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Gêneros literários do

Novo Testamento
Ementa

• A disciplina visa situar o estudo do gênero literário dentro do


conceito da tríade hermenêutica (história, literatura e
teologia) bem como lidar com cada gênero presente no Novo
Testamento (evangelho, epístola, narrativa e apocalíptica).
Tríade hermenêutica.

A bíblica como literatura.

Conceito de gênero.
Conteúdo Narrativa histórica.
programático
Evangelhos

Cartas.

Apocalíptica.
Tríade hermenêutica

A tríade hermenêutica “[...] consiste


nos três elementos que o intérprete
deve considerar no estudo de qualquer
passagem bíblica, não importa o
gênero: o contexto histórico do livro
[...], sua dimensão literária [...] e sua
mensagem teológica [...]”.
(KÖSTENBERGER, PATTERSON
2015:65 – itálico nosso).
Tríade hermenêutica

“Essencialmente [...] a tarefa do


intérprete consiste em analisar cada
um dos aspectos principais da tríade
hermenêutica com o devido equilíbrio,
sendo os primeiros dois elementos –
história e literatura –a base, e a
teologia, o vértice.”
(KÖSTENBERGER, PATTERSON
2015:67 – destaque nosso).
Tríade hermenêutica

“Ainda que discernir a mensagem


espiritual das Escrituras – a teologia
– seja o objetivo final da
interpretação bíblica, estudar o pano
de fundo histórico cultural de cada
texto e ter a devida compreensão de
seus aspectos literários é essencial.”
(KÖSTENBERGER, PATTERSON
2015:67-8 – destaque nosso).
Teologia Bíblica
Tríade hermenêutica
Teologia Sistemática

Teologia

Tríade
Hermenêutica

Estudo lexical
Análise do discurso Cronologia
Gênero literário Estudo Cultural
Figura de
linguagem. Linguagem História
Aplicação
Proclamação

TEOLOGIA

1. Determinar o contexto histórico.


2. Situar a passagem no contexto canônico.
3. Identificar o gênero literário.
INTERPRETAÇÃO 4. Ler a passagem no seu contexto discursivo.
5. Estudo de palavras importantes.
6. Identifique figuras de linguagem.
7. Identifique temas teológicos da passagem.

A tríade hermenêutica
HISTÓRIA LITERATURA
Cânon
Gênero
Linguagem
Análise dos pressupostos Preparação
Espiral hermenêutica
TEOLOGIA EXEGÉTICA

Geral  Particular

1 Mapa 2 diagrama 6 pano de fundo 7 bíblica 8 história 9 sistemática 10 homilética


do livro linear da passagem
TEOLOGIA
Ideia-núcleo

3 estudo gramatical

4 estudo semântico
Particular  Geral
5 estudo sintático

Estudo indutivo Estudo dedutivo


A Bíblia como
Literatura
O que é literatura?
A expressão “literatura” aqui não
usada para tudo que que é escrito. É
uma referência à escrita criativa,
imaginativa em contraponto a escritas
expositivas ou a linguagem do dia a
dia . Entendemos como RYKEN
(2017:10) que quanto o assunto é
literatura e a Escritura não precisamos
escolhes entre textos literários e não
literário, mas entender em um
espectro “em que algumas partes da
Bíblia são mais literárias e outras
menos literárias”.
Leland Ryken

“[...] quando a Bíblia se utiliza de um


método literário, ela o convida a encará-la
como literatura, não como outra coisa.”
Promessas de uma abordagem
literária
(LONGMAN 1987:131-2)

• Revela as convenções da literatura bíblica (e.g.,


Deuteronômio como tratado).

• Segundo Robert ALTER (LONGMAN 1996:132)


“[...] cada cultura, mesmo cada época em uma
cultura particular, desenvolve códigos distintos e
às vezes intrincados para contar suas histórias,
envolvendo tudo, desde o ponto de vista narrativo,
procedimentos de descrição e caracterização, a
gestão do diálogo, a ordenação do tempo e a
organização de trama.”
Promessas de uma
abordagem literária
• Enfatiza os textos em sua totalidade.
• Teoria literária focaliza no processo de leitura.
O que significa “tratar a Bíblia
como literatura”?

• Dificuldades e/ou armadilhas (LONGMAN


1996:126):
• As abordagens literárias são contraditórias.
• Cada escola é um mundo a parte com suas
terminologias próprias.
• A teoria pode impor conceitos ocidentais no
mundo antigo (e.g., Kugel e a poesia).
• Teorias seculares eliminam o autor.
Perigos
O perigo de reduzir a Bíblia ao
nível de uma boa história sem
se basear em eventos reais e
sem impacto no mundo real é
um perigo real. A questão é
simplesmente o que significa
“tratar a Bíblia como literatura”.
História e
literatura
Alta crítica e
Crítica literária

“A crítica literária, por muito tempo tida como


periférica ou mesmo irrelevante aos estudos
bíblicos, emergiu desde meados da década de 1970
como um novo foco importante de estudos
bíblicos acadêmicos na América do Norte,
Inglaterra e Israel, e tem mostrado alguns sinais
notáveis na Europa.”
(ALTER, KERMODE 1997:16 – itálico nosso)
ROBERT ALTER
[...] a crítica literária foi de pequena importância nesse
empreendimento [tentar compreender o processo pelo qual a
Bíblia emergiu de sua história original], que tratou os textos
bíblicos como relíquias, provavelmente distorcidas na
transmissão, de um passado que era preciso recuperar o mais
exatamente possível. No decorrer das últimas décadas,
contudo, houve uma revivescência do interesse nas qualidade
literárias desses textos, nas virtudes pelas quais eles
continuam a viver como algo mais arqueologia.
(ALTER, KERMODE 1997:12)
Alta crítica e
Crítica literária

A Alta Crítica trata a narrativa, poesia e


profecia como “registros históricos mais
ou menos distorcidos” e o valor do texto
era de “substitutos do que infelizmente
havia se perdido”.
(ALTER, KERMODE 1997:14).
FRYE (2021:18 – itálico nosso)
A Bíblia, apesar da miscelânea de seus
conteúdos, não aparenta ter vindo à existência
por uma série improvável de acidentes; e,
embora seja certamente o produto final de um
longo e complexo processo editorial, tal
produto final deve ser examinado como uma
unidade independente.
Análise Literária
“Quando falo em análise literária,
refiro-me às numerosas modalidades
de exame do uso engenhoso da
linguagem, das variações no jogo de
ideias, das convenções, dicções e
sonoridades, do repertório de
imagens, da sintaxe, dos pontos de
vista narrativos, das unidades de
composição e de muito mais; em
suma, refiro-me ao exercício daquele
mesma atenção disciplinada que, por
diversas abordagens críticas, tem
iluminado, por exemplo, a poesia de
Dante, as peças de Shakespeare, os
romances de Tolstói.”
(ALTER 2007:28-9 – itálico nosso)
Leland Ryken
Sobre o crescente interesse advindo do reconhecimento
de que a Bíblia é um trabalho literário, Ryken acerta:

Vários ingredientes compõem essa nova abordagem da Bíblia:


um interesse pelos gêneros literários da Bíblia; uma nova
disposição para tratar os textos bíblicos como textos
completos e acabados, em vez de tratá-los como uma colcha
de retalhos; um foco na Bíblia como se encontra atualmente,
em vez de realizar escavações no processo de redação (edição)
por trás do texto. Há, ainda, uma tendência de usar literários
em vez de teológicos para examinar as narrativas e os poemas
da Bíblia; reconhecimento pela arte contida na Bíblia; uma
sensibilidade para a dimensão empírica e extraintelectual
(mais do que ideativa) da Bíblia.
Crítica
Literária
Gênero Literário
Leland Ryken
A literatura nos incita a
prestar atenção ao “modo”
de ser do discurso.
(2017:119).
Leland Ryken
O que significa
dizer que a Bíblia é
literatura? São
muitas as
respostas. A mais
óbvia é que Bíblia
veio a nós em
gêneros literários.
Gênero Literário
Segundo RENE WELLEK e
AUSTIN WARREN (apud.
OSBORNE 2009:228): “O gênero
deve ser concebido, conforme
pensamos, como um agrupamento
de obras literárias baseado
teoricamente tanto na forma
exterior (métrica ou estrutura
específica) quanto, também, na
forma interna (atitude, propósito –
grosso modo, assunto e público)”.
Paul Ricoeur (1913-2005)

“Gêneros literários fazem mais do


que apenas classificar textos; na
realidade, fornecem um código que
forma o modo pelo qual um leitor
irá interpreter aquele texto.”
(KAISER 2009:29)
Gênero e interpretação
A pergunta interpretativa mais
importante não é “o que essa declaração
está me dizendo para fazer a fim que Deus
seja representado devidamente?” A
primeira pergunta que devemos fazer é
“Por que isso está aqui?” – é essa
pergunta que nos ajudará em direção a
tarefa literária.
Lemos uma revista em quadrinhos, um conto, uma poesia e um jornal
com posturas e expectativas completamente diferentes. Por que?
Parte da explicação está no fato de entendermos (consciente ou
inconscientemente [intuitiva]) a proposta dos seus autores. Essa
proposta, por sua vez, muitas vezes não declarada, deixa indícios no
próprio texto. Todo bom interprete deve reconhecer o que o autor
pretende gerar com seu texto. Quem escreve não quer somente
informar. Quer emocionar, assustar, consolar, explicar, trazer uma
lição moral, confundir, entreter, gerar prazer, gerar empatia etc.
Quando reconhecemos esses sinais, reconhecemos o gênero literário
de uma obra. Portanto, umas das perguntas mais importantes que
podemos fazer diante das Escrituras é: Que tipo de escrito é esse?
• Identificação por comparação.
• Indicação de propósito e expectativa.
• Consciência do gênero fornece uma leitura
estratégica e corrige falsas expectativas.
Considerações • Reconhecer as categorias não implica que são
estanques ou rígidas.
• Texto não visa somente informar
(Impossibilidade de separação do amor de
Deus – A mulher em Apocalipse 12, Salmo
23, Romanos 8).
• Existem particularidades nos gêneros do
mundo antigo.
David Aune

“[...] consiste nos elementos


inter-relacionados de forma,
conteúdo e função.”
Baird diz que “forma” é um artifício literário,
baseado na natureza do material, que é usado para
analisar pequenas unidades de literatura; “gênero”
Gênero, Forma e modo toma várias dessas unidades e as reúne em um
único todo para fins de classificação; e “modo” é
(PHILIPS 1996:307) ainda mais difuso, observando características que
(às vezes artificialmente) unem várias formas ou
gêneros sob uma única rubrica.
Narrativa

Lei

Poético

Sabedoria

Gêneros Profético

Evangelhos

Epístolas

Apocalíptica
• Boa parte das Escrituras é registrada em
forma de narrativa. Todas as narrativas, por
sua vez, tem um enredo, uma trama, e
personagens (seja divinas, humanas, animais,
vegetais, etc).

Narrativa • Elementos a serem considerados.


• Dependência literária (e.g., Marcos
primeiro ou Mateus?).
• Formas (sabedoria, parábola, narrativa de
exemplo).
• Redação (como todo o material foi
arranjado).
O que as narrativas não são (FEE & STUART)

• Não são histórias fragmentadas de indivíduos.


• Não são alegorias cheias de significados ocultos.
• Nem sempre ensinam de forma direta.
• Cada história ou episódio não tem necessariamente uma lição moral individual.
Interpretando a narrativa

• Uma narrativa não é uma asserção. Narrar uma história não é o mesmo que corroborá-
la. Narra-se o que aconteceu; não necessariamente o que deveria ter acontecido. O
mérito moral muitas vezes é incidental.
• Todas as narrativas são incompletas e seletivas. O que está sendo colocado é o que o
autor entendeu ser importante.
• ALTER destaca o contraste de personagens como um dos dispositivos preferidos da
narrativa hebraica (e.g., Caim e Abel).
• Deus é o herói de todas as histórias.
Interpretando a narrativa

• Observe a estrutura – da macro para a micro.


• Precisamos observar o estilo e as técnicas literárias (quiásmo, repetição).
• Redação (como todo o material foi arranjado).
História do texto e história no texto

• Quando pensamos na relação entre história e o texto bíblico podemos


estar considerando o texto como um produto condicionado pela história
(história do texto) ou no texto como apelando ou dependendo da
historicidade de determinado evento (história no texto).
• Provérbios e parábolas, por exemplo, tem menos apelo histórico. O texto
não relata ou depende de eventos históricos (história no texto). Ainda
assim, precisamos entender o texto como algo que surge na história
(história do texto).
Atos Levítico Provérbios

História no texto História no texto História no texto

História do texto História do texto História do texto


Histórico em Histórico-gramatical.

• Necessidade de situar a obra e suas declarações em um contexto histórico.


• Por “histórico” estamos lidando com questões cronológicas e culturais.
• O acesso ao sentido passa por questões históricas. Em outras palavras, não
podemos ter acesso ao significado do texto ignorando os elementos
históricos. Os elementos históricos condicionam o sentido do texto.
Contexto histórico-cultural

1. Parte do reconhecimento da natureza do documento – do objeto de estudo.


Deus falando na história – dentro de um momento histórica. Exemplo: As
palavras foram condicionadas pela cultura, pela linguagem. Conceito de
acomodação de João Calvino.
2. A própria bíblia faz isso. Ela nos situa historicamente.
3. Teologia. O estar situado historicamente não é importante somente por
questões de sentido do texto, mas de uma construção teológica (Gálatas).
Lucas foi historiar ou teólogo?
A historiografia é o estudo de como a história é
escrita e como nossa compreensão histórica
muda com o tempo. Esse estudo considera as
Historiografia abordagens usadas pelos historiadores e
procura entender como e por que suas teorias
e interpretações diferem.
É a disciplina que estuda como a história é
escrita. Ela reconhece os método, as ideologia
e a teoria. Nela revela-se a forma como o
historia é pensada e estudada pelo historiador.
Historiografia Que fonte são fidedignas? Que personagens
são importantes? Como os dados históricos se
relacionam? Que dados devem ser levados em
conta? São algumas questões que permeiam o
historiografia.
Historiografia

ESTUDO DA METODOLOGIA. PRÁTICA DA ESCRITA


HISTÓRICA.
Positivismo:

• Fases na humanidade: mítico-metafísica-ciência.


• Fonte histórica: escrita. O conceito de pré-história.
• Grandes homens e grandes eventos.

Materialismo histórico.
Correntes
historiográficas • Alvo principal: forma de produção da vida material.
• Corrente mais utilizada (escravistas, feudal...).
• Determinismo histórico.

Nova história (Annales).

• Fonte histórica: perceber os detalhes (ausência).


• Eventos de longa duração – mentalidade.
A Bíblia é um livro de história?

Diante dessa pergunta, PHILIPS LONG (1996:299) declara:

“A resposta simples para a pergunta feita no título deste capítulo é não, (a


Bíblia não é um livro de história. Mas este é exatamente o tipo de pergunta
para a qual uma resposta simples (simplista?) não deve ser dada, pelo
menos não sem dizer o que mais a Bíblia não é também. Ela não é um livro
de ciências, um livro de leis, um livro de ética, um livro de teologia ou
mesmo um livro de literatura ou política (a lista pode continuar). A Bíblia
pode ter um interesse vital em cada uma dessas áreas, mas sua essência
não pode ser reduzida a nenhuma delas.”
V. Philips Long (324)
Em que base, então, as narrativas devem
ser classificadas? A forma por si só não é
um critério suficiente: “simplesmente
não há universais da forma histórica
versus fictícia. Ou seja, nada na
superfície marca infalivelmente os dois
gêneros. Como modos de discurso,
história e ficção formam categorias
funcionais que podem permanecer
constantes sob as mais variadas
variações e são distinguíveis apenas por
seu senso geral de propósito.” (Aqui
citando Meir Sternberg em The Poetics
of Biblical Narrative).
V. Philips Long (1996:324)
“A questão a ser feita então é esta: Qual é a função
aparente de uma narrativa particular dentro de seu
contexto mais amplo? Um sentido do propósito de uma
narrativa é, como Sternberg coloca, ‘uma questão de
inferência a partir de pistas plantadas dentro e ao redor
a escrita.’”
História e ficção na historiografia bíblica.

• ALTER reconhece o papel da ficção na historiografia bíblica. Para ele


(2007:46), “prosa de ficção” é a melhor forma de classificar as
narrativas bíblicas.
• A resistência pela terminologia pode ser mitigada pela escolha de
expressões menos ambíguas (e.g., arte, criatividade).
• O narrador bíblico não nos convida a ver os fatos, mas a ver os fatos
pelos seus olhos.
Qual a função primária dessa obra? Histórica ou artística?
V. Philips Long (1996:325)
O que é verdade para a arte visual
(pinturas) é verdade também para a arte
verbal (narrativas). A diferença entre uma
narrativa cujo objetivo principal é
representacional (ou referencial) e uma
cujo objetivo principal é estético é o grau
em que o artista é contido pelas
realidades do assunto.
“[...] a recontagem do que
aconteceu, mesmo poucos
Peter R. momentos depois,
inevitavelmente introduz
Ackroyd simplificações, seleções,
interpretações.”
A participação do historiador bíblico.

Poucos eruditos do campo


O narrador “encontra” as
da interpretação negariam a
narrativas ou as “constrói”?
“participação criativa” dos
Existe uma caminho entre
historiadores. A questão é a
as duas pontas desse
natureza e extensão dessa
espectro.
contribuição.
Historiografia bíblica
Relato Histórico-jornalístico Ficção Pura

Foto Retrato Pintado Fantasia

1. O autor escolhe o assunto dentro uma multidão.


2. Um ponto de vista é escolhido.
3. Decisões composicionais (presença ou não de certos detalhes).
4. Escolhas estéticas.
Conclusões

• Se o historiador deve apresentar somente a transcrição dos eventos, a


confiabilidade da historiografia bíblica é colocada em cheque.
• V. PHILPS LONG (1996:337 – itálico nosso) resume bem: “[...] o que a
comparação das duas representações da promessa dinástica ilustra é a
extensão em que os historiadores podem ser criativos em suas apresentações,
enquanto ao mesmo tempo permanecem conditos pelo fato.”
• Concluímos então que a historiografia envolve uma tentativa criativa, embora
restrita, de retratar e interpretar eventos significativos ou sequências de
eventos do passado.
Advertência

• Uma das grandes falácias interpretativas na lida com material narrativo vem do
contraste das perspectivas historiográficas do mundo moderno (presentes na
mente de muitos cristão – incluindo aqueles que abertamente lutam contra o
método crítico) e do mundo bíblico.
• O apelo à literalidade nas narrativas muitas vezes não somente revela a
ignorância da historiografia bíblica; é a manifestação da presença tácita da
historiografia moderna.
Evangelhos

• Em termos gerais os evangelhos podem ser considerados narrativas


históricas. Eles registram a vida e ministério do Senhor Jesus Cristo. Existe
uma intencionalidade histórica. Os evangelistas nos situam geograficamente,
nos apresentam nomes de pessoas, lugares e instituições.
• A história de Cristo sendo contata em narrativa diz muito sobre a natureza do
ministério de Jesus. Os autores poderiam ter lançado mãos de outros gêneros
(e.g., Evangelho de Tomé), mas a narrativa nos permite “viver com Jesus”.
• O entendimento do gênero dos Evangelhos nos ajuda na tarefa apologética,
pois lidamos diretamente com a confiabilidade do registro.
Evangelhos: marcas literárias

• Todos possuem uma estrutura narrativa comum (nascimento  morte).


Todos estabelecem seu relato dentro de um contexto histórico. Como
bem nos lembra HURTADO (354), há “um esforço gramático
compartilhado de situar Jesus em um contexto histórico, geográfico e
cultural específico.”
• Jesus aparece com uma figura paradigmática em ações e ensinamento.
Narrativas antigas e os evangelhos: paralelos

Narrativas antigas Evangelhos


• Personagens e objetivos. • Jesus e o Reino.
• Desafios e obstáculos. • Desafios com religiosos.
• Conclusão. • Resultados do ministério.
Narrativa de nascimento (Mt.; Lc.).

Narrativa da morte (Mt.; Mc.; Lc.; Jo.).


Biografias
greco-romanas Traçam eventos da vida de Cristo.
e os evangelhos:
paralelos • Alguns organizados
cronologicamente.
• Outros organizados por tópicos.
• Ainda outros organizados
geograficamente.
Público alvo. Mais específico nos
evangelhos.

Ênfases. Destaque para a


singularidade de Jesus nos
Distinções. evangelhos.

Cultura. Mais influenciado pela


cultura judaica.
• Aretologia: “narrativas greco-romanas sobre a vida
de um “homem divino”, um herói ou guerreiro
famoso do passado, que tinha feitos embelezados ou
exagerados” (BLOMBERG 2009:142).
Confusão de • Terminologia teatrais: comédia/tragédia.
Propostas • Midrash. Devido ao uso constante do AT.
• Parábola / Apocalíptica. Devido ao caráter
enigmático de partes de Marcos.
• Drama.
HURTADO (2012:363, 367)
“Quanto à forma, trata-se de narrativas
sequenciais das atividades de Jesus que
possuem grande semelhança com
escritos biográficos. [...] os escritos
judaicos de bios ilustram como os Evangelhos
canônicos não se encaixam
perfeitamente nas convenções da biografia
grega e romana. [...] ele [Jesus] não é
simplesmente um protótipo de virtudes gerais
como coragem, honra e sabedoria. Em todos
os relatos, Jesus é apresentado como o
enviado singular de Deus [...]”
HURTADO (2012:368)

“Embora durante algum tempo no século XX a


visão predominante entre os estudiosos do
Novo Testamento fosse que os Evangelhos
canônicos representariam um tipo novo e único
de escrito, sem comparações validades na
literatura romana, nos últimos anos, um
crescente número de estudiosos chegaram a
conclusões diferentes. Está cada vez mais claro
que os Evangelhos podem ser comparados
adequadamente com o amplo e diverso
gênero de escritos chamado de biografia antiga,
ou escritos de bios.”
HURTADO (2012:369)

“Alguns enfatizam as semelhanças [...]


outros enfatizam as maneiras como os
evangelhos diferem e não podem ser
tomados simplesmente como biografias de
Jesus. A melhor aproximação à questão é
provavelmente evitar a simplificação
exagerada e contar com certa
complexidade.”
N. T. Wright
Quando você comprar os evangelhos com
“biografias” de Grécia ou Roma antiga, eles
correspondem muito bem ao gênero. [...] os
evangelhos se apresentam com biografias, isto é,
biografia de Jesus. (2019:81)
Craig L. BLOMBERG (2009:143)

Há, com certeza, características únicas nos


evangelhos, em geral relacionadas aos
eventos sem igual que eles narram a à
natureza distintiva da pessoa de Jesus de
Nazaré. Mas isso não os torna menos
históricos ou biográficos segundo as
convenções do seu tempo. Talvez seja
melhor, então, referir-se aos evangelhos
como biografias teológicas.
Richard Bauckham
O testemunho é a categoria que nos
possibilita ler os Evangelhos de maneira
apropriadamente histórica e de modo
satisfatoriamente teológico. É onde
história e teologia se encontram.
Epístolas
Carta ou epístola?

• Segundo O´BRIEN (em REID 2012:188), “A palavra grega


epistolē (‘epístola’, ‘carta’) originariamente se referia a uma
comunicação oral enviada por mensageiro. [...] o termo ‘carta’
era designação ampla para indicar tipos diferentes de
documentos comerciais, governamentais e legais, bem como
relatório políticos e militares...”.
ELSOM (em ALTER, KERMODE 1997:611, 613)
• A carta era um dos tipos mais comuns de escrita no período romano. Era o
meio pelo qual monarcas e imperadores administravam seus domínios, e
pelo qual as autoridades judaicas em Jerusalém mantinham integrados o
culto e a comunidade do povo judeu até a destruição do Templo.
• Paulo com frequência, tem em mente formas litúrgicas em vez de
epistolares, de modo que a carta é também um serviço religioso e de homilia
desempenhando a distância, mas a flexibilidade inerente à forma da carta
muitas vezes permite que o mesmo elemento tenha diversas funções.
• “Parece portanto artificial traçar uma distinção entre ‘cartas’, isto é, cartas
documentárias, e ‘epístolas’ ou cartas literárias.”
Documento comunitário

“Cartas da comunidade eram uma características familiar da vida


judaica. Era necessário que os líderes nacionais mantivessem as
comunidades da Diáspora informadas acerca do calendário a cada ano,
e inovações e decisões ad hoc requeriam essa comunicação.”
(GOULDER em ALTER, KERMODE 1997:515-6)
Tratados:

• Menos literárias,
Contrastes com outras • Menos formais e
literaturas • Menos artísticas.
(KLEIN,
BLOMBERG,
HUBBARD Correspondências pessoais:
2017:673-4).
• Mais longas,
• Estrutura mais cuidadosa e
• Mais ditáticas.
Modelo em 2 Macabeus 1.1-2.18

Saudação.

Ação de graça.

Prece para o bem estar dos destinatários.

Relato da situação.

Encorajamento.

Conclusão devota.
Diatribe

• A maioria dos estudiosos (STERLING 2002:322; 153) reconhece a diatribe como um recurso
retórico ligado às escolas de instrução filosófica (e.g., cínicos [Tales], estoicos [Sêneca],
epicureus [Filodemo] e plantonistas [Plutarco]); mas também encontrada entre os profetas do
Antigo Testamento e em documentos judaicos (e.g., Sabedoria de Salomão).
• Segundo STERLING (2007:153 – itálico nosso): “As marcas da diatribe são o uso de um
oponente e a antecipação de falsas conclusões.” A diatribe “prever objeções a uma
argumentação” (KÖSTENBERGER, Patterson, 2015:447 – itálico nosso). Além disso,
KÖSTENBERGER e PATTERSON (ibid.) nos lembram que se trata de uma técnica “usada
somente com um público que tem uma relação mais do que apenas superficial [...] visto que
ela visa constranger o ouvinte a examinar a verdade.” Trata-se de um método ou estilo (não
gênero) que visa a persuasão e censura (AUNE 1989:200).
Dificuldades

• Documento ocasional (um lado do diálogo).


• A estrutura das orações podem ser muito longas (e.g., Efésios 1.1-14).
• Ausência de uma fluidez. Segundo Leland RYKEN (2017b:54-5 – itálico nosso):
• “Por causa da informalidade das situações e do conteúdo, a estrutura das
epistolas é fragmentada e não sistemática. Um tópico leva a outro num
processo de associação. Porque os autores estavam muitas vezes
respondendo a questões que tinham surgido, precisamos estar preparados
para um salto desarticulado de um tópico para outro.”
• Incorporação de outros gêneros.
Literatura Apocalíptica
Dificuldades

• Não temos paralelos em nossa cultura.


• Muitas referências simbólicas (e.g., números) e, por isso, enigmática.
• Segundo Fee:“[...]interpretar as imagens em uma obra apocalíptica do primeiro
século é a mais difícil de nossas tarefas.”
• Petencial de intertextualidade maior que qualquer livro da Escritura.
Literatura Apocalíptica

• A importância:
• John COLLINS (2010:365- 6 – itálico nosso): “Tanto os Evangelhos sinóticos quanto Paulo […] são
matizados em um grau significativo numa visão de mundo apocalíptica”.
• Em outras palavras, qualquer que seja o problema subjacente, ele é percebido a partir de uma perspectiva
distintamente apocalíptica. […] A função da literatura apocalíptica é moldar a percepção imaginativa da
situação de alguém e, assim, colocar fundamentos para qualquer curso de ação ao qual ela exorte.
• A linguagem de ameaça é comum na literatura apocalíptica. Segundo NONGBRI, (273) “um dos
propósitos principais da linguagem apocalíptica é instilar temor na audiência”. Nongbri (266) entende que
esse é o mesmo propósito do autor de Hebreus – “evocar temor” aos seus leitores.
Apocalipse e seus gêneros.
“Uma designação mais acurada de gênero [...] ocorre em
Apocalipse 1.3 e 22.7, 10, 10-19 (cf. 11.16; 19.10) onde João
claramente identifica o livro como uma prophētia (‘profecia’).
Também contém muitas características das epístolas no prólogo
(1.5-8) e epílogo (22.6-21) além das ‘sete cartas’ para igrejas (2.1-
3.22), mas o gênero de Apocalipse é uma profecia com aspectos
apocalípticos. Portanto, Apocalipse constitui um gênero
misturado.” (BANDY 2015:215)
Gordon Fee
A substância apocalíptica incluiu vários
dispositivos literários reconhecíveis.
Em primeiro lugar, em relação à sua forma, os
apocalípticos registravam visões e sonhos. Em
segundo lugar, sua linguagem, especialmente
suas imagens, era deliberadamente
enigmática e simbólica. Terceiro, os
apocalipses tendem a ser formalmente
estilizados, o que muitas vezes inclui o uso
simbólico de números. Tempo e os eventos
são divididos em pacotes numéricos
organizados, como no Apocalipse de João,
onde as três seções principais (caps. 6–7, 8-11,
15-16) são todos conjuntos de 4-2-1, com um
interlúdio duplo entre os dois últimos (sexto e
sétimo) em cada caso.
Gordon Fee
• “Deve-se sempre estar ciente de que João faz o
que outros apocalípticos fizeram: ele
reinterpretou imagens anteriores para que eles
têm um novo significado, precisamente porque
no caso de João ele também está falando como
um profeta cristão.”
• “[…] o tema mais dominante através de todo o
livro é o da Guerra santa [...] O papel do povo de
Deus é se envolver na Guerra Santa. E aí está o
cerne do livro, porque a sua sorte na guerra será
de sofrimento, que para eles já é presente e
iminente.”
Orientações interpretativas
• “É especialmente importante neste ponto instar
o leitor a ver as visões como um todo, e não
alegoricamente para pressionar todos os
detalhes para ter um significado especial.”
• “Em segundo lugar, esse tipo de esquematização
pertence à forma apocalíptica de escrita e,
portanto, não deve ser considerado um
desdobramento passo a passo do futuro.”

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