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NATURALISMO

O naturalismo, tendência estética e literária em voga no último quartel do século XIX,


surgiu na França e é entendido por muitos críticos como uma corrente mais extremada do 
movimento realista, sendo muitas vezes também chamado de realismo-naturalismo.
O termo naturalismo foi utilizado como vertente artística pelo escritor Émile Zola, inspirado
no método de investigação das ciências naturais que se estabelecia desde o século XVII:
“O Naturalismo, nas letras, é
igualmente o retorno à natureza
e ao homem, a observação
direta, a anatomia exata, a
aceitação da pintura do que
existe.”
Empenhados em escrever um retrato fidedigno da realidade, ao contrário do universo
idealizado e subjetivo do romantismo, os naturalistas desenvolveram um estilo literário
objetivo e, como postulou o próprio Zola, anatômico: o “retorno à natureza” focalizava
o lado mais animalesco do homem, em frequentes descrições patológicas – doenças,
hereditariedade, influências do meio, em uma constante luta pela sobrevivência.
CONTEXTO HISTÓRICO

A Europa do século XIX vivenciava profundas transformações econômicas, políticas e


sociais, proporcionadas por dois grandes eventos do século XVIII: a Revolução Industrial e
a Revolução Francesa. Com a industrialização, surgiam os primeiros centros urbanos e a
nova ordem econômica do capitalismo financeiro, dividindo a sociedade entre burguesia, a
nova classe dominante após o fim do Antigo Regime, e proletariado, classe dos trabalhadores
assalariados, que operavam o maquinário industrial.
Essas oposições e as condições degradantes de trabalho da época propiciaram matéria-prima
para as teorias socialistas de Karl Marx, cuja perspectiva classista influenciou diretamente
a estética naturalista.
A burguesia consolidava-se no poder, o que propiciava o movimento da 
Segunda Revolução Industrial, que levaria à exploração do aço, do petróleo e da eletricidade.
O entusiasmo das novas invenções e descobertas levava o cientificismo, em voga desde o
século XVII, ao seu ápice: o método das ciências naturais era tido como a principal maneira
de compreender a realidade.
Essa mentalidade deu origem também ao positivismo, doutrina de Auguste Comte que
dividia a humanidade em três estágios, sendo o científico o mais evoluído dos três. A teoria
defendia que a única maneira de se chegar à verdade era por meio da investigação científica
– ou seja, acredita-se apenas naquilo que é passível de comprovação pelos meios da ciência.
•Auguste Comte é considerado um dos pais da Sociologia e
desenvolveu a teoria positivista.
Foi nessa época que Charles Darwin propôs sua teoria da evolução das espécies e
que Mendel postulou suas leis da hereditariedade, grandes influenciadoras da corrente
naturalista, que entendia o homem como um produto da natureza – portanto, sujeito à
seleção natural e herdeiro de características das gerações anteriores.
Também em voga na época foi o determinismo de Hippolyte Taine, corrente de pensamento
que entendia o contexto, o meio em que o indivíduo vive, como determinante de suas ações.
Taine postulou que o meio, a raça e o momento são os três fatores que determinam as
atitudes e o caráter dos indivíduos, teoria que também influenciou diretamente o
naturalismo (e acabou por também dar espaço para correntes teóricas do racismo científico,
por exemplo).
P R INC I PA I S CA R AC T E R ÍS T IC A S DO N AT U RA L I S M O

• Ênfase no lado mais animalesco do homem: a fome, o instinto, a parte “não civilizada”, a sexualidade etc., bem
como a zoomorfização de personagens;
• Determinismo: o indivíduo não é mais sujeito, mas um figurante da história, resultado das influências do meio;
• Cientificismo: o homem é entendido como produto das leis naturais;
• Patologias sociais: as obras naturalistas enfatizam esses temas, trazendo à tona tópicos como as taras sexuais, os
vícios, as doenças, o incesto, o adultério;
• Objetividade e impessoalidade narrativas;
• Preferência por temas cotidianos, frequentemente priorizando as relações e vivências das classes “inferiores”;
• Predominância da forma descritiva;
• Obras comumente engajadas, denúncias de aspectos socialmente retrógrados, da miséria e do sistema de
desigualdades que fundamentava o capitalismo que surgia.
Émile Zola (Paris,1840-1902)
Considerado o fundador da estética naturalista, foi
romancista, contista, dramaturgo, poeta, jornalista e
crítico literário. Entendido como pai do romance
experimental, Zola tencionava fazer da literatura um
P R IN C I PAI S A U TO R E S instrumento efetivo de luta para mudanças sociais.
D O N AT U R A L I S M O Autor prolífico, de sua vasta obra destacam-se os
títulos A
Taberna (1886), Naná (1880), Germinal (1885), A
besta humana (1890) e J’accuse (1898). Exerceu
influência decisiva na maioria dos escritores
naturalistas.
Aluísio Azevedo – escritor, dramaturgo, pintor, caricaturista e,
no final de sua carreira, diplomata –  foi o autor que
inaugurou a estética naturalista no Brasil. Sua obra O
Mulato (1881) é tida como o primeiro expoente dessa corrente
literária, que alcançou o seu auge com o célebre O
Cortiço (1890), romance em que descreve em minúcias
(patológicas) a organização social da periferia carioca, onde o
português é o dono do imóvel, dividido em porções menores e
alugado aos brasileiros das classes mais baixas, que se veem
diante de diversas barreiras sociais, como o preconceito e a
exploração constantes.
Adolfo Caminha (Aracati-CE, 1867 – Rio de Janeiro, 1897)
Escritor, jornalista e oficial da Marinha do Brasil, sua morte precoce por
tuberculose não o impediu de ser um dos mais veementes naturalistas do
cânone nacional. Estreou em 1886 com a publicação em versos Voos
Incertos, mas foi com a obra A Normalista (1893) que se consolidou como
autor naturalista: trata-se de uma chocante narrativa cujo enredo centra-se
em uma relação incestuosa.
Aclamado por suas descrições minuciosas, o mais famoso romance de 
Caminha é O Bom Crioulo (1895), protagonizado por um oficial da
Marinha que se envolve amorosa e sexualmente com um grumete
(graduação mais inferior das praças da Armada). Trata-se da primeira obra
brasileira centrada em uma relação homossexual.
NATURALISMO NO BRASIL

Desde a década de 1870, o Brasil passava por ebulições políticas e sociais: o 


Segundo Reinado via-se ameaçado por crises diversas, que incluíam a longa duração da
Guerra do Paraguai (1864-1870) e pela pressão em prol da abolição da escravatura – sendo o
Brasil o último país a banir essa prática, que era embasada em distinção racial.
Os naturalistas brasileiros foram, grosso modo, abolicionistas e engajados no movimento
republicano, de modo que a tendência estética de origem francesa ganhou aqui as cores e os
problemas nacionais: o racismo, a herança colonial das relações de trabalho e da apropriação
da terra, a mestiçagem etc. As questões universais das diferenças sociais misturaram-se às
questões locais que urgiam reflexão.
NATURALISMO E REALISMO

O naturalismo é entendido como uma corrente mais radical do realismo. As duas escolas compartilham, portanto,
algumas premissas: o retrato verossímil da realidade, a preferência por cenas cotidianas, a objetividade das obras, o
desprezo pelas idealizações românticas – retratando o adultério em oposição à realização amorosa matrimonial e o
fracasso social ao contrário do herói idealizado –, a crítica da moralidade burguesa e a impessoalidade.
O que diferencia o naturalismo é a abordagem patológica das personagens e situações. Enquanto o realismo privilegia
mergulhos psicológicos nas personagens, o naturalismo possui um olhar anatômico, ressaltando a doença e o aspecto
animalesco do ser humano. As personagens são abordadas de fora para dentro, enfatizando as ações exteriores, sem
preocupação com o aprofundamento psicológico. O realismo retrata o homem psicológico, enquanto o naturalismo
propõe o homem biológico.
Se o realismo propõe retratar o homem em interação com seu meio, o naturalismo vai ainda um pouco além: expõe o
indivíduo como um produto biológico, cujo comportamento é determinado a partir dessas relações com o meio e de
acordo com suas características hereditárias.

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