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TRATAMENTO PSÍQUICO

(TRATAMENTO ANÍMICO)
(1890)
Tratamento Anímico

• Psique é uma palavra grega que em tradução alemã significa “alma”.


• Portanto, tratamento psíquico seria tratamento anímico.
• Tratamento psíquico quer dizer, antes: tratamento que parte da alma, tratamento – de distúrbios
anímicos ou físicos – com meios que inicial e diretamente terão efeito sobre o anímico da pessoa.
Psicossomática
A relação entre o corporal e o anímico (tanto no animal
quanto no humano) é de efeito interativo, mas o outro lado
dessa relação, o efeito do anímico sobre o corpo, em tempos
mais antigos era tratado de forma impiedosa pelos médicos.

Essa direção unilateral da Medicina, voltada para o corporal,


na última década e meia experimentou gradativamente uma
mudança, que derivou diretamente da atividade médica.
Psicossomática

• Os sinais de sofrimento estão muito claramente sob a influência de excitações, oscilações de ânimo,
preocupações, etc., bem como que eles podem desaparecer e dar lugar à saúde plena, sem deixar
rastros, mesmo após uma longa duração.
• A pesquisa médica por fim chegou à conclusão de que essas pessoas não devem ser vistas e tratadas
como doentes dos olhos ou do estômago e assemelhados, mas que no caso delas deve se tratar de
uma afecção de todo o sistema nervoso.
Chamaram-se esses estados de nervosismo
(neurastenia, histeria), sendo eles caracterizados como
meras afecções “funcionais” do sistema nervoso.

Aliás, também em muitas afecções nervosas mais


Doença dos constantes e naquelas que só apresentam sinais de
doenças anímicas (as chamadas ideias obsessivas, ideias

Nervos delirantes, loucura) o exame detalhado do cérebro (após


a morte do doente) não trouxe resultados.

Coube aos médicos a tarefa de examinar a natureza e a


origem das manifestações da doença nesses doentes de
nervos [Nervösen] ou neuróticos.
Afetos
• Nesse contexto, então, descobriu-se que pelo menos em
uma parte desses doentes os sinais do sofrimento se
originavam nada mais, nada menos que de uma influência
modificada de sua vida anímica sobre o seu corpo, ou seja,
que a origem mais próxima do distúrbio deve ser procurada
no anímico.
• Em determinados estados anímicos que chamamos de
“afetos”, a participação do corpo é tão evidente e tão
grandiosa que alguns pesquisadores da alma chegaram a
acreditar que a essência dos afetos consistiria apenas
nessas suas manifestações físicas.
Os leigos, que gostam de resumir tais
influências anímicas sob o nome de
“imaginação”, costumam ter pouco
respeito diante de dores causadas pela
imaginação, ao contrário daquelas
causadas por ferimento, doença ou
Fé x Tratamento inflamação.
Anímico
Mas se trata de uma evidente injustiça;
seja qual for a origem das dores, até
mesmo a imaginação, as dores nem por
isso são menos reais ou menos intensas.
As verdadeiras curas milagrosas acontecem com crentes sob a
influência de eventos adequados para a intensificação dos
sentimentos religiosos.

Parece que não é fácil apenas para a fé religiosa, sozinha,

Fé x afastar a doença pelo caminho da expectativa, pois nas curas


milagrosas geralmente ainda há outros eventos em jogo.

Tratamento Seria confortável, mas muito incorreto se simplesmente

Anímico
negássemos a fé a essas curas milagrosas e quiséssemos
esclarecer os relatos a respeito através da junção de
enganação religiosa e observação imperfeita.
Por mais que muitas vezes essa tentativa de explicação possa
estar certa, ela não tem o poder de eliminar o fato das curas
milagrosas em si.
O efeito de todo remédio que o médico prescreve, de toda
intervenção que ele faz se compõe de duas partes.

Tratamento Uma delas, às vezes maior, às vezes menor, mas nunca


totalmente desprezível, é representada pelo comportamento
anímico do doente.
Anímico x
Tratamento A expectativa crédula com que ele vem de encontro à
influência da medida médica por um lado depende do tamanho
de sua própria ambição pela cura e, por outro, de sua

Médico confiança de que tenha dado os passos certos para tanto.

Há médicos que têm a capacidade de ganhar a confiança dos


doentes mais desenvolvida que outros médicos; o doente
muitas vezes já sente o alívio quando vê o médico entrando na
sala.
Tratamento Anímico x Tratamento Médico

Os médicos desde sempre, já em tempos antigos, exerceram o tratamento


anímico, muito mais intensamente do que hoje.

Se por tratamento anímico entendermos o esforço de evocarmos no doente os


estados e condições anímicos mais favoráveis para a cura, então esse tipo de
tratamento médico é historicamente o mais antigo.

Dessa forma, a pessoa do médico, naquela época assim como hoje, era uma das
principais circunstâncias para atingir no doente o estado anímico favorável à cura.
Talking Cure
• Agora começamos a entender também a “magia” da
palavra.
• Palavras, como sabemos, são os mais importantes
mediadores da influência que uma pessoa quer ter sobre a
outra; palavras são bons meios para provocar
transformações anímicas naquele a quem elas são dirigidas,
e por isso não soa mais estranho quando se afirma que a
magia da palavra pode afastar manifestações de doença,
ainda mais aquelas que se originam em estados anímicos.
• Todas as influências anímicas que se mostraram eficazes
para eliminar doenças têm algo de imponderável.
Hipnose
• Há muito tempo era de conhecimento geral, mas apenas nas últimas décadas
suspendeu-se toda e qualquer suspeita a respeito de que através de certas intervenções
suaves é possível levar pessoas a um estado anímico muito peculiar, bastante semelhante
ao sono, e por isso chamado de hipnose.
Hipnose

• Os procedimentos para chegar à hipnose, à primeira vista, não têm muito em comum.
• Pode-se hipnotizar alguém pedindo que a pessoa olhe fixamente para um objeto
brilhante durante alguns minutos, ou então colocando um relógio de bolso durante o
mesmo tempo junto ao ouvido da pessoa usada na experiência, ou ainda passando as
próprias mãos esticadas repetidas vezes a uma pequena distância sobre o rosto e os
membros da pessoa.
• Mas pode-se conseguir o mesmo anunciando com calma e de forma segura para a
pessoa que se quer hipnotizar o início do estado hipnótico e de suas peculiaridades, ou
seja, “convencendo-a através da fala”. Pode-se também unir os procedimentos.
Hipnose
• Um estado de doença absolutamente não faz parte das condições da hipnose; pessoas
normais, ao que parece, são facilmente hipnotizáveis, e uma parte dos nervosos é
especialmente difícil de hipnotizar, enquanto doentes mentais são totalmente refratários.
• O estado hipnótico tem diversas gradações; em seu grau mais leve, o hipnotizado sente
apenas algo como uma leve anestesia, e o grau mais alto, caracterizado por
singularidades específicas, foi chamado de sonambulismo, devido à sua semelhança com
o andar durante o sono, observado como fenômeno natural.
Hipnose
• A hipnose presenteia o médico com uma autoridade que provavelmente um sacerdote
ou um curandeiro nunca tiveram, na medida em que reúne todo o interesse anímico do
hipnotizado na pessoa do médico.
• O médico coloca o paciente em estado de hipnose, aplica a sugestão de que ele não está
doente, modificada de acordo com as respectivas circunstâncias, e de que após acordar
não sentirá mais nenhum sinal de sofrimento, depois do que acordará o doente e ficará
na expectativa de que a sugestão fez a sua parte para sanar a doença.
• Esse procedimento teria de ser repetido em número suficiente, caso apenas uma sessão
não tenha resolvido.
Falhas da Hipnose
• É bom que o doente conheça essas falhas do método hipnótico de cura e as
possibilidades de se decepcionar na sua aplicação.
• O poder de cura da sugestão hipnótica é um fato, ele não precisa do louvor exacerbado.
• Por outro lado, é facilmente compreensível que os médicos a quem o tratamento
anímico hipnótico prometia muito mais do que podia cumprir não se cansem de buscar
outros procedimentos que possibilitem uma intervenção mais profunda ou menos
imprevisível na alma do doente.
MÉTODO PSICANALÍTICO
FREUDIANO (1904 [1905])
Método Catártico x Método Psicanalítico
• “O método peculiar de psicoterapia que Freud exerce e chama de Psicanálise tem
sua origem no chamado processo catártico, sobre o qual ele relatou à sua época
nos Estudos sobre histeria, em 1895, elaborados com J. Breuer.
• A terapia catártica foi uma invenção de Breuer, que com seu auxílio
primeiramente, de certa forma, fabricou uma doente histérica um decênio antes,
percebendo então a patogênese de seus sintomas.
• Devido a um encorajamento pessoal de Breuer, Freud então retomou o
procedimento e o experimentou em um número maior de doentes.
Hipnose

• O procedimento catártico pressupunha que o paciente fosse hipnotizável e fundava-se na ampliação da


consciência, que se instaura na hipnose.
• Ele tinha como objetivo o afastamento dos sintomas da doença, e alcançava essa meta fazendo com que os
pacientes regredissem até o estado psíquico em que o sintoma havia aparecido pela primeira vez.
• Então, no doente hipnotizado surgiam lembranças, pensamentos e impulsos que até então tinham ficado de
fora de sua consciência, e quando ele, sob intensas expressões dos afetos, tinha comunicado ao médico
esses seus processos anímicos, o sintoma tinha sido superado, e o retorno dele, suspenso.
• Essa experiência, repetida regularmente, foi explanada pelos dois autores em seu trabalho conjunto, no
sentido de que o sintoma estaria no lugar de processos psíquicos reprimidos e que não chegaram à
consciência, ou seja, seria uma transformação (conversão) da última.
Hipnose
• A eficácia terapêutica de seu procedimento era explicada por eles a
partir do escoamento do afeto que até então se encontrava
“comprimido” e que tinha estado colado às ações anímicas reprimidas
(ab-reação).
• O esquema simples da intervenção terapêutica, no entanto, começou
a se complicar quando ficou evidente que não era uma impressão
única (traumática), mas geralmente uma série dessas impressões,
difíceis de serem superadas, que participavam do surgimento do
sintoma.
Hipnose
• A característica principal do método catártico, que o coloca em
oposição a todos os outros procedimentos da psicoterapia, portanto,
consiste no fato de que nesse método a eficácia terapêutica não é
transferida para uma proibição sugestiva do médico.
• Ele espera, ao contrário, que os sintomas desapareçam por conta
própria, se a intervenção, que se baseia em determinados
pressupostos sobre o mecanismo psíquico, conseguir levar processos
anímicos por um percurso diferente do atual, que desembocou na
formação do sintoma.
Hipnose
• As mudanças que Freud fez no procedimento catártico de Breuer
inicialmente eram mudanças técnicas; mas estas precisavam de novos
resultados e acabaram, na sequência, por mostrar a premência de
uma concepção de um trabalho terapêutico de outro tipo, mas que
não contradizia a concepção anterior.
• Se o trabalho catártico já havia abdicado da sugestão, Freud, por sua
vez, deu um passo além e desistiu da hipnose.
Hipnose
• Atualmente, ele atende os seus doentes deixando que eles se
posicionem confortavelmente em um divã, sem qualquer outro tipo
de influenciamento, enquanto ele próprio, fora do escopo visual dos
pacientes, senta-se em uma cadeira atrás deles.
• Ele também não exige que fechem os olhos e evita qualquer contato e
todo procedimento que possa lembrar a hipnose. Portanto, uma
sessão assim transcorre como uma conversa entre duas pessoas
igualmente despertas, sendo que uma delas poupa todo e qualquer
esforço muscular, assim como toda impressão dos sentidos que possa
atrapalhar a concentração na sua própria atividade anímica.
Hipnose
• Uma vez que sabemos que toda forma de ser hipnotizado, por maior
que seja a habilidade do médico, está fundada na arbitrariedade do
paciente, e que um grande número de pessoas neuróticas não é
passível de ser hipnotizado por nenhum procedimento, foi recusando
a hipnose que se conseguiu garantir que o procedimento fosse
aplicável a uma quantidade ilimitada de doentes.
• Por outro lado, ficou de fora a ampliação da consciência que,
justamente, tinha fornecido ao médico aquele material psíquico de
lembranças e imaginações, com ajuda do qual era possível executar a
transposição dos sintomas e a libertação dos afetos.
Mudança de método
• Freud, então, encontrou um tal substituto plenamente
suficiente nas ocorrências dos doentes, isto é, naquelas
ocorrências involuntárias, geralmente sentidas como
pensamentos que atrapalham e que, por isso, sob
condições normais seriam afastados, pois costumavam
atravessar o contexto de uma apresentação
intencionada.
• Para se apoderar dessas ocorrências, ele convida os
doentes a falarem à vontade em suas comunicações,
‘como, por exemplo, em uma conversa na qual de um
assunto se passa a outro totalmente diferente’.
• Antes de convidá-los à narrativa detalhada do histórico de sua doença, ele
reforça a instrução de que eles lhe contem tudo que lhes vem à cabeça,
mesmo se acharem não ser importante, ou se acharem que aquilo não vem
ao caso, ou que não faz sentido.
• Mas com bastante ênfase exige deles que não excluam nenhum pensamento
ou nenhuma ocorrência da comunicação pelo fato de lhes parecer
vergonhoso ou embaraçoso.
• Já durante a narração do histórico da doença, os doentes evidenciam lacunas
nas lembranças, seja porque processos que de fato aconteceram foram
esquecidos, seja porque relações temporais tenham ficado confusas ou
porque relações causais tenham sido esfaceladas, de modo a resultarem daí
efeitos incompreensíveis.
• Sem amnésia de qualquer tipo não há histórico da doença neurótica.
• Se insistirmos com o narrador que preencha
essas lacunas da memória com um esforço de
atenção, perceberemos que as ocorrências que
surgem a partir daí são refreadas por ele com
todas as formas de crítica, até que, por fim, ele
sinta o mal-estar direto quando a lembrança
realmente aparece.
• A partir dessa experiência, Freud conclui que as
amnésias são resultado de um processo que ele
chama de recalque, e cujo motivo ele entende
serem as sensações de mal-estar.
• Ele julga sentir as forças psíquicas que trouxeram
à tona esse recalque na resistência que se ergue
contra o restabelecimento.
Fundamentos

• O momento da resistência acabou se tornando um dos fundamentos de


sua teoria.
• As ocorrências que até então eram colocadas de lado, sob inúmeros
pretextos (como citado na fórmula acima), porém, ele vê como derivados
das formações psíquicas recalcadas (pensamentos ou moções), como
deformações destas, devido à resistência que há contra a sua reprodução.
• Quanto maior a resistência, maior será essa deformação.
Técnica Psicanalítica

• A técnica da Psicanálise é muito mais fácil de exercer do que pode parecer


em uma descrição; por outro lado, nenhum outro caminho leva ao objetivo
e, por isso, o caminho mais trabalhoso ainda acaba sendo o mais curto.

• Pode-se objetar em relação à hipnose que ela encobre a resistência,


impedindo, assim, que o médico consiga vislumbrar o jogo das forças
psíquicas.
Diferença de métodos

• Podemos formular essa condição de outro modo: tornar todos os recalques


reversíveis; o estado psíquico, então, seria o mesmo que aquele em que todas
as amnésias foram preenchidas.
• Em outra formulação, ainda vamos além: tratar-se-ia de tornar o inconsciente
acessível ao consciente, o que ocorre através da superação das resistências.
• Mas não podemos esquecer aqui que um estado ideal como esse também não
existe em uma pessoa normal, e que só raras vezes conseguimos nos
aproximar minimamente desse ponto no tratamento.

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