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A integração regional é um fenômeno surgido na segunda metade do século

XX, resultante da necessidade de os países situados na mesma região se


congregarem, reunindo capitais, tecnologias, recursos humanos, a fim de
protegerem suas economias dos efeitos negativos da mundialização e
promoverem medidas conjuntas nos vários campos de atividade para
dinamizar o progresso material e social de seus povos e, por esse meio,
lograrem o desenvolvimento econômico com justiça social, que implica a
melhoria de suas condições de vida. As organizações de integração regional,
pois, traduzem uma reação necessária dos Estados ao contexto econômico
internacional (MATIAS, 2005, p. 423).

Sánchez (2004, p. 17) considera o fenômeno da integração no quadro de um


mundo em transformação, em que ela exerce um papel preponderante, como
resposta às interrogações suscitadas nessa conjuntura. A esse respeito, analisa
a ordem antropológica, a ordem cultural, a ordem geopolítica e a ordem
econômica.

Em relação à primeira, assinala que na fase atual de sua evolução o homem -


princípio e fim de todo sistema político, social, educativo e cultural - sofre um
reducionismo selvagem e grosseiro, pela instauração do egocentrismo, em que
o interesse geral cede diante do interesse individual e, assim, a noção do bem
comum tende a desaparecer. "Com isso se veem afetados, necessariamente, os
demais princípios ordenadores da vida social", dentre eles o da solidariedade,
que "fica reduzido a nada" (SÁNCHE , 2004, p. 19).

No que diz respeito à ordem cultural, observa que o "imperialismo" cultural


instala um absoluto relativismo, segundo o qual não existe uma moral objetiva
(admite-se uma moral para cada pessoa). Ora, isso acarreta o debilitamento
dos valores tradicionais sobre que assenta a sociedade, com a consequente
perda da consciência da necessidade de agrupar-se em torno desses valores, os
quais são os elementos que, em definitivo, configuram a identidade (pessoal e
coletiva). O relativismo, por conseguinte, leva o homem a ensimesmar-se, não
se reconhecendo pertencente a uma comunidade, o que inviabiliza o
"intercâmbio cultural fecundo, em cujo marco os povos se enriquecem com a
mútua doação de suas vivências". Por essa razão, diz-se que ele concorre para
a destruição das culturas, representando a própria negação do cultural. Essa é,
segundo Sánchez (2004, p. 21), a perspectiva atual no tocante a tal ordem.

Quanto à ordem geopolítica, Sánchez (2004, p. 22) aponta a tendência para a


regionalização, movida pelo fator econômico, tido como eixo sobre o qual se
constrói a nova ordem social. Refere-se ao papel das organizações
supranacionais, criadas com o propósito de erigir instâncias capazes de
superar o isolamento e abrandar os imperialismos.

Sob o prisma da ordem econômica, a integração tem em conta, sobretudo, o


elemento econômico, que é seu eixo. Ora, em todos os processos dessa
natureza se objetiva "a ampliação dos mercados e a complementação como
mecanismos de sobrevivência num esquema ferozmente competitivo".
Contudo, como estratégia de enfrentamento de outros blocos, tais processos
"perdem de vista que a integração deve ser um instrumento de união e não de
divisão". "A solidariedade é virtude e valor dos homens e dos povos." O mais
"é cálculo e mera conveniência, conjuntura e instrumentalização;
definitivamente, egoísmo" (SÁNCHE , 2004, p. 23).

O fenômeno da integração - "que está no centro das atuais tendências em


política internacional" - segundo Sánchez (2004, p. 23), pode ser entendido de
várias maneiras, conforme os processos históricos concretos e as teorias
vigentes, e comporta algumas concepções, das quais ele menciona:
"integração" pelo uso da força; integração fundada nas ideologias; integração
sobre a base do pragmatismo, centrada na economia, ou seja, a integração
considerada como "possibilidade meramente instrumental e conjuntural,
surgida da mera conveniência econômica" (é a que inspira as tentativas de
construção de blocos econômicos regionais); integração sustentada na
irmandade universal do gênero humano, que implica "a convicção de uma
radical interdependência" (JOÃO PAULO II apud SÁNCHE , 2004, p. 25), "é
muito mais que a encarnação de uma conveniência histórica e
geograficamente determinável. Trata-se, nada menos, de uma das maneiras
mais coerentes de materializar a irmandade universal do gênero humano. A
partir dessa ótica, jamais poderá ser a integração causa de divisão nem de
contraposição".

"De que maneira pode a integração das nações favorecer um desenvolvimento


harmônico e integral dos povos, a fim de que o bem comum deixe de ser uma
quimera a mais em um mundo até há pouco tempo radicalmente dividido?" -
indaga Sánchez (2004, p. 28), para, em seguida, oferecer os elementos de uma
resposta adequada.

Em primeiro lugar, a integração deve ser um meio de garantia da paz, que, na


concepção da Igreja Católica, expressa em pronunciamentos dos Papas Paulo
VI e João Paulo II, é inerente ao desenvolvimento - "o desenvolvimento é o
novo nome da paz" - (SÁNCHE , 2004, p. 28). Para a consecução desse
ambicioso, nobre e indispensável objetivo, urge que os governos lhe deem a
mais alta prioridade na formulação de suas políticas e seus programas de ação,
tendo em conta que o desenvolvimento não deve ser meramente econômico ou
tecnológico; porém, mais abrangente e de tal ordem que respeite a dignidade e
os direitos inalienáveis da pessoa humana, ou seja, voltado à "plenitude
ontológica dos homens e dos povos". E se conscientizem de que "o
desenvolvimento humano integral está liga-

do estreitamente à busca da igualdade e da justiça e a uma preocupação


sincera com os membros mais frágeis e mais pobres da sociedade"
(SÁNCHE , 2004, p. 29). Ademais, o desenvolvimento deve valorizar a
riqueza cultural e espiritual dos povos, pois são precisamente esses bens que,
na verdade, qualificam a integração.

Sob a ótica política, a integração deve ser analisada como um fenômeno


inserido no contexto da globalização, a qual tem, como importante elemento
propulsor, os meios de comunicação. A intercomunicação gera
interdependência dos povos, a qual empresta ao Estado nova configuração,
que leva à revisão do conceito de soberania. Além disso, apresentam-se nesse
quadro fenômenos aparentemente contrapostos - o ressurgimento de
nacionalismos e regionalismos com os processos de integração -, que
traduzem uma realidade de difícil compreensão. Para entender esse panorama,
deve-se reconhecer a globalização como um dado da realidade, que não
convém negar, não sendo razoável tentar subtrair-se aos seus efeitos, posto
que é impossível consegui-lo. Importa, pois, procurar equilíbrios que
possibilitem conviver nessa complexa realidade sem perder a própria
identidade, bem assim tornar esses processos fatores de progresso para todos
os membros da comunidade - nos planos nacional, regional e internacional
(SÁNCHE , 2004, p. 51).

O êxito de um processo de integração depende de nova concepção da


soberania desprovida, ao menos parcialmente, de conotações outrora
dominantes, devendo "afirmar-se mais em suas notas culturais - verdadeiro
substrato da soberania real - a fim de não perder sua identidade na inter-
relação. E, por outra parte, abrir-se às demais culturas em intercâmbio
fecundo". Outrossim, uma integração real e duradoura requer a
conscientização e o comprometimento dos povos envolvidos no respectivo
processo, pois sua participação nele é, evidentemente, o elemento-chave.
Torna-se imperioso, por conseguinte, "desenvolver canais de participação que
permitam ao homem comum intervir na construção de um futuro melhor". Isso
implica "incrementar mecanismos de manifestação do cidadão, formas de
contato entre governantes e governados, correntes educativas que
conscientizem da necessidade de ocupar-se dos problemas que nos tocam
vitalmente" (SÁNCHE , 2004, p. 53).13

O caráter jurídico da integração expressa-se no direito da integração, ou


direito comunitário, de que se tratará adiante.

No campo das relações internacionais, distingue-se o fenômeno da cooperação


do que se denomina de integração. Em um e outro está presente o conceito-
motor poder ou coordenação de interesses. O sistema de relações particulares
entre os protagonistas é que faz a diferença.

Na cooperação, comumente, há uma atividade de dois ou mais Estados


concorrentes entre si e com os demais, em maior ou menor intensidade. Entre
eles se estabelece um sistema de cooperação mediante o qual coordenam
algumas ações de sua política exterior - geralmente de ordem econômica,
comercial ou tecnológica -, prestam-se mútuo apoio visando à obtenção de
vantagens particulares que contribuam para melhorar sua situação
internacional, sem que isso importe em integração ou abandono da
concorrência entre eles. Eis que a cooperação vale apenas para evitar os
desgastes de uma oposição demasiadamente acirrada (ARBUET-VIGNALI,
2004, p. 178).

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