Marla Mário Sacúr Amade1

A ARQUITECTUTA PROBLEMÁTICA DA DESCENTRALIZAÇÃO EM

MOÇAMBIQUE (AUTORIDADES LOCAIS VS ÓRGÕES DE GOVERNAÇÃO
DESCENTRALIZADA)

THE PROBLEMATIC ARCHITECT OF DECENTRALIZATION IN MOZAMBIQUE

(LOCAL AUTHORITIES VS DECENTRALIZED GOVERNANCE ORGANS)

1
e-mail
A ARQUITECTURA PROBLEMÁTICA DA DESCENTRALIZAÇÃO EM MOÇAMBIQUE
(AUTORIDADES LOCAIS VS ÓRGÕES DE GOVERNAÇÃO DESCENTRALIZADA)
Marla Mário Sacúr Amade 2
Resumo: O presente artigo coloca em reflexão a problemática da descentralização em Moçambique, a criação,
organização e funcionamento das autarquias e órgãos de governação locais como representantes do Estado ao nível
local para a administração e o desenvolvimento do território, integração e unidade nacionais. Sendo o estímulo a
participação comunitária na busca de soluções para o melhoramento das condições de vida objecto central da
descentralização em Moçambique, torna se pertinente a criação de políticas concebidas especificamente para o nível
local como forma de fortalecimento dos mecanismos legais de prática da democracia participativa, portanto, o artigo
faz menção a Lei no 12/2023 de 25 de Agosto 2023 Lei de bases de criação, organização e funcionamento das
autarquias locais sobre a actual reforma da descentralização em Moçambique, para elucidar sobre os possíveis
progressos na matéria de descentralização, envolvimento dos intervenientes sociais na vida local e da comunidade no
processo decisório.

Palavras-Chave: Descentralização, Autarquias e Órgãos de Governação Locais.

THE PROBLEMATIC ARCHITECT OF DECENTRALIZATION IN MOZAMBIQUE (LOCAL

AUTHORITIES VS DECENTRALIZED GOVERNANCE ORGANS)
Abstract

This article reflects the problem of decentralization in Mozambique, the creation, organization and functioning of local
authorities and governance bodies as representatives of the State at the local level for the administration and
development of the territory, national integration, and unity. Since the stimulus to community participation in the
search for solutions for the improvement of living conditions is the central object of decentralization in Mozambique,
it becomes pertinent to create policies designed specifically for the local level as a way to strengthen the legal
mechanisms for the practice of participatory democracy, therefore, the article mentions Law No. 12/2023 of August
25, 2023 Law of bases for the creation, organization and functioning of local authorities on the current reform of
decentralization in Mozambique, in order to enlighten the possible progress in the field of decentralization,
involvement of social actors in local life And the community in the decision-making process.

Key words: Decentralization, Governance, Local authorities

2
e-mail

1
 1. INTRODUÇÃO

A descentralização constitui um dos duas vertentes. Desconcentração, através da

princípios-chave da organização da Lei n.o 8/2003, de 19 de Maio e
administração pública em Moçambique, a descentralização, no contexto da criação,
qual, segundo n˚1 do art.270-A da organização e funcionamento das autarquias
Constituição da República, visa organizar a locais, lei n.o 12/2023, de 18 de Agosto. As
participação dos cidadãos na busca de quais serviram de base para realização do
soluções para o melhoramento das condições estudo. Autarquias locais3 são pessoas
de vida e promover o desenvolvimento colectivas públicas, dotadas de órgãos
localmente. “A descentralização é um representativos próprios, que visam a
processo pelo qual a lei transfere atribuições prossecução dos interesses das populações
e poderes de decisão, até aí pertencentes aos respectivas, sem prejuízo dos interesses
órgãos do Estado, para órgãos próprios de nacionais e da participação do Estado.
entidades independentes do Estado,
Desta forma, o trabalho tem como
designadamente autarquias locais”
objectivos debruçar sobre a arquitectura
(ZAVALE, 2011, p.47 citado em
problemática da descentralização em
VIQUELEQUE, 2018)
Moçambique, autarquias e os órgãos de
Ou seja, de ponto de vista teórico e governação locais; Descrever os tipos de
normativo, a descentralização visa assegurar descentralização: administrativa, fiscal e
a consolidação da democracia, a promoção
democrática; bem como, descrever o
do desenvolvimento local e participação
histórico do processo de descentralização em
comunitária no processo decisório. É neste
Moçambique e abordar sobre os paradigmas
âmbito que o Estado implanta as autarquias
das autarquias e os órgãos de governação
locais ao poder local, à luz do n˚1 do art.135
locais em Moçambique.
da Constituição da República, para responder
aos interesses das respectivas populações. Internacionalmente, o estudo e a
problematização da descentralização no
O processo de descentralização em
contexto africano foram realizados por James
Moçambique está actualmente assente em
Fesler, na década de 1950, o qual considerava

3
Constituição da República de Moçambique 2004, Artigo 272.

2
que para a análise dos sistemas, governos
locais e dos processos de descentralização
administrativa eram necessários para fazer
distinção entre os conceitos "Devolução e
desconcentração de poderes".
Fonte: Com vontade política haverá descentralização
em Moçambique – DW – 23/09/2016
MATERIAIS E MÉTODOS
De modo a debruçar sobre o tema
Arquitectura Problemática da Descentraliza-
ção em Moçambique (Autoridades Locais Vs
Órgões De Governação Descentralizada), a
literatura na área das ciências sociais sugere
uma abordagem na qualitativa, assente em
dados sob domínio público, onde foi
adaptada a pesquisa bibliográfica e
documental, tais como leis, decretos, artigos
científicos, relatórios, normas jurídicas e
livros que abordam assuntos relacionados ao
4
Documento de Base do Programa Nacional de
Descentralização – PND Pag 6-8, 2019
tema, com enfoque para descentralização,
órgão de governação e autoridades locais.
RESULTADOS
Descentralização em Moçambique
Enquadramento Histórico e do Conceito de
Descentralização em Moçambique
Narrativa histórica4
O tema sobre descentralização em
Moçambique é remetido já aos tempos da luta
armada. No período pós-independência,
houve experiências de descentralização,
destacando-se a criação das Assembleias
Populares, conselhos executivos das cidades
e a criação dos Governos Provinciais em
1978, e toda a estruturação da divisão
administrativa do Estado consagrada nas
sucessivas constituições do país — de 1975,
1990 e 2004 revista no ano 2018 pela Lei n. º
1/2018 de 12 de Junho — que previa a
existência dos Órgãos Locais do Estado
(OLE). Neste contexto, o maior ponto de
inflexão significativa do processo deu-se em
1994, primeiro com a aprovação da lei n.º
3/94, referente aos distritos municipais ainda
no legislativo mono partidário,
posteriormente revogada, e através da
emenda constitucional de 1996 (lei n.º 9/96,
de 22 de Novembro), que introduziu os
órgãos de poder local. Esta alteração
3
Constitucional criou bases para a aprovação
da legislação das autarquias locais,
começando pela lei que aprova o quadro
jurídico para a implantação destes órgãos —
a lei n.º 2/97 de 18 de Fevereiro — seguindo-
se uma série de instrumentos legislativos e
regulatórios que constituíram o chamado
pacote autárquico.
O quadro de organização e funcionamento
Dos Órgãos do Estado ganhou mais impacto
com a aprovação da lei n.º 8/2003 de 19 de
Maio (a Lei dos Órgãos Locais do Estado —
LOLE) e o respectivo regulamento, aprovado
pelo Decreto n.º 11/2005, de 10 de Junho. A
esta legislação seguiu-se a aprovação de
Decretos referentes à organização tipo dos
distritos (6/2006, de 12 de Abril), à
descentralização das competências na gestão
dos recursos humanos aos governos
provinciais e distritais (Decreto n.º 5/2006, de
12 de Abril), a aprovação da Estrutura
Orgânica do Governo Provincial (Decreto
21/2015), e o estabelecimento de Normas e
Critérios Gerais de Organização das
Direcções Provinciais (Decreto n.º 24/2015).
As mudanças legislativas recentes
modificaram de forma significativa o quadro
legal, (Lei no 12/2023 de 25 de Agosto 2023,
Lei de bases de criação, organização e
funcionamento das autarquias locais, CRM
(Constituição da República de Moçambique,
revisão constitucional, Lei n. º 1/2018 de 12
de Junho) em alguns casos significando uma
ruptura e em outros casos se juntando a um
quadro já existente, tanto legal como de
políticas voltadas à descentralização e ao
desenvolvimento económico local, a ser
apresentado adiante.
Conceptualização
O processo de descentralização engloba
vários aspectos em termos políticos,
económicos, sociais, culturais e científicos.
Por que é importante descentralizar?
Segundo (GASPAR 1991, MANDANI 1996,
MANOR 1997, 1999, GUAMBE 1998,
SWILLING at al 1998, citados em
KUMUNGA, 2019), a descentralização
capacita as instituições da sociedade civil, em
pondera as comunidades locais, promove a
democracia localmente, reduz a corrupção e
nepotismo, reforça o espírito de auto-estima
e identidade comunitária, bem como concede
aos cidadãos facilidades de acesso a alguns
serviços básicos e contribui para a construção
do Estado.
Uma das razões fundamentais para a
existência dos governos locais é a
pressuposição de que níveis inferiores do
Governo, por exemplo, o Governo local, está
bem colocado para perceber os desejos e as
demandas dos cidadãos para os serviços
públicos do que um Governo distante e
4
centralizado (EKPO, 2007; HAMID, 2013; fraca de descentralização, enquanto esta
OKAJIE, 2009 citados em OMBE, J, apenas distribui os poderes de decisão,
CATIQUE,J, 2017). Isto, devido à responsabilidades na gestão financeira e
proximidade que os governos locais têm com outros.
a população, onde permite um fácil
“Este tipo de desconcentração e
envolvimento destes no processo de
comummente utilizada em Estados unitários
governação participativa, o que não
como Moçambique” KUMANGA, 2019,p.94
aconteceria em governos centralizados.
Descentralização fiscal trata da transferência
Tipos de Descentralização
de responsabilidades e recursos, outrora
Segundo MANOR, 1997, p.4 citado em assumidos pelo Estado ou governo central,
KUMUNGA, 2019) existem três principais para uma entidade ou agência pública e/ou
tipos de descentralização: privada. Exemplo são as empresas estatais
que passam a gestão publica ou privada
1. A desconcentração/descentralização
.(MANOR, 1997 citado por KUMUNGA
administrativa;
2019,P.94)
2. Descentralização fiscal;
Estes recursos tornaram se importantes no
3. Devolução ou descentralização processo de descentralização, para um
Democrática. funcionamento adequado das administrações

Onde a desconcentração e um processo da locais. Nas autarquias locais, estes fundos

transferência das funções administrativas e podem provir de auto geração por meio de

competências dos órgãos centrais ou rendimentos ou receitas resultantes de

superiores para estruturas governamentais do impostos, doações nacionais e internacionais,

nível inferior de tomada de decisões. transferências intra governamentais, bem

como empréstimos bancários, entre outras
Ou seja, a desconcentração ira
fontes.
permitir que o governo central, apesar de
delegar as competências nos órgãos Devolução ou descentralização

inferiores, mantém sempre o poder, para Democrática, este resulta da devolução do

retirar las quando necessitar. Deste modo, a poder político a entidades autónomas ou com
desconcentração e tida como a forma mais maior autonomia, conhecidas por governos
locais. Sob a estrutura de devolução, os

5
governos locais tem como competências de político, pelo que a autonomia é conferida
adoptar iniciativas próprias para o aos órgãos e não aos territórios e essa
desenvolvimento local. Esta estimula a autonomia é administrativa, patrimonial e
participação dos cidadãos nas actividades financeira exercida dentro dos limites fixados
políticas, económicas e sociais, ao mesmo na Constituição e na lei, pois o poder
tempo que concorre para o aumento da legislativo e judicial continuarão
transparência dos actos públicos. centralizados, assim como as áreas de
(KUMANGA,,2019,p.95) soberania continuarão a ser da
responsabilidade exclusiva do Estado e
Segunda MACUÁCUA, 2021 são instituídos
configuram um limite à própria
três níveis de entidades descentralizadas:
descentralização.
1. Órgãos de Governação
Quais são os factores associados a uma
Descentralizada Provincial, que
efectiva descentralização?
compreende o Governador de
Província, o Conselho Provincial e a ✓ Uma sociedade democrática que
Assembleia Provincial. permite aos cidadãos gozar a
2. Órgãos de Governação liberdade de expressão.
Descentralizada Distrital que ✓ Uma sociedade civil dinâmica, pois, a
compreendem o Administrador de descentralização pode ser
Distrito, o Conselho Distrital e a determinado pelo grau de
Assembleia Distrital. participação dos diversos órgão
3. Autarquias locais que compreendem sociais na resolução dos problemas
o Presidente da Autarquia, o locais. KUMANGA, 2019, p. 104
Conselho Autárquico e a Assembleia
MANOR, 1997p.47 Citado por
Autárquica.
KUMANGA,2019,p..109 acrescenta:
Ainda na perspectiva de MACUÁCUA, 2021
a autonomia dos órgãos descentralizados de ✓ Poderes suficientes para exercer

governação provincial e distrital, não se influência substantiva dentro do

confundem com a autonomia territorial das sistema político e dos processos de

províncias e dos distritos, pois o modelo de desenvolvimento

descentralização adoptado é o da
descentralização administrativa e não

6
 ✓ Disponibilidade de recursos função a representação do Estado ao nível
financeiros adequados para cumprir local para a administração e o
as tarefas importantes desenvolvimento do respectivo território e
✓ Capacidade administrativa adequada contribuem para a integração e unidade
para realizar tais tarefas nacionais.
✓ Existência de mecanismos de
A organização e o funcionamento dos órgãos
responsabilização
do Estado localmente obedecem aos
Definição Dos Limites Da princípios de descentralização e
Descentralização5 desconcentração, sem prejuízo da unidade de
acção e dos poderes de direcção do Governo.
São definidos os limites da descentralização,
não sendo objecto de descentralização as Órgãos de Governação Descentralizada
matérias de exclusiva responsabilidade dos
De acordo com MACUÁCUA, 2023,p372),
órgãos de soberania, dos órgãos e instituições
são definidas como pessoas colectivas
centrais do Estado, por exemplo: (i) a
públicas adoptadas de personalidade jurídica,
definição e organização do território; (ii) a
com uma autonomia administrativa,
defesa nacional, a segurança e ordem pública;
patrimonial e financeira. A autonomia é
(iii) a fiscalização das fronteiras; (iv) a
conferida aos órgãos e não aos territórios, por
emissão de moeda; (v) as relações
isso não abrange a esfera política, dai que
diplomáticas; (vi) os recursos minerais e
estes órgãos não dispõem de poder
energia; (vii) bem como os recursos naturais
legislativo, mas sim regulamentar.
situados no solo e no subsolo, nas águas
interiores e no mar territorial, na plataforma Nos termos do disposto no artigo 286 da

continental e na zona exclusiva; (viii) a CRM, a descentralização compreende os

criação e alteração dos impostos, entre órgãos de governação descentralizada

outras. provincial, distrital e as autarquias locais. O

Estado mantém nas entidades
Órgãos De Governação Local Do Estado
descentralizadas as suas representações para
Nos termos do estabelecido Artigo 262 da o exercício de funções exclusivas e de
CRM Os órgãos locais do Estado têm como soberania, nos termos definidos por lei.

5
CRM, Artigo 270 nr 2

7
Os órgãos de governação Descentralizada
provincial e distrital estão entre o Estado e as
Autarquias Locais, por isso na definição das
suas atribuições, o critério adoptado para a
definição das suas atribuições foi por
exclusão das atribuições conferidas aos
órgãos centrais do Estado e as Autarquias
Locais.MACUÁCUA, 2021
6
Principais Características Dos Órgãos De
Governação Descentralizada
a) Os órgãos de governação
Descentralizada, são constituídos por
três elementos: território, população e
órgãos executivos e deliberativos.
b) Os órgãos são eleitos por sufrágios
universal, igual, secreto, periódico e
pessoal
c) Gozam de autonomia administrativa,
patrimonial e financeira
d) Tem Personalidade jurídica
capacidade jurídica própria, distinta
do Estado.
e) Dispõem, de um poder regulamentar
próprio
f) Estão sujeitos a tutela do Estado
g) Os órgãos executivos prestam contas
nos órgãos deliberativos
Autonomia dos órgãos de governação
descentralizada e das autarquias locais7
6
Edson da Graça Francisco Macuácua, 2021
O artigo 269 da CRM dispõe que “Os órgãos
de governação descentralizada e das
autarquias locais gozam de autonomia
administrativa, financeira e patrimonial, nos
termos da lei”.
A autonomia é concedida aos órgãos e não
aos territórios (províncias e distritos), isto é,
não são as províncias e os distritos que são
autónomos, mas sim os órgãos de governação
descentralizada provinciais e distritais é que
são autónomos e autonomia é administrativa,
patrimonial e financeira; a autonomia não é
política, pelo que os órgãos de governação
descentralizada provinciais e distritais não
estão investidos de um poder legislativo.
Autarquias locais
De acordo com MACUÁCUA, 2023, p.313,
as autarquias locais são pessoas colectivas
públicas territoriais. Estas são caracterizadas
e essencialmente pela autonomia.
Ou seja, as autarquias são um órgão que
presta serviços públicos em nome do Estado
a ele ligada. Seu objectivo é ser um auxiliar
do Estado na prestação de serviços de
carácter público.
Segundo MACUÁCUA,2023, p.312, a
função das autarquias locais e a prossecução
dos interesses próprios das populações
7
Edson da Graça Francisco Macuácua, 2021
8
respectivas, que são aquelas que radicam nas
comunidades locais enquanto tais, isto é, que
são comuns a comunidade local, e que se
definem dos interesses da colectividade
nacional e dos interesses próprios das
restantes comunidades locais.
Ainda na perspectiva
MACUÁCUA, 2021, entre as principais
características do modelo de autarquias locais
definido pela lei n.º 2/97 de 18 de Fevereiro
destacam-se:
1. A autonomia administrativa,
patrimonial e financeira;
2. A sujeição à tutela administrativa do
Estado;
3. A existência da representação do
Estado;
4. A sua criação gradual por lei
aprovada pela Assembleia
República;
5. A outorga do poder regulamentar;
Conforme a Lei n.° 6/2018, artigo 9 nr 2 a
autonomia administrativa compreende os
seguintes poderes:
a) praticar actos definitivos e executórias na
área da sua circunscrição territorial;
b) criar, organizar e fiscalizar
serviços destinados a assegurar a
prossecução das suas atribuições.
3. A autonomia financeira compreende os
seguintes poderes:
a) elaborar, aprovar, alterar e executar
planos de actividades e orçamento;
b) elaborar, aprovar as contas de
gerência;
c) dispor de receitas próprias, ordenar
de
e processar as despesas e arrecadar as
receitas que, por lei, forem destinadas
às autarquias;
d) gerir o património autárquico;
e) recorrer a empréstimo nos termos
da legislação em vigor.
A autonomia patrimonial consiste em ter
património próprio para a prossecução das
atribuições das autarquias locais.
DISCUSSÃO
Abordar a realidade da descentralização,
da governação local e autarquias locais não é
suficiente prestar atenção somente aos
processos formais – políticas públicas,
decisões governamentais, normas
legislativas, textos administrativos,
organismos sociais – que podem ser
desmentidos, ignoradas ou fracamente
aplicados nas realidades do terreno à escala
local. E necessário uma pesquisa mais
aprofundada no terreno, ou seja, nas
autarquias locais e/ou comunidades.
9
Em Moçambique, a descentralização tem
sido vista como uma forma de melhorar a
governação e permitir uma maior
participação das comunidades locais na
tomada de decisões. No entanto,
implementação da descentralização tem
enfrentado desafios significativos.
No entanto, a implementação da descentrali-
zação tem enfrentado desafios significativos.
Um dos principais desafios é a tensão entre as
autoridades locais eleitas e os órgãos de
governação descentralizada nomeados pelo
governo central. Isso muitas vezes resulta em
conflitos de interesse e pode levar à falta de
cooperação e coordenação.
Os órgãos de governação
descentralizado, provincial, distrital
autarquias locais gozam de autonomia
administrativa, financeira e patrimonial.
Sendo a autonomia uma das características
básicas das autarquias, esta e colocada em
questão, pois, estas carecem de recursos de
todo o tipo, tanto humanos, financeiros e
infra-estruturas, onde estrutura económica
continua grandemente dependente do Estado
ou governo central, a transferência de
competências para as colectividades locais
pode ser anulada pela transferência
insuficiente de recursos, ou seja, mecanismos
de controlo de abusos de poder e mobilização
de recursos próprios são fracos. Além disso,
muitas áreas rurais em Moçambique
enfrentam desafios de infraestrutura e falta de
capacidade institucional para implementar a
descentralização. Isso pode levar à exclusão
a das comunidades locais e à falta de serviços
básicos essenciais, como água potável e
saneamento.
A necessidade de compreensão da dinâmica
local e a autonomia realmente efectiva das
autarquias moçambicanas torna-se
pertinente.
"Parece que a transferência do poder
político foi feita para entidades de pouca
capacidade de assegurar autogestão."
KUMANGA, 2019,p.32
e A participação comunitária, por norma, e
realizada por associações representantes de
interesses específicos, tais como, sindicatos,
associações de camponeses ou segmentos
fragilizados da população que se organizam
espontaneamente para intervir em problemas
concretos e pontuas. Segundo KUMANGA,
2019, em geral, iniciativas promovidas por
comunidades municipais são quase que
inexistentes, o que faz lembrar o tempo do
poder centralizado.
Estas formas organizativas locais permitem
a alteração significativa da relação entre o
Estado e a sociedade, pois criam novos canais
de participação popular na procura de
10
consensos e alianças necessárias para sociais na vida local, quer na definição da
definição de políticas públicas de impacto propriedade, quer na concepção de planos do
colectivo apropriação pela sociedade. desenvolvimento.
Entretanto, ainda parece difícil criar
Das condições para efectivação da
estruturas locais que realmente derivam da
descentralização, fortalecimento dos órgãos
vontade das comunidades locais. Em
locais do Estado e os órgãos locais de modo
obediência ao princípio de gradualismo,
geral revela se ainda pertinente no contexto
Moçambique já conta com 65 autarquias , os 8
moçambicano.
critérios para definição das autarquias estão
em constante alteração. Mas, na essência A transferência do poder de tomada de

prevalecem os determinantes infra- decisão para os níveis do Governo que estão

estruturas, económico-social, como os mais próximos da população, ou seja, a

mercados, serviços públicos, industria, desconcentração (autarquias locais) pode

energia, entre outros. Porem, as políticas permitir aos cidadãos uma maior influência

concebidas para o nível local pouco sobre o nível e o tipo de serviço dos governos

estimulam a participação comunitária e a que a população necessita, possibilitando

promoção da capacidade das estruturas maior habilidade do Governo cumprir com as

municipais, porque poucos recursos são metas e satisfação dos mesmos.

alocados aos municípios. O nível de

Independentemente da existência de
participação local e ainda limitado, havendo
autarquias locais, o Estado continua a
uma necessidade de consciencialização, pelas
participar nos interesses das populações
estruturas políticas, como das pessoas que
locais através dos órgãos locais o Estado
encarecem a questão da participação
continua a participar na preservação dos
fundamental no processo do
interesses das populações locais através dos
desenvolvimento local. O que pressupõe o
órgãos locais territoriais (Governos
fortalecimento dos mecanismos legais de
provinciais, governos distritais, postos
prática da democracia participativa para
administrativos, e localidades). Em
estimular o envolvimento dos intervenientes
Moçambique, o modelo adoptado é

8
Parlamento Aprovou Criação de 12 Novas
Autarquias em Moçambique • Diário Económico
(diarioeconomico.co.mz) acessado dia 30/09/2023

11
parcialmente descentralizado, havendo República de Moçambique. publicados no
autarquias locais em 65 centros urbanos do Boletim da República,1ª Serie-nº51, de 22 de
país. Para superar esses desafios, é Dezembro de 2004
importante que o governo central trabalhe em
Leis
estreita colaboração com as autoridades
locais eleitas e com as comunidades locais Lei n.º3/94,de 13 de Setembro, Lei que

para garantir uma implementação eficaz da aprova o Quadro Institucional dos Distritos

descentralização. Isso pode envolver o Municipais, publicada no Boletim da

investimento em infraestrutura e capacitação República, I Série,N.º37,2º Suplemento de 31

institucional para garantir que as de Setembro de 1994.

comunidades locais possam participar Lei n. º2/97, de 18 de Fevereiro, Lei que

plenamente na tomada de decisões. aprova o quadro jurídico legal para a

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS implantação das Autarquias Locais,

publicado no Boletim da República, Iª Série,
Livros
n.º 71 (2ºSuplemento), de 18 de Fevereiro de
1997.
KUMANGA, M. Descentralização em
Moçambique Desafios da participação Lei n. º 1/2018 de 12 de Junho (Lei de
democrática e desenvolvimento local. Revisão Pontual da Constituição da
Maputo: Escolar Editora, 2019. República), publicada no BR, de 12 de Junho
de 2018, I Série-Número 115.
MACUÁCUA,E, (2023). A configuração
Lei n.º 6/2018, de 3 de Agosto, lei que altera
Jurídica da Descentralização em
a lei n.º 2/97, de 18 de Fevereiro, estabelece
Moçambique: contributo para um
o quadro jurídico-legal para a implementação
paradigma moçambicano de
das autarquias locais, publicada no Boletim
descentralização. Maputo: Escolar Editora,
da República, I Série, Número 152, de 3 de
2023.
Agosto de 2018.
Legislação Aplicada

Constituições da República De
Moçambique (2004). Constituição da

12
Lei n. 8/2003, de 19 de Maio e
descentralização, no contexto da criação,
organização e funcionamento das autarquias
locais, lei no12/2023, de 18 de Agosto.

Relatórios técnicos, dissertações, teses e

outros

Macuácua,E. A Revisão Constitucional De

2018 Em Moçambique: Contexto,
Processo E Desafios, Ano 7 (2021), nº 6,
663-709

República De Moçambique, Ministério Da

Administração Estatal E Função Pública.
Documento De Base Para O Desenho Do
Programa Nacional De Descentralização,
Maputo, 2019.

VIQUELEQUE,O. A Problemática Da
Descentralização Democrática Em
Moçambique: O Caso Da Governação Local,
Face A Governação Central Na Cidade De
Nampula. Universidade Pedagógica de
Nampula, 2018.

OMBE,J e CATIQUE,E. As Implicações da

Descentralização na gestão das unidades
sanitárias: Um olhar para o caso do município
de Maputo,Maputo, 2017.

13