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CURSO DE DIREITO

CURSO DE DIREITO
LEONARDO DE ARAÚJO LANDIM NOGUEIRA ALVES

O CONTRATO E SUA FUNÇÃO SOCIAL

FORTALEZA
2009
2

CURSO DE DIREITO

LEONARDO DE ARAÚJO LANDIM NOGUEIRA ALVES

FORTALEZA
2009
3

LEONARDO DE ARAÚJO LANDIM NOGUEIRA ALVES

O CONTRATO E SUA FUNÇÃO SOCIAL

Monografia apresentada ao curso


de direito com habilitação em
Graduação da Faculdade
Integrada do Ceará como
requisito para a obtenção do grau
de bacharel.
Orientador: Prof. Esp. Karol
Wojtyla.

FORTALEZA
2009
4

Superado de vez o individualismo, que


condicionara as fontes inspiradoras do
Código vigente, reconhecendo-se cada
vez mais que o Direito é social em sua
origem e em seu destino, impondo a
correlação concreta e dinâmica dos
valores coletivos com os individuais, para
que a pessoa humana seja preservada
sem privilégios e exclusivismos, numa
ordem global de comum participação, não
pode ser julgada temerária, mas antes
urgente e indispensável, a renovação dos
códigos atuais, como uma das mais
nobres e corajosas metas do governo

Miguel Reale
5

RESUMO

PALAVRAS-CHAVE: FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS,


CONTRATO NO CÓDIGO CIVIL DE 2002, NOVA CONCEPÇÃO DOS
CONTRATOS. ART. 421 DO NOVO CÓDIGO CIVIL, CONTRATOS NO
BRASIL.

NÃO HÁ DÚVIDA QUE O CONTRATO É UM DOS PRINCIPAIS


INSTITUTOS DO DIREITO PRIVADO, SUA UTILIZAÇÃO REMONTA
OS PERÍODOS ARCAICOS. NO IMPÉRIO ROMANO FOI
SISTEMATIZADO E ORGANIZADO, INSTITUINDO AS BASES PARA A
DOUTRINA CONTRATUAL, PORÉM SOMENTE COM O CODIGO DE
NAPOLEÃO ADQUIRIU OS CONTORNOS ATUAIS. POSSUI A
IMPORTANTE MISSÃO DE HARMONIZAR INTERESSES
ANTAGÔNICOS, REGULANDO E ASSEGURANDO AS RELAÇÕES
INDIVIDUAIS, ADEMAIS SUA IMPORTÂNCIA ULTRAPASSA A
INDIVIDUAL POIS É FONTE DE CIRCULAÇÃO DE RIQUEZAS E
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. ATÉ BEM POUCO
TEMPO O CONTRATO ERA INSTRUMENTO INATINGÍVEL PELO
PODER PUBLICO. O ESTIPULADO PELOS INDIVIDUOS ERA LEI
QUE MUITAS VEZES PERPETUAVA A DESIGUALDADE E
ESBARRAVA COM OS DITAMES DA CONSTITUICAO FEDERAL. DE
SORTE QUE COM O NOVO CODIGO CIVIL EM SEU ART. 421 FICOU
ESTABELECIDO QUE “A LIBERDADE DE CONTRATAR SERÁ
EXERCIDA EM RAZÃO E NOS LIMITES DA FUNÇÃO SOCIAL DO
CONTRATO.” A PARTIR DAÍ, HOUVE A FLEXIBILIZAÇÃO DO
PRINCÍPIO DA FORÇA OBRIGATÓRIA DOS CONTRATOS (“PACTA
SUNT SERVANDA”) E O ENTE PÚBLICO PASSOU A INTERVIR NAS
RELAÇÕES PARTICULARES LIMITANDO, IMPONDO CONDIÇÕES E
INTERFERINDO SEMPRE QUE SE MOSTRAR NECESSÁRIO.
PORTANTO, CONCLUI-SE QUE O CONTRATO, É HOJE, UM
INSTITUTO EM TRANSFORMAÇÃO E QUE SUA FUNÇÃO SOCIAL É
PREMISSA NORTEADORA DA ATIVIDADE CONTRATUAL,
CONTRIBUINDO PARA IGUALDADE MATERIAL E PROMOVENDO
UMA SOCIEDADE MAIS DIGNA E JUSTA.
6

ABSTRACT

KEYWORDS: SOCIAL FUNCTION OF CONTRACTS, CONTRACT IN


CIVIL CODE OF 2002, NEW DESIGN CONTRACTS . ART. 421 THE
NEW CIVIL CODE, CONTRACT IN BRAZIL

NO DOUBT THAT THE CONTRACT IS A PRINCIPAL OF INSTITUTES


OF PRIVATE LAW, THE USE RE THE ARCHAIC PERIOD.
THROUGHOUT THE ROMAN EMPIRE WAS SYSTEMATIZED AND
ORGANIZED, ESTABLISHED THE BASIS FOR CONTRACTUAL DOC-
TRINE, BUT ONLY WITH THE CODE OF THE OUTLINES CURRENT
PURCHASED NAPOLEON. I HAVE THE IMPORTANT TASK OF HAR-
MONIZING CONFLICTING INTERESTS, REGULATION AND ENSURE
PERSONAL RELATIONSHIPS, BEYOND THE ADEM ITS IMPORT-
ANCE OF INDIVIDUALS BECAUSE OF MOVEMENT AND SOURCES
OF RICHES AND ECONOMIC AND SOCIAL DEVELOPMENT. TOO
GOOD TO TIME THE CONTRACT INSTRUMENT ERA UNREACH-
ABLE BY PUBLIC AUTHORITIES. THE INDIVIDUAL WAS SET BY
LAW THAT OFTEN PERPETUATE THE INEQUALITY AND RUNS UP
AGAINST THE DICTATES OF THE FEDERAL CONSTITUTION. LUCK
WITH THAT OF THE NEW CIVIL CODE IN YOUR ART. 421 HAS BEEN
ESTABLISHED THAT "THE FREEDOM OF CONTRACT WILL BE EX-
ERCISED IN REASON AND THE LIMITS OF SOCIAL FUNCTION OF
THE CONTRACT." FROM THERE, THERE WAS A RELAXATION OF
THE PRINCIPLE OF BINDING CONTRACTS ( "PACTA SUNT SER-
VANDA") AND THE PUBLIC UNDER PASSOS TO INTERVENE RELA-
TIONS IN PRIVATE LIMITED, IMPOSING CONDITIONS AND INTER-
FERE WHERE THE NEED ARISES. IT WAS CONCLUDED THAT THE
CONTRACT, AND TODAY, ONE IN THE PROCESSING AND ITS RE-
LATION TO SOCIAL ACTIVITY AND ASSUMPTIONS ABOUT THE
CONTRACTUAL CONTRIBUTING TO SUBSTANTIVE EQUALITY AND
TO PROMOTE A SOCIETY MORE DIGNIFIED AND JUST.
7

SUMÁRIO

SUMÁRIO....................................................................................................................................................
.................7
1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................................
...................8
2 BREVE HISTÓRICO SOBRE OS CONTRATOS....................................................................................
.........9
3 CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONTRATO..................................................................................................
.13
3.1 CARACTERÍSTICAS.............................................................................................................................................14
3.2 REQUISITOS......................................................................................................................................................14
3.3 CLASSIFICAÇÃO................................................................................................................................................15
3.4 EFEITOS...........................................................................................................................................................16
3.5 PRINCÍPIOS.......................................................................................................................................................17
4 A TEORIA TRIDIMENSIONAL DO DIREITO E SUA CONTRIBUIÇÃO...............................................18
5 A FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS.......................................................................................
..................18
6 A TEORIA DA IMPREVISÃO......................................................................................................
.......................25
7 A LESÃO NO CÓDIGO CIVIL.........................................................................................................................
...31
8 ATÉCNIAS CONTIDAS NO ART. 421 DO CÓDIGO CIVIL........................................................................
.32
9 O PROBLEMA DOS CONTRATOS DE ADESÃO......................................................................
....................32
10 O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NOS CONTRATOS.........................................................................
..................34
11 O CONTROLE DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS.............................................................................
................36
12 CONCLUSÃO.................................................................................................................................
......................39
13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................................
..40
14 ANEXO - JURISPRUDÊNCIA......................................................................................................................
.....43
TRIBUNAIS ESTADUAIS................................................................................................................................51
8

1 INTRODUÇÃO

Esta monografia dissertará sobre a historia dos contratos na humanidade;


abordará de maneira sucinta, breves delineamentos sobre a doutrina contratual
brasileira; e posteriormente, concentrar-se-á na no exame minucioso do art. 421 do
novo diploma civil que trata da função social dos contratos.
Procurarei demonstrar neste trabalho as várias situações que permitem a
intervenção judicial nas estipulações contratuais, as diversas formas de controle das
clausulas abusiva e as conseqüências destas mudanças na criação e execução dos
contratos.
Através deste estudo o leitor será capaz de identificar as diversas
mudanças ocorridas nos princípios do direito contratual as suas repercussões no
universo jurídico.
A estrutura ético-jurídica da função social do contrato exige a observação
da boa-fé referente a todos os negócios jurídicos.
O legislador muito nos ajudou com a criação do novo Código Civil
pautado nos princípios da eticidade, da operabilidade e da sociabilidade. Sua
interpretação está fundamentada nos valores éticos, morais e sociais consagrados
pela Constituição Federal. Jamais poderemos esquecer que foi através desta nova
função que o contrato passou a controlar o enriquecimento ilícito (art. 884 a 886 do
CC) e o exercício abusivo de direitos (art. 187 do CC).
Concluindo, entendemos que o contrato é instrumento não apenas
gerador e assegurador de relações jurídicas particulares, mas também desempenha
o importante papel na promoção de uma sociedade mais justa e digna ,quando limita
a autonomia da vontade em face de interesses tido como preferenciais que
coincidem com os sociais.
9

2 BREVE HISTÓRICO SOBRE OS CONTRATOS

Dissertar a respeito do surgimento dos contratos não é uma tarefa fácil,


pois a própria noção de contrato pode ter diferentes significações na história. Nesse
sentido Wald (2000, p. 43) assevera:

Poucos institutos sobreviveram por tanto tempo e se desenvolveram sob


formas tão diversas quanto o contrato, que se adaptou a sociedades com
estruturas e escala de valores tão distintas quanto às que existiam na
Antiguidade, na Idade Média, no mundo capitalista e no próprio regime
comunista.

Se observarmos o passado, podemos identificar a utilização dos contratos


desde que o homem percebeu a necessidade de conviver em sociedade. Muitas
vezes precisando realizar trocas (escambo) para sobreviver.
Na Antiga Mesopotâmia, nos deparamos com os primeiros enunciados
acerca dos contratos escritos. As Leis de Eshnunna, promulgadas provavelmente
entre os anos de 1825 e 1787 a.C., já dispunham sobre a compra e venda,
arrendamento e empréstimo a juros.

Figura 1 Tábua de argila cozida, que contém a famosa codificação de Eshnunna, desde o início do 2º
Milênio A.C. , encontradas antes mesmo do código de Hamurabi, em Tell Harmal. (Fonte:
http://www.theartnewspaper.com)
10

O Código de Hamurabi, elaborado em 1758 a.C., no Império Babilônico,


também possuía diversos dispositivos sobre os contratos. Inclusive, já havia
regulamentações sobre certos tipos de contratos, incluindo sua execução e controle
de juros.
Reza o §268 do Código de Hamurabi que: “Se um homem alugou um boi
para semear o grão, seu aluguel será de dois sutu1 de cevada”.

Figura 2 - Esta estela representa Hamurabi Figura 3 - Hamurabi, relevo em calcário


recebendo de Shamash, o deus-sol, o código de leis Cortesia dos curadores
do Museu Britânico
Fonte: www.historiadomundo.com.br
Fonte: www.historiadomundo.com.br

No entanto, foi no Império Romano que o instituto contratual foi


sistematizado, organizado e instituiu as bases para a doutrina contratual moderna.
Não podemos esquecer, contudo, que o Império romano sofreu intensas
mudanças no tempo, devido a conquistas de novos povos e mudanças políticas 2.
Acarretando deste modo, inúmeras variações no instituto contratual.
No período clássico, por volta do século XVIII, eram utilizadas três
expressões para designar os contratos: convenção, contrato e pacto; Cada uma
destas denominações possui especificidades próprias.
Convenção era o gênero que englobava duas espécies: contrato e pacto.

1
Cada sutu correspondia a vinte litros de cevada
2
Com a que do domínio romano houve um retrocesso, pois passou a predominar o Direito Germânico
que era menos evoluído que o Direito Romano, havendo necessidade, para a formalização de
obrigações, a observância de um ritual. Tal procedimento conservou-se até a idade média.
11

Os contratos eram as convenções3 normatizadas e por isso, protegidas


pela via da actio. Os contratos possuíam três modalidades: a literis – que exigia a
inscrição do devedor no livro do credor (denominado codex), a ré – que se fazia pela
tradição da coisa, e a verbis que se efetivava pela troca de expressões verbais,
semelhante a um ritual religioso. Estas categorias de contratos possuíam proteção
prevista pelo ius civile, onde era prevista a execução dos mesmos.
Como bem proclama Venosa (2003, p. 365): “Cada uma dessas
convenções, sob certas formalidades, constituía um contractus”, o que significa que
não havia uma teoria geral aplicada aos contratos, mas apenas alguns tipos de
contratos.
Já o pacto, espécie do gênero dos contratos, não possuía forma especial,
não era previsto pela lei e não possuía proteção pela actio. Nada obstante, tenha
recebido, no período clássico, certa proteção em razão da sua freqüente utilização.
Há evidências que no período clássico e no pós-clássico do direito
romano, a estrutura do contrato era concebida de maneira extremamente rigorosa,
como acordo de vontades, somado ao pressuposto objetivo, resultando no
surgimento da "obligatio", contudo, com o passar do tempo começa surgir nos
contratos alguma alteração no sentido de abrandamento do rigor. Foi nesse período
histórico, em que o jurisconsulto Gaio realizou a classificação das denominadas
fontes das obrigações, é que se verifica, de forma mais visível à concepção jurídica
do contrato, traçando uma comparação com o conceito no direito moderno.
Na Idade Média por influência do direito germânico, o inadimplemento
contratual ensejava penas corporais, escravidão ou prisão. O direito aplicado dentro
dos feudos, que era promulgado e aplicado pelo próprio senhor feudal, exigia do
vassalo, aceitação, caracterizando-se, portanto um contrato pelo qual eram
assumidas obrigações recíprocas. O vassalo recebia sua porção de terra e em troca
deveria jurar fidelidade ao senhor feudal, fornecendo-lhe sempre que necessário
auxílio de ordem material e militar.
Desde modo, o contrato feudo-vassálico consistia em um ato simbólico e
formal. (Podemos dizer que este era um contrato solene, já que a tradição da coisa
ou de algo que a representasse, era essencial para que o contrato se efetivasse.)

3
Notamos então que, no Direito Romano, o contrato já estava estruturado a partir do acordo de vontades, que
gerava obrigação (ressaltando o caráter personalíssimo da obligatio).
12

Posteriormente, e em função da evolução do direito canônico, a vontade


foi elevada e passou a fazer “a lei entre as partes.” O contrato a partir de então
deixou de ser apenas instrumento jurídico, tornando-se também instrumento
religioso. Neste período resgatou-se a tradição contratual do Direito Romano
clássico, atribuída pelo Corpus Iuris Civilis, que exigia formalidades na constituição
do contrato.
Com o advento do direito natural, a força obrigatória dos contratos foi
reforçada como princípio racional, devendo prevalecer sobre as demais normas;
Para os jus naturalistas o homem era visto como senhor dos seus atos, indivíduo
livre e independente, e por isso não devia se submeter a nenhuma imposição
externa. Pensamento este que serviu de alicerce para o iluminismo.
Revoredo(2007, p. 19) disserta sobre as conseqüências do
Iluminismo ao contrato:

Somente se reconhece, no contrato, o aspecto pertinente a sua força


normativa, a partir do iluminismo, movimento que marcou época na França,
por não aceitar a autoridade real enquanto poder absoluto fundamentado no
poder divino, que fazia oposição à Igreja e as condições inalteráveis de
hierarquia social e cuja ideologia influenciou boa parte do mundo ocidental.
Essa força normativa demasiadamente valorizada e resultante do auge do
individualismo, no qual o homem, pelo fato de firmar a sua vontade racional,
equipara-se a um deus, é levada ao extremo na seara contratual.

Apesar de muitos atribuírem ao Império Romano o surgimento de


contratos , entendemos que o contrato “nos moldes atuais”, surgiu no século XIX,
com o “Code de Napoleon4”, o qual representou o primeiro grande trunfo da
codificação jurídica no mundo.
O Código Civil Frances Fundamentava-se nos princípios individualistas da
liberdade contratual, na propriedade como direito absoluto, e na responsabilidade
civil fundada na culpa provada.
Sabe-se que este código inspirou o nosso código civil e o de
diversos países pelo mundo. (antigo Código Civil Italiano, o Espanhol, o Português,
o Belga, o Holandês, o Romeno, o antigo Código Civil Egípcio, entre outros)

4
Art. 1143 do código de Napoleão: Les conventions légalement formées tiennent lieu de loi à ceux qui
les ont faites. Elles ne peuvent être révoquées que de leur consentement mutuel, ou pour les causes
que la loi autorise. Elles doivent être exécutées de bonne foi.
Tradução : As convenções feitas nos contratos formam para as partes uma regra a qual devem se
submeter como a própria lei.
13

3 CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONTRATO

O vocábulo contrato deriva da palavra romana “contractus” que significa


contrair.
No direito romano utilizavam-se também outras expressões para designar
os contratos: convenctio (de convenção), e pacto ( de pacis si, estar de acordo.)
Podemos definir contrato como negócio jurídico resultante de um acordo
de vontades que produz efeitos obrigacionais.
Ulpiano (Digesto) dizia acertadamente que os contratos representavam o
mútuo consenso das partes sobre o mesmo objeto - “duorum pluriumve in idem
placitum consensus”.

Figura 4 - O Digesto, conhecido igualmente pelo nome grego Pandectas, é uma


compilação de fragmentos de jurisconsultos romanos clássicos
(Fonte: pt.wikipedia.org)

Analisando topograficamente o diploma civil, encontramos a matéria


contratual disciplinada nos artigos 421 à 853. E é interessante observar que a lei
14

pátria não conceitua o contrato, como faz, por exemplo, o Código Francês em seu
artigo 11015 e o Argentino, em seu artigo 11376.
Para que possamos entender perfeitamente o conceito de contratos é
fundamental o entendimento do que vem a ser um negócio jurídico e o que significa
a produção de efeitos obrigacionais.
Negócio jurídico é toda ação ou omissão humana cujos efeitos jurídicos
acarretam a criação, modificação, conservação ou extinção de direitos.
Efeito obrigacional é o liame jurídico entre os contratantes, pelo qual uma
das partes pode exigir da outra a prestação correspondente.
Analisada esta questão conceitual introdutória, gostaria de exibir as
características, requisitos, classificação, efeitos e princípios aplicáveis aos contratos
por entender que tais preceitos são de fundamental importância para o entendimento
da doutrina contratual.

3.1 Características

● Transitoriedade: Os contratos, via de regra, são transitórios. Geralmente


têm vida curta, porém podem ser duradouros, mas nunca permanentes.

● Valor econômico: o contrato em geral é apreciável financeiramente


(possui valor econômico), pois é através desta estimativa que se viabiliza a
responsabilização da parte inadimplente judicialmente, caso este não seja adimplido.

3.2 Requisitos

● Capacidade dos contraentes: art. 3º a 5º, 104, 166, 167, 171 CC/2002).
● Mútuo consenso;
● Legitimidade
● Prestação
● Objeto lícito, possível, determinado ou determinável.

5
Le contrat est une convention par laquelle une ou plusieurs personnes s'obligent, envers une ou
plusieurs autres, à donner, à faire ou à ne pas faire quelque chose.
6
Art.1137.- Hay contrato cuando varias personas se ponen de acuerdo sobre una declaración de
voluntad común, destinada a reglar sus derechos.
15

● Forma prescrita ou não defesa em lei. (forma pode ser verbal ou


escrita).

3.3 Classificação

● Contratos unilaterais ou bilaterais: unilaterais são aqueles em que


apenas uma das partes se obriga em relação à outra, um dos contratantes é
exclusivamente credor, enquanto o outro é exclusivamente devedor; bilaterais são os
que geram obrigações para ambas as partes e essas obrigações são recíprocas;
cada uma das partes fica adstrita a uma prestação.
● Contratos principais ou acessórios: principais são os contratos que
podem existir independentemente de qualquer outro; já os acessórios, têm por
objeto assegurar a execução de outro contrato, de que dependam.
● Contratos a título gratuito ou a título oneroso: os contratos gratuitos só
beneficiam uma das partes envolvidas, geralmente todo contrato unilateral é gratuito.
Já os onerosos beneficiam ambas as partes, causando proveito a estas.
● Contratos comutativos ou aleatórios: Comutativo é o contrato em que
cada uma das partes, além de receber da outra prestação equivalente à sua, pode
apreciar de imediato essa equivalência. Os contratos comutativos apresentam
grandes semelhanças com os contratos bilaterais; Os contratos aleatórios têm a
característica de prestações incertas, quanto à quantidade ou extensão, pois estas
estão na dependência de um fato futuro e imprevisível.
● Contratos típicos ou atípicos: os primeiros são conhecidos como
nominados e são aqueles que têm nomen júris, estando previstos e regulados em
lei; Os segundos são aqueles em que o legislador não fez previsão de modo
expresso, mas que gradativamente foram surgindo na vida quotidiana, criados pela
imaginação ou pelas necessidades das pessoas.
● Contratos solenes ou informais: solenes(ou formais) são os contratos
que não possuem forma livre, dependendo de forma especial para se efetivar;
Contatos informais são os que independem de forma especial para se formarem,
bastando o consentimento das partes.

● Contratos pessoais ou impessoais: os contratos pessoais (“intuitu


personae”) levam em conta a personalidade da pessoa, o serviço só poderá ser
16

executado por ela. Há contratos que por sua natureza são pessoais; impessoais são
aqueles onde qualquer pessoa com capacidade para executar o objeto do contrato,
poderá fazê-lo. As partes não especificam, a pessoa que irá cumprir o contrato é
irrelevante.
● Contratos instantâneos ou contratos de duração: Os contratos
instantâneos são aqueles cujas prestações podem ser realizadas em um só instante;
os Contratos de duração têm como característica essencial a distribuição da
execução no tempo. As partes estão adstritas ao cumprimento de prestações
contínuas ou repetidas em intervalos estipulados, por tempo determinado ou
indeterminado. Estes subdividem-se em contratos de execução periódica e contratos
de execução continuada. Os de execução periódica seriam os contratos de trato
sucessivo, que se executam mediante prestações periodicamente repetidas. Os de
execução continuada, aqueles em que a prestação é única, mas ininterrupta. Cada
prestação corresponde à obrigação total, não uma parcela. São interdependentes
● Contratos civis ou mercantis: contrato civil é aquele praticado por
qualquer pessoa que seja capaz, conforme dispõe o Estatuto Civil. Contrato
mercantil é aquele praticado por comerciante no exercício de sua profissão, cujo
objeto é um ato de comércio
● Contratos negociáveis ou de adesão: Contratos negociáveis ocorrem
quando as cláusulas contratuais forem frutos de discussões e debates entre ambas
as partes, ou quando, este debate, for no mínimo possível. Contratos de adesão são
aqueles nos quais um dos contraentes se limita a aceitar o texto que o outro
contraente estipula. A parte aderente só pode aderir ao modelo oferecido, não lhes
cabendo a possibilidade de discutir/estipular as cláusulas contratuais.

3.4 Efeitos

● Obrigatoriedade: o contrato faz lei entre as partes.


● Irretratabilidade: nenhuma das partes pode, arbitrariamente, desfazer o
contrato.
● Intangibilidade: inalterabilidade, não admitindo, de ordinário,
modificações sem o consentimento da parte contrária.
17

● Efeito pessoal: em relação ao objeto, o contrato cria obrigações de


natureza pessoal. O credor exige do devedor o cumprimento da prestação sob pena
de perdas e danos

3.5 Princípios

● Princípio da autonomia da vontade: Por este princípio entende-se que


aos indivíduos é conferida a prerrogativa de criarem negócios na órbita jurídica,
desde que estes negócios se submetam às regras impostas pela lei e que seus fins
coincidam com o interesse geral. Desse modo qualquer pessoa capaz pode pela
manifestação de sua vontade, sendo o objeto lícito, criar relações contratuais a que
a lei empresta validade. A liberdade contratual caracteriza-se então por ser: “A
faculdade reconhecida às pessoas de criarem entre si, guiadas pela sua própria
razão, acordos destinados a regular os seus interesses recíprocos” (VARELA).
● Princípio do consensualismo: Segundo este princípio o contrato é
concluído quando existe o encontro de vontades, bastando o consenso para que o
contrato tenha existência.
● Princípio da força obrigatória dos contratos (“pacta sunt servanda”):
Este princípio estabelece que os contratos cumpram, com força
obrigatória, isto é, como se lei fossem. Caso não seja cumprido, a parte
prejudicada poderá valer-se da execução patrimonial contra o inadimplente.
Ressalte-se (como veremos mais adiante) que este princípio não é absoluto, mas
relativo.
● Princípio da relatividade dos efeitos do negócio jurídico contratual:
desde princípio informa que os contratos não podem aproveitar, nem prejudicar
terceiras pessoas, vinculando apenas as partes estipulantes.

● Princípio da boa fé: segundo ele, o sentido literal da linguagem não


deverá prevalecer sobre a intenção inferida da declaração de vontade das partes.
18

4 A TEORIA TRIDIMENSIONAL DO DIREITO E SUA CONTRIBUIÇÃO

A teoria tridimensional do direito, de autoria do eminente jurista Miguel


Reale (1968), indubitavelmente forneceu subsídio para os importantes avanços
traçados pelo novo código civil (função social da propriedade, princípio de a boa-fé
objetiva, resolução contratual por onerosidade excessiva, acolhimento do juízo de
equidade, e, sobretudo a função social dos contratos).
Acolhida internacionalmente, procura esta teoria demonstrar a superação
do normativismo, através da revelação de que o fenômeno jurídico decorre de um
fato social, atribuído carga de valores antes de gerar uma norma.
Para a teoria tridimensional, o direito se compõe então de três dimen-
sões: dimensão normativa, pela qual se entende o direito como ordenamento jurídi-
co. Dimensão fática, que interpreta o direito com foco na sua efetividade social e his-
tórica e, por fim, dimensão axiológica que entende a ciencia jurídica como ciencia
valorativa, cuja finalidade é a busca da Justiça.
Compondo-se o fenômeno jurídico então, necessariamente, de um fato
subjacente (fato geográfico, econômico, demográfico, etc.); de um valor, que é atri-
buído a determinado acontecimento, inclinando ou determinando a ação dos ho-
mens no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo; e, finalmente, de
uma norma, que representa a relação ou medida que integra os demais elementos.

5 A FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS

Apesar de este tema ter ganhado repercussão com o código civil de 2002,
sabe-se que esta matéria já era abordada deste o século XIX.
Enrico Cimbali publicou, em 1884, na Itália, o artigo intitulado “A função
social dos contratos e a causa jurídica da respectiva força obrigatória”; já em 1929,
Karl Renner, publicou, na Alemanha, a obra denominada “Os institutos de direito
privado e a sua função social”.
19

Podemos definir a função social7 dos contratos como atributo elevado a


princípio constitucional, que tem por intento, proteger as pessoas, envolvidas
diretamente ou indiretamente na relação contratual.
Pereira (2004, p. 13-14), tratando em sua obra sobre a nova função dos
contratos aduz que:

A função social do contrato é um princípio moderno que vem a se


agregar aos clássicos do contrato, que são os da autonomia da vontade,
da força obrigatória, da intangibilidade do seu conteúdo e da relatividade
dos seus efeitos.

Já nas palavras do Excelentíssimo ex-ministro Delgado, do STF (2004, p. 7):

O contrato, em razão dessa nova realidade legal, apresenta-se


conseqüentemente, na atualidade, com um desenho composto pelas
complexidades que envolvem as relações jurídicas no alvorecer deste
Século XXI.

[...]

O Código Civil de 2002 reflete, na mensagem do art. 421, um padrão


moderno referente à função do contrato, imprimindo-lhe um efeito que
rompe com a predominância da livre manifestação da vontade como
pressuposto para a sua validade e eficácia.

Essa nova teoria ganhou alcance após a crise contratual, quando a teoria
clássica dos contratos deixou de mostrar-se satisfatória à sociedade. Que aspirava
ansiosamente por meios de eliminar ou diminuir a condição execrável que era
imposta pelo contrato em sua concepção liberal.
A importância dos princípios contratuais de proteção, neste contexto, se
elevou. O contrato deixou de ser visto como instrumento de segurança jurídica e
passou a ser visto como fator contributivo para o desenvolvimento humano.
Bruno T. Oliveira (2006) esclarece:

Sem sombra de dúvida, a função econômica dos contratos em nossa


sociedade de consumo é enorme. A ponto de afirmarmos que sem o
contrato, nossa sociedade capitalista não existiria. O contrato é instrumento
de circulação de riqueza, ajudando a distribuir a renda e a gerar empregos.

7
De acordo com o dicionário Michaellis, a palavra “função” significa: “sf (lat functione) 1 Ação natural e própria de qualquer
coisa. 2 Atividade especial, serviço, encargo, cargo, emprego, missão”. E o vocábulo “social significa”: adj m+f (lat sociale) 1
Pertencente ou relativo à sociedade. 2 Que diz respeito a uma sociedade.
20

Em uma perspectiva contemporânea, contrato é um conceito funcional e,


como tal, desempenha importante papel social.
A função social do contrato, erigida modernamente a princípio, coloca em
foco a dimensão coletiva, não se limitando à satisfação de necessidades
individuais dos contratantes. (...)
O princípio da função social do contrato evidencia a funcionalização do
contrato; devolvê-lo à sua tarefa original, às vezes esquecida nos caminhos
do individualismo. O contrato, além da realização de interesses privados,
deve contribuir para edificação do ser humano digno.

O Conselho de Justiça Federal (CFJ) aprovou na I Jornada de Direito civil


enunciado8 que trata de esclarecer e orientar o entendimento sobre a função social
dos contratos no Código civil:
Enunciado 22: A função social do contrato, prevista no art. 421 do novo
Código Civil, constitui cláusula geral que reforça o princípio de conservação do
contrato, assegurando trocas úteis e justas.
Entendemos então que o artigo 421 do CC instituiu então uma nova
condição de validade dos acordos, subordinando estes à observância de
determinados modelos de probidade, lealdade e sociabilidade, o que indica que não
podemos pensar no contrato de maneira isolada, mas sim no contexto geral do
ordenamento jurídico em que está inserto, através do qual deve ser assegurado,
principalmente, o princípio da igualdade material.
César Fiúza (2003) dissertando sobre a função social dos contratos
traçou a seguinte definição:

Contratos são instrumentos de movimentação da cadeia econômica, de


geração e de circulação de riquezas. É por seu intermédio que a economia
se movimenta. Eles geram empregos, criam oportunidades para a promoção
do ser humano. Nisto reside sua função social. É com base no princípio da
função social dos contratos que muitos problemas contratuais serão
solucionados.

Esse princípio pode ser encarado sob dois aspectos: individual, relativo
às partes contratantes, que devem valer-se do contrato para satisfazer seus
interesses individuais, e outro o aspecto público, que diz respeito à sociedade.
Nesse exame a função social só irá se concretizar quando a sua finalidade de
8
As Jornadas de Direito Civil, que o Conselho da Justiça Federal promove há alguns anos, constituem hoje um dos
mais importantes acontecimentos culturais que se realiza no país na área do direito privado”
21

distribuição de riquezas for alcançada de maneira justa, quando o contrato equilibrar


a sociedade.
O contrato é instrumento gerador de riqueza e gerador de patrimônio, por
ter a característica patrimonial só é admitido em regimes que permitem a
propriedade individual.
Emilio Betti afirma:

Naturalmente, la necessidad de negocios entre individuo e individuo sólo se


aprecia en aquelles ordenamientos económicosociales que reconecen a los
indivíduos uma esfera de bienes de su pertenencia, o sea: em ordenamientos
fundados em el reconocimento de la propriedad individual

A Respeito dos ordenamentos pioneiros nesse desígnio socializador, a


Constituição mexicana, de 1917, e a alemã de 1919 foram as primeiras a tratar da
função social da propriedade, limitando o direito de propriedade em face de
interesses valorados como preferenciais, que no caso se identificavam com os
interesses da coletividade. Após a difusão desses ideais muitos foram os Estados
que seguiram este modelo.
A Constituição Brasileira, seguindo o modelo das constituições sociais,
passou a prever também a limitação do exercício do direito à propriedade, onde se
colocou o bem estar social acima do bem estar individual:

CF/88 Art. 5º - XXIII - a propriedade atenderá a sua função social”


[...]
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano
e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna,
conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
III – função social da propriedade
[...]
VI – redução das desigualdades regionais e sociais

Nossa Norma Maior além de ter dedicado alguns artigos sobre a função
social da propriedade, definiu como um de seus fundamentos o valor social da livre
iniciativa e determinou (como objetivo fundamental) a construção de uma sociedade
livre, justa e solidária.
22

A legislação infraconstitucional pátria também acompanhou o espírito


social derivado de nossa Carta Magna. A lei de introdução ao código civil que regula
a vigência, a validade, a eficácia, a aplicação, a interpretação e a revogação de
normas no direito brasileiro, estabelece em seu artigo 5º, que, na aplicação da lei, o
juiz deverá atender aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem
comum. Ao invés de aferrar-se à letra fria do texto legal, o aplicador da lei deve fixar-
se claramente no objetivo da lei e da justiça: manter a paz social.
Compreende-se que os "fins sociais" a que alude o texto da LICC estão
estreitamente atrelados à busca de maior igualdade material entre os cidadãos e à
modificação do caráter do direito de propriedade e conseqüentemente do direito
contratual, que deixa de ser absoluto e incontestável para tornar-se um instrumento
de descentralização econômica e de bem-estar e igualdade social.
No diploma civil a função social dos contratos está positivada no art. 421
e no art. 2035, Parágrafo único:

Art. 421. A Liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da


função social do contrato.
[...]
Art. 2.035. [...]
Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos
de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código para
assegurar a função social da propriedade e dos contratos.

A Promoção e efetivação da já discutida função social dos contratos dar-


se-á então, pela Intervenção do Estado na órbita dos indivíduos (na relação
contratual, que antes vigorava livre), pelo intermédio do Juiz, que recebe a
incumbência de realizar a integração do contrato, visando sua máxima adequação à
ordem constitucional.
Sobre este assunto, cita a doutrina de Theodoro Júnior (2008, p. 6.) que:

É inegável, nos tempos atuais, que os contratos, de acordo com a visão


social do Estado Democrático de direito, hão de submeter-se ao
intervencionismo estatal manejado com o propósito de superar o
individualismo egoístico e buscar a implantação de uma sociedade
presidida pelo bem-estar e sob “efetiva prevalência da garantia jurídica dos
direitos humanos.

Gomes (1972) elenca em sua obra os principais fatores propulsores das


mudanças ocorridas na teoria geral dos contratos:
23

● Insatisfação de grandes estratos da população pelo desequilíbrio, entre


as partes, atribuído ao princípio da igualdade formal;
● A modificação na técnica de vinculação por meio de uma relação jurídica;
● A intromissão do Estado na vida econômica.

Essas mudanças só foram possíveis após a vitória liberal e a imperiosa


crítica ao estado absolutista; onde a idéia de intervenção do Estado na econômica
tornou-se totalmente inaceitável. Contudo, devido aos excessos cometidos pelas
estruturas liberais (exploração de mão de obra do proletariado, excessiva
concentração de renda, etc.), o princípio da liberdade contratual enfraqueceu,
cedendo espaço para a intervenção nas disposições privadas, passando, então, o
Ente Estatal a ter a incumbência de intervir na ordem econômica e na ordem
jurídica, sob o argumento de preservar o bem estar comum e a proteção integral dos
cidadãos, assumindo o aspecto de intervencionista não pela finalidade única de
regular uma política econômica, mas sim pela necessidade de estimular a proteção
aos menos favorecidos (hipossuficientes) e evitar maiores desastres sociais.
Nesse sentido manifesta Miguel Reale (1999, p. 7), ao aduzir que “se não
houve vitória do socialismo, houve o triunfo da ‘socialidade’, fazendo prevalecer os
valores coletivos sobre os individuais (...)”
Essas práticas de intervenção chamam-se de dirigismo estatal, e se
traduzem em duas práticas básicas: a primeira a imposição de cláusulas favoráveis
a uma das partes; a segunda, a possibilidade de efetuar a revisão dos contratos pelo
poder judiciário. Podendo este suprir a vontade das partes nos casos de lesão,
imprevisão ou onerosidade excessiva. Sendo, portanto, a finalidade de práticas
dirigistas equilibrar as partes, promovendo a distribuição da justiça, e a isonomia.
A partir de então o princípio da obrigatoriedade e intangibilidade, que
estabelecia que o contato não sofria alterações após sua conclusão, é alvo de
reinterpretação. Passando este a sofrer alterações quando certas situações
prejudiciais forem evidenciadas por uma das partes.
Outra conseqüência dessa nova perspectiva é a relativização do princípio
da autonomia da vontade.
24

Conforme salienta Gomes(1967, p. 36.): O princípio da autonomia da


vontade é o poder dos indivíduos de suscitar, mediante declaração de vontade, os
efeitos reconhecidos e tutelados pela ordem jurídica.
Tal princípio parte da premissa de que os sujeitos, em sua essência
abstrata (Estado de Natureza), são livres e iguais, nada os podendo vincular, salvo o
seu consentimento. Logo, a fonte única das normas jurídicas, por definição
obrigatórias, é o acordo de vontades.
A visão tradicionalista oferecia ao indivíduo legitimidade de estipular o
conteúdo e firmar o pacto com absoluta liberdade. Contudo esta liberdade não pode
mais ser concebida como era antes, pois os contratos não mais refletem a vontade
dos indivíduos. Nas palavras de Cláudia Lima Marques (1999, p. 37.):

A concepção de contrato, a idéia de relação contratual, sofreu, porém, nos


últimos tempos uma evolução sensível, em face da criação de um novo tipo
de sociedade, sociedade industrializada, de consumo, massificada,
sociedade de informação, e em face, também, da evolução natural do
pensamento teórico-jurídico.

Se esvaindo, deste modo, o papel da vontade como elemento central.


Logo, não é a simples autonomia da vontade que direciona a execução dos
contratos. A vontade não mais vigora de maneira ampla e irrestrita.
Não obstante a mitigação da autonomia da vontade, o Estado Social não
excluiu inteiramente o princípio da autonomia volitiva, em verdade, o que se fez foi
reduzir a importância deste que era considerado um verdadeiro dogma na teoria
clássica dos contratos. Pois a segurança jurídica é imprescindível, motivando o
crescimento econômico e conseqüentemente impulsionando a sociedade para o seu
desenvolvimento, neste sentido foi editado o enunciado 23 da CFJ:

Enunciado 23 - Art. 421: a função social do contrato, prevista no art. 421 do


novo Código Civil, não elimina o princípio da autonomia contratual, mas
atenua ou reduz o alcance desse princípio quando presentes interesses
metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa
humana.

Entendemos então que apesar do contrato ser dotado desta utilidade, não
pode este ser transformado em instrumento para a prática de atividades abusivas,
25

causando lesão à parte contrária ou a terceiros, como se estabelece no art. 187 do


CC:

Art. 187. também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou
social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Segundo Santos (2002, apud DELGADO, 2004, p. 9): não se justifica, com
a função social dos contratos, que o instituto contratual venha a ser distorcido,
proteja a má-fé e venha a gerar contratos desprovidos de vontade. Apesar de
estarmos diante de uma nova concepção não se pode admitir o desaparecimento
total da autonomia da vontade.
Por fim é importante ressaltar que o descumprimento dos mandamentos
contidos no art. 421 na lei civil podem acarretar a parte negligente obrigação de
reparar danos por desatendimento a tal preceito.

6 A TEORIA DA IMPREVISÃO

Procedendo segundo a tendência da relativação do “pacta sunt servanda”


(princípio da força obrigatória dos contratos) o CC/02 adotou em seu texto a cláusula
“rebus sic standibus” (teoria da imprevisão) aos contratos de execução diferida ou
continuada. Essa teoria determina que quando as circunstâncias que envolveram a
formação contratual não forem as mesmas no momento da execução da obrigação,
de modo a prejudicar uma parte em benefício da outra, há a necessidade de um
ajuste no contrato.
O Conselho da Justiça Federal, no decorrer de suas jornadas de direito civil,
elaborou alguns enunciados que versam sobre o assunto e procuram esclarecer
alguns conceitos e padronizar a interpretação destes. É o que se extrai da leitura
dos enunciados nº 17 e 175:

Enunciado nº 17: A interpretação da expressão "motivos imprevisíveis",


constante do art. 317 do novo Código Civil, deve abarcar tanto causas de
desproporção não previsíveis como também causas previsíveis, mas de
resultados imprevisíveis.
26

Enunciado nº 175 - A menção à imprevisibilidade e à extraordinariedade,


insertas no art. 478 do Código Civil, deve ser interpretada não somente em
relação ao fato que gere o desequilíbrio, mas também em relação às
conseqüências que ele produz.

Sobre a teoria da imprevisão Buzaid (p. 382) afirma:

O antagonismo entre a regra pacta sunt servanda e a cláusula rebus sic


stantibus traduz, em última análise, duas tendências: a primeira é uma
expressão marcante do liberalismo econômico e do otimismo burguês,
confiante na santidade do contrato; a segunda, a procura de um critério de
justiça contratual, quando um evento posterior à formação do negócio
jurídico alterou imprevistamente o estado de fato sobre o qual ele se
constituiu. p. 382

A Teoria da imprevisão permite então que uma das partes, obedecidas


certas circunstâncias, possa revisar o contrato, quando uma situação nova e
extraordinária surja na vigência do contrato, colocando esse referido contratante em
extrema dificuldade de realizar sua obrigação.
Entrando um pouca na história deste Instituto, remeto a um interessante
artigo de Donoso (2004):

Suas origens (tratando da teoria da imprevisão) remontam ao Código de


Hammurabi, em que se admitia a imprevisão nas colheitas. O Direito Romano
apenas a aplicou. Dormente por séculos, o princípio ressurge com a 1ª
Guerra (1914-1918) que gerou diversas instabilidades econômicas, tendo
surgido inclusive leis como a Failliot (França, 1918) que autorizou a resolução
dos contratos concluídos antes da guerra porque sua execução acabou se
tornando muito onerosa. No Brasil, a teoria da imprevisão foi aplicada pela
primeira vez apenas nos anos 30, pelo Ministro NELSON HUNGRIA.
A teoria tem larga aplicação em ordenamentos alienígenas, como se verifica
pelo art. 1.467 do CC italiano; art. 269 do Código das Obrigações polonês;
art. 1.198 do CC argentino, introduzida de forma minuciosa naquela lei por
proposta de ITURRASPE, já que representa novidade; art. 437 do CC de
Portugal, entre outros. No direito inglês, a teoria leva o nome de frustration, o
que revela o espírito do instituto também na commom law.

Para que a parte prejudicada possa suscitar ao Poder Judiciário revisão do


contrato, aplicando esta teoria, devem ser obedecidos alguns requisitos:

● Contrato deve ser sinalagmático, oneroso, comutativo e de execução


continuada ou diferida;
27

● Deve ter ocorrido algum acontecimento extraordinário, geral e


superveniente.
● O Acontecimento não poderia ter sido previsto na época da celebração
do contrato.
● O Acontecimento deve ter gerado uma desproporção entre as
prestações, de forma a causar um grande prejuízo a uma parte e grande benefício
(financeiro) a outra.
Assim, de acordo com grande parte da doutrina e caminhando pari passo
com a jurisprudência o Novo Código Civil previu expressamente a teoria da
imprevisão, como se verifica da leitura dos artigos 478 e 317:

Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação


de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema
vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos
da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.

Entendimento semelhante está expresso no art. 317 do CC:

Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção


manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua
execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que
assegure, quando possível, o valor real da prestação.

Além disso, não é apenas no artigo supracitado que se disciplina a matéria


em nosso ordenamento. Nas relações de consumo também é possível a aplicação
da Teoria da Imprevisão, com a consequente mudança de ajustes contratuais que
estabeleçam prestações desproporcionais, ou, sua revisão em motivo de
acontecimentos supervenientes que as tornem demasiadamente dispendiosas,
conforme preceitua o inciso V do artigo 6º da Lei 8.070/90:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:


[...]
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações
desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as
tornem excessivamente onerosas;

Sobre a função social dos contratos no CDC, Lobo (2002), anota:


28

No Código de Defesa do Consumidor os princípios estão referidos no art. 4º,


não especificamente dos contratos, mas do sistema das relações de
consumo. Existe certa imprecisão entre o que se denomina princípios e as
diretrizes gerais contidas no mencionado artigo. As expressões empregadas
no referido artigo podem ser agrupadas segundo a classificação dos
princípios sociais:
• Compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de
desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios
nos quais se funda a ordem econômica": esse trecho do inciso III do art. 4º,
implicitamente, conduz ao princípio da função social;
• transparência, "boa-fé", "informação": princípio da boa-fé;
• vulnerabilidade, "harmonização dos interesses", "equilíbrio nas relações:
princípio da equivalência material.

O Código de Defesa do Consumidor, no capítulo específico da proteção


contratual, especialmente no art. 51 menciona o princípio da boa-fé e expressões
enquadráveis no princípio da equivalência material, como "equidade", "equilíbrio
contratual", "justo equilíbrio entre direitos e obrigações das partes".”

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais
relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do
fornecedor por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou
impliquem renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo
entre o fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá
ser limitada, em situações justificáveis;
II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já
paga, nos casos previstos neste código;
III - transfiram responsabilidades a terceiros;
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que
coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
V - (Vetado);
VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do
consumidor;
VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem;
VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio
jurídico pelo consumidor;
IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato,
embora obrigando o consumidor;
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço
de maneira unilateral;
XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem
que igual direito seja conferido ao consumidor;
XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua
obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor;
XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo
ou a qualidade do contrato, após sua celebração;
XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais;
XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao
consumidor;

Constata-se, claramente, o cunho social da Lei 8.078/90 no momento em


que o consumidor brasileiro é "agasalhado" pelo Estado de ocasionais abusividades.
29

Procura-se, desse modo, restabelecer a igualdade substancial. Aliás, o Estado tem o


dever de proteger o consumidor e isto decorre de imperativo constitucional
Vale salientar que por muito tempo, alegou-se que em relações de
consumo não seria possível a aplicação concomitante do Código Civil. Isso, na
vigência do Código anterior, eminentemente individualista e muito distante da
proteção do “mais fraco” constante na Lei consumerista.
Entretanto, atualmente e ao contrário, tem-se defendido um "diálogo das
fontes" entre o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor. Por meio desse
diálogo, deve-se entender que os dois sistemas não se anulam, mas se integram.
Essa tese foi trazida para o Brasil por Cláudia Lima Marques ( 2002, p. 15-54) ,
utilizando dos ensinamentos do jurista alemão Erik Jayme. Isso se dá diante da
aproximação principiológica dos dois sistemas legislativos, principalmente no que
tange aos contratos. Por derradeiro, conclui-se que a partir da análise dos diplomas,
evidencia-se que o CDC é mais flexível (no que tangue a aceitabilidade da teoria da
imprevisão), principalmente por prever a maior vulnerabilidade de um dos pólos
(consumidor) em relação ao outro (fornecedor). Portanto, apesar de ressalvar
proteção a imprevisão no código civil. No código consumeirista, o legislador facilitou
um pouco mais desta teoria para o consumidor, abrindo a possibilidade de
modificação de cláusulas contratuais (ou sua revisão), sem a obrigatoriedade, por
exemplo, da demonstração da extraordinária vantagem para a outra parte, no caso,
o prestador ou fornecedor de serviços.
As principais ferramentas utilizadas para justificar pedidos de revisão
contratual fazem referência à teoria da imprevisão (já abordada nessa obra) e a
teoria da onerosidade excessiva, que iremos abordar nos parágrafos seguintes. A
carga de subjetividade na interpretação das situações motiva infindáveis discussões.
Não é necessário a demonstração de impossibilidade de cumprimento
das prestações a partir de fatos supervenientes, se imprevisíveis basta comprovar-
se a inviabilidade fática de adimplemento. Qualquer meio de prova hábil poderá
atestar a necessidade de não se manter a obrigação.
Não há critérios exatos para medir quando uma relação tornou-se
inviável, há a necessidade de se fazer uma criteriosa análise dos elementos
concretos. Para tal toma-se o equilíbrio original e choca-se com a desproporção
posterior.
30

Ressalta-se que para ocorrer a revisão não é obrigado existir vantagem


excessiva para a outra parte, apenas corroborando tal proveito para a revisão. Caso
apenas uma parte seja afetada, ter-se-á a possibilidade de pleitear a resolução do
liame. Logo, o que se procura é a comprovação do flagrante desequilíbrio entre a
situação inicial e a situação posterior. A respeito deste tema examine o enunciado do
CJF:

Enunciado nº 365 - "A extrema vantagem do art. 478 deve ser interpretada
como elemento acidental da alteração de circunstâncias, que comporta a
incidência da resolução ou revisão do negócio por onerosidade excessiva,
independentemente de sua demonstração plena".

Saliento, que nem toda alteração enseja uma modificação nas cláusulas
contratuais. Alguns acordos podem sofrer alterações no decorrer de sua execução
(naturalmente, pela sua essência), sem que isso importe em onerosidade excessiva,
tampouco imprevisibilidade. Além disso, se ao credor for mais benéfico continuar
com o vínculo, rateando o ônus, a legislação confere o direito de revisão visando
equilibrá-lo. É o que se extrai da leitura do artigo 479 do Código Civil: que estatui
que a resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente
as condições do contrato”.
Qualquer vantagem eventualmente percebida por uma das partes,
embora não pretendida originalmente, não confere direito à revisão pela outra parte.
É que tais circunstâncias são de difícil constatação e não afetam a condição das
prestações devidas pelo outro contraente. Porém, em alguns casos algumas
hipóteses de ocorrência incidental são previamente discutidas e regulamentadas no
contrato, de acordo com a natureza do negócio. Contudo, tais possibilidades de
ganho não geram onerosidade excessiva a nenhuma das partes, sendo apenas uma
vantagem indireta ao beneficiado.
Para a determinação de estado que enseje aplicação da teoria da
imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva não há objetivamente um critério
que determine o lapso temporal necessário para sua configuração. Na realidade a
preocupação maior se destina a conservar o equilíbrio econômico-financeiro das
partes, através da comparação da situação atual com a situação pretérita.
31

7 A LESÃO NO CÓDIGO CIVIL

O novo Código Civil reintroduziu no ordenamento o instituto da lesão como


modalidade de vício dos negócios jurídicos. Embora este instituto não estivesse
presente no antigo código civil já havia previsão da lesão no Código de defesa do
consumidor e na lei de crimes contra a economia popular (lei 1.521/51).
Este defeito representa também uma flagrante alteração nas normatizações das
relações privadas, prevalecendo o “bem comum” em detrimento do individualismo.
Topograficamente a lesão encontra-se no art. 157 CC/02:

Art. 157. Ocorre a lesão quando uma pessoa, sob premente necessidade,
ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente
desproporcional ao valor da prestação oposta.
§ 1o Aprecia-se a desproporção das prestações segundo os valores
vigentes ao tempo em que foi celebrado o negócio jurídico.
§ 2o Não se decretará a anulação do negócio, se for oferecido suplemento
suficiente, ou se a parte favorecida concordar com a redução do proveito.

Este instituto é justificado para proteger o contratante que se encontra em


relação de inferioridade no negócio contratual. Mesmo nos contratos paritários
(àqueles em que os contratantes discutem livremente suas cláusulas) pode
acontecer de um dos contratantes perder a noção do justo e do real e ser levado a
cometer atos que constituem verdadeiros absurdos do ponto de vista econômico.
Sabe-se que este instituto deriva do direito romano, através da obras de
Diocleciano e Maximiliano9, e posteriormente alcançou o direito francês.

9
Nestas foi criada a rescisão da venda de imóveis em favor do vendedor, através de Instituto conhecido como
laesio enormis (ou laesio ultra dimidiam). Bastava a desproporção das prestações e que esta fosse superior a
metade do preço justo.
32

8 ATÉCNIAS CONTIDAS NO ART. 421 DO CÓDIGO CIVIL

O primeiro desacerto encontrado no referido artigo é o fato de falar em


“liberdade de contratar” , quando o correto seria expressar o termo “liberdade
contratual”, pois liberdade de contratar refere-se a liberdade que as partes têm para
celebrar o contrato, ao passo, que liberdade contratual é aquela relacionada ao
conteúdo do negócio.
O segundo equívoco apontado pelos doutrinadores é o fato da função
social não ser a razão do contrato, mas sim seu limite.
Vale ressaltar que outro artigo de não menor importante para o
esclarecimento da função social contratual é o art. 2035, Parágrafo Único do CC/02:

Art. 2.035 Parágrafo único. Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar


preceitos de ordem pública, tais como os estabelecidos por este Código
para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.

Veja a seguir as interpretações que são extraídas da leitura desse artigo:

Prevê que a função social do contrato é preceito de ordem pública,


cabendo portanto proteção “ex-ofício” pela autoridade judiciária.
Compara e equipara a função social do contrato a função social da
propriedade que é princípio expresso constitucionalmente.
Traz o princípio da retroatividade motivada ou justificada, pelo qual
preceito de ordem pública pode retroagir.

9 O PROBLEMA DOS CONTRATOS DE ADESÃO

Reiteramos que na atualidade se tem noção diversa do fenômeno


contratual do que ocorria no século XIX. O Mito da igualdade formal, defendido pela
ideologia burguesa, que anunciava a possibilidade de garantir a manutenção do
equilíbrio entre as partes contratantes pela simples aceitação da paridade formal
entre os indivíduos (igualdade legal), já se mostra desacreditada na realidade fática.
O elemento central dos contratos é a vontade, o contrato só se aperfeiçoa
quando os indivíduos chegam a um consenso.
33

O problema dos contratos de adesão surge quando este elemento central


sofre limitação em virtude da evolução do capitalismo, quando as negociações
precisam ser cada vez mais céleres e quando os meios jurídicos então existentes
mostraram-se insuficientes para acompanhar o dinamismo comercial introduzido
pelo consumismo.
Martins (1958, p. 99), falando sobre os contratos de adesão assevera
que estes:

Cedo se desenvolveram em larga escala e hoje são grandemente usados


nos negócios comerciais. Significam uma restrição ao princípio da
autonomia da vontade, consagrado pelo Código Civil Francês, já que a
vontade de uma das partes não pode se manifestar-se livremente na
estruturação do contrato

Nos contratos de adesão apenas uma das partes (preponente) determina


de modo amplo e geral o conteúdo estabelecido nas condições contratuais.
Suprimindo-se a fase das negociações preliminares e gerando a impossibilidade de
qualquer transigência quanto ao conteúdo das estipulações. Do outro lado está o
aderente. Este apenas adere ao estabelecido pelo estipulante, e não possui voz e
nem possuía vez. Com o advento do Código de defesa do consumidor (lei 8078/90)
o contrato de adesão “aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela
autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de
produtos e serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar seu
conteúdo” (Art. 54) esta realidade, porém, está mudando, possibilitando-se a
revisão destes contratos.
O Código Civil dispõe sobre os contratos de adesão no art. 424:

Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a
renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do
negócio.

Esta relação anômala pode ser encarada sob dois ângulos:

● Quanto configura apenas a formação das cláusulas por uma só das


partes, é chamada de condições gerais dos contratos.
34

● Quando há efetiva adesão ao contrato, formando-se a relação jurídica


bilateral, temos o contrato de adesão, propriamente dito, passando assim, a
observar eficácia no mundo jurídico.

Em resumo, são estes os dois aspectos do mesmo fenômeno em


momentos diversos. No entanto as condições gerais dos contratos, enquanto não
ingressem no comércio jurídico, “não passam de simples Musterformulare10”, como
se refere Orlando Gomes(1990, p. 119) , usando expressão alemã. Ou seja, não tem
interesse jurídico, são meras formulações. Por seu turno o comportamento do
indivíduo que cria uma relação concreta só tem relevância jurídica quando implica
adesão às condições gerais do contrato preestabelecidas pela outra parte.
Através deste mecanismo, permite-se a atuação judicial revisando os
termos do ajuste, para compatibilizá-lo à realidade econômica ou a sua resolução,
com o retorno das partes ao estado anterior à contratação com a satisfação de todos
os efeitos patrimoniais compreendidos.

10 O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ NOS CONTRATOS

O Direito dos contratos é alvo, como já foi dito, de inúmeras


transformações. O novo código civil, inspirado no CDC, previu mecanismos de
atualização e adequação da norma ao caso concreto.

No artigo 113 do Novo Código Civil vimos que “os negócios jurídicos
devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar da sua celebração”.
Nesse dispositivo, a boa-fé é consagrada como meio auxiliador do aplicador da
norma quanto à interpretação dos negócios obrigacionais, particularmente dos
contratos.
A boa fé também está presente no art. 4, III, do CDC. Este artigo trata da
política nacional das relações de consumo:

[...]harmonização dos interesses dos participantes das relações de


consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a
necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a
viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da

10
Significa amostra de formulário
35

Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações


entre consumidores e fornecedores.

A expressão boa-fé, deriva da expressão latina boa fides. Fides significa


hábito de firmeza, compromisso daquele que honra com suas obrigações; significa
ter fidelidade, não apenas honrando o compromisso expresso mas permanecendo
reticente quanto aos compromissos de cooperação na relação contratual
(compromissos implícitos)
O contrato passa a ter uma visão de cooperação entre os contratantes,
onde ambos devem harmonizar seus objetivos em torno do objeto do negócio.
Sendo o cumprimento da obrigação um dever de satisfação do crédito do outro.
Sendo, pois, o contrato um instrumento dotado de valor ético.
Sob um aspecto amplo, a boa-fé pode ser considerada como algo que
deve estar presente em todas as relações jurídicas e sociais existentes. Este
princípio deve estar presente em vários aspectos da vida social. Boa fé significa
então franqueza, honestidade, conformidade entre o que se pensa, o que se diz, o
que se faz.
A boa-fé possui dois sentidos:
● Sentido objetivo: O princípio da boa-fé objetiva versa sobre um conjunto
de deveres exigidos nos negócios jurídicos, mais explicitamente, nos contratos,
destinado a pautar a conduta dos contratantes, num silogismo de honradez,
honestidade, probidade e boa-fé.
● Sentido subjetivo: considera-se a intenção do sujeito. Trata-se de um
estado de espírito, estado de consciência, como o conhecimento ou
desconhecimento de uma situação, fundamentalmente psicológica. E é exatamente
a intenção do sujeito da relação jurídica que o intérprete terá que levar em
consideração.
36

11 O CONTROLE DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS

A proteção do consumidor é tema bastante debatido e cresce a


importância ,na sociedade capitalista que vivemos, de meios de dirimir os constantes
abusos cometidos contra os consumidores.
Inicialmente devemos entender o que significa ser uma cláusula abusiva.
Clausulas abusivas são todas aquelas estipulações que demonstram
notável desfavorecimento ao consumidor, prejudicando assim o equilíbrio almejado
nas relações jurídicas. Presente em um contrato de fornecimento de produtos ou de
serviços, essa cláusula será considerada nula, conforme preceitua o “caput” do
artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, estando ainda esta, expressamente
exposta no inciso IV do supra citado artigo.
O artigo 51 do Código do consumidor elenca o rol de clausulas abusivas
(grifo nosso):

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais
relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor
por vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem
renúncia ou disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o
fornecedor e o consumidor pessoa jurídica, a indenização poderá ser
limitada, em situações justificáveis;
II - subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga, nos
casos previstos neste código;
III - transfiram responsabilidades a terceiros;
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que
coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam
incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
V - (Vetado);
VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor;
VII - determinem a utilização compulsória de arbitragem;
VIII - imponham representante para concluir ou realizar outro negócio
jurídico pelo consumidor;
IX - deixem ao fornecedor a opção de concluir ou não o contrato, embora
obrigando o consumidor;
X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de
maneira unilateral;
XI - autorizem o fornecedor a cancelar o contrato unilateralmente, sem que
igual direito seja conferido ao consumidor;
XII - obriguem o consumidor a ressarcir os custos de cobrança de sua
obrigação, sem que igual direito lhe seja conferido contra o fornecedor;
XIII - autorizem o fornecedor a modificar unilateralmente o conteúdo ou a
qualidade do contrato, após sua celebração;
XIV - infrinjam ou possibilitem a violação de normas ambientais;
XV - estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;
37

XVI - possibilitem a renúncia do direito de indenização por benfeitorias


necessárias.

No entanto, vale salientar que a nulidade da cláusula não abrangerá o


contrato em sua totalidade e será considerada nula tão somente a cláusula abusiva,
cabendo aqui a exceção nos casos da ausência desta acarretar danos mais
gravosos a uma das partes. Elas podem ser encontradas tantos nos contratos
paritários quanto nos de adesão, sendo mais comum neste último.
Após estas explanações iniciais vamos adentrar nas formas de controle
das clausulas abusivas. Existem varias formas de controle: preventivo, concreto,
interno, posterior, legislativo, administrativo, judicial e etc.
O controle preventivo visa impedir o cometimento do dano ao consumidor,
evitando a concretização da abusividade. Neste caso evidencia-se o controle
abstrato (ou antecipado).
Desta forma quando se constatar a existência de uma cláusula abusiva,
embora o contrato ainda nem tenha sido utilizado, poderá o Ministério Público ajuizar
a devida ação para que seja declarada a nulidade desta disposição. Conforme a
seguinte disposição do diploma consumeirista (grifo nosso):

Art. 51 [...]

§ 4° É facultado a qualquer consumidor ou entidade que o represente


requerer ao Ministério Público que ajuíze a competente ação para ser
declarada a nulidade de cláusula contratual que contrarie o disposto neste
código ou de qualquer forma não assegure o justo equilíbrio entre direitos e
obrigações das partes.

Destarte é um poder-dever do Parquet ajuizar ação visando inibir estas


clausulas descomedidas.
Observe também a redação dos seguintes artigos do supracitado código
(grifonosso):

Art. 81. A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas
poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título coletivo.
Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste
código, os transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares
pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
38

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste


código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo,
categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária
por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os
decorrentes de origem comum.
Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados
concorrentemente: (Redação dada pela Lei nº 9.008, de 21.3.1995)
I - o Ministério Público,
II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal;
III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta,
ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à
defesa dos interesses e direitos protegidos por este código;
IV - as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que
incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos
protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear.

Percebemos da leitura dos artigos que nesse caso, o poder-dever de


controle das cláusulas abusivas é atribuído ao Ministério Público, conforme os
artigos citados anteriormente, o que implica dizer que a defesa dos interesses dos
consumidores, nessa situação, será coletiva.
Ressalte-se que esse poder-dever, atribuído ao Ministério Público, deve
ser interpretado à luz do artigo 127 da Constituição Federal. Observe:

Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função


jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do
regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.

Portanto, isso nos permite alegar que os legitimados, no artigo 51, § 4º,
do Código de Defesa do Consumidor, não podem exercer o controle das cláusulas
abusivas em sua forma abstrata.
Nesse mesmo sentido, fica impossibilitado o MP de agir na existência de
lesão a consumidor individualizado, pois desse modo estaria fugindo de sua função
precípua que é a de zelar pelos interesses metaindividuais11.
O controle posterior ou repressivo ocorre após a adesão do consumidor
ao contrato e em tais casos o controle será efetivado pelas vias administrativas ou
judiciais. Sendo passível a aplicação das punições elencadas no art. 56 do CDC:
11
Nigro Mazzilli em sua obra A defesa dos interesses difusos em juízo: meio ambiente, consumidor, e
outros interesses difusos e coletivos.Pág. 93. defende que “O Ministério Público só pode promover a
defesa de interesses individuais homogêneos quando isso convenha à coletividade como um todo".
elencando duas situações permicivas para atuação do parque além das previstas na lei
consumeirista: primeiro, quando, embora individuais, se trate de interesses indisponíveis ou quando
haja tal abrangência de lesados que se torne francamente proveitosa para a sociedade a substituição
processual dos interessados pela Instituição.
39

Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas,


conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das
de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas:
I - multa;
II - apreensão do produto;
III - inutilização do produto;
IV - cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
V - proibição de fabricação do produto;
VI - suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;
VII - suspensão temporária de atividade;
VIII - revogação de concessão ou permissão de uso;
IX - cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
X - interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de
atividade;
XI - intervenção administrativa;
XII - imposição de contrapropaganda.
Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela
autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo ser
aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar, antecedente ou
incidente de procedimento administrativo

O controle interno é aquele realizado pelo próprio consumidor, como


dispõe o art. 46 do código do consumidor. Já o controle externo é aquele realizado
por intermédio de entes estatais e de entes particulares autorizados a atuar na
defesa de interesses alheios.
Legislativo é o controle cuja iniciativa pertence ao poder legislativo, que
estabelecerá o conteúdo do contrato.
Por fim vale ressaltar, a importância dos órgãos administrativos de
proteção ao consumo, das associações de consumidores, do CADE – Conselho
Administrativo de Defesa Econômica - e dos PROCONS, que bastante contribuem
com a sociedade, não apenas através do controle das cláusulas abusivas, atuando
como fiscalizadores, mas também através, da educação e orientação aos
consumidores.

12 CONCLUSÃO
40

Concluo, que através das diversas mudanças ocorridas ao longo tempo o


contrato sofreu inúmeros reflexos, todos visando o respeito e a dignidade da pessoa
humana que é alvo de uma sociedade exploradora e massificada, repleta de abusos
cometidos pelos fortes contra os fracos que são prejudicados constantemente pela
ausência de condições favoravoreis, em virtude de sua precariedade financeira.
Em decorrência da limitação imposta pelo Estado, os contratantes devem
obedecer às normas de ordem pública, que fixam os interesses da coletividade e as
bases jurídicas fundamentais da ordem econômica e moral da sociedade e os bons
costumes relativos a moralidade social, deixando para trás o individualismo.
Cabe então ao magistrado intervir tomando medidas no sentido de equilibrar as
partes, podendo proclamar a inexistência ou nulidade do contrato, convalidar
contrato anulável, reduzir a prestação de uma das partes quando entender ser esta
exacerbada ou determinar a resolução do contrato.

13 Referências Bibliográficas
41

COUTO E SILVA, Clóvis Veríssimo do. A obrigação como processo. São Paulo:
Editora Bushatsky, 1976, p.18

DELGADO, José Augusto. O Contrato no código civil e a sua função social. Revista
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GOMES, Orlando. Contrato de Adesão: condições gerais dos contratos. São Paulo:
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LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípios sociais dos contratos no CDC e no novo Código
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<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2796>. Acesso em: 10 abr. 2009.

LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi,


Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=07>. Acesso em: 26 nov. 2008

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MELO, Lucinete Cardoso de. O princípio da boa-fé objetiva no Código Civil . Jus
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PASSOS, Anderson Santos dos. Problema e teoria dos contratos de adesão. Jus
Navigandi, Teresina, ano 7, n. 65, maio 2003. Disponível em:
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SILVA, Vitor Borges da. A função social dos contratos e a intervenção do


Estado nas relações jurídicas privadas. Panóptica, Vitória, ano 1, n. 7, mar. –
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42

TALAVERA, G. M. (2002). A Função Social do Contrato no novo código civil. Revista


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TARTUCE, Flávio. A função social dos contratos, a boa-fé objetiva e as recentes


súmulas do Superior Tribunal de Justiça . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1049,
16 maio 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=838>.
Acesso em: 26 nov. 2008 .

THEODORO JÚNIOR, Humberto. O contrato e sua função social. Rio de Janeiro:


Forense, 2004.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral
dos Contratos.

WALD, Arnold. O contrato: Passado, Presente e Futuro. Revista Cidadania e Justiça:


1º semestre de 2000. RJ.
REALE, Miguel - Teoria Tridimensional do Direito. 5.ªed., São Paulo, 1994

REVOREDO, Alda Regina. A Função Social do Contrato e as cláusulas abusivas.


Mestrado FADISP, São Paulo, 2007

Reale, Miguel - Teoria Tridimensional do Direito, 5.ªed., São Paulo, 1994

REALE, Miguel. Novo Código Civil: Exposição de Motivos. Brasília: Senado Federal,
Subsecretaria de Edições Técnicas, 2002, p. 26.
43

14 ANEXO - JURISPRUDÊNCIA

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

RECURSO ESPECIAL Nº 691.738 - SC (2004/0133627-7)


RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ADMINISTRAÇÃO, CONSTRUÇÃO E INCORPORAÇÕES DE
IMÓVEIS LTDA - SANT'ANA
ADVOGADO : EVERALDO LUÍS RESTANHO E OUTRO
RECORRIDO : BESC S/A CRÉDITO IMOBILIÁRIO
ADVOGADO : IVO MULLER

EMENTA

RECURSO ESPECIAL.. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPUGNAÇÃO


EXCLUSIVAMENTE AOS DISPOSITIVOS DE DIREITO MATERIAL.
POSSIBILIDADE. FRACIONAMENTO DE HIPOTECA. ART. 1488 DO
CC/02. APLICABILIDADE AOS CONTRATOS EM CURSO.
INTELIGÊNCIA DO ART. 2035 DO CC/02. APLICAÇÃO DO PRINCIPIO
DA FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS.

Se não há ofensa direta à legislação processual na decisão do Tribunal que revoga


tutela antecipadamente concedida pelo Juízo de Primeiro Grau, é possível a
interposição de Recurso Especial mencionando exclusivamente a violação dos
dispositivos de direito material que deram fundamento à decisão.. - O art. 1488 do
CC/02, que regula a possibilidade de fracionamento de hipoteca, consubstancia uma
das hipóteses de materialização do princípio da função social dos contratos,
aplicando-se, portanto, imediatamente às relações jurídicas em curso, nos termos do
art. 2035 do CC/02. - Não cabe aplicar a multa do art. 538, § único, do CPC, nas
hipóteses em que há omissão no acórdão recorrido, ainda que tal omissão não
implique a nulidade do aresto.

Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.


44

ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA
TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por maioria, conhecer em parte do recurso
especial e, nessa parte, dar-lhe provimento. Votou vencido o Sr. Ministro Carlos
Alberto Menezes Direito. Os Srs. Ministros Castro Filho e Humberto Gomes de
Barros votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr.
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Sustentou oralmente o Dr. Túlio Kavalazi Filho,
pelo recorrente.

Brasília (DF), 12 de maio de 2005(data do julgamento).


MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Presidente e Relatora
Documento: 1838396 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 26/09/2005
Página 1 de 1

RECURSO ESPECIAL Nº 803.481 - GO (2005/0205857-0)


RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : CARGILL AGRÍCOLA S/A
ADVOGADO : ADILIO EVANGELISTA CARNEIRO E OUTRO
RECORRIDO : LUIZ FERREIRA LIMA
ADVOGADO : RENATO MENDONÇA SANTOS

EMENTA

DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A


PREÇO CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO.
CIRCUNSTÂNCIA PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA.
INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO
CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E PROBIDADE. INEXISTÊNCIA.
45

- A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato


que alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível. - Na hipótese afigura-se
impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive porque a alta do dólar em
virtude das eleições presidenciais e da iminência de guerra no Oriente Médio –
motivos alegados pelo recorrido para sustentar a ocorrência de acontecimento
extraordinário – porque são circunstâncias previsíveis, que podem ser levadas em
consideração quando se contrata a venda para entrega futura com preço certo.- O
fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da
majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não
indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função social do
contrato. - A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel
primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita futura,
é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos em que
poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato, como aqueles
derivados das condições da lavoura. - A boa-fé objetiva se apresenta como uma
exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe
o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo
como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal. Não tendo o comprador agido de
forma contrária a tais princípios, não há como inquinar seu comportamento de
violador da boa-fé objetiva.

Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA


TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial
e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros
Castro Filho, Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes
Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Documento: 3139936 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 01/08/2007


46

Brasília (DF), 28 de junho de 2007 (data do julgamento).


MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

RECURSO ESPECIAL Nº 783.404 - GO (2005/0158134-4)


RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : CARGILL AGRÍCOLA S/A
ADVOGADO : ADILIO EVANGELISTA CARNEIRO E OUTRO(S)
RECORRIDO : RICARDO ALVES RESENDE
ADVOGADO : HENRIQUE ALVES DE ARAÚJO E OUTRO

EMENTA

DIREITO CIVIL E AGRÁRIO. COMPRA E VENDA DE SAFRA FUTURA A


PREÇO CERTO. ALTERAÇÃO DO VALOR DO PRODUTO NO MERCADO.
CIRCUNSTÂNCIA PREVISÍVEL. ONEROSIDADE EXCESSIVA.
INEXISTÊNCIA. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO
CONTRATO, BOA-FÉ OBJETIVA E PROBIDADE. INEXISTÊNCIA.
CLÁUSULAS ACESSÓRIAS ABUSIVAS. IRRELEVÂNCIA.

- A compra e venda de safra futura, a preço certo, obriga as partes se o fato que
alterou o valor do produto agrícola não era imprevisível. - Na hipótese afigura-se
impossível admitir onerosidade excessiva, inclusive porque chuvas e pragas –
motivos alegados pelo recorrido para sustentar a ocorrência de acontecimento
extraordinário – são circunstâncias previsíveis na agricultura, que o produtor deve
levar em consideração quando contrata a venda para entrega futura com preço
certo.- O fato do comprador obter maior margem de lucro na revenda, decorrente da
majoração do preço do produto no mercado após a celebração do negócio, não
indica a existência de má-fé, improbidade ou tentativa de desvio da função social do
contrato. - A função social infligida ao contrato não pode desconsiderar seu papel
primário e natural, que é o econômico. Ao assegurar a venda de sua colheita futura,
é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os custos em que
poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do contrato, como aqueles
derivados das condições da lavoura. - A boa-fé objetiva se apresenta como uma
47

exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe
o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse modelo, agindo
como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal. Não tendo o comprador agido de
forma contrária a tais princípios, não há como inquinar seu comportamento de
violador da boa-fé objetiva. - Nos termos do art. 184, segunda parte, do CC/02, “a
invalidade da obrigação principal implica a das obrigações acessórias, mas a destas
não induz a da obrigação principal”. Portanto, eventual abusividade de determinadas
cláusulas acessórias do contrato não tem relevância para o deslinde desta ação.
Ainda que, em tese, transgridam os princípios da boa-fé objetiva, da probidade e da
função social do contrato ou imponham ônus excessivo ao recorrido, tais abusos não
teriam o condão de contaminar de maneira irremediável o contrato, de sorte a
resolvê-lo.

Recurso especial conhecido e provido.


Documento: 3139396 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJ: 13/08/2007
Página 1 de 2

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA


TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial
e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros
Castro Filho, Humberto Gomes de Barros, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes
Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 28 de junho de 2007 (data do julgamento).


MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

EDcl no RECURSO ESPECIAL Nº 951.553 - RJ (2007/0090881-0)


RELATOR : MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA
EMBARGANTE : EDENEA WAGNER AGUIEIRAS
ADVOGADO : DENIELLE CORRÊA MARIANO DE CAMPOS
48

EMBARGADO : GEORGINA VIEIRA NICOLAU


ADVOGADO : JOSÉ WANDER GOMES E OUTRO

EMENTA
DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS
DECLARATÓRIOS NO RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO,
OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO. INEXISTÊNCIA. LOCAÇÃO.
PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA. FIANÇA. VALIDADE.
CLÁUSULA PREVENDO A RESPONSABILIDADE DO FIADOR
ATÉ A EFETIVA ENTREGA DAS CHAVES DO IMÓVEL.
EXISTÊNCIA. EMBARGOS REJEITADOS.

O princípio do pacta sunt servanda , embora temperado pela necessidade de


observância da função social do contrato, da probidade e da boa-fé, em seu prisma
objetivo, ainda continua plenamente válido em nosso ordenamento jurídico. Assim,
têm os contratantes plena liberdade de pactuar normas a gerarem efeitos entre si,
desde que estas não venham a ofender interesses sociais previstos na Constituição.
O fato de o contrato de locação ter sido celebrado sob a vigência da Lei 6.649/79,
por si só, não afasta a responsabilidade da fiadora pelos débitos locatícios
posteriores ao vencimento do contrato de locação, tendo em vista a existência de
cláusula expressa em que concordou em garantir a locação até a efetiva entrega das
chaves do imóvel locado. Precedente da Terceira Seção.
Embargos de declaração rejeitados.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,


acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, rejeitar os embargos. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho,
Jorge Mussi, Felix Fischer e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 26 de agosto de 2008(data do julgamento)


49

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA


Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.034.702 - ES (2008/0043541-5)


RELATOR : MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
RECORRENTE : GRANLIMA INDUSTRIA E COMERCIO DE GRANITOS LTDA ME
- MICROEMPRESA
ADVOGADO : MILTRO JOSÉ DALCAMIN E OUTRO(S)
RECORRIDO : AGEO LTDA.
ADVOGADO : JOSÉ FRANCISCO CUNHA FERRAZ FILHO E OUTRO(S)
RECURSO ESPECIAL Nº 1 . 0 3 4 . 7 0 2 - ES ( 2 0 0 8 / 0 0 4 3 5 4 1 - 5 )

EMENTA

CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ONEROSIDADE


EXCESSIVA. CLÁUSULAS ABUSIVAS. ILEGALIDADE DA
CLÁUSULA
PENAL. SÚMULAS NS. 5 E 7 DO STJ. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS.
INDENIZAÇÃO E MULTA DA CLÁUSULA PENAL. SÚMULA N. 211
DO STJ.
VIOLAÇÃO DO ART. 410 DO CC NÃO CARACTERIZADA. SÚMULA
N. 284
DO STF. REDUÇÃO DO QUANTUM DA MULTA COMPENSATÓRIA.
SÚMULA N. 7 DO STJ. ART. 460 DO CC. SÚMULA N. 211 DO STJ.

1. Os requisitos para caracterização da onerosidade excessiva são: o contrato de


execução continuada ou diferida, vantagem extrema de outra parte e acontecimento
extraordinário e imprevisível, cabendo ao juiz, nas instâncias ordinárias, e diante do
caso concreto, a averiguação da existência de prejuízo que exceda a álea normal do
contrato, com a conseqüente resolução do contrato diante do reconhecimento de
cláusulas abusivas e excessivamente onerosas para a prestação do devedor. O
reexame dessa matéria na instância especial enseja a aplicação das Súmulas ns. 5
e 7 do STJ.
50

2. Inviabiliza-se o conhecimento de recurso especial fundado na aferição da


legalidade de cláusula penal, quando o reconhecimento da quebra da exclusividade
pela Corte a quo, que gerou a multa contratual considerada ilegal pelo recorrente, foi
firmado com base no conjunto fático-probatório dos autos. Incidência das Súmulas
ns. 5 e 7 do STJ.
3. A ausência de prequestionamento de tese acerca da cumulação de pedidos de
indenização e multa relativa à cláusula penal impede o conhecimento do apelo
especial, a teor da Súmula n. 211 do STJ.
4. Em sede de recurso especial, é inadmissível a revisão do quantum fixado a título
de multa compensatória, tendo em vista o disposto na Súmula n. 7 do STJ, na
medida em que cabe ao magistrado das instâncias ordinárias, atento às
circunstâncias do caso em apreço e à realidade dos fatos, a redução proporcional ao
valor do pagamento já realizado, a fim de evitar o enriquecimento sem causa do
devedor.
5. Recurso especial não-conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,


acordam os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, não conhecer do recurso especial nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior votaram
com o Sr. Ministro Relator.
Sustentou oralmente Dr. JOSÉ FRANCISCO CUNHA FERRAZ FILHO, pela parte
RECORRIDA: AGEO LTDA.
Documento: 3905111 - EMENTA / ACORDÃO - Site certificado - DJe: 19/05/2008
Página 1 de 2
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Fernando Gonçalves.
Brasília, 15 de abril de 2008 (data do julgamento).
MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
Relator
51

TRIBUNAIS ESTADUAIS

TJ/MS

Processo nº 2006.013731-2/0001.00
Julgamento: 24/07/07
Órgão: 4º Turma CIVIL
Classe: Agr. Regimental em Apelação Civil
Rito: Ordinário
Quarta Turma Cível

Relator - Exmo. Sr. Des. Paschoal Carmello Leandro.


Agravante - Unimed - Campo Grande/MS - Cooperativa de Trabalho Médico
Ltda.
Advogados - Paula Coelho Barbosa Tenuta e outro.
Agravada - Romilda Aparecida Miotto Fernandes.
Def. Públ. 1ª Inst. - Guilherme Cambraia de Oliveira.

E M E N T A – AGRAVO REGIMENTAL EM APELAÇÃO


CÍVEL – DECISÃO MONOCRÁTICA DENEGATÓRIA DE SEGUIMENTO –
RECURSO MANIFESTAMENTE IMPROCEDENTE – AÇÃO DE
OBRIGAÇÃO DE FAZER – PLANO DE SAÚDE – CLÁUSULA ABUSIVA –
RELATIVIZAÇÃO DO PACTA SUNT SERVANDA – ART. 51, CDC –
APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ OBJETIVA E DA FUNCAO
SOCIAL DOS CONTRATOS – RECURSO IMPROVIDO.
Mantém-se a decisão denegatória de seguimento a recurso de
apelação, quando esta encontra-se estritamente fundamentada em
entendimento pacífico e dominante do respectivo Tribunal e da Corte
Superior.
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, bem como dos
princípios da boa-fé objetiva e da função social dos contratos, o princípio do
pacta sunt servanda deve ser relativizado para declarar nulas as cláusulas
abusivas previstas nos contratos de adesão.
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É vedada a interpretação extensiva de cláusula contratual limitativa


de direitos, prevista em contratos de adesão de plano de saúde.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da


Quarta Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e
das notas taquigráficas, negar provimento ao agravo regimental. Unânime.

Campo Grande, 24 de julho de 2007.

Des. Paschoal Carmello Leandro – Relator

RELATÓRIO

O Sr. Des. Paschoal Carmello Leandro


Unimed Campo Grande – Cooperativa de Trabalho Médico Ltda. –, inconformada
com a decisão (f. 155-158) que negou seguimento ao recurso de apelação cível por
ela interposto em face de Romilda Aparecida Miotto Fernandes, agrava
regimentalmente a este Tribunal.
Em suas razões recursais (f. 160-163), a agravante alega, em apertada síntese, que
discorda da decisão, uma vez que a demanda em questão não versa unicamente a
respeito da necessidade de atendimento médico hospitalar ao qual a recorrida foi
submetida, mas, sobretudo, à existência de dever jurídico oponível contra a
recorrente, para que se procedesse ao custeio daquele stent farmacológico não
previsto contratualmente, por ser importado, o qual foi pago pela própria recorrida
por mera liberalidade.
Afirma que o próprio CDC, em seu art. 22, preserva a continuidade da prestação dos
serviços, mediante o pagamento do preço justo, previamente ajustado no contrato.
Sustenta, ainda, que no caso em exame é impossível o atendimento pleiteado pela
recorrida porque não há previsão contratual para o custeio de materiais importados,
conforme cláusula expressa no contrato celebrado entre as partes litigantes.
Ao final, requer provimento ao regimental, pugnando pela reconsideração ou
remessa para o Colegiado.
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Campo Grande, 30 de maio de 2006.

Des. Horácio Vanderlei Nascimento Pithan – Relator

RELATÓRIO
O Sr. Des. Horácio Vanderlei Nascimento Pithan
Trata-se de apelação cível interposta por Lauro Veloso Malaquias, Marisa Silveira
Malaquias, Daltro Fiúza e Rosi Mari dos Santos Fiuza, contra a parte dispositiva da
sentença que julgou procedente os pedidos na ação ordinária ex empto, intentada
pelos dois primeiros recorrentes, condenando os réus ao pagamento da diferença
constatada na área adquirida, concernente a 60,2327 ha nos termos do contrato de
compra e venda do imóvel rural e julgou parcialmente procedente a reconvenção
para o fim de declarar rescindida a letra 'e' da cláusula 2ª do aludido contrato de
compra e venda de imóvel rural.
Os apelantes, Lauro Veloso Malaquias e Marisa Silveira Malaquias, alegam:
1- que o magistrado procedeu com desnecessário e ilegal açodamento ao julgar
antecipadamente a lide principal, ferindo os princípios constitucionais do
contraditório e da ampla defesa;
2- que os apelados carecem de interesse de agir na reconvenção, já que os próprios
apelantes, desde a inicial da ação principal admitem dever aos apelados os valores
do apartamento do edifício Mont Serrat, de 75 vacas e de suas rendas, sendo
inclusive, objeto do pedido na letra 'd' do pedido inicial;
3- que a área faltante é muito superior à definida na sentença e que o limite é a base
da serra;
4- que o perito judicial nunca foi ao local da perícia judicial e que a referida área é
inapta para a exploração de pecuária ou agricultura e pertence a terceiros ou é
devoluta.
Postulam, ao final, em pedidos alternativos:
1- seja decretada a nulidade da sentença, retornando o processo a origem para que
se conclua a produção das provas requeridas fundamentadamente e que seja
proferida uma nova sentença;
2- ou, que seja indeferida a petição inicial da reconvenção, por carecerem os
apelados de interesse processual;
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3- ou ainda, que seja reformada parcialmente a sentença para que sejam


respeitados os limites do título original, conforme os levantamentos procedidos pelo
Idaterra.
Em contra-razões, os apelados postulam pela manutenção da sentença.
Os recorrentes Dautro Fiúza e Rosi Mari dos Santos Fiuza, réus no feito principal,
interpuseram recurso de apelação alegando:
1- que a sentença merece ser reformada na parte em que deixa de anular a cláusula
contratual de número 3.1., haja vista que referida disposição viola a função social do
contrato, gerando o enriquecimento sem causa dos apelados;
2- que o magistrado não considerou o mandamento contido no artigo 1.136 do
Código Civil de 1916, já que determinou a indenização pela área faltante conforme
previsto no contrato e não como a lei determina, e, ainda, condenou os apelantes a
indenizar os apelados em valor muito superior que o previsto para o abatimento
proporcional no preço do negócio.
Pedem alternativamente:
I- seja dado provimento ao recurso para reformar parte da sentença, anulando-se a
cláusula 3.1 do contrato,
II- ou, que seja aplicada cláusula 3.1 para a apuração do valor devido aos apelantes,
levando-se em consideração a área de 203.53 hectares da qual não houve
adimplemento, acrescida de juros anuais de 25% (vinte e cinco) por cento.
Os apelados em contra-razões batem-se pelo improvimento do recurso.
(...)

Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:


POR UNANIMIDADE, REJEITARAM AS PRELIMINARES E NO MÉRITO, POR
MAIORIA, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DOS APELANTES LAURO
VELOSO MALAQUIAS E SUA MULHER, VENCIDO O VOGAL. EM DECISÃO
UNÂNIME, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO POR DALTRO
FIÚZA E ROSI MARI DOS S. FIUZA.
Presidência da Exma. Sra. Desª. Tânia Garcia de Freitas Borges.
Relator, o Exmo. Sr. Des. Horácio Vanderlei Nascimento Pithan.
Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Horácio Vanderlei
Nascimento Pithan, Tânia Garcia de Freitas Borges e Luiz Carlos Santini.
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Campo Grande, 30 de maio de 2006.

TJ/CE

2008.0006.4412-5/1 APELAÇÃO CÍVEL

Relator: DES. LINCOLN TAVARES DANTAS


Orgão Julgador : 4ª CÂMARA CÍVEL
APELANTE : BANCO ITAU S/A

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO.


RECONVENÇÃO. REVISÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO
GARANTIDO COM CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.
INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

Sendo o crédito fornecido ao consumidor pessoa física para a sua utilização na


aquisição de bens no mercado como destinatário final, o dinheiro funciona como
produto, implicando o reconhecimento da instituição bancária/financeira como
fornecedora para fins de aplicação do CDC, nos termos do art. 3º, parágrafo 2º, da
Lei nº 8.078/90. Entendimento referendado pela Súmula 297 do STJ, de 12 de maio
de 2004. DIREITO DO CONSUMIDOR À REVISÃO CONTRATUAL. O art. 6º, inciso
V, da Lei nº 8.078/90 consagrou de forma pioneira o princípio da função social dos
contratos, relativizando o rigor do "Pacta Sunt Servanda" e permitindo ao
consumidor a revisão do contrato em duas hipóteses: por abuso contemporâneo à
contratação ou por onerosidade excessiva derivada de fato superveniente (Teoria da
Imprevisão). Hipótese dos autos em que o desequilíbrio contratual já existia à época
da contratação uma vez que o fornecedor inseriu unilateralmente nas cláusulas
gerais do contrato de adesão obrigações claramente excessivas, a serem
suportadas exclusivamente pelo consumidor. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA
NULIDADE DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS. O art. 168, parágrafo único, do novo
Código Civil (mera repetição do art. 145, parágrafo único da codificação revogada),
permite ao Juiz declarar de ofício a nulidade de negócio jurídico que lhe tenha sido
submetido a exame. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. Ausente qualquer
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justificativa por parte do fornecedor para a imposição ao consumidor de taxa de juros


excessiva como obrigação acessória em contrato de consumo, o restabelecimento
do equilíbrio das obrigações exige a redução da taxa de juros remuneratórios fixada
em contrato de adesão. Juros reduzidos para 12% (doze por cento) ao ano, com
fundamento exclusivamente no disposto no art. 52, inciso II c/c os arts. 39, inciso V e
51, inciso IV, todos da Lei nº 8.078/90. Desnecessário examinar argumentos
constitucionais sobre o tema. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. No caso concreto trata-
se de contrato de financiamento firmado já na vigência do Novo Código Civil. Assim,
havendo autorização expressa em lei, a incidência da capitalização dos juros
remuneratórios contratados não vai afastada, sendo, entretanto, permitida apenas
em periodicidade anual. TERMO INICIAL DA MORA. Estando "sub judice" a liquidez
e, em via de conseqüência, a própria exigibilidade do crédito oriundo do contrato
revisando, é de ser afastada com efeitos "ex tunc" a mora decorrente do
inadimplemento de obrigações declaradas abusivas até que se apure o valor real do
eventual débito ainda existente. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Obrigação
acessória que vai afastada, na esteira de jurisprudência consolidada. A correção
monetária é suficiente, e mais confiável, para servir como fator de recomposição da
perda do valor real da moeda, corroída pela inflação. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.
Mantido o IGP-M/FGV como índice de correção monetária, eis que a jurisprudência
indica ser o que melhor reflete a real perda inflacionária. JUROS MORATÓRIOS.
Mantidos em 1% (um por cento) ao mês. MULTA MORATÓRIA. Mantida em 2% (dois
por cento), porém, sobre o valor da parcela em atraso, nos termos do art. 52,
parágrafo 1º, da Lei nº 8.078/90. Disposição de ofício. COBRANÇA DE TARIFA
E/OU TAXA NA CONCESSÃO DO FINANCIAMENTO. ABUSIVIDADE. Encargo
contratual abusivo, porque evidencia vantagem exagerada da instituição financeira,
visando acobertar as despesas de financiamento inerentes à operação de outorga
de crédito. Inteligência do art. 51, IV do CDC. Disposição de ofício. IOF.
ABUSIVIDADE QUANTO À FORMA DE COBRANÇA. A cobrança do tributo diluído
nas prestações do financiamento se afigura como condição iníqua e desvantajosa ao
consumidor (CDC, art. 51, IV). Disposição de ofício. DIREITO À COMPENSAÇÃO
DE CRÉDITOS E À REPETIÇÃO DE INDÉBITO. Sendo apurado a

RELATÓRIO
57

Cuidam-se de Apelações Cíveis em Ação Revisional de Cláusulas


Contratuais, esta aforada por ANTONIETA SILVA CAMPOS contra o BANCO ITAÚ
S/A; e em ação de Busca e Apreensão interposta pelo mesmo BANCO ITAÚ S/A,
contra ANTONIETA SILVA CAMPOS.

O douto juízo de origem julgou pela procedência parcial da revisional,


determinando o recálculo do débito, a contar da data da celebração do contrato
firmado entre as partes, de modo a aplicar o CDC, possibilitando a revisão do
mesmo, vedando a capitalização de juros em qualquer periodicidade, manter a
comissão de permanência conforme taxa de mercado, proibindo sua cumulação com
juros moratórios, aplicar a taxa de juros pactuada, mas de forma simples, limitar os
juros de mora a 1% ao ano, afastar a exigibilidade dos encargos moratórios, em
razão da descaracterização da mora debendi, estabelecer que a multa pactuada de
2% só pode incidir sobre as parcelas em atraso, possibilitando a compensação dos
valores, de forma simples.

Em relação à busca e apreensão, o julgador monocrático decretou sua


extinção, com base no art. 267, VI, CPC, por considerar que a existência de
cláusulas abusivas descaracterizam a mora.

Nas razões recursais concernentes à revisional, defende o banco


recorrente, em síntese, a legalidade dos termos livremente pactuados, devendo
prevalecer o princípio da pacta sunt servanda, defendendo incabível a sua revisão.
A título de prequestionamento, defende que o julgador de origem
contrariou o princípio da pacta sunt servada; contrariou o disposto no art. 46 e 6º,
inciso V, do CDC, pois admitiu a alteração das cláusulas contratuais que eram de
conhecimento prévio do apelado, redigidos de forma clara e precisa; contrariou,
também, o art. 126, CPC, ao não aplicar o art. 5º, da Medida Provisória nº 2.170-36,
a Lei nº 4.595/97 e demais normas pertinentes; contrariou o disposto na Medida
Provisória nº 1.963-17, que autoriza definir a taxa de juros mediante capitalização
mensal, pugnando pela apreciação desses pontos pelo colegiado.
Contra-razões às fls. 99/102, reiterando a existência de cláusulas
abusivas no contrato firmado, contrárias às normas de regência, passíveis de
revisão, nos termos do art. 421, CCB, defendendo a manutenção da peça de desate.
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Em relação ao apelo interposto na busca e apreensão, o banco recorrente


prequestiona a aplicação do art. 267, VI, CPC, em confronto com o Decreto-Lei
911/69, defendendo que o julgador dera entendimento diverso ao dispositivo legal
deixando de aplicar a lei no caso, tanto que a sentença foi baseada no dispositivo
citado, sem, contudo, aplicar a íntegra do dispositivo.
Defendendo presente os pressupostos legais concernentes, pede pelo
provimento do apelo, com a reforma sentença extintiva.

Não havendo contraditório, foi determinada a imediata subida dos autos à


instância superior.

Esses os relatos.
Sigam à análise do douto Revisor.

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