um movimento de retrocesso e de exten- terno (4), cuja contração provoca o alongamen-
são do atlas sobre o áxis; esta extensão pode ser to (e) do seu homólogo oposto, é o mais eficaz
medida nas radiografias de perfil pelo ângulo â nas dos músculos da inclinação. O oblíquo interno
massas laterais do atlas, ou pelo ângulo â' no seu toma como ponto fixo a apófise transversa do
arco posterior. Uma vista superior (fig. 5-79) mos- atlas, estabilizada, por sua vez, pela contração
tra com nitidez o movimento de retrocesso (r) de- do oblíquo externo (3); o reto maior (1) é menos
terminado pela contração simétrica dos dois mús- eficaz que o oblíquo interno e o reto menor qua-
culos oblíquos, que, como a corda de um arco, se não age, porque está muito próximo da linha
propulsionam o áxis para a frente e por reação do média.
atlas, para trás. Deste modo, o ligamento transver- A contração simultânea e bilateral dos
so se descarrega, o que assegura a contenção pas- músculos posteriores suboccipitais (fig. 5-81)
siva da apófise odontóide e impede que ela se lu- determina a extensão da cabeça sobre a coluna
xe para trás: os dois oblíquos externos agem si- cervical superior: esta extensão se realiza na ar-
multaneamente de modo que desempenham um ticulação atlantooccipital graças à contração do
papel essencial no comportamento dinâmico da oblíquo posterior menor (2) e do oblíquo inter-
articulação atlantoodontóide. no (4) e na articulação atlantoaxial pela contra-
A contração unilateral dos quatro mús- ção do reto posterior maior (1) e do oblíquo ex-
culos posteriores suboccipitais (fig. 5-80) de- terno (3) (fig. 5-78).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 237

Fig.5-78 Fig.5-79

Fig.5-80 Fig.5-81
238 FISIOLOGIA ARTICULAR

AÇÃO ROTATÓRIA DOS MÚSCULOS SUBOCCIPITAIS

Além das suas ações de extensão e de incli- sua contração. No exemplo que está ilustrado
nação, os músculos suboccipitais estão dotados aqui, a contração do reto anterior maior direito
de uma ação rotadora sobre a cabeça. (1) determina uma rotação da cabeça para a di-
Considerando em primeiro lugar o nível su- reita, na atlantooccipital e a atlantoaxial ao
boccipital, isto é, a articulação atlantooccipi- mesmo tempo. Neste caso, o reto maior esquer-
tal. Em vista inferior (fig. 5-82), pode-se ver ni- do se alonga num comprimento a que assegura
tidamente que a contração do músculo oblíquo o retomo da cabeça até a sua posição neutra; a
interno (4) determina uma rotação da cabeça de contração do oblíquo externo direito (3) deter-
10 graus para o lado oposto da sua contração; mina a rotação da cabeça para a direita na arti-
no exemplo que está ilustrado aqui, a contração culação atlantoaxial. Uma vista em perspectiva
do oblíquo interno esquerdo provoca a rotação (fig. 5-84) mostra como a contração do reto
da cabeça para a direita; neste caso pode-se ob- maior do lado direito, que se estende diagonal-
servar como o oblíquo interno direito (4') e o mente entre a espinhosa do áxis e a transversa
oblíquo interno posterior (2) entram em tensão direita do atlas, faz com que esta gire para a di-
passivamente, de modo que eles asseguram o re- reita, ao mesmo tempo que alonga o reto maior
tomo da cabeça até a posição neutra. esquerdo (fig. 5-83) num comprimento b (mús-
culo de volta).
Considerando agora o nível subjacente, o
da articulação atlantoaxial. Em vista inferior Uma vez assimiladas todas as ações dos
(fig. 5-83), o áxis aparece em claro sobre o músculos suboccipitais, se pode estudar a pági-
atlas em cinza. Pode-se constatar que a contra- na 214 para compreender melhor o seu papel na
ção dos músculos reto posterior maior (1) e anulação dos componentes não desejados de in-
oblíquo externo (3) determinam uma rotação clinação ou de rotação no percurso dos movi-
da cabeça de cerca de 12 graus para o lado da mentos puros da cabeça.

-~
i
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 239

10°

4 3

Fig.5-82 Fig.5-83

Fig.5-84
240 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS DA NUCA: O PRIMEIRO E O QUARTO PLANOS

o plano profundo dos músculos da nuca, ao ní- sobre a cabeça. Assim sendo, o transver-
vel da coluna cervical superior, está constituído pelos soespinhoso é sinergista do ECOM, mas o
músculos suboccipitais anteriormente descritos e na primeiro age de maneira segmentária em ca-
coluna cervical inferior pelos mÚsculos transversoes- da um dos níveis da coluna cervical, en-
pinhosos. Dispostos contra o plano ósseo, na corredei- quanto o segundo, cujas fibras têm uma di-
ra formada pelas apófises espinhosas, as lâminas e as reção geral parecida com a do transversoes-
apófises transversas, estes músculos estão formados pinhoso, age sobre toda a coluna cervical em
por lingÜetas musculares que cobrem uns aos outros, cujas extremidades se insere, através de dois
como sefossem telhas. Existe, a cada lado da linha das braços de alavanca muito importantes.
espinhosas, um traÍ1sversoespinhoso que ocupa a corre-
O plano superficial dos músculos da nuca (fig.
deira vertebral do áxis até o sacro. A disposição das lâ-
5-86) está constituído pelo trapézio (Tr), cujas fibras,
minas musculares (fig. 5-85) foi interpretada de diver-
dispostas em leque, partem de uma linha contínua que
sas maneiras por autores diferentes:
ocupa, por um lado, o terço interno da linha curva su-
- na descrição clássica de Trolard, as fibras perior do occipital e, por outro, as apófises espinhosas
musculares que partem das apófises espin- até a décima torácica e o ligamento cervical posterior.
hosas e das lâminas das quatro vértebras A partir desta linha de inserção contínua, as fibras
suprajacentes convergem na apófise trans- mais craniais descendem obliquamente para baixo,
versa da quinta vértebra: neste esquema (T), para fora e para a frente e se fixam no terço externo
pode-se observar a disposição do primeiro da clavícula, no acrômio e na espinha da escápula.
sistema laminar completo que termina na Deste modo, o contomo da parte inferior do pescoço
sexta apófise transversa cervical e cobre os está constituído pela curva envolvente das direções
sistemas laminares incompletos que con- sucessivas das fibras do trapézio. Este desempenha
vergem na quinta, quarta e terceira apófises um papel essencial na motricidade da cintura escapu-
transversas cervicais; lar (ver volume I); mas quando toma a cintura esca-
- numa descrição mais recente de Winckler, pular como ponto fixo, ele age de maneira importan-
os fascículos musculares têm uma disposi- te sobre a coluna cervical e sobre a cabeça:
ção inversa (W): da lâmina e da espinhosa - a contração bilateral simétrica dos trapé-
da vértebra mais cranial, partem quatro lin- zios determina uma extensão da coluna cer-
güetas musculares que finalizam nas trans- vical e da cabeça com acentuação da lordo-
versas das quatro vértebras subjacentes. No se cervical; quando esta extensão é contra-
esquema está representado o sistema lami- balançada pela ação dos antagonistas ante-
nar mais cranial que parte do áxis e que co- riores da coluna cervical, o trapézio desem-
bre, mais ou menos, os sistemas laminares penha uma função de suporte, estabilizando
subjacentes. toda a coluna cervical;
Estas duas concepções são duas formas diferen- - a contração unilateral ou assimétrica do tra-
tes de descrever uma mesma realidade, dependendo se pézio (fig. 5-87, vista torácica e contração do
partirmos da inserção superior ou da inferior. Seja co- trapézio esquerdo) determina uma extensão
mo for, como a direção das fibras musculares sempre da cabeça e da coluna cervical com hiperlor-
é oblíqua para baixo, para fora e levemente para a dose, uma inclinação para o lado da contra-
frente, a contração do transversoespinhoso determina: ção e uma rotação da cabeça para o lado
- quando é bilateral e simétrica, uma extensão oposto. O trapézio é sinergista do ECOM do
da coluna cervical e uma hiperlordose. Trata- mesmo lado.
se do músculo eretor da coluna cervical;
Na parte súpero-extema da nuca (fig. 5-86) apa-
- quando é assimétrica ou unilateral, a exten- rece a extremidade superior do ECOM. Por conse-
são, a inclinação para o lado da sua contra- guinte, o conto mo extemo da parte superior da nu-
ção e a rotação da coluna vertebral para o ca está constituído pela curva envolvente das dife-
lado oposto. Portanto, esta ação sobre a co- rentes direções sucessivas das fibras musculares do
luna vertebral é semelhante ao do ECOM ECOM torcido sobre o seu eixo.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 241

Fig.5-85

Fig.5-86

Fig.5-87
242 FISIOLOGIA ARTICULAR

OS MÚSCULOS DA NUCA: O SEGUNDO E O TERCEIRO PLANOS

Por debaixo do trapézio se encontra o terceiro plano nas transversas das seis primeiras vértebras torácicas, na base
muscular (fig. 5-88) constituído pelo esplênio e o angular. das transversas das quatro últimas cervicais e nas espinhosas
da sétima cervical e da primeira torácica. O seu corpo muscu-
O esplênio descende até a região torácica e se insere nas
lar, grosso e arredondado, recobre o transverso e termina de
seis últimas espinhosas cervicais, o ligamento cervical poste-
preencher a corredeira vertebral, ele está separado do seu ho-
rior. as quatro primeiras espinhosas dorsais e o ligamento in-
mólogo pelo ligamento cervical posterior. Os dois esplênios se
terespinhoso; as suas fibras se dirigem obliquamente para bai-
encaixam na convexidade do complexo maior e este finaliza na
xo. para fora e para a frente, enrolando-se nos músculos do
escama occipital, por fora da crista occipital externa eentre as
plano profundo, para acabar com duas porções diferentes: duas linhas curvas.
- uma porção cefálica que forma o esplênio da cabeça
A contração simétrica e bilateral do complexo maior
(9) e que se insere no occipital, por debaixo do ECOM
determina a extensão da cabeça e da coluna cervical com hi-
na metade externa da linha curva occipital superior e
perlordose; a sua contração assimétrica ou unilateral deter-
sobre a mastóide. Ela recobre de maneira incompleta
mina uma extensão da cabeça associada a uma leve inclina-
os dois complexos, que se localizam no triângulo for-
ção para o lado da sua contração.
mado pela margem interna dos dois esplênios;
O complexo menor (8), situado por fora do complexo
- uma porção cervical que forma o esplênio do pesco-
maior, longo e fino, se dirige para cima e levemente para fora,
ço (10) que está representado no lado esquerdo nas
fixando-se por baixo na base das transversas das quatro últimas
suas conexões com o esplênio da cabeça, e no lado
cervicais e da primeira torácica e, por cima, no vértice e mar-
direito está isolado para mostrar como ele se enrola
gem posterior da mastóide. O seu corpo muscular está torcido
sobre si mesmo, e as lingüetas terminais que se inse-
sobre si mesmo, visto que as suas fibras mais caudais tenninam
rem sobre as apófises transversas do atlas, do áxis e
da terceira cervical. sendo as mais internas por cima, enquanto as mais craniais na
origem cervical são as mais externas sobre a mastóide.
A contração bilateral e simétrica do esplênio determina
A sua contração bilateral e simétrica determina a ex-
uma extensão da cabeça e da coluna vertebral com hiperlordose.
tensão da cabeça; quando esta extensão está contrabalança-
A contração assimétrica ou unilateral do esplênio de- da pela ação dos antagonistas anteriores, o complexo menor
termina uma extensão, uma inclinação e uma rotação para o estabiliza lateralmente a cabeça, como se fosse um cabo de
lado da sua contração, isto é, no sentido do movimento unívo- suporte invertido.
C(J da coluna cervical inferior.
A sua contração unilateral ou assimétrica determina a
O angular da escápula (l2) se localiza por fora do es- extensão associada com a inclinação do mesmo lado. mais
p/<inio do pescoço e possui com ele inserções superiores co- acentuada que no complexo maior e, além disso, uma rotação
mc:ns sobre as apófises transversas das quatro primeiras cervi- homóloga.
cais. O seu corpo muscular plano se enrola, graças ao mesmo
O transverso do pescoço (lI), longo e fino, está situa-
I/W';imento que o do esplênio, apesar de ele se separar rapida-
do por fora do complexo menor e se insere sobre o vértice das
mente para dirigir-se obliquamente para baixo e levemente pa-
cinco últimas transversas cervicais e, por baixo, no vértice das
ra fora e fixar-se sobre a escápula. Quando o angular toma a
transversas das cinco primeiras dorsais. As fibras mais internas
coluna cervical como ponto fixo, ele determina uma elevação
são as mais curtas entre C, e D,. As externas são as mais lon-
da escápula (ver volume I). Pelo contrário, quando a escápula
gas e unem C, a D,.
está fixa, ele se converte em motor da coluna cervical.
A contração simétrica dos dois transversos detennina a
A sua contração bilateral e simétrica determina uma ex-
extensão da coluna cervical inferior. Quando esta extensão es-
tensão da coluna cervical com hiperlordose. Quando os anta-
tá contrabalançada pela ação dos antagonistas, os transversos
gonistas não deixam que esta extensão aconteça, ele age como
agem como suporte.
suporte, estabilizando lateralmente a coluna cervical.
A contração unilateral ou assimétrica de um transverso
A sua contração unilateral ou assimétrica provoca, co-
determina uma extensão e uma inclinação homolateral.
mo no caso do esplênio do pescoço, uma extensão com incli-
nação e rotação para o lado da sua contração e, portanto, no O torácico longo forma parte dos músculos da nuca
sentido do movimento unívoco da coluna cervical inferior. pelas suas inserções mais craniais sobre as últimas transver-
sas cervicais. Por outro lado, ele está mais ou menos confun-
O segundo plano muscular, situado diretamente sobre
dido com a porção cervical do músculo sacrolombar (lI')
o plano mais profundo (fig. 5-89), está constituído pelos dois que se origina na margem superior das seis primeiras coste-
complexos e pelo torácico longo, o transverso do pescoço e a las, finaliza junto com o transverso do pescoço no tubérculo
pane superior da massa lombossacra.
posterior das cinco últimas transversas. As suas ações são pa-
O complexo maior (7), situado imediatamente por fora recidas com as do transverso; além disso, a porção cervical
da linha média, forma uma banda muscular vertical, interrom- do sacrolombar desempenha a função de suporte muscular da
pida por uma intersecção aponeurótica que lhe valeu o nome coluna cervical inferior e de elevador das seis primeiras cos-
de "digástrico da nuca". O complexo maior se fixa por baixo telas (ver pág. 150).
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 243

Fig.5-89
244 FISIOLOGIA ARTICULAR

A EXTENSÃO DA COLUNA CERVICAL PELOS MÚSCULOS DA NUCA

Todos os músculos da nuca são extensores serção. Deste modo, eles unem diretamente o
da coluna cervical e da cabeça, mas, dependen- occipital e a mastóide com a cintura escapular.
do da sua disposição, eles podem ser classifica- Trata-se de:
dos em três grupos: o primeiro grupo (fig. 5- - por um lado, o trapézio (fig. 5-91, 15);
90) contém todos os músculos que se inserem na
coluna cervical na altura das apófises transver- - por outro, o ECOM (fig. 5-92), sistema
sas e que se dirigem obliquamente para baixo e diagonal que cruza a direção da coluna
para trás até a região torácica; se trata de: cervical e cuja contração bilateral e simé-
trica tem três conseqüências: a extensão
- o esplênio do pescoço (10);
da cabeça sobre a coluna cervical (1), a
- o transverso do pescoço e a porção cer- flexão da coluna cervical sobre a coluna
vical do sacrolombar (11); torácica (2), e a extensão da coluna cervi-
- o angular da escápula (12). cal sobre si mesma, com hiperlordose (3).
Estes músculos são extensores da coluna A estática da coluna cervical sobre o pla-
cervical e aumentam a sua lordose; a sua contra- no sagital (fig. 5-93) depende de um equilíbrio
ção unilateral determina, além disso, a inclinação dinâmico permanente entre:
e a rotação para o lado da sua contração; eles são
os mlÍsculos motores do movimento unívoco da
- por um lado, a ação extensora dos mlÍs-
culos da nuca: esplênio (E), transverso
coluna cervical inferior (ver pág. 214).
do pescoço, sacro lombar e torácico lon-
O segundo grupo (fig. 5-91) compreende go (TL) e trapézio (Tr). Todos eles for-
os músculos de direção oblíqua para baixo e mam cordas parciais ou totais na conca-
para a frente: vidade da lordose cervical;
- por um lado, o transversoespinhoso (5), - por outro, os músculos anteriores e ân-
músculo próprio da coluna cervical infe- tero-externos:
nor;
• o longo do pescoço (lp), que é fiexor
- por outro, os músculos que unem o oc- e retificador da lordose cervical;
cipital com a coluna cervical inferior: o
complexo maior (7), o complexo menor
• os escalenos (ES) que fiexionan a co-
luna cervical sobre a coluna torácica,
(8), o esplênio da cabeça, que apesar de
apesar de ter a tendência de causar
não estar representado neste esquema,
forma parte deste grupo; uma hiperlordose cervical se a sua
ação não estiver compensada pelo
- por último, os músculos suboccipitais longo do pescoço e pelos músculos
não representados neste esquema (ver supra- e infra-hióides (ver figo 5-73).
págs. 234, 236 e 238).
A contração simultânea de todos estes gru-
Todos estes músculos estendem a coluna
pos musculares determina uma retificação da co-
cervical, aumentam a sua lordose e estendem a luna cervical na sua posição média. Deste modo,
cabeça sobre a. coluna cervical devido às suas estes músculos se comportam como se fossem
inserções diretas no occipital. cabos de suporte situados no plano sagital e nos
Finalmente, um terceiro grupo de músculos planos oblíquos; eles desempenham um papel
q~e passam como se fossem uma ponte por cima primordial no equilíbrio da cabeça e no trans-
da coluna cervical, onde não tomam nenhuma in- porte de cargas sobre ela.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 245

Fig.5-90 Fig.5-91

~x.

Tr

DL

Fig.5-92
Fig.5-93
246 FISIOLOGIA ARTICULAR

SINERGIA-ANTAGONISMO DOS lVIÚSCULOS PRÉ- VERTEBRAIS


E DO ESTERNOCLEIDOlVIASTÓIDEO

Como já vimos anteriormente (fig. 5-92), os grande braço de alavanca situado pela
estemocleidomastóideos não podem, quando se frente da coluna cervical, com a condi-
contraem de maneira isolada, agir eficazmente pa- ção de que a contração dos músculos
ra manter o equilíbrio da cabeça e a estática da co- mastigatórios esteja bloqueando o maxi-
luna cervical. Para isto, a ajuda dos músculos si- lar inferior sobre o maxilar superior.
nergistas-antagonistas é necessária, e que eles pre-
viamente tenham realizado o movimento de retifi- A partir do momento em que a coluna cer-
vical se retifica, a lordose retificada (fig. 5-96) e
cação da lordosecervical (fig. 5-94). Trata-se de:
a extensão da cabeça sobre a coluna cervical
- essencialmente, o longo do pescoço impedida pelos músculos suboccipitais anterio-
(Lp), situado imediatamente pela frente res e os supra- e infra-hióideos, a contração si-
dos corpos vertebrais; multânea dos dois ECOM (fig. 5-97) determina
- os músculos flexores da cabeça sobre a aflexão da coluna cervical sobre a coluna torá-
coluna cervical (fig. 5-95) situados no cica. Portanto, existem relações de antagonis-
nível suboccipital: retos anteriores mo-sinergia entre os ECOM por um lado e, por
maior e menor da cabeça e reto lateral; outro, os músculos pré-vertebrais, seja em con-
- por outro lado, os músculos supra- e in- tato com a coluna vertebral, seja a distância pe-
fra-hióideos agem a distância sobre um la frente da coluna.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 247

Fig.5-96
Fig.5-94

Fig.5-97 Fig.5-95
248 FISIOLOGIA ARTICULAR

AS AMPLITUDES GLOBAIS DA COLUNA CERVICAL

Como as amplitudes da coluna cervical po- Uma medida mais exata da flexão-extensão e
dem ser medidas de forma prática? No caso da da inclinação pode ser conseguida, utilizando-se
flexão-extensão e da inclinação, a medida pode um goniômetro de bolha que se fixará no crânio,
ser realizada, de forma precisa, por meio de ra- seja no plano sagital para medir a flexão-extensão,
diografias de perfil e de frente, mas no caso das seja no plano frontal para medir a inclinação.
rotações isto é muito mais difícil. A medida da rotação da cabeça e do pes-
Pontos de referência exteriores também po- coço (fig. 5-99) pode ser realizada com o indi-
dem ser utilizados. Na flexão-extensão (fig. 5- víduo sentado numa cadeira e imobilizando-se
98), o ponto de referência é o plano mastigató- corretamente a sua cintura escapular. Então, se
rio, que, em posição neutra, é horizontal. Por- tomará como referência a linha dos ombros, e a
tanto, a extensão será o ângulo aberto por cima, rotação será medida seja pelo ângulo (R) for-
formado pelo plano mastigatório e a horizontal, mado por esta linha de referência e o plano
a flexão será o ângulo aberto por baixo, entre o frontal que passa pelas orelhas, seja pelo ângu-
plano mastigatório e a horizontal. As amplitudes lo (ROT) formado pelo plano sagital da cabeça
já foram -definidas anteriormente. com o plano sagital do corpo. Pode-se realizar
Para medir a inclinação (fig. 5-100), to- uma medida mais precisa com o indivíduo em
maremos o ângulo formado por duas linhas, decúbito supino sobre um plano duro e hori-
por um lado, a linha das clavículas e, por ou- zontal, com um goniômetro de bolha fixo na
tro, a linha dos olhos. testa no plano transversal.

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3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 249

Fig.5-98

Fig.5-99
Fig. 5-100
250 FISIOLOGIA ARTICULAR

RELAÇÕES ENTRE O EIXO NERVOSO E A COLUNA CERVICAL

o sistema nervoso cérebro-espinhal está den- nicamente. O que equivale a reconhecer a im-
tro da caixa craniana e do canal raquidiano. Na co- portância dos elementos de união ligamentar e
luna cervical, o canal raquidiano protege o bulbo, dos fatores ósseos de estabilidade, dos que o
que sai do crânio pelo forame magno, e a medula principal é a apófise odontóide; urna fratura da
cervical, que emite as raízes do plexo cervical e do base da apófise odontóide produz urna instabili-
plexo braquial. Portanto, o bulbo e a medula cer- dade completa do atlas sobre o áxis, que pode
vical realizam relações estreitas com elementos bascular para trás, ou o que é pior, para a frente,
muito móveis da coluna cervical, principalmente provocando uma verdadeira luxação anterior do
no nível da coluna suboccipital numa zona de atlas sobre o áxis com a conseguinte compressão
transição mecânica muito específica (fig. 5-101). do bulbo e morte imediata.
De fato, desde a sua saída pelo forame magno, o Outro elemento muito importante da esta-
bulbo, prolongado pela medula (M), se situa por bilidade do atlas sobre o áxis é o ligamento
trás e entre os dois côndilos occipitais, que cons- transverso. A sua ruptura provoca a luxação an-
tituem, neste nível, os dois pontos de apoio do crâ- terior do atlas sobre o áxis, permanecendo a apó-
nio sobre a coluna cervical. Porém, entre os côn-
fise odontóide no seu lugar e comprimindo e le-
dilos occipitais e a terceira vértebra cervical, o sando gravemente o bulbo. Novamente a morte
atlas e o áxis vão distribuir o peso da cabeça entre súbita acontece. Contudo, as rupturas do liga-
três colunas, suportado em princípio por duas co- mento transverso não são tão freqüentes quanto
lunas (C e C'). Estas três colunas, que se prolon- as fraturas da apófise odontóide.
gam ao longo de toda a coluna vertebral, são:
No nível cervical inferior, o ponto mais
- a coluna principal dos corpos vertebrais solicitado se localiza entre Cs e C6• É neste nível
(CV), situada pela frente da medula; onde mais freqüentemente se produzem as luxa-
- e das duas pequenas colunas laterais ções anteriores de Cs e C6, com as articulares in-
das apófises articulares (A e A'), situa- feriores de Cs enganchadas nas articulares supe-
das em ambos os lados da medula. riores de C6 (fig. 5-103). Nesta posição, a medu-
A divisão das linhas de força se realiza no la está comprimida entre o arco posterior de Cs
nível do áxis, que, deste modo, representa um e o ângulo póstero-superior do corpo de C6• De-
verdadeiro distribuidor de forças entre o crânio pendendo do nível, a compressão medular pro-
e o atlas, por um lado, e o resto da coluna cervi- voca uma paraplegia ou uma tetraplegia, que po-
cal, por outro. De fato (fig. 5-102), as forças que de ser rapidamente mortal.
suportam cada um dos côndilos occipitais (CC) É óbvio, que todas estas lesões que criam
se dividem em dois grupos: uma grande instabilidade na coluna vertebral po-
- por um lado, para a frente e para dentro, dem ser agravadas por manipulações inadequa-
as principais forças estáticas caem so- das durante o manejo e transporte dos feridos e,
bre os corpos vertebrais (CV) através principalmente, se pode entender que qualquer
movimento de flexão da coluna cervical e de fle-
do corpo do áxis;
xão da cabeça sobre a coluna cervical pode piorar
- por outro, as forças dinâmicas caem so- a compressão do bulbo ou da medula. Portanto,
bre a coluna das articulares (A), para trás quando se levanta um ferido de acidente de tráfe-
e para fora, através do pedículo vertebral go, por exemplo, urna das pessoas que está aju-
do áxis e da apófise articular inferior si- dando deve desempenhar corno única e primor-
tuada debaixo do arco posterior do áxis. dial tarefa manter a cabeça no eixo da coluna
Portanto, esta zona suboccipital representa, vertebral, assim corno a estender levemente para
ao mesmo tempo, o pivô, o ponto mais móvel da evitar os deslocamentos de urna eventual fratura,
coluna cervical, e o lugar mais solicitado meca- seja no nível occipital ou por debaixo dele.
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 251

Fig.5-101

Fig.5-102

Fig.5-103
252 FISIOLOGIA ARTICULAR

RELAÇÕES ENTRE AS RAÍZES CERVICAIS E A COLUNA VERTEBRAL

Acabamos de ver as importantes relações cais saindo dos farames intervertebrais com as
entre a coluna cervical e o bulbo e a medula. articulações interapofisárias par trás e com as
De cada nível da coluna cervical saem as articulações uncovertebrais pela frente. Quan-
raízes dos nervos cervicais pelos forames inter- do o processo da artrose cervical se inicia (par-
vertebrais. Estas raízes podem estar afetadas por te inferior da figura), se podem apreciar os bi-
processos patológicos (fig. 5-104): as hérnias dis- cos osteofíticos na parte anterior dos platôs
cais são raras na coluna cervical; a sua saída pós- vertebrais e principalmente nas projeções ra-
tero-lateral (seta 1) está dificultada pela presença diológicas oblíquas, as vegetações osteofíticas
das apófises unciformes de tal modo que, quando que partem das articulações uncovertebrais e
existem, elas estão muito mais próximas da linha formam uma proeminência na área do forame
média (seta 2) que na região lombar, razão por intervertebral. Assim, os osteófitos avançam
que podem provocar compressões medulares. por trás a partir da articulação interapofisária
e a raiz cervical pode ser comprimida entre os
Contudo, o processo de compressão mais osteófitos anteriores que têm o ponto de parti-
freqüente na coluna cervical é devido à artrose da uncovertebral e os osteófitos posteriores de
das articulações uncovertebrais (seta 3). ponto de partida articular. Deste modo se pode
De fato, uma vista de perfil (fig. 5-105) explicar a sintomatologia radicular das artro-
mostra as relações estreitas das raízes cervi- ses CerVICaIS.

I .~-
3. TRONCO E COLUNA VERTEBRAL 253

Fig.5-104

Fig.5-105

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