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Neurose obsessiva

Prof. Cristina Kern


A obsessividade deve ser discriminada em

traços obsessivos
caráter marcadamente obsessivo
transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).
Espectro – “três tons de azul”

1) traços obsessivos em uma pessoa normal, traços acompanhantes de


nas estruturas de personalidade;
Ex. excesso de limpeza, organização, meticulosidade
Importante para profissões que requeiram esse tipo de perfil, tais como:
odontologia, faxina, etc.
2) caráter marcadamente obsessivo (presença de sintomas)

• Presença permanente e predominante dos traços de


• meticulosidade (agir com minúcia, focado em todos os aspectos e
pormenores daquilo que está fazendo)
• controle
• dúvida
• intolerância, etc.,

não altera a harmonia do indivíduo a ponto de lhe fazer sofrer


exageradamente
mas apresenta algumas inibições que o desgastam e frequentemente
inflige algum sofrimento aos que convivem mais intimamente com ele.
3) transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) ou neurose obsessiva está enquadrada
como transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), de acordo com o DSM.

Presença de obsessões, compulsões ou ambas:

Obsessões são :
1. Pensamentos, impulsos ou imagens recorrentes e persistentes
em algum momento durante a perturbação, são experimentados como intrusivos e
indesejados e que, na maioria dos indivíduos, causam acentuada ansiedade ou
sofrimento.

2. O indivíduo tenta ignorar ou suprimir tais pensamentos, impulsos ou imagens


ou neutralizá- los com algum outro pensamento ou ação. (negação, repressão,
anulação)
3) transtorno obsessivo-compulsivo (TOC).

Presença de obsessões, compulsões ou ambas:

Compulsões são:
1. Comportamentos repetitivos (ex., lavar as mãos, organizar, verificar) ou
atos mentais (ex., orar, contar ou repetir palavras em silêncio) que se sente
compelido a fazer devido a uma obsessão.

2. Os comportamentos ou os atos mentais visam prevenir ou reduzir a ansiedade ou


o sofrimento ou evitar algum evento ou situação temida;

Esses comportamentos ou atos mentais não têm uma conexão realista com o que
visam neutralizar ou evitar ou
são claramente excessivos
As obsessões ou compulsões
- tomam tempo
(Ex. mais de uma hora por dia)
- ou causam sofrimento significativo
- ou prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas
importantes da vida do indivíduo.

Os sintomas obsessivos (pensamentos) e compulsivos (atos) podem apresentar-se


por:
• dúvidas ruminativas
• pensamentos cavilatórios (atribuir uma falsa significação às palavras,
deturpando-as de modo malicioso)
• controle onipotente
• Frugalidade (poupador )
• rituais
Exs: de lavagem (de mãos, banhos, objetos)
simetria (posição de livros, de sapatos ou outros objetos, ordenação de roupas no
varal )
simetria em toques ou esbarrões (p. ex.: ter de tocar com a mão direita naquilo que
foi tocado com a esquerda ou vice-versa);
de colecionamento (incapacidade de se desfazer de jornais, notas fiscais antigas,
embalagens inúteis, papéis de bala ou objetos encontrados na rua);
rituais "diversos“ (sapatear, rezar, perguntar, relembrar, gesticular, tocar, cuspir
etc. )

atos que compulsiva e repetitivamente são feitos e desfeitos


• podem atingir um alto grau de incapacitação total do sujeito para uma vida livre,
configurando uma gravíssima neurose.
Etiologia - aspectos que podem estar relacionados:

Pais obsessivos que impuseram um comportamento ( superego) por demais


rígido e punitivo.

Identificação com aspectos obsessivos dos pais e da cultura em que estão


inseridos.

Permanente conflito intrasistêmico (o ego está submetido ao superego cruel e,


ao mesmo tempo, ele está pressionado pelas demandas pulsionais do id).

Fixações da fase anal (repercussões em traços de caráter): a forma como foi


realizado o controle dos esfíncteres pelo (s) cuidador (es) principais exercem
efeitos sobre a necessidade de limpeza, por exemplo.
CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS

São encontrados dois tipos de obsessivos:

o tirânico-controlador ( ativo-submetedor) Exemplo: protagonista do filme


As Good as It Gets
https://www.youtube.com/watch?v=vk9pWhhUSgw

o tímido-indeciso (ou passivo-submetido). Exemplo: Homem dos ratos no


início do tratamento.
A escolha das relações objetais costuma recair em pessoas que se
prestem em fazer a complementação dos dois tipos referidos:
Exemplo - relação dominador x dominado; ativo x passivo

Traço comum:

O paciente obsessivo está em um permanente conflito em busca de um


perfeccionismo, em uma luta para cumprir/descumprir as demandas de
impostas pelo superego tirânico (rígido).
Quando ocorre a obsessividade com aspectos narcisistas significativos, o
paciente exibe características de “superioridade”.

Esta superioridade pode estar disfarçada, sob uma capa de modéstia,


pela qual ele tenta convencer aos outros (e a si próprio) o quanto ele é,
entre todos outros: “o mais honesto, dadivoso, humilde”, etc.

Essa convicção de superioridade pode manifestar-se por uma dimensão


“moral”, em que ele se torna, compulsivamente, um “colecionador de
injustiças”, o que prova a sua tese de que ele está rodeado de gente que
está longe da pureza dos seus ideais (moralista).
Nesse mesmo tipo de paciente “obsessivo- narcisista”

ocorre um pavor de que haja um fracasso da potência ou da orgasmia

ele (ela) usa formas para evitar o enfrentamento de uma ligação erótica e
afetiva (ver protagonista do filme referido)

porque este tipo de paciente tem dificuldade de se entregar ao ato sexual,


relacionado à dificuldade na busca de prazer e/ou afeto.

É como se estivesse “se submetendo a um exame de avaliação de sua


autoestima”

Daí a facilidade de instalar-se um círculo vicioso de medo e evitação, que


pode adquirir características fóbicas (pela evitação do contato com o
outro).
A característica mais comum e constante é a de um permanente estado de
dúvida, na base de interrogações do tipo: faço ou não faço; está certo ou
errado; devo ou não devo...?

Excessivas demandas perfeccionistas


terapeuta deve visar ao estabelecimento da capacidade de o paciente
reconhecer

quais são os seus limites, alcances e limitações;

direitos e deveres;

o possível e o impossível de ser alcançado;

a intolerância pelas falhas e diferenças que os outros têm em relação a ele.


Nos obsessivos com fortes defesas narcisistas, o analista deve assumir a
posição de “não-desejante”, de modo a sair do mundo especular do paciente,
em que o mesmo procure corresponder ao ideal do terapeuta (paciente
“bonzinho”).
O maior cuidado que o analista deve ter consiste na possibilidade de ele se
deixar equivocar pela colaboração irretocável desse paciente

que costuma ser obsessivamente correto, assíduo, pontual, bom pagador, com
boa apresentação e vida profissional geralmente bem-resolvida;

Estar atento para a possibilidade de que esse paciente esteja apenas


“cumprindo a tarefa de ser um bom paciente”, (submetido) do que
propriamente alguém disposto a fazer mudanças verdadeiras.
O analista deve propiciar ao paciente que ele construa pensamentos próprios,
genuínos

deverá ter continência e paciência para as angústias do paciente, no início da


experiência de uma autêntica busca de sua autonomia.
Há risco de que o paciente obsessivo consiga fazer prevalecer o seu
controle, sobre si mesmo e sobre o terapeuta, pelo uso de seus habituais
mecanismos defensivos:

controle onipotente ( por meio de descrição rotineira da semana, do dia,


trazer escrito o que quer falar, etc, de forma a tentar deixar o processo
analítico estagnado )

deslocamento (para detalhes, que se tornam enfadonhos e podem


provocar uma esterilizante contratransferência de tédio)

a anulação (muitos sintomas manifestam-se com a participação da


defesa de anulação)

leva o neurótico obsessivo a realizar algum ato/pensamento, anulando o


que fez/pensou, começando da “estaca zero” repetidamente.
Em casos mais graves, essa operação de “faz/desfaz” pode-se repetir de
uma forma quase interminável

Uma tarefa que normalmente levaria uma hora, por exemplo, pode
durar cinco ou mais horas.
O crescimento nas diversas áreas da vida se estagnam por conta disso.

a formação reativa (sempre gentil, educado e bem-comportado, o


paciente não deixa irromper a sua agressão reprimida),

o isolamento (em narrativas desprovidas de emoções), etc.


Racionalização - se mostram “pessoas lógicas”
utilizam racionalizações, detalhismos, certo ar professoral. Isso costuma
atrapalhar as relações, inclusive a comunicação com o analista pode ficar
dificultada.
Com os pacientes obsessivos, por demais “lógicos”, uma boa tática
consiste em fazê-los clarearem e assumirem, com os respectivos afetos, o
significado daquilo que dizem de uma forma intelectual e fria

Portanto, não basta que as interpretações estejam corretas

é necessário observar o destino que elas tomam na mente do obsessivo, se


elas germinam ou ficam desvitalizadas, às vezes ampliando as defesas
Um bom recurso técnico é fazer um permanente confronto para o paciente
entre o que ele diz, sente e, de fato, faz.

Além do risco da, mencionada, contratransferência de tédio

o analista também deve conhecer bem o perfil de sua própria personalidade

Filme Homem dos Ratos


https://www.youtube.com/watch?v=FbXHtAyEKNU

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