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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

Administração Pública 3ª Ano

Canifai Ângelo Corneta

Ernestina Manuel

Idalina Castro

Igor Carlos Uaite

Tifany Felizardo Horta

Desafios no Processo de Autarcizaçâo em Moçambique

Docente

MBA: Aboochama Oliveira Vontade

Nampula

2019
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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MOÇAMBIQUE

FACULDADE DE DIREITO

Administração Pública 3ª Ano

Canifai Ângelo Corneta

Ernestina Manuel

Idalina Castro

Igor Carlos Uaite

Tifany Felizardo Horta

Desafios no Processo de Autarcizaçâo em Moçambique

Trabalho em grupo de carácter avaliativo, da


cadeira de Administração Autárquica, com
objectivo de debruçar sobre os desafios no
processo de Autarcizaçâo em Moçambique, cadeira
leccionada pelo MBA: Aboochama oliveira
Vontade

Nampula

2019

1
Introdução

O presente trabalho enquadra-se na cadeira de Administração Pública Autárquica, e tem por


Objecto falar dos Desafios do processo de Autarcizaçâo em Moçambique, no que concerne
aos desafios dos líderes comunitários no desenvolvimento local, os desafios dos Municípios
no processo de gestação local, os desafios dos Munícipes e da sociedade civil no processo de
tomada de decisão, o financiamento pelos empréstimos nas Autarquias Locais e a Gestão do
património domínio público das Autarquias Locais.

A descentralização é um fenómeno muito novo em Moçambique, mas trás consigo vários


desafios para os seus principais actores, como as comunidades, os líderes tradicionais, os
Municípios, a sociedade até mesmo o Estado. A existência das autarquias locais é uma
verdadeira forma de aproximar os serviços aos cidadãos e, promover a participação e
desenvolvimento ao nível local.

A Autarquia Local como pessoa colectiva pública, não pode materializar os seus fins sem o
uso de alguns meios, sejam eles humanos, financeiros e patrimoniais, dai que neste trabalho
irá se delimitar qual o domínio público das autarquias, e consequentemente quais as condições
e casos em que esta pode acorrer aos empréstimos para cobrir as suas despesas e realizar as
atribuições que lhes são concedidas. A primeira parte do trabalho, faz-se-a um breve
enquadramento do surgimento das autarquias locais em Moçambique, seguindo com a
discussão sobre os desafios que os líderes comunitários devem enfrentar, os Municípios, os
Munícipes e a sociedade no processo de tomada de decisão.

O trabalho é resultado de uma investigação bibliográfica rigorosa e legal, assim como


tecnológica.

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1.Desafios do processo de Autarcizaçâo em Moçambique

Segundo Cistac (2012) “O processo de descentralização é relativamente antigo em


Moçambique apesar de que se tornou mais consistente a partir do fim dos anos 80” (p.2).

A crise económica de 1980, foi o primeiro marco do processo de autarcizaçâo em


Moçambique, seguindo com a aprovação de uma nova constituição de 1990, que instituiu o
modelo de democracia pluripartidária que rompeu com o regime do governo de
partido único ou seja:

As concepções de um possível modelo de descentralização vieram a ser


concretizadas no que se designou de Programa de Reforma dos Órgãos Locais
(PROL), criado em 1991, este favoreceu a apresentação das primeiras ideias sobre a
partilha do poder político nas áreas de escalão inferior do Estado, A primeira
abordagem está baseada na descentralização territorial operada através da criação
dos municípios distritais com a lei nº3/94 de 13 de Setembro, que exercem o seu
auto governo e possuem autonomia administrativa e fiscal, a segunda abordagem
está relacionada à desconcentração concretizada pelos órgãos provinciais, através da
transferência de responsabilidades do governo central para esses entes locais os
quais, não possuem autonomia subnacional e o movimento das relações (Simione et
al, 2018, p.8).

Segundo Simione et al (2018), com a aprovação da lei que criava os distritos municipais, em
1994 ocorrem as primeiras eleições multipartidárias, a lei que cria os distritos municipais é
revogada, houve emenda constitucional em 1996 e em 1997 foi aprovada a lei nº2/97 de 18 de
Fevereiro, que cria o quadro jurídico para a implantação de autárquicas locais.

Embora aprovada a lei que criará as autarquias locais, esta institucionalizou-se em 1998, com
a realização das primeiras eleições autárquicas que apenas envolviam 33 autarquias.

O termo descentralização em Moçambique é definido no artigo 6 da lei nº7/2012 de 8 de


Fevereiro, sendo a criação pelo Estado de pessoas colectivas públicas menores, ou seja, a
descentralização implica que a prossecução do interesse público passa a ser encarregue a
outras pessoas colectivas públicas diferentes do Estado.

Segundo Amaral (1998) “onde quer que haja autarquias locais, enquanto pessoas colectivas
diferentes do Estado, e dele juridicamente separado, poderá dizer-se que existe
descentralização em sentido jurídico” (p.422).

Nos termos do nº2 do artigo 271 da CRM, as autarquias locais são pessoas colectivas
públicas, dotadas de órgãos representativos próprios que visam a prossecução dos interesses
públicos das respectivas populações, sem prejuízo dos interesses nacionais e da participação
do Estado.
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Segundo Amaral (1998) “ as autarquias locais são pessoas colectivas de população e territorial
correspondente ao agregado de residentes em diversas circunscrições do território nacional, e
que asseguram a prossecução dos interesses comuns resultantes da vizinhança” (p.418).

De acordo com Cistac (2012), O processo de descentralização Moçambicano deverá fazer


face a dois desafios opostos. Por um lado, as autarquias locais deverão fazer face a um
processo rasteiro de recentralização empreendido pelo Estado, e lutar pelo reforço da sua
própria autonomia.

1.2 Desafio dos Lideres Comunitários no Desenvolvimento Local

O nº2 do artigo 26 da lei nº6/2018 de 3 de Agosto, consagra que no desempenho das suas
actividades, os órgãos das autarquias locais podem auscultar as opiniões e sugestões das
autoridades tradicionais reconhecidas pelas comunidades como tais, de modo a coordenar
com elas a realização de actividades que visem a satisfação das necessidades específicas das
referidas comunidades.

No contexto Moçambicano, nos termos do artigo 104 do decreto 11/2005, a comunidade local
é o conjunto de população e pessoas colectivas compreendidas numa determinada organização
territorial, agrupando famílias, que visam a salvaguarda de interesses comuns, tais como a
protecção de áreas habitacionais, áreas agrícolas, quer sejam cultivadas ou em pousio.

Segundo o nº 1 do artigo 105 do Decreto 11/2005 de 10 de Junho, as autoridades comunitárias


são pessoas que exercem uma forma de autoridade sobre determinada comunidade ou grupo
social, tais como chefes tradicionais, secretários e bairro ou aldeia, e outros lideres
legitimados como tais pelas respectivas comunidades ou grupo social.

O decreto acima citado estabelece direitos e deveres das autoridades comunitárias nos artigos
106, 107 e 108, sendo que o nª 2 do artigo 108, estabelece que estas são consultadas nas
questões fundamentais que afectem a vida e o bem-estar da população e o desenvolvimento
integrado e harmonioso das condições de vida da comunidade local.

Os líderes comunitários ajudam a dar voz a suas comunidades, facilitando a apresentação de


demandas ao poder público, isto é:

O líder comunitário é importante no contexto do desenvolvimento local de uma


comunidade, em prol da qualidade de vida, trabalho e renda, o líder deve actuar com
projectos e junto a entidades que promovam o desenvolvimento local para sanar as
demandas do seu entorno, principalmente em busca de uma maior auto-estima; nesse

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sentido, ele torna-se imprescindível para o processo de interacção do líder
comunitário com o desenvolvimento local (comissão senado do futuro, 2018,p.1).

A liderança comunitária tem um papel decisivo no processo de desenvolvimento local. Com


efeito, uma comunidade, coordenada e gerenciada por um líder, é capaz de desenvolver-se de
modo sustentável, tendo consciência da interdependência de seus membros, sabendo que o
sucesso de todos depende do sucesso de cada um e que o sucesso de cada um depende do
sucesso de todos, por isso que:

É preciso, contudo, esclarecer que o surgimento de um processo de liderança não irá


resolver todos os males da comunidade, mas é inegável que a capacidade de pessoas
serem agentes de sua história, empreendedoras, criativas, inovadoras, buscando a
realização de suas necessidades e a cooperação da comunidade, criando laços de
confiança, organizando-se em redes e em parcerias, em torno de valores e objectivos
comuns, vai depender fundamentalmente de sua liderança. O desenvolvimento local
existe quando se pensa na possibilidade de organizar-se em grupos sociais,
relativamente homogéneos, motivando em cada membro uma consciência de seus
problemas históricos, fazendo com que as pessoas acreditem que a acção provoca
uma mudança e buscando despertar em cada um a sua importância na solução desses
problemas (Borges & Pinheiro, 2012,p.2).

Segundo Borges & Pinheiro (2012), o líder comunitário deverá, praticar junto com a
comunidade, as seguintes acções:

 Reunir as pessoas que participam da comunidade, buscando desenvolver em


cada uma, a responsabilidade pela melhoria das condições de vida, tanto de ponto de
vista individual, como principalmente colectivo;
 Estabelecer a visão da comunidade;
 Diagnosticar as ameaças (actuais e futuras) e oportunidades da comunidade;
 Identificar as alternativas de solução para minimizar ou eliminar as ameaças e
traçar acções no sentido de robustecer as oportunidades identificadas;
 Formular os objectivos em função das acções estabelecidas, procurando
combinar factores económicos, ambientais e socioculturais e sempre incorporando o
conceito de sustentabilidade;

O artigo 107 do decreto 11/2005, confere as autoridades tradicionais o dever de instruir as


populações sobre a produção agrícola, ajudar a comunidade a participar condignamente nas
cerimoniais de celebração das datas históricas, Aos lideres comunitários cabe a tarefa de
informar as autoridades administrativas sobre a existência de epidemias, secas, cheias, e
pragas, assim como ajudar a identificar as situações de falta de emprego e promover as formas
de auto emprego, individual ou associativo.
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O líder comunitário tem como desafio, definir o eixo de desenvolvimento da comunidade,
estabelecer os planos de acções e delegar as autoridades competentes para a sua
materialização, por isso que:

O líder comunitário deve traçar os mecanismos de acompanhamento de cada


projecto, estabelecer a periodicidade de reavaliação dos planos, procurar sempre
avaliar o impacto ambiental de cada projecto e examinar desde seus possíveis efeitos
ambientais até os impactos económicos e sócio culturais. Obter programas que
visem á melhoria de qualidade de vida da população, além de propiciarem a geração
de trabalho e renda para a comunidade (Borges & Pinho, 2012.p.4).

Segundo Galli (2003), citado por Weimer & Carrilho (2017, p.194), Os líderes tradicionais
muitas vezes conhecem com alguma precisão os limites, os recursos e a história das suas
terras e territórios, incluindo as circunstâncias da sua ocupação, contestações e mudanças,
além dos papéis e funções tradicionais, eles também desempenham um papel de facilitação
administrativa na emissão de documentos para assuntos públicos e até privados.

Os líderes locais podem ter uma significativa capacidade de moldar a vida das suas
comunidades, particularmente através dos processos de consulta consagrados em várias leis:

Os dirigentes comunitários são convocados para conselhos consultivos, com alguma


influência no processo de planificação a nível distrital, embora limitados por uma
organização ineficaz e uma interacção e fluxos de informação deficientes. Os líderes
tradicionais e locais estão sujeitos a uma substancial prestação de contas aos seus
superiores, que contrasta com mecanismos fracos ou inexistentes de prestação de
contas descendente aos membros da comunidade. Estes líderes são também o
principal alvo do clientelismo e da compra de votos dos partidos políticos, porque
podem influenciar os padrões de voto locais. Com os seus interesses próprios, são
moderadamente proactivos em relação à devolução e proactivos em relação à
desconcentração (Weimer & Carrilho, 2017,p.194).

1.3 Desafios dos Municípios na Gestão Local

Segundo Santos (citado por Dias, 2015, p.45) Com o poder local coincide a melhor
democracia, porque é uma democracia de proximidade, em contraponto da democracia de
distanciamento, quando não de alheamento, próprios da democracia representativa. Com o
poder local coincide a melhor forma de aproximar os eleitos dos eleitores, porque
reciprocamente se conhecem, se influenciam e se esclarecem.

No actual contexto político-económico, de globalização, de crise económica, mas também


tantas vezes de carências sociais graves, novos desafios se impõe às estruturas de governo
local e particularmente aos municípios:

O primeiro dos desafios, que compete a todos, a todas as instituições públicas e


nesse contexto também aos municípios, parece residir na necessidade de inverter
uma tendência generalizada de afastamento por parte dos cidadãos da sua actividade
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e do exercício dos seus direitos, mas também das suas responsabilidades políticas
perante o sistema democrático vigente. Sendo os municípios as estruturas locais com
competência para responder à generalidade dos problemas que se colocam aos
cidadãos e às colectividades no seu dia-a-dia, devido à sua proximidade e ao
conhecimento mais real das necessidades, aplicando o princípio constitucional da
subsidiariedade, é natural que os seus desafios e as suas responsabilidades sejam
também eles proporcionais ao acréscimo de competências (Dias, 2015,pp.43-45).

Face à evolução das atribuições e competências transferidas da administração central para os


municípios deve questionar-se qual o papel de alguns organismos da administração central se
justifica ou não a sua coexistência ou se ficaram desprovidos de competências e ainda se não
é necessário existir uma entidade que coordene as políticas públicas a nível municipal.

O grande desafio para os Municípios, nos próximos anos, será, por um lado, aumentar a
arrecadação tirando partido de todo o potencial de receitas e, por outro, mobilizar outros
recursos para fazer face aos avultados investimentos, isto é:

Em particular os municípios devem aumentar as infra-estruturas que possibilitarão o


desenvolvimento urbano e protecção ambiental já que muitos destes investimentos
estão acima da capacidade real ou potencial dos municípios e mesmo do próprio
Governo, por outro lado os municípios devem mobilizar recursos para manter a
sustentabilidade dos serviços, entendida como a capacidade da gestão municipal
para prestar os serviços que os munícipes esperam, aumentando permanentemente a
sua cobertura e a qualidade de prestação. A Sustentabilidade dos serviços significa,
os gestores dos serviços terem a capacidade de identificar as prioridades dos
munícipes e traduzir essas prioridades em processos internos ou no estabelecimento
de parcerias para as satisfazer, significa também dotar os Conselhos Municipais de
capacidades e competências não só para prestar os serviços, como para analisar o
seu desempenho, racionalizar os recursos envolvidos e introduzir mecanismos de
melhoria contínua (Noronha & Brito, 2010,pp.107-110).

Segundo o Manual de Desenvolvimento Municipal (2009), uma das principais dificuldades


com que os municípios se defrontam é o imperfeito enquadramento político, jurídico e legal.
As responsabilidades funcionais dos Municípios continuam pouco claras em algumas áreas,
por isso que municípios devem enfrentar os seguintes desafios:

 Estabelecer critérios transparentes e calendários para acompanhar o gradualismo no


processo de municipalização;
 Estabelecer critérios de calendário, metodologia e de “preparação” para a transferência
de quaisquer novas competências para as autarquias.

Os Municípios devem trabalhar em estreita colaboração, para chegarem a um consenso e


estabelecerem as competências específicas, em relação às atribuições que são pouco claras ou
que requerem responsabilidade conjugada:

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As autarquias deverão concentrar-se em alcançar sucesso nas áreas que são
claramente de jurisdição municipal, com o apoio de outros actores. A prioridade
deve ser dada à provisão dos bens e serviços locais mais simples, deixando para
outros níveis do governo e empresas fornecedoras de serviços os mais complexos,
tais como alguns aspectos de saúde e educação, para os quais lhes falta capacidade.
Além disso, os Municípios devem concentrar-se principalmente na provisão de
serviços, para os quais têm mandatos claros, receitas suficientes e capacidade de
executar (Desenvolvimento Municipal, 2009, p.17).

O Município desempenha um papel preponderante na garantia de direitos de meninos e


meninas ao nível local:

É responsabilidade Municipal, sempre de forma articulada com os governos


distritais e provinciais, zelar para que as crianças e adolescentes possam crescer em
segurança, com acesso a cultura e lazer, e protegidos de toda forma de violência,
negligência e discriminação. Os Municípios devem tomar todas as medidas
legislativas, administrativas e outras necessárias à realização dos direitos da Criança,
no limite máximo dos seus recursos disponíveis e, se necessário, no quadro da
cooperação internacional, os Municípios devem tomar medidas necessárias para
proteger as crianças contra qualquer forma de violência, abuso, abandono,
tratamento negligente, maus tratos ou exploração (UNICEF, 2017,pp.6-8).

A UNICEF (2017), propõe os seguintes desafios ao nível municipal:

 Assegurar que a maioria (acima de 50%) do Orçamento Municipal seja alocada para as
áreas sociais;
 Priorizar os grupos sociais mais desfavorecidos e vulneráveis na planificação das
actividades (Planificação e Orçamentação participativa):
 Adoptar políticas públicas de educação cívica aos condutores e peões para a prevenção
de acidentes de viação;
 Adoptar programas específicos ou aderir às políticas públicas do Governo de
Moçambique para a prevenção à violência, com acções voltadas à prevenção da
violência de género e em razão da orientação sexual.
 Garantir a formação continuada dos conselhos de escolas para que actuem na
protecção e na defesa dos direitos de crianças;
 Envolver as comunidades no mapeamento participativo dos espaços públicos;

As responsabilidades autárquicas estão a aumentar e o país está a atravessar um processo


assimétrico de descentralização. Os municípios têm um papel a desempenhar na redução da
pobreza e na promoção do investimento:

Entre outros factores, redução da pobreza urbana está relacionada, com o acesso a
terra, serviços, empregos e alimentação. Às autarquias cabe o papel principal na
regularização da posse da terra e na sistematização dos mercados de terra, em grande
medida corruptos, factores que são reconhecidos internacionalmente como
fundamentais para a canalização de investimentos e poupanças para que os pobres
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acedam a bens, iniciativas agrícolas, urbanas e periurbanas, para que haja garantia
de alimentos e criação de emprego, podem ser apoiadas por um eficaz planeamento
urbano e direitos de uso da terra, bem como para alguns serviços de apoio
específicos. As autarquias podem contribuir para um clima de investimento mais
atraente e para a criação de emprego, através de uma gama de instrumentos,
incluindo investimentos em infra-estruturas físicas de importância crucial
(Desenvolvimento Municipal, 2009,p.8).

Os Municípios em Moçambique têm como desafios, eliminar os condicionamentos do Estado


e do Governo central. Segundo o Manual de Desenvolvimento Municipal, o Estado restringe a
autonomia das autarquias através da imposição de mecanismos institucionalizados de
supervisão que procuram garantir a obediência municipal às regras e normas formais e
processuais da gestão do sector público.

O governo restringe a autonomia das autarquias através de mecanismos que procuram


assegurar a conformidade municipal com as prioridades e práticas políticas substantivas
preferidas pelo regime nacional no poder.

A nível local, o governo e a administração pública, em particular os Municípios enfrentam o


desafio de interagir com as comunidades e líderes locais:

O reforço da governação municipal constitui um desafio para uma melhor prestação


de serviços. Os processos de descentralização e de municipalização empreendidos
desde 1997 têm tido alguns resultados positivos, mas que precisam de ser
aprofundados. A descentralização municipal é a melhor forma de dar resposta aos
desafios da urbanização, no entanto, nas condições actuais, as autarquias não estão
em posição, política, financeira e administrativa, de enfrentar esses desafios e
fornecer serviços a uma população crescente, e particularmente aos pobres
(Desenvolvimento Municipal, p.83)

1.4 Desafio dos Munícipes e da sociedade civil no processo de tomada de decisão

Um dos princípios norteadores da Administração Pública Moçambicana, é o princípio da


participação dos administradores, que estabelece a necessidade da administração pública
promover a participação e defesa dos administrados na formação das decisões que lhes dizem
respeito (artigo10 da lei nº14/2011 de 10 de Agosto).

Consagra o artigo 103 do decreto 11/2005, que os planos de desenvolvimento são elaborados
com a participação da população residente através dos conselhos consultivos locais e visam
mobilizar recursos humanos, materiais e financeiros para a resolução dos problemas, isto
significa que, os munícipes e a sociedade participam no processo de tomada de decisão ao
nível da circunscrição territorial em que residem

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Os Munícipes têm um grande papel no processo de tomada de decisões, a prova disso é que as
sessões extraordinárias da Assembleia Municipal, onde são discutidos os problemas
respeitantes a vida dos cidadãos da respectiva autarquia, podem ser requeridas por 5% dos
cidadãos eleitores do município, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 42 da lei nº2/97.

A sociedade civil assim como os munícipes, têm um papel importante na tomada de decisões,
sendo um dos principais desafios destes actores garantir que os conselhos consultivos locais,
sendo órgãos de consulta das autoridades da administração local, sejam eficazes na busca de
soluções para as questões fundamentais que afectem a vida das populações, o seu bem-estar e
desenvolvimento sustentável (artigo 111 do decreto 11/2005).

A sociedade Civil deve assegurar através do fórum local, que as autoridades tradicionais
como representantes da comunidade saibam definir as suas prioridades que em conjunto com
os comités comunitários assegurem a identificação e procura de soluções dos seus problemas.

Segundo Santos (2002) citado por (Jamal, 2014, p.72), o orçamento participativo é um
processo social e político muito dinâmico, sendo, por isso, difícil extrair a partir dele muitas
projecções, este constitui um mecanismo de participação das comunidades na definição de
acções prioritárias das circunscrições territoriais a que elas pertencem.

O orçamento participativo, constitui um meio de promoção da participação


dos cidadãos em decisões que dizem respeito à justiça distributiva, à eficácia decisória e à
responsabilidade do governo local, tende a fortalecer a democracia local, através do
envolvimento activo dos cidadãos:

Todavia, o orçamento participativo, ligado a descentralização e a planificação


participativa desconcentração deveriam, constituir o centro dos vários mecanismos
locais de participação da comunidade na governação porque, não somente contribui
para a justiça distributiva, melhor prestação de serviços públicos, como também
resulta numa maior prestação vertical de contas e por conseguinte, maior
probabilidade de transparência na governação local (Jamal, 2014, p.73).

1.5 O financiamento pelos Empréstimos nas Autarquias Locais

As autarquias locais possuem uma autonomia local, que é o direito e a capacidade efectiva das
autarquias locais regulamentarem e gerirem, nos termos da lei, sob sua responsabilidade e no
interesse das respectivas populações, uma parte importante dos assuntos públicos ou seja:

Autarquias locais possuem uma autonomia administrativa, patrimonial e financeira.


A autonomia financeira pressupõe que as autarquias locais tenham um poder de
decisão financeira de natureza a garantir-lhes uma autonomia de decisão em relação

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ao Estado. Isto implica um poder de decisão da autarquia local tanto em matéria de
receitas assim como de despesas (Cistac, 2012,p.11-14)

Segundo Cistac (2001), um dos grandes desafios para a efectivação da descentralização,


consiste na atribuição às autarquias locais, de recursos que lhes permitam desempenhar um
papel efectivo no seu desenvolvimento.

Segundo este autor, se as autarquias não tiverem recursos para a realização das suas funções, e
capacitadas em termos financeiros para a prestação de serviços sob sua responsabilidade, a
sua existência como tal não passa de uma ficção.

A autonomia financeira segundo Cistac (2001-p.169), é a possibilidade prática para o


organismo descentralizado de procurar fontes e de escolher a sua utilização, é uma condição
muito importante de uma descentralização concreta e efectiva.

Nos termos do nº1 do artigo 276 da CRM de 2004, as autarquias locais têm finanças próprias,
essa autonomia financeira compreende nos termos da alínea e) do nº3 do artigo 7 da lei nº2/97
de 18 de Fevereiro, o poder de recorrer a empréstimos nos termos da lei.

De acordo com o artigo 18 da lei nº 1/2008 de 16 de Janeiro, os orçamentos autárquicos


podem beneficiar de empréstimos, o recurso a empréstimos tem sempre carácter
extraordinário e destina-se aplicação em investimentos produtivos, e em investimentos de
carácter social e cultural.

O recurso a empréstimos destina-se também, as despesas extraordinárias necessárias à


reparação de prejuízos ocorridos em situação de calamidade publica, assim como satisfazer as
necessidades de saneamento financeiro das autarquias locais, em resultado da execução do
contrato de reequilíbrio financeiro previamente celebrado. A Lei determina que os
empréstimos têm de ser pagos durante o mesmo exercício fiscal em que foram contraídos

O Artigo 19 da lei em estudo atribui as autarquias locais, a faculdade de contrair empréstimos


a curto prazo, junto de instituições de crédito nacionais para acorrer a dificuldades ocasionais
de tesouraria, não podendo o montante ultrapassar em qualquer circunstância ou caso, o valor
equivalente a três duodécimos da verba que cada uma delas couber, nas transferências de
fundo de compensação.

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As autarquias locais podem contrair empréstimos plurianuais, nos termos do artigo 20 da lei
nº1/2008, mas esta contracção depende da ratificação do Ministro que superintende a are das
finanças,

Segundo o Manual de desenvolvimento Municipal (s/d-p113), as autarquias moçambicanas


têm acesso a ajudas e empréstimos, estas ajudas totalizam frequentemente várias vezes o
montante dos orçamentos municipais. Mas as ajudas não são uma fonte regular de receitas,
pois os seus montantes variam de acordo com os projectos específicos de investimento de
cada doador. Além disso, estes recursos são na sua maioria fundos previamente destinados a
certos investimentos específicos de capital e à assistência técnica

O artigo 23 da lei nº2/97 estabelece que a Assembleia Municipal ou de Povoação é o órgão


com competência para autorizar a contracção de empréstimos, desde que a sua amortização
anual ou plurianual seja devidamente fundamentada em mapa demonstrativo da capacidade de
endividamento da autarquia.

Em muitos países descentralizados o recurso aos empréstimos locais é visto como uma
forma eficiente e equitativa de financiar infra-estruturas locais:

No entanto, para que os empréstimos se tornem um instrumento financeiro viável,


seria necessário criar uma série de condições, sobretudo para evitar potenciais
desequilíbrios fiscais. Presentemente, a condições financeiras das autarquias de
Moçambique não são, em geral, favoráveis ao recurso aos empréstimos como
mecanismo regular e viável de financiamento. Os mercados de crédito exigem
mecanismos de controlo que não existem nas autarquias moçambicanas
(Desenvolvimento Municipal, s/d, p.14).

Segundo Mendes (2018), O principal desafio que os municípios enfrentam quando se fala em
finanças autárquicas é a sustentabilidade financeira das autarquias, essa sustentabilidade
financeira está associada a Cultura tributária, o Índice de iliteracia dos munícipes, Fundo de
compensação autárquica e a autonomia financeira das autarquias.

1.6 A Gestão do Património domínio Público das Autarquias locais

Para Caetano (2010-p.218), cada pessoa colectiva tem o seu património, em que podem entrar
direitos de propriedade, tanto sobre coisas corpóreas como sobre coisas incorpóreas. Este
pode ser direito de propriedade, literária ou artística, direitos de crédito e obrigações.

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O nº 4 do artigo 7 da lei nº2/97, estabelece que as autarquias locais possuem uma autonomia
própria, que consiste em ter património próprio para a prossecução das atribuições que lhes
são impostas por lei.

A autonomia patrimonial é o poder de ter património próprio suposto ou tomar decisões


relativas ao património público no âmbito da lei ou seja, a autonomia patrimonial consiste em
as autarquias locais terem património próprio, isto é:

A autonomia patrimonial consiste nas autarquias possuírem bens, móveis e imóveis,


direitos e acções que, a qualquer título, lhes pertençam ou venham a pertencer. O
património das autarquias locais devem estar em consonância com os fins que estas
prosseguem, ou seja, quanto mais actividade e fins o município tiver, maior será a
necessidade de deter bens patrimoniais (Cistac, 2001, p.259).

Nos termos do nº1 e 2 do artigo 32 da lei nº1/2008, constitui património das autarquias todas
as coisas moveis e imóveis, direitos e acções que a qualquer titulo lhe pertençam ou venham a
pertencer. A administração do património autárquico compete ao presidente do conselho
municipal ou de povoação com observância das leis e salvaguardadas as competências da
assembleia respectiva relativamente aos bens utilizados ao seu serviço.

O presidente do conselho municipal ou de povoação, deve promover todas as acções


necessárias à administração corrente do património autárquico e à sua conservação,
assegurando a actualização do cadastro dos bens móveis e imóveis da autarquia, por isso:

Do ponto de vista prático, para um necessário controlo do património da autarquia


local, todos os bens devem estar rigorosamente escriturados em livros próprios, o
património autárquico constitui uma riqueza cujo uso as autárquicas podem e devem
garantir. As autárquicas locais estão sujeitas a uma obrigação de manutenção do seu
domínio público e garantir o uso normal do seu domínio público (Cistac, 2001,
pp.266-268).

É possível conceber uma autarquia seu património próprio, mas também não é a melhor
solução porque:

A não detenção de um património próprio, coloca a autarquia numa situação de


dependência em relação ao proprietário do património, seja ele o Estado ou um
particular, por outro lado se o património não for cuidado não se frutifica e não há
como o proprietário para cuidar do património, alem da relação entre propriedade e
proprietário, existe um conjunto de infra-estruturas colectivas que deverão ser
propriedade da autarquia, como os jardins e sanitários publico, arruamentos e
caminhos autárquicos, ser proprietário implica a responsabilidade na manutenção e
frutificação dos mesmos, o objectivo de um património bem cuidado é o bem-estar
das povoações (Mazula et al, 1998, p.135)

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1.6.1 O domínio público das autarquias Locais

Segundo Cistac (2001) ” o domínio público da autarquia local corresponde ao conjunto dos
direitos reais que a autarquia tem por lei sobre o território e seus espaços, coisas próprias nele
individualizadas ou bens alheios, conferidos para serem exercidos no regime do direito
público” (p.262).

O domínio público constituiu o conjunto das coisas públicas e os direitos públicos que à
administração compete sobre elas formam o domínio público. O que permite diferenciar o
domino público do privado autárquico é a numeração legislativa desses bens,

Para Cistac (2001), as principais componentes do domínio público autárquico podem ser
reagrupados entre os bens naturais ou artificiais, afectados ao uso directo e imediato do
público e os que são afectados a um serviço público autárquico, mas em ambos casos os bens
devem ser propriedade da autarquia local.

a) Os bens afectados ao uso directo e imediato do público

Segundo Cistac (2001), os bens facetados ao uso directo e imediato do público são os
seguintes:

 Os cemitérios públicos mantidos pela autarquia;


 As estradas municipais;
 As praças e jardins públicos, com as respectivas obras de arte;
 As obras, canalizações e redes de distribuição públicas de água e energia eléctrica.

b) Bens afectados a um serviço público autárquico

Os bens afectados a um serviço público segundo Cistac (2001) são:

 Os museus, monumentos e as bibliotecas municipais;


 O palácio municipal;
 Os mercados municipais;
 Os parques municipais de estacionamento de veículos;
 Os matadouros municipais.

14
1.6.2 O domínio privado das autarquias locais

Segundo Caetano (citado por Cistac, 2001), os bens do domínio privado hão-de ser os que, ao
menos em princípio, estão sujeitos a um regime de direito privado e inseridos no comércio
jurídico correspondente.

O domínio privado das autarquias locais é constituindo por coisas de natureza muito diversa,
distinguindo-se assim o domínio privado imobiliário do domínio privado mobiliário. Segundo
Cistac (2001), o domínio privado imobiliário é constituído pelos prédios urbanos afectados a
um serviço público municipal.

O domínio privado mobiliário compreende vários móveis corpóreos, como livros, mobiliários,
maquinas roupas e móveis incorpóreos, como dinheiros públicos, títulos e papéis de crédito e
participações no capital de empresas de direito privado.

15
Conclusão

Chegado ao final do trabalho o grupo conclui que a descentralização é um processo que


permite que o Estado não fique sobrecarregado com as diversas necessidades públicas, e
permite a partilha de poder ao nível politico.

A criação das autarquias locais através da aprovação da lei nº2/97, é um modo de aproximar
os serviços aos cidadãos e promover a participação no processo de tomada de decisão no
âmbito dos problemas das suas comunidades assim como no processo de desenvolvimento
local. A existência das autarquias locais em Moçambique pressupõe que tenham meios
suficientes para a fácil prossecução das suas atribuições, ou seja, é necessário que as
autarquias locais sejam verdadeiramente autónomas, tanto ao nível administrativo,
patrimonial e financeiro.

Para que as autarquias locais sejam verdadeiramente autónomas, é necessário que o Estado
deixe que estas sejam livres para a efectivação das suas funções, atribuindo-lhes meios e
recursos necessários que sejam próprios da autarquia e deixe que as populações respectivas
decidam o ritmo da descentralização ao nível local, que o Estado venha intervir somente para
garantir que as atribuições estejam a ser prosseguidas e que os representantes locais estejam a
prosseguir os fins pelos quais foram eleitos,

Todos devem trabalhar para o desenvolvimento dos seus Municípios, os líderes comunitários,
a sociedade civil, os políticos, independentemente das suas cores partidárias, convicções
religiosas e terem a concepção de que o bem-estar de qualquer autarquia assim como o
crescimento da mesma equivale ao bem-estar de todo o Estado Moçambicano.

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Referências Bibliográficas

Constituição da República de Moçambique 2004


Lei nº1/2008 de 16 de Janeiro, define o regime financeiro, orçamental e patrimonial das
autarquias locais e o sistema financeiro
Lei nº2/97 de 18 de Fevereiro, aprova o quadro jurídico para a implantação das autárquicas
locais.
Lei nº6/2018 de 3 de Agosto, altera a lei nº2/97 de 18 de Fevereiro
Lei 14/2011 de 10 de Agosto, Regula a formação da vontade da Administração Pública.
Decreto 11/2005 de 10 de Junho, Aprova o regulamento da lei dos órgãos locais do Estado

Borges, R & Pinheiro, D (2012). Relacionamento da liderança comunitária com o processo


de desenvolvimento local
Caetano, M (2010). Manual de direito Administrativo. Vol. I (10ªed). Coimbra. Almedina
Editora
Cistac, G (2001). Manual de Direito das Autarquias Locai. Maputo. Livraria Universitária
Cistac, G (2012), Moçambique: institucionalização, organização e problemas do poder local.
Lisboa.
Desenvolvimento Municipal em Moçambique: as lições da primeira década, pp- 14,113
Desenvolvimento Municipal em Moçambique (2009): as lições da primeira década, p.17
Dias, A (2015). Governação Autárquica: Desafios e Oportunidades. Coimbra
Do Amaral, D.(1998). Curso de direito Administrativo. Vol. I (2ªed). Coimbra. Almedina
Editora
Jamal, S (2014). Descentralização e democracia local: mecanismos de participação e
prestação vertical de contas dos governos locais em Moçambique. Coimbra
Mendes, E. (2018). Desafios das finanças autárquicas em Moçambique, Portal jurídico
Investidura, Florianópolis/SC, Disponível em:
investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direitotributario/336467-desafios-das-financas-
autarquicas-em-mocambique. Acesso em 17 Abr. 2019 as 20:15
Mazula, A et al (1998). As Autarquias Locais em Moçambique: Antecedentes e Regime
jurídico. Lisboa-Maputo
Noronha, J & Brito, L (2010). Desafios da gestão Municipal: Desafios para Moçambique
Simione, A et al (2018). A História da Municipalização em Moçambique: Atores, Estratégias
e Implicações para a Gestão Pública Local.
UNICEF (2017). Agenda para crianças nos Municípios: Desafios e propostas
Weimer, B & Carrilho, J (2017). A Economia Política da Descentralização em Moçambique:
Dinâmicas, Efeitos, Desafios. Maputo. Edição IESE
17
Índice

Introdução...................................................................................................................................2

1.Desafios do processo de Autarcizaçâo em Moçambique.........................................................3

1.2 Desafio dos Lideres Comunitários no Desenvolvimento Local...........................................4

1.3 Desafios dos Municípios na Gestão Local............................................................................6

1.4 Desafio dos Munícipes e da sociedade civil no processo de tomada de decisão..................9

1.5 O financiamento pelos Empréstimos nas Autarquias Locais..............................................10

1.6 A Gestão do Património domínio Público das Autarquias locais.......................................12

1.6.1 O domínio público das autarquias Locais........................................................................13

1.6.2 O domínio privado das autarquias locais.........................................................................14

Conclusão..................................................................................................................................16

Referências Bibliográficas........................................................................................................17

18

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