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Comentários adicionais ......................................................................................

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ECONOMIA E FINANÇAS CAPÍTULO 2
NOTAS DE AULAS DO PROFESSOR
NOÇÕES DE MICROECONOMIA
RAYMUNDO JOSÉ SANTOS GARRIDO
Objeto do estudo da microeconomia ................................................................ 33
ÍNDICE Oferta, procura e estática comparativa ............................................................. 33
Interferências governamentais na economia .................................................... 36
Tributos .............................................................................................................. 36
CAPÍTULO 1 Subsídios ............................................................................................................ 38
INTRODUÇÃO Política de preço máximo .................................................................................. 41
Por que convém ao (à) estudante de engenharia estudar Política de preço mínimo ................................................................................... 42
economia e finanças ......................................................................................... 04 Outros tipos de interferência do governo no equilíbrio de mercado ................ 44
Os agentes econômicos ..................................................................................... 05 Teoria da Firma .................................................................................................. 44
Necessidades humanas ......................................................................................06 Produção e custos .............................................................................................. 44
Bens e serviços ...................................................................................................07 Produto total de um fator variável .................................................................... 45
Objeto do estudo da economia ......................................................................... 08 Produto médio de um fator variável ................................................................. 46
Fatores de produção .......................................................................................... 09 Produto marginal de um fator variável .............................................................. 46
Escassez e fronteira de possibilidades de produção .......................................... 11 Síntese da análise no curto prazo ...................................................................... 46
Consumo suntuário ............................................................................................13 Síntese da análise no longo prazo: conceito de isoquantas .............................. 48
Questões econômicas fundamentais e sistemas econômicos ........................... 14 Restrição orçamentária e a otimização do processo produtivo
O quê produzir ................................................................................................... 15 no longo prazo .................................................................................................. 49
Como produzir ................................................................................................... 15 Funções de custo ............................................................................................... 52
Como distribuir a riqueza produzida ................................................................. 16 Custo total ......................................................................................................... 52
Breves notas sobre as teorias do valor .............................................................. 17 Custo médio ....................................................................................................... 53
O uso de modelos na análise de problemas econômicos .................................. 18 Custo marginal ................................................................................................... 53
Vantagens comparativas .................................................................................... 19 Custos fixos e variáveis ...................................................................................... 54
Lei da Procura e da Oferta ................................................................................. 20 Curvas de custo no curto e no longo prazos ...................................................... 54
Excedentes econômicos ..................................................................................... 21 Rendimentos e lucros ........................................................................................ 56
Excedente do consumidor ................................................................................. 22 Maximização do lucro e utilização dos insumos ................................................ 56
Excedente do produtor ...................................................................................... 22 Rendimentos em função dos níveis de produção .............................................. 56
Fluxo circular da riqueza .................................................................................... 23 Rendimento total ............................................................................................... 57
Economia, ciências e áreas afins ........................................................................ 25 Rendimento médio ............................................................................................ 57
Relação da economia com a engenharia em suas diversas áreas ...................... 28 Rendimento marginal ........................................................................................ 57
Microeconomia e macroeconomia .................................................................... 30 Lucro .................................................................................................................. 57
Economia normativa e economia positiva ......................................................... 31

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Curvas de rendimento ................................................................................ 58 Conceitos básicos …………………………..………..............................................….. 90
Síntese apertada da teoria do consumidor .................................................. 59 Estoques e. Fluxos …………………………...............................................………….. 92
Abordagens Cardinal e Ordinal .................................................................... 59 Produto e renda: abordagem preliminar ……………….....…….......................… 93
Preferências e curvas de indiferença .......................................................... 60 PIB e deflator ………......………………….....................................................……… 94
Taxa Marginal de Substituição ..................................................................... 61 PIB e PNB ……………………….…….....................................................……………… 96
Restrição orçamentária e a otimização da escolha do consumidor .............. 62 Produto potencial e hiato de produto ………………….............................……… 97
Equilíbrio do Consumidor ........................................................................... 63 PIB e PNB a preços de mercado e a custos de fatores ………..........……….…… 98
A função de demanda ................................................................................. 64 Produtos interno e nacional brutos e líquidos …………………..................…….. 98
Noções básicas sobre elasticidades ............................................................. 66 Identidades macroeconômicas básicas ………………………………........…………..…. 99
Elasticidade-preço da demanda ................................................................... 66 Equilíbrio macroeconômico ……………………………….............................………… 99
Elasticidade-preço da oferta ........................................................................ 67 Decomposição do investimento …………………………………………...........…………. 101
Classificação dos coeficientes de elasticidades-preço da demanda Origem dos recursos para investimento …………………………………………............ 102
e da oferta ................................................................................................. 68 Origem dos recursos para financiar o déficit público ……………….................... 103
Elasticidade-renda ....................................................................................... 68 Decomposição da renda nacional …………………….………………………................. 104
Elasticidade cruzada-preço da demanda ...................................................... 69 Determinação da renda ……………………………………………………………...........…… 105
Breve estudo seletivo dos mercados ........................................................... 70 Síntese do modelo clássico …………………………............………………….....………… 105
Mercados de bens de consumo ................................................................... 70 Síntese do modelo keynesiano …………………………………………….............……… 107
Principais características da concorrência perfeita ...................................... 70 Síntese do modelo ISxLM ……………………………..........…..........................…….. 112
Síntese do equilíbrio em concorrência perfeita .......................................... 71 Outros modelos ……………………………………………………………...................………. 114
Breve estudo do monopólio ....................................................................... 74 A taxa de juro ……………………………………..........................................………….. 115
Notas sobre os oligopólios .......................................................................... 79 Determinantes do Investimento ………………………………………….......………........ 116
Concorrência monopolística ....................................................................... 83 Inflação ……………………..............…………....................................................…… 118
Mercados de fatores de produção .............................................................. 84 Tipos de inflação e comentários sobre fatores determinantes .…............….. 118
Concorrência pura e concorrência perfeita dos fatores de produção .............. 84 Notas sobre a teoria quantitativa da moeda ………………………....…............…… 121
Monopsônio ..................................................................................................... 84 Efeitos do processo inflacionário ………………………………………....................….. 123
Oligopsônio ...................................................................................................... 85 Breve referência à curva de Phillips ………………………………………...........…...… 124
Concorrência monopsonística..............................................................................87 Metas de inflação ……………………………......................................................….. 125
Monopólio bilateral ...........................................................................................87 Desemprego e emprego …………………….………………………………................……. 126
Conclusão ..........................................................................................................88 Câmbio ………………………………………………………….......................................……. 128
Taxa nominal e taxa real de câmbio ………………………...............................…… 129
CAPÍTULO 3 Regimes cambiais ………………………………………….....................................……… 130
NOÇÕES DE MACROECONOMIA Atuação dos governos no mercado externo …………………………………….......…. 132
Tópicos especiais …………….………………………...........................................……. 132
Generalidades ……………………………......….................................................…… 89 Dívida Pública …………………………………………..........................................…….. 132

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Algumas notas sobre o crescimento econômico ……………...........…….........… 134 Valor Presente Líquido ...................................................................................... 158
Medida do custo de vida …………………………………………….....................……….. 135 Taxa interna de retorno (TIR) ............................................................................ 158
Elementos do arcabouço institucional e componentes do Razão de custos e benefício .............................................................................. 159
instrumental da aplicação dos conceitos macroeconômicos …….……… 138 Payback .............................................................................................................. 159
Contabilidade nacional ………………………..…………..................................…….. 138 Síntese das vantagens e desvantagens dos indicadores considerados ............ 159
Moeda e bancos ………………………………….……………………….........................….. 139 Taxa mínima de atratividade ............................................................................ 160
Breves notas sobre a história da moeda ……………………………………….......…….. 139 As óticas de mercado e social na avaliação de projetos .................................. 161
Funções da moeda ………………………………………………………………………........…… 141 Fases de elaboração e componentes do projeto para a
Demanda por moeda ……………………………………………………………..……...........… 142 avaliação econômica ......................................................................................... 161
Características da moeda …………………………………………………………...........……. 142 Pesquisa de mercado ........................................................................................ 162
Papel dos bancos ………………………….....………..........................................…… 143 Tamanho do empreendimento ......................................................................... 162
Oferta monetária ……….....……………………………….......................................….. 143 Projeto de engenharia e processo associado .................................................... 164
O processo de criação de moeda ……………………………………………………......….. 144 Localização ......................................................................................................... 164
Encaixe técnico ………………………………………………………................................… 145 Investimento ...................................................................................................... 165
Base monetária. Política monetária …………………….................................…… 146 Custos e receitas ................................................................................................ 166
Mercados financeiros ………………………………..............................................…. 147 Financiamento ................................................................................................... 166
Alguns comentários à economia brasileira recente ………….......................…. 147 Subsídios para a avaliação de projetos sob a ótica social ................................ 166
Sobre a taxa de juro ………………………………………………………………………….....…. 147 Correção de falhas de mercado como medida para a racionalida
O Risco-País ………………………………………………................................................ 149 dos gastos públicos ........................................................................................... 167
Superávit primário ……………………………………..........................................……. 150 Variações Compensatórias como medida de convivência
Déficit público …………………….....................……............................................ 152 com as externalidades ...................................................................................... 168
Política tributária e desigualdade: consumo das famílias ………………….......… 152 Preços sociais ..................................................................................................... 169
Política tributária: o peso das obrigações sobre setores produtivos .......... 153 Determinação dos Preços Sociais ...................................................................... 170
Comentários finais ……….………………………………..........................................… 154 Preço social do capital ou taxa social de desconto ........................................... 170
Preço social da terra: ........................................................................................ 171
CAPÍTULO 4 Preço social do trabalho .................................................................................... 172
ASPECTOS ECONÔMICOS E FINANCEIROS DE UM EMPREENDIMENTO DE Preço social de um insumo básico .................................................................... 172
ENGENHARIA Preço social da energia ..................................................................................... 172
Preço social da taxa de câmbio ........................................................................ 173
Notas preliminares ....................................................................................... 155 Breve estudo de caso: um projeto pecuário fictício ......................................... 174
Motivação para o estudo .................................................................................. 156
Níveis de abordagem do problema ............................................................. ..... 156
Breves notas sobre a análise de custos e benefícios ........................................ 157
Indicadores de mérito dos projetos .................................................................. 157

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introdução______________________________________________ Cada indivíduo depende dos demais para atender às suas necessidades.
capítulo 1 Alimentos, remédios, moradia, vestuário, educação, transporte e outros
requisitos básicos para viver, tudo isso é resultado dos esforços de muitas pessoas
que trabalham, de modo organizado ou não, em firmas e outras fmas de
organizações produtivas, ou, ainda, individualmente. A relação de dependência
entre os indivíduos e, entre estes e as firmas, outros tipos de organização,
privadas e públicas, bem como das organizações entre si, implica trocas de bens e
serviços.

Nos primórdios da cultura humana, as trocas eram feitas usando-se apenas as


mercadorias. Desse modo, o indivíduo que precisasse de determinado alimento, o
milho por exemplo, e dispusesse de cevada, teria que encontrar um outro
indivíduo que precisasse da cevada e, ao mesmo tempo, dispusesse do milhoque
preenchesse o seu interesse para que a troca pudesse ser negociada e efetivada.

Com o tempo, algumas mercadorias mais comuns passaram a ser utilizadas como
moeda. O gado, o sal, a própria cevada ora referida, o arroz foram utilizados como
moeda em distintas épocas e lugares como será comentado na seção sobre a
História da Moeda, no Capítulo 3 deste Curso. A moeda, tal como é conhecida
hoje, é, portanto, uma mercadoria que substituiu as que foram anteriormente
utilizadas ao longo da história. Mas trata-se de uma mercadoria com uma
característica que não se encontra em nenhuma outra que é a aceitação
01. Por que convém ao (à) estudante de engenharia estudar economia e incontinenti quando oferecida em troca de uma mercadoria ou serviço. É tão
finanças? especial essa troca que é conhecida como operação de compra e venda: o
comprador entrega moeda ao vendedor que, em contrapartida, entrega a
A engenharia é uma profissão fascinante! Por seu intermédio, o(a) profissional mercadoria ou presta o serviço ao comprador. Moedas compram, inclusive, outras
transforma recursos e riquezas em outras riquezas, adicionando-lhes valor. Esse moedas (operação de câmbio).
valor adicionado constitui um importante conceito econômico que, desde estas
primeiras linhas, insinua uma relação entre engenharia e economia. bem ou Ora, o(a) profissional de engenharia tem necessidade de conhecer os custos dos
serviço que estará à disposição do uso ou consumo da sociedade. bens que produz. O custo de uma obra, tanto quanto o custo da energia
produzida ou do serviço de saneamento prestado ou, ainda, o custo do produto

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industrializado produzido, bem como os custos de muitos bens e/ou serviços uma gama mais ampla de pessoas. Com efeito, os problemas econômicos sempre
produzidos constituem tema inerente à carreira do(a) engenheiro(a). foram objeto das preocupações de governantes, monarcas, dirigentes públicos,
empresários, professores e pesquisadores, sociólogos, filósofos e pessoas de
Sucede que a determinação de custos de produção é passagem obrigatória no
inúmeras outras qualificações ou posições em face da sociedade, porque a
contexto da formação de preços dos bens e serviços, os quais não se atêm
economia sempre esteve presente na tomada de decisões das pessoas.
unicamente ao conhecimento dos custos, implicando a necessária avaliação das
características da demanda por cada bem e serviço, uma vez mais impulsionando As relações econômicas são uma constante em qualquer sociedade, permeando o
o(a) estudante de engenharia em direção à necessidade dos estudos econômicos. ambiente humano e regendo as relações entre pessoas, entre estas e empresas,
Esses aspectos nada bastassempara revelar a necessidade de o(a) estudante de do governo com as firmas e com as pessoas, fazendo aparecer em cena a figura
engenharia se familiarizar com o estudo da economia, são reforçados por razões do agente econômico, que nada mais reflete senão o papel desempenhado pelo
igualmente relevantes que resultam do fato de os(as) profissionais da engenharia ser humano em suas múltiplas formas de atuar, ora como consumidor, ora como
e a sociedade em geral habitarem um mundo no qual o comportamento dos produtor, ora como agente público.
agregados econômicos afeta os preços, as receitas, os lucros, o valor da moeda, a
A condição de consumidor que caracteriza o indivíduo procede das necessidades
desvalorização ou a valorização desta, a formação da riqueza bruta de cada país,
deste, questão explorada na seção 3, deste capítulo. Em verdade, as necessidades
as trocas entre países, entre muitos outros elementos da análise
humanas são o elemento motor do processo econômico porquanto, para serem
macroeconômica, segmento dos estudos econômicos que agasalha a análise dos
satisfeitas, implicam a necessidade de ter quem produza os bens e serviços que
referidos agregados.
satisfarão as demandas, ao mesmo tempo em que implicarão a necessidade de
Por fim, as finanças são uma relevante parte dos estudos da economia eis que um sistema organizado de atividades econômicas, sociais e políticas que
tratam dos diversos mecanismos associados ao uso da moeda e outros meios de dependem de um governo. Daí surge o conjunto de agentes econômicos:
pagamento em um multivariado ambiente de transações entre consumidores, consumidores, produtores e governo.
produtores e governos. Nesse contexto, os títulos de crédito, os descontos de
Freqüentemente, ao atuar como produtor, o ser humano faz uso de um artifício
títulos e duplicatas na rede bancária, os valores das ações das companhias nas
muito presente em sistemas econômicos de livre iniciativa. Esse artifício é a firma,
bolsas de valores e o mercado de moedas estrangeiras alinham-se, entre muitas
que emprega pessoas e é igualmente comandada por pessoas. No estudo da
outras, a peças do conhecimento das finanças que interessam, em maior ou
economia, a firma é um instrumento cuja importância é tão significativa que
menor medida, ao(à) engenheiro(a), dependendo da oportunidade em que vá
impõe a análise de seu comportamento em compartimento próprio do estudo da
fazer uso de cada um desses instrumentos do mundo financeiro.
economia: a teoria da firma, tópico da análise microeconômica, a ser abordada
02. Os agentes econômicos no contexto do Capítulo 2 deste Curso.

Na seção precedente, comentou-se sobre o interesse do(a) profissional da Conforme indicado, é a organização para a produção que dá lugar ao conceito de
engenharia a respeito dos problemas econômicos. Mas a economia interessa a firma ou empresa como unidade produtiva voltada para o atendimento ao

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mercado consumidor de seus produtos e/ou serviços, a jusante da cadeia de neste primeiro Capítulo, à introdução dos principais conceitos que serão
relações interssetoriais, portanto, e, também, defrontando-se com os mercados explorados nas demais partes do Curso.
fornecedores de matérias primas e insumos, a montante dessa mesma cadeia ena
condição de compradora de tais primas matérias e insumos para realizar a sua 03. Necessidades humanas
produção.
Todo o indivíduo carrega consigo necessidades que pretende vê-las satisfeitas.
À comunidade de indivíduos, agrupados por famílias, dá-se a denominação de Alimentar-se, instruir-se, repousar, fazer recreação, formar um patrimônio, todas
consumidores, e à coletividade de empresas dá-se o nome de produtores. Esses são, entre inúmeras outras, necessidades inerentes à vida do ser humano.
dois conceitos são muito importantes em qualquer sistema econômico de livre Conforme se percebe, essas necessidades são bastante heterogêneas. Não se
iniciativa. Os produtores produzem o que os consumidores consomem, mas, em pode comparar, por exemplo, a necessidade de o indivíduo alimentar-se todos os
inúmeras ocasiões, há excesso ou escassez da quantidade produzida de um bem dias com aquela vontade que ele tem, por exemplo, de viajar, a turismo, para o
e/ou serviço em relação à quantidade consumida, o que caracteriza o surgimento exterior. A primeira é básica, enquanto que essa última é supérflua.
de determinados problemas econômicos. Assim, o desbalanceamento entre
Em seu trabalho intitulado Política, Aristóteles já classificava as necessidades em
oferta e demanda costuma ser, em grande número de situações, a origem de um
físicas e morais. As necessidades físicas, também ditas corporais, resultam das
problema de natureza econômica.
demandas do corpo humano para o seu funcionamento, associadas a hábitos
Conforme mencionado, além dos produtores e consumidores, um sistema adotados pelo ser humano. Comer e vestir-se diriam bem de um e de outro tipos
econômico incorpora, também, o governo, que é a representação da sociedade, dessas necessidades físicas ou corporais. Quanto às necessidades morais,
estruturado de acordo com a constituição de cada país. O governo atua, em nome também referidas como necessidades espirituais, estas procedem da componente
do estado1, planejando, regulando, estimulando, inibindo, coibindo, monitorando psíquica do indivíduo, refletindo o desejo do conhecimento intelectual, da criação
e fiscalizando o conjunto da sociedade, orientando-a para o desenvolvimento e artística e de outras formas de manifestação do intelecto.
para a busca do bem estar coletivo.
As necessidades físicas podem ser classificadas em necessidades biológicas ou
O governo atua, portanto, como um importante agente do processo econômico, absolutas, e necessidades relativas ou da existência social. As necessidades
na privilegiada condição de emissor das leis, normas e regulamentos jurídico- biológicas estão relacionadas com as funções vegetativas do corpo humano, mas
administrativos que regem a vida dos agentes econômicos. É justamente nem todas têm significado inteiramente econômico.
analisando o comportamento dos agentes econômicos e suas conseqüências para
As necessidades próprias da existência social são aquelas criadas pelo homem em
a sociedade que se desenrolará o presente Curso de Economia e Finanças. Essa
razão da vida em coletivo que, com o tempo, fez aparecer hábitos, sedimentando
análise será procedida, tanto quanto possível, com um olhar dirigido para o
costumes e normas de civilidade. Por exemplo, o uso da gravata não chega a ser
interesse da formação profissional e científica do(a) engenheiro(a), e se cingirá,
um hábito indispensável ao indivíduo ao trajar. Igualmente, o uso de brincos e
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Conjunto formado por três elementos que são, um povo, seu território e seu governo, numa das acepções mais outros adornos pode ser dispensável. No entanto, ambas as necessidades foram
simples do significado da palavra estado.

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se firmando como resultado de hábitos adquiridos, e são cambiantes de indivíduo recém derrubadas está, para efeitos práticos, em seu estado original. Os móveis
para indivíduo, daí porque a denominação de necessidades relativas. fabricados com essa madeira, no entanto, já são produtos trabalhados que
modificaram a matéria prima original. Ambos constituem bens econômicos.
As necessidades morais ou espirituais são subjetivas e resultam de diferentes
tipos e estágios de desenvolvimento das diversas culturas. Assinala-se que nem Considerando que os serviços também servem para a satisfação das necessidades
todas têm repercussão econômica, como é o caso, por exemplo, das inquietações humanas, as referências que se fizerem a bens, neste texto, serão feitas por meio
filosóficas do indivíduo que, a menos que gerem algum tipo de demanda da expressão bens e/ou serviços de um modo geral. E, a menos nos casos em que
implicando a aquisição de bem e/ou serviço, ou que, de outro lado, gere algum se omita adrede e justificadamente a palavra serviços, a palavra bens, quando
tipo de oferta de bem e/ou serviço, não têm significado econômico. Para ter utilizada nos demais casos, deve ser tomada pela mencionada expressão.
sentido econômico, a necessidade moral deverá implicar o uso de salário e/ou
Em geral, os bens são de natureza material, palpável, enquanto que os serviços
outra forma de renda do indivíduo para vê-la satisfeita, ou de seu próprio
podem ter, total ou parcialmente, um caráter intangível como vários serviços
trabalho para criá-la, e/ou, ainda, da faculdade de poder ser submetida a troca
profissionais, a segurança pública e outros mais. Portanto, alguns serviços são
por alguma outra mercadoria.
compostos de uma parte intangível e outra material. Tal é o caso, por exemplo,
Por fim, há as necessidades coletivas que, embora advenham de necessidades dos serviços de restaurante, que trazem, em conjunto, os cuidados com o bem
individuais, são decorrência da vida em comum e não podem ser alcançadas por estar do comensal por meio de um ambiente agradável, além da refeição
cada indivíduo isoladamente. É nesse ponto que o estado assume o papel de propriamente dita, sendo esta última a sua parte material.
provê-las à coletividade, para tanto fazendo uso da arrecadação de recursos, isto
Os bens podem ser classificados, quanto à disponibilidade, como bens livres e
é, do resultado da tributação, e de sua estrutura organizacional, com a qual
bens econômicos. Chamam-se bens livres aqueles bens que existem em
promove ações nos setores de educação, segurança, saúde, habitação,
abundância e que não demandam esforço humano para a sua obtenção.
transportes e uma série de outros serviços. As necessidades coletivas têm grande
Exemplos de bens livres são a luz do dia, o ar atmosférico, entre outros. Suas duas
significado social porque, conforme referido acima, são providas pelo estado
principais características são não estarem sujeitos a regime de preços tampouco a
mediante o recebimento de pequenas quotas (tributos) de cada um de seus
regime de propriedade. São denominados bens econômicos aqueles que têm
membros, para formar os recursos com os quais proporcionará a cada um os bens
como característica freqüente o estado de escassez, real ou potencial.
e/ou serviços de que necessitem, mas que dificilmente poderiam ser
Adicionalmente, incorpora-se à caracterização de um bem econômico o fato de
providenciados ou gerados por cada indivíduo isoladamente.
haver necessidade de trabalho para obtê-los.
4. Bens e serviços
Segundo a natureza do uso, os bens podem ser classificados em bens de consumo
Os bens são quaisquer elementos que se prestam à satisfação das necessidades e bens de produção. Os bens de consumo, também denominados bens finais, são
humanas. Em geral provêm da natureza, podendo estar em seu estado original ou aqueles que satisfazem diretamente às necessidades do consumidor. E os bens de
já ter passado por algum tipo de transformação. A madeira em tronco de árvores produção, também denominados bens indiretos, satisfazem indiretamente às

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necessidades do consumidor. Livros e cadernos comprados por estudantes para Finalmente, os estudos microeconômicos adotam dois critérios de classificação
uso nos estudos, tanto quanto a pizza encomendada pela família para uma para os bens e/ou serviços: (i) quanto à correlação com outros bens; e (ii) quanto
refeição caseira constituem exemplos de bens de consumo. O pneumático aos efeitos da variação do preço e/ou da renda. No que se refere à correlação, os
fabricado que é vendido à montadora de automóvel é um exemplo de bem de bens e/ou serviços, quando correlatos, podem ser substitutos e complementares.
produção ou indireto. De outro lado, se alguém adquire, por exemplo, arroz, no Por exemplo, o feijão e a farinha no costume nordestino são complementares; o
supermercado para o estoque da família, neste caso o arroz terá sido um bemde mesmo pode-se afirmar da relação entre feijão e arroz. E, como conseqüência
consumo oufinal. Mas se o arroz é comprado para o estoque de um restaurante, o dessa correlação, arroz e farinha são substitutos.
qual prestará o serviço a que se propõe, neste caso a mercadoria arroz é um bem
Quanto aos efeitos da variação do preço dos bens e/ou serviços e/ou da renda do
de produção.
consumidor, estes podem ser classificados em bens e/ou serviços superiores ou
Há, ainda, outros critérios de classificação dos bens e serviços. Entre esses, está a de luxo, normais, inferiores e bens e/ou serviços de Giffen. Esse critério de
classificação quanto ao grau de necessidade de um bem e/ou serviço para o classificação será mais detidamente comentado no Capítulo 2, do presente Curso.
consumidor ou para o produtor2. São considerados bens e/ou serviços de
05. Objeto do estudo da economia
primeira necessidade os alimentos, remédios, artigos essenciais de vestuário,
transporte, educação, entre outros. Em um segundo rol vêm os bens e serviços ao Uma das mais importantes preocupações dos estudos econômicos é a escassez
consumidor que não são absolutamente de primeira necessidade e que, também, de recursos para atender ou satisfazer às demandas dos agentes econômicos. A
não estão relacionados com o consumo de luxo, abordado neste capítulo. Esses abundância de recursos, por oposição, nem sempre é objeto do interesse da
bens são classificados como bens de segunda necessidade. Os bens e serviços de economia porquanto é indicativa da inexistência de problema com o
luxo formam, juntamente com outros não necessariamente de luxo, mas que são aprovisionamento de bens e serviços. Entretanto, em alguns casos o excesso de
supérfluos, o grupo dos bens e serviços de terceira necessidade. oferta de bens e serviços constitui também um problema econômico uma vez que
afeta o estado de equilíbrio dos agentes, principalmente os da oferta, isto é, os
No caso de fatores de produção, por exemplo, dependendo da natureza de cada
produtores. Além disso, excessos de oferta de alguns bens e/ou serviços podem
processo produtivo, a energia e a mão de obra poderiam ocupar ― e ocupam em
trazer problemas para a coletividade. Por exemplo, os produtores de batata no
muitas oportunidades ― o grupo de fatores de primeira necessidade. Em algumas
Brasil enfrentaram uma crise de excesso de produção sem precedentes em 2007,
indústrias como, por exemplo, a de bebidas e a de celulose e papel, além dos
tendo que abandonar milhares de hectares plantados, afora as imensas
curtumes, a água constitui um fator de produção de primeira necessidade. Os
quantidades de toneladas então já colhidas que foram jogadas ao lixo por falta de
bens e/ou serviços podem, ainda, ser submetidos ao critério da durabilidade e,
comprador. O excesso de produção ocorreu por uma expectativa frustrada gerada
neste caso, podem ser perecíveis e duráveis.
pelos preços favoráveis ao produtor no ano imediatamente anterior, o que fez
com que a área plantada fosse expressivamente aumentada em várias regiões do
país, além de se ter procedido ao plantio fora de época. Essa crise foi agravada
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Não é habitual utilizar-se esse critério de classificação em relação ao produtor. em razão da grande oferta da variedade ágata, da batata, que encontrou fortes

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restrições no mercado consumidor dadas às suas características pouco A análise do comportamento dos conjuntos totais de consumidores, de
apreciáveis, especialmente quanto à curta estabilidade químico-biológica dos produtores, e do governo como um todo também interessa ao estudo da
tubérculos. economia. Esses conjuntos são denominados agregados econômicos e são objeto
da análise macroeconômica como será referido no presente capítulo.
Mas é efetivamente a escassez de bens e serviços o que importa primordialmente
analisar, dado que a insatisfação dos agentes da demanda, principalmente a 6. Fatores de produção
demanda por bens e serviços de consumo, é um dos problemas mais frequentes
As disponibilidades de recursos para a produção de bens e/ou serviços
da economia moderna.
objetivando a satisfação das necessidades humanas são insuficientes em um
Em segundo lugar, mas não menos importante, a economia reserva uma grande número de casos, ensejando o aparecimento do problema que está no
acentuada dose de atenção para o estudo do custo de oportunidade. O custo de centro da definição de economia: a distribuição de bens escassos em relação às
oportunidade de um bem e/ou serviço corresponde às oportunidades que estão quantidades demandadas.
sendo deixadas de ser aproveitadas quando o agente econômico não emprega o
Esses recursos, ditos produtivos, também são chamados de fatores de produção.
dinheiro (ou outro bem qualquer que vá dar em troca) do modo mais rentável
Os fatores de produção são, pois, elementos que entram no processo produtivo
possível na compra de outros bens ou serviços. De modo mais preciso, o agente
para, em conjunto, atuar na elaboração de bens e/ou serviços. Podem ser
econômico, especialmente o produtor, deve empregar os recursos de que dispõe
classificados em quatro grupos: (i) matéria-prima, também referida como
do modo mais rentável possível. Caso assim não proceda, a diferença perdida
natureza ou, ainda, terra, esta última pelo fato de provir do planeta Terra; (ii)
equivale ao custo de oportunidade. Portanto, o custo de oportunidade reflete o
capital; (iii) trabalho, ou mão de obra ou, ainda, homem, denominação esta
quanto o agente deixa de ganhar quando não aproveita o uso alternativo mais
última que está em desuso e cedendo lugar ao termo pessoa; e (iv) capacidade
rentável possível de seus recursos.
empresarial.
Os mercados são também um tema do interesse dos estudos econômicos. Os
A matéria-prima é qualquer elemento advindo do meio físico, tendo ou não
mercados constituem um mecanismo que ajusta as decisões de consumo com
passado por transformação anterior, que participa de determinado processo
aquelas de produção, e seus elementos-chave são preços e quantidades
produtivo e se incorpora ao corpo do produto produzido. A madeira, tanto
transacionadas. Os mercados não podem solucionar todos os casos de alocação
quanto o aço ou o vidro, são exemplos de matérias primas. Do mesmo modo, o
de recursos, ainda que solucionem ou contribuam para a solução de uma
leite, a água e a manteiga são, sob certas circunstâncias, matérias primas, embora
significativa parte deste tipo de problema. Quando um mercado é ineficiente para
também também sejam bens de consumo.
alocar recursos, bens e/ou serviços, o que sucede com os mercados imperfeitos, a
regulação governamental entra em cena, porém não deixa de considerar os É importante considerar que a matéria-prima, ao ser transformada em produto
elementos fundamentais com que o mercado lida, isto é o binômio preço e industrializado, em geral deixa resíduos. Os resíduos da produção advêm
quantidade. normalmente das perdas de matérias primas processadas e de outros elementos
do processo como, por exemplo, rejeitos de combustão, rejeitos líquidos ou de

9
natureza outra qualquer. Esse comentário é relevante para assinalar o atual nula, encontram-se em estado estacionário, isto é, em estagnação. E as
debate sobre a economia do meio ambiente. É, também, oportuno, para salientar economias cuja capitalização líquida é negativa são economias em recessão. A
um conceito, igualmente atual, segundo o qual de um processo produtivo capitalização de uma economia também pode ser financiada. Essa é, aliás, uma
resultam sempre produtos e resíduos e não apenas os primeiros, como por das maneiras de se promover agilmente o crescimento econômico. Os recursos
muitas décadas do passado se considerou3. para esse financiamento tanto podem vir de outras economias quanto podem ser
gerados dentro da própria economia, aumentando-se, para tanto, a poupança.
O capital, por seu turno, é o conjunto de riquezas utilizadas para produzir outras
Aumentar poupança significa fazer migrar recursos então utilizados no consumo
riquezas que são os próprios bens ou serviços resultantes dos diversos processos
para a finalidade de investimento6.
produtivos. As máquinas e os edifícios de uma fábrica, tanto quanto o dinheiro,
são distintas formas de capital. As máquinas, edifícios e demais ativos da firma O fator trabalho resulta da atuação do ser humano no contexto da produção
são formas de capital imobilizado 4, enquanto que o dinheiro em caixa ou em econômica. Por isso mesmo também é denominado fator mão de obra. Tomado
bancos constitui forma líquida de capital. Estudando-se o capital sob o ângulo da em agregado, o fator trabalho de uma economia depende do tamanho da
economia, o primeiro conceito a fixar é que este procede de inversões que têm população e de sua eficiência total. A demografia é, portanto, um elemento
origem na poupança dos agentes econômicos. Conforme será estudado no importante na avaliação do referido fator. Os estudos demográficos demonstram
Capítulo 3, deste Curso, voltado para os conceitos macroeconômicos, a poupança que não somente o tamanho de uma população deve ser objeto dos estudos de
é o resultado do adiamento do consumo, ou seja, é a parte da renda nacional economia da demografia. Importante, também, é a sua densidade e seus
que, não sendo consumida, torna-se disponível para as inversões econômicas. movimentos migratórios, a proximidade com recursos naturais mais facilmente
Assim, capitalizar, ou criar capitais, resulta da inversão de uma parte da renda obteníveis, sua capacitação para o trabalho, os mercados dos bens e/ou serviços
nacional, justamente a que foi poupada, isto é, a que foi economizada. O que podem ser produzidos, entre outros aspectos.
crescimento de uma economia ocorre principalmente por meio de investimento
Os distintos processos produtivos balanceiam, em razão de suas respectivas
líquido, ou seja, por meio de um processo de capitalização que, além de repor os
tecnologias, a dosagem dos fatores entre si, especialmente, capital e mão de
capitais gastos, acrescente novos capitais, realizando algum nível de capitalização
obra, sendo alguns processos mais capital-intensivos e, outros, mais trabalho-
líquida5.
intensivos. O que é verdadeiramente relevante ter-se em conta é o índice de
As economias que passam, em dado momento, por uma capitalização líquida produtividade em relação a todos e a cada um desses fatores. A produtividade
positiva, são economias em crescimento. Aquelas cuja capitalização líquida é média de um fator é a relação que existe entre determinado volume de produção
3
e a quantidade utilizada do fator de produção considerado. Esse conceito,
Os resíduos da produção respondem por uma parte importante dos estudos econômicos contemporâneos
relacionados com a preservação ambiental. também referido como conceito mecanicista, ou ainda conceito científico de
4
O imobilizado de uma firma pode ser técnico ou financeiro. Diz-se que o imobilizado é técnico quando os recursos
são transformados em ativos operacionais consoante os objetivos sociais da firma. E financeiro, quando os 6
Aumento do consumo durante algum tempo também gera crescimento econômico enquanto o aumento está se
recursos estão aplicados no mercado financeiro. materializando, isto é, quando o aumento cessa, mesmo que o novo patamar de consumo mais elevado seja
5
O investimento líquido é o que resulta do total investido, ou investimento bruto, deduzida aquela parcela mantido, o crescimento também cessa. Portanto, o crescimento econômico não pode ser realizado só com
correspondente à restauração do capital depreciado, isto é, do capital gasto. aumento de consumo, dependendo, antes e sobretudo, de investimento.

10
produtividade, corresponde à definição de produto médio de um fator, A análise do comportamento das grandes firmas demonstra que, em geral, a
largamente utilizado no corpo da teoria da produção, parte dos estudos de capacidade empresarial costuma ser proporcional ao tamanho da firma. Dessa
microeconomia. O produto médio de um fator de produção será abordado no constatação resulta que a intuição e a referida perspicácia empresariais são
Capítulo 2 do presente Curso. capazes de influir na natureza dos mercados cativos, expandindo-os, por exemplo,
por meio de fusões e aquisições de firmas.
De acordo com a conceituação acima, a produtividade de um sistema de
produção em relação ao fator matéria prima é a razão entre a quantidade O fator capacidade empresarial afeta, portanto, não somente a unidade
produzida do produto que resulta desse processo e a quantidade da matéria produtiva, como também parcelas significativas dos mercados nos quais
prima utilizada. Se o produto for medido, por exemplo, em unidades físicas (u.f.), determinadas firmas atuam, sendo um fator decisivo na agregação de valor ao
e a matéria prima em quilogramas (kg), então a unidade dessa produtividade é bem ou serviço produzido, constituindo assim um capítulo importante da teoria
dada em u.f./kg da matéria prima utilizada. No caso da produtividade da mão de da produção, objeto da capítulo seguinte.
obra, a unidade será o resultado da quantidade produzida por tempo de trabalho
07. Escassez e fronteira de possibilidades de produção
realizado, normalmente medido em horas. E no caso de utilização de máquinas,
essa produtividade poderá ser a razão entre a quantidade produzida e o número O estudo da fronteira de possibilidades de produção, também referida como
de horas de funcionamento das máquinas. Mas é possível também calcular-se a curva de possibilidade de produção, ou, ainda, curva de transformação, é útil para
produtividade total em relação aos três fatores simultaneamente. Nesse caso, a demonstrar como a escassez permeia os fatores de produção, uma das razões
unidade a adotar no denominador terá que ser o custo total dos fatores, pois não para o estudo da economia.
será possível tomar-se a soma de quilogramas com horas de trabalho humano e Para melhor compreensão, exemplifique-se o problema mediante a avaliação de
com horas de máquina. uma firma que produza apenas dois produtos. Seja essa firma uma marcenaria
Finalmente, no que diz respeito ao fator capacidade empresarial, este resulta de que fabrique dois tipos de portas: o tipo I (standard) e o tipo II (de fino
uma série de ingredientes aportados pelo investidor-gestor. Entre tais acabamento). Analisem-se exclusivamente dois dos fatores de produção que
ingredientes, alinham-se principalmente a tecnologia adotada, a capacidade entram no processo de fabricação das portas, supondo-os constantes: as
organizativa do empresário, aí incluídas as decisões sobre a seleção da mão de máquinas e os trabalhadores. Por fim, considere-se que, após a análise técnica do
obra, das matérias primas, de métodos de informatização, automação e setor de planejamento da produção dessa fábrica, o resultado encontrado tenha
mecanização, além da busca da capacidade econômica para prover o seu negócio sido o do quadro da Figura 01.01.
com as condições de obter e utilizar todos esses ingredientes. Uma leitura preliminar desse quadro mostra que, se somente forem produzidas
O conceito de capacidade empresarial contém, adicionalmente, a perspicácia do portas do tipo I, então serão fabricadas 40 portas. Se, ao contrário, somente
empreendedor quanto à percepção dos mercados e o compromisso permanente forem produzidas portas do tipo II, então apenas 5 portas serão fabricadas.
com a criatividade e a inventividade aplicadas à prática incessante da busca da
inovação.

11
Fig. 01.01 – Pares de produção das portas tipos I e II
TIPOS DE PORTAS
I II
40 0
35 1
28 2
20 3
12 4
0 5
É também digno de nota o seguinte conjunto de observações aos elementos da
Entre as quantidades extremas de cada coluna do quadro alinham-se quantidades
curva de possibilidades de produção: (i) a produção das portas do tipo I é mais
intermediárias que formam pares correspondentes dos tipos de portas I e II. Esses
complexa e/ou laboriosa do que a produção de portas do tipo II, uma vez que,
pares de quantidades descrevem a curva de possibilidades de produção mostrada
quando todos os fatores são postos à disposição da fabricação de I, alcança-se um
na Figura 01.02.
total de 40 unidades, e quando esse mesmo estoque de fatores é posto à
A continuação da leitura do mencionado quadro permite verificar que, para disposição da produção de II, somente se alcançam 5 unidades; (ii) qualquer
acrescentar-se uma unidade de porta do tipo II ao lote de produção quando o par ponto acima da curva de possibilidades de produção é indicativo de um par de
produzido é de 40 portas do tipo I e nenhuma do tipo II, isto é, para o par (40;0), portas que a fábrica não pode fabricar (por exemplo, o ponto A da mencionada
é necessário que se abra mão da produção de cinco portas do tipo II. Figura 01.02); (iii) qualquer ponto abaixo da curva de possibilidades de produção
é indicativo de um par de portas que a fábrica pode fabricar, mas que não fará
uso de todos os fatores produtivos disponíveis (por exemplo, o ponto B da Figura
01.02).

Se a fábrica estiver produzindo uma unidade do tipo I, isto é, quando o par de


portas produzido for representado por (1;35), e seu gestor decidir aumentar a
Fig. 01.02 – Curva de possibilidades de produção produção de portas do tipo I em uma unidade, ceterisparibus7ele terá de abrir
mão de produzir 5 unidades de portas tipo II para poder acrescentar essa unidade
do tipo I, pois o novo par coordenado será (2;28). Isso significa que as 7 unidades
que se deixam de produzir de portas do tipo II correspondem ao custo de
oportunidade dessa decisão. Esse custo de oportunidade aumenta para o
equivalente a 8 portas do tipo II quando a fábrica pretende produzir o par (3;20).

7
Vide comentário na seção 11 deste capítulo.

12
Uma observação ao gráfico permite verificar que o custo de oportunidade em
cada nova unidade que a fábrica produz de I é crescente. O custo de
oportunidade crescente é explicado pelo fato de o deslocamento dos fatores de
produção de um tipo de produto para o outro gerar ineficiência porquanto o uso
(manejo) dos fatores não é igualmente adequado aos dois tipos de processo. Por
exemplo, alguns trabalhadores especializados na produção de portas tipo II, ao
serem transferidos para a produção de portas do tipo I, serão menos eficientes.
Do mesmo modo, alguns trabalhadores especializados na produção de portas tipo
I, ao serem transferidos para a produção de portas do tipo II, apresentarão
produtividade mais baixa. É justamente o fato de o custo de oportunidade ser
crescente que explica a concavidade para baixo da curva de possibilidades de
produção.

Exemplo de aplicação no 01.01


08. Consumo suntuário
A fronteira de possibilidades de produção de uma economia que produz apenas
Classifica-se como consumo suntuário, ou consumo de luxo, o consumo ou uso de
dois produtos, vestuário e alimento, é dada por x 22=1600-x12, sendo x1 a produção
bens e/ou serviços considerados supérfluos para o indivíduo. Inicialmente, deve-
horária de alimento e x2 a produção horária de vestuário. Qual o custo de
se considerar que o conceito de luxo é relativo à renda de cada consumidor ou
oportunidade de passar-se da produção de 25 peças de vestuário por hora para
agente econômico. Frequentar peças teatrais pode ser considerado um luxo para
30 peças por hora. Esboce o gráfico da fronteira de possibilidade.
quem aprecie o teatro e ganhe o salário mínimo, e ser, ao mesmo tempo, uma
Solução recreação absolutamete corriqueira para indivíduos de elevada renda e que se
A produção de vestuário igual a 25 corresponde a uma produção de alimento interessem pelo teatro. Em outro exemplo, no Brasil, até o princípio dos anos
igual a 975, quantidade a que se chega a partir de x 1=1600-252 (ponto A da curva 1990, dispor de uma linha telefônica ainda era considerado luxo para uma
de fronteira de possibilidade da Figura 01.03). Se a produção de vestuário expressiva parcela da população. Nos dias atuais, existem mais linhas telefônicas,
aumenta para 30, a produção de alimento se reduz para 700, quantidade obtida a
entre fixas e móveis, do que a totalidade da própria população brasileira.
partir de x1’=1600-302 (ponto B da curva de fronteira de possibilidade já referida).
O aumento de 5 unidades de vestuário implicou a redução de 975-700=275 A História demonstra que o consumo suntuário tem sido a causa da ênfase nas
unidades de alimento, que refletem o custo de oportunidade para a alteração na diferenças de status sociais. Indivíduos que têm acesso a bens e/ou serviços de
produção dada no enunciado.
luxo são percebidos pelos demais como pessoas abastadas. Sob o ponto de vista
Fig. 01.03 – Curva de possibilidades de produção
de vestuário e alimento dos estudos econômicos, o luxo é capaz de produzir efeitos negativos e positivos
também. No que se refere aos efeitos negativos, o luxo é visto como uma

13
atividade cujos esforços empregados na produção dos bens e/ou serviços aos argumentos apresentados anteriormente, justificam a importância do
poderiam ser canalizados para a produção de outros bens e/ou serviços que consumo de bens e serviços de luxo no contexto do estudo da economia.
fossem mais necessários, os quais, certamente, de menor custo, serviriam para
9. Questões econômicas fundamentais e sistemas econômicos
satisfazer a demandas de uma quantidade maior de indivíduos ou famílias.
Em economia, o processo decisório toma, como ponto de partida, a busca de
Em termos de efeitos positivos produzidos pelo consumo suntuário, reconhece-se
respostas claras a três inquietações principais. A primeira diz respeito ao quê
que, ao ser objeto do interesse de classes de altas rendas, os bens e serviços de
deve ser produzido, ou seja, qual o objeto para o qual cada segmento da
consumo de luxo são mais freqüentemente suscetíveis a estímulos que levam ao
economia pode drenar seus esforços. Em economias de livre iniciativa, essa
aperfeiçoamento da qualidade dos padrões intermediários, e também dos
primeira inquietação guia a decisão que o empresário toma quando vai iniciar um
padrões inferiores, dos mesmos bens e/ou serviços, contribuindo, no contexto do
novo negócio. E a parte produtiva à escala macroeconômica, em seu conjunto,
processo de produção capitalista, para a melhoria do processo e do produto. Em
resultará da agregação de todas as atividades empresariais adicionadas da
outras palavras, a produção e venda de bens de luxo desperta o conjunto total
produção do setor público, em geral limitada8.
dos consumidores para níveis mais elevados de qualidade que devem ser
almejados. A segunda pergunta está relacionada com o método que deve ser empregado na
produção, isto é, corresponde à indagação sobre como e onde produzir,
Veja-se, por exemplo, o caso do automóvel que foi bem suntuoso no início
implicando a noção de processos produtivos e localização física do
décadas, porque somente podia ser comprado por pessoas de elevadas rendas.
empreendimento e suas ramificações (filiais ou sucursais).
Foi justamente isso que levou a indústria automobilística a perceber a
necessidade do barateamento do produto, o que somente tornou-se possível por Por fim, aflora uma questão que é das mais delicadas em economia, que se refere
meio da grande produção acompanhada de alguns tipos de incentivos como o a como se deve promover adistribuição da riqueza produzida, ou seja, como
crédito, por exemplo, contribuindo para que um número maior de consumidores promoverem-se os meios pelos quais se possa assegurar o acesso da maioria dos
pudesse ver materializado seu desejo de ter o carro próprio. consumidores aos bens e/ou serviços produzidos.

O luxo contribui, também, para mudanças de grande significado político e As respostas a essas indagações não são triviais nem de simples elaboração. Há
econômico, ao estabelecer o confronto entre as classes dominantes e as menos inúmeros fatores atuando nesse contexto, que não é de natureza apenas
abastadas. Assim ocorrera, em certa medida, na Revolução Francesa, em 1789, na econômica. Muito mais do que matéria de caráter apenas econômico, essas três
Revolução Soviética de 1917, e tem ocorrido com movimentos menos inquietações refletem, antes, complexas questões de caráter social, histórico,
perceptíveis, onde o luxo afronta as classes de rendas mais baixas. A existência do político, cultural, tecnológico e outros que estão a influir no contexto das decisões
luxo é, pois, fator que contribui, às vezes como causa imediata, para importantes adotadas pelos agentes econômicos. A Economia Política, tal como comentada
desfechos de relações deterioradas entre classes sociais. Essa razão, associada
8
O Brasil é um país no qual o governo atua também no campo da produção de bens e serviços por meio de empresas
estatais ou de economia mista.

14
neste capítulo(seção 16), contribui para a busca das possíveis respostas a essas sobre o que entende deva ser, ou deva não ser, respectivamente, objeto da
questões. produção econômica. Tais estímulos e desestímulos refletem intervenções do
governo na economia11.

De outro lado, em economias de planificação centralizada, típicas dos regimes


09.01. O quê produzir
socialistas, a decisão sobre o quê produzir costuma resultar de um trabalho de
Admita-se, inicialmente, uma economia livre e fechada 9, ou seja, os agentes planejamento elaborado pelo governo e é tomada como uma ordem expedida
econômicos produtores é que tomarão a iniciativa de decidir o que vão produzir, que não comporta questionamentos tampouco alterações. Nesses casos, o
e sua produção será colocada à disposição do mercado interno de seu país. Nesse governo, atua como agente produtor único e formula o seu entendimento próprio
caso, a resposta à primeira das três indagações levará em conta, entre outros a respeito das necessidades do conjunto dos consumidores.
fatores10, o mercado, que expressa o desejo do conjunto dos consumidores. Os
09.02. Como produzir
agentes produtores costumam decidir, portanto, conforme a sua leitura a respeito
do que o mercado prefere e/ou deve preferir, por meio de uma tão consistente No que se refere à pergunta sobre o como produzir, a resposta poderá ser
quanto possível tarefa de pesquisa. Entretanto, eventualmente eles podem encontrada na tecnologia e seus constantes aperfeiçoamentos, que conduzem ao
decidir, em algumas situações, pela produção de bens e/ou serviços sobre os desenvolvimento dos processos produtivos, os quais indicam os caminhos pelos
quais o mercado não tenha necessariamente sinalizado em termos de possível quais a produtividade pode ser maximizada, contribuindo para a escolha de
demanda. Isso ocorre, por exemplo, quando os produtores inovam com a processos eficientes. Além disso, o modo de produzir inclui necessariamente
produção de bens e/ou serviços antes desconhecidos, ou de produtos conhecidos decisão sobre localização física, leiaute (arranjo físico) de instalações, tudo em
porém adicionando-lhes características inovadoras, e que, os estudos consonância com o estudo de mercado que é o ponto de partida de todo o
prospectivos, ou mesmo a intuição, demonstraram que o mercado se inclina a processo de definição do como produzir.
receber bem a inovação.
Os elementos comentados nos dois períodos imediatamente anteriores são
O que é importante assinalar é o fato de que, em economias livres, os agentes indutores do conceito de eficiência econômica, o qual implica três conceitos
produtores são os que tomam essa decisão sobre o quê produzir, mas quase diferentes de eficiência: (i) eficiência técnica; (ii) eficiência alocativa; e (iii)
sempre cercados da necessária atenção para que não se decidam por algo que o eficiência de escala.
mercado possa vir a não acolher. Assinale-se que, em muitos casos, essa decisão
Aeficiência técnica assegura que, com os recursos disponíveis, a produção seja
advém de sinais emitidos pelo governo por meio de estímulos e desestímulos
maximizada, enquanto que a eficiência alocativa garante, para um dado nível de
produção e uma dada estrutura de preços dos vários insumos, uma alocação
9
Por economia fechada, pretende-se indicar a economia de um país que não se relacione economicamente com
perfeita dos recursos existentes entre as várias unidades produtivas. Vistas sob o
outro ou com outros países.
10
No caso de iniciativas no campo da indústria, por exemplo, facilidade de obtenção de matérias primas e utilidades
11
diversas como energia, água, vapor e outras inerentes ao processo produtivo, além da disponibilidade de mão de As intervenções governamentais na economia podem ocorrer sob a forma de subsídios, taxas, políticas de preços
obra, existência de vias de escoamento da produção, incentivos fiscais, entre outros fatores de oportunidade. mínimos, políticas de preços máximos, quotas de importação, critérios de racionamento e outras mais.

15
ângulo da economia, eficiências técnica e alocativa juntas asseguram que os Entretanto, economias puramente de mercado inexistem na prática. Em outras
custos sociais sejam minimizados. Sucede que a minimização dos custos sociais é palavras, o liberalismo econômico por completo em uma sociedade é impossível,
condição necessária para a maximização do benefício social líquido, mas não é pois os mercados imperfeitos implicam a necessidade de regulação, o que
suficiente. A condição de suficiência só é garantida com a eficiência de escala. significa presença do estado na economia. A própria teoria neoclássica, a doutrina
Eficiência de escala assegura, pois, para um dado nível de preços relativos, um que consagra a maior parte de seu corpo ao estudo dos mercados, reconheceessa
nível de produção ótimo12. Esses três conceitos de eficiência, quando circunstância e, mais do que isso, consagra numerosas páginas de seu conteúdo
considerados em conjunto, garantem que o benefício social líquido será aos mercados de monopólio, oligopólio e demais mercados imperfeitos 13. Em
maximizado. geral, os governos sempre interferem em seu funcionamento, em maior ou
menor grau, tornando as economias puras de mercado uma irrealidade.
9.3. Como distribuir a riqueza produzida
Subsídios, taxas, políticas de preços mínimos são, entre outras, algumas dessas
A distribuição da riqueza produzida constitui um desafio complexo da Política formas de intervenção.
Econômica, pois a busca de critérios justos de repartição dos bens e serviços
Nas economias de planificação centralizada, típicas dos regimes socialistas, a
produzidos tem sido, não raro, objeto de importantes disputas entre as classes
questão distributiva é resolvida por meio de uma instância de planejamento
sociais, que têm conduzido a fatos históricos marcantes. Essa questão já foi
integrante da estrutura do governo, a qual estabelece a forma de remuneração
passada em comentário, de certa forma, quando se tratou do consumo de luxo.
das diferentes profissões e ocupações, com a preocupação sempre presente de
O processo de distribuição envolve sobretudo a orientação emanada do governo evitar desníveis, contribuindo para a construção e manutenção de uma sociedade
que estabelece as linhas de sua Política Econômica, cujo princípio básico é o de menos heterogênea no que se refere ao acesso aos bens e serviços produzidos. A
contribuir para a melhoria do bem estar social. Por esses breves comentários, História do Pensamento Econômico analisa as principais características das
percebe-se claramente que a questão distributiva constitui um problema diversas formas de socialismo, com destaque para o socialismo utópico, o
econômico de grande significado, pois está no centro da abordagem de uma socialismo cristão, o anarquismo, o socialismo das guildas, o sindicalismo e o
discussão maior que se refere à evolução das doutrinas político-econômicas. socialismo marxista ou socialismo científico. De todas essas formas, a última, isto
Nas economias de mercado, por exemplo, a questão distributiva está é, o socialismo marxista, é a que mais profundamente estudou os meios de
intimamente relacionada com a renda das famílias, que pode variar, dependendo produção e distribuição da riqueza, desnudando o capitalismo, e criando a
do estágio de desenvolvimento econômico de cada economia, em um espectro expectativa do desaparecimento deste, o que não veio a ocorrer sobretudo por
amplo que vai desde uma repartição que possa ser considerada justa, até graus uma característica do agente capitalista que é a de negociar sempre e de adaptar-
acentuados, e mesmo insuportáveis, de disparidades entre segmentos extremos se continuadamente a novas condições que se lhe vão apresentando. No campo
da sociedade. dos estudos do socialismo, ressalta-se o estágio mais elevado a que uma
sociedade deve aspirar, qual seja o do comunismo, cujo slogan é: “de cada um, de
12 13
Esse nível ótimo de produção é o próprio tamanho, ou seja, a escala do empreendimento ou iniciativa Adicionalmente, são mercados imperfeitos a concorrência monopolística, o monopsônio, o oligopsônio, a
empresarial. concorrência monopsonística e o monopólio bilateral.

16
acordo com a sua habilidade, para cada um de acordo com suas necessidades”. A Adam Smith e David Ricardo argumentavam que o valor dos bens dependia da
contrapartida a esse slogan, no socialismo é: “de cada um, de acordo com a sua quantidade de trabalho utilizada para a sua produção. Seria este o valor real de
habilidade, para cada um de acordo com seu trabalho”. um bem no entendimento dos economistas clássicos. No entanto, admitiam esses
mesmos clássicos, como os bens são elaborados para transação em seus
Por fim, há os sistemas de economia mista. Nesses sistemas, a questão
respectivos mercados, neste contexto é o valor de troca que assume
distributiva se resolve pela atuação conjunta do sistema de preços e da ação do
preponderância. O valor de troca, já identificado como preço do bem e/ou
estado, que dirige ou apoia, de modo decisivo, algumas atividades produtivas,
serviço, se forma a partir das relações entre procura e oferta. Em outras palavras,
promovendo as condições de gratuidade na obtenção de determinados bens e
se determinado bem tem um valor real igual 100 unidades monetárias consoante
serviços essenciais, como a educação, saúde, transporte coletivo e outros mais. A
o argumento da doutrina clássica, e existe excesso de oferta desse bem no
social-democracia cujas origens remontam à fundação do Partido Social-
mercado, é possível que os compradores somente aceitem pagar 95 unidades
Democrata alemão em 1875 com a proeminência de Karl Kautsky, que dedicou
monetárias. Sejam quais forem as conjecturas a respeito do mercado desse bem,
seus estudos à economia agrária, é um regime que encontrou seu apogeu entre
o certo é que as transações somente serão levadas a efeito por um preço que seja
1945 e 1960. A bandeira empunhada pelo regime é a da defesa dos recursos
aceito tanto pelos produtores quanto pelos consumidores. Esse preço é chamado
públicos para garantir uma distribuição menos desigual da riqueza produzida
preço de equilíbrio. No exemplo comentado no período anterior, o preço de
mediante a expansão de programas nas áreas da saúde.
equilíbrio será aquele que os compradores concordem em pagar e, ao mesmo
10. Breves notas sobre as teorias do valor tempo, os vendedores aceitem receber.
As diversas teorias de valor dos bens, mercadorias e serviços são um dos temas Para as escolas Clássica e Socialista, entretanto, a lei da procura e da oferta opera
mais controvertidos em economia. A sucessão das doutrinas e, sobretudo, a como um mecanismo de ajustamento dos preços no mercado, por causas
explicitação do pensamento de alguns renomados pensadores foram muito ricas distintas, aproximando-os do valor real. Adicionalmente, a Escola Socialista
em termos de proposição de teorias para o valor. Bens e serviços heterogêneos aperfeiçoou a postulação dos clássicos sobre o valor-trabalho, introduzindo o
têm diferentes valores de troca, ou diferentes preços. As correntes de conceito do trabalho socialmente necessário para a produção de um bem. Isso
pensamento econômico têm procurado métodos concretos para explicar de que significa dizer que entre métodos distintos de elaboração industrial, o mais usual
dependem essas diferenças de preços e como calculá-los. Apesar de a questão do e mais eficiente é que deve refletir o valor-trabalho. Em outras palavras, métodos
valor não ter sido, até aqui, um problema inteiramente resolvido no corpo da antiquados, ou então artesanais, de produção, dos quais resultem índices de
teoria econômica, o conceito de valor de troca sedimentou-se como um sinônimo produtividade inferiores aos normais, não podem comandar a definição do valor-
de preço e, portanto, é variável mesmo quando analisado em relação a uma só trabalho. De outro lado, métodos produtivos muito avançados ainda em fase de
mercadoria que pode ter preços distintos em função de condições diferenciadas pesquisa e, portanto, ainda não disseminados comercialmente, mesmo que
que se situam em torno das transações. possam responder por índices de produtividade superiores aos normais, também
não devem nortear essa definição.

17
O valor-trabalho baseado no trabalho socialmente necessário é, pois, aquele Tome-se como exemplo a demanda por um bem qualquer. Conforme estuda-se
lastreado em processos que estejam ao alcance dos meios produtivos da no Capítulo 2 deste Curso, a função de demanda depende de alguns fatores como
sociedade. Além disso, o trabalho socialmente necessário que se incorpora ao o preço do bem, os gostos e preferências do consumidor, a renda do consumidor
valor de um bem é o trabalho que procede desde o início da cadeia produtiva, e os preços dos bens correlatos (substitutos e complementares). Na busca do
quando de seu estágio extrativo, até a produção da mercadoria que se esteja preço e da quantidade de equilíbrio que se procede mediante a aplicação da lei
avaliando, passando em seqüência por todas as etapas das relações intersetoriais. da procura e da oferta, brevemente estudada neste capítulo, utiliza-se uma
função de demanda do tipo q=f(p), onde “q” é a quantidade transacionada do
Aos bens econômicos estão associados os conceitos de valor de uso e valor de
bem ou serviço, e “p” é o preço deste bem ou serviço. A expressão dessa função
troca. O valor de uso depende do significado da satisfação preenchida, ou seja,
demonstra que a quantidade transacionada depende apenas do preço do bem, o
reflete a utilidade do bem para o consumidor. Refere-se com freqüência, como
que reflete uma simplificação do modelo em relação à realidade. Dito de outro
exemplo que bem elucida o conceito do valor de uso, ao exemplo de um
modo, o que é afirmado por essa função algébrica é que somente as variações de
indivíduo em pleno deserto, para quem um copo de água pode valer muito mais
preço do bem objeto da análise é que interessam entrar no cálculo.
do que uma pedra de diamante.
Evidentemente que essa análise considera que, em determinado momento, os
Para a Escola Marginalista, que aprofundou os estudos dos clássicos dando ênfase gostos e preferências tanto quanto as rendas dos consumidores não variem e
ao papel da procura como força primária do mecanismo de formação dos preços que, também, não variem os preços dos bens correlatos. O fato de não variarem
dos bens e/ou serviços, o valor de troca é regulado pelos preços das transações, esses outros elementos equivale a tê-los excluído na passagem da realidade para
os quais resultam da aplicação prática da lei da procura e da oferta. Segundo essa o modelo, considerando que mantiveram-se invariáveis. Esse artifício é
lei, comentada na seção 13 do presente Capítulo, os preços sobem quando há normalmente referido como a condição ceterisparibus, expressão latina muito
escassez do bem e/ou serviço e se reduzem quando há excesso de oferta. utilizada em economia que pode ser traduzida como “tudo o mais mantendo-se
11. O uso de modelos na análise de problemas econômicos inalterado”14.

O uso de modelos é tão comum em economia quanto na engenharia e em outras Os modelos são de grande utilidade para compreender-se a teoria econômica. Os
ciências experimentais. Os modelos são úteis para a análise de um problema da resultados que eles produzem precisam, entretanto, ser levados a teste,
realidade por simplificarem-na mediante a seleção das variáveis que mais afetam principalmente avaliando-se a sensibilidade do problema estudado em relação
o comportamento do problema estudado. O fato de constituírem uma aos fatores que foram mantidos inalterados, verificando-se como as variações em
simplificação da realidade significa que os modelos são conjuntos incompletos de cada um destes outros fatores que foram mantidos inalterados afetam o
informações relativas aos problemas do mundo real. O que parece, entretanto, resultado obtido mediante o uso do modelo. A seqüência de testes com esses
ser uma desvantagem, contrariamente constitui uma vantagem da adoção de outros fatores e a comparação dos novos resultados seqüenciais são capazes de
modelos porquanto serão avaliados apenas os pontos relevantes que interferem
no problema e sua solução.
14
Do latim ceteris (o resto, os restantes, os outros) par, paris (igual).

18
reproduzir a parte essencial do conjunto de elementos do mundo real que o dias de hoje, Portugal provavelmente deveria exportar ambos os produtos, isto é,
modelo original simplificou. com o deslocamento de capital inglês para produzir o tecido em Portugal. Na
época em que Ricardo apresentou sua proposta, ele recebeu crítica também por
tê-la baseado tão somente na teoria do valor-trabalho e por considerar ambientes
12. Vantagens comparativas de pleno emprego.
No período em que os economistas clássicos lideraram o debate econômico, dois
A teoria das vantagens comparativas pode ser aplicada entre regiões ou cidades
dos mais destacados autores da doutrina referiram-se ao comércio entre os
de um mesmo país, sem a dificuldade de ter-se que considerar a taxa de câmbio.
países. Adam Smith, autor de A riqueza das nações, propunha a ampliação
Suponha-se por exemplo que, dois estados brasileiros produzam café e feijão.
irrestrita do mercado externo e considerava que todos deveriam comprar as
Sejam Bahia e São Paulo esses estados e considere-se que o estado de São Paulo
mercadorias no país que oferecesse o preço mais barato. David Ricardo veio
seja duas vezes mais eficiente que a Bahia na produção de café e 1,5 vez mais
enriquecer a proposta de Smith por meio de um estudo que tornou-se conhecido
eficiente do que a Bahia na fabricação do feijão, com iguais cargas horárias de
como a teoria das vantagens comparativas, ou teoria dos custos comparativos, de
mão de obra em ambos os processos, conforme os dados do quadro da Figura
acordo com a qual, mesmo que o país “A” fosse mais eficiente do que o país “B”
01.04, cujos coeficientes de produtividade são fictícios.Embora São Paulo
na produção de todos os bens que ambos produzissem, esse país deveria
apresente uma vantagem absoluta nos dois produtos, sua vantagem é mais
exportar para “B” os bens em que fosse comparativamente bem mais eficiente e
significativa em relação ao café. A Bahia compete com uma desvantagem menor
importar de “B” aqueles bens em que fosse comparativamente menos eficiente,
no feijão.
ainda que ostentando eficiência maior do que a de “B”.

Na sua formulação, Ricardo exemplifica a relação entre a Inglaterra e Portugal Figura 01.04– Produção (fictícia) dos dois bens em cada um dos dois estados
SÃO PAULO BAHIA
quanto à produção de vinho e de tecido (algodão). Portugal era mais eficiente em HORAS DE PROD/HORA PROD TOTAL (t) PROD/HORA PROD TOTAL (t)
ambos os produtos, sendo três vezes mais eficiente em produção de vinho do que TRAB. (t/h) (t/h)
CAFÉ 700,00 90,00 63.000,00 30,00 21.000,00
em produção de tecido. Considerando apenas os custos de produção, Ricardo
FEIJÃO 300,00 60,00 18.000,00 50,00 15.000,00
propunha que Portugal exportasse vinho para a Inglaterra e importasse tecido
desse mesmo país. A intenção da proposta das vantagens comparativas é baseada Considere-se que os dois estados entrem em negociação da qual resulte a decisão
no fato de que, no exemplo em discussão, a Inglaterra se especializasse em de São Paulo somente produzir café e a Bahia somente produzir feijão com a
produzir apenas tecido e Portugal se especializasse apenas em vinho, efetuação de trocas destes produtos entre os dois estados. Considerando
abandonando a produção de tecido, com ganhos totais superiores aos que se adicionalmente que a expansão ou redução da produção em ambos os estados
produziriam se ambos os países continuassem a produzir ambas as mercadorias. ocorra a um custo constante por unidade produzida de qualquer dos produtos e
que os custos de transporte sejam nulos (ou iguais). As novas quantidades
Não estava presente na proposta de Ricardo a possibilidade de o capital de um produzidas em São Paulo e na Bahia são apresentadas no quadro da Figura 01.05,
país se instalar no outro país, situação que, uma vez ocorrendo como ocorre nos antes que sejam feitas trocas dos excedentes de produção.

19
exercite algumas variantes de negociação de preços em torno de um mesmo
exemplo.
dois bens com base nas vantagens
Figura 01.05– Produção dos
comparativas dos dois estados 13. Lei da Procura e da Oferta
SÃO PAULO BAHIA
HORAS A procura é um fenômeno observado no comportamento do consumidor
PROD/HORA PROD TOTAL (t) PROD/HORA (t/h) PROD TOTAL (t)
DE TRAB. (t/h) refletindo o desejo deste em obter determinado bem ou serviço. Alguns bens
CAFÉ 1000,00 90,00 90.000,00 ---- ---- e/ou serviços, por essenciais que são à sobrevivência humana, costumam ser
FEIJÃO 0,00 60,00 0,00 ---- ----
CAFÉ 0,00 ---- ---- 30,00 0,00 objeto de uma procura ditarígida, ou inelástica. Os alimentos básicos para uma
FEIJÃO 1000,00 ---- ---- 50,00 50.000,00 família são bens que fazem parte desse grupo. A adjetivação baseada na
elasticidade será desenvolvida no Capítulo 2.
Diante do resultado proporcionado pela especialização, São Paulo poderá
preservar as 63.000,00 t de café e oferecer à Bahia a diferença (90.000,00- Bens e/ou serviços, ditos de demanda elástica, podem deixar de ser comprados,
63.000,00) t em troca de 18.000,00 t ou mais de feijão, uma vez que a ou então podem ser substituídos por outros. Como já mencionado
produtividade paulista do café é igual a 1,5 vez a sua produtividade de feijão, anteriormente, a procura pelos bens e/ou serviços depende de fatores como a
donde (90.000,00-63.000,00)/1,5=18.000,00 t. renda do consumidor, seus gostos e preferências, o preço do bem e/ou serviço
desejado e a expectativa em torno da variação deste, além dos preços dos bens
De outro lado, a Bahia, que passou a produzir 50.000,00 t de feijão, pode
e/ou serviços correlatos.
preservar as 15.000,00 t que produzia antes e oferecer (50.000,00-15.000,00) t
em troca de 20.958,08 t ou mais de café, dado que sua produtividade de feijão é De outro lado, a oferta constitui um fenômeno resultante da atitude do produtor,
igual a (50,00/30,00)=1,67 vez a sua própria produtividade de café, donde invariavelmente movido pelo desejo de realizar lucro, de mobilizar fatores
(50.000,00-15.000,00)/1,67=20.958,00. Como há um espaço para negociação dos produtivos e elaborar bens e/ou serviços os quais ele põe à disposição do
preços relativos, uma transação possível corresponde à entrega por São Paulo à mercado consumidor, com o objetivo de transacionar. A oferta é influenciada pelo
Bahia das 27.000,00 t de café recebendo em troca as 27.000,00 t de feijão, preço do bem ou serviço 15, pelo custo dos fatores de produção, pela tecnologia
fazendo com que São Paulo fique, ao final, com 63.000,00 t de café e com disponível, pelos preços de bens e/ou serviços correlatos que, neste caso,
27.000,00 t de feijão, e, a Bahia, com 23.000,00 t de feijão e 27.000,00 t de café. refletem as condições da concorrência na oferta, além de fatores como, por
exemplo, a sazonalidade, a geografia, modismos e outros aspectos influentes
Esse resultado demonstra que ambos os estados ficaram economicamente
sobre a iniciativa do produtor.
melhor (better off) no que se refere às produções dos dois bens, consideradas as
simplificações adotadas. Entretanto, algumas condições relacionando número de O diagrama cartesiano da Figura 01.06 ilustra o mecanismo da procura e da
horas consagrado à produção de cada produto e índices de produtividade são oferta, que é o ponto de partida para a formação dos preços dos bens e/ou
necessárias para a confirmação da teoria proposta. Sugere-se ao aluno, a título de serviços. Sobre o eixo da variável independente marcam-se as quantidades
exercício, averiguar que possíveis condições serão essas. Sugere-se, ainda, que 15
Preço que o mercado consumidor aceita pagar, e efetivamente paga.

20
transacionadas e, sobre o eixo da variável dependente, marcam-se os preços. Solução
Analisando-se as duas curvas do referido diagrama, é possível constatar-se que,
O ponto de equilíbrioé determinado pela intersecção das duas funções, isto é,
para níveis elevados de preços, os produtores sinalizam, por meio da curva de
igualando-se demanda e oferta: 100-2q=10+4q, do que resultam p e=70 e q*=15. O
oferta “s”, que pretendem vender elevadas quantidades, enquanto que os
gráfico da Figura 01.07 ilustra esse resultado.
consumidores sinalizam, por meio da curva de demanda “d”, que pretendem
comprar pequenas quantidades do bem ou serviço. Fig. 01.07 –Equilíbrio da demanda e oferta

Analogamente, para níveis reduzidos de preços, os produtores sinalizam, por


meio da curva de oferta “s”, que pretendem vender baixas quantidades, enquanto
que os consumidores sinalizam, por meio da curva de demanda “d”, que
pretendem comprar elevadas quantidades do bem ou serviço. Em um e em outro
caso, surgem forças tendentes a levar níveis de preços e quantidades para um
ponto de equilíbrio, o ponto “E” do diagrama, correspondente ao preço p e, para o
qual consumidores e produtores estarão desejosos de comprar e de vender,
respectivamente, quantidades iguais do bem ou serviço.

Fig. 01.06 – Diagrama da lei da procura e da oferta


Observa-se que há consumidores que podem pagar um preço superior a 70
unidades monetárias, valor de equilíbrio a que se chegou por meio da aplicação
da lei da procura e da oferta. Mas todos pagarão o único preço de 70, que é o
preço de equilíbrio.Sabe-se, também, que há consumidores que não podem arcar
com o preço de equilíbrio de 70 unidades monetárias por unidade do bem ou
serviço transacionado. Diz-se desses consumidores que eles estão fora do
mercado do referido bem ou serviço. Esse aspecto da capacidade de pagamento
dos consumidores é abordado na seção imediatamente seguinte.

14. Excedentes econômicos

Exemplo de aplicação no 01.02 O cálculo dos excedentes econômicos em um mercado qualquer é feito
utilizando-se as curvas de demanda e oferta, cada uma em confronto com o nível
No mercado de determinado bem, a função de demanda ép=100-2q, e a função
de preço de equilíbrio. Ao confrontar-se a curva de demanda com o nível de
de oferta é dada porp=10+4q.Determinar as coordenadas do ponto de equilíbrio.
preço de equilíbrio encontra-se o excedente do consumidor e, analogamente, ao

21
confrontar-se a curva de oferta com o nível de preço de equilíbrio, encontra-se o corresponde à área (p1EpE). Ao preço que representa a disposição a pagar de cada
excedente do produtor. consumidor denomina-se preço de reserva desse consumidor.

Para efetuar-se esse cálculo, mede-se, em cada nível de quantidade, a diferença Há consumidores que, ao contrário de ostentarem uma disposição a pagar
entre a ordenada representativa da demanda e o preço de equilíbrio (excedente superior ao preço de equilíbrio, não têm condição econômica sequer para
do consumidor), e entre o preço de equilíbrio e a ordenada representativa da comprar o bem ou serviço. A representação da falta de capacidade de pagar
oferta (excedente do produtor). A seguir, apresenta-se mais detalhadamente esse desses consumidores é o trecho da curva de demanda à direita do ponto de
processo. equilíbrio. Nesse trecho da curva, todas as ordenadas são inferiores ao nível de
pE, o que significa que os consumidores aí representados estão fora do mercado
14.01. Excedente do consumidor
do bem ou serviço considerado.
Considere-se o mercado representado pelo gráfico da Figura 01.08, que se
Retomando a consideração do trecho da curva de demanda situado à esquerda
encontra em equilíbrio no ponto E, de coordenadas q* e pE. Todos os
de E, ponto de equilíbrio, a soma de todas as diferenças entre os preços de
consumidores que comprarem o produto pagarão o mesmo preço pE, que é o
reserva e o preço de equilíbrio pE corresponde à área situada por baixo da curva
preço de equilíbrio do mercado.
de demanda nesse trecho e acima da linha do próprio preço de equilíbrio.
Fig. 01.08 – Representação geométrica
do excedente do consumidor Analiticamente, o excedente do consumidor é determinado por meio da integral
definida no intervalo (0;q*), da forma seguinte:

Ec=∫0q*[f(q)-pE]dq ,

sendof(q) a função de demanda e pE a linha do preço. E o excedente unitário do


consumidor resultará da divisão do excedente total pela quantidade
transacionada do bem ou serviço, que é a quantidade de equilíbrio q*, isto é:

Ecunit=(1/q*).∫0q*[f(q)-pE]dq

14.02. Excedente do produtor

Por analogia à definição do excedente do consumidor, define-se o excedente do


No entanto, a maior parte dos consumidores que compra o produto pode pagar produtor como a massa de recursos monetários correspondente à área situada
mais do que o preço pE, de equilíbrio. O fato de as ordenadas de todos os pontos acima da curva de oferta no intervalo (0;q*) e abaixo da linha de preços pE, no
da curva de demanda à esquerda de E serem superiores ao nível de pE é indicativo mesmo intervalo. No diagrama da Figura 01.09, o excedente total do produtor
dessa disposição a pagar a maior que os consumidores que compram têm em corresponde à área (pEEp2) e o excedente unitário do produtor resulta da divisão
relação ao preço de equilíbrio do mercado. Assim, o excedente do consumidor do excedente total pela quantidade transacionada do bem ou serviço que é q*.

22
Fig. 01.09 – Representação geométrica do excedente do produtor O gráfico da Figura 01.10 mostra as duas funções, o ponto de intersecção e as
áreas representativas dos excedentes.

O cálculo dos excedentes é feito determinando-se as áreas seguintes:

(i) Para o excedente do produtor: Ep=(1.520x12)-∫012[400-(q2+80q+416)]dq,


donde Ep=18.240-[(q3/3)+(80q2/2)+416x]012, donde Ep=6.912; e

(ii) Para o excedente do consumidor: E c=∫(2.000-40q)-1.520]dq, donde


Ec=[2.000q-(40q2/2)-(1.520q)]012, donde Ec=[(2.000x12)(40x122/2)-
(1.520x12)], donde Ec=2.880.
Fig. 01.10 – Aplicação do cálculo de excedentes

Analiticamente, são representados pelas expressões seguintes:

Ep=∫0q*[pE-g(q)]dq ,

sendo g(q) a função de oferta. E o excedente unitário do produtor é expresso por:

Epunit=(1/q*).∫0q*[pE-g(q)]dq

Exemplo de aplicação 01.03:

Considere-se um bem que seja transacionado em um mercado competitivo no


qual a oferta é dada pela função p=q 2+80q+416 e a demanda é dada por
p=2.000-40q. Calcule as coordenadas do ponto de equilíbrio e, em seguida, O excedente do consumidor poderia ser calculado pelo método geométrico mais
determine os excedentes do produtor e do consumidor. rapidamente, da forma seguinte: Ec=[(2.000-1.520)x12]/2=2.880.
Solução 15. Fluxo circular da riqueza
O preço e quantidade de equilíbrio resultam de q 2+80q+416=2.000-40q, donde Nas diversas economias, a riqueza está em permanente circulação, movimento
q*=12, abandonando-se a raiz negativa (q*’=-132). Para q*=12, tem-se p E=1.520. este que pode variar, em intensidade e velocidade, em função de cada momento
ou fase. Com efeito, a compra de mercadorias e/ou serviços faz com que dois

23
fluxos se materializem: um primeiro movimento, o da mercadoria e/ou serviço, tem condição de comprar novas quantidades de recursos produtivos. Tais
que sai das mãos do produtor e segue em direção ao consumidor. E um segundo, recursos podem ser comprados a outras firmas, quando é o caso de matérias
de dinheiro, correspondendo ao pagamento, que se movimenta partindo das primas, energia e outros insumos, ou podem ser comprados do próprio
mãos do consumidor em direção ao produtor. Esses dois fluxos em sentido consumidor, quando é o caso do fator trabalho, o qual é vendido ao produtor em
contrário conformam o conjunto dos mercados de bens e/ou serviços de troca de salário.
consumo, mostrado na parte superior do esquema gráfico da Figura 01.11.
De outro lado, o consumidor que é proprietário de bens imóveis pode alugá-los a
Fig.01.11 – Fluxo circular da riqueza
produtores. O consumidor pode, ainda, ser possuidor de capital, o qual ele aplica
em troca de juros, ou faz investimento e, neste caso, em troca de lucros. O
consumidor, na maior parte dos casos, vende seu trabalho em troca de salário ou
outra forma de remuneração. O que é relevante observar é que há um fluxo dos
bens e/ou serviços de consumo e dos fatores de produção, que reflete o
comportamento da economia real; e um segundo fluxo, em sentido contrário, que
reflete a economia monetária.

Assinala-se que os dois fluxos, o da economia real e o da economia monetária,


não são absolutamente constantes em termos de velocidade. O comportamento
Na parte inferior da mesma Figura 01.11, encontram-se os mercados de fatores
dos agentes econômicos leva a que a velocidade de circulação tanto dos bens e
de produção. Nesses mercados, as famílias provêm as firmas com trabalho,
serviços quanto dos recursos financeiros possa sofrer reduções, ou mesmo
propriedades para uso, aplicações em dinheiro e, em contrapartida, recebem
interrupções, e impulsos. Essas reduções e impulsos são referidas como
salários, alugueis, juros e dividendos. Portanto, no referido esquema gráfico,
vazamentos e injeções, respectivamente.
enquanto os bens e serviços tanto quanto os fatores de produção fluem em
determinado sentido, no caso, dextrógiro, os pagamentos, seja pela compra dos A poupança que o consumidor faz constitui um vazamento no fluxo da economia
bens e serviços, seja pela compra dos fatores de produção, experimentam o monetária, do mesmo modo que um estoque involuntário de mercadorias que as
sentido oposto, ou seja, sinistrógiro. Mas esses dois sentidos poderiam ser firmas fazem pela frustração de não haver sido vendido conforme previsto são
representados exatamente ao contrário, isto é, a favor dos ponteiros do relógio vazamentos no fluxo da economia real.
para os pagamentos e contra os ponteiros do relógio para a movimentação dos
Os investimentos que as firmas fazem são, de outro lado, injeções no fluxo da
bens, serviços e fatores de produção. Não há uma convenção segundo a qual o
economia monetária dado tratar-se de um montante de recursos que não terão
sentido de giro seja fixo para cada um dos fluxos.
sido feitos com o emprego de recursos adicionais aos do fluxo monetário normal.
O fluxo circular da riqueza mostra claramente que o produtor recebe o Essa injeção costuma ocasionar impulso no fluxo da economia real.
pagamento pela venda de um bem ou serviço. Agora, de posse do dinheiro, ele

24
O gráfico da referida Figura 01.11, ainda que apresente uma versão socioeconômica, gerador de uma riquíssima trama de relações com praticamente
extremamente simplificada do fluxo circular da atividade econômica, também todas as demais ciências e técnicas.
pode ser considerado como uma versão atualizada e aperfeiçoada do Tableau
Ao estudar a evolução da sociedade humana, a Economia Política foi
Économique, de François Quesnay (expoente da fisiocracia), que historicamente
contribuindo, a cada avanço, com a construção da própria Teoria Econômica, com
representa um dos primeiros vestígios do conceito de circulação da riqueza. O
a qual praticamente se confunde. Desse modo, aEconomia Política, também
gráfico da Figura 01.11 não reflete, entretanto, a inteira realidade das economias,
referida como Teoria Econômica, se ocupa do estudo, em termos abstratos, dos
uma vez que ali está faltando o governo, que arrecada obrigações (tributos) dos
problemas econômicos, buscando estabelecer as leis e princípios que os regem.
contribuintes, formando uma massa de recursos com a qual presta serviços
públicos. Como ficaria, então, este gráfico se se lhe incluísse, em seu corpo, o De outro lado, a aplicação do conhecimento teórico da economia tem como
governo que, conforme mencionado, recebe pagamento das obrigações dos objetivo central dar sua contribuição para a promoção do desenvolvimento e do
contribuintes em troca da oferta, a estes, de serviços públicos? Essa indagação é bem estar social. Ao fazê-lo, tem como produto, a Política Econômica, ramo da
feita à guisa de provocação ao aluno, para que tente esboçar o gráfico do fluxo economia aplicada estreitamente relacionado com a Teoria Econômica ou
circular da riqueza em uma economia de mercado, incluindo, agora, a figura do Economia Política. Na formulação da Política Econômica, a macroeconomia e a
governo. microeconomia, principalmente a primeira, se apresentam como instrumentos de
grande relevância para o economista. A macroeconomia, em razão de as medidas
Por igual, pergunta-se, como apareceria, nesse desenho do fluxo circular da
de natureza macroeconômica atuarem sobre os agregados da economia, sendo
riqueza, o papel desempenhado pelo crédito, ou seja, o fato de o pagamento ser
capazes de produzir rapidamente efeitos de real significado para o conjunto da
feito a prazo pelo consumidor, porém recebido a vista pelo produtor? Deixa-se
sociedade. E a microeconomia, por atuar sobre o comportamento individual dos
mais esta inquietação para o aluno procurar representá-la graficamente. Por fim,
produtores, dos consumidores e sobre os diversos mercados formados por esses
como poderia ser representado, no mesmo gráfico do fluxo circular da riqueza o
produtores e consumidores. O conjunto de diretrizes emanadas tanto da
segmento da economia do meio ambiente, tendo em vista o caráter de bem
macroeconomia quanto da microeconomia influi de modo decisivo no
público dos recursos naturais de uso coletivo?
planejamento econômico, contribuindo para a definição de medidas econômicas
16. Economia, ciências e áreas afins específicas, para o planejamento regional, entre outros.

A Economia Política foi a primeira denominação dada à identificação e à Os comentários introdutórios acima permitem acrescentar uma série de ligações
abordagem do problema econômico. Seu objetivo é a análise da estrutura social que podem ser facilmente identificadas entre a economia e outras áreas do
da produção, o quê, desde já, implica contar com o auxílio de ciências afins conhecimento. A História Econômica é uma dessas áreas porquanto, ao buscar na
diversas. A Economia Política, ao estudar o mundo do qual o sêr humano faz fundamentação do pensamento econômico a referência que pode ser útil para a
parte, e que existe independentemente da vontade do ser humano, impõe-se, sociedade do presente e o desenvolvimento de sua economia, termina por
naturalmente, na condição de um ramo do conhecimento, de natureza constituir um rico instrumental de que a decisão de natureza econômica pode
lançar mão. Com efeito, a evolução histórica das civilizações é um verdadeiro

25
manancial de experiências reais, fazendo com que a pesquisa histórica se revista Outro campo do conhecimento com que a economia se relaciona é a
de incontestável utilidade para o trabalho do economista, fornecendo-lhe a Geografia.Geografia, sobretudo a que explora, em um de seus múltiplos
necessária localização − temporal e espacial − das atividades humanas, a natureza enfoques, os aspectos essencias da economia relacionados com o território e os
e a correlação dos acontecimentos, além da organicidade e evolução dos fatos. efeitos da atividade antrópica sobre o mesmo, estabelecendo as bases do
Nesse sentido, a História Econômica se justapõe à História do Pensamento conhecimento intitulado Geografia Econômica. Da simples descrição de divisões
Econômico, que se ocupa das distintas correntes de pensamento resultantes das político-administrativas, regimes climáticos, fisiografia e geomorfologia, a
interpretações que os economistas têm dado aos fenômenos econômicos. A Geografia evoluiu para novos estágios mediante o estudo e a análise dos fatores
História Econômica constitui, pois, importante referência do passado, ao mesmo produtivos, a demografia e seus movimentos migratórios, as condições geo-
tempo que é utilizada como elemento balizador das perspectivas do futuro, pois econômicas dos mercados regionais, a localização espacial dos fatores produtivos,
os fatos econômicos costumam se repetir, pelo menos em sua essência, o que faz as distintas formas de organização para a produção em diferentes regiões ou
da História Econômica um riquíssimo ferramental de trabalho do economista. países, além de inúmeras outras questões que a conectam com a economia. Não
é ocioso assinalar que a maior parte dos fenômenos econômicos está relacionada
As Finanças Públicas, ramo consagrado ao estudo dos objetivos e resultados
a uma ou mais localizações sobre a Terra, reforçando o significado da Geografia. E
econômicos e financeiros da gestão, conformam uma fatia robusta da própria
é justamente o conhecimento geográfico que torna razoável esperar-se que as
Economia do Setor Público, importante página do conhecimento econômico. É
economias das diversas regiões do mundo sigam padrões que estão
que as Finanças Públicas, ao tratarem da origem e aplicação dos recursos
intrinsecamente ligados a fatores geográficos que ocorrem regional e/ou
públicos, envolvem uma série de instituições e mecanismos que exercem, pelo
localmente. Por exemplo, a economia dos países do Oriente Médio é afetada de
seu papel, importante influência sobre o conhecimento econômico. Mais do que
maneira decisiva pelas questões relacionadas com a exploração do petróleo em
isso, as Finanças Públicas produzem indicadores de especial relevo nos contextos
razão da abundante ocorrência desse bem na região. Assim também, a título de
macro e micro econômicos, servindo para retroalimentar todo o processo de
exemplo, a economia de uma parte da região da Andaluzia, na Espanha, guarda
decisão e de formulação das políticas públicas setoriais e da própria Política
uma relação estreita com a agricultura das oliveiras e a produção de óleo de oliva.
Econômica.
Por igual, a economia gaúcha tem, como importante item de sua pauta, a
Adicionalmente, é importante considerar, nas relações com a economia, as produção vinícola, em razão dos parreirais abundantes em uma parte de seu
Finanças do Setor Privado, que se ocupam do planejamento e execução das território. A Bahia, por seu turno, incluiu no conjunto de suas mais expressivas
finanças das unidades produtivas, ou seja, a firma, que é a unidade de riquezas econômicas, por longas décadas, o cacau, como rubrica de grande
transformação dos fatores de produção em bens e serviços, diretos ou indiretos. importância para a sua economia.
O conjunto das Finanças Públicas e Privadas compreendem, por fim, um vasto
A Matemática também é um instrumental de grande valia para o estudo e
mundo de distintos mercados da moeda nos quais a aplicação de dinheiro é capaz
aplicação do conhecimento da economia, sendo extremamente útil para a
de produzir mais dinheiro, pondo em relevo a importância de seu estudo no
avaliação das variações quantitativas dos fenômenos econômicos.
contexto das diversas profissões e ocupações.
Particularmente, o cálculo diferencial é largamente empregado na economia

26
marginalista16, que baseia a maior parte de seus estudos nos diagramas da economia da firma, mediante a técnica dos balanços patrimoniais e de
cartesianos, incluindo funções de produção de custos e uma série de outros resultados, mostrando a real situação econômico-financeira das unidades
conceitos econômicos de elevado grau de recorrência ao conhecimento produtivas.
matemático. Temas outros como a álgebra matricial, de grande importância no
O Direito também é uma técnica intimamente ligada à economia. Essa relação
desenvolvimento da Teoria do Insumo e Produto, a geometria analítica e o
decorre do fato de que os fenômenos econômicos, ao refletirem as expectativas e
manejo das funções homogêneas, as equações diferenciais e as equações a
as ações dos agentes econômicos, o fazem sob um ordenamento dado pelas
diferenças finitas, todos esses importantes capítulos da Matemática constituem
normas jurídicas estabelecidas pelo estado, como um reflexo da vontade social. É
instrumental de trabalho do economista.
que, compete à matéria inerente ao campo jurídico, situar o ser humano, a firma
A Estatística, também amplamente utilizada em economia por meio dos cálculos e a sociedade diante do poder político e da natureza, estabelecendo obrigações e
econométricos que servem para identificar as diversas tendências dos fenômenos direitos, e dando, por conseguinte, o balizamento a esses agentes para o exercício
econômicos recorre, entre outros temas, à distribuição de probabilidades, à da atividade econômica. O que sucede é que a ação econômica põe em confronto
regressão e correlação, séries temporais, índices de preços, provendo o as esferas de interesses dos indivíduos, das empresas e dos governos, cada uma
economista com análises de grande realce no contexto de sua tomada de decisão. das quais em conflito potencial com as demais. Disso resulta que nenhuma ordem
econômica seja possível sem o necessário ordenamento jurídico, evidenciando a
Importante técnica que guarda afinidade com a economia é a Contabilidade. A
estreita relação entre economia e Direito. Veja-se, à guisa de exemplo, que a
Contabilidade atua praticamente em todos os níveis, do individual ao agregado,
regulação de um setor da economia − matéria com grande enfoque no Direito
no conjunto dos produtores, dos consumidores e do governo, enfeixando a
Administrativo −, ao afetar a vida de milhares de agentes econômicos, ditos
sistematização das contas globais de um estado em seu contexto nacional. O
administrados, exibe uma das mais significativas formas dessa relação entre
estudo da Contabilidade Nacional ocupa lugar de destaque no campo da
economia e Direito, pois a observância dos direitos dos administrados, tanto
macroeconomia, porquanto é por seu intermédio que se pode aferir a dinâmica e
quanto dos deveres destes, constitui requisito mandatório a ser observado nas
as tendências dos agregados econômicos. O conhecimento das diversas contas
ações de regulação.
nacionais17 é de extrema utilidade para se ter uma ideia de como se organiza e
como se comporta, em um dado momento, a economia de um país. A A Sociologia, ocupando-se do estudo das relações entre pessoas que convivem
Contabilidade desempenha um importante papel, conforme referido, no estudo em um mesmo grupo social ou em grupos sociais diferentes é um referencial
importante no contexto dos problemas econômicos. Em verdade, Sociologia e
16
O conceito de margem é essencial em economia, a ponto de refletir a essência do pensamento de uma das economia guardam estreitas e seculares ligações. Na Grécia antiga, fenômenos
doutrinas econômicas: a Escola Marginalista, ou Marshalliana (de Alfred Marshall).
17 sociais costumavam ser explicados pelos pensadores a partir da análise de fatores
A conta de produção, que reflete a identidade existente entre o Produto Nacional e as Despesas Nacionais; a conta
de apropriação, que mostra como a renda é distribuída entre consumo e poupança; a conta de capital, econômicos. Mais recentemente no curso da história, a maior parte dos autores
correspondente à identidade entre poupança e investimento; a conta-corrente de governo, que permite da Idade Média e do Renascimento ocupou-se do exame conjunto das lutas de
acompanhar o comportamento das receitas e despesas do setor público; e as contas externas, que retratam as
relações econômicas de um país com o resto do mundo. classes e os interesses econômicos. Mas somente no século XVIII é que economia

27
e Sociologia viriam a se fragmentar como partes distintas das ciências sociais. A Engenharia se reparte em um significativo número de modalidades, algumas
Essa divisão foi, em verdade, uma resposta ao “especialismo” científico que teve das quais surgiram da especialização de áreas tradicionais em que, no início, se
grande aceitação, à época. A mencionada separação sofreu, entretanto, a estruturou a profissão. Dificilmente, o estudo de alguma técnica da Engenharia
tentativa de retorno ao estado anterior de mesmo ramo do conhecimento, como deixará de referir-se, minimamente que seja, aos custos incorridos por suas
demonstra o argumento de Jean-Baptiste Say, em 1828, segundo o qual o etapas de desenvolvimento, o que pode ser tomado como importante vestígio da
desenvolvimento das ciências econômicas estaria subordinado à investigação que relação entre a Engenharia e a economia. Mas a questão econômica não se
os economistas deveriam fazer sobre a interrelação das partes do sistema social. esgota com a avaliação de custo simplesmente, permeando as técnicas e os
Esse argumento de Say foi um novo despertar para o significado da relação entre produtos da Engenharia com inúmeros outros mecanismos de abordagem. Entre
os dois ramos do conhecimento, pois a sua importância veio num crescendo tal esses mecanismos está a análise de custos e benefícios, essencial para medir o
que deu lugar ao aparecimento da Sociologia Econômica, fazendo aflorar o mérito de um projeto. A análise de custos e benefícios por seu turno se
entendimento segundo o qual os sociólogos se situam, em termos da produção e decompõe em análise privada (ou de mercado) e análise social, esta última se
colocação em disponibilidade do conhecimento, entre os principais grupos de ocupando do benefícios líquidos do projeto para o conjunto da sociedade.
tributários dos economistas.
Adicionalmente, a economia investiga, no contexto do estudo de mercados, o
A economia relaciona-se, também, com a área de conhecimento da Medicina e papel das firmas de Engenharia e os produtos que produzem, verificando e
Saúde Pública, de grande relevância para os estudos da economia do bem-estar analisando a lucratividade destas, a utilidade para os consumidores dos bens e/ou
social; com a Administração Pública e com a Administração de Empresas, quanto serviços produzidos, as externalidades geradas pelos processos produtivos,
aos aspectos de gestão das instituições públicas e das firmas respectivamente; positivas e negativas, o papel dos bens e/ou serviços na cadeia de relações
com as engenharias das diversas modalidades na abordagem a relevantes temas interssetoriais da economia do país ou região, e os impactos socioeconômicos
como os investimentos em obras e empreendimentos, custos operacionais, impostos para a frente e para trás, os mecanismos de formação de preços,
precificação dos bens e serviços; e, por fim, mas não exaurindo o tema, a especialmente os preços das utilidades públicas, a pertinência da tributação a que
economia está presente no recente debate sobre a Gestão do Meio Ambiente, estão submetidas as firmas de engenharia, os efeitos da inflação bem como os da
voltada para a racionalidade do uso e para a preservação dos recursos naturais. política de câmbio sobre sua atividade, entre inúmeros outros aspectos de
As relações da economia com as diversas modalidades da engenharia são interesse comum ao engenheiro e ao economista.
destacadas em uma seção individualizada considerando o interesse deste Curso
As abordagens acima brevemente mencionadas estão presentes na Engenharia
que é majoritariamente voltado para os estudantes de engenharia.
Aeronáutica em suas etapas de projeto, construção e manutenção de aeronaves,
naves espaciais, satélites, dirigíveis, balões e infraestrutura para o tráfego aéreo;
na Engenharia Agronômica, por meio de análises de cunho econômico na
17. Relação da economia com a engenharia em suas diversas áreas concepção, projeto, operação e manutenção de sistemas de irrigação e

28
drenagem, nas técnicas de aplicação de produtos fitossanitários, na agropecuária metálicas, por meio de tratamentos químicos e físicos. De sua atividade resultam
e no melhoramento animal e vegetal. os mais diversos produtos como chapas, vergalhões, perfis metálicos que darão
origem a um sem-número de produtos derivados que estão presentes nos
As referidas abordagens também agasalham as questões relativas à Engenharia
diversos tipos de mercado estudados na economia.
de Alimentos, especialmente no que toca ao aproveitamento dos produtos
agrícolas, da pecuária e da pesca para a fabricação, conservação, estoque, A economia se relaciona com a Engenharia de Minas, área do conhecimento
transporte e consumo de bens alimentícios; estão presentes também na voltada para o aproveitamento racional dos recursos minerais envolvendo a
Engenharia Civil nas atividades de projeto, construção, fiscalização e recuperação prospecção, o planejamento, a elaboração de projetos e a explotação
de estruturas de edifícios, rodovias, ferrovias, hidrovias, aeroportos, pontes, propriamente dita desses recursos, aí incluídas as águas subterrâneas. Relaciona-
túneis, barragens, canais, proteção de margens de cursos d’água e obras se, também, com a Engenharia Naval e seu objeto de trabalho que incorpora o
marítimas. Tais abordagens são igualmente relevantes para a Engenharia Elétrica projeto e construção de embarcações de todos os portes, incorporando as
especialmente no projeto, execução e manutenção de sistemas de geração a avaliações da dinâmica estrutural e da hidroninâmica das estruturas flutuantes, a
partir das diversas fontes, de transmissão e de distribuição de energia, além do propulsão e o controle direcional; o projeto e construção de plataformas
controle e automação, da eletrônica de potência e das telecomunicações. Estão marítimas, instalações portuárias, tráfego fluvial e marítimo, além das estruturas
presentes, também, nas atividades da Engenharia Florestal, incluindo o em alto-mar. O estudo dos mercados do transporte marítimo de cabotagem e
planejamento, a produção e o aperfeiçoamento da exploração madeireira longo-curso, que muito repercute sobre a Engenharia Naval serve, também,
observando a preservação dos recursos naturais; na Engenharia Industrial, como traço de união entre a economia e esta modalidade da engenharia.
mediante as atividades de operação e manutenção de linhas de produção fabril,
A Engenharia de Pesca também se relaciona com a economia pelo próprio caráter
suas máquinas e equipamentos, observando critérios que conduzam à elevação
de setor econômico que tem a atividade pesqueira. A transformação dos recursos
da produtividade industrial e ao controle de qualidade, relacionando-se
aqüícolas em produtos industrializados envolvendo a detecção, captura,
estreitamente com as áreas da engenharia mecânica, metalúrgica, elétrica,
conservação e beneficiamento dos cardumes forma uma cadeia produtiva de
química e com a química industrial.
especial relevância no contexto da economia sobretudo pela classificação como
Os estudos econômicos ainda se fazem presentes na Engenharia Mecânica nas gênero de primeira necessidade que representa a maior parte dos produtos
atividades de projetamento, acompanhamento da operação e manutenção dos gerados.
produtos da mecânica pesada como os guindastes, pontes e pórticos rolantes, as
Importante relação com a economia é exercida, também, pela Engenharia de
turbinas hidráulicas; dos produtos inerentes à fabricação em série como
Produção, que se ocupa de atividades estratégicas para a produção industrial em
determinados tipos de máquinas, motores e veículos; e dos produtos da
particular, e para a produção dos diversos ramos de negócios em geral, como o
mecânica fina que incluem instrumentos de precisão, de medição, entre outros. A
estudo e a definição da localização industrial, da racionalização do trabalho
economia permeia, também, o mundo da Engenharia Metalúrgica, que abrange a
mediante a avaliação dos métodos e dos estudos de tempos e movimentos, da
transformação secundária dos minerais transformando-os em metais e em ligas

29
administração dos materiais e da repercussão de todas estas atividades sobre a Engenharia Têxtil resulta ser um composto das engenharias química e mecânica,
economia e as finanças da empresa. pois o engenheiro têxtil também se envolve com o projeto e construção,
montagem, operação e manutenção das máquinas utilizadas no processo. Desse
A economia também se faz presente no ambiente da Engenharia Química,
modo, a Engenharia Têxtil traz os mesmos interesses para os estudos econômicos
envolvendo o desenvolvimento e operação do processamento industrial de
que são encontrados nas duas mencionadas modalidades de engenharia.
produtos químicos, estabelecendo a seqüência da linha de produção bem como o
dimensionamento dos equipamentos, com evidentes conseqüências sobre os Ao conjunto de atividades de engenharia sobre o qual ora se discorreu com
custos e a formação dos preços finais dos bens produzidos. Nesse mesmo ramo ênfase em suas relações com a economia, acrescentam-se as atividades da
da química, destaca-se a Química Industrial que também guarda relação com os pesquisa e desenvolvimento do produto e do processo, um imperativo da busca
estudos da economia, pois a realização dos experimentos e de análises químicas da eficiência econômica, reforçando as relações existentes entre as ciências
laboratoriais conduz ao desenvolvimento de novos materiais bem como a novas econômicas e cada uma das engenharias aqui alinhadas.
reações para o fabrico de produtos e artefatos químicos, exercendo influência na
18. Microeconomia e macroeconomia
oferta de bens e serviços e, portanto, afetando o sistema de preços relativos,
objeto do interesse dos estudos econômicos. A microeconomia e a macroeconomia são as duas grandes e principais áreas do
estudo da economia e se complementam no sentido de promover-se uma análise
A Engenharia Sanitária e Ambiental constitui um dos ramos da engenharia mais
ampla de um processo ou fenômeno econômico qualquer. A microeconomia, ou
fortemente relacionados com a economia. Essa circunstância resulta do fato de
teoria microeconômica, se ocupa do estudo do comportamento dos agentes
que os serviços providos pela Engenharia Sanitária e Ambiental são demandados
econômicos tomados individualmente. Temas como o comportamento do
pela totalidade da população e resultam de necessidades físicas absolutas e de
consumidor e o comportamento da firma são, por excelência, integrantes do
natureza coletiva, portanto de interesse prioritário das avaliações econômicas,
campo de estudo microeconômico. A relação entre a firma e o consumidor, tanto
especialmente as que conformam os estudos do bem estar social. Com efeito, o
quanto a relação da firma com os proprietários de fatores de produção, bem
abastecimento de água, o esgotamento e tratamento de águas residuárias, a
assim o estudo dos mercados e os mecanismos de formação de preços, são
drenagem urbana, a coleta, transporte e disposição dos resíduos sólidos, além do
inerentes à teoria microeconômica.
controle de vetores de enfermidades transmissíveis são atividades da Engenharia
Sanitária e Ambiental que correspondem a grandes programas governamentais A teoria macroeconômica, de outro lado, consagra seus estudos à avaliação do
de cunho social com potenciais efeitos positivos sobre o bem estar das comportamento dos agregados econômicos e não apenas de cada agente
populações, tema dos mais relevantes para os estudos econômicos. econômico tomado individualmente, como faz a teoria microeconômica. A
macroeconomia é, portanto, o estudo do conjunto de todos os consumidores,
Por fim, a economia também está presente nas atividades da Engenharia Têxtil
para o agregado consumidores, e do conjunto de todos os produtores, para o
que se ocupa da produção de tecidos envolvendo desde a fabricação de fios,
agregado de mesmo nome, bem assim do papel desempenhado pelo governo,
artificiais e sintéticos, bem como o tratamento de fios naturais, até as etapas de
que atua e interfere sobre as mencionadas variáveis agregadas. Essas variáveis
acabamento e confecção, passando pela tecelagem, tinturaria e estamparia. A

30
são a renda total das famílias, a poupança, o emprego, a taxa de inflação, a taxa
de juros, os produtos econômicos brutos, nacional e interno, o câmbio, entre
outras. Costuma-se afirmar, clássica e figurativamente, que a diferença entre 19. Economia normativa e economia positiva
microeconomia e macroeconomia é que a primeira se entrega ao estudo do
O estudo da economia pode se estruturar de acordo com duas perspectivas
comportamento da árvore, enquanto que a macroeconomia cuida do estudo do
distintas e bem definidas: a economia normativa e a economia positiva. A
conjunto da floresta, como que a vôo de pássaro, observando-a em seu
economia normativa, como indica seu qualificativo, está engajada na produção e
comportamento global.
emissão de conceitos e normas que guardam relação com juízos de valor, ou seja,
No passado, era corrente a opinião de autores segundo a qual o estudo da que indicam o que pode ser melhor e o que pode ser pior em termos de decisão
economia deveria se iniciar pela microeconomia, para, somente depois de sobre algum problema econômico. Em outras palavras e de modo bastante
adequadamente assimilado, passar ao campo da macroeconomia. Entendia-se amplo, a economia normativa indica como o mundo econômico deveria ser e se
que grandezas como as diversas modalidades de produto e de custos 18, além das desenvolver.
elasticidades, deveriam começar pela análise microeconômica porque, depois de
De outro lado, a economia positiva busca explicar como a economia funciona na
adequadamente assimiladas, sustentariam a boa compreensão dos conceitos
realidade, isto é, ocupa-se em verificar como os fenômenos econômicos podem
macroeconômicos. Atualmente, entretanto, há autores que veem com indiferença
ser analisados pelos fatos da vida real. Dito de outra maneira, as assertivas da
essa preocupação, considerando que a absorção do conhecimento de uma e
economia positiva precisam ser confirmadas pelas evidências empíricas, ou seja,
outra áreas pode se complementar em qualquer ordem, sem prejuízo para a
indicam como o mundo econômico efetivamente se desenvolve. Essas duas
didática. A recorrência mútua a conceitos de uma das duas áreas quando se
concepções alimentam-se mutuamente, aperfeiçoando o conhecimento científico
estuda a outra parece ser maior da macroeconomia em relação à microeconomia
da economia.
do que a recorrência no sentido oposto. Em outras palavras, ao estudar-se a
macroeconomia, recorre-se a conceitos de natureza microeconômica um maior 20. Comentários adicionais
número de vezes do que a quantidade de vezes que se recorre à macroeconomia Os temas deste Capítulo abrem espaço para os estudos específicos que serão
quando se procede ao estudo da análise microeconômica. Mas é razoável desenvolvidos ao longo do Curso. Em particular, buscou-se apresentar um
considerar que, em qualquer dos dois sentidos que se trafegue, o grau de panorama geral do espaço do conhecimento econômico, apresentando-se
recorrência não chega a ser tão elevado que a falta do estudo de uma das áreas algumas definições básicas como as de agentes econômicos, bens e serviços,
prejudique de todo a construção do conhecimento da outra. O que é certo conceitos de eficiência econômica, além de uma brevíssima referência a
afirmar-se é que o conhecimento completo de uma somente terá sido alcançado modalidades de sistemas econômicos. Adicionalmente, foram apresentados leves
quando concluído e bem assimilado estiver o estudo de ambas as áreas. traços dalei da procura e da oferta, do fluxo circular da riqueza e das teorias do
valor, como abordagem preliminar necessária à compreensão de conceitos que

18
Produtos médio, marginal e total; e custos médio, marginal e total.

31
serão discutidos quando eventualmente estes tópicos forem revisitados, em
capítulos posteriores.

Em relação ao conjunto de temas acima, alguns aspectos foram apenas


tangenciados, remetendo para capítulos futuros do Curso uma abordagem mais
ampla. O conteúdo deste Capítulo, mesmo com o grau de superficialidade com
que foi apresentado, é o suficiente para dar-se partida aos estudos econômicos
na extensão pretendida pelo programa desta disciplina. De sua firme assimilação
dependerá o bom aproveitamento dos pontos que serão estudados na
continuação do Curso.

32
O conhecimento do mecanismo de formação dos preços nos distintos tipos de
noções de microeconomia________________________________
mercados tem muitas utilidades. Uma dessas utilidades é a compreensão de
capítulo 2 como funciona uma economia de livre empresa. Apesar de a expressão economia
de livre empresa deixar transparecer que o grau de liberdade deste tipo de agente
econômico é amplo, a análise microeconômica serve para mostrar que a firma,
nessas economias, enfrentam limitações impostas ora por outras firmas que
dominam parcial ou totalmente determinado mercado, ora pela necessária
regulação econômica dos mercados ditos imperfeitos, além das crises cíclicas do
capitalismo e de outras causas exógenas que afetam seu funcionamento. Por isso
mesmo é que, além da concorrência perfeita de bens e serviços de consumo, e de
fatores produtivos, são estudados também os mercados oligopolísticos,
monopolísticos, de concorrência monopolística e os mercados oligopsonísticos,
monopsonísticos e de concorrência monopsonística, bem como o monopólio
bilateral, todos estes integrantes do conjunto de mercados imperfeitos.

A teoria dos preços, outra denominação que, conforme já referido, se dá, ainda
que menos freqüentemente, à microeconomia, também oferece instrumentos
analíticos que ensejam o controle governamental sobre a atividade econômica,
mais precisamente sobre preço, produção e lucro, além da avaliação de mudanças
no estado de bem estar social.

02. Oferta, procura e estática comparativa


01. Objeto do estudo da microeconomia
No Capítulo 1 deste Curso foi apresentada a lei da procura e da oferta, em
A microeconomia se ocupa do estudo do comportamento dos agentes
particular como se produz o equilíbrio entre estas duas funções representado por
econômicos observados individualmente e dos resultados obtidos por esses
uma quantidade e um preço do bem ou serviço sob análise. Quando dessa breve
agentes no âmbito de cada mercado. Esse estudo, normalmente partindo de uma
apresentação, as funções de demanda e oferta foram enunciadas sob a forma
condição de equilíbrio entre oferta e demanda, estabelece preços e quantidades
p=f(q), onde p é o preço e “q” é a quantidade do bem ou serviço.
transacionadas entre agentes que são, no caso mais generalizado, os indivíduos e
as firmas. Por tratar do tema dos preços com acentuada freqüência, a Apesar da simplicidade da expressão algébrica acima referida, o que está por trás
microeconomia é também referida como teoria dos preços. de seu significado é que tanto oferta quanto demanda relacionam, também, o
preço e a quantidade com outras variáveis que não aparecem na fórmula porque

33
são tomadas como fixas para efeito da análise. Em outras palavras, ceteris paribus paribus fez aumentar a demanda e, conseqüentemente, o preço e a quantidade
p=f(q) como função inversa19 de demanda ou oferta respectivamente, e q=g(p) do bem ou serviço.
como função direta de demanda ou oferta são simplificações de expressões mais Fig. 02.01 – Comportamento da curva de demanda face
elaboradas, do tipo: ao aumento da renda do consumidor

p=f(q,M,pc)

Onde:

p é o preço do bem ou serviço;

q é a quantidade demandada;

M é a renda do consumidor; e

pc é o preço de um bem ou serviço correlato.

Nessa expressão estão omitidos adrede os gostos e preferências do consumidor,


uma variável a ser explorada na seção que se ocupa das utilidades e preferências
deste, ainda no presente Capítulo. Conforme se percebe, ao enunciar a expressão
simplificada p=f(q), implicitamente considera-se que as demais variáveis não se
alteram, uma abstração inerente a modelos de análise. Entretanto, uma alteração Exemplo de aplicação 02.01
em alguma dessas variáveis outras que não a quantidade promoverá um A função de demanda por determinado bem é p=48/q e a função de oferta é
deslocamento da curva de demanda. Por exemplo, um aumento na renda do p=10+2q. O aumento do salário mínimo repercutiu sobre a demanda fazendo-a
consumidor gera um deslocamento da curva de demanda para cima, o que deslocar-se para a direita e para cima de tal modo que sua nova expressão
implica movê-la também para a direita, enquanto que uma redução da renda faz passou a ser p=72/q. Determine preço e quantidade de equilíbrio antes e depois
com a mesma curva tenha sua posição alterada deslocando-se para baixo, o que do aumento do salário mínimo.
implica deslocá-la também para a esquerda. O gráfico da Figura 02.01 ilustra o
Solução
caso de um aumento de renda ao mostrar o deslocamento da função de
demanda de D para D’. Portanto, o aumento da renda do consumidor ceteris Antes do aumento do salário mínimo, o equilíbrio resultava de: 48/q 1=10+2q1,
donde 2q12+10q1-48=0, donde q1*=3 (desprezando-se a raiz negativa por não ter
significado económico neste caso20). Depois do aumento do salário mínimo, o
19
A função inversa de demanda é a que explicita preço em relação à quantidade demandada e a função direta de
demanda é a que explicita quantidade demandada em relação a preço. Analogamente, a função inversa de oferta é a
equilíbrio passa a ser obtido a partir de 72/q 2=10+2q2, donde 2q22+10q2-72=0,
que explicita preço em relação à quantidade ofertada e a função direta de oferta é a que explicita a quantidade
20
ofertada em relação a preço. Trata-se de uma quantidade negativa.

34
donde q2*=4, igualmente desprezando-se a menor raiz. Os preços antes e depois T é o grau de tecnologia empregado.
do deslocamento da função de demanda, p E1 e pE2 são: pE1=10+(2x3) donde
O grau de tecnologia empregado se manifesta por meio da função de produção, a
pE1=16; e pE2=10+(2x4) donde pE2=18, correspondentes aos pontos de equilíbrio E
qual se transmite à função de custo, função, esta última, cuja curva marginal
e E’, respectivamente. O gráfico da Figura 02.02 ilustra essa mudança de ponto de
(primeira derivada em relação à quantidade) em seu ramo ascendente, como ver-
equilíbrio.
se-á neste Capítulo, corresponde à curva de oferta da firma. O gráfico da Figura
Fig. 02.02 – Deslocamento da curva de demanda e novo equilíbrio 02.03 ilustra o caso de uma redução nos preços dos insumos ao mostrar o
deslocamento da função de oferta de S para S’.
Fig. 02.03 – Comportamento da curva de oferta face
à redução nos preços dos insumos

A função de oferta é tratada de maneira análoga, ou seja, de modo mais


elaborado, essa função pode ser escrita como se segue: A redução dos preços dos insumos ceteris paribus fez aumentar a oferta e, em
conseqüência, reduzir o preço e aumentar a quantidade ofertada do bem ou
p=g(q,pi,pc,T),
serviço.
Onde:
Exemplo de aplicação 02.02
p é o preço do bem ou serviço;
A função de demanda por determinado bem é p=22,25-0,5q 2 e a função de oferta
q é a quantidade ofertada; é dada por p=6,25+0,5q2. Os preços dos insumos utilizados na produção desse
pi é o preço de cada insumo utilizado na produção; bem se reduziram e os produtores expandiram a oferta cuja função passou a ser

pc é o preço de um bem ou serviço correlato; e

35
p=2+0,5q2. Determine preço e quantidade de equilíbrio antes e depois da redução agentes econômicos, como também inibir mercados de desbens21, estimular
dos preços dos insumos. mercados de bens e serviços essenciais, limitar preços, garantir preços mínimos,
entre outros.
Solução
No espaço deste Curso, são abordados alguns tipos de interferências
Antes da redução dos preços dos insumos, o equilíbrio é alcançado quando:
governamentais no equilíbrio de mercados. Particularmente serão comentados os
0,5q12+6,25=22,25-0,5q12, donde q1*=4, desprezando a raiz negativa. Depois da
efeitos que são exercidos pelos tributos, subsídios e políticas de preços máximo e
redução dos preços dos insumos, o equilíbrio passa a resultar de 0,5q 22+2=22,25-
mínimo sobre o equilíbrio de mercados.
0,5q22, donde q2=4,5. Os preços antes e depois são, respectivamente, p E1=22,5-
(0,5x42), donde pE1=14,5; e pE2=22,5-(0,5x4,52), donde pE1=12,38. O gráfico da 03.01. Tributos
Figura 02.04 ilustra essa mudança de ponto de equilíbrio.
Os tributos são obrigações fiscais que têm vários objetivos, sendo os principais os
Fig. 02.04 – Deslocamento da curva de demanda e novo equilíbrio de arrecadar recursos para a manutenção da estrutura da administração pública e
para os investimentos que o governo precisa realizar, ao mesmo tempo que
servem para inibir mercados de determinados bens e serviços que, por razões de
políticas públicas, devam ter seu crescimento contido ou mesmo contraído.

Os tributos, que podem ser classificados como impostos, taxas, contribuição de


melhoria, entre outros, interferem no equilíbrio de um mercado criando dois
níveis de preços, um ao produtor (pp) e outro ao consumidor (pc), além de gerar
arrecadação, como ilustra o gráfico da Figura 02.08. A arrecadação do governo
corresponde à área do retângulo pcCFpp.

Com a introdução do tributo, o preço ao consumidor passa a ser mais elevado do


que era antes, e o preço ao produtor se reduz em relação a seu nível original. Esse
nível original de preço corresponde ao preço de equilíbrio que era o mesmo para
produtores e consumidores (pE da mencionada Figura 02.08).

Ora, se o consumidor passa a pagar mais do que antes pagava e o produtor passa
03. Interferências governamentais na economia a receber menos do que antes recebia, ambos se inclinam a transacionar uma
quantidade menor, inclinação esta que reflete um dos objetivos da aplicação do
Na sua missão de assistir à sociedade mediante a oferta de bens e serviços
públicos, o setor público também exerce um papel regulador da economia. Esse 21
No linguajar dos economistas (jornalisticamente denominado economês), um desbem é um não-bem, também
referido como um mal. A fumaça de cigarros fumados em ambientes fechados ou semi-fechados bem como as
papel decorre da necessidade de combater práticas abusivas de parte de alguns drogas não aceitas socialmente, além da poluição produzida são exemplos de males ou desbens.

36
tributo. A criação de um tributo altera os excedentes do consumidor e do Solução
produtor reduzindo-os, e gera o que se denomina peso morto, que é o custo
O equilíbrio do mercado é alcançado quando demanda e oferta se igualam, isto é
social do tributo.
100-3p=4+5q, donde p=pE=12 e q=q*=4+(5x12), donde q*=64.
Fig. 02.08 – Efeitos da tributação
O gráfico da Figura 02.09 apresenta as funções de demanda e oferta, as
coordenadas do ponto de equilíbrio ora calculadas e as áreas dos excedentes,
além dos elementos que refletem a incidência do imposto, este último
representado pelo segmento de reta BC e as consequências que este produz, ou
seja, novos excedentes e peso morto.

Para determinar-se a nova quantidade de equilíbrio, iguala-se a 3,20 u.m. a


diferença entre as funções de demanda e oferta explicitadas em relação ao preço,
ou seja:

(100/3)-(q/3)-[(-4/5)+(q/5)]=3,20,

Donde:

q*’=58
Na referida Figura 02.08, o excedente do consumidor se alterou de AEpE para Conhecido o valor de q*’, determinam-se pc e pp, entrando-se, para tanto, com o
ACpc, o excedente do produtor sofreu redução de pEEB para ppFB, a arrecadação valor de q*’ nas funções de demanda e oferta, respectivamente:
do governo foi igual à área do retângulo pcCFpp e o peso morto corresponde ao
pc=(100/3)-(58/3), e
triângulo CEF. A identificação do peso morto é feita ao observar-se que parte das
figuras do diagrama representam riquezas de que nem produtores nem pp=(-4/5)+(58/5)
consumidores tampouco o governo se apropriam. Donde pc=14 e pp=10,8.
Exemplo de aplicação 02.03: Os excedentes do produtor e do consumidor antes da introdução do imposto
O mercado de determinado bem é regido pela função de demanda q=100-3p, e serão respectivamente as áreas do triângulo AEp E e do trapézio pEEF0. Como
pela função de oferta q=4+5p. Suponha que o governo crie um imposto de T=3,20 ambas as funções são lineares, o cálculo de áreas será feito por geometria.
u.m. (unidades monetárias) por u.f. (unidade física) transacionada. Determine, Cálculo da área do triângulo AEpE:
com esses dados, os excedentes antes e depois da aplicação do imposto e a
magnitude do peso morto. Ec=[(33,33-12)x64]x(1/2)

37
Donde Donde

Ec=682,56 E’p=334,80
Fig. 02.09 – Aplicação de um tributo
O peso morto (PM) do imposto corresponde à área do triângulo BEC, igual a:

PM=[(64-58)(14-10,8)]/2

Donde

PM=12,80

Finalmente, as reduções dos excedentes do consumidor e do produtor foram,


respectivamente, iguais a:

ΔEc=682,56-560,57

ΔEp=473,60-334,80
Cálculo da área do trapézio pEEF0:
Donde
Ep=[12+(12-10,80)]/2]x64
ΔEc=121,99
Donde
ΔEp=138,80
Ep=473,60
03.02. Subsídios
Os excedentes do produtor e do consumidor depois da introdução do imposto
serão respectivamente as áreas do triângulo ABp C e do trapézio ppCF0: Os subsídios são o oposto dos tributos. São recursos que o governo dá a fundo
perdido aos agentes de mercado de determinado bem ou serviço com a
Cálculo da área do triângulo ABpC: finalidade de estimular este mercado a crescer. Ao se subsidiar um setor, criam-
E’c=[(33,33-14)x58]x(1/2) se, como também sucede com os tributos, dois níveis de preços, um ao
consumidor (pc) e outro ao produtor (pp).
Donde
A diferença em relação ao tributo é que, no caso do subsídio, o preço ao
E’c=560,57
consumidor decresce em relação ao preço de equilíbrio enquanto que o preço ao
Cálculo da área do trapézio ppCF0: produtor cresce em relação ao preço de equilíbrio. Esses dois estímulos fazem
com que ambos os agentes se inclinem a aumentar a quantidade transacionada,
E’p=(58+4)/2]x10,8
como mostra o gráfico da Figura 02.10.

38
A criação de um subsídio altera os excedentes do consumidor e do produtor consumidor antes e depois da aplicação do subsídio, mostrando a variação
aumentando-os, e gera, também, o que se denomina peso morto, que é o custo experimentada por cada um dos dois excedentes. Determinar também o peso
social do subsídio. morto.

Solução

O equilíbrio inicial é alcançado quando 220-q=60+4q, donde q*=32 e


Fig. 02.10 – Efeitos do subsídio pE=60+(4x32), donde pE=188. O gráfico da Figura 02.11 apresenta as funções de
demanda e oferta, as coordenadas do ponto de equilíbrio ora calculadas e as
áreas dos excedentes, além dos elementos que refletem a incidência do subsídio,
este último representado pelo segmento de reta CF e as consequências que este
produz, ou seja, novos excedentes e peso morto.
Fig. 02.11 – Aplicação de um subsídio

Na referida Figura 02.08, o excedente do consumidor se alterou de AEpE para


AFpc, o excedente do produtor ampliou-se de pEEB para ppCB, o montante
subsidiado pelo governo foi igual à área do retângulo ppCFpc e o peso morto
corresponde ao triângulo ECF. A identificação do peso morto é feita ao observar-
se que parte das figuras do diagrama representam riquezas de que nem
produtores nem consumidores tampouco o governo se apropria.

Exemplo de aplicação 02.04: Para determinar-se a nova quantidade de equilíbrio, iguala-se a 20 u.m. a
diferença entre as funções de demanda e oferta explicitadas em relação ao preço,
Suponha-se que o governo pretenda subsidiar determinado setor da economia
ou seja:
cujas funções inversas de procura e oferta são, respectivamente, p=220-q e
p=60+4q. As bases de cálculo desse subsídio são fixas, à razão de 20 u.m. 60+4q-220+q=20,
Determinar o equilíbrio inicial desse mercado e os excedentes do produtor e do

39
Donde: Donde:

q*’=36 Ep=(188x32)—[(60x32)+(4x322/2)],

Conhecido o valor de q*’, determinam-se pc e pp, entrando-se, para tanto, com o Donde:
valor de q*’ nas funções de demanda e oferta, respectivamente:
EP=2.048.
pc=220-36, e
Após a implantação do subsídio, o excedente do consumidor será a área do
pp=60+(4x36) triângulo AFpc, e o excedente do produtor será a área do triângulo ppCB.

Donde pc=188 e pp=204. Cálculo da área do triângulo AFpc

Os excedentes do produtor e do consumidor antes da introdução do imposto E’c=o∫36(220-q)dq-p.q*’


serão respectivamente as áreas dos triângulos p EEB e do trapézio AEp E. Mesmo
Donde:
em se tratando de funções são lineares (oferta e demanda), o cálculo de áreas
será feito por meio da integral definida, a exceção da área sob a função da linha E’c= [220q-(q2/2)]o36-p.q*’,
de preço que será determinada geometricamente, como se segue: Donde:
Cálculo da área do triângulo AEpE: E’c=(220x36)-(362/2)-(184x36),
Ec=o∫32(220-q)dq-pE.q*, Donde:
Donde E’c=648.
2 32
Ec=[220q-(q /2)]o -(188x32), Cálculo da área do triângulo ppCB
Donde E’p=(pp.q*’)-[o∫36(60+4q)dq],
Ec=[(220x32)-(322/2)]-(188x32), Donde:
Donde Ec=512. E’p=(204x36)-[60q+(4q2/2)]o36,
Cálculo da área do triângulo pEEB: Donde:
32
Ep=(188x32)-[o∫ (60+4q)dq], E’p=(204x36)-[(60x36)+(4x362/2)]-[(-10x100),
Donde: Donde:
Ep=(188x32)[60q+(4q /2)] ,2
o
32

40
E’p=2.592. essa política, o governo está obrigando a que a função de oferta original S seja
modificada para a linha poligonal pmáxDS’23.
O peso morto (PM) do subsídio corresponde à área do triângulo ECF, igual a:
No mencionado gráfico, o excedente do consumidor que deveria variar do
PM=[(204-184)(36-32)]/2
triângulo AEpE para o trapézio ACDpmáx, resulta, por força do ágio, diminuído para
Donde o triângulo ACpc. De outro lado, o excedente do produtor, que deveria reduzir-se
PM=40 do triângulo pEEB para o triângulo pmáxDB termina, em razão do ágio cobrado,
aumentando para um montante equivalente à área do trapézio pcCDB.
Finalmente, os incrementos observados nos excedentes do consumidor e do
produtor foram, respectivamente, iguais a: Fig. 02.12 – Efeitos da política de preço máximo

ΔEc=648-512

ΔEp=2592-2048

Donde

ΔEc=136

ΔEp=544

03.03. Política de preço máximo

A política de preço máximo corresponde ao que, na prática, também é referido


como tabelamento de preço de algumas mercadoriais e serviços. Essa limitação é
feita em um nível de preço inferior ao preço de equilíbrio e corresponde a uma
tentativa de proteção ao consumidor ampliando seu excedente em detrimento do
produtor que vê seu excedente se reduzir. O gráfico da Figura 02.12 apresenta o A política de preço máximo gera um peso morto equivalente à área do triângulo
mecanismo da imposição de um preço máximo ao produtor. CED. O ágio total cobrado é igual à área do retângulo pcCDpmáx, e o ágio por
A política de preço máximo, quando generalizada para vários bens e serviços, unidade do bem ou serviço transacionado é igual ao segmento pc-pmáx.
costuma ser infrutífera, pois o produtor a ela reage cobrando ágio do consumidor
por meio de operações quase sempre ocultadas à fiscalização 22. Ao estabelecer

23
Trata-se de uma função que é infinitamente elástica entre as abcissas 0 e a que se situa no ponto
22
Quando a fiscalização é eficiente, o produtor simplesmente passa a ofertar menos ou até mesmo deixa dee infinitesimalmente vizinho à esquerda de q*’, e perfeitamente inelástica em q*’. Os conceitos de elasticidade são
ofertar a totalidade do que ofertava antes da introdução da nova política. apresentados neste Capítulo.

41
Exemplo de aplicação 02.05.

O governo resolve tabelar o preço de determinada mercadoria. As funções de


demanda e oferta são, respectivamente, q=240-4p e q=20+p e o preço máximo
que o governo admite para essa mercadoria é de 30 u.m. Determine as condições
de equilíbrio antes e depois da imposição do referido preço máximo, e calcule o
ágio que os consumidores estariam dispostos a pagar.

Solução

O equilíbrio inicial é dado por q d=qs, donde 240-4p=20+p, donde p E=44 e


q*=20+44, donde q*=64. Com a introdução da política de preço máximo, a oferta
se limita a determinado nível, indicado por q*’, que é obtido entrando-se com o
03.04. Política de preço mínimo
pmáx na função de oferta, ou seja: q*’=20+p máx, donde q*’=20+30, donde q*’=50.
A política de preço mínimo, normalmente aplicada à oferta de produtos agrícolas,
A contração da oferta faz com que os consumidores se disponham a pagar mais
representa a garantia, dada pelo governo, de um preço adequado ao produtor,
do que o preço de equilíbrio inicial e o preço que os consumidores se disporão a
para que este se sinta estimulado a aumentar ou pelo menos manter seu nível de
pagar é obtido entrando-se com o valor de q*’na função de demanda. Daí:
produção.
50=240-4pd, donde pd=47,50. Portanto, o ágio que os consumidores se dispõem a
pagar é igual a pd-pmáx, isto é, igual a 47,50-30=17,50. A Figura 02.13 ilustra o Com a compra, o governo assegura estoques que vão sendo desovados conforme
comportamento desse mercado submetido à política de preço máximo. a demanda, fazendo desaparecer o problema da escassez de oferta durante a
entressafra. O gráfico da Figura 02.14 ilustra o mecanismo da política de preço
Fig. 02.13 – Aplicação do tabelamento de preço (política de preço máximo)
mínimo.

O gráfico da mencionada Figura 02.14 mostra que o gasto total do governo é


representado pelo retângulo FCq*’G, o excedente do consumidor se reduz da
área do triângulo AEpE para a área do triângulo AFpmín, enquanto que o excedente
do produtor se amplia da área do triângulo pEEB para a área do triângulo pmínCB.

Não há como avaliar-se, pelo menos aprioristicamente, o peso morto, uma vez
que o escoamento dos estoques formados se dá em prazos imprevisíveis, às vezes
superando alguns anos e obedecendo a uma política de preços que pode não ser
mais a mesma do ano em que o preço mínimo houver sido implementado.

42
O agente financeiro da política de preço mínimo é o Banco do Brasil por meio de qd=66.200-400p e qs=-1.000+200p. O preço mínimo que o governo quer assegurar
sua carteira agrícola. Os estoques são armazenados em silos de manutenção ao produtor é pmín=120. Determine as condições de equilíbrio antes e depois da
relativamente onerosa, de propriedade da Companhia Nacional de aplicação da política de preço mínimo bem como o gasto total do governo
Abastecimento, vinculada ao Ministério da Agricultura.
Solução

As condições do equilíbrio inicial são obtidas a partir de q d=qs, donde 66.200-


400p=-1.000+200p, donde pE=112 e q*=21.400. Com a introdução de p mín=120,
surgirão duas quantidades de equilíbrio, a do consumidor e a do produtor,
determinadas por meio das expressões seguintes: q d’=66.200-(400x120) e qs’=-
Fig. 02. 14 – Efeitos da política de preço mínimo
1.000+(200x120), donde qd’=18.200 e qs’=23.000. E o gasto total do governo será
dado por GG=(qs’-qd’)xpmín=(23.000-18.200)x120, donde GG=576.000. A Figura
02.15 mostra em diagrama cartesiano o resultado da aplicação dessa política de
preço mínimo.

Fig. 02.15 – Aplicação da política de preços mínimos

Exemplo de aplicação 02.06.

Um produto agrícola está sujeito a uma política de preço mínimo determinada


pelo governo que pretende assegurar um nível de preço que, ao mesmo tempo
estimule o produtor a produzi-lo e ajude o consumidor a comprá-lo na entre
03.05. Outros tipos de interferência do governo no equilíbrio de mercado
safra. As funções de demanda e oferta desse produto são, respectivamente,

43
Além das interferências do governo sobre o equilíbrio de mercados acima iguais tipos de solicitação, pressão, ou demandas de mercado, todas as firmas
apresentadas, há outras formas de intervenção governamental nos mercados. reagem de modo igual, na forma da firma representativa (firma típica), embora,
Destacam-se, entre essas outras, as políticas de quotas de importação e as na prática, sistemas organizacionais complexos possam responder de maneiras
políticas de racionamento. As primeiras objetivam a proteção do produtor diferentes a um mesmo tipo de pressão. Esses sistemas complexos ― em geral
doméstico, restringindo a entrada de produtos estrangeiros no país e, com isto, firmas grandes ― são comumente encontrados em mercados imperfeitos como o
reduzindo a dificuldade dos produtores internos em razão de um regime oligopólio e o monopólio, por exemplo, também abordados neste capítulo. Em
competitivo menos acirrado. Recentemente (março de 2012), o governo brasileiro outras palavras, o conceito de firma típica adotado em microeconomia traduz a
estabeleceu uma política de quotas para a entrada de automóveis mexicanos no concepção de uma firma que reflita a média do comportamento de todas as
país. firmas do conjunto. Traduz, em outras palavras, a substituição das “n” diferentes
firmas de um mercado por “n” firmas típicas que, ao atuarem, estariam
O racionamento, de sua vez, é aplicado em situações muito específicas quando a
reproduzindo e o resultado do comportamento do mercado tal como ele é. É
solução do problema de escassez de determinado bem ou serviço essencial torna-
como se todas as firmas de um mercado pudessem ser consideradas invólucros
se difícil. É comum ocorrer em situações de conflitos entre países quando os
com o mesmo conteúdo, o que manteria a homogeneidade de comportamento
esforços são dirigidos para as frentes de luta e determinados bens são raros no
entre elas.
país, apesar de serem básicos.
A Teoria da Firma é decomposta no estudo da produção (Teoria da Produção) e
04. Teoria da Firma
dos custos (Teoria dos Custos) à mesma associados, e na Teoria dos Rendimentos
Entre as diversas definições que podem ser dadas para a firma, uma das mais e Lucros. A conduta racional da firma resume-se praticamente à perseguição da
simples é a que a considera como uma unidade técnica que produz bens e/ou maximização de seu lucro, única forma de crescimento e sobrevivência perenes.
serviços para vendê-los auferindo lucro. Na Análise Microeconômica, o estudo da Sendo assim, no processo de estudo de equilíbrio de um mercado, qualquer que
firma está voltado para a sua produção, aqui tomada no sentido quantitativo do seja a modalidade deste, o ponto de partida para a análise da conduta da firma é
que é produzido, a sua receita, seu lucro e o preço praticado na venda de cada o da busca permanente da maximização do lucro. Ora, como o lucro resulta da
produto ou serviço que ela produz. subtração do custo da receita, ou seja, Lucro=RT-CT, então todo o esforço da firma
Na abordagem preliminar dos problemas microeconômicos é comum considerar- é orientado para aumentar a parcela RT e para reduzir CT, simultaneamente.
se o caso geral da firma em mercado de concorrência perfeita, noção de mercado
que será mais detidamente estudada adiante neste capítulo. Na concorrência
04.01. Produção e custos
perfeita, a forma de organização interna da firma não tem relevância para a teoria
dos preços. Nesse caso, a firma é considerada como uma unidade de ação que O estudo da Teoria da Produção e Custos busca estabelecer as relações existentes
tem um comportamento racional, em nada importando a complexidade do entre estes dois aspectos do processo de elaboração dos bens e serviços no curso
funcionamento de sua estrutura orgânica. Na modelagem, considera-se que, para da conduta otimizadora da firma. Considerando que a conduta otimizadora da

44
firma corresponde à maximização do lucro, então, como já referido, todo o Como exemplo de produção simples, tem-se a fabricação de cimento, na qual
esforço é canalizado para dar racionalidade ao processo produtivo buscando-se utilizam-se diversos fatores de produção como o calcário, a argila e o calor para
incessantemente minimizar o custo. Esse comportamento reflete a relação que calciná-los até a fusão absoluta. Para ilustrar a produção múltipla independente,
existe entre produção e custo. pode-se considerar um produtor do setor químico que fabrique, por exemplo,
fertilizantes e detergentes. Esses dois processos, além de inteiramente distintos,
Neste estudo, o primeiro conceito a fixar é o da função de produção, uma
não fazem uso, pelo menos de modo acentuadamente marcado, de fatores
expressão algébrica que relaciona a quantidade produzida de um determinado
específicos comuns ou de uma mesma lógica de processo. A produção múltipla
bem ou serviço com as quantidades dos fatores de produção que entram no
comum pode ser exemplificada com fábricas de artefatos de couro que, fazendo
processo produtivo, isto é, q=f(x1,x2,...,xn).
uso de vários fatores de produção, alguns comuns como é o caso do couro,
Se, por exemplo, um litro de um refrigerante é preparado com determinadas produzem produtos distintos como bolsas, sapatos, cintos e outros mais.
quantidades de água e mais a essência que dá o sabor à bebida, o açúcar, o gás
Por fim, à guisa de exemplo de produção múltipla conjunta, pode-se considerar
carbônico, além da energia e mão de obra, a função de produção deverá
uma aglomeração industrial que fabrique itens de uma mesma família de
conseguir exprimir a relação que existe entre o mencionado litro do refrigerante e
produtos, mas que não necessariamente se esteja tirando proveito do uso de
a quantidade de cada um desses insumos.
uma mesma matéria prima, ou produzindo produtos para um mesmo fim. É o
Quanto ao processo de produção para efeito de análise econômica, distinguem-se caso de um um distrito ou pólo petroquímico que, pela imensa variedade de
dois tipos principais: a produção simples e a produção múltipla. Na produção produtos ― e de matérias primas também ― não pode ser caracterizado como
simples, obtém-se um, e somente um, tipo de produto a partir da combinação de exemplo produção comum, mas conjunta, porque os processos se encontram
um ou mais fatores de produção24. juntos apenas em razão de importantes conexões decorrentes requisitos técnicos
Na produção múltipla, produzir-se-ão sempre mais de um produto a partir da da produção.
combinação de fatores. A produção múltipla pode se apresentar de três distintas A abordagem do processo produtivo pode ter, como horizonte temporal, tanto o
formas: (i) produção múltipla independente, da qual resultam produtos curto quanto o longo prazo. Ambos os horizontes agasalham o significado de cada
inteiramente independentes, e que são fabricados em plantas separadas; (ii) uma das grandezas mais notáveis da Teoria da Produção, cujos conceitos são
produção múltipla comum, cujos produtos resultantes utilizam, em seus resumidos nesta seção.
processos produtivos, alguns fatores comuns; e (iii) produção múltipla conjunta,
04.01.01. Produto total de um fator variável
cujos produtos são fabricados em conexão uns com os outros em razão de
requisitos técnicos que impõem esta conexão. É a quantidade de produto que se obtém da utilização de um fator, dito variável,
mantendo-se fixas as quantidades dos demais fatores. Suponha-se o caso de um
24
Os fatores podem ser de mesma natureza ou de distintas naturezas, ou seja, o produto único pode resultar, por alimento qualquer, o iogurte por exemplo. Se se quiser avaliar a produção total de
exemplo, da combinação de duas matérias primas distintas, ou então de uma matéria prima e certo tipo de mão
de obra, ou ainda de dois diferentes tipos de mão de obra ou de combinação de quaisquer outros fatores de iogurte em relação ao fator de produção leite, tomado, para efeito desta análise,
produção.

45
como fator variável, mantidas fixas as quantidades da essência que dá o sabor ao É a razão entre as variações do produto total e as variações da quantidade
iogurte, do açúcar e dos demais fatores que entram na produção desse alimento, utilizada do fator produtivo variável. Ainda no mesmo exemplo do alimento
então, ao fazer-se variar o volume de leite, o produto total variará comentado na subseção anterior, a cada variação unitária do volume de leite
quantitativamente e, portanto, o produto total do fator variável leite, neste caso, corresponderá uma variação da quantidade do iogurte. É à relação entre uma e
será a quantidade de iogurte que se conseguir produzir a cada volume de leite outra quantidades que se dá o nome de produto marginal do iogurte em relação
utilizado na produção. ao fator leite. Em notação diferencial, o produto marginal do fator 1 é dado por:

É claro que se houver exagero na quantidade de leite mantidas as quantidades PMG1=dq/dx1


dos demais ingredientes, o iogurte se tornará excessivamente líquido ou mesmo
Onde:
ralo. O comentário acima, na prática, limita-se às quantidades mínima e máxima
do fator variável tais que o produto não perca as características para receber PMG1 é o produto marginal do fator variável 1 (produto marginal do leite, no caso
aceitação pelo mercado. São os limites dados pela engenharia de produção ― no considerado);
caso, engenharia de produção de alimentos ― e normalmente fiscalizados por dq é a variação no nível do produto total provocada pela variação unitária do
uma agência reguladora. fator variável 1; e
04.01.02. Produto médio de um fator variável dx1 é a variação unitária do fator variável 1 (leite) que provoca uma variação no
Também denominado produtividade média do fator variável, é a razão entre a produto total.
quantidade total produzida de um dado produto e a quantidade utilizada do fator
considerado. No caso do exemplo anteriormente mencionado, a produtividade
média do fator leite na fabricação do iogurte será dada em unidades do produto 04.01.04. Síntese da análise no curto prazo
por volume unitário de leite, isto é: O objeto da presente seção é o estudo do processo produtivo no qual uma das
PME1=q/x1, duas variáveis seja fixada em determinado nível, e a outra tenha liberdade para
variar. A representação gráfica geral é a apresentada na Figura 02.16, a qual faz
Onde: uso de dois diagramas cartesianos interconectados verticalmente, ambos
PME1 é o produto médio do fator variável 1 (produto médio do leite, no caso relacionando o insumo variável x1 com distintos conceitos de produto. O
considerado); diagrama superior relaciona esse insumo variável com o produto total q. E o
diagrama inferior relaciona o mesmo insumo variável com os níveis de produto
q é o produto total; e
médio e marginal. O insumo x2 mantém-se invariável e não figura em nenhum dos
x1 é a quantidade do fator variável 1 (leite). dois diagramas. O conjunto dos dois diagramas reflete a lei dos rendimentos
decrescentes.
04.01.03. Produto marginal de um fator variável

46
Segundo a lei dos rendimentos decrescentes, o aumento da quantidade de um
fator variável mantidas constantes as quantidades dos fatores fixos faz com que o
produto total cresça, inicialmente a taxas crescentes, para, depois de
determinado nível de crescimento do fator variável, continuar crescendo a taxas
decrescentes; uma vez que o fator variável ainda continui a crescer mantidos
constantes os fatores fixos, o produto total começa a diminuir.

Os dois diagramas da referida Figura 02.16, de correspondência vertical, mostram


os pontos extremos (de máximo) dos produtos total, médio e marginal, e
apresentam os três estágios de produção no curto prazo (diagrama superior).

O Estágio I se estende, sobre o eixo que mede a quantidade do insumo variável,


desde o nível mínimo de produção (teoricamente q=0) até o ponto em que o
produto médio é máximo. O Estágio II é o intervalo compreendido sobre o
mesmo eixo das abcissas entre o nível de produto correspondente ao produto
médio máximo e o produto total máximo. E o Estágio III, também referido ao eixo
das abcissas, parte do ponto correspondente ao produto total máximo e segue
para a direita até o final do domínio da função.

No Estágio I, o produto cresce a taxas crescentes até que a produtividade


marginal alcance seu ponto de máximo, observado no diagrama inferior e
correspondente à inflexão da curva ascendente do produto total. A taxa de
Por paradoxal que pareça é quando os rendimentos são decrescentes que a firma
crescimento daí em diante é decrescente até que o produto marginal (diagrama
está se aproximando dos limites máximos de utilização dos fatores produtivos,
inferior) seja igual a zero, o que corresponde ao produto total máximo (diagrama
elaborando, em consequência, mais eficientemente. A firma concorrencial
superior).
eficiente opera, pois, com rendimentos decrescentes. Caso o preço do fator fixo
A firma, ao agir racionalmente, situa seu nível de produção no Estágio II porque seja relativamente baixo quando comparado ao preço do fator variável, a firma
explora sua capacidade ao extremo, até o limite em que os rendimentos ancorará seu nível de produção nas proximidades dos limites entre os Estágios I e
comecem a declinar. II. Em caso contrário, o empresário elevará sua produção para níveis que estejam
mais próximos do produto máximo.
Fig. 02.16 – Produção no curto prazo Exemplo de aplicação 02.07

47
Uma firma usa capital e trabalho sendo que, no curto prazo, o fator capital é fixo. 04.01.05. Síntese da análise no longo prazo: conceito de isoquantas
A sua função de produção de curto prazo é q=-0,8x 13+20x12+200x1. Calcule os
No longo prazo, ambos os insumos, x1 e x2, variam. A análise bidimensional como
intervalos de valores de x1 correspondentes aos estágios I, II e III da produção.
se fez no curto prazo agora recorre ao conceito das isoquantas que são curvas de
Solução nível que representam os diferentes níveis de produto. A Figura 02.18 apresenta
um mapa de isoquantas.
O limite à direita do Est I corresponde a P ME1=PME1máx  d(PME1)/dq=0  [d(-0,8X12+
20X1+200)]/dq=0  -1,6x1+20=0  x1=12,50; Limite à dir. do Est. II: P MG=0  Isoquantas ou curvas de isoproduto são curvas que, representando cada uma um
-2,4x12+40x1+200=0  x1=20,69: Limite à dir. do Est. III: Pme=0  nível invariável de produto, estabelecem as possíveis proporções com que dois
-0,8x12+20x1+200=0 x1=32,65. O gráfico da Figura 02.17 elucida o significado insumos entram no processo produtivo do qual resulta este nível de produto.
desses valores extremos dos intervalos.
Considerando-se apenas dois insumos, a função de produção pode ser expressa
Fig. 02.17 – Produtos total, médio e marginal do modo seguinte:

q=f(x1,x2)

Cada isoquanta, como já mencionado, além de corresponder a um nível invariável


de produto em todos os seus pontos, é negativamente inclinada, semi-côncava (o
que reflete a convexidade em relação à origem do sistema de eixos), e nunca
intercepta outra isoquanta em razão de sua própria definição.
Fig. 02.18 – Isoquantas

O limite à direita do Estágio III não está representado no gráfico acima por
desimportante pois as firmas não operam neste estágio.

48
A inclinação em cada ponto de uma isoquanta corresponde à Taxa Marginal de Fig. 02.19 – Casos particulares de isoquantas
Substituição Técnica – TMST. Para estabelecer-se a expressão da TMST, iguala-se a
zero a diferencial total de q e explicita-se o resultado em relação a (-dx2/dx1).

De dq=0, tem-se

(∂q/∂x1)dx1+(∂q/∂x2)dx2=0,

Donde

-(dx2/dx1)= (∂q/∂x1)/(∂q/∂x2)

Ou seja:

TMST=-(dx2/dx1)=Pmg1/Pmg2 A combinação dos insumos em proporções fixas pode ser qualquer, isto é, haverá
exemplos em que uma unidade do insumo x1 se combina com duas de x2, ou
Conforme se percebe, a TMST mede a taxa de troca de uma quantidade de quaisquer outras proporções. O painel à direita da Figura 02.17 representa um
insumo por quantidade do outro insumo sem que o nível de produto se altere. Há caso geral e não necessariamente o caso do abajour, dado que a reta que une os
alguns casos particulares de isoquantas, dois dos quais são apresentados nos vértices das isoquantas não forma um ângulo de 45 o com os eixos coordenados,
diagramas da Figura 02.19. ou seja, não reflete a combinação de uma unidade do insumo x 1 para cada
A isoquanta do diagrama à esquerda reflete as características de um processo unidade do insumo x2 como sucede no exemplo do abajour.
produtivo no qual os insumos são substitutos perfeitos, enquanto que a 04.01.06. Restrição orçamentária e a otimização do processo produtivo no longo
isoquanta à direita corresponde a um processo no qual as proporções entre os prazo
insumos são fixas.
O orçamento da firma pode ser decomposto em parcelas que representam
O fabrico de arame constitui exemplo do primeiro caso pois entram no processo produtos do preço unitário de cada insumo utilizado pela quantidade que é
produtivo o cobre e o alumínio em quaisquer proporções. Cobre e alumínio são utilizada de cada um destes insumos, isto é:
os insumos levados à análise e suas quantidades são representadas pelos eixos
coordenados. Como exemplo de isoquantas de proporções constantes, tem-se a M=∑pixi
produção de abajours. Onde:
Considerando que os dois insumos mais importantes sejam o soquete e a haste pi é o preço do insumo i; e
com base, a combinação destes para cada unidade produzida é fixa porque, para
xi é a quantidade do insumo i.
cada haste com base, há um, e somente um, soquete.

49
A representação gráfica da restrição orçamentária para uma firma que utilize dois Há dois tipos de problema a resolver com base nesses elementos. O primeiro é o
insumos resulta em uma reta negativamente inclinada cujo coeficiente angular é de determinar-se o produto máximo que pode ser produzido dado um orçamento
(-p1/p2) e que tangenciará uma isoquanta em um ponto cuja TMST é igual a limitado, e o segundo é o de determinar-se o custo mínimo pelo qual um dado
Pmg1/Pmg2=-dx2/dx1. O ponto de tangência implica a igualdade: nível de produto pode ser produzido. Os dois problemas de otimização podem ser
traduzidos em linguagem matemática do modo seguinte:
p1/p2=Pmg1/Pmg2
Problema Tipo 1:
Donde:
Maximizar a função de produção q=f(x1,x2)
Pmg1/p1=Pmg2/p2
Sujeita à restrição de M=Mo=p1x1+p2x2,

Onde:
A expressão acima corresponde ao equilíbrio entre a função de produção,
representada pela isoquanta, e a função de restrição orçamentária, representada q é o nível de produto cujo máximo será determinado;
pela reta M=p1x1+p2x2, conforme ilustra o gráfico da Figura 02.20.
xi são as quantidades dos insumos;
Fig. 02.20 – Equilíbrio entre função de produção e restrição M é o orçamento da firma em valor conhecido e fixo igual a Mo; e
orçamentária da firma
pi são os preços desses insumos.

Problema Tipo 2:

Minimizar o custo M=p1x1+p2x2

Sujeito à restrição de produção q=qo=f(x1,x2)

Onde:

M é o orçamento da firma, o qual pretende-se minimizar para um dado nível de


produto;

pi são os preços dos insumos;

xi são as quantidades desses insumos;

q é o nível de produto em um valor conhecido e fixo igual a qo;

50
Ambos os problemas podem ser solucionados pela expressão Pmg1/p1=Pmg2/p2 sujeita à restrição 12x1+8x28x2=552. Para tanto, parte-se da expressão do
formando um sistema de equações com a restrição orçamentária, ou podem ser lagrangeano seguinte:
solucionados por meio da otimização condicionada baseada nos multiplicadores
£=3x10,25x20,25+λ(552-12x1-8x2), donde se extraem as condições de primeira ordem:
indeterminados de Lagrange, como será mostrado na seção de exercícios
resolvidos. No já mencionado gráfico da Figura 02.12, se o problema enfrentado ∂£/∂x1=0,75x1-0,75x20,25-12λ=0
for o da maximização da produção, então a isoquanta representada é a mais ∂£/∂x2=0,75x10,25x2-0,75-8λ=0
distante da origem do sistema de eixos coordenados e que seja tangenciada pela
restrição orçamentária. De outro lado, se o problema em vista for o da ∂£/∂λ=552-12x1-8x2=0
minimização do custo, então a reta representativa da restrição orçamentária será Donde [(0,75x1-0,75x20,25)/12]=[(0,75x10,25x2-0,75)]/8, donde x2=(3x1/2), donde 552-12x1-
a mais próxima da origem do mesmo sistema de eixos coordenados e que seja 8(3x1/2)=0, donde x1=23, donde x2=34,50. E o produto máximo será
tangenciada por uma das infinitas isoquantas. Nesse segundo caso, a restrição qMÁX=3x230,25x34,500,25=15,90 u.f.
orçamentária corresponderá a um feixe de retas paralelas a uma direção dada.
Exemplo de aplicação 02.09 (Problema do tipo 2)
Exemplo de aplicação 02.08 (Problema do tipo 1)
Pretende-se produzir 120 unidades físicas (u.f.) de determinado produto cuja
A função de produção de uma firma que fabrica um só produto é q=3x 10,25x20,25. função de produção é q=x10,6x20,2. Os preços unitários dos insumos são p1=2 u.m. e
Sejam p1=12 e p2=8 os preços desses dois insumos. Determinar a combinação de p2=5 u.m.. Determinar o custo mínimo em que se pode incorrer. Determinar
quantidades dos dois insumos que maximizará o nível de produção, considerando também a quantidade a utilizar de cada insumo.
que o orçamento da firma para essa tarefa está limitado a 552 unidades
Solução
monetárias (u.m.). Determinar ainda o nível de produto máximo.
A condição de equilíbrio para obter-se o custo mínimo dada a quantidade que se
Solução
pretende produzir é PMG1/p1= PMG2/p2, donde 0,6x1-0,4x20,2/2=0,2x10,6x2-0,2, donde
A condição de equilíbrio é: PMG1/p1=PMG2/p2, donde (0,75x1- x2=0,4x1/3. Substituindo esse valor de x2 na expressão da função de produção
0,75
2
0,25 0,25 -0,75
x )/12=(0,75x1 x2 )/8, donde x2=(3x1/2), relação que é levada à função de para a quantidade a produzir pretendida, tem-se: x 10,6x20,6, donde x10,6.
restrição: 552-12x1-8(3x1/2)=0, donde x1=23, donde x2=34,50. O produto máximo (0,4x1/3)0,2=120, donde x1=923,08 e x2=0,4.(923,08/3), donde x2=678,40. E o custo
será qMÁX=3x230,25x34,500,25=15,90 u.f. minimizado será M=p1x1+ p2x2, donde M=(2x923,08)+(5x678,40), donde
Alternativamente, o problema pode ser solucionado por meio da análise da finalmente M=5238,16 u.m..
conduta de otimização de uma função condicionada a uma restrição. Tal solução Como exercício, o(a) aluno(a) deve resolver este problema pelo método do
se opera por meio dos multiplicadores indeterminados de Lagrange, como se multiplicador indeterminado de Lagrange.
segue. A formulação do problema corresponde a maximizar a função q=3x 10,25x20,25

51
04.01.07. Funções de custo já incluídas as obrigações sociais e trabalhistas, e 300 quilowatt-hora (kWh), a
0,20 u.m. por kWh.
Os problemas-tipo 1 e 2 da seção anterior demonstram que a teoria da produção
guarda uma estreita relação com a teoria dos custos. Do mesmo modo que ocorre Suponha-se também que essa produção seja realizada em um dia de trabalho e
com a primeira, a teoria dos custos também é analisada sob duas perspectivas que o custo diário da administração da firma, seja de 20 u.m. por dia. Isto significa
temporais: a de curto prazo e a de longo prazo. A diferença entre uma e outra dizer que o custo indireto, ou fixo, dessa produção é igual a 20 u.m. diárias.
abordagens está unicamente na possibilidade de, no longo prazo, todos os fatores Considerando que essa fábrica nada mais produza, e que, portanto, o custo
poderem variar, enquanto que, no curto prazo, um ou mais fatores remanescem indireto em que incorre seja integralmente consagrado a administrar a
fixos. Essas considerações levam a que as três dimensões dos custos, a total, a mencionada produção, então o custo total do mencionado lote de 1000 unidades
média ou unitária, e a marginal, possam ser avaliadas em ambos os horizontes de terá o custo total de:
prazo, o curto e o longo.
CT=(200x5)+(160x2)+(300x0,20)+20=1.400 u.m.
Uma função de custo representa o custo mínimo a que se pode chegar, para cada
A expressão imediatamente anterior, quando apresentada em forma genérica do
quantidade produzida, por meio da tecnologia correntemente utilizada em cada
tipo CT=f(pi,xI) e levada a um sistema de equações juntamente com a expressão do
processo produtivo. Definem-se, nas subseções seguintes, os custos total, médio
Caminho de Expansão da Firma (CEF) e com a restrição orçamentária, gera como
e marginal.
resultado a função de custo total da forma CT=g(q) onde CT é o custo total e q é a
04.01.08. Custo total quantidade produzida do bem ou serviço, isto é, o nível do produto. Observa-se
que esta conduta é a mesma do Problema 2 da subseção 5.1.6. O Exemplo de
É a mensuração em termos monetários de todos os esforços realizados pela firma
Aplicação 02.10 ilustra essa transformação.
para concretizar a produção. É, pois, a somatória de todos os gastos despendidos
com os fatores de produção utilizados para a realização de um determinado nível Exemplo de Aplicação 02.10
de produção. Conforme se percebe, o custo total depende das quantidades e dos
A função de produção de uma firma é q=x 11/6x21/6 e sua restrição orçamentária é
preços dos fatores produtivos utilizados na elaboração de um produto ou serviço.
CT=2x1+4x2+10. Determinar a função de custo total de curto prazo dessa firma.
As quantidades são dadas por meio da função de produção, referida na
introdução desta seção (05.01), e os preços são aqueles pagos pela aquisição dos Solução
diversos fatores e insumos da produção. A condição de equilíbrio é dada por (P MG1/p1)= (PMG2/p2), donde [x21/6/
Admita-se por exemplo que determinado produto seja fabricado utilizando-se (12x15/6)]=[ x21/6/(24x25/6], donde x2=0,5x1, expressão do Caminho de Expansão da
apenas três fatores, material, mão de obra e energia. Seja esse produto um Firma (CEF). Entrando-se com o resultado do CEF na restrição orçamentária,
artefato de couro qualquer, sapato, cinto ou bolsa. Diga-se que a produção de obtém-se CT=2x1+2x1+10, donde x1=(CT-10)/4. Daí, x2=(CT-8)/10, que pode ser
1.000 unidades tenha envolvido 200 quilos de couro, comprado a 5 unidades reescrita sob a forma x2=[(CT-8)/4](1/2). Substituindo essas expressões de x 1 e x2
monetárias (u.m.) por quilo, 160 homens-hora (hh) a 2 u.m. por hora trabalhada,

52
na função de produção, obtém-se: q=[(C T-10)/4]1/3(1/2)1/6, donde q3=0,222CT- Onde:
22,20, donde finalmente CT=4,5q3+100.
CME é o custo médio;
A função utilizada no Exemplo de Aplicação 02.10 é do tipo Cobb-Douglas . Caso 25
CT é o custo total; e
os expoentes iguais a que foram afetadas as variáveis x 1 e x2 fossem menores, o
grau do polinômio da função de custo total seria ainda maior. Por exemplo, se Q é a quantidade produzida, isto é, é o nível de produto.
esses expoentes fossem iguais a 1/10<1/6 mantidos os demais dados utilizados O custo médio não é sempre constante tampouco varia linearmente em todos os
no referido Exemplo de Aplicação, a função de custo total resultante seria de casos. Ao contrário, muitas funções de custo médio são do segundo grau em
quinto grau. função dos intervalos de produção, os quais comportam trechos onde está
De outro lado, se os referidos expoentes fossem iguais a 1/5>1/6 mantidos os presente a economia de escala bem como trechos em que há deseconomias de
demais dados do problema, o polinómio da função de custo total de curto prazo escala. Com efeito, da expressão geral do custo total apresentada na sub-seção
seria de grau 2,5. Para os casos correntes de processos produtivos cuja função (4.1.8), tem-se:
utilizada seja do tipo Cobb-Douglas, a função de custo total de curto prazo ´-e da CME=(1/q)CT,
forma:
Donde:
CT=aq3-bq2+cq+d,
CME=aq2-bq+c+(d/q)
que reflete o custo total de curto prazo. No longo prazo, tem-se o mesmo tipo de
expressão geral, porém com d=0, dado que d representa o custo fixo conforme No caso acima, está-se tratando do custo médio de curto prazo. Caso se tratasse
será comentado neste texto. do longo prazo, a expressão não conteria a parcela d/q.

04.01.09. Custo médio 4.1.10 Custo marginal

O custo médio é o resultado do custo total dividido pela quantidade produzida do O custo marginal é a variação que o custo total de produção experimenta quando
produto. É o custo da unidade produzida e, por isso, também é denominado custo esta mesma produção varia de uma unidade. Imagine-se que a produção do
unitário do produto, bem, mercadoria ou serviço. No exemplo utilizado para o artefato de couro tomado como exemplo aumente em uma unidade para mais,
cálculo do custo total, o custo médio será C ME=1.400/1.000, donde CME=1,40 u.m. ou seja, seja aumentada para 1.001.
por unidade fabricada do produto. 1,40 u.m. é, portanto, o custo da unidade Considerando que os preços dos insumos não se alterem com o pequeno
produzida. A expressão geral do custo médio é dada por: acréscimo nas quantidades compradas dos fatores, então o custo total da
CME=CT/q, produção aumentará para:

CT=(200,20x5)+(160,16x2)+(300,30x0,20)+20=1.401,38 u.m.
25
Os principais tipos de funções de produção são apresentados ao longo do texto.

53
Ao deduzir-se o novo custo total do anterior, tem-se o custo marginal nesse nível porque também são referidos como custos diretos. No exemplo dado, são os
de produção, ou seja: custos incorridos com o couro, a mão de obra, a energia e demais insumos, os
quais aumentam com o aumento da produção e diminuem com a redução desta.
CMG=1.401,38-1.400,00, donde CMG=1,38
Da expressão geral do custo total CT=aq3-bq2+cq+d, têm-se:
É importante que se observe que o custo marginal ao nível de produção de 1.000
unidades produzidas não é necessariamente o mesmo em outros níveis de Cf=d; Cv= aq3-bq2+cq; CFME=d/q; e Cvme= aq2-bq+c
produção. Se esse mesmo cálculo for feito para uma produção de, por exemplo,
Onde Cf é o custo fixo; Cv é o custo variável; CFME é o custo fixo médio; e CVME é o
2.000 unidades do produto, variações em um ou mais coeficientes técnicos, além
custo variável médio.
de variações nos preços desses fatores poderão ocorrer e os novos custos totais
(para 2.000 e para 2.001 unidades físicas produzidas) já não mais guardarão 4.1.12. Curvas de custo no curto e no longo prazos
proporcionalidade com a variação calculada entre 1.000 e 1.001 unidades do As curvas de custo total representam as funções que são geradas a partir de uma
cálculo apresentado. conduta de otimização visando à minimização de custos. Essa conduta de
Isso significa afirmar que a função de custo marginal não tem necessariamente otimização, já referida anteriormente, parte de uma função objetivo de custo em
um comportamento linear, e os custos marginais variam ao longo dos diversos função das quantidades e preços dos fatores produtivos (insumos), a qual é
níveis de produção. Em alguns casos, entretanto, a função de custo marginal minimizada sujeita à restrição tecnológica que é dada pela função de produção.
poderá ser de primeiro grau. Os quatro diagramas da Figura 02.21 guardam correspondência vertical dois a
Uma propriedade do custo marginal é a de interceptar o custo médio no ponto de dois. Os dois paineis superiores apresentam curvas de custo total, sendo que o da
mínimo deste. Essa propriedade é demonstrada por meio da pesquisa de ponto esquerda refere-se ao curto prazo e, o da direita, ao longo prazo. Os dois
extremo da função de custo médio, a qual comprova que, neste extremo, que é diagramas inferiores apresentam os custos médios e marginais e guardam
de mínimo, ocorre a interseção das duas curvas. Na seção de exercícios é correspondência com os superiores. No caso do diagrama inferior da esquerda, a
apresentada essa demonstração. curva de custo fixo médio está representada apenas para tornar completo o
conjunto de curvas. Em outras oportunidades de utilização desse diagrama de
04.01.11. Custos fixos e variáveis
custo de curto prazo a representação do custo fixo médio será desprezada por
Os custos fixos são aqueles que não se alteram com a variação do nível de desimportante para fins de análise na imensa maioria dos casos.
produção. São também referidos por custos indiretos. No exemplo dado
A curva de custo médio de longo prazo (diagrama inferior à direita) é a envoltória
relativamente aos custos dos artefatos de couro (seção 05.01.08), o custo fixo de
das infinitas curvas de custo médio de curto prazo e indicativa de que a planta de
20 u.m. é o mesmo para qualquer quantidade produzida.
tamanho ideal é que minimiza o Cmelp.
Os custos variáveis, contrariamente, são aqueles que variam com a variação da
produção. São os custos dos fatores utilizados diretamente na produção, daí Fig. 02.21 – Curvas de custos médios e marginais

54
primeira ordem dCME/dq=0, donde [3-(1/q2)]=0, donde q=(1/3)1/2=0,58. Além
disso, observa-se que essa curva é assintótica em relação ao eixo dos preços e
custos e que para q=1 tem-se que CME=6 e para q=2, tem-se CME=8,5. Com esses
pares de coordenadas, pode-se traçar a curva de C ME, mostrada na Figura 02.22.
Para traçar a curva representativa do custo marginal, atenta-se para o fato de que
se trata de uma reta que intercepta o eixo dos preços e custos no ponto em que,
no caso do presente exemplo, CMG=2, substituindo-se, para tanto, na expressão
CMG=6q+2, a variável “q” por q=0. Conhecendo-se um outro ponto qualquer dessa
reta, é possível traçá-la. Seja, por exemplo, o ponto para o qual q=1, que
corresponde a CMG=8. Assim, com os dois pares de pontos (0;2) e (1;8), pode-se
traçar a reta ilustrada pela mesma Figura 02.22.
Quanto ao nível de produção para o qual a firma fica indiferente entre continuar
operando ou encerrar atividades, este corresponde ao custo variável médio
mínimo, a ser determinado como se segue: C V=CT-CF, donde CV=3q2+2q+1-1,
donde CV=3q2+2q e CVME=(1/q)CV=3q+2.
Figura 02.22 – Custos médio, marginal e fixo
Esse custo mínimo é simultaneamente igual ao custo médio de curto prazo, ao
custo marginal de curto prazo e ao custo marginal de longo prazo.

Exemplo de aplicação 02.11

A função de custo total de uma firma que produz um único produto é dada por
CT=3q2+2q+1. Representar graficamente os custos médio e marginal e determinar
o nível de produção correspondente ao custo variável médio mínimo. Qual o nível
de produção para o qual a firma fica indiferente entre continuar operando ou
encerrar atividades?

Solução

As curvas a serem representadas graficamente correspondem às seguintes


funções: CME=(1/q)CT=3q+2+(1/q) e CMG=dCT/dq=6q+2. Para a representação
gráfica do CME, deve-se pesquisar seu ponto de mínimo mediante a condição de

55
Seu ponto de mínimo no espaço economicamente válido coincide com o custo Fig. 02.23 – Lucro no curto prazo
marginal, daí: 6q+2=3q+2, donde q=0, correspondente ao preço p=2. Então,
qualquer nível de produção q>0 atrairá o interesse dessa firma desde que de
acordo com a função de CMG que é a função de oferta, ou seja: p=C MG=6q+2. A
curva de custo variável médio, linear, também é esboçada na Figura 02.22.
05. Rendimentos e Lucros

Os rendimentos são as receitas pela venda dos bens produzidos. Correspondem a


uma compensação ao produtor pelo esforço empreendido na sua produção e
distribuição, ensejando a formação dos lucros que são, em essência, o fator de
motivação e atração para o empreendedor.

Do mesmo modo como estudado em relação aos custos, têm-se os rendimentos


total, médio e marginal, conforme apresentado nesta seção. Antes, porém,
analisa-se a questão da lucratividade máxima em relação aos níveis de utilização
dos insumos produtivos.

05.01. Maximização do lucro e utilização dos insumos

A maximização do lucro ocorre quando a inclinação da curva do produto total se


iguala à inclinação da reta representativa do custo total. Essa assertiva pode ser A condição de primeira ordem para um máximo é [dq(x1)/dx1]-{[(p1x1)+CF]/p}=0,
verificada por meio do diagrama da Figura 02.23, que apresenta a relação entre donde dq(x1)/dx1]=p1/p, isto é a inclinação da curva do produto total (membro
receita, custo e lucro no curto prazo. esquerdo da equação) é igual à inclinação da reta representativa do custo total. A
razão (p1/p) é o coeficiente angular dessa reta.

05.02. Rendimentos em função dos níveis de produção

Conforme já referido na introdução desta seção, procede-se ao estudo dos


rendimentos explicitando-os em relação ao nível de produção da firma. Nesse
contexto, surgem os conceitos de rendimento total, médio e marginal.

05.03. Rendimento total

56
O rendimento total é, em qualquer caso ou regime de mercado, o resultado da somente se mantém constante em mercados de concorrência perfeita. Nos
multiplicação da quantidade vendida26 de um dado produto pelo do preço desse mercados imperfeitos, p=f(q), ou seja, o preço unitário variará consoante a
produto, ou seja: quantidade transacionada.

RT=p.q 05.05. Rendimento marginal

Se uma firma fabricar e vender mais de um produto, o seu rendimento total será O rendimento marginal, ou receita marginal é o acréscimo da receita total em
a somatória dos produtos dos diversos itens que forem fabricados e vendidos. decorrência de um acréscimo unitário da quantidade vendida de um bem ou
Seja o exemplo de uma firma que produza os bens “A” e “B” , cujos preços serviço. Em linguagem matemática, RMG=∆RT/∆q, sendo o numerador a variação
unitários sejam respectivamente “pa” e “pb”, e cujas quantidades vendidas sejam da receita e o denominador a variação unitária da quantidade vendida.
“qa” e “qb”. O rendimento total dessa firma será dado por:
Em notação matemática contínua, o rendimento marginal corresponde à variação
RT=(pa.qa)+(pb.qb) infinitesimal da receita total em decorrência da variação infinitesimal da
quantidade vendida, o que equivale à definição da derivada da receita em relação
Na produção simples, objeto do presente Curso, analisa-se apenas um bem e/ou
à quantidade vendida, ou seja: RMG=dRT/dq.
serviço elaborado a partir de um ou mais insumos, de modo que a receita total de
mais de um item deixa de ser considerada nas análises que se seguem. 05.06. Lucro

O lucro, definido como diferença entre rendimento e custo, constitui o objetivo


primordial da firma. Na sua conduta de otimização, o empresário busca
05.04. Rendimento médio
maximizar o lucro, racionalizando os custos e esforçando-se para maximizar as
O rendimento médio auferido com a venda de um produto, também referido receitas ou rendimentos.
como rendimento unitário, ou ainda receita média ou receita unitária será o
A maneira como cada fator de produção é empregado no processo produtivo é
resultado da divisão do rendimento total pela quantidade do produto vendido,
importante como elemento que contribui para a lucratividade da firma. Quanto a
isto é:
esse aspecto, afirma-se, sem entretanto demonstrar-se, que o lucro máximo de
RME=RT/q. uma firma impõe, como condição necessária para ser concretizado, que o valor
Ora, como RT=p.q, resulta que RME=p.q/q, ou seja RME=p. Isso significa afirmar que do produto marginal seja igual ao preço.
o rendimento médio é o mesmo que o preço unitário do produto. Mas é
oportuno antecipar que o preço unitário pode ou não ser constante. No estudo
dos mercados, objeto do presente capítulo, ver-se-á que o preço unitário
05.07. Curvas de rendimento
26
Considera-se que a quantidade vendida seja a mesma que é produzida, isto é, é igual ao nível de produção
(abstração do modelo).

57
Para a determinação das curvas de rendimento, parte-se da função de demanda. A representação gráfica das três funções de rendimento é mostrada na Figura
O estudo da gênese da função de demanda será apresentado na seção da Teoria 02.24. A curva de receita média também é chamada de curva de preços ou curva
do Consumidor. Nesta altura, utilizar-se-á um formato simples de função de de demanda.
demanda que é a demanda linear do tipo:
No estudo da teoria do consumidor, verrificar-se-á que essa curva corresponde à
p=a-bq demanda ordinária ou marshalliana, que se distingue da demanda compensada
ou hicksiana, importante recurso para a análise do comportamento e da avaliação
Onde:
do estado de bem estar do consumidor.
p é o preço do bem ou serviço objeto da demanda; Fig. 02.24 – Curvas de rendimento

a e b são os coeficientes da equação reduzida da reta; e

q é a quantidade transacionada do bem ou serviço.

Multiplicando-se ambos os termos da equação linear que representa a demanda


por q, obtém-se a função de receita total, isto é:

pq=RT=aq-bq2

Conhecida a expressão da receita total, calculam-se as receitas média e marginal,


do modo seguinte:

Rme=(1/q)RT Para o interesse do presente Curso, não é relevante ter em conta a existência
desses dois tipos de demanda pois o trabalho é inteiramente desenvolvido com
Donde:
base nas curvas de demanda ordinária por ser o mais comum no cálculo
Rme=a-bq econômico corrente.
A receita marginal será: Exemplo de aplicação no 02.12
Rmg=(d/dq)RT A função de demanda por determinado bem é a. Determinar as funções
Donde: de receita total e receita marginal. Calcular a receita total máxima e a
receita média correspondente.
Rmg=a-2bq

58
Solução Considerando-se apenas dois bens ou serviços, x1 e x2, são essas quantidades que
produzem utilidade para o consumidor, isto é:
Partindo-se da função de demanda ou receita média, tem-se:
RT=p.q=120q-2q2. A ou rendimento marginal é a primeira derivada da U=f(x1,x2)
receita total, isto é, RMG=120-4q. Para obter-se a receita total, iguala-se a Além disso, define-se como utilidade marginal do bem ou serviço “i” à variação
receita marginal a zero, encontrando-se a quantidade do produto que gera do nível de utilidade quando o bem ou serviço “i” varia infinitesimalmente. Nesse
receita máxima. Daí: 120-4q=0, donde q*=30 e a receita total será caso, a utilidade marginal do bem ou serviço “1” será igual a:
RT=(120x30)-(2x302), donde RT=1800 u.m.. A receita média UMG1=∂U/∂x1
correspondente à receita total máxima será p=120-(2x30), donde p=60
Na busca de uma definição satisfatória para a utilidade, alguns autores preferem
u.m.. Note-se que a receita média é o mesmo que preço (a curva de afirmar que esta é a quantidade de determinado bem ou serviço que o
receita média é também referida como curva de preços). consumidor supõe, subjetivamente, necessitar para ter sua vontade satisfeita.
06.Síntese apertada da teoria do consumidor Note-se que, nessa definição, a utilidade está sendo tomada como a própria
quantidade do bem ou serviço que gera utilidade.
O título desta seção indica uma apreciação panorâmica e seletiva de aspectos da
Teoria do Consumidor que, minimamente, devem ser estudados para a necessária É oportuno assinalar que qualquer que seja o enfoque para definir-se a utilidade
compreensão das Noções de Microeconomia no campo de interesse dos de um bem ou serviço, estar-se-á manejando sempre com a ideia da adequação
estudantes de engenharia. do bem ou serviço à necessidade sentida pelo consumidor. No que se refere às
preocupações com a forma de se medir a utilidade, há duas distintas abordagens:
O estudo do comportamento do consumidor está relacionado com a teoria da
a cardinal, abandonada, e a ordinal, comentadas na seção imediatamente
demanda, importante função do mecanismo universal da formação de preços que
seguinte.
é a lei da oferta e da procura. Entende-se por consumidor um indivíduo ou uma
unidade de consumo, ou de gasto, podendo ser uma pessoa ou uma família que 6.1. Abordagens Cardinal e Ordinal
age racionalmente refletindo seus gostos e preferências e que é portadora de um Na abordagem cardinal, admite-se a possibilidade da mensuração quantitativa da
determinado orçamento cuja utilização depende de suas decisões de consumo. utilidade, para tanto atribuindo-se-lhe uma unidade de medida: a util (utiles, no
O primeiro conceito a fixar no contexto da Teoria do Consumidor, também plural). A ideia, discutida pelos economistas neoclássicos da segunda metade do
referida como Teoria da Preferência, é o de utilidade, pois o consumidor racional século XIX, era a de que o consumidor pudesse associar um número em utiles a
toma decisões econômicas de sorte maximizar sua utilidade ou satisfação. cada bem ou serviço de que necessitasse, e este número comandaria o seu
Implícito resta, pois, que a utilidade é a satisfação que o consumidor percebe processo de decisão. A racionalidade por trás da ideia era a de que o consumidor
preenchida pela obtenção e uso dos bens ou serviços que anseia possuir. poderia fazer comparações entre os bens e a capacidade de os mesmos
satisfazerem suas respectivas necessidades e desejos. Se ao bem “x” estivessem

59
associadas 4 utiles e, ao bem “y”, 12, isto significava dizer que o consumidor O qualificativo de marginal é indicativo de que procurou-se medir a variação da
poderia trocar três unidades de “x” por uma só unidade de “y”. Em qualquer utilidade quando o consumo do bem variava unitariamente, ou seja, é como se se
hipótese, supõe-se que quanto maior for o consumo de determinado bem ou indagasse qual teria sido a variação da utilidade do consumidor a cada copo
serviço, maior será a utilidade que esse bem ou serviço propiciará ao consumidor. d’água ingerido. Adicionalmente, considerando que, a cada unidade adicional
A utilidade que a quantidade total consumida propiciar será dita, pois, utilidade consumida (copo d’água), o consumidor tinha um acréscimo cada vez menor de
total. utilidade, este fenômeno ensejou a qualificação complementar de decrescente. A
dificuldade prática de se estabelecerem proporções entre utilidades de bens e
O processo de satisfação da necessidade de um consumidor se opera
serviços distintos fez com que, pouco a pouco, a abordagem cardinal perdesse
gradualmente. Por exemplo, uma pessoa ao sentir-se sedenta, bebe água cuja
espaço em favor da abordagem ordinal até hoje utilizada no corpo da teoria
quantidade, se for medida em número de copos de determinado tamanho, trará,
neoclássica.
a cada um dos copos iniciais, níveis crescentes de utilidade total. Assim, a cada
copo d’água ingerido, há um aumento da utilidade total de que se beneficia o A abordagem ordinal nasceu da crítica que se fez à abordagem cardinal. Inúmeros
consumidor, utilidade total esta que reduz, em uma determinada medida, o pensadores27 que emitiram suas ideias entre final do século XIX e primeiras
referido estado de insatisfação inicial. Entretanto, a cada copo d’água adicional décadas do século XX, prepararam o terreno para que Hicks, em 1938,
bebido, o consumidor sente uma necessidade pouco a pouco menor de beber apresentasse uma sistematização completa a respeito da abordagem ordinal.
mais água. É possível que, se se associasse o número de 10 utiles ao primeiro
A base da abordagem ordinal foi substituir o critério de imposição de uma
copo d’água, então o segundo propiciaria ao consumidor um número de utiles
unidade de medida da utilidade de um bem ou serviço, algo subjetivo, por um
menor do que dez. Seja oito esse número de utiles do segundo copo; ao terceiro
outro critério de comparação. Nessa nova abordagem, em vez de atribuir-se um
copo seria atribuído um número ainda menor do que o do segundo, cinco, diga-
valor para a utilidade, observa-se apenas a ordem de preferência que o
se; e assim sucessivamente. Admitindo-se que o consumidor tenha saciado a sede
consumidor tem entre uma série de bens e serviços e, com o estabelecimento
com os três mencionados copos d’água, a sua utilidade total terá sido de 23 utiles,
dessas preferências, ele hierarquiza a aplicação de sua renda, uma conduta
conforme ilustra o quadro da Figura 02.25. O fato de as quantidades de utilidade
essencialmente racional e que bem elucida a análise por meio de modelos. Uma
incorporadas terem sido cada vez menores é referido, no corpo da Teoria do
forma de se representar essas preferências do consumidor são as curvas de
Consumidor, como Lei da Utilidade Marginal Decrescente.
indiferença que, para a análise a duas variáveis, podem ser representadas com
Fig. 02.25 – Utilidade Marginal Decrescente
Consumo medido em copos Utilidade adicionada facilidade no espaço de duas dimensões. As curvas de indiferença são funções das
d’água (util) quantidades dos bens a respeito dos quais o consumidor revela a sua preferência.
Primeiro 10
Segundo 8 6.2. Preferências e curvas de indiferença
Terceiro 5
Total 23

27
Entre outros Vilfredo Pareto, Slutsky e Edgeworth.

60
Admita-se que o consumidor avalie suas preferências entre dois bens quaisquer. dados os bens e serviços a adquirir, seus respectivos preços, e os gostos e
Sejam esses bens, por exemplo, o bem x1, sobre o qual se pretende elaborar a preferências do próprio consumidor.
análise econômica, e a renda, M, gasta com todos os demais bens que ele Fig. 02.27 – Mapa de Indiferença

consome. A tabela da Figura 02.26 apresenta pares de valores para os quais os


níveis de satisfação do consumidor, ou seja, o nível de utilidade, seja constante.

Os dados do quadro da mencionada Figura 02.26 permitem esboçar-se o gráfico


da curva de indiferença, que é o lugar geométrico dos pares de quantidades dos
dois bens ou serviços que propiciam ao consumidor um mesmo nível de utilidade.
Fig. 02.26 – Preferências de um consumidor
entre dois bens
M (unid. monetária) x1 (unid. fís.)
5 10,0
4 12,5
3 16,6
2 25,00
1 50,00
As curvas de indiferença mostram que o consumidor pode admitir a substituição
de um bem por outro em termos de quantidade. De acordo com o quadro da
Suponha-se que a função de utilidade seja dada por U=x1.M. Nesse caso, o
retroreferida Figura 02.26, o consumidor que disponha de 5 unidades de M e 10
produto dos valores de cada par é igual a 50 que é o nível de utilidade da curva
unidades de x1, sentir-se-á igualmente satisfeito se trocar uma unidade de M por
Uo, da Figura 02.27. Ocorre que, nessa mesma Figura 02.27, estão representadas
2,5 unidades de x1, isto é, passando a ficar com 4 unidades de M e 12,5 unidades
outras curvas de indiferença (Uo, U1, ..., U4). Conforme se observa,
de x1. Esse conceito de substitubilidade induz ao conceito da Taxa Marginal de
U4>U3>U2>U1>Uo, isto é, quanto mais afastada da origem estiver a curva de
Substituição – TMS entre dois bens.
indiferença, tanto maior será o nível de utilidade que representa. E isso sucede
porque, quanto maior o nível de utilidade, tanto maiores serão as quantidades de 6.3. Taxa Marginal de Substituição
x1 e de M. Ao conjunto de várias curvas de indiferença dá-se o nome de mapa de O conceito da Taxa Marginal de Substituição – TMS é análogo ao da TMST,
indiferença, o qual contém infinitas curvas que não se interceptam, são abordado na seção (04.01.05). A diferença está no fato de que a TMST é aplicada
negativamente inclinadas e semi-côncavas. à função de produção, representada pelas isoquantas, enquanto que a TMS é
As curvas de indiferença são úteis para revelar as preferências do consumidor em aplicada à função de utilidade, representada pelas curvas de
relação ao conjunto de bens que vai adquirir fazendo uso de sua renda. Nesse indiferença.Conforme já mencionado, considerando-se apenas dois bens ou
processo de escolha dos bens e serviços a comprar, o consumidor racional serviços, a função de utilidade pode ser expressa do modo seguinte:
buscará otimizar a aplicação da renda, o que corresponde a maximizar a utilidade,

61
U=f(x1,x2) As curvas de indiferença do diagrama à esquerda refletem as características de
dois bens ou serviços substitutos perfeitos, enquanto que as curvas de
Cada curva de indiferença, além de corresponder a um nível invariável de
indiferença correspondem a dois bens ou serviços complementares, isto é, as
utilidade, é negativamente inclinada, semi-côncava (o que reflete a convexidade
proporções entre as necessidades de um e de outro são fixas.
em relação à origem do sistema de eixos cartesianoss), e nunca intercepta outra
curva de indiferença em razão de sua própria definição. 06.04. Restrição orçamentária e a otimização da escolha do consumidor

A inclinação em cada ponto de uma curva de indiferença corresponde à Taxa Considerando-se que a restrição orçamentária do consumidor seja totalmente
Marginal de Substituição –TMS. Para estabelecer-se a expressão da TMS, iguala- gasta com os bens que este consome, pode-se escrever a expressão seguinte:
se a zero a diferencial total de U e explicita-se o resultado em relação a (-dx2/dx1).
M=∑pixi
De dU=0, tem-se
(∂U/∂x1)dx1+(∂U/∂x2)dx2=0, Onde:
Donde
-(dx2/dx1)= (∂U/∂x1)/(∂U/∂x2) pi é o preço do bem ou serviço i; e
Ou seja: xi é a quantidade do bem ou serviço i.
TMS=-(dx2/dx1)=Umg1/Umg2
A representação gráfica da restrição orçamentária de um consumidor que utilize
Um exame da expressão acima permite observar que a TMS mede a taxa de troca
apenas dois bens ou serviços resulta em uma reta negativamente inclinada cujo
de uma quantidade de um bem ou serviço por quantidade de outro bem ou
coeficiente angular é (-p1/p2) e que tangenciará uma curva de indiferença em um
serviço sem que o nível de utilidade se altere. Há alguns casos particulares de
ponto cuja TMS é igual a Umg1/Umg2=-dx2/dx1. O ponto de tangência implica a
curvas de indiferença, dois dos quais são apresentados nos diagramas da Figura
igualdade:
02.28.
Fig. 02.28 – Casos particulares de curvas de indiferença p1/p2=Umg1/Umg2

Donde:

Umg1/p1=Umg2/p2

A expressão acima corresponde ao equilíbrio entre a utilidade, representada pela


curva de indiferença, e a função de restrição orçamentária, representada pela
reta M=p1x1+p2x2, conforme ilustra o gráfico da Figura 02.29.

62
Fig. 02.29 – Equilíbrio entre função de utilidade e restrição M é a renda do consumidor em valor conhecido e fixo igual a Mo; e
orçamentária do consumidor
pi são os preços desses bens ou serviços.

Problema 2:

Minimizar o gasto do consumirdor M=p1x1+p2x2

Sujeito à restrição de sua função de utilidade U=Uo=f(x1,x2)

Onde:

M é gasto do consumidor, o qual pretende-se minimizar para um dado nível de


utilidade;

pi são os preços dos bens ou serviços;

xi são as quantidades desses bens ou serviços;


06.05. Equilíbrio do Consumidor
U é o nível de utilidade a ser alcançado em um valor conhecido e fixo igual a Uo;
O equilíbrio do consumidor é alcançado quando este, agindo racionalmente,
atinge a máxima satisfação ou utilidade com um mínimo de sacrifício nos limites Ambos os problemas podem ser solucionados pela expressão Pmg1/p1=Pmg2/p2
de sua restrição orçamentária, a qual é dada por sua renda. formando um sistema de equações com a restrição orçamentária, ou podem ser
solucionados por meio da otimização condicionada baseada nos multiplicadores
De modo a análogo a como precedeu-se na conduta otimizante da firma, o
indeterminados de Lagrange, a qual será adotada nos exemplos de aplicação
equilíbrio do consumidor também é verificado mediante a pesquisa de dois tipos
desta seção.
de problema, o da maximização condicionada da utilidade e o da minimização
condicionada do gasto, como se apresenta a seguir: No já mencionado gráfico da Figura 02.29, se o problema a ser enfrentado for o
da maximização da produção, então a isoquanta representada é a mais distante
Problema 1:
da origem do sistema de eixos coordenados e que seja tangenciada pela restrição
Maximizar a função de utilidade U=f(x1,x2) orçamentária.

Sujeita à restrição orçamentária do consumidor M=Mo=p1x1+p2x2, De outro lado, se o problema em vista for o da minimização do custo, então a reta
representativa da restrição orçamentária será a mais próxima da origem do
Onde:
mesmo sistema de eixos coordenados e que seja tangenciada por uma das
U é o nível de utilidade cujo máximo será determinado; infinitas isoquantas.
xi são as quantidades dos bens ou serviços;

63
Exemplo de aplicação 02.13 (Problema do tipo 1) Há dois tipos de função de demanda. A função de demanda ordinária ou
A renda de um consumidor é de 540 u.m e é integralmente gasta com a compra
marshalliana, e a função de demanda compensada ou hicksiana. Sem aprofundar
de dois bens, x 1 e x2, cujos preços são, respectivamente, 3 u.m. e 2 u.m. Sua na análise do mecanismos que dá origem à demanda compensada, estuda-se a
função de utilidade é U=x 11/2x2. Determinar quanto ele comprará de cada bem construção da demanda ordinária.
considerando que sua utilidade é maximizada.
Os diagramas da Figura 02.30, de correspondência vertical, apresentam um mapa
Solução
de indiferença de dois bens e/ou serviços, x1 e x2, além da restrição orçamentária
A condição de equilíbrio é U MG1/p1= UMG2/p2, donde 0,5x1-1/2x2/3=x11/2/2, donde do consumidor (diagrama superior) e um sistema de eixos cartesianos sobre o
x2=3x1/2. Entrando-se com essa expressão de x 2 na função de restrição qual é lançada a demanda pelo bem x1 (diagrama inferior).
orçamentária do consumidor, tem-se 3x 1+2x2=540, donde 7,5x1=540, donde x1=72
Considere-se um consumidor que esteja comprando os bens x1 e x2 nas
u.f. e x2=3x72/2, donde x2=108 u.f.. E a utilidade máxima desse consumidor é
quantidades x1o e x2o, respectivamente (diagrama superior). Em se tratando de um
UMÁX=721/2.108=916,41.
consumidor racional, ele está maximizando sua utilidade com essas quantidades
Como exercício, sugere-se que o(a) aluno (a) resolva o mesmo problema pelo que adquire sob a restrição orçamentária que sua renda M lhe impõe.
método do multiplicador indeterminado de Lagrange.
Essa restrição orçamentária, representada pela reta MMo, corresponde à
Exemplo de aplicação 02.14 (Problema do tipo 2) expressão M=p1x1+p2x2, onde p1 e p2 são os preços dos bens e/ou serviços 1 e 2, e
x1 e x2 são as quantidades desses bens e ou serviços. Ora, ao maximizar sua
Determinar o gasto mínimo em que incorrerá um consumidor que pretenda
utilidade, o consumidor se encontra em equilíbrio, o que ocorre no ponto Eo,
extrair uma utilidade de Uo=243 com o consumo de dois bens cujos preços
ainda do diagrama superior.
unitários sejam p1=4 u.m. e p2=6 u.m., sabendo-se que sua função de utilidade é
U=x12x23. Conforme se pode observar, o equilíbrio se situa no ponto de tangência da
restrição orçamentária do consumidor (reta MMo) com a curva de indiferença de
Solução
nível Uo. Correspondentemente, no diagrama da oferta e demanda (inferior) esse
A condição de equilíbrio é UMG1/p1=UMG2/p2, donde 2x1x23/4=3x12x22/6, donde x2=x1. consumidor estará comprando a quantidade x1o ao preço po, sobre o ponto Eo’ da
Entrando-se com essa expressão de x 2 na função de utilidade do consumidor, função de demanda. A lembrar, o diagrama inferior somente trata de um bem ou
tem-se U=Uo=x12x13=243, donde x1=3 u.f. e x2=3 u.f.. O custo mínimo desse serviço, o bem ou serviço x1, e a relação das quantidades deste bem ou serviço
consumidor é MMÍN=(4x3)+(6x3)=30 u.m.. com seu preço.
Como exercício, sugere-se que o(a) aluno (a) resolva o mesmo problema pelo
método do multiplicador indeterminado de Lagrange. Fig. 02.30 – Função de demanda ordinária

06.06. A função de demanda

64
A trajetória de Eo’ para E1’ no diagrama inferior já é indicativa da inclinação negativa
da curva de demanda do consumidor, uma característica presente em todos os
mercados de bens inferiores, normais e superiores quando a curva de preços é
marshalliana (demanda ordinária), caso ora estudado. Quando na curva é
hicksiana (demanda compensada), caso não estudado no presente curso, até
mesmo os bens de Giffen tem curva negativamente inclinada.

Por fim, considerando-se os infinitos níveis de preços que pode ter o bem e/ou
serviço 1, construir-se-á uma curva contínua que será a curva de demanda
marshalliana, que é, portanto, o lugar geométrico dos pontos de maximização da
utilidade do consumidor quando os preços de determinado bem ou serviço varia.
Exemplo de aplicação 02.15
A função de utilidade de um consumidor é U=x 12x23.Os preços dos bens são p1=3
u.m/u.f. e p1=5 u.m/u.f.. A renda mensal desse consumidor é M=150 u.m.. Admita
que sua função de demanda seja linear, simule a variação do preço do bem 1 para
p1’=2 u.m./u.f. e determine a equação dessa função de demanda.
Solução

A função de demanda passará pelos pontos E 0’ e E1’ do diagrama inferior da


Figura 02.31. Considerando que no referido diagrama inferior figurará a curva de
demanda de um só dos dois bens (no caso, o bem 1), seus eixos coordenados
serão indicados por “q” e “p”, quantidade e preço do mencionado bem.De acordo
Suponha-se, agora, que o preço po, do bem ou serviço 1, se reduza ceteris paribus,
com a simulação recomendada, os dois níveis de preços “p” já estão definidos
para o nível de preço p1. A primeira conseqüência dessa redução de preço é um giro (p0=3 e p1=2). As duas abcissas correspondentes respectivamente aos pontos E 0’ e
sinistrógiro, no diagrama superior, da reta MMo em torno de M, uma vez que o E1’ do diagrama inferior serão calculadas por meio da condição de equilíbrio que é
preço do bem ou serviço 2 não se alterou, passando a ocupar a posição MM1. UMg1/p1=UMg2/p2. Daí: UMg1=∂U/∂x1=2x1x23 e UMg2=∂U/∂x2=3x12x22, donde:
2x1x23/3=3x12x22/5, donde x2=9x1/10. Entrando-se com essa relação na função de
Esse giro é indicativo de que o consumidor ficou economicamente melhor, dado restrição orçamentária, tem-se: 150=3x1+5(9x1/10), donde x1=20 u.f. e
que o preço de um bem ou serviço reduziu-se mantido o preço p2 do outro bem ou x2=(9x20)/10, donde x2=18 u.f. Portanto, o par coordenado que representa o
serviço e sua renda M. Ao tornar-se economicamente melhor (mais rico), o ponto E0’ é (20;3). De outro lado, quando se simula um novo nível de preço do
consumidor passou a encontrar seu equilíbrio no ponto E1, do diagrama superior, bem 1 (p=2) ceteris paribus, a condição de equilíbrio passa a ser
correspondente a E1’, do diagrama inferior. 2x1x23/2=3x12x22/5, donde x2=3x1/5. Entrando-se com essa relação na nova função
de restrição orçamentária, isto é, aquela que apresenta um novo preço do bem 1,

65
tem-se: 150=2x1+5(3x1/5), donde x1=30 u.f. e x2=(3x30)/5, donde x2=18 u.f., e o elasticidade-preço da demanda, há a elasticidade-preço da oferta, a elasticidade-
par ordenado que representa o ponto E 11 é (30;2). Finalmente, a função de insumo do produto, entre outras. As elasticidades podem envolver, também,
demanda pelo bem 1, admitida linear, será a reta que passa pelos pontos (20;3) e relações entre variáveis macroeconômicas.
(30;2), cuja equação será p=5-0,1q.
Fig. 02.31 – Diagramas das curvas de indiferença e da função de demanda 7.1. Elasticidade-preço da demanda
aplicados aos dados do Exemplo de aplicação 02.13
A elasticidade da demanda de um consumidor em relação ao preço de
determinado bem, cuja notação adotada será Ɛd é igual a:

Ɛd=(Δq/q)/(Δp/p)

Onde:

Δq é a variação observada na quantidade comprada do bem ou serviço quando o


preço p varia;

Δp é a variação no nível de preço do bem ou serviço;

p é o preço do bem ou serviço; e

q é a quantidade comprada do bem ou serviço.

A expressão da elasticidade acima apresentada pode ser re-escrita do modo


seguinte:

Ɛd=(Δq/Δp)(p/q)

Em notação diferencial, a expressão da elasticidade torna-se 28:

7. Noções básicas sobre elasticidades Ɛd=(dq/dp)(p/q)

Elasticidade é um número adimensional que resulta da razão entre duas grandezas Isso significa que, conhecendo-se a função de demanda p=f(q), determina-se
relativas de variáveis interrelacionadas. Há índices de elasticidades os mais dq/dp e multiplica-se o resultado por p/q, obtendo-se a elasticidade-preço da
diversos. Os mais comuns são a elasticidade-preço da demanda por um bem ou demanda, que também pode ser intitulada elasticidade da demanda em relação ao
serviço, a elasticidade preço da oferta de um bem ou serviço, a elasticidade renda
28
(do consumidor) e a elasticidade-cruzada-preço. Mas, como referido, podem-se Partindo-se de q=f(p) sendo “p” não negativo e f(p) contínua, tem-se que: Δq=f(p+Δp)-f(p), donde Ɛ d=(Δq/Δp)
(p/q)={[f(p+Δp)-f(p)]/Δp)}(p/q). Tomando o limite da função q=f(p) quando o preço se torna um infinitésimo, tem-se
determinar elasticidades de quaisquer variáveis interrelacionadas. Assim, além da limΔp→0{[f(p+Δp)-f(p)]/Δp)}(p/q)=(p/q)limΔp→0{[f(p+Δp)-f(p)]/Δp)}. Mas limΔp→0{[f(p+Δp)-f(p)]/Δp)}=dq/dp, donde
Ɛd=(dq/dp)(p/q).

66
preço. Conforme se percebe, a elasticidade, ao depender também da razão p/q, A elasticidade-preço da demanda será, na maior parte dos casos, negativa, pois as
varia ao longo da curva da função analisada, no caso em apreço, a função de variações de preço e quantidade se dão em sentido inverso 29.
demanda.
Exemplo de aplicação 02.16.
No caso da elasticidade-preço da demanda, é comum referir-se a seus coeficientes
A demanda por determinada mercadoria é dada por x=40.000-10p. Determinar a
com base no módulo │Ɛd│, e evitando-se o sinal negativo para o coeficiente.
elasticidade-preço da demanda para os níveis de preços p o=1.000 e p1=1.800.
Particularmente, a elasticidade-preço da demanda tem uma importância acentuada
nos estudos da teoria do consumidor porquanto serve como instrumento de Solução
medida da sensibilidade deste a variações nos preços aaeercadoriais. Partindo de εd=(dx/dp)(p/x) e considerando que x=40.000-10p, tem-se que ε d=-
Esse indicador econômico será tanto mais importante quanto maior for a 10(p/x). Para p=1.000, tem-se x=30.000, valor obtido na função de demanda;
participação do bem ou serviço no orçamento do consumidor. Mercadorias como o analogamente, para p=1.800, tem-se x=22.000. Daí, calculam-se as elasticidades
sal, a água, o café, o cigarro costumam apresentar o módulo da elasticidade-preço nos dois pontos cujas coordenadas foram determinadas: (i) para o ponto
da demanda inferior a 0,5. A moradia apresenta em geral elasticidade-preço da (30.000;1.000), εd=-10(1.000/30.000), donde εd=-0,33; e (ii) para o ponto
demanda unitária. O automóvel e o lazer em sessões de teatro ou cinema são bens (22000;1800), εd=-10(1800/22000), donde εd=-0,82.
ou serviços elásticos, isto é, apresentam o módulo de elasticidade-preço da 7.2. Elasticidade-preço da oferta
demanda superior à unidade. Os fatores que influem na elasticidade-preço da
demanda são, principalmente: A elasticidade-preço da oferta tem expressão igual à da elasticidade-preço da
demanda, com a diferença de significado da variável q, que, no caso, refere-se à
(i) a disponibilidade de bens substitutos, uma vez que a possibilidade de passar a quantidade ofertada. Portanto:
preferir outro bem que caiba adequadamente no orçamento do consumidor ao
mesmo tempo em que lhe enseje nível assemelhado de utilidade fará com que o Ɛs=(dq/dp)(p/q),
consumidor opte pelo bem substituto, o que produz um índice de elasticidade As elasticidades-preço da oferta são positivas, sem exceção, pois não existe curva
elevado, ou seja, a procura pelo bem cujo preço aumentou será elástica; de oferta com inclinação negativa.
(ii) o período de análise, que, quanto mais longo, mais favorável a que o Exemplo de aplicação 02.17.
consumidor altere sua decisão de compra para adequar-se ao novo nível de preço
A função de oferta de um bem é x=30+6p. Determine a elasticidade-preço da
da mercadoria que habitualmente vinha adquirindo. Isso significa que quanto mais oferta para o nível de preço po=20.
longo o período de análise, maior é a chance de a procura ser elástica; e
Solução
(iii) proporção do orçamento do consumidor comprometida pela compra do bem,
a qual, quanto mais alta, mais sensível torna o consumidor a variação do preço do
29
bem, tornando a procura, desta forma, elástica. Apenas no caso dos chamados bens de Giffen, cuja análise não é objeto deste Curso, a elasticidade-preço da
demanda ordinária é positiva.

67
Partindo-se de x=30+6p, donde se verifica que para p=20, tem-se x=150 e,
considerando-se que Ɛs=(dx/dp)(p/x), donde Ɛs=6(20/150), donde Ɛs=0,80.

07.03. Classificação dos coeficientes de elasticidades-preço da demanda e da


oferta

A classificação dos coeficientes de elasticidade da demanda e da oferta pode ser


sintetizada no quadro da Figura 02.32.

Apesar de a elasticidade, qualquer que seja o par de variáveis interrelacionadas,


depender do ponto da curva para o qual se está procedendo ao cálculo, as
inclinações das curvas de demanda e oferta dão indicações do caráter elástico ou
07.04.Elasticidade-renda
inelástico da demanda ou oferta respectivamente, e, mesmo, são referidas desta
maneira. De modo análogo às formulações das elasticidades-preço da demanda e da oferta,
Fig. 02.32 – Classificação dos coeficientes de elasticidade-preço a elasticidade-renda da demanda de um consumidor por um determinado bem é
da demanda e da oferta calculada mediante a expressão:
Valor ou intervalo
Classificação da demanda e da oferta de valores do η=(dq/dM).(M/q)
conforme o coeficiente de elasticid-preço coeficiente
De elasticidade-preço unitária 1
Onde:
Elástica >1
Inelástica <1
η é o índice de elasticidade-renda da demanda;
Infinita ou perfeitamente elástica →∞
q é a quantidade demandada do bem ou serviço; e
Perfeitamente inelástica 0

Os diagramas da Figura 02.33 mostram os casos possíveis de .Ɛd e Ɛs. O painel M é a renda do consumidor.
superior apresenta gráficos da elasticidade-preço da demanda, enquanto que o O índice de elasticidade-renda permite classificar os bens em normais, superiores
painel inferior apresenta os casos de elasticidade-preço da oferta. Em ambos os (ou de luxo) e inferiores, além de bens de consumo saciado. Os bens normais são
painéis, os dois diagramas da direita apresentam os casos extremos de elasticidade, inelásticos em relação à renda, ou seja, a quantidade comprada cresce com o
isto é, a elasticidade zero e a elasticidade infinita, nesta ordem. Nos casos de aumento da renda porém numa proporção inferior a 1 (0<η<1). Roupas e alimentos
elasticidade intermediária, a inclinação das curvas dão o significado de curva de uso corrente se enquadram nessa categoria.
elástica ou inelástica, tanto para a demanda quanto para a oferta.. Entretanto, o
Os bens superiores ou de luxo são aqueles cujo aumento da quantidade comprada
coeficiente de elasticidade varia conforme o par de pontos (q;p). Em outras
é proporcionalmente maior do que o aumento da renda do consumidor (η>1).
palavras, a elasticidade é medida em cada ponto das curvas.
Fig. 02.33 – Elasticidades-preço da demanda e da oferta
Joias, casacos de pele e carros de luxo alinham entre os bens superiores.

68
Os bens inferiores são aqueles cuja quantidade adquirida diminui com o aumento Isto é:
da renda do consumidor (η<0). São exemplos de bens inferiores a farinha, a carne
Ɛd1x2=(+1,5)(p2/q1)
de segunda, carros populares, entre outros. Por fim, são bens de consumo saciado
aqueles cujo consumo não se altera com o aumento da renda (η=0). Os níveis de p2 e q1 são, respectivamente 10 e 12, este último dado diretamente no
problema formulado. Daí, a elasticidade-cruzada-preço da demanda do bem 1 em
Exemplo de aplicação 02.18.
relação ao preço do bem 2 é:
Considere a função de demanda individual de um bem “i” seguinte:
Ɛd1x2=(+1)(6/12)
q=20+80M0,5/p. Determine a elasticidade-renda da demanda para M=3600 u.m..
Donde:
Solução
Ɛd1x2=0,75
Partindo da expressão ƞ=(dq/dM)(M/q), tem-se ƞ=(40M -0,5/p){M/[(20+80M0,5)/p]},
donde ƞ=40M0,5/(20+80M0,5), donde ƞ=(40x60)/[20+(80x60)], donde ƞ=0,498. Teste-se esse caso prático. Um consumidor não deixa faltar à sua mesa o feijão.
Mas não se alimenta de feijão puro. Em alguns dias faz a mistura do feijão com o
7.5. Elasticidade cruzada-preço da demanda
arroz e, em outros dias, se alimenta de feijão com farinha. Assim, arroz e farinha se
As elasticidades-cruzadas são índices de elasticidades os quais incluem variáveis de substituem na função de complementar o feijão na composição da dieta desse
outro mercado relacionado com o da variável cuja elasticidade se busca determinar. consumidor. Ora, se o preço da farinha aumenta, por exemplo, o consumidor,
Por exemplo, a função de demanda por determinado bem ou serviço é do tipo: passará a comprar uma quantidade menor de farinha e, juntamente com esta
redução na quantidade de farinha, reduz em alguma medida, a quantidade de
q1=f(p1,p2)
feijão. O arroz, substituto da farinha, suprirá o papel desta em alguma medida que
Onde: é dada pela elasticidade-cruzada-preço da demanda por arroz com respeito ao
q1 é a quantidade demandada do bem ou serviço 1; preço da farinha. No caso em apreço, o aumento da quantidade do arroz se dá em
uma proporção menor do que a redução da quantidade de farinha, o que é
p1 é o preço desse bem ou serviço; e revelado pela expressão Ɛd1x2=0,75<1.
p2 é o preço de um bem ou serviço correlato. Por fim, a elasticidade cruzada-preço da demanda permite classificar os bens em
Seja, por exemplo, o alimento arroz cujo preço seja p1 e a farinha (aqui tomada substitutos, quando Ɛd1x2>0, complementares, quando Ɛd1x2<0, e em bens não
como substituta do arroz), cujo preço é p2. Suponha-se que a função de demanda relacionados, quando Ɛd1x2=0.
seja dada por q1=23-2p1+1,5p2. A elasticidade-cruzada preço da demanda de q1 Exemplo de aplicação 02.19.
com relação ao preço p2 no ponto (q1=12;p1=10) será:
A função de demanda por determinada mercadoria é dada por q i=30pj/pi, sendo
Ɛd1x2=(dq1/dp2)(p2/q1) pj o preço de um bem correlato do bem i. Determinar a elasticidade-cruzada-

69
preço da demanda por i com respeito ao preço do bem j para pi=3 u.m. e pj=2 Considerando as definições já dadas de agentes atomizados e de produtos
u.m.. homogêneos, diz-se que a concorrência pura é uma estrutura ou regime de
mercado na qual os agentes, tanto os da procura, isto é, os compradores, quanto
Solução
os da oferta, ou seja, os vendedores, são atomizados, ao mesmo tempo em que
Partindo de ƞ=(∂qi/∂pj)/(pj/qi), tem-se ƞ=30pj/piqi. Quando pi=3 e pj=2, qi=20 u.f., o produto objeto do mercado é homogêneo.
obtido diretamente da função de demanda. Daí, ƞ=(30x2)/(3x20)=1.
Diz-se, também, que qualquer estrutura ou regime de mercado que não
8. Breve estudo seletivo dos mercados satisfizer integralmente a uma das duas condições acima, é dito mercado
Esta seção apresenta um panorama geral das principais características dos distintos imperfeito, ou estrutura de concorrência imperfeita. Conforme ver-se-á à
mercados. Está dividida em duas partes: a dos mercados de bens e serviços de continuação, os mercados em oligopólio, concorrência monopolística e o próprio
consumo e a dos mercados de fatores produtivos. O estudo dos mecanismos de monopólio, são mercados imperfeitos.
formação de preços não são apresentados, entretanto, para todos os mercados, Por outro lado, define-se como mercado de concorrência perfeita aqueles que,
limitando-se àqueles de interesse para os cursos de engenharia e química além de satisfazerem às duas condições da concorrência pura, perfazem,
industrial. também, as condições apresentadas no quadro da Figura 02.34. Esses atributos
8.1. Mercados de bens de consumo adicionais que perfazem a classificação da concorrência em perfeita ― e não
pura ― resultam mais propriamente do desejo de se praparar um cenário que
Os mercados de bens finais compreendem a concorrência perfeita, o monopólio, o permita o exercício do caráter absoluto de competição que se pretende
oligopólio e a concorrência monopolística. A concorrência perfeita e o monopólio, conceber para este regime de mercado. Em outras palavras, um mercado de
por constituirem casos-limite de situações de mercado, são os únicos para os quais concorrência perfeita, na prática, não existe.
se apresentam considerações sobre a formação de preços. Os demais mercados são
simplesmente apresentados em suas características mais importantes. Uma análise mais detida dessas definições levará o leitor à percepção que as
demais condicionantes para a concorrência perfeita estão embutidas nas duas
primeiras condições que serviram para definir a concorrência pura. O que é
importante assinalar é que a competição na concorrência perfeita não é maior
do que na concorrência pura, sendo ambas, antes, estruturas concebidas para
08.01.01. Principais características da concorrência perfeita
permitir o estudo de alguns regimes de mercado que se aproximem de um
A concorrência pura, juntamente com o monopólio, a ser comentado na sub- desses dois modelos teóricos. Em verdade, a expressão concorrência pura faz
seção seguinte, constitui um caso-limite. Cada um desses dois casos-limite se mais o estilo de economistas americanos, enquanto que a concorrência perfeita
situa em uma extremidade da seqüência de estruturas de mercado existentes. é mais utilizada por economistas britânicos. Embora seja difícil identificar-se um
Todos os demais refletem estruturas intermediárias entre essas duas. exemplo prático que reflita plenamente as condições de concorrência perfeita,

70
costuma-se indicar a feira livre como o exemplo clássico deste tipo de estrutura até aqui frequentemente utilizado para as primeiras reflexões sobre o equilíbrio. A
de mercado. Figura 02.35 ilustra essa circunstância.
Fig. 02.34 – Condições adicionais para a concorrência perfeita Fig. 02.35 – Equilíbrio no prazo de mercado

Indiferença
Não há qualquer diferença, ou mesmo desvantagem para o agente comprador em
transacionar com qualquer um dos vendedores, ou que qualquer um destes transacione
com qualquer um dos compradores, porque supõe-se que todos os agentes, tanto os da
procura quanto os da oferta conhecem a natureza do bem ou serviço, como também o seu
preço de mercado.
Transparência do mercado
Todos os agentes, compradores e vendedores, conhecem o mercado, as condições
econômicas dos agentes, o preço do produto e outros fatores necessários às suas
respectivas tomadas de decisão.
Igualdade dos custos de transporte
Os preços finais dos bens ou serviços são afetados de uma mesma proporção pelos custos
de transporte pata todos os consumidores.
Divisibilidade absoluta dos bens ou serviços
Cada bem ou serviço pode ser decomposto em uma fração tão pequena quanto se
pretenda para indicar sua quantidade transacionada. O equilíbrio ocorre no ponto E, representado pelo par de coordenadas (q;p E), que
Livre mobilidade dos agentes e dos bens e serviços
Na perspectiva de longo prazo, os agentes econômicos podem entrar ou sair do mercado.. resulta da interseção de oferta e demanda. Se as funções de oferta e demanda
forem, respectivamente, p=a+bq e p=c-dq, a quantidade de equilíbrio será:

q*=(c-a)/(b+d),

E o preço de equilíbrio será:


8.1.2. Síntese do equilíbrio em concorrência perfeita pE=(ad+bc)/(b+d)
O equilíbrio em concorrência perfeita, abrange três distintas situações de prazo: o Exemplo de aplicação 02.20.
prazo de mercado, também referido como curtíssimo prazo; o curto prazo e o longo
prazo. Comenta-se, a seguir, cada uma dessas situações. As funções de demanda e oferta por um bem são respectivamente p=q 2 e
p=1000/q. Determinar quantidade e preço de equilíbrio desse mercado no prazo
(i) Prazo de mercado de mercado ou curtíssimo prazo..
O prazo de mercado, ou curtíssimo prazo, corresponde à situação em que a firma Solução
dispõe de determinado estoque do bem produzido e precisa vendê-lo. Os custos de
produção já não mais interessam nessa análise pois o problema agora é a
necessidade de desovar o estoque. Nesse caso, o diagrama é de demanda e oferta

71
O equilíbrio desse mercado é alcançado quando q 2=1000/q, donde q=10 u.f.. Daí, o
preço será p=102, donde p=100 u.m. O gráfico da Figura 02.34 ilustra esse equilíbrio
de mercado.
Figura 02.34 – Equilíbrio no curtíssimo prazo

A igualdade acima ocorre para a abscissa q*, do diagrama da esquerda, que o da


firma típica. Essa será a produção da firma. A produção do mercado será Q*=nq*,
onde “n” é o número de firmas presentes no mercado. Os exercícios práticos a
serem ministrados em classe ensejarão o cálculo e/ou a verificação do lucro da
firma e a natureza deste.

Exemplo de aplicação 02.21.

A função de custo de curto prazo de uma firma que produz um só produto é CT=q3-
10q2+17q+66. Determinar o nível de produção em que uma firma maximizará seu
(ii) Curto prazo
lucro considerando que o preço do produto é igual a 5 u. m.. Determinar, ainda,
No curto prazo, a firma submete o preço de mercado à sua estrutura de custos de esse lucro.
curto prazo. O diagrama da Figura 02.34 mostra a transmissão do preço de
Solução
equilíbrio pE, estabelecido pelas forças de demanda e oferta, do diagrama da direita
para o diagrama de custos de curto prazo da firma típica, à esquerda da referida A maximização de lucro ocorre quando CMG=RMG sendo que, em se tratando de
figura. concorrência perfeita RMG=p. Daí (d/dq)CT=3q2-20q+17=5, donde 3q2-20q+12=0,
donde q’=6 e q”=2/3 e, desprezando-se a menor raiz, q *=6. O descarte da raiz
O preço pE, constante porque a firma é tomadora de preços, é igual à receita
menor se dá em razão de esta situar-se no ramo descendente da curva de custo
marginal. A maximização do lucro ocorrerá para:
marginal. O lucro é obtido a partir de π=RT-CT, donde π=pq-CT, donde π=(5x6)-[63-
pE=Cmg (10x62)+(17x6)+66], donde π=6 u.m. (lucro extraordinário). O gráfico da Figura
02.35 mostra essa situação. O diagrama da direita comparece apenas para
Fig. 02.34 – Equilíbrio de curto prazo
mostrar a origem de p=5 u.m..

72
Figura 02.35 – Maximização do lucro da firma

O lucro econômico da firma será zero e nenhuma firma adicional se interessará


em adentrar ao mercado. Os exercícios da Parte II trarão oportunidade de outras
(iii) Longo prazo verificações sobre o equilíbrio em concorrência perfeita no longo prazo.

No longo prazo, não há custos fixos para a firma, a qual pode fazer variar seu Exemplo de aplicação 02.22.
tamanho. Além disso, observar-se-á a entrada e saída de firmas no mercado. O custo total de longo prazo de uma firma que produz um único produto é C T=q3-
Enquanto o mercado for lucrativo, surgirão novas firmas, fenômeno que contribuirá q2+10q. Determinar preço e produção no equilíbrio de longo prazo.
para a expansão da oferta cuja curva deslocar-se-á para a direita e para baixo. O
Solução
diagrama da Figura 02.35 resume esse movimento apresentando as curvas S e S’.
O equilíbrio de longo prazo ocorre para p=C MELPmín. A expressão do custo médio de
Em seu deslocamento, a curva de oferta passará por infinitas posições até que o
longo prazo é CMELP=cTLP/q=q2-q-10. A condição de primeira ordem para obtenção do
preço se iguale ao custo mínimo da curva envoltória do diagrama da esquerda.
custo médio de longo prazo mínimo é /dq=0, donde 2q-1=0, donde q*=0,5. O preço
Nesse ponto, ter-se-á:
será p=CMELPmín=0,52-0,5+10=9,75. A Figura 02.36 apresenta esse equilíbrio de longo
CTlp=CTcp=Cmelp=Cmecp=Cmglp=Cmgcp=Rmg=pE prazo.
Fig. 02.35 – Equilíbrio de longo prazo

Fig. 02.36 – Equilíbrio da firma em concorrência perfeita no longo prazo

73
curvas de custo da firma com as curvas de demanda e de receita marginal do
consumidor típico.

A condição de equilíbrio é a clássica Rmg=Cmg, já demonstrada no texto dos


mercados de concorrência perfeita, porém, no monopólio, o preço praticado é
maior do que a receita marginal porque a curva de demanda não é infinitamente
elástica e, portanto, não é colinear à curva de receita marginal, ostentando
ordenadas sempre superiores às desta.

O fato de o monopolista cobrar um preço superior à receita marginal é indicativo


de que ele realiza lucro puro, isto é, uma parcela de lucro além da parcela de
lucro normal. O monopolista pode operar cobrando um só preço, caso do
monopólio a preço único, ou discriminando preços.
08.01.03. Breve estudo do monopólio O equilíbrio do monopolista, tal como ocorre com firmas em outros regimes de
O monopólio constitui um caso-limite das estruturas de mercado de bens e mercado, é estudado em três horizontes temporais: o prazo de mercado (ou
serviços. Nesse mercado, firma e indústria se confundem, porquanto a indústria, curtíssimo prazo), o curto prazo e o longo prazo.
no monopólio, é constituída de uma única unidade. O outro caso-limite, como já No campo de interesse do presente Curso, realizar-se-á apenas o estudo do
visto, é o da concorrência perfeita. equilíbrio no curto prazo, tanto para a monopólio a preço único quanto para
A existência de uma s firma não significa que outras não estejam tentando monopólio com discriminação de preços.
disputar o mesmo mercado. Essas outras quase sempre não conseguem romper (ii) Monopólio no curto prazo
as barreiras à entrada no mercado do monopolista e continuam atuando
Conforme referido na seção antecedente, as curvas de custo do monopolista são
perifericamente, ocupando um espaço muito pequeno da demanda, o que faz
postas em presença das curvas de receita média (curvas de demanda ou linhas de
com que, na prática, o monopolista possa ser considerado como tal.
preços) e de receita marginal do consumidor, isto é, a interseção da curva Cmg do
(i) Conceito e condição de equilíbrio gráfico da Figura 02.37 com a receita marginal Rmg (ponto E) indica o nível de
O monopólio é um regime de mercado no qual um só produtor vende seu produção no qual o monopolista maximizará seu lucro.
produto homogêneo a consumidores atomizados, podendo vendê-lo a preço O preço corresponderá à ordenada da função de demanda D (linha de preços)
único ou discriminando preços. O monopolista se defronta diretamente com o para o nível de quantidade q*. A receita total do monopolista corresponderá à
mercado consumidor o que implica, ao estudar-se o equilíbrio, confrontar as área do retângulo pEAq*0.

74
Fig. 02.37 – Equilíbrio do monopólio no curto prazo
Fig. 02.38 – Equilíbrio da firma monopolista no curto prazo

O custo total do monopolista equivale ao retângulo CBq*0. Esse custo é


composto de duas parcelas, a de custo fixo, correspondente à área do retângulo
(iii) Monopólio com discriminação de preços
CBGF, e a de custo variável, correspondente à área do retângulo FGq*0.
Na discriminação de preços, o monopolista tem a compreensão de que o
Exemplo de aplicação 02.23.
mercado consumidor total pode ser dividido em vários quinhões (sub-mercados)
Um monopolista defronta-se com a função de demanda dada por p=100-4q. com diferentes capacidades econômicas. O gráfico da Figura 02.39 ilustra o
Estudar o equilíbrio no curto prazo, determinando preço, produção e lucro, equilíbrio com discriminação de preços separando o mercado em apenas dois
sabendo-se que sua função de custo total é CT=6q2+40. quinhões.
Solução O mercado consumidor foi dividido, conforme referido, em duas partes, o
mercado (i) e o mercado (ii). Esses dois quinhões se somam horizontalmente
De p=100–4q, tem-se RT=pq=100q–4q 2, donde Rmg=(d/dq)RT=100–8q. O custo
conformando o mercado total com o qual o monopolista se defronta.
marginal da firma é CMG=dCT/dq=12q. A condição de equilíbrio é Rmg=Cmg. Daí:
100–8q=12q, donde q*=5. O preço de equilíbrio será p E=100–(4x5)=80, e o lucro  O custo marginal do monopolista é lançado no mercado total e, da igualdade
será igual a (RT-CT), sendo RT=pq=80x5=400, e CT=(6x52)+40=190, donde =400- Cmg=Rmg, estabelece-se o nível de produção Q*, a ser produzido e vendido, o qual
190=210 u.m. O gráfico da Figura 02.38 elucida o desenvolvimento algébrico determina o preço único que poderia ser cobrado (pu).
acima apresentado.

75
Fig. 02.39 – Monopólio com discriminação de preços Solução

Inicia-se pelo cálculo do preço único considerando, para tanto, que o mercado
total é a soma das quantidades dos dois quinhões em que o monopolista o dividiu
e que, evidentemente, p1=p2=p, ou seja: q=q1+q2=(32-0,4p)+(18-0,1p); donde:
q=50-0,5p; donde: p=100-2q. Essa última expressão é a função de demanda do
mercado total, a qual ensejará o cálculo da receita marginal que será confrontada
com o custo marginal do monopolista (condição de equilíbrio). Daí: R T=pq=(100-
2q)q; donde RT=100q-2q2; donde RMG=dRT/dq=100-4q.

O custo marginal é: dCT/dq=2q+10, e a quantidade de equilíbrio resultará, como


mencionado, de: CMG=RMG, donde 2q+10=100-4q, donde q*=15, quantidade que,
Os preços discriminados são encontrados nos diagramas dos mercados (i) e (ii), levada à função de demanda p=100-2q, permite revelar o preço de equilíbrio
respectivamente, transferindo-se o nível de Cmg=Rmg para estes dois diagramas, pE=70. Para q*=15, a receita marginal corresponde a R MG=100-(4x15), isto é
marcando-se as abcissas q1* e q2* que serão as quantidades de equilíbrio de cada RMG=40.
mercado e, mediante uma linha de chamada vertical em cada um, obter-se o
preço a ser cobrado no espectivo mercado, isto é, pE1 e pE2. Essa receita marginal será a mesma em cada fatia de mercado quando o
monopolista decide discriminar preços. As expressões de receita marginal em
A ordenada preço único pu é transferida para os dois diagramas da esquerda cada fatia do mercado são, respectivamente:
apenas para enfatizar que o preço único tem um nível intermediário entre os dois
outros. É possível demonstrar-se, também, que o preço maior é imposto ao (i) De q1=32-0,4p1, tem-se p1=80-2,5q1, donde RT1=80q1-2,5q12, donde RMG1=80-5q1
mercado menos elástico e vice-versa. (ii) De q2=18-0,1p2, tem-se p2=180-10q2, donde RT2=180q2-10q22, donde RMG2=180-
Exemplo de aplicação 02.24 20q2

Um monopolista vende seu produto cobrando preços diferenciados a duas fatias Daí: RMG1=80-5q1=40; e RMG2=180-20q2=40, donde q1*=8 e q2*=7. Entrando-se com
de um mesmo mercado cujas funções de demanda são respectivamente q 1=32- essas quantidades nas correspondentes funções de demanda, têm-se p E1=60 e
0,4p1 e q2=18-0,1p2. A função de custo total do monopolista é C T=q2+10q. pE2=110. O gráfico da Figura 02.40 ilustra este processo de diferenciação de
Determine preços e quantidades de equilíbrio em cada fatia do mercado, bem preços em monopólio.
como preço e quantidade de equilíbrio caso o monopolista não discriminasse
preço, isto é, adotasse o preço único. Mostre que, na discriminação de preços, ele
impõe um preço maior ao mercado menos elástico e um preço menor ao mercado
mais elástico.

76
Fig. 02.40 – Resultado da diferenciação de preços A Figura 02.41 mostra a tabela de preços unitários do fornecimento da água
potável pela Empresa Baiana de Saneamento – EMBASA, no Estado da Bahia.
Observa-se que o preço varia, na tarifa residencial, por exemplo, entre R$0,165 e
R$1,66 por metro cúbico de água fornecido.
Fig. 02. 41 – Tarifas residenciais normais/veraneio
de abastecimento de água da Embasa30
INTERVALO DE CONS (m3) PREÇO (R$/m3)
0 a 10 1,94
11 a 15 5,42
16 a 20 5,80
21 a 25 6,51
26 a 30 7,27
Finalmente, as elasticidades-preço da demanda nesses dois pares de pontos são: 31 a 40 7,65
41-50 8,77
Ɛd1=(dq1/dp1)(pE1/q1*)=-0,4x(60/8)=-3; e Ɛd2=(dq2/dp2)(pE2/q2*)=-0,1x(110/7)=-1,57, >50 10,55
comprovando que o monopolista impõe um preço mais alto ao sub-mercado de Fonte: EMBASA. Salvador. 2014.

menor módulo da elasticidade-preço da demanda e um preço mais baixo ao sub- Assinala-se que, na prática, o cálculo dos preços progressivos nem sempre é
mercado mais elástico. feito com base nas elasticidades-preço da demanda. É comum que os saltos de
um nível tarifário para o seguinte seja definido levando-se em conta a vazão
(iv) Exemplo prático de discriminação de preços
média de consumo das diversas classes de usuários formando-se as tarifas em
O monopólio com discriminação de preços, também referido como monopólios bloco. Na tabela da referida Figura 02.41, os blocos são os intervalos de vazão
com diferenciação de preços, é muito comum, ocorrendo, por exemplo, com o contidos na coluna da esquerda.
fornecimento de água e com o fornecimento de energia, nos quais os primeiros
Um breve exame das cifras dessa tabela permite deduzir que os consumidores
metros cúbicos de água e os primeiros quilowatts-hora de energia são cobrados
de renda mais alta subsidiam os menos aquinhoados com a riqueza material,
a um preço unitário menor do que as unidades adicionais consumidas. Isso
pois, mesmo cobrando um preço unitário menor pelas primeiras unidades
significa dizer que as famílias que consomem menos pagam um preço menor
vendidas, o produtor não deixará de arrecadar tudo quanto precisa para
pela água e pela energia, porque estão sujeitas ao menor preço unitário do
equilibrar o seu orçamento, cobrando a maior daqueles consumidores que
escalonamento que é feito.
consomem mais e que são os de renda mais elevada.
Aquelas famílias que consomem mais, passam a ter um preço médio final maior,
E quando o monopólio é privado, os lucros são extraordinários, superando o
porque pagam o preço menor pelas primeiras unidades consumidas, mas pagam
lucro normal nulo que é praticado nos mercados de concorrência perfeita. Nos
um preço maior pelas unidades adicionais que consomem.
30
As demais categorias de tarifas residenciais são a residencial social, a residencial intermediária e a residencial
filantrópica.

77
monopólios privados não regulados ou fracamente regulados, os preços vão à Portanto:
perversidade. RMG=p+q(dp/dq) (I)
Multiplicando-se e dividindo-se a expressão (I) por “p”, tem-se:
E, quando esse monopólio adota a diferenciação de preços, os preços mais RMG=(p/p)(p+q.dp/dq)
elevados são ainda mais perversos, são preços escorchantes para cima. Donde:
RMG=p[1+(1/εd)],
(v) Natureza das barreiras à entrada
Considerando-se que εd<0, e tomando-a por seu valor absoluto:
Conforme se percebe, uma preocupação constante do monopolista é a de RMG=p[1-(1/│εd│)]
manter à distância os potenciais concorrentes, o que é feito por meio das Adicionalmente, considerando-se que, como já referido, no equilíbrio, R MG=CMG, a
expressão (II) pode ser reescrita do modo seguinte:
barreiras à entrada. As barreiras à entrada podem ser de natureza tecnológica ou
CMG=p[1-(1/│εd│)],
legal-institucional. Donde, subtraindo-se CMG de “p” e dividindo-se toda a expressão por “p”, resulta
As barreiras tecnológicas ocorrem nos casos dos monopólios naturais, o poder de monopólio (PM):
PM= (p-CMG)/p=p-{p[1-(1/│εd│)]}
constituídos por firmas de proporções grandes, situação em que não encontra
Donde finalmente:
competidores, pois as firmas de menor tamanho não são capazes de produzir PM=1/│εd│
com a mesma eficiência que tem o monopolista. Exemplos de monopólios com Exemplo de aplicação 02.25
barreiras tecnológicas são setores como os que atuam por meio de franquias. A função de demanda com que se defronta um monopolista é dada por p=80-q 2 e
sua função de custo total é CT=q2+10q. Calcular a produção e o preço de equilíbrio
As barreiras à entrada legais-institucionais podem ser de natureza variada. A
dessa firma e, em seguida, calcular seu poder de monopólio.
proteção às inovações sob a forma de marcas registradas ou patentes, conforme Solução
o caso, constituem tipos de barreiras legais-institucionais. O privilégio de que se O equilíbrio é dado por CMG=RMG,
beneficiou a Petrobrás na exploração do petróleo no Brasil por muitos anos é Donde:
outro exemplo de barreira legal-institucional para proteger um monopólio. 2q+10=80-3q2
(vi) Poder de monopólio Donde:
A firma monopolista tem a capacidade de cobrar um preço superior ao custo q*=4,51 (desprezando-se a menor das duas raízes).
marginal. A proporção dessa diferença (p E-CMG) em relação ao preço cobrado que O preço de equilíbrio é pE=80-4,512=59,66.
é o preço de equilíbrio pE é denominada Poder de Monopólio. Daí, o custo marginal é:
Considerando que, no equilíbrio, o custo marginal iguala-se à receita marginal, CMG=(2x4,51)+10=19,02.
busca-se a expressão desta última, que é dada por: Com os dados obtidos, o poder de monopólio pode ser calculado pelos dois
RMG=dRT/dq seguintes métodos:
Onde: (i) PM=1/│εd│
RT é a receita total do monopolista (RT=p.q), sendo p=f(q); e A elasticidade-preço da demanda é dada por:
q é a produção da firma. εd=(dq/dp)(pE/q*)=(-1/2q)(pE/q*)=[-1/(2x4,51)](59,66/4,51)=1,47

78
Donde: nada indicando que o comprador exerça, com freqüência, algum tipo de
PM=0,68; e preferência por essa ou por aquela marca.
(ii) PM=(p-CMG)/p=(59,66-19,02)/59,66
Donde: Diz-se que o oligopólio é diferenciado, quando o produto tem substitutos
PM=0,68. próximos, ou seja, o consumidor tem a percepção de que diferentes tipos ou
mesmo marcas do produto são objeto da oferta por parte de um número
8.1.4. Notas sobre os oligopólios
reduzido de vendedores que controla uma parte expressiva do mercado. O
Oligopólios são regimes de mercado nos quais poucas firmas vendedoras, consumidor, neste caso, pode exercer a sua escolha por este ou por aquele
concorrentes e rivais, controlam a maior parte da oferta de um produto, produto em um rol de alguns tipos ou marcas diferenciadas. A indústria de
homogêneo ou diferenciado, que é vendido a consumidores atomizados. cigarros, com suas distintas marcas, constitui um tipo de oligopólio diferenciado.
A rivalidade, característica forte no oligopólio pode, em alguns desfechos 31, ser Na análise de formação de preços em oligopólio, há diversos modelos de
substituída por acordos, fazendo com que as firmas se unam em torno de um desfecho. Entre estes, o de Cournot, o de Bertrand, o de Chamberlin, o de
mesmo propósito. Isso, no entanto, não retira a índole do oligopolista de ser Edgeworth, o de Stackelberg, o modelo da coalisão, entre outros33. No espaço do
sempre um rival dos demais, figura que se acentua ainda mais no caso dos presente capítulo, não serão desenvolvidos os mecanismos de formação de
duopólios. preços para o oligopólio.
Outra característica importante do oligopólio resulta do número pequeno de (I) Modelo de Cournot
firmas, que faz com que o comportamento de uma afete o comportamento das
Por comodidade de cálculo, analisa-se o caso do oligopólio singular que é o
demais. E mais, ao adotar determinada decisão, cada oligopolista fica atento às
duopólio. Ambas as firmas duopolistas se defrontam com a mesma função de
possíveis reações de seus concorrentes, para melhor situar sua nova “jogada”, tal
demanda que é dada por p=f(q1+q2), onde q1 é a quantidade que o duopolista 1
como se tivesse diante de si um tabuleiro de xadrez, o qual funcionaria como seu
produzirá e q2 é a quantidade que o duopolista 2 produzirá. As receitas totais das
mercado, estando do outro lado o seu concorrente e rival.
firmas serão dadas pelo produto pxqi, isto é, RT1=q1.f(q1+q2) e RT2=q2.f(q1+q2). O
Os oligopólios podem ser classificados em puros e diferenciados. O oligopólio é custo de cada um dos duopolistas depende de sua própria quantidade produzida,
puro quando o seu produto ou serviço é homogêneo. Os produtores das diversas isto é, CT1=g1(q1) e CT2=g2(q2). Daí, os lucros serão dados por:
marcas de cimento Portland costumam formar um oligopólio puro, pois 33
No modelo de Cournot, cada firma adapta passivamente a sua conduta à do rival. O modelo de Bertrand é, em
praticamente há um só tipo deste material 32 e com características bem definidas, certo sentido, um sucedâneo do de Cournot, com a diferença para este que no processo de ajustamento, as
decisões das firmas serão calcadas sobre os preços de transação e não sobre as quantidades produzidas,
31 admitindo que os preços das rivais se mantenham fixos. O modelo de Chamberlin produz resultados diferentes do
O estudo da formação de preços em oligopólio se dá sempre pela análise de um certo tipo de desfecho, ou seja, o modelo de Cournot, porque admite que os vendedores consideram a dependência mútua entre si, afetando seus
comportamento adotado pelas firmas até chegar-se ao preço de estabilidade. respectivos comportamentos. No modelo de Edgworth, à semelhança do modelo de Bertrand, as firmas admitem
32
Em verdade, há cimentos de distintas categorias em termos de contribuição para a resistência dos produtos que que colocarão no mercado toda a sua produção, supondo que os preços dos demais vendedores continuarão fixos.
são fabricados mediante o seu uso. As peças e as obras de concreto protendido, por exemplo, exigem cimentos de O modelo de Stackelberg orienta o seu cálculo mediante as escolhas das firmas entre as que pretendem atuar
alta resistência, diferentes dos cimentos para as obras correntes. Mas para cada mesmo tipo de cimento, não há como líder e aquelas que concordam em atuar como seguidoras. E o modelo da coalisão equivale, no que
uma preferência diferenciada, conotando o caráter homogêneo desse produto. concerne à formação de preços, a uma fusão entre as firmas (merger).

79
π1=q1.f(q1+q2)-g1(q1), e A função de demanda pode ser escrita do modo seguinte: q 1+q2=4000-10p, donde
p=400-0,1(q1+q2). Os lucros dos duopolistas são dados por π1=pq1-CT1 e π2=pq2-CT2,
π2=q2.f(q1+q2)-g2(q2)
donde π1=[400-0,1(q1+q2)]q1-0,1q12-20q1-100.000 e π2=[400-0,1(q1+q2)]q2-0,4q22-
A conduta de cada uma das firmas é a da maximização do lucro admitindo que a 32q2-20.000, donde π1=380q1-0,2q12-0,1q1q2-100.000 e π2=368q2-0,5q22-0,1q1q2-
rival não altere a quantidade que produz em função da quantidade que ele 20.000. As condições de primeira ordem para o equilíbrio dos duopolistas
próprio decide produzir. Para tanto, as condições de primeira ordem são: implicam: ∂π1/dq1=0 e ∂π2/dq2=0, donde π1=380-0,4q1-0,1q2=0 e 368-q2-0,1q1=0,
∂π1/∂q1=0, e donde determinam-se as equações de reação dos duopolistas: q 1=950-0,25q2 e
q2=368-0,1q1. A solução do sistema formado pelas equações de reação conduzem
∂π2/∂q2=0. ao ponto de equilíbrio de Cournot e responde à primeira indagação do problema:
As condições de segunda ordem são: (i) a solução do sistema formado pelas equações de reação pode ser encontrada,
por exemplo, pelo método de substituição, entrando-se com a expressão explícita
∂2π1/∂q12<0, e
em relação a “q2” na curva de reação do duopolista I, como se segue: q 1=950-
∂2π2/∂q22<0. 0,25(368-0,1q1), donde q1=880 u.f.; levando-se esse resultado á curva de reação
do duopolista II, tem-se: q2=368-(0,1x880), donde q2=280 u.f.; (ii) o preço de
O sistema de equações relativo às condições de primeira ordem, ao ser
equilíbrio é encontrado por meio da função de demanda indireta p=400-
explicitado em relação a q1 e q2, corresponde às equações de reação, isto é,
0,1(q1+q2), substituindo-se os valores de q 1 e q2, isto é: p=400-0,1(880+280),
determinam o critério mediante o qual cada duopolista reage às decisões do rival.
donde p=284 u.m.; (iii) os lucros são obtidos entrando-se com as quantidades
A solução desse sistema de equações de reação é o próprio desfecho do modelo
produzidas em alguma das expressões do lucro de cada duopolista anteriormente
de Cournot.
estabelecidas, preferencialmente nas expressões que se apresentem mais
Exemplo de aplicação 02.26. simplificadas. Desse modo: π1=(380x880)-(0,2x8802)-(0,1x880x280)-100.000 e
As firmas de um duopólio homogêneo praticam o comportamento previsto na π2=(368x280)-(0,5x2802)-(0,10x280x880)-20.000, donde π1=54.880 e π2=19.200; o
solução clássica de Cournot. As funções de custo total de curto prazo são gráfico que ilustra as curvas reativas e o ponto de equilíbrio é apresentado na
CT1=0,1q12+20q1+100.000 e CT2=0,4q22+32q2+20.000. As duas firmas fabricam um Figura 02.42.
produto homogêneo cuja função de demanda é q=4.000-10p. Considerando que o
equilíbrio de Cournot é alcançado, pede-se determinar: (i) a produção de Figura 02.42 – Curvas de reação e equilíbrio de Cournot

equilíbrio de cada firma; (ii) o preço de equilíbrio; (iii) o lucro puro de cada firma;
e (iv) a representação gráfica das equações de reação indicando o ponto de
equilíbrio de Cournot.

Solução

80
equilíbrio de Stackelberg cuja solução corresponde ao modelo de Cournot, isto é,
por meio da solução do sistema de equações de reação. E, no terceiro caso, há
complementaridade de interesses e cada firma se coloca na condição que lhe é
mais lucrativa, ou seja, uma liderando e a outra sendo liderada ou seguidora.

Exemplo de aplicação 02.27.

Em um duopólio homogêneo, a função de demanda é dada por p=80-0,4(q 1+q2) e


as funções de custo dos dois duopolistas são respectivamente C T1=4q1 e CT2=0,6q22.
Estudar o desfecho desse duopólio por meio da solução de Stakelberg.

Solução

As funções de lucro dos duopolistas são:


(ii) Modelo de Stackelberg
π1=pq1-CT1, e
O modelo de Stackelberg tem a primeira parte de seu desenvolvimento igual à
π2=pq2-CT2
solução de Cournot, até à produção das equações de reação. A partir daí, em vez
de resolver-se o sistema formado por essas equações, o desfecho de Stackelberg Donde:
é obtido por meio de duas suposições. A primeira, segundo a qual um dos
π1=[80-0,4(q1+q2)]q1-4q1, e
duopolistas liderará o duopólio e, em consequência, o outro será seguidor; e, a
segunda, dando-se a liderança ao outro duopolista, ocasião em que seu rival é π2=[80-0,4(q1+q2)]q2-0,6q22
seguidor, isto é, reage à sua decisão. O desfecho dependerá dos níveis de lucro As condições de primeira ordem são:
que cada firma poderá auferir em cada uma das duas condições (de líder e de
seguidor ou liderado, ou ainda satélite). Cada firma procurará colocar-se na ∂π1/∂q1=0, e
condição que lhe for mais lucrativa, e daí poderão suceder três situações: (i) ∂π2/∂q2=0.
ambas as firmas pretendem ser a líder; (ii) ambas as firmas pretendem ser a
Donde, as equações de reação são:
seguidora; e (iii) uma das firmas pretende ser a líder e a outra pretende ser a
seguidora. q1=(76-0,4q2)/0,8=95-0,5q2

No primeiro caso, ocorre o desequilíbrio de Stackelberg, e as firmas poderão q2=(80-0,4q1)/2=40-0,2q1


buscar o entendimento para que maximizem o lucro conjunto das duas.
Até esta altura, a conduta foi exatamente a mesma que se seguiu na solução de
Eventualmente, durante esse processo, uma das duas poderá liderar a outra
Cournot. No modelo de Stackelberg, estudam-se duas hipóteses a partir deste
conduzindo o entendimento para o terceiro caso. No segundo caso, ocorre o

81
ponto. A primeira é a de considerar o duopolista 1 como líder do duopólio e, em PE=80-0,4(93,75+21,25)
consequência, o duopolista 2 como seguidor do líder. Na segunda suposição, os
Donde:
papeis dos duopolistas são invertidos.
pE=34,00 u.m.
Hipótese 1:
Conhecidos o preço de equilíbrio e as quantidades a produzir por cada duopolista
Duopolista 1 é líder e duopolista 2 é seguidor:
nesta primeira hipótese, determinam-se os lucros:
Nesta hipótese, substitui-se, na expressão do lucro da empresa líder a variável q 2
π1=pq1-4q1=(34,00x93,75)-(4x93,75)
(produção da empresa seguidora) por sua equação de reação, uma vez que o
seguidor apenas reage às decisões do líder. O lucro do duopolista líder fica Donde:
explicitado em relação à sua própria produção (sobre a qual ele detém controle), π1=2812,50 u.m.
e é submetido à conduta de maximização, como se segue:
π2=pq2-0,6q22=(34,00x21,25)-(0,6x21,252)
π1={80-0,4[q1+(40-0,2q1)]}q1-4q1
Donde:
A condição de primeira ordem para maximizar o lucro 34 é:
π2=451,56 u.m.
dπ1/dq1=0,
Os dois lucros ora calculados serão levados à comparação, no final, com os da
Donde: Hipótese 2, a seguir analisada.
60-0,64q1=0 Hipótese 2:
Donde: Duopolista 2 é líder e duopolista 1 é seguidor:
q1*=93,75 u.f. Na presente hipótese, a equação de reação da empresa 1 é que será introduzida
E a produção do duopolista seguidor será: na expressão do lucro da empresa 2, ora líder:

q*2=40-(0,2x93,75) π2={80-0,4[(95-0,5q2)+q2]}q2-0,6q22

Donde: A condição de primeira ordem para maximizar o lucro 35 é:

q*2=21,25 u.f. dπ1/dq1=0,

O preço único (o oligopólio é homogêneo ou puro) será:


35
Deixa-se de verificar a condição de segunda ordem que apenas confirma tratar-se de um ponto de máximo (e não
34
Deixa-se de verificar a condição de segunda ordem que apenas confirma tratar-se de um ponto de máximo (e não de mínimo), o que já é reconhecido pela natureza da função (lucro).
de mínimo), o que já é reconhecido pela natureza da função (lucro).

82
Donde: Quadro comparativo

42-1,6q2=0 Para a verificação do desfecho de Stackelberg, elabora-se o painel


Donde: seguinte:
DUOPOLISTA LÍDER SEGUIDOR
q2*=26,25 u.f. I 2.812,50 2.681,57
II 551,25 451,56
E a produção do duopolista seguidor será:
Verifica-se que ambas as empresas realizam lucro maior quando se encontram na
q*1=95-(0,5x26,25) condição de líder, ou seja, ambas pretendem liderar o duopólio. Neste caso,
Donde: ocorrerá o desequilíbrio de Stackelberg e é provável que as firmas busquem o
entendimento para a maximização do lucro conjunto.
q*1=81,88 u.f.
8.1.5. Concorrência monopolística
O preço único (o oligopólio é homogêneo ou puro) será:
A concorrência monopolística é uma estrutura de mercado na qual vendedores
PE=80-0,4(81,88+26,25) atomizados ofertam seus bens ou serviços diferenciados a compradores também
Donde: atomizados, sendo que cada vendedor percebe ser detentor de um certo
domínio do mercado.
pE=36,75 u.m.
Os bens ou serviços objeto desse mercado são, portanto, substitutos próximos
Conhecidos o preço de equilíbrio e as quantidades a produzir por cada duopolista
mas não perfeitos. A diferenciação, em concorrência monopolística, pode ser
nesta segunda hipótese, determinam-se os lucros:
real ou artificial. A diferenciação é real quando baseada em diferentes
π1=pq1-4q1=(36,75x81,88)-(4x81,88) características de tamanho, densidade, natureza de substância, no caso de bens,
e quando baseada em atributos de serviços concretamente diferentes, no caso
Donde:
de serviços.
π1=2681,57 u.m.
Mas a diferenciação pode ser artificial, também denominada imaginária ou
π2=pq2-0,6q22=(36,75x26,25)-(0,6x26,252) fictícia, quando apenas leva o consumidor a crer que esteja diante de um
Donde: produto ou serviço diferente daquele que é oferecido por outro(s) vendedor(es).
A propaganda muito contribui para a disseminação de um produto
π2=551,25 u.m. artificialmente diferenciado.
Do mesmo modo como se indicou no final da Hipótese 1, os dois lucros ora A propaganda é tão importante que a diferenciação se torna acentuadamente
calculados serão levados à comparação com os daquela Hipótese. dependente dela. Em verdade, são os apelos da publicidade que fazem com que

83
o consumidor passe a dar uma maior atenção ao bem ou serviço objeto da Assim, todas as condições enumeradas no sub-item (i), da sub-seção (08.01.01)
propaganda, terminando por preferi-lo em razão da percepção a que é induzido são aqui aplicáveis, e os agentes, tanto os que compram quanto os que vendem,
em relação aos atributos do produto ou serviço. não podem influir nos níveis de preços nem no comportamento dos demais
agentes que compõem o mercado.
Há uma variada gama de exemplos de estruturas de mercado de concorrência
monopolística. Muitos estão associados a produtos cujo apelo maior se dê em Em outras palavras, como na concorrência perfeita dos bens serviços finais, os
relação a gostos e preferências do consumidor como, por exemplo, agentes econômicos são tomadores de preços. Os preços em concorrência
determinados alimentos que são oferecidos por um expressivo número de perfeita resultam da igualdade entre receita e custo marginais e são constantes.
marcas. Por igual aí incluem-se os artigos de higiene e toucador, de escritório, os
8.2.2. Monopsônio
inúmeros artigos que obedecem às ondas da moda, como peças de vestuário,
equipamentos individuais de esportes, entre outros. São produtos que De modo inverso ao que se passa no monopólio, o regime de monopsônio tem
costumam ser apresentados com embalagens vistosas, fator importante da um único comprador de determinado fator de produção, que atua perante
diferenciação, para chamar a atenção do consumidor. vendedores atomizados desse fator. Se, em monopólio, é o produtor que explora
os consumidores compradores, no caso presente, de monopsônio, é um único
8.2. Mercados de fatores de produção
comprador que explora os produtores, empurrando o preço do fator de
Os mercados dos fatores de produção correspondem a transações que, em um produção para baixo.
grande número de casos, são realizadas entre firmas, umas produzindo e
Pode-se afirmar, portanto, que monopsônio é uma estrutura de mercado em que
vendendo insumos produtivos a outras. Mas não somente firmas são agentes
um único comprador, ou mesmo um grupo de compradores atuando em bloco,
desses mercados. Mesmo quando um fator de produção é vendido por uma
procura e compra sozinho uma determinada quantidade de um fator de
pessoa física, esta última está atuando como agente produtor. É o caso de
produção que lhe é ofertado por vendedores atomizados.
profissionais que vendem seus serviços a firmas ou a outros profissionais. O que
caracteriza o mercado de fatores de produção é a presença destes como objeto Do mesmo modo que o monopolista, o monopsonista não pode fixar, ao mesmo
das transações. Apresentam-se, a seguir, breves comentários sobre esses tempo a quantidade do fator que pretende comprar e o preço que está disposto
mercados. a pagar. Se o monopsonista definir a quantidade, o preço que será pago será
definido pelo mercado. Se, ao contrário, o monopsonista estabelecer o preço
8.2.1. Concorrência pura e concorrência perfeita dos fatores de produção
que quer impor aos detentores do fator de produção, a quantidade a ser
A concorrência perfeita de fatores de produção é uma estrutura de mercado transacionada depende da função de oferta destes.
praticamente igual à concorrência perfeita de bens e serviços para o consumidor,
Habitualmente, estuda-se a conduta otimizadora do monopsonista como um
com a diferença que os bens e serviços que são vendidos a agentes da produção
comprador único do fator mão de obra (L), com o qual ele produz o seu produto
e não do consumo. Por isso mesmo, neste caso, os bens e serviços são ditos
(q). Ele paga salário (w) ao trabalhador e vende seu produto por um preço o
fatores de produção.

84
preço (p), admitido constante, isto é, como se fosse vendido em mercado de CT=(140x24,62)+(23x24,622)=17.388,12 u.m., donde finalmente o lucro é π=R T-
concorrência perfeita. CT=20.140,95-17.388,12=2.752,83 u.m..

Com esses elementos, pode-se afirmar que a função de produção do 8.2.3. Oligopsônio
monopsonista é p=f(L), que sua receita total é R T=pq e seu custo total é dado por
Inversamente ao que se passa com o oligopólio, o oligopsônio é uma estrutura
CT=wL, ou seja, o custo total da firma monopsonista é o custo total do trabalho.
ou regime de mercado em que poucos compradores de fatores de produção
Sucede que o salário que o monopsonista paga depende da quantidade de
adquirem a posse ou o direito de uso de algum desses fatores em mercados
trabalho que ele contrata, isto é, w=g(L) com dw/dL>0. Daí, dC T/dL=w+L.dw/dL.
ofertantes atomizados, influindo no nível de preço a pagar.
Na sua conduta, ele procura maximizar o lucro π=R T-CT=pq-wL, ou ainda,
π=p.f(L)-wL. A condição de primeira ordem é d π/dL=0, donde p.f’L-w-L.dw/dL=0, O oligopsônio pode ser puro ou diferenciado, de acordo com a natureza
donde p.f’L=w+L.dw/dL, o que corresponde a afirmar que o valor do produto homogênea ou diferenciada, respectivamente, do fator de produção objeto do
marginal do monopsonista (membro à esquerda na expressão) é igual ao custo mercado oligopsonístico. Como exemplo de oligopsônio, tem-se a venda da
marginal do trabalho (membro à direita da mesma expressão. A condição de farinha a poucas redes de supermercados em Salvador por um significativo
segunda ordem é: d2π/dL2=p.f”(L)-2g’(L)-L.g”(L)<0, donde p.f”(L)<2g’(L)+L.g”(L). número de “Casas de Farinha”, pequenas fábricas, algumas caseiras, no
Recôncavo Baiano e adjacências. Nesse caso da venda da farinha, as condições
Exemplo de aplicação 02.28.
da transação são comandadas pelas poucas redes de supermercados
Estudar a conduta otimizadora de um monopsonista cuja função de produção compradoras, que avaliam as condições da oferta atomizada e definem os seus
seja q=16L2-0,2L3, sabendo que o preço do salário que ele paga é w=140+23L e limites de negociação com os donos das referidas pequenas fábricas.
que o preço de seu produto é p=3 u.m.
No espaço deste Curso, estuda-se o duopsônio homogêneo e seu desfecho.
Nesse modelo, cada uma das firmas compradoras detém o controle sobre a
quantidade de suas compras mas é afetada pela quantidade adquirida por seu
Solução
concorrente. Admita-se que o único fator de produção adquirido seja o trabalho
A receita total do monopsonista é RT=pq=48L2-0,6L3 e o custo total é (L)36, pago por meio de salário (w) cuja função cresce com a quantidade
CT=wL=140L+23L2. O lucro será: π=48L2-0,6L3-140L-23L2, donde π=25L2-0,6L3-140L. adquirida, isto é, w=f(L1+L2). Admita-se, adicionalmente, que o produto da firma
A condição de primeira ordem é dπ/dL=0, donde 50L-1,8L3-140=0, donde L’=24,62 seja vendido em mercado de concorrência perfeita, isto é, os preços p 1 e p2 são
e L’=3,16. Verificando-se a condição de segunda ordem, tem-se: -3,6L+50<0, constantes. As funções de produção das firmas dependem, portanto, apenas do
donde L>13,88, o que elimina a menor das duas raízes, resultando a solução fator mão de obra e são do tipo q 1=g(L1) e q2=g(L2). Os lucros dos duopsonistas
L=24,62. Essa solução corresponde a um nível de produto igual a q=(16x24,62 2)- serão:
(0,2x24,623), donde q*=6713,65 u.f., donde a receita total é
π1=p1.g1(L1)-L1.f(L1+L2)
RT=pq=3x6713,65=20.140,95 u.m., o custo total é
36
O estudo aplica-se a qualquer outro fator de produção.

85
π2= p2.g2(L2)-L2.f(L1+L2) Duas firmas prestadoras de serviços cujo insumo único é a mão de obra vão se
instalar em uma região e contratarão trabalhadores para esta finalidade. O preço
As condições de primeira ordem para um máximo são:
do salário é função da quantidade total empregada de acordo com a função
∂π1/∂L1=p1.g1’(L1)-f(L1+L2)-L1.f’(L1+L2)=0, e seguinte: w=1,6+0,1(L1+L2). As funções de produção das firmas são
∂π2/∂L2=p2.g2’(L2)-f(L1+L2)-L2.f’(L1+L2)=0. respectivamente q1=14L1-0,3L12 e q2=10l2-0,1L22. Os produtos das firmas são
vendidos em mercados de concorrência perfeita aos preços unitários p 1=3 u.m. e
Donde: p2=4 u.m.. Essas firmas adquirirão mais de 70% dos serviços de mão de obra
p1.g1’(L1)=f(L1+L2)+L1.f’(L1+L2) disponível na região, configurando um caso de duopsônio. Estude o desfecho
desse caso fazendo uso da solução modificada de Cournot.
p2.g2’(L2)=f(L1+L2)-L2.f’(L1+L2)
Solução
As expressões acima indicam que, no equilíbrio, o valor do produto marginal de
cada duopsonista (membro à esquerda de cada equação) é igual ao custo Os lucros dos dois duopsonistas são:
marginal do fator de produção (membro à direita de cada equação). É possível π1=3(14L1-0,3L12)-L1[1,6+0,1(L1+L2)]
verificar-se que o custo marginal do duopsonista que adquire o mais elevado
nível do fator produtivo é maior do que o custo marginal de seu rival. π2=4(10L2-0,1L22)-L2[1,6+0,1(L1+L2)]

As condições de segunda ordem são: Desenvolvendo essas expressões e reduzindo-as aos termos semelhentes, têm-
se:
p1.g1”(L1)-2f’(L1+L2)-L1.f”(L1+L2)<0
π1=40,4L1-L12-0,1L1L2
p2.g2”(L2)-2f’(L1+L2)-L2.f”(L1+L2)<0,
π2=38,4L2-0,5L22-0,1L1L2
Donde:
As condições de primeira ordem para a maximização dos lucros dos duopsonistas
p1.g1”(L1)<2f’(L1+L2)+L1.f”(L1+L2)<0 são:
p2.g2”(L2)<2f’(L1+L2)+L2.f”(L1+L2)<0 ∂π1/∂L1=0, e
As expressões acima são indicativas de que o valor do produto marginal de cada ∂π2/∂L2=0.
duopsonista deve crescer mais lentamente do que o custo marginal do único
fator de produção. Donde:

Exemplo de aplicação 02.29. 40,4-2L1-0,1L2=0

38,4-L2-0,1L1=0

86
A solução do sistema de equações acima resulta em L 1*=18,37 u.f. e em Do mesmo modo, o monopsonista não tem uma função de demanda pelo
L2*=36,56 u.f.. Conhecidas as quantidades do insumo utilizado, determinam-se insumo que quer comprar. Ele seleciona na função de oferta dos vendedores do
os níveis de produto dos duopsonistas: insumo que ele pretende comprar um par de preço e quantidade que lhe enseje
a maximização de seu lucro.
q1=(14x18,37)-(0,3x18,372)=155,94 u.f., e
Dos comentários acima resulta que, ao se defrontarem, a firma compradora não
q2=(10x36,56)-(0,1x36,562)=231,94 u.f..
tem diante de si uma função de oferta para selecionar um par de valores
Finalmente, os lucros auferidos pelos duopsonistas são: (quantidade e preço), como faria se fosse um monopsonista. E, reciprocamente,
π1=(3x155,94)-18,37[1,6+0,1(18,37+36,56)]=337,52 a firma vendedora não encontra diante de si uma função de demanda para
selecionar um par de valores (quantidade e preço), como faria se fosse um
π2=(4x231,94)-36,56[1,6+0,1(18,37+36,56)]=668,44. monopolista.
8.2.4. Concorrência monopsonística Não é um problema de fácil solução, este da pesquisa do equilíbrio em
A definição de concorrência monopsonística pode ser dada buscando-se a monopólio bilateral. Há um certo entendimento entre autores segundo o qual,
simetria que existe entre este regime de mercado e a concorrência na negociação das duas firmas, a determinação da quantidade é mais fácil de ser
monopolística. Trata-se, pois, de uma estrutura de mercado em que as firmas alcançada do que a determinação do preço. É razoável imaginar-se que, ao
compradoras são numerosas e não influem no preço do fator de produção que analisarem quantidades possíveis de ser negociadas, as firmas observem que
adquirem a detentores de fatores de produção diferenciados. cada quantidade seja compatível com um determinado nível de lucros máximos
conjuntos para ambas as partes. E que, por algum processo de entendimento,
Na concorrência monopsonística, é o comprador que emite sinais sobre as
elas dividam esse lucro máximo.
características que diferenciam um fator de produção de seu similar. Esta
circunstância é indicativa de que não pode haver uma diferenciação artificial do No caso em que busquem negociar o preço, várias forças entram em ação no
fator como sói ocorrer com o bem ou serviço na concorrência monopolística. processo negocial. Uma dessas forças advém do grau de informação que uma
firma tem sobre a outra, além, evidentemente, da diferença entre suas
8.3. Monopólio bilateral
respectivas capacidades econômicas, sendo o tamanho da firma um dos fatores
O monopólio bilateral é uma estrutura singular de mercado. Nela, defrontam-se que influem nessa capacidade. Adicionado a isso, os níveis de aspiração do
um monopolista com um monopsonista. Sucede que o monopolista, neste caso, comprador e do vendedor também desempenham importante papel na
não tem uma função de oferta de seu produto, relacionando pares de preço e negociação. A aspiração todavia constitui um conceito subjetivo, relativo à
quantidade, pois costuma recorrer à função de demanda de seus compradores, disposição de cada uma das partes, que depende da intensidade do desejo de
elegendo um par de preço e quantidade no qual ele maximiza seu lucro. maximizar seus respectivos resultados. A teoria econômica pouco pode
contribuir na análise desse conceito.

87
Em geral, o desfecho de um monopólio bilateral pode levar a um de quatro
resultados possíveis: (i) uma das firmas, por ser detentora de condições
econômicas mais vantajosas, ou por outra razão que seja valorizada na
negociação, pode dominar a outra firma, conduzindo-a aceitar as suas bases
negociais; (ii) pode haver coalisão, o que é curioso porque será entre comprador
e vendedor; (iii) pode haver barganha, chegando-se a um resultado negociado; e
(iv) pode não ocorrer nenhum dos casos anteriores e o mecanismo de mercado
ser destruído.

9. Conclusão

Neste Capítulo, estudaram-se os conhecimentos básicos da teoria


microeconômica. Às noções da teoria da produção acrescentaram-se os
conhecimentos relativos ao comportamento da firma racional, destacando-se o
objetivo de maximização de lucro como a principal diretriz seguida pelo
empresário. Esse objetivo está presente na firma qualquer que seja a natureza
do mercado do bem e/ou serviço em que esta atua. Em particular, foram
estudadas a formação de preços em concorrência perfeita e em monopólio,
tratando-se os demais regimes de mercado apenas conceitualmente por falta de
espaço em uma ementa assaz delongada. Apesar disso, o fato de a igualdade
entre custo e receita marginais constituir o mecanismo básico para a formação
de preços qualquer que seja o regime de mercado pode ser desenvolvido pelo(a)
próprio(a) aluno(a) que se interesse em aprofundar o conhecimento de
microeconomia por meio dos exercícios passados em sala.

88
noções de macroeconomia_________________________________ As unidades que compõem os agregados são o indivíduo ou a família, formando o
capítulo 3 agregado dos consumidores; a firma e outras formas de organizações produtivas
formando o agregado dos produtores; e os órgãos e entidades públicas, formando
o agregado governo.

Questões como a determinação do conjunto de todas as riquezas produzidas por


uma sociedade, a análise do nível geral de preços e o que interfere na
estabilidade destes, a formação da renda da sociedade, o número total de
desempregados e a dinâmica do emprego e desemprego, o salário, a taxa de juro,
a taxa de câmbio fazem parte, entre outros, do rol dos problemas enfrentados na
análise macroeconômica. Cada um desses problemas é representado por uma ou
mais variáveis, ditas variáveis macroeconômicas.

Em macroeconomia, a agregação não é um processo simples pois depende da


variável considerada. A renda total de uma sociedade, por exemplo, resulta da
somatória das rendas de todas as famílias, enquanto que a taxa de inflação
corresponde a uma média de taxas inflacionárias de uma quantidade
razoavelmente grande de setores em cada regiâo. De outro lado, o produto bruto
resulta da adição dos incrementos de valor adicionado a cada etapa da cadeia de
relações interssetoriais, e, assim, o tratamento a cada variável depende das
01. Generalidades características desta.

A macroeconomia compreende o estudo das atividades econômicas por meio da As causas e consequências das expansões, recessões e crises econômicas são,
avaliação do comportamento dos agentes econômicos tomados em agregado, isto também, objeto dos estudos macroeconômicos, sendo os governos, no
é, analisando-se o comportamento dos conjuntos formados por estes agentes. As cumprimento de sua missão de promover o bem estar social, os grandes
economias ditas livres são compostas de três agregados que são os interessados nesses estudos atuando, inclusive, como autores de vários deles. Por
consumidores, os produtores e o governo. Desse modo, distintamente dos isso mesmo, diz-se que o conteúdo teórico macroeconômico é produzido em dois
estudos microeconômicos, no presente capítulo estudar-se-ão os mecanismos distintos níveis de abordagem. O primeiro se dá no terreno da explicação, e é útil
que explicam o comportamento de cada um desses três conjuntos sem para esclarecer o comportamento observado no desempenho das variáveis
necessariamente analisar em detalhe o comportamento de cada unidade ou macroeconômicas. A segunda abordagem, da previsão, objetiva antever o
grupo de unidades que os integra. comportamento das mesmas variáveis macroeconômicas bem como a reação dos
agentes econômicos a esse comportamento. Para tanto, utiliza-se não somente a

89
análise histórica como também a racionalidade das expectativas e formulações O juro ou preço do dinheiro é a remuneração do capital, resultando da aplicação
econométricas que ensejam a simulação do comportamento futuro dos deste. O capitalista pode ser pessoa física ou jurídica. O empresário, quando opta
agregados econômicos. por fazer aplicação financeira de seu capital ― e não aplicação produtiva em troca
de lucro ― recebe, como ganho, o juro. E o aluguel é a remuneração recebida
Os governos, como já referido, são os principais beneficiários da construção do
pelo proprietário de bens, um tipo de riqueza de capital sob a forma de
conhecimento macroeconômico. Eles são, também, os produtores de uma vasta
imobilizado.
quantidade de informações por meio de fatos político-econômicos, números-
índice e de uma variada gama de estatísticas que conformam uma expressiva Ao conceito de salário estão relacionadas duas importantes variáveis
parte da matéria-prima utilizada pelos economistas e pelas instituições de macroeconômicas: emprego e desemprego. Emprego é a utilização do fator de
pesquisa e ensino que consagram o seu esforço à produção do conhecimento produção mão de obra ou trabalho; nos estudos macroeconômicos, o emprego é
macroeconômico. Na primeira das duas condições, isto é, como beneficiários, os caracterizado pelo número de indivíduos com ocupação profissional; e o
governos utilizam tanto os elementos explicativos quanto os de cunho desemprego, por oposição, é a não utilização desse mesmo fator de produção, ou
previsional37 para formular e executar as políticas públicas. seja corresponde à quantidade de pessoas que não encontra ocupação
remunerada. Ambos, emprego e desemprego, podem ser medidos em números
2. Conceitos básicos
absolutos ou por meio de taxas percentuais. A soma desses dois contingentes em
O estudo da macroeconomia implica, como ponto de partida, a definição de uma uma economia em um dado momento é igual à força de trabalho dessa
série de variáveis e indicadores cujos conceitos são sucintamente explorados economia. Portanto, a força de trabalho é a parcela da população que está apta e
nesta seção. O comportamento de cada uma das variáveis macroeconômicas em idade de trabalhar e que, se estiver totalmente ocupada, caracteriza o pleno
afeta a todos os agentes econômicos, direta ou indiretamente. emprego.
Inicia-se pelo conceito de renda que é a remuneração dos proprietários de fatores A poupança é a parcela da renda de um indivíduo ou família que não é dirigida
produtivos. Há quatro tipos de renda: salários, lucros, juros e alugueis. O salário é para o consumo, ou seja, é indicativa de adiamento do consumo. A poupança é a
o pagamento feito aos proprietários do fator trabalho. O termo é derivado da economia feita por um agente econômico, reservando recursos financeiros para
palavra sal que, historicamente, foi uma mercadoria-moeda com que se fazia o necessidades futuras.
pagamento pelo trabalho das pessoas 38. Os lucros são a remuneração do
O consumo é a parte da renda de um indivíduo ou família que se destina aos
empresário que, para obtê-la, faz investimentos e paga salários, além de pagar
gastos com a compra de mercadorias e serviços para a satisfação de suas
para obter outros insumos produtivos inerentes à sua atividade empresarial. O
necessidades. São os gastos com alimentação, saúde, transportes, vestuários,
empresário tanto aufere lucros como os distribui por meio de dividendos.
educação, recreação, entre outros.

O investimento é a aplicação de recursos financeiros poupados para aumentar a


37
Termo consagrado pelo uso no linguajar dos economistas. capacidade produtiva, isto é, objetivando ganhos nos médio e longo prazos. Tem,
38
Procede de salariu, palavra latina que significa ração de sal.

90
portanto, a finalidade da formação de novas riquezas, que são riquezas de capital. apenas os valores adicionados entre cada etapa e a imediatamente seguinte para
Freqüentemente são feitas referências, em economia, a investimento por meio de evitar-se a dupla contagem.
aplicação de dinheiro em títulos, ações, imóveis e em caderneta de poupança,
O Nível Geral de Preços constitui um indicador econômico cuja variação identifica
com o objetivo de se obterem ganhos. O conceito de investimento é, entretanto,
a inflação ou deflação em um dado período. No Brasil, o índice de preços mais
mais abrangente, correspondendo, também e em grande medida, à aplicação de
comum é o Índice de Preços ao Consumidor – IPC, que corresponde à medida do
capital em empreendimentos produtivos, direta ou indiretamente, como fábricas,
custo de vida39. Dois relevantes conceitos associados ao Nível Geral de Preços são
infra-estrutura, obras diversas e outros mais.
os dos Preços Rígidos e Preços Flexíveis. Os Preços Rígidos são relacionados com a
O Produto Interno Bruto – PIB é a medida de toda a produção realizada em um análise de curto prazo, enquanto que os Preços Flexíveis são inerentes à análise
país ou região durante um dado intervalo de tempo, normalmente de um ano, e de longo prazo. A flexibilidade nos níveis de preços que se observa na análise de
corresponde à somal de todos os bens e serviços que se produziram longo prazo resulta de novos cenários de procura e oferta que vão surgindo com o
internamente na economia deste país ou região. O PIB inclui, portanto, a passar do tempo e que vão modificando as condições de cada mercado parcial 40.
contribuição dos estrangeiros que residem e produzem no país, mas deixa de
Inflação é o aumento persistente do Nível Geral de Preços de uma expressiva
computar a contribuição dos emigrantes que estão produzindo em outros
quantidade ― senão de todos ― de bens e serviços. De outro lado, o movimento
ambientes econômicos que não o do país.
oposto que os preços podem experimentar, isto é, a queda persistente,
O Produto Nacional Bruto – PNB é um outro conceito de grande relevância no corresponde ao fenômeno da deflação. À elevação de preços em um ritmo menor
contexto da análise macroeconômica. Define-se o PNB como a medida de toda a do que o que se observava em período imediatamente anterior dá-se o nome de
produção realizada em um país ou região durante determinado intervalo de desinflação, ou seja, quando se passa a ter uma desaceleração da inflação.
tempo, normalmente de um ano, adicionada do saldo líquido dos fatores Portanto, enquanto a deflação corresponde a uma queda absoluta do nível de
externos que resulta das receitas recebidas do exterior, deduzidas das receitas preços, a desinflação corresponde a uma redução no ritmo de crescimento
enviadas para outros países de acordo com os registros do balanço de destes.
pagamentos, adiante comentado.
Câmbio é a conversão de um preço em uma dada moeda para outra moeda por
Ambos, PIB e PNB, são fundamentalmente medidas básicas da atividade meio de um multiplicador. Esse multiplicador é denominado taxa de câmbio. A
econômica, porque refletem o tamanho de uma economia, sendo os parâmetros taxa de câmbio constitui o elemento chave para as atividades de importação e
que costumam ser observados desde as abordagens preliminares que se fazem a exportação. A importação é a aquisição de bens e/ou serviços de outro país por
respeito da economia de um país, estado ou região. Seus respectivos cálculos meio de agentes econômicos do país importador, enquanto que a exportação é a
podem ser feitos pelos preços de mercado dos bens e serviços finais uma vez que venda de bens e/ou serviços para outro país pela ação de agentes econômicos do
estes incorporam os custos sucessivos das etapas anteriores de cada cadeia de
39
relações interssetoriais. Podem, também, ser procedidos seguindo-se as trilhas 40
Tema abordado na parte final deste capítulo.
A expressão mercado parcial é indicativa do mercado individualizado de cada bem ou serviço conforme estudado
dessas cadeias de relações interssetoriais porém com o cuidado de somarem-se no Capítulo 2 (Noções de Microeconomia).

91
país exportador. Em macroeconomia, tanto importação quanto exportação são As variáveis macroeconômicas podem ser classificadas como exógenas e
referidas por uma cifra monetária. No caso das importações, essa cifra resulta da endógenas. As primeiras são variáveis de origem externa a determinado processo
soma monetária de todos os bens e serviços adquiridos a agentes econômicos de que se esteja analisando e que afetem este processo, enquanto que as variáveis
outros países. No caso das exportações, essa cifra resulta da soma monetária de endógenas são variáveis inerentes ao processo ou fenômeno estudado, ou seja,
todos os bens e serviços vendidos, por agentes econômicos, públicos ou privados, são internas a este. A crise de 2008, nascida nos Estados Unidos, produziu
a compradores de outros países. variáveis que afetaram, em maior ou menor grau, a economia de outros países.
Tais variáveis foram exógenas às economias dos países afetados.
A balança comercial e o balanço de pagamentos são conceitos associados ao
câmbio. A balança comercial é o registro das exportações e importações Conforme já mencionado, os conceitos ora relacionados dizem respeito a um ou
realizadas em determinado período de tempo, normalmente anualizado. Os mais agregados da economia, caracterizando o caráter macroeconômico da
preços adotados nesse registro não incluem o frete e o seguro das mercadorias, análise. Há, evidentemente, uma série de outros conceitos de interesse dos
isto é, são preços FOB41. O balanço de pagamentos corresponde ao registro estudos macroeconômicos afora os citados. Uma significativa parte desses outros
contábil de todas as transações econômicas de um país com todos os outros conceitos é derivada dos acima enumerados. Por exemplo, a propensão a
países, incluindo as transações correntes e a conta de capital financeira. As consumir deriva do conceito de consumo, tanto quanto a propensão a poupar
transações correntes contêm a balança comercial, a balança de serviços, a deriva do conceito de poupança. Entretanto, é aos conceitos que integram a
balança de rendas e as transferências unilaterais correntes. É na balança de relação da presente seção que mais se recorre, o que fez com que a ênfase deste
serviços que se procedem aos registros de seguros e fretes, serviços texto recaísse sobre eles. Outros conceitos e variáveis serão objeto de referência
governamentais, alugueis de equipamentos, entre outros. na continuação deste capítulo.

Recessão é a redução significativa porém passageira da atividade econômica. Há 3. Estoques e Fluxos


várias definições técnicas para recessão, sendo a mais usual a de considerar-se
Algumas variáveis econômicas podem ser analisadas ou entrar no cálculo de
que uma economia entra em recessão quando vê o seu PIB reduzir-se por dois
algum tipo de avaliação simplesmente por sua magnitude em dado momento.
trimestres consecutivos. Por outro lado, depressão reflete uma grave crise
Essas são chamadas de variáveis de estoque. Por exemplo, a quantidade de papel-
econômica com drástica e duradoura redução da produção e do consumo.
moeda em um país, tanto quanto a população desse país, é um estoque em dado
momento que pode se estender por um lapso de tempo menor ou maior. Com a
41
Os preços FOB (Free on Board) não incluem os custos de embarque, transporte e desembarque entre dois países
moderna dinâmica econômica, o estoque de moeda em circulação pode manter-
que mantêm relações comerciais, tampouco os seguros associados às operações de importação e exportação. se por várias semanas e mesmo por alguns meses, sem sofrer variação apreciável,
Distinguem-se dos preços CIF (Cost, Insurance and Freight) que resultam da soma do preço FOB com os custos com
seguros e fretes. Esses conceitos de preços são, também, habitualmente utilizados no mercado de bens domésticos dependendo do grau de estabilidade e do ritmo de crescimento da economia.
mediante adaptação. Por essa adaptação, por exemplo, se um fabricante produz e vende um equipamento ou bem Analogamente, em demografia, tema recorrente no contexto dos estudos
outro qualquer a um comerciante, entregando-o na loja do fabricante e, portanto, cobrando o seguro e o frete além
do preço do equipamento, o preço é dito CIF ou preço posto-loja (produto posto na loja do comprador). Mas se, macroeconômicos, pode suceder o mesmo com o estoque da população de uma
nessa transação, diferentemente, o comprador se responsabilizar pelo transporte e seguro, pagando ao fabricante
apenas pelo equipamento, então o preço é FOB ou preço posto-fábrica (produto posto na fábrica do vendedor).
região em que se observe um balanço zero (na prática, um número muito

92
pequeno) entre nascimentos, mortes, imigração e emigração. De modo igual, a poupança nasce já nos primeiros dias do ser humano no planeta: poupar significa,
quantidade de pessoas empregadas é uma variável de estoque. como já foi referido, adiar consumo.

Mas há variáveis que implicam a noção de tempo em sua definição. É o que Ao mesmo tempo, o ser humano fez, quando necessário, trocas de algo de que
sucede, por exemplo, com o PIB de um país, o qual costuma ser avaliado por ano. dispunha por bens outros de que precisava. A moeda de troca que ele usava para
Do mesmo modo ocorre com os gastos governamentais desse país, ou, ainda, pagar, que era a própria mercadoria de que dispunha, um dia mais tarde veio a
com o salário do trabalhador uma vez que, neste último caso, há um fluxo mensal dar lugar ao aparecimento da moeda tal como esta se apresenta hodiernamente.
ou semanal. Essas são variáveis de fluxo. Conforme se percebe, essa moeda de troca era fruto do trabalho do ser humano
já que se tratava de algo que ele produziu. Nesse caso, a referida moeda de troca
A distinção entre estoques e fluxos é importante na formulação de soluções para
usada na transação era parte de sua renda, isto é, parte da renda de sua atividade
a Política Econômica. Por exemplo, se o fluxo de gastos governamentais aumentar,
produtiva. Daí infere-se que tudo quanto ele produziu durante determinado
certamente o fluxo de alguma outra variável econômica também precisará ser
intervalo de tempo transformou-se em renda sua nesse mesmo período e,
aumentado, ao mesmo tempo em que, possivelmente, os fluxos de terceira(s)
portanto, produto é igual a renda! Essa é a primeira identidade macroeconómica
outra(s) variável(eis) terão que reduzir-se. Por exemplo, o aumento do salário
a fixar, a qual será indicada do modo seguinte:
mínimo pode ser acompanhado da redução do ritmo com que vinha crescendo a
inadimplência na praça. Em um outro exemplo, no caso de uma variável de Y=P,
estoque, pode-se considerar a análise de como a quantidade de capital de uma
Onde:
economia afeta o nível de emprego e renda. No processo de análise econômica é
importante ter-se em mente a natureza da variável, se de estoque ou se de fluxo, Y é a renda; e
pois cada uma dessas duas categorias (estoques e fluxos) influi no processo P é o produto, ou produto bruto, podendo ser interno ou nacional.
econômico de modo distinto. Enquanto uma variável de estoque se altera apenas
episodicamente, uma variável de fluxo está em permanente ritmo de No trato teórico, a unidade de medida, tanto de Y quanto de P, será a moeda, ou
modificação. dinheiro ou, ainda, numerário, como usualmente se refere a dinheiro Na prática,
P é o conjunto total da riqueza produzida sob a forma de produtos e serviços
4. Produto e renda: abordagem preliminar heterogêneos, e Y é a remuneração recebida pelas famílias porquanto estas, além
O agente motor de uma economia é o ser humano que, desde os tempos de atuarem como agentes do consumo, também atuam como agentes que
primitivos, precisou consumir e, para ter o que consumir, também precisou realizam a produção para as firmas e outras formas de organizações produtivas. A
produzir. Caça, pesca, colheita e busca de abrigo foram as atividades produtivas firma é o principal agente moderno da produção fazendo uso dos fatores
dos primórdios do ser humano na Terra. Uma parte do produto da caça, da pesca produtivos, entre os quais a mão de obra (família). Portanto, o conceito a fixar,
e/ou da colheita era consumida imediatamente (função consumo) e outra era
guardada para consumo nos dias seguintes (função poupança). O conceito de

93
repete-se, é o da igualdade entre produto e renda, o que explica o fato de, em Fig. 03.01 – Produto Interno Bruto de uma economia fictícia no
inúmeras ocasiões, tomar-se um pelo outro42. ano 1
Bem ou Unid de Quantidade Prç Unitário Prod. Econ.
Há outras identidades macroeconômicas básicas. Para melhor entendimento serviço Medida (u.m.*) (u.m.)
dessas identidades adicionais, no entanto, expendem-se, nas sub-seções A ton 180 12,00 2.160,00
B m3 70 60,00 4.200,00
imediatamente seguintes, algumas variantes do conceito macroeconômico da C gl** 82 45,00 3.690,00
palavra produto. Surgirão, nesse contexto, além das variantes produto interno, Total - - - 10.050,00
* unidade monetária.
produto nacional e produto potencial, alguns conceitos associados como, por ** galão
exemplo, deflator e hiato de produto, todos de grande relevância na análise Como já referido, esse exercício financeiro, isto é, o ano de 1, é o ano-base para
macroeconômica. fins de análise da evolução do PIB-real, ao longo deste e do ano imediatamente
4.1. PIB e deflator subsequente. Como o ano-base é o ponto de partida, então o PIB observado
nesse ano, igual a 10.050,00 u.m., é, ao mesmo tempo, o PIB-real e o PIB-
O Produto Interno Bruto é a somatória do valor monetário de todos os bens finais
nominal. O ano-base de uma série para fins de acompanhamento do crescimento
produzidos em um dado país ou região durante um ano, como já referido neste
de uma economia pode ser qualquer um. É comum que sejam escolhidos anos
texto. Há uma diferença entre o PIB e o Produto Nacional Bruto – PNB, explicitada
iniciais de uma série do calendário. Por exemplo, o ano 2000 para a série 2000-
mais adiante.
2009; ou o ano 2001, para a década 2001-2010. Entretanto, repete-se, a escolha
Para melhor compreensão da medida do Produto Interno Bruto, suponha-se a de um ano para ser tomado como referência pode recair sobre qualquer um. O
existência de uma hipotética economia na qual somente três bens e/ou serviços que norteia a escolha de um ano-base são o objeto e o critério da análise que se
finais sejam produzidos, os bens ou serviços A, B e C. Proceder-se-á à análise do pretenda elaborar.
comportamento dessa economia em dois anos consecutivos, 1 e 2. As
Como já referido na seção 02, ao definir-se o Produto Interno Bruto, arrolaram-se
quantidades e os preços unitários dos bens e/ou serviços dessa economia,
somente os bens e produtos finais para entrar nessa contagem. Por exemplo,
admitidos constantes durante todo o ano 1, são apresentados no quadro da
peças de vestuário que não para fardamento de pessoal em organizações são
Figura 03.01. Considere-se que esta seja a produção de um ano, tomado como
bens finais, e, portanto, entram no cômputo. Camisas, calças, lenços e um sem-
exercício financeiro e que corresponda ao ano-base para determinação do PIB-
número de outras mercadorias de consumo final estão também enquadradas
real em anos subsequentes.
nessa condição. Entretanto, os produtos intermediários que servem à fabricação
O Produto Interno Bruto dessa economia é igual a 10.050,00 unidades monetárias de peças de vestuário como, por exemplo, os tecidos, a linha de costura, os
e está calculado em valores nominais, ou seja em valores correntes do exercício botões e outros complementos, não devem ser computados no cálculo, porque já
financeiro correspondente ao ano 1. estão embutidos no custo da mercadoria ou bem final. O fato de incluir no cálculo
os produtos intermediários levaria a uma múltipla contagem para a formação do
42 Produto Interno Bruto, aumentando o valor deste de maneira equivocada. Para
Seguidamente, autores utilizam a notação Y para indicar o produto de uma economia.

94
que não haja, portanto, a múltipla contagem, somente os bens e serviços finais quantidades produzidas. A parte do aumento do PIB devida ao aumento de
devem compor o quadro de cálculo do Produto Interno Bruto. Alternativamente, preços corresponde à inflação, enquanto que a parte do aumento do PIB devido
no entanto, pode-se fazer o cálculo do Produto Interno Bruto incluindo-se as ao aumento de quantidades de bens produzidas reflete o crescimento real da
diversas etapas de cada processo, desde que computando-se apenas o valor economia. Para se determinar que parcela desse percentual cabe a cada uma das
adicionado entre uma etapa e a que se lhe segue imediatamente na trama de alterações mencionadas, pode-se fazer o cálculo do Produto Bruto Total do ano 2
relações intersetoriais, evitando-se, assim, a repetição de valores já computados. a preços do ano 1, do que resultarão os valores constantes da tabela da Figura
03.03.
Suponha-se, agora, que, no exercício financeiro 2, o Produto Interno Bruto dessa
mesma economia seja dado pela tabela da Figura 03.02, à qual não se Mediante esse artifício, o incremento do Produto Interno Bruto calculado entre as
acrescentou nenhum produto novo, mas suas respectivas produções tabelas das Figuras 03.01 e 03.03 terá sido resultante apenas do aumento das
(quantidades) e preços se alteraram. quantidades produzidas, e será igual a:
Fig. 03.03 – Produto Interno Bruto da economia fictícia considerada no ano de 2 a preços do
ano 1
Bem ou Unid de Quantidade Prç Unitário Prod. Econ.
serviço Medida (u.m.*) (u.m.)
Fig. 03.02 – Produto Interno Bruto da economia fictícia A ton 200 12,00 2.400,00
B m3 80 60,00 4.800,00
considerada no ano 2 C gl** 100 45,00 4.500,00
Bem ou Unid de Quantidade Prç Unitário Prod. Econ. Total - - - 11.700,00
serviço Medida (u.m.*) (u.m.) * unidade monetária.
A ton 200 16,00 3.200,00 ** galão
B m3 80 65,00 5.200,00
C gl** 100 50,00 5.000,00 Variação (Ano 2/Ano 1) a preços correntes de 1=[(11.700,00/10.050,00)-
Total - - - 13.400,00 1,00].100=11,43%,
* unidade monetária.
** galão
que é o aumento real da atividade econômica. Daí, o aumento devido ao
Comparando-se as tabelas das referidas Figuras 03.01 e 03.02, percebe-se que aumento de preços (inflação) será igual à diferença entre o aumento nominal e o
houve um incremento de 33% entre os exercícios financeiros de 1 e 2, conforme o aumento real da economia, ou seja:
cálculo seguinte:
Variação real (Ano 2-Ano 1)=33,00%-11,43%= 21,57%
Variação (Ano 2/Ano 1) a preços correntes de cada
exercício=[(13.400,00/10.050,00)-1,00].100=33% À relação (PIB-nominal/PIB-real) de um mesmo exercício financeiro dá-se o nome
de Deflator do PIB. No caso presente do ano 2, tendo-se como ano-base o ano 1,
Sucede que, tendo havido incremento de preços e também de quantidades o Deflator é igual a (13.400,00/11.700,00)=1,145.
produzidas, o incremento de 33% no Produto Interno Bruto dessa sociedade é
explicado em parte pelo aumento de preços, e em outra parte pelo aumento das

95
Por fim, o PIB pode também ser referido a cada indivíduo que integra a sociedade mencionado, excluem-se, neste caso, as transações intermediárias, cuidado
(PIB per capita), bastando, para tanto, que se o divida pela população. Caso a essencial para que seja evitada a multiplicidade na contagem das parcelas do PIB.
população da hipotética economia acima ilustrada fosse de 1.000 habitantes no
De outro lado, conceitua-se como Produto Nacional Bruto – PNB, ao valor do PIB
ano 1, então o PIB per capita a preços do ano 1 seria:
somado algebricamente com a receita líquida dos fatores externos. Os fatores
PIB per capita a preços do ano 1=11.700,00/1.000=11,70 u.m./habitante externos são medidos pelo saldo de remessas de rendas do país para fora e de
fora para o país.
E, caso a população fosse de 1020 habitantes no ano 2, então o PIB per capita do
ano 2, será: PIB+RLFE=PNB

PIB per capita do ano 2=13.400/1.020=13,14 u.m./habitante. onde:

Exemplo de aplicação 03.01 RLFE é a renda líquida de fatores externos.


O PIB de um país passou de 1.000 u.m. para 1.100 u.m. de um ano para o
A RLFE, por seu turno, é igual a:
seguinte. Qual o deflator desse PIB no segundo ano sabendo-se que a inflação de
um ano para o outro foi de 7,00%? RLFE=RR-RE,
Solução
O deflator do segundo ano é dado por: onde:
Defl(2)=PIBnom(2)/PIBreal(2), RR é a renda recebida do exterior; e
Sendo o PIBrea(2)=PIB(1) + (0,10-0,07)xPIB(1)
Donde: RE é a renda enviada ao exterior.
PIBrea(2)=1.000 + (0,03 x 1.000)
Se RE>RR, resultará que RLFE<0 e, conseqüentemente, PNB>PIB. Conforme se
Donde:
PIBrea(2)= 1.030 u.m. percebe, o Produto Nacional Bruto pode ser maior ou menor do que o Produto
E o deflator será: Interno Bruto, tudo dependendo do saldo entre a renda enviada e a renda
Defl(2)=1.100/1.030, recebida do exterior.
Donde:
Defl(2)=1,068. Exemplo de aplicação 03.02
O PIB de uma economia é 3.000 u.m.. As receitas recebidas do exterior são de 120
04.02. PIB e PNB u.m. e as receitas enviadas para o exterior são de 80 u.m.. Calcular o PNB dessa
Conforme já referido, o Produto Interno Bruto – PIB é o valor agregado de todos economia.
Solução
os bens e serviços finais produzidos no território de um país, independentemente
da nacionalidade dos proprietários dos fatores de produção. Como já Partindo de:

PNB=PIB+RRE—REE,

96
Tem-se: observado. Essa aderência do PIB observado ao potencial é indicativa de que a
economia esteve, no referido período, em um estado próximo ao estado de
PNB=3.000 +120-80
equilíbrio.
Donde:
O PIB potencial é uma variável de difícil determinação pois refere-se ao que
PNB=3.040 u.m. poderia ter sido produzido se restrições tecnológicas e/ou econômicas fossem
04.03. Produto potencial e hiato de produto removidas ou inexistissem.

O Produto Potencial é o nível de PIB correspondente a um estado da economia no Uma das hipóteses mais presentes na análise do produto potencial é a de
qual todos os fatores de produção estão sendo plenamente empregados. Dito de restrições impostas pela inflação uma vez que este fenômeno macroeconômico
outro modo, é o nível de PIB que corresponde ao limite de crescimento de uma impede o emprego de todos os fatores de produção em sua plenitude.
economia sem que surjam desequilíbrios. O PIB potencial é normalmente
comparado com o PIB medido (PIB observado), também referido como PIB Fig. 03.04 – PIB potencial e PIB efetivo da economia brasileira no período 1992-2005 em
efetivo, e a diferença entre um e outro é denominada hiato do produto. termos de números-índice (ano de 2004=100)

Trata-se de um indicador útil na formulação das políticas monetária e fiscal. No


primeiro caso, o PIB potencial ― ou mesmo o hiato do produto ― serve para
avaliar possíveis pressões de demanda que podem produzir flutuações
econômicas, ensejando a antecipação de medidas para contê-las. Entre as
possíveis flutuações econômicas, prioridade é dada à inflação. No caso da política
fiscal, o produto potencial é extremamente útil para avaliar-se o resultado fiscal
estrutural do governo. O gráfico da Figura 03.04 apresenta resultados do PIB
potencial brasileiro no período 1992-2005, a valores de 2004.

Uma rápida leitura do mencionado gráfico permite verificar, por exemplo, que o
período que se estende entre o segundo semestre de 1994 e o segundo semestre
de 1995 foi de expansão econômica uma vez que o hiato do produto apresentou-
se positivo (linha rosa por cima da linha azul); e, que, contrariamente, o período
que vai do terceiro trimestre de 1997 até o quarto trimestre de 2001 foi de Fonte: Souza Jr, J.R. Produto Potencial: conceitos, métodos de estimação e aplicação à economia brasileira. IPEA.
Texto para discussão no 1.130. Rio de Janeiro. 2005.
contração econômica porquanto o hiato do produto esteve negativo; e, que entre
o final do primeiro período indicado nesse exemplo e o início do segundo período
utilizado também nesse exemplo, o PIB potencial esteve muito próximo do PIB

97
Reforça-se, aqui, o fato de que o produto potencial não é o máximo que se pode De igual modo, conceitua-se o PNB a preços de mercado e o PNB a custos de
conseguir a qualquer custo, isto é, em marcha forçada. Trata-se, antes, do fatores, com a seguinte expressão análoga:
produto alcançado quando todos os mercados se encontram em equilíbrio de
PNBpm=PNBcf+II-Sbsd
longo prazo. O conceito de PIB potencial ainda experimenta limitações que, por
certo, serão superadas com o avanço da pesquisa. Em macroeconomia, essa distinção é importante porque a variável preço pode ser
analisada em termos de preços de mercado e em termos de preços a custos de
Destacam-se, aqui, duas dessas limitações. A primeira reside no fato de a
fatores, dependendo do enfoque de cada análise.
determinação do produto potencial cingir-se a uma análise somente do lado da
oferta, deixando de considerar a demanda como fator indutor do aumento do Exemplo de aplicação 03.03
investimento, o que retroalimentaria a oferta. E, a segunda, é o fato de a análise Determinar o PIB a preços de ,mercado sabendo que o PIB a custo de fatores é
não revisitar ou mesmo não aprofundar o conceito de Produtividade Total dos 1.000 u.m., que o governo paga subsídios no montante de 100 u.m. e que os
Fatores de Produção, referida como PTF. impostos indiretos correspondem a 20% do PIB a preços de mercado.
Solução
4.4. PIB e PNB a preços de mercado e a custos de fatores Partindo de:
PIBpm=PIBcf+II-Subsd,
O produto bruto, interno ou nacional, normalmente é referido a preços de Tem-se:
mercado. Os preços de mercado incluem os tributos indiretos que são pagos PIBpm=1.000+(0,20 x PIBpm)-100,
pelas firmas ao produzirem e ao comercializarem seus bens e serviços. No Brasil, Donde:
esses tributos são, no caso de mercadorias, respectivamente, o Imposto sobre PIBpm=1.125 u.m.
Produtos Industrializados – IPI que é um tributo federal, e o Imposto sobre a
Circulação de Bens e Serviços – ICMS, que é um tributo estadual. 4.5. Produtos interno e nacional brutos e líquidos

O fato de esses tributos já se encontrarem embutidos nos preços do bens e Na seção seguinte, serão estudadas as identidades macroeconômicas básicas. Na
serviços adquiridos pelo consmidor é indicativo de que ditos tributos são decomposição do produto, ver-se-á que uma das parcelas é o investimento.
indiretos, representados pela notação II. Conforme se percebe, a notação está Quando se faz referência ao investimento sem qualquer restrição, diz-se estar
tomando o todo pela parte dado que impostos são um dentre os vários tipos de tratando do investimento bruto. O investimento bruto é composto de duas
tributos. parcelas: o investimento líquido e a depreciação de ativos já existentes.

preços de mercado são resultado da soma dos preços a custos de fatores com os A depreciação de um ativo reflete o custo da manutenção da capacidade
tributos indiretos pagos pelas firmas e deduzidos os subsídios, estes últimos se funcional desse ativo. Por exemplo, a manutenção de equipamentos e do prédio
houver. A expressão do PIB a preços de mercado é: de uma fábrica, tanto quanto o recapeamento da camada de asfalto de uma
rodovia implicam custos de depreciação.
PIBpm=PIBcf+II-Sbsd

98
De outro lado, a ampliação do número de equipamentos e/ou do prédio da PNBpm=PIBpm+RRE-REE,
fábrica bem como a duplicação da rodovia implicam investimento que fazem
Donde:
aumentar esses ativos, correspondendo, portanto, a investimento líquido.
PNBpm=5.000 +200 -100=5.100,
No cálculo do PIB, e também do PNB, a parcela de investimento corresponde ao
investimento bruto. Se se deduzir a depreciação da parcela do investimento Donde:
bruto, passa-se a ter apenas o investimento líquido na formação do produto, e PNLpm=5.100-(0,10 x 5.000),
estes deixam de ser os produtos brutos para se tornarem produtos líquidos,
respectivamente Produto Interno Líquido (PIL) e Produto Nacional Líquido (PNL). Donde PNLpm=4.600 u.m.
As representações algébricas, para um outro, são: 5. Identidades macroeconômicas básicas
PIL=PIB-D; e O estudo das identidades macroeconômicas básicas implica analisar o equilíbrio
PNL=PNB-D, macroeconômico, a identidade entre poupança e investimento, o financiamento
do déficit público e a decomposição da renda nacional.
onde D é a parcela da depreciação.
05.01. Equilíbrio macroeconômico
Por extensão, haverá Produto Interno Líquido a preços de mercado (PIL pm), o
Produto Interno Líquido a custos de fatores (PIL cf), o Produto Nacional Líquido a O equilíbrio macroeconômico é alcançado quando oferta e demanda agregadas
preços de mercado (PNLpm) e o Produto Nacional Líquido a custos de fatores de bens e serviços se igualam. A oferta agregada de bens e serviços depende da
(PNLcf). disponibilidade de fatores de produção existente na economia em um dado
momento.
Exemplo de aplicação 03.04
O PIB de uma economia a preços de mercado é 5.000 u.m. Calcule o PNL a preços Em uma perspectiva de curto prazo, admite-se que as quantidades disponíveis
de mercado dessa economia sabendo que as receitas recebidas do exterior desses fatores sejam constantes oferecendo um determinado nível de produto
montam a 200 u.m., as receitas enviadas para o exterior correspondem a 100 potencial. Para melhor entendimento, o equilíbrio macroeconômico será
u.m. e a taxa de depreciação é 10% do PIB a preços de mercado. estudado, nesta seção, para três hipóteses de economia, partindo da mais
Solução simples para a mais complexa, esta última a mais aderente à realidade das
economias dos países.
A expressão do PNLpm=PNBpm-D
Essa divisão em três hipóteses de economia, uma primeira, fechada e sem
Donde:
governo, uma segunda, também fechada e com governo, e, a terceira, aberta e
PNLpm=PNBpm- (0,10 x PIB), necessariamente com governo, não passa de um artifício didático de que se lança
Onde: mão para que se compreenda melhor o papel do agregado governo (na passagem

99
da primeira para a segunda hipótese) e, em seguida, do comércio exterior (na está realizando um gasto de consumo. O pagamento das faturas da construtora
passagem da segunda para a terceira hipótese). que executa a ferrovia é parte de “I”, enquanto que o pagamento pela compra
dos cartuchos é parte de “G”.

As transferências representam gastos do governo em favor do bem estar das


(i) Economia fechada e sem governo
famílias, com fundos de previdência social e de auxílios de tipos diversos como os
Em uma economia fechada e sem governo a oferta se compõe da soma de duas valores pagos por meio da Bolsa-Família e outros programas assistenciais. O total
parcelas: a que é produzida para atender ao consumo (C); e a que é produzida a G dos gastos governamentais é sustentado por duas fontes principais que são os
título de investimento para permitir a continuidade e o crescimento do processo tributos (T) e a venda de títulos de sua emissão no mercado financeiro. O governo
produtivo (I). Nessa mesma economia, a demanda agregada é composta dos bens recorre à emissão de títulos quando há déficit orçamentário, isto é quando T<G.
e serviços que são consumidos (C), acrescidos de uma parcela que corresponde Idealmente, um governo deveria não contrair dívidas e gastar exatamente o
ao que é poupado (S). montante arrecadado, isto é T=G. Comumente ocorre, no entanto, que
Daí, a igualdade entre oferta e demanda conduz a C+I=C+S, donde I=S, ou seja, desequilíbrios de fases governamentais anteriores, ou então quando governos
tudo quanto é poupado em uma economia é drenado para investimento. pretendem realizar ações cujos custos não encontram contrapartida na
arrecadação, seja contraída dívida: a dívida pública. Nessas situações, o governo
(ii) Economia fechada e com governo precisa ajustar seus custos totais de modo a produzir um superávit, denominado
Na sub-seção anterior, considerou-se uma economia fechada e sem governo. Na superávit primário que é igual a (T-G). São os casos em que aparece a
presente, analisa-se uma economia ainda fechada, porém com governo. Não desigualdade T>G.
havendo trocas com o exterior, o equilíbrio é alcançado mediante a igualdade da O tratamento da questão relativa à magnitude de G e de T diz respeito à política
oferta (produto Y) e demanda, agora constituída de três parcelas: consumo (C), fiscal e não são considerados no modelo de equilíbrio que se analisa nesta seção.
investimento (I) e gastos de governo (G), como se segue: Dito de outro modo, G e T são variáveis de controle, controle este que é exercido
Y=C+I+G pelo governo, portanto são variáveis exógenas ao modelo.

O governo realiza gastos com a manutenção de suas respectivas estruturas (iii) Economia aberta e com governo
orgânicas, com investimentos de interesse coletivo e com as transferências. Para a Introduzindo, agora, o conceito de economias abertas, que corresponde ao caso
manutenção das estruturas, o governo paga salários e outras formas de mais geral, sobretudo em um mundo de economia globalizada, surgem as
remuneração a servidores, realiza compras, faz transferências de recursos, importações e as exportações que precisam ser integradas à expressão do
totalizando seus gastos (G). Os investimentos públicos integram a parcela “I”, do equilíbrio. As importações, cuja notação será M, integram-se à oferta agregada,
produto “Y”. Por exemplo, quando o governo contrata a construção de uma isto é, ao membro à esquerda da expressão. E as exportações, cuja notação será
ferrovia, está realizando um investimento, no caso, um investimento público. Mas
quando o governo adquire cartuchos de tinta para a produção de documentos,

100
X, integram-se à demanda agregada, ou seja, ao membro à direita da mesma montam a 300 u.m., que as exportações são iguais a 500 u.m. e as importações
expressão, do que resulta: são iguais a 300 u.m.

Y+M=C+I+G+X

A expressão acima reflete o lado da economia real, e não a monetária. As Solução


importações M (em bens e serviços) se acrescentam ao produto Y (em bens e Partindo-se de Y=C+I+G+X-M e substituindo os dados conhecidos, tem-se:
serviços) compondo a oferta agregada. Analogamente, as exportações X
Y=0,60Y+0,20Y+300+500-300
correspondem a demandas exercidas por agentes econômicos de outros países,
também em termos de bens e serviços. Juntamente com o consumo, os Donde:
investimentos e os gastos de governo, X comporá a demanda agregada. A referida
Y=2.500 u.m.
expressão do equilíbrio entre oferta e demanda agregadas considerando uma
economia aberta pode ser reescrita do modo seguinte: 05.02. Decomposição do investimento

Y=C+I+G+X-M Há duas abordagens distintas para a análise da composição do investimento. A


primeira, já apresentada na seção 04.05, está relacionada com a separação do
A parcela binomial (X-M) representa as exportações líquidas ou saldo da balança
investimento bruto em investimento líquido (I líq) e depreciação (D). Como já
comercial. Essa parcela é simétrica da poupança externa (M-X), porque, como já
referido, o investimento líquido corresponde à aplicação de recursos monetários
mencionado, M é a parte da produção de agentes de outros países que é ofertada
que efetivamente fazem aumentar o produto da economia, enquanto que a
na economia do país sob estudo e X é a parte da produção deste país sob estudo
depreciação corresponde à aplicação de recursos objetivando a manutenção da
que é exportada, isto é, que é comprada por agentes de outros países. A partir
capacidade funcional de investimentos já realizados.
dessa expressão, é possível determinar-se como o investimento é financiado pela
poupança e como o excesso de poupança em relação ao investimento pode A segunda abordagem da composição do investimento está relacionada com a
financiar o déficit público. As duas subseções seguintes mostrarão, natureza dos bens resultantes da ação de investir. Nessa abordagem, separa-se o
respectivamente, como a poupança atua como fonte de recursos do montante correspondente ao capital fixo daquele correspondente aos bens
investimento, e como o déficit público pode ser socorrido pelo excesso de produzidos para serem vendidos mas que ainda não foram transacionados. Esses
poupança privada em relação ao investimento e/ou pela poupança externa últimos, como são bens de consumo futuro, integram a parcela do investimento.
positiva. Convém observar que o investimento é a parte do produto da economia que não
é consumida durante o período de formação do produto. Portanto, na
Exemplo de aplicação 03.05
decomposição da parcela do investimento segundo esta abordagem surgem as
Determinar o produto interno bruto de uma economia aberta e com governo
duas seguintes parcelas:
sabendo-se que o investimento bruto corresponde a 20% deste produto, o
consumo equivale a 60% também deste produto, que os gastos do governo I=FBKF+ΔE,

101
Onde: Y-C-T=C+I+G+X-M-C-T,

FBKF é a formação bruta de capital fixo; e Simplificando-se, em seguida, o membro da direita e rearranjando-se os termos
de ambos os membros de modo a explicitar I em relação à demais variáveis, tem-
ΔE é a variação de estoques.
se:
Observa-se que a variação de estoques pode ser positiva ou negativa.
I=(Y-C-T)+(T-G)+(M-X)
Exemplo de aplicação 03.06
Em uma economia, dados PIBpm=1450 u.m. (unidades monetárias), C=800 u.m., Onde:
FBKF=100 u.m., G=400 u.m., X=600 u.m., e M=500 u.m., determinar a variação do Y-C-T corresponde à poupança privada que é a parcela que sobra da renda
estoque experimentada por essa economia. depois de deduzidos o consumo e os tributos;
Solução
T-G corresponde à poupança pública porque é a diferença entre a
Partindo de: arrecadação e o gasto total do governo; e
PIBpm=C+FBKF+ΔE+G+X-M, M-X é a poupança externa, porque é a diferença positiva entre o que
Tem-se: produziu-se em outros países e que veio por compra internacional para
consumo ou utilização no país sob estudo e o que se produziu neste país
ΔE=PIBpm-C-FBKF-G-X+M
sob estudo e que foi levado, mediante venda internacional, para
Donde: consumo ou utilização em outros países.

ΔE=1450-800-100-400-600+500, A expressão portanto é o mesmo que I=Sprivada+Spública+Sexterna, ou, ainda, em


termos de totalização:
Donde:
I=S,
ΔE=50 u.m.
A poupança privada corresponde ao saldo remanescente em mãos das famílias e
05.03. Origem dos recursos para investimento
firmas depois de deduzidos as despesas com o consumo e o pagamento dos
Recursos para investimento podem advir de fontes diversas podendo, inclusive, tributos (obrigações fiscais). A poupança pública corresponde ao saldo do
ser providos por empréstimos de curto e longo prazos. A fonte natural de governo em conta corrente e sua formação depende de o governo gastar menos
recursos para investimento é, no entanto e como já referido anteriormente, a do que arrecada. E a poupança externa equivale ao déficit em transações
poupança. A seguir, demonstra-se o porquê dessa afirmação. correntes do balanço de pagamentos.
Subtraindo-se C+T de ambos os membros de Y=C+I+G+X-M, obtém-se:

102
Exemplo de aplicação 03.07 de tributos. Déficits públicos ocorrem com freqüência, e são os geradores ou
O PIB de uma economia aberta e com governo é 4.000 u.m.. O consumo é de fatores de ampliação de dívida pública, normalmente administradas e, quando
2.500 u.m., os gastos governamentais são de 900 u.m. e a arrecadação de não quitadas, transferidas de uma gestão de governo para a seguinte. A fonte
tributos corresponde a 20% do PIB. As exportações líquidas são de 180 u.m.. Qual natural de eliminação do déficit público reside nas poupanças, privada e externa,
a capacidade de investimento dessa economia em termos de proporção do PIB? como se demonstra a seguir.
Solução
Partindo-se da expressão Y-C-T=C+I+G+X-M-C-T, e explicitando-se (G-T) em
Partindo-se de: relação às demais variáveis, encontrar-se-á:
I=(Y-C-T)+(T-G)+(M-X), e considerando T=0,20 x Y = 800, além dos demais dados G-T=(Y-C-T)-I+(M-X)
do enunciado, tem-se:
Donde:
I=(4.000-2.500-800)+(800-900)+180,
Déficit público=(Spriv-I)+Sexterna
Donde:
O membro à direita da igualdade acima mostra que é necessário que a soma da
I=780 u.m. que, como proporção do PIB é igual a (780/4000)x100=19,50%. poupança privada com a externa supere o investimento

para que sejam gerados recursos objetivando a eliminação do déficit público. Em


05.04. Origem dos recursos para financiar o déficit público outras palavras, em uma economia aberta, o déficit público deve ser financiado
por uma composição entre as poupanças privada e externa e o nível de
O déficit público pode ser financiado por meio de recursos de natureza variada.
investimento. Nos tópicos especiais deste Capítulo (subseção 11.01), voltar-se-á
Entre esses, alinham-se o aumento de tributos, a emissão de títulos da dívida
ao tema da dívida pública, como ela surge e os critérios de seu manejo.
pública, empréstimos, reescalonamento de compromissos já assumidos, vencidos
e/ou vincendos por prazos mais elastecidos e, mesmo tratando-se de um recurso Exemplo de aplicação 03.08
condenável à economia, emissão de moeda. O exame dessas possibilidades faz O deficit público de uma economia aberta e com governo em dado momento é
parte do estudo da economia do setor público, não integrante do programa deste 800 u.m.. O PIB a preços de mercado dessa economia é 5.000 u.m., o consumo
Curso. Idealmente, não deveria haver déficit público uma vez que os governos corresponde a 60% deste PIB e a carga tributária equivale a 10% deste mesmo
deveriam gastar exatamente o que arrecadam. Na prática, entretanto, não é o PIB. As exportações montam a 600 u.m. e o investimento é igual a 1.100 u.m..
que ocorre, não somente pela imprevisibilidade que assalta alguns gastos Pergunta-se: qual o montante das importações? Suponha que o governo adote
governamentais como, por exemplo, uma inesperada epidemia que surge depois medidas que estimulem o aumento do consumo c, e que, destas medidas tenham
que o orçamento público já se encontra em aplicação sem a correspondente resultado, ao cabo de um ano, um aumento do consumo para 3.200 u.m., do PIB
provisão para enfrentá-la. Em outra ordem de exemplo, um eventual para 5.100 u.m., e da arrecadação para 510 u.m. tudo o mais mantido constante,
desaquecimento da economia que implique significativa redução da arrecadação qual o nível final do deficit público?

103
Solução Considerando-se, em seguida, que PIL pm=PILcf+II-Sbsd, pode-se explicitar o Produto
Interno Líquido a custo de fatores:
Substituindo-se os dados conhecidos em:
PILcf=C+Ilíq+G+X-M-II+Sbsd,
G-T=(Y-C-T)-I+(M-X)
Transformando-se o Produto Interno Líquido em Produto Nacional Líquido
Tem-se:
acrescentando-se ao PILcf a receita recebida do exterior e deduzindo-se a receita
800=(5.000-3.000-500)-1.100+(M-600) enviada ao exterior:
Donde: PNLcf=C+Ilíq+G+X-M+RRE-REE-II+Sbsd
M=1.000 u.m. A expressão acima corresponde, por definição, à renda nacional RN. Daí:
Com a adoção das medidas, o deficit público passa a ser: RN= C+Ilíq+G+X-M+Rre-Ree-II+Sbsd
G-T = (5.100 – 3.200 – 510)-1.100+(1.000-600), A renda nacional é formada a partir dos salários, juros, lucro e alugueis recebidos
Donde: G-T = 690 u.m. pelas famílias.

Em continuação, se se deduzirem da renda nacional os lucros retidos pelas firmas,


os impostos diretos pagos pelas firmas, as contribuições previdenciárias
05.05. Decomposição da renda nacional recolhidas pelas firmas e, ao mesmo tempo, se se acrescentarem as
Partindo-se do Produto Interno Bruto a preços de mercado, a expressão do transferências feitas pelo governo e os juros pagos pelo governo, obtém-se a
equilíbrio maacroeconômico geral é: renda pessoal, ou seja:

Y=PIBpm=C+I+G+X-M Rpess=RN-Lretfirm-IDfirm-Cprev+Tr+Jgov = C+Ilíq+G+X-M+Rre-Ree-II+Sbsd-Lretfirm-IDfirm-Cprev+Tr+Jgov

Donde, decompondo a parcela do investimento em investimento líquido e Por fim, se se deduzir, da renda pessoal, o imposto de renda pessoa física, chega-
depreciação, tem-se: se à renda pessoal disponível, isto é:

PIBpm=C+Ilíq+D+G+X-M Rpessdisp=Rpess-IRPF.

Deduzindo-se a parcela da depreciação, passa-se do Produto Bruto ao Produto A renda pessoal disponível se reparte em consumo, poupança, juros e prestações.
Líquido: Exemplo de aplicação 03.09
PILpm=PIBpm-D=C+Ilíq+G+X-M, Considerem-se os seguintes dados macroeconômicos de um país: (i) PNB a preços
de mercado=2.000 unidades monetárias (u.m.); (ii) Receitas enviadas para o
exterior=10 u.m.; (iii) Receitas recebidas do exterior=20 u.m.; (iv)

104
Exportações=400u.m.; (v) Importações=180u.m.; (vi) Gastos do Governo=600 (administrados) na formulação da política macroeconômica de um país. A
u.m.; (vii) Depreciação=10% do Investimento; (viii) Investimento=25% do PIB a evolução dos estudos sobre a determinação da renda fez com que os avanços
preços de mercado; (xii) Impostos Indiretos=8% do PIB a preços de mercado; (xiii) fossem dando conformação a diferentes tipos de abordagem ao problema. Essas
A soma dos lucros retidos pelas empresas com os impostos diretos e as
diferentes abordagens constituem os modelos de análise que serão sintetizados
contribuições previdenciárias recolhidas pelas empresas é 430 u.m.; (xiv) As
na presente seção. Na sequência, são apresentadas as características principais
transferências oriundas do governo montam a 25 u.m.; (xv) Os juros pagos pelo
governo correspondem a 30 u.m.; e (xvi) A alíquota média do Imposto de Renda do modelo clássico, do modelo keynesiano e do modelo ISxLM para uma
da pessoa física é de 15% sobre a renda disponível. Pede-se determinar: (i) O PIB economia fechada. O estudo do modelo ISxLM para uma economia aberta é
a preços de mercado; (ii) O PNL a preços de mercado; (iii) O consumo; (iv) A renda remetido para leitura posterior de parte de alunos(as) que pretenderem se
nacional; (v) A renda pessoal; e (vi) A renda pessoal disponível. aprofundar nos estudos macroeconômicos. No espaço deste Curso, a base do
Solução conhecimento se limita até o modelo ISxLM em economias fechadas, ou ISxLM
simplesmente, porquanto, com esta base assimilada, o(a) estudante tem
(i) A expressão PIBpm+RRE-REE=PNBpm permite calcular o PIBpm, como se segue:
condições de desenvolver o modelo ISxLM para economias abertas, referido
PIBpm=2.000-10+20, donde PIBpm=2.010 u.m.; como ISxLMxBP. Esse mesmo comentário é válido para o estudo dos casos
especiais dos modelos ISxLM, excluídos deste texto e para o modelo de
(ii) Partindo de PNLpm=PNBpm-D, sendo D=0,10 x 0,25 x 2.500, donde D=50,25
determinação conjunta de produto e inflação. Inobstante tais exclusões, este
u.m.. Daí, PNLpm=2.000-50,25, donde PNLpm=1.949,75 u.m.;
capítulo consagra algumas seções ao estudo da taxa de câmbio, da inflação, do
(iii) Da expressão PIBpm=C+I+G+X-M, tem-se C=PIBpm-I-G-X+M, sendo I=0,25 x desemprego, entre outras que conceituam importantes variáveis
2.010, donde I=502,50, e finalmente: C=2.010-502,50-600-100+180, donde macroeconômicas.
C=1.087,50 u.m.; 06.01. Síntese do modelo clássico
Historicamente, o primeiro exercício desenvolvido para explicar o nível de renda
(iv) RN=PNLcf, sendo PNLcf=PNLpm-II+Sbsd e II=0,08 x 2.010, ou seja, II=160,80. Daí,
de uma economia foi o modelo clássico, que elegeu a quantidade de trabalho
PNLcf=1.949,75-160,80+60, donde PNLcf=RN=1.848,95 u.m.
como variável determinante do produto. Para tanto, foram alinhadas no modelo
(v) Rpess=RN-Lucrretp/firmas-IDpagosp/firmas-Cprevrecolhpfirmas+Transfgov+Juropagopgov, donde as seguintes considerações:
Rpess=1.848,95-430+25+30, isto é, Rpess=1.413,95 u.m.; e (i) os mercados da economia são de concorrência perfeita e tendem a se auto-
regular;
(vi) Rpessdisp=(1-0,15).Rpess=0,85 x 1.413,95, donde Rpessdisp=1.201,86 u.m. (ii) a oferta gera sua própria demanda (lei de Say43);
6. Determinação da renda (iii) o estoque de capital e o nível de tecnologia são constantes;
(iv) inexistência de desemprego involuntário; e
A determinação da renda constitui uma das questões centrais da análise (v) papel neutro da moeda que atua apenas para refletir os níveis de preços
macroeconômica, pois a renda de uma economia depende do concurso de vários determinado pela demanda agregada.
fatores (variáveis macroeconômicas), alguns dos quais são utilizados 43
Say, Jean-Baptiste (1767-1832), economista francês.

105
Incorpora-se às condições ora apresentadas, as quais refletem as simplificações Em decorrência desse valor do produto marginal, para demandar o trabalho de
do modelo, a função de produção, da forma: três trabalhadores, os produtores estarão dispostos a remunerar cada um dos
Y=f(K,L,Tg) três por 800 u.m. porque este é o valor monetário acrescentado pelo terceiro
Onde: trabalhador.
Y é o produto ou renda;
Fig. 03.05 – Demanda das firmas por trabalho
K é o estoque de capital que, como referido, é constante; No de Produto Prod. marg. Preço unit do Valor do
L é o estoque utilizado de trabalho, que é a variável do modelo; e trabalhadores total Y (u.f). do trabalho produto prod
Tg é o nível de tecnologia, também considerado invariável. (u.f.*) (u.m.**) marginal
Como todo e qualquer mercado, o de trabalho é comandado por uma função de (u.m)
1 100 100 10 1.000
demanda e por uma função de oferta que são representadas em diagrama de 2 190 90 10 900
quantidade de trabalho e preço do salário. 3 270 80 10 800
Analisa-se, preliminarmente, a demanda. As firmas contratarão mão de obra até 4 340 70 10 700
5 400 60 10 600
determinada quantidade cujo valor do incremento da produtividade seja igual ao *Unidade física.
salário pago. ** Unidade monetária.

Essa condicionante pode ser melhor compreendida por meio dos dados da tabela A condição de equilíbrio corresponde, portanto, à igualdade entre o salário
da Figura 03.05. Nessa tabela, a quantidade de trabalho é representada pelo nominal que é pago e o valor do produto marginal. Em termos algébricos, essa
número de trabalhadores e o nível de produto é dado por uma quantidade física condição é representada por:
VPMGL=W
que corresponde à de um produto equivalente de toda a economia, ou seja, a
Dadas as condições ora apresentadas, o nível de produto, e consequentemente
quantidade que seria produzida caso a economia só produzisse um único produto
da renda da economia, são definidos com base na lei dos rendimentos
encarnando o conceito de produto típico, isto é, um só produto representativo da
decrescentes (vide Capítulo 2 deste Curso), considerando-se a quantidade de
quantidade e da heterogeneidade de todos os produtos dessa economia.
trabalho como insumo variável.
Além disso, o preço unitário do produto é fixo dado o pressuposto do modelo
A quantidade de trabalho é determinada, por seu turno, pelo equilíbrio do
segundo o qual o ambiente é de concorrência perfeita. Por fim, o valor do
mercado de trabalho, resultante da interação de oferta e demanda de mão de
produto marginal é dado em unidades monetárias., resultado da multiplicação do
obra.
produto marginal pelo preço de venda do produto.
Os diagramas da Figura 03.06 apresentam esse resultado do modelo. O nível de
O incremento de produto a cada novo trabalhador adicionado corresponde ao
utilização do fator trabalho (L) é transferido do diagrama inferior da referida
produto marginal do trabalho. Por exemplo, ao passar de uma operação com dois
Figura 03.06 para o diagrama superior, definindo o produto da economia e,
trabalhadores para três, o conjunto de produtores vê seu produto físico evoluir de
consequentemente, a renda Y.
190 unidades físicas para 270 unidades físicas. O produto marginal dessa
A quantidade de trabalho corresponde à variável independente em ambos os
mudança de dois para três trabalhadores é de 80 unidades físicas do produto, e o
diagramas, enquanto que a variável dependente é a renda (e o produto) no
valor desse produto marginal é igual a (80 u.f. x 10 u.m./u.f.)=800 u.m.
diagrama superior e o salário real no diagrama inferior.

106
De Ws=WD, tem-se 80-L=20+5L, donde L*=10x10 6. Entrando-se com o número de
Fig. 03.06 – Produto de equilíbrio no Modelo Clássico trabalhadores encontrado na equação do produto (PIB), tem-se: Y E=900x106 u.m.

06.02. Síntese do modelo keynesiano


O ambiente econômico da grande depressão de 1929 inspirou o economista
britânico John Maynard Keynes (1883-1946) a elaborar um modelo com diretrizes
para o combate ao desemprego que se alastrava nos Estados Unidos, havia
atravessado o Atlântico e já promovia desarranjo macroeconômico em algumas
nações europeias. O modelo formulado é, ao mesmo tempo, uma crítica ao
modelo clássico.
O ponto de partida é a observação de Keynes segundo a qual níveis reduzidos de
consumo privado e de investimentos produtivos motivaram o desemprego em
1929. Em 1936, ele publicou seu trabalho principal A Teoria do Emprego, do Juro
e da Moeda, no qual demonstrou que as decisões de gasto é que determinam o
nível de renda. O resultado do modelo keynesiano é o estabelecimento do
multiplicador autônomo de gastos, o qual revela que a renda, e
consequentemente o produto de uma economia, cresce em uma proporção
superior aos gastos realizados, seja de consumo seja de investimento. Para
melhor compreensão, o modelo será estudado em três etapas, uma primeira
admitindo que a economia somente conte com dois agregados, consumidores e
produtores; uma segunda, considerando os três agregados, isto é, acrescentando-
se o governo à etapa anterior, porém limitando a economia a seu mercado
interno (economia fechada); e, a terceira e última etapa, considerando os três
agregados macroeconômicos em um ambiente de economia aberta, ou seja, uma
economia que mantém relações com outras, trazendo como novo ingrediante, as
Exemplo de aplicação 03.10
exportações e importações.
Determinar, pelo modelo clássico, o produto bruto de uma economia cuja função
Antes de desenvolver cada uma dessas etapas, aborda-se o tratamento dado por
de produção agregada é Y=12L2-0,3L3, e que as funções de demanda e oferta de
Keynes a quatro importantes variáveis: o consumo, a poupança, o investimento e
trabalho sejam respectivamente Wr=80-L e Wr=20+5L, sendo Wr o salário real, e
os gastos de governo. Nesse contexto, surgem os conceitos de propensão a
L expresso em 106 trabalhadores.
consumir, de propensão a poupar, e de propensão a tributar, todos em duas
Solução
dimensões, a média e a marginal.

107
Para melhor compreender como se formam consumo e poupança, convém de renda. O que se mantém constante é a soma das participações relativas dessas
analisar a maneira como a renda das famílias correntemente se distribui entre duas propensões, que é sempre igual à unidade, ou seja, uma parte da renda de
estas duas variáveis. Admita-se, para tanto, que a tabela da Figura 03.07 seja cada família é canalizada para o consumo, e o seu complemento, se houver, é
indicativa do comportamento da família típica de uma economia fictícia em poupado. As variações do que se consome e do que se poupa quando a renda
termos de distribuição de sua renda. varia, que, para variações elementares da renda, correspondem,
respectivamente, a propensão marginal e consumir e propensão marginal a
As necessidades de consumo costumam indicar, quando confrontadas com o nível
poupar são, também, variáveis macroeconômicas de relevo na análise do
de renda, a parcela que resta à família para a finalidade de poupar. O consumo de
equilíbrio da economia. A renda da família aqui considerada é a renda líquida, isto
uma família depende do número de seus integrantes, suas faixas de idade, seus
é, o que sobra da renda bruta depois de deduzidos os tributos que a família
hábitos e, evidentemente, de seu nível de renda. Surgem, nesta análise, dois
recolhe ao erário. Em continuação, passa-se a analisar o tratamento conferido por
novos conceitos: o da propensão a consumir e o da propensão a poupar, ambos
Keynes às mencionadas variáveis.
relacionados com suas respectivas dimensões média e marginal. As quatro
colunas à direita na referida Figura 03.07 apresentam aplicações desses - Consumo
conceitos.
O consumo da sociedade depende principalmente de quanto lhe resta em termos
Fig. 03.07 – Distribuição da renda de uma da renda Y depois de deduzidos os tributos, isto é,
família C=f(Y-T),
Renda Consumo Poupança Prop. Mg. a Prop. Mg. a Prop. Méd. Prop. Méd.
disp. C S cons. poup. cons a poup. onde T representa os tributos cobrados. Parte dessa sobra de renda após o
Y ΔC/ΔY ΔS/ΔY C/Y S/Y
1000 1200 -200 1,1 -0,1 1,2 -0,2 pagamento dos tributos é aplicada em consumo e o restante é poupado. A parte
2000 2300 -300 0,7 0,3 1,15 -0,15 que é destinada ao consumo depende da propensão marginal a consumir das
3000 3000 0 0,8 0,2 1 0
4000 3800 200 0,3 0,7 0,95 0,05 famílias, que corresponde a [dC/d(Y-T)]. Essa derivada reflete a inclinação em
5000 4100 900 0,4 0,6 0,82 0,18
cada ponto da curva de consumo em função da renda disponível, também
6000 4500 1500 0,5 0,5 0,75 0,25
7000 5000 2000 --- --- 0,71 0,29 chamada de Curva da Função Consumo, conforme ilustrado pela Figura 03.08.

A forma corrente da representação da função consumo é C=C.+Pmgc(Y-T), onde C0


Quando a renda de uma família aumenta, o consumo também aumenta, mas é o consumo autônomo, Pmgc é a propensão marginal a consumir e Y é a renda.
quase sempre as alterações observadas nos padrões desse consumo não Além disso, por mera simplificação de raciocínio, considera-se que a função de
obedecem a um comportamento estritamente proporcional, ou seja, não há uma consumo seja linear.
linearidade na variação dos gastos quando comparada com a variação do
No gráfico da mencionada Figura 03.08, a propensão marginal a consumir das
consumo da família. Isso sucede porque a relação entre a propensão média a
famílias corresponde à inclinação da curva de consumo. Por fim, observa-se que a
consumir e a propensão média a poupar sofre alteração quando se altera o nível

108
parte não consumida da renda disponível é levada à poupança que, em última Fig. 03.09 – Curva da função poupança
análise, nada mais é, conforme já referido, do que o adiamento do consumo.
Observa-se que, no caso de uma economia sem governo, o nível de “T” (tributos)
na abcissa do gráfico da já referida Figura 03.08 seria T=0.

Fig. 03.08 – Curva da função consumo

A expressão da curva da função poupança é S=-Ca+Pmgs(Y-T), onde:


- Pmgs é a propensão marginal a poupar, sendo Pmgs=1-Pmgc.;
- Ca é o consumo autônomo;
- Y é a renda; e
- T é o tributo.
- Investimento
Em seu modelo, Keynes não explica esta função, admitindo-a como autônoma, ou
No Brasil, a proporção do consumo em relação ao PIB vem se reduzindo, tendo
seja: I=Ia.
passado de um patamar superior a 75% no final dos anos 1940 para - Gastos de governo
aproximadamente 60% nos dias atuais. O modelo keynesiano considera que o governo tenha gastos definidos
- Poupança autonomamente, tanto em suas despesas correntes de custeio e investimento
quanto nas tranferências que faz ao setor privado.
Poupança significa o adiamento do consumo. Como já referido, poupança e A seguir, apresentam-se as três etapas de desenvolvimento do modelo
consumo se complementam na formação da renda. Para a renda líquida nula, isto keynesiano, começando pelo formato mais simples de uma economia fictícia
é, para Y-T=0, a poupança é negativa e igual em módulo ao consumo autônomo, constituída apenas de dois agregados, os consumidores e os produtores.
posto que, mesmo sem renda, o indivíduo realiza o consumo autônomo. Daí
resulta que o gráfico cartesiano do consumo tem o formato mostrado na Figura (i) Economia fechada e sem governo
03.09. Uma vez mais, observa-se que, no caso de uma economia sem governo, A simulação de uma economia fechada, isto é, sem relações com outros países, e
T=0 na abcissa do gráfico cartesiano da função sob análise. sem governo, dois artifícios que serão removidos na sequência desta seção, faz
com que a renda nacional se origine apenas da necessidade das famílias para
satisfazerem o seu consumo e, em havendo sobras, guardarem-nas para

109
necessidades futuras. Essas sobras são a poupança. Genericamente, pode-se Dada a propensão marginal a consumir P mgc=0,60 de uma economia, determine o
então afirmar que a renda das famílias se distribui em consumo, ou gasto, e gasto autônomo capaz de produzir uma variação na renda igual a 2.500 unidades
poupança, sendo que a poupança é drenada para investimento, isto é: monetárias (u.m.), Se o gasto autônomo com o investimento não variar, qual a
variação do gasto autônomo com o consumo?
Y=C+I,

Onde: Solução
O multiplicador é igual a ᾳ=1/(1-0,60)=2,5. De ΔY=ᾳ(ΔA), tem-se ΔA=2500/2,5,
Y é a renda nacional; donde ΔA=1000. Considerando que ΔA=ΔCa+ΔIa, se ΔIa=0, donde ΔCa=1000.
C é o consumo; e
(ii) Economia fechada e com governo
I é o investimento. A equação do equilíbrio macroeconômico assume a forma seguinte:
Y=C+I+G,
Com base nos conceitos de consumo e poupança formulados na teoria
onde a variável nova em relação ao modelo anterior cuja economia era fechada e
keynesiana, já expendidos, e na acepção igualmente keynesiana do caráter
sem governo, são exatamente os gastos de governo (G). O governo atua
autônomo do investimento, passa-se ao cálculo do multiplicador dos gastos
realizando gastos para adquirir bens e serviços de interesse público, e com a
autônomos.
transferência de recursos monetários para o setor privado. Tais transferências
Substituindo as expressões C=Ca+PmgcY e I=Ia em Y=C+I, tem-se: correspondem a aposentadorias, pensões, bolsas-auxílio, entre outros. Para fazer
Y=Ca+PmgcY+Ia. face a esses custos, o governo arrecada tributos de espécies diversas como, por
Explicitando-se a renda em relação às demais variáveis, chega-se à expressão: exemplo, impostos, taxas, contribuições de melhoria e preços públicos.
Y=[1/(1-Pmgc)](Ca+Ia), O modelo keynesiano adota o critério segundo o qual tanto os gastos quanto as
Onde a expressão entre colchetes é o multiplicador dos gastos autônomos em transferências governamentais sejam autônomos, ou seja. G=G a e Tr=Tra. Ao
uma economia fechada e sem governo. Chamando esse multiplicador de ᾳ, e os mesmo tempo, considera que o governo tribute consoante sua propensão
gastos autônomos de A, tem-se, finalmente: marginal relativa a esta finalidade, isto é, sua propensão marginal a tributar (P mgt).
Y=ᾳGA, e ΔY=ᾳ(ΔA), o que significa que uma variação dos gastos autônomos
Em outras palavras, que o montante de tributos seja igual a uma fração da renda
produz uma variação na renda em uma proporção maior do que a variação de tais
dada por: T=Pmgt.Y
gastos, posto que, como Pmgc é sempre menor do que a unidade, o multiplicador A renda disponível, Yd, será:
ᾳ será sempre maior do que a unidade. Daí resulta uma consequência importante Yd=Y-T+Tr.
para a formulação da política macroeconômica que é o fato de que um aumento Considerando a expressão do consumo já estudada no modelo de economia
nos gastos autônomos (C e/ou Ia) faz o produto bruto da economia crescer em fechada e sem governo, esta passará a ser escrita do modo seguinte:
uma proporção superior a este aumento. C=Ca+Pmgc.Yd,
Exemplo de aplicação 03.11 donde:
C=Ca+Pmgc (Y-T+Tr),

110
donde: Donde:
C=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[Y-Pmgt.Y] Y=3.113,00 u.m.
donde finalmente: (iii)Economia aberta
C=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[1-Pmgt.]Y. No estudo da economia aberta e com governo, o modelo keynesiano considera
A expressão acima corresponde à versão da função consumo em uma economia que as exportações sejam autônomas (X=X a) e que as importações sejam
fechada e com governo. Essa expressão indica que quanto maior for a propensão compostas de uma parcela autônoma e de uma segunda parcela que depende da
marginal a consumir e menor for a propensão marginal a tributar, tanto maior propensão marginal a importar, isto é, M=Ma+Pmgm. Dadas essas condições, a
será o consumo da economia. renda será:
Para determinar-se o multiplicador dos gastos autônomos, entra-se com a Y=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[1-Pmgt.]Y+Ia+Ga+Xa-Ma-Pmgm.
expressão de C, acima encontrada, na equação do equilíbrio macroeconômico Explicitando-se a expressão acima em relação a Y, tem-se:
Y=C+I+G, consideranjohndo, como já indicado, que as variáveis I e G sejam Y={1/[1-Pmgc(1-Pmgt)]+Pmgm}.[Ca+(Pmgc.Tr)+Ia+Ga+Xa-Ma,
autônomas. Daí: O multiplicador keynesiano será a parte da última expressão que está entre entre
Y=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc[1-Pmgt.]Y+Ia+Ga, chaves, ou seja:
Isolando os gastos que dependem de decisões autônomas na equação da renda γ=1/[1-Pmgc(1—Pmgt)+Pmgm].
acima: E variação da renda será:
Y-Pmgc[1-Pmgt]Y=Ca+ Ia+Pmgc.Tr, ΔY= γ.[Δ(Ca+Ia+Ga+Pmgc.Tr+Xa-Ma).
donde:] Exemplo de aplicação 03.13
Y={1/[1-Pmgc(1—Pmgt)]}(Ca+Ia+Ga+Pmgc.Tr). Dados C=120+0,60Y, Tr=2, Ia=180, Ga=30, Xa=200, M=120+0,10Y, e P mgt=0,30
O multiplicador keynesiano será a parte da última expressão que está entre entre determinar a renda de equilíbrio da economia e o multiplicador de gastos.
chaves, ou seja:
β=1/[1-Pmgc(1—Pmgt)]. Solução
A variação da renda será, portanto, igual a: Cálculo do multiplicador:
ΔY=β.[Δ(Ca+Ia+Ga+Pmgc.Tra). γ=1/[1-0,60(1—0,30)+0,10]
Donde:
Exemplo de aplicação 03.12 γ=2,08.
Dadas as propensões marginais a consumir e a tributar, P mgc=0,55 e Pmgt=0,35, A renda será:
Y=2,08[120+(0,60x2)+180+30+200-120-0,10Y],
além dos seguintes gastos autônomos: Ia=0,18Y; Ga=1000; Tr=100 e Ca=400.
Donde: Y=706,30 u.m.
Determine a renda da economia.
Solução 06.03.Síntese do modelo ISxLM
Cálculo do multiplicador:
β=1/[1-0,55(1-0,35)]=1,56 Este modelo, conhecido pelos nomes de duas curvas (IS e LM), teve sua versão
A renda ou produto será: original apresentada por Hicks e resulta da evolução da Teoria Geral de Keynes,
Y=1,56[400+0,18Y+1000+(0,55x100] trazendo como ingrediente novo o mercado monetário.

111
O sistema é organizado, portanto, em dois mercados, o de bens e serviços, Onde 1/[1-Pmgc(1-Pmgt)]=β, isto é, é o muliplicador keynesiano para uma economia
representado pela curva IS (investment savings), e o monetário, representado fechada e com governo.
pela curva LM (liquidity preference money)44. Daí:
O modelo ISxLM é aplicado a economias fechadas e com governo. Para as Y=β(A-θi),
economias abertas (necessariamente com governos), o modelo que deriva do
que é a equação da curva IS, de primeiro grau em “i” e negativamente inclinada,
ISxLM é ISxLMxBP, onde BP é o Balanço de Pagamentos, indicativo das relações da
como mostra a Figura 03.10.
economia de um país com outras economias.
Colocando a expressão da curva IS na forma da equação reduzida da reta i=f(Y),
Portanto, a equação do equilíbrio geral macroeconômico para economias
tem-se:
fechadas e com governo é:
i=(A/θ)-(1/βθ).Y
Y=C+I+G,
donde:
E os seguintes pressupostos são adotados:
i=(1/θ)[A-(1/β)].Y,
- O consumo C segue o mesmo padrão do modelo keynesiano;
Fig. 03.10 – Curva IS
- O gasto de governo é autônomo (G=Ga); e
- O investimento depende da taxa de juro “i”, variando numa proporção inversa à
da variação deste conforme se demonstra na seção 07.
Daí:
C=Ca+Pmgc.Tra+Pmgc(1-Pmgt)Y;
G=Ga; e
I=Ia-θi.
Na terceira das condições acima, “θ” é a sensibilidade-juro da demanda por
investimento. Estabelecem-se, a seguir, as equações e representações gráficas das
curvas IS e LM:
- Curva IS:
Parte-se do produto (ou renda) de equilíbrio:
Y=Ca+Pmgc.Tr+Pmgc(1-Pmgt)Y+Ia-θi+Ga que permite observar que, quanto menor o valor de θ (sensibilidade-juro da
Separando-se, no membro da direita da expressão acima, os gastos que demanda por investimento), tanto maior será a inclinação da reta IS e,
dependem de decisões autônomas, tem-se: consequentemente, menor será o impacto da alteração da taxa de juro sobre o
Y[1-Pmgc(1-Pmgt)]=Ca+Pmgc.Tra+(Ia-θi)+Ga nível de renda.
Em seguida, chamando-se os gastos autônomos de A, isto é: C a+Pmgc.Tra+Ia+Ga, a - Curva LM
expressão da renda de equilíbrio se transforma em: Na determinação da curva LM, o pressuposto básico é a existência de apenas dois
Y={1/[1-Pmgc(1-Pmgt)]}.(A- θi), tipos de ativos financeiros: títulos (que rendem juros) e moeda sonante. Sejam OT
44
Keynes trabalhou somente com o mercado de bens e serviços (economia real), admitindo que o equilíbrio deste
independia do mercado monetário.

112
a oferta de títulos, M a oferta de moeda, P o nível geral de preços, e W a oferta
monetária total (de títulos e moedas). A valores reais, a oferta monetária total é:
W/P=(OT/P)+(M/P).

Adicionalmente, sejam DT a demanda por títulos e L a demanda por moeda.


Analogamente, a demanda monetária total é:
W/P=(DT/P)+(L/P).
O equilíbrio do mercado financeiro implica:
(OT/P)+(M/P)=(DT/P)+(L/P)
Donde:
[(OT/P)-(DT/P)]+[(M/P)-(L/P)]=0
Um rápido exame da expressão acima permite concluir que se o mercado de
títulos estiver em equilíbrio, o de moeda também estará e vice-versa, porque se
(OT/P)-(DT/P)=0, obrigatoriamente (M/P)-(L/P)=0. Em face dessa implicação, basta A taxa de juro e a renda de equilíbrio resultará da intersecção das duas curvas.
analisar-se um dos dois mercados. Opte-se, no caso, pelo mercado de moeda. Superpondo os diagramas das Figuras 03.10 e 03.11, tem-se o resultado do
A oferta de moeda é controlada pelo Banco Central que é a autoridade monetária modelo, ilustrado pela Figura 03.12.
de cada país. Essa oferta é, em termos reais, M/P. De outro lado, a demanda por
moeda, isto é, quanto os agentes desejam manter de sua riqueza em dinheiro, Fig. 03.12 – Taxa de juro e renda de equilíbrio
corresponde, em termos reais,a:
L/P=λY-ρi
Onde:
λ é a sensibilidade-renda da demanda por moeda; e
ρ é a sensibilidade-juro da demanda por moeda.
O equilíbrio do mercado de moeda é dado por:
L/P=M/P,
Donde:
λY-ρi=M/P,
donde:
i=(1/ρ)[λY-(M/P)],
que é a equação da curva LM. Ela revela que, quanto maior for a variação da
renda, mantida constante a oferta de moeda M, maior será a taxa de juro “i”. O
gráfico da Figura 03.11 apresenta a curva LM.
Fig. 03.11 – Curva LM Exemplo de aplicação 03.14

113
Uma economia tem a seguinte função de consumo: C=0,70(1-P mgt)Y. A função de ao mesmo tempo, quanto o agente emprestador está disposto a receber para
investimento é dada por I=2000-47,5i. Determinar a taxa de juro e o nível de dispor de dinheiro. O primeiro procura dinheiro por ter necessidade de liquidez
renda dessa economia sabendo-se que P mgt=0,25, os gastos do governo são iguais (preferência pela liquidez) e, o segundo, por ter interesse em receber uma
a 755, a função de demanda por moeda é L/P=0,30Y-50i e a oferta de moeda em recompensa por abrir mão durante um certo tempo do ativo líquido de que
termos reais (M/P) é igual a 500. dispõe. Portanto, o preço da taxa de juro depende da procura e da oferta de
dinheiro. Comentam-se brevemente os principais fatores influentes na procura e
Solução na oferta de dinheiro.
Determinação da curva IS: (i) Procura de dinheiro
De Y=C+I+G, tem-se: A procura da liquidez ocorre para satisfazer a uma ou mais das três seguintes
Y=0,70(1-0,25)Y+2000-47,5i+755, donde Y=5800-100i;
finalidades: (i.1) transação, que resulta das necessidades dos indivíduos e das
Determinação da curva LM:
firmas para seus gastos habituais; (i.2) precaução, que está relacionada não
De L/P=M/P, tem-se 0,30Y-50i=500, donde i=0,006Y-10;
Cálculo do equilíbrio ISxLM: somente com a possibilidade do surgimento de oportunidades que devam ser
De Y=5800-100i, tem-se i=58-0,01Y. Equiparando-se a taxa de juro dessa aproveitadas e para as quais uma reserva de caixa (de liquidez) seja necessária,
expressão (curva IS) com a taxa de juro da expressão da curva LM, isto é: como também pela natural necessidade de os indivíduos e as firmas contarem
i=0,006Y-10, encontra-se i=8% e Y=3000. com alguma folga de dinheiro acima da demanda pelo motivo transação; e (iii) e
especulação, finalidade de aplicação do dinheiro que procede da incerteza quanto
06.04. Outros modelos à taxa de juro futura. O indivíduo ou a firma poderá especular quando julgar que
Há, ainda, o modelo ISxLMxBP que é voltado para economias abertas, o qual é a taxa de juro futura lhe trará um resultado favorável (um lucro esperado).
construído acrescentando-se o Balanço de Pagamentos (BP) ao modelo ISxLM. (ii) Oferta de dinheiro
Este modelo não é previsto de ser estudado no presente Curso por falta de A oferta de dinheiro é controlada pelo sistema bancário cujas decisões mais
espaço. Fica, entretanto, a sugestão ao(à) aluno(a) de, a título de exercício, tentar relevantes são tomadas, no Brasil, pelo Comitê de Política Monetária – COPOM e
estruturá-lo utilizando o mesmo critério adotado no desenvolvimento do modelo implementadas pelo Banco Central. Dado um nível constante de oferta
ISxLM, mediante a incorporação da relação do país com outras economias. monetária, a taxa de juro aumentará com o aumento da demanda por dinheiro e
decrescerá com a redução dessa demanda. A autoridade monetária poderá
Por fim, e igualmente por falta de espaço, não é previsto estudar-se, no presente interferir para evitar oscilações na taxa de juro expandindo ou contraindo a oferta
Curso, a determinação do produto em ambiente de variação de preços, isto é, o monetária, e uma das maneiras de se proceder a essa interferência é alterando-se
cálculo conjunto do produto e da inflação. o depósito compulsório, conforme referido na seção 12.09 (Processo de criação
de moeda).
07. Taxa de juro
Em uma definição simples, conceitua-se o juro como o preço do dinheiro,
refletindo quanto o agente econômico que dele precisa está disposto a pagar e,

114
No Brasil, a taxa básica de juro é a taxa SELIC 45. Essa taxa corresponde à média da em busca de uma maior lucratividade. Investimentos resultam de decisões que
remuneração dos títulos federais negociados entre os bancos. Como se dá o seu dependem basicamente da taxa de juro. Dependem da expectativa do agente
cálculo? Os bancos emprestam diariamente dinheiro uns aos outros. Quando um investidor em relação ao futuro (expectativa otimista ou pessimista). Dependem,
banco toma um desses empréstimos, ele dá ao banco emprestador títulos
ainda, de confiança no sistema econômico. A confiança está relacionada com
públicos federais em garantia e cada uma dessas operações, ditas operações
alternâncias políticas que possam interferir no sistema econômico pondo em
compromissadas, é registrada no SELIC. A taxa média ponderada pelo volume
total das operações diárias é anualizada com base no expoente 252 que é o risco, por exemplo, a garantia do direito de propriedade.
número de dias úteis de um ano. O resultado é a taxa overnight anualizada do Como a taxa de juro é a mesma que remunera o capital que é tomado
SELIC. A expressão de cálculo é, portanto:
emprestado pelas entidades financeiras, então, ceteris paribus, se a taxa estiver
Taxa SELIC={[(∑i=1nRi/∑i=1nIi)252-1]x100}% a.a.
Onde: alta, o empresário deixa de canalizar seu dinheiro para o investimento produtivo e
n é o número de operações que entram na base de cálculo; o leva para aplicações no mercado financeiro pois auferirá uma remuneração
Ri é o valor financeiro da recompra/revenda da i-ésima operação mais alta ensejada por essa elevada taxa de juro. No entanto, se a taxa de juro for
compromissada; e baixa, o investimento produtivo se torna atraente desde que o seu retorno, isto é,
Ii é o valor financeiro da compra/venda da i-ésima operação sua lucratividade seja superior à propiciada pela aplicação financeira.
compromissada.
Apesar de o SELIC haver sido criado em 1979, é somente a partir de 04 de março Para melhor compreensão, suponha-se que em uma economia existam cinco
de 1999 que o governo passou a utilizar a taxa SELIC como referência para a tipos de projetos passíveis de ser realizados pelos agentes econômicos.
economia brasileira, revogando o sistema da Bandas de Juros que havia sido Denominem-se esses projetos por Projeto I, Projeto II, Projeto III, Projeto IV e
criado em 1996. Projeto V. Cada tipo de projeto poderá ser alvo do interesse de uma grande
Convém assinalar que algumas operações realizadas entre os bancos são
quantidade de agentes (empresários) que, dispondo de recursos ou podendo
excluídas do cálculo da SELIC. Deixa-se, aqui, de especificar a natureza dessas
operações por corresponder a um detalhamento do tema que escapa ao interesse aportar recursos via empréstimos, terão interesse em investir em um ou mais
do presente Curso. Tais exclusões podem ser conhecidas mediante a leitura da desses tipos de projeto. Admita-se que os retornos anuais dos projetos sejam os
Circular no 3.671, do Banco Central do Brasil, editada em 18 de outubro de 2013. que se apresentam no quadro da Figura 03.13.

Caso a taxa de juro real da economia seja, por exemplo, 14% a.a., os agentes
08.Determinantes do investimento investidores somente estarão interessados no projeto do tipo I cuja rentabilidade
é maior do que 14% a.a.. Mesmo que precisem tomar dinheiro emprestado, os
O investimento corresponde à aplicação de capital para gerar nova riqueza. Os
agentes tomarão empréstimo a 14% a.a., farão o projeto que lhes enseja um
empresários investem em novos negócios ou expandem seus negócios correntes
retorno de 15% a.a. e saem ganhando 1% a.a. sobre o capital investido.
45
Forma abreviada de referir-se ao Sistema Especial de Liquidação e Custódia. O SELIC foi criado em 1979 pelo
Fig. 03.13 – Tipos de projeto (fictícios) para interesse em investir
Banco Central e pela Associação Nacional das Instituições do Mercado Aberto – ANDIMA com o objetivo de tornar PROJETO I II III IV V
mais transparente e segura a negociação com títulos públicos. Trata-se de um sistema eletrônico que permite a RETORNO ANUAL (%) 15 10 5 3 2
atualização diária das posições das instituições financeiras, assegurando maior controle sobre as reservas bancárias.

115
Os agentes que, por motivo outro que não os juros, não estiverem interessados
no projeto do tipo I darão as costas também para os projetos cuja rentabilidade
seja inferior a 14% a.a. e aplicarão seus recursos no mercado financeiro para
obterem o ganho de 14% a.a..

Nesse mesmo ambiente econômico, caso a taxa de juro real fosse, por exemplo,
6% a.a., investidores investiriam em projetos dos tipos I e II e descartariam o
interesse nos demais tipos de projeto.

Se a taxa de juro real da economia fosse de, por exemplo, apenas 4% a.a., a
escolha dos agentes recairia sobre os projetos que oferecessem um retorno anual
superior a 4% a.a..

No caso, muitos agentes aplicariam seus recursos em projeto do tipo I (o mais


rentável), outros aplicariam em projetos do tipo II ou em projetos do tipo III, mas
certamente nenhum agente empregaria seus recursos em projetos dos tipos IV ou Sublinha-se que a taxa de juro que entra na decisão do investimento é a taxa real,
V. que resulta da taxa nominal de juro corrigida pela inflação. Pode-se afirmar,
portanto, que I=g(i), e esta expressão será um dos elementos balizadores da
O resultado dessas escolhas pode ser lançado em um diagrama cartesiano que
decisão de investimento, sobretudo nos casos em que o investidor precise
relacione a taxa de juro real “i-π” com o investimento, como apresentado na
contrair empréstimo para investir. Nesses casos, quando a taxa de juro for alta, o
Figura 03.14, que explicita valores fictícios de taxas reais de juros e os
investidor prefere empregar seu dinheiro, como já referido, no mercado
correspondentes totais de investimentos, também fictícios, em unidades
financeiro para obter a alta remuneração correspondente, em vez de arriscar-se a
monetárias.
fazer um investimento na economia real cujo retorno percentual seja inferior à
Portanto, para cada taxa de juro real haverá um portfólio de projetos que taxa de juro.
interessa aos investidores. Essas preferências são representadas pela ligação dos
Para variações da taxa de juro real, o nível de investimento varia deslocando-se ao
pontos A, B e C que correspondem ao lugar geométrico dos conjuntos de projetos
longo da curva da mencionada Figura 03.14.
que serão realizados, dando conformação à curva que relaciona a taxa de juros
reais com os investimentos. Abordam-se, neste ponto, variações nos custos de bens de capital. São bens que
Fig. 03.14 – Investimento e Juro precisam ser adquiridos para a materialização dos investimentos. Eles podem
constituir, em muitos casos, o próprio investimento, como ocorre com quem
investe em terrenos ou imóveis rurais apenas para aguardar que o preço destes
aumente, ocasião em que os revenderá. Se o preço desses bens aumenta, a

116
tendência de comportamento de quem os compraria é de, para uma mesma taxa
de juro da economia, investir menos.

Além do preço em si, esses bens também são avaliados quanto à capacidade de
gerar um fluxo futuro de lucros que trazem para o investidor. Se esses lucros
futuros derem indicação de que serão elevados, a atração pelo investimento é
maior; contrariamente, se a análise mostrar que os lucros futuros podem ser
pouco atraentes, o investimento é menor.

O aumento do custo dos bens de capital ou expectativa pessimista ou, ainda,


prováveis baixos níveis de lucros futuros, corresponde a um deslocamento para a
esquerda e para baixo da curva do investimento, como mostrado na Figura 03.15
no qual a curva sai da posição I1 para a posição I2.

Quanto à confiança no sistema econômico, o empresário não realiza investimento As diferenças entre as taxas de juro decorrem, inicialmente, da finalidade da
sempre que percebe o risco de perder seu capital. Empresas multinacionais, por operação financeira a que se destinam. Mas decorrem também dos prazos das
exemplo, examinam cuidadosamente a geopolítica dos países nos quais aplicam operações, do nível da inadimplência dos mercados em que são utilizadas, além
seus recursos em investimentos, principalmente as inversões de significativa do regime tributário a que estão submetidas.
monta.

A história tem mostrado que, quando são adotadas medidas de nacionalização de


ativos por países politicamente instáveis, medidas que são protegidas pelo 09.Inflação
princípio da soberania, dificilmente elas são materializadas mediante níveis de Inflação é um estado persistente de aumento dos preços das mercadorias e
ressarcimento que reflitamm o custo real dos ativos tomados às empresas. serviços corroendo o valor da moeda. Isso não significa que todos os preços
Por fim, convém observar que há distintas modalidades de taxas nominais de estejam rigorosamente em ascensão, podendo, inclusive, observar-se a queda de
juro. No Brasil, praticam-se a Taxa SELIC, a Taxa Referencial – TR, a Taxa de Juro alguns. Mas a tendência geral é de subida. Trata-se de um processo pelo qual os
de Longo Prazo – TJLP, entre outras. preços da maior parte dos bens e serviços se movimenta para cima, o que é
diferente de os preços estarem em um nível alto.

Fig. 03.15 – Investimento, custos de bens de capital e expectativas A inflação é, pois, a medida de uma variação percentual dos preços entre
momentos que se sucedem. É usual fazer-se referência à inflação entre um ano e
o subsequente. Nesse caso, o ano anterior é tomado como ano-base. É comum,
também, utilizar-se o ano móvel, isto é indicar-se o índice de inflação dos doze

117
meses imediatamente anteriores, do mesmo modo que frequentemente se faz Comenta-se, brevemente, cada um dos tipos de inflação acima relacionados, de
referência à inflação trimestral móvel. Em qualquer caso, a expressão geral de um e de outro grupos.
cálculo para um determinado ano em relação ao ano imediatamente anterior, já
(i) Inflação de demanda
abordada neste texto, é a seguinte:
A inflação de demanda resulta de de um movimento da curva de demanda
π={[P(ano-base+1)-P(ano-base)]/P(ano-base)}x100
agregada para cima e para a direita mantida a oferta agregada em sua posição. O
A inflação pode se apresentar de modo explícito ou implícito, isto é, aberta ou gráfico da Figura 03.16 ilustra esse movimento, de DA para DA’, fazendo com que
represada. No primeiro caso, a subida de preços é visível enquanto que, na o nível geral de preços se eleve de P para P’.
inflação represada, ou reprimida, os preços não sobem em razão de interferências
Note-se que a variável independente, apesar de corresponder a demanda e oferta
governamentais para controlar o nível geral de preços. Tais interferências são
de bens, é representada em unidades monetárias dado tratar-se do conjunto de
medidas de controle (regulação de preços) que, uma vez retiradas, fazem com
todos os bens e serviços que são transacionados na economia, consumindo a
que os preços reprimidos subam aberta e vigorosamente.
renda Y, dos agentes econômicos.
Considerando que o crescimento dos preços nem sempre é acompanhado de
A inflação de demanda pode estar associada a um incremento da renda dos
correspondentes aumentos de salários e outras formas de ganho, a inflação
agentes econômicos quando, por exemplo, ocorre o aumento do salário mínimo,
promove uma redução na capacidade de compra das pessoas e famílias e este é o
que também gera repercussão nos salários de algumas outras categorias. Nesse
aspecto crucial do problema que preocupa a área econômica de governos.
mesmo contexto, a inflação de demanda pode resultar de um efeito riqueza pela
O fato, pois, de a inflação estar descolada do aumento das disponibilidades incorporação de uma quantidade significativa de agentes econômicos a uma
monetárias dos consumidores é indicativo de que a mesma quantidade de classe de renda mais alta.
dinheiro que um indivíduo dispõe por mês, fruto de seu trabalho e/ou de outras
Mas a inflação de demanda também pode ser causada pela expansão dos gastos
fontes de renda, perde valor perante os preços persistentemente incrementados
públicos que, quando sob a forma de investimentos, pode vir associada à
dos bens e serviços que esse consumidor precisa adquirir.
contratação de obras e outros tipos de encomendas a firmas que exercerão
09.01. Tipos de inflação e comentários sobre fatores determinantes pressão de demanda por insumos para a concretização dos objetos de seus
contratos com o governo.
A inflação pode ser classificada consoante as causas que lhe dão origem e
consoante a intensidade. No que diz respeito às causas, a inflação pode ser de Essa pressão de demanda, quando os programas governamentais são de vulto,
demanda, de custos, inercial e monetária. Alguns autores se estendem por mais contribui para o movimento da curva de demanda agregada já referido (Figura
um ou dois casos que refletem, em verdade, variantes destes ora mencionados. 03.16). Há, ainda, outros fatores determinantes da inflação de demanda. A
Quanto à intensidade, a inflação pode ser moderada, galopante e hiperinflação. expansão do crédito ao consumidor, ao facilitar o impulso em direção às compras,

118
também opera em favor de uma movimentação da curva de demanda agregada em circulação incita a demanda fazendo com que a curva de demanda agregada
para cima e para a direita. realize o movimento para cima e para a direita, contribuindo para o aumento dos
preços dos bens e serviços. Historicamente, o fenômeno foi detectado já nos
primórdios da história do pensamento econômico quando os escolásticos 46
Fig. 03.16 – Movimento da função de demanda agregada verificaram que, a cada nova chegada de ouro e prata à Europa, advinda das
Américas, os preços das mercadorias subiam em razão do aumento da demanda.
(ii) Inflação de custos

A inflação de custos ocorre por um aumento nos preços de alguns fatores de


produção, isto é, pelo aumento do custo com a mão de obra se este aumento for
acima da produtividade do trabalho; pelo aumento do preço das matérias primas
e outros insumos como a energia, os transportes, fazendo com que as firmas
passem a ofertar seus bens e/ou serviços por preços mais elevados. Quando os
derivados de petróleo têm seus preços aumentados, o que pode ocorrer por
causas exógenas ao mercado doméstico, praticamente todos os preços sobem em
razão da parcela relativa aos fretes que está embutida nos custos finais dos bens
e serviços.

Influem na inflação de custos o aumento da taxa de juros, a desvalorização


A inflação de demanda pode ser provocada, ainda, pelo efeito da expectativa dos cambial, o aumento dos preços externos, a prática de preços perversos em
agentes econômicos, principalmente firmas que antecipam compras para formar
estoques preventivos. Nesses casos, a expectativa é de que possa ocorrer alta de
preços de determinados insumos, ou mesmo a escassez destes. As firmas 46
Na fase do mercantilismo (1500-1776), alguns religiosos se dedicavam a estudos que relacionavam a teologia com
adotam, então, uma postura preventiva comprando quantidades maiores do que a filosofia, explorando temas de conteúdo econômico. A publicação Comentarios Resolutorios del Cambio (1556), da
autoria de Martín de Azpicuelta, padre e professor nas universidades de Salamanca e Coimbra, aponta os efeitos
as habituais o insumo produtivo que pode faltar ou ter seu preço elevado, sobre os preços das mercadorias na Espanha causados pela grande quantidade de metais preciosos que chegava da
América para o país. O metal era a moeda de troca por mercadorias. Ele comparava esses preços com os
contribuindo desta forma para o aumento da demanda agregada. correspondentes que eram praticados, à época, na França, país cujo estoque metalista era bem menor do que o
espanhol. Notando a proporcionalidade entre quantidade de metal (moeda) e os níveis de preços a cada novo
Por fim, a inflação de demanda também procede do excesso de estoque de desembarque de ouro e prata, ele deduziu o conceito segundo o qual um estoque elevado de dinheiro contribui para
a prática de preços elevados. Rudimentar que tivesse sido quando comparado ao conhecimento atual da economia,
moeda em circulação em relação ao estoque necessário para a realização das o estudo de Azpicuelta pode ser tomado como um dos primeiros vestígios da teoria quantitativa da moeda.
transações da economia. Por essa razão, a emissão de moeda é administrada
mediante rigorosa avaliação do Banco Central com base nos princípios da teoria
quantitativa da moeda, brevemente explorada neste texto. O excesso de dinheiro

119
mercados imperfeitos sob regulação insuficiente, além dos já referidos custos Em outras palavras, é preciso que exista algum nível de inflação originada por
com a mão de obra acima de seu índice de produtividade. causa outra que não a inercial para que a inflação inercial se materialize.

O aumento da taxa de juros faz o custo do dinheiro para as firmas produtoras A indexação é um mecanismo de convivência com a inflação pois garante que os
aumentar, incorporando-se ao custo de fabricação e elevando os preços dos bens preços sejam reajustados entre dois momentos com base na inflação ― motivada
e serviços ofertados por essas firmas. A desvalorização cambial, ao tornar a por outra causa conforme referido ― do período que vai de um momento a
moeda do país mais fraca do que outras, implica a necessidade de uma outro. Quando a inflação com a qual se pretende conviver é moderada, a
quantidade maior de dinheiro para importar bens e serviços que o país não indexação tem a virtude de promover a confiança dos agentes econômicos que
produz. O aumento dos preços internacionais causa efeito assemelhado ao negociam entre si de que nenhum sairá perdendo pois os preços nominais são
imediatamente anterior, com a diferença que não é um aumento causado pela atualizados por meio da indexação. Essa confiança dos agentes no sistema de
taxa de câmbio quando a moeda do país é desvalorizada e sim por tratar-se de preços reduz incertezas e cria oportunidades de contratos de longo prazo.
um aumento dos preços de bens e serviços produzidos no ambiente externo.
A indexação, quando generalizada para todos os preços traz consigo, entretanto, a
As firmas atuantes nos mercados imperfeitos, principalmente os monopólios e desvantagem de fazer com que a inflação de um período qualquer seja o patamar
oligopólios, quando sob regulação insuficiente, isto é, quando as agências mínimo da inflação do período imediatamente seguinte, isto é, a indexação não
reguladoras não cumprem adequadamente o seu papel de vigilantes desses está comprometida com a redução da taxa inflacionária. Ela está comprometida
mercados, praticam preços escorchantes para cima, fazendo subir a taxa de com a manutenção da taxa observada e esta manutenção pode ser perturbada
inflação. O aumento frequente dos tributos também se acrescenta à perturbação por episódios de inflação de demanda ou de custo cujos resultados, uma vez
dos preços relativos causando inflação. incorporados à inflação então observada, elevam-na para níveis que podem
tornar-se indesejáveis. Nesses casos, a indexação terá criado um ambiente
(iii) Inflação inercial
favorável à alimentação do processo inflacionário.
Conceitua-se como inércia inflacionária o fato de a inflação passada influir nos
No Brasil, praticou-se a indexação durante o período de 1964 até 1994 quando o
índices de inflação presente e futuro. O efeito desse processo é a inflação inercial,
Plano Real extinguiu a correção monetária. Vários índices eram utilizados, sendo
que está estreitamente relacionada com o comportamento dos agentes
as Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional – ORTN o mais divulgado. As
formadores de preços, os quais agem, neste caso, por precaução. Eles aumentam
ORTNs foram depois transformadas em OTNs.
os preços das mercadorias e serviços por considerarem que os preços dos fatores
produtivos de que eles dependem para prosseguir no seu ciclo de produção virão As metas de inflação desempenham, em certo sentido, o papel de um sistema
aumentados. indexado, porque os agentes econômicos mais influentes (os grandes agentes
formadores de preços) mantêm-se atentos à vigilância do Banco Central sobre o
A inflação inercial pode ocorrer em um ambiente econômico indexado, isto é,
cumprimento destas. Sempre que a inflação observada ultrapassa o limite de
quando os preços em geral estão atrelados a algum indicador de correção
tolerância da meta, o Banco Central é obrigado a informar ao Ministro da Fazenda
nominal para que seu valor real seja recomposto com base na inflação observada.

120
quais as medidas que adotará para fazer a inflação retornar para a meta. Sucede cada unidade monetária trocou de mãos, ou seja,
que, quando essas medidas são programadas para que o retorno se dê em prazo R$874.764,50/R$200.000,00=4,37 vezes por ano.
muito longo, os agentes formadores de preços atribuem um peso maior à inflação Fig. 03. 17 – Transações de uma economia fictícia
passada do que à meta. Os agentes seguem a lógica segundo a qual o retorno da Transação Quantidade de Bens Preço Unit. do Sub-Total (R$)
Bem (R$)
inflação ao centro da meta pode ocorrer linearmente no tempo e, neste caso, se 1 2000 10,00 20.000,00
o Banco Central estabelece o tempo de retorno em dois anos, por exemplo, o 2 5.800 136,00 788.800,00
comportamento dos agentes, o qual baseia-se na expectativa de inflação, confere 3 12.560 4,20 52.752,00
4 20.000 0,65 13.000,00
igual importância tanto à inflação passada quanto à meta. Se o planejamento do 5 25 8,50 212,50
Banco Central estabelecer três anos para o retorno da inflação à meta, os agentes TOTAL 874.764,50
considerarão que este retorno pode se dar em três saltos e, para tanto, atribuirão O significado dessa operação é o que se define como velocidade de circulação da
uma importância maior à inflação passada (com peso igual a 2/3) e uma moeda, que resulta do produto do número de transações pelo preço típico destas
importância menor à meta (com peso igual a 1/3). O resultado desse processo é dividido pela quantidade de dinheiro em circulação. Em outras palavras, sendo P,
que, quanto maior for o prazo de retorno à meta que o Banco Central previr, o preço da transação típica desse todo; T, o número de transações; M, a
tanto mais persistente se torna a inflação observada no passado. quantidade de dinheiro que circula; e V, a velocidade com o dinheiro circula,
09.02. Notas sobre a teoria quantitativa da moeda então:

A quantidade de dinheiro à disposição dos agentes econômicos lhes permite M.V=P.T,


realizar um número significativamente grande de transações em determinado que reflete a equação da teoria quantitativa da moeda. Como as economias, por
período de tempo, fazendo com que este dinheiro circule entre eles. Para menores que sejam, envolvem um número muito grande de transações, número
comodidade de exposição, suponha-se que esse número de transações se limite a este que oferece dificuldade em seu dimensionamento, substitui-se o número de
cinco por ano e que estas cinco transações anuais sejam as que são mostradas no transações T pelo produto bruto real da economia, Y, o que não é o mesmo que a
quadro da Figura 03.17. Um breve exame do referido quadro permite observar, equação acima por não incluir o número de transações e sim a renda total. Mas
na coluna de sub-totais, que há transações de elevados valores totais tanto convém lembrar que o produto bruto total é igual à renda total, conforme já
quanto há transações de baixos e de médios valores. A transação típica é a média assinalado neste texto.
aritmética dos valores de todas as cinco transações e corresponde a
R$174.952,90. Então, o que ter-se-á feito ao permutar T por Y, foi escrever-se uma outra
equação para a teoria quantitativa da moeda igual a:
Suponha-se, agora, que a quantidade de dinheiro em circulação seja
R$200.000,00. Se se dividir o total transacionado pela quantidade disponível de M.V=P.Y,
dinheiro em poder dos agentes econômicos, chegar-se-á ao número de vezes que que corresponde ao que se intitula equação da velocidade renda da moeda, que é
a mais utilizada e que faz com que a variável V passe a representar o número de

121
vezes que cada unidade monetária entre na renda de um agente econômico por A expressão acima indica que os saldos monetários que as pessoas pretendem
ano. Convém notar que Y é o produto bruto real, ou seja, medido em valores manter são proporcionais à renda, sendo o parâmetro α, que é o inverso da
monetários. Quando multiplicado por P, preço da transação típica da economia, o velocidade de circulação, a constante de proporcionalidade.
produto P.Y passa a significar o produto nominal da economia. Por outro lado, se
Por fim, considerando a condição de equilíbrio que é uma tendência natural do
se transpuser o fator V para o membro direito da equação e, ao mesmo tempo, o
confronto das forças de demanda e oferta, o saldo monetário demandado será
fator P para o membro esquerdo, ter-se-á uma nova forma de se escrever a
igual ao saldo monetário ofertado, isto é:
equação da velocidade renda da moeda, que será:
(M/P)d=M/P,
M/P=Y/V
e, sucessivamente, se retroage a M/P=αY, donde M(1/α)=PY, donde MVo=PY, o
A razão M/P é chamada saldo monetário real, que, ao dividir a quantidade
que implica afirmar que uma variação na quantidade de moeda ofertada M
nominal de moeda pelo nível de preços, faz com que esta razão corresponda ao
promove um aumento no produto bruto nominal PY. Ora, considerando que
poder de compra da moeda.
Y=f(K,L), e que K,L=constantes donde Y também é constante, então um aumento
De outro lado, a velocidade de circulação, que depende da demanda por moeda, na quantidade de moeda ofertada M causa um aumento no nível geral de preços
pode ser considerada constante, isto é, V=Vo, sendo Vo=cte. Então: P. Em outras palavras, a causa primária da inflação é a elevação da quantidade de
moeda em circulação. Emissão de moeda além do estritamente necessário,
M/P=Y/Vo
portanto, constitui medida a ser evitada de todas as formas.
Considerar a velocidade de circulação da moeda constante reflete uma
09.03. Efeitos do processo inflacionário
possibilidade razoável pois mudanças no valor de V dependem, conforme
referido, da demanda por moeda que é uma função da maior ou menor facilidade A inflação a taxas moderadas costumam ser recebidas com naturalidade. Embora
com que as transações podem ser feitas. A intensificação do uso de cartões de não haja uma limitação claramente definida do percentual acima do qual ela
crédito, associada ao uso dos caixas automáticos, produziu uma queda enorme na deixe de ser moderada, estudiosos do tema consideram que uma taxa anual de
demanda por moeda, aumentando, em conseqüência, a velocidade de circulação até 3% seja perfeitamente suportável e, até mesmo, desejável.
desta. É que os agentes econômicos passaram a retirar de cada vez apenas o
A inflação produz inúmeros efeitos desfavoráveis e este caráter negativo é tanto
montante necessário para cada transação, fazendo cair a demanda por moeda.
mais forte quanto mais alta for sua taxa. A inflação deixa marcas no mundo dos
Fazendo-se, agora, 1/Vo=α, a equação da velocidade renda da moeda passa a ser preços relativos dos bens e serviços, atua sobre os investimentos prejudicando-os
escrita da forma seguinte: em seu planejamento, piora a distributividade, afeta o balanço de pagamentos e a
balança comercial do país, além de prejudicar o mercado de capitais. No caso da
(M/P)d=αY
relatividade dos preços dos bens e serviços, como nem todos os preços sobem
por igual em um regime inflacionário, as distintas configurações que a referida

122
relatividade vai adquirindo criam um cenário de incerteza deixando de ser uma A inflação impõe efeitos também sobre o mercado de capitais sempre que supera
referência segura para a tomada de decisões de parte dos agentes econômicos. os níveis que podem ser considerados moderados, pois a insegurança em relação
Além de afetar os investimentos que o consumidor cogita realizar, a incerteza à moeda faz com que os agentes econômicos passem a drenar suas aplicações
afeta, em montantes globais bem mais elevados, os investimentos das firmas, para bens de raiz (imóveis) que costumam se valorizar acentuadamente em
uma vez que dificulta a avaliação dos ganhos ou perdas que destes podem períodos de alta e prolongada inflação. Adicionalmente, os agentes econômicos
resultar. Tais incertezas estimulam, ainda, a especulação. A inflação faz, também, costumam incorporar os custos da inflação esperada, principalmente quando
com que o Banco Central se incline a aumentar a taxa de juros, o que significa muito elevada, que incluem as conseqüências diretas de ter que receber e pagar
custo mais elevado do dinheiro, inibindo ainda mais os investimentos produtivos. compromissos a intervalos cada vez menores, antes que a inflação corroa o valor
das importâncias em jogo em cada momento.
No que concerne à distributividade, a inflação, quando elevada, contribui para a
concentração de renda porquanto os mais abastados podem aplicar seus recursos No caso da inflação não esperada, quando as transações, em especial os
no mercado financeiros beneficiando-se de elevados retornos, enquanto que os financiamentos de longo prazo, são feitas com base em taxas de juro ex-ante, isto
que dependem de rendimento fixo (salário) não somente não contam com folga é, pré-fixadas, e ocorre de a inflação verificada ser diferente, um dos agentes, o
para investir como também veem seu poder aquisitivo se deteriorar. Os emprestador ou o tomador do empréstimo, será prejudicado economicamente.
empresários podem repassar aos preços, sobretudo quando participantes de Dessa maneira, a inflação termina atuando como mecanismo de redistribuição de
mercados imperfeitos. Assim, quanto maior for a taxa de inflação, tanto maior renda, deslocando recursos pertencentes a um agente para o outro com quem
será o desarranjo promovido na distribuição da renda. Quanto aos efeitos sobre o estiver negociando. Uma forma de evitar esse deslocamento de riqueza é a
balanço de pagamentos, taxas inflacionárias muito altas que coloquem os preços adoção de taxas de juro ex-post.
do país, uma vez transformados para uma moeda comum, em níveis mais
Por fim, breve referência deve ser feita ao fenômeno da hiperinflação. É
elevados do que os preços externos, empurram as exportações para baixo e
considerada, por vários autores, uma taxa hiperinflacionária aquela que alcança o
estimulam as importações reduzindo o saldo da balança comercial e dificultando,
patamar mensal do entorno de 50%. As economias sob hiperinflação representam
em consequência, o balanço de pagamentos pela menor acumulação de
prejuízo para todos os agentes econômicos e, por via de consequência, para toda
quantidade de moeda internacional. Nesta altura, convém enfatizar que a balança
a sociedade. Nas firmas e nas famílias todos passam a interromper as atividades-
comercial é parte integrante do balanço de pagamentos compondo as transações
fim para cuidar do caixa, com enorme desperdício de tempo. Os regimes
correntes, conforme já mencionado no presente texto.
hiperinflacionários costumam ser resolvidos com ajustes fiscais severos que
Quando o saldo de exportações se torna indesejavelmente baixo, o governo pode aproximem os gastos governamentais das respectivas receitas públicas, afastando
desvalorizar a moeda do país, o que faz aumentar as exportações e reduzir as de uma vez por todas a necessidade da prática da senhoriagem, isto é, não
importações. Essa medida, apesar de trazer a vantagem de melhorar o resultado implicando a necessidade de emitir-se moeda nova.
da balança comercial, pode contribuir para a inflação de custos uma vez que os
insumos importados pela indústria se tornam mais caros.

123
09.04. Breve referência à curva de Phillips 09.05.Metas de inflação

No ano de 1958, o economista inglês A. William Phillips apontou a relação As metas de inflação são um regime de Política Monetária adotado por vários
existente entre a taxa de desemprego e a inflação salarial, uma forma alternativa países, desenvolvidos e em desenvolvimento que tem como objetivo principal
de expressar a oferta agregada, cujos modelos dão suporte à Curva de Phillips. zelar pela estabilidade dos preços dos bens e serviços com baixas taxas
Phillips elaborou curvas para alguns países aí incluídos os Estados Unidos, a inflacionárias. As metas de inflação têm outros objetivos adicionais, com
Inglaterra e a França. Nessa construção, o autor levou em conta que a inflação destaque para o crescimento do produto bruto desde que observadas as referidas
depende de três fatores principais: a inflação esperada, o desemprego cíclico e os baixas taxas de inflação, além de propiciarem uma articulação mais fluida entre os
choques de oferta. O formato encontrado para as curvas nos diversos países para agentes do mercado e os formuladores da política macroeconômica, e de dar
os quais foram construídas foi aproximadamente o mesmo, formato este que é transparência, disciplina e flexibilidade à política monetária.
mostrado na Figura 03.18.
Na implementação do regime de metas de inflação, pelo menos três requisitos
Fig. 03.18 – Curva de Phillips devem fazer-se presentes. O primeiro é a entrega do comando do processo aos
formuladores da política monetária por tratar-se de uma faceta da política
macroeconômica que é mais dinâmica do que a política fiscal, onde também o
governo atua com o propósito de controlar os índices inflacionários. É que a
política monetária realiza movimentos mais rápidos do que a política fiscal,
induzindo esta última alinhar-se a ela.
O segundo requisito reside no fato de que a política monetária deve ser
operacionalizada com base em critérios técnicos, preferencialmente mediante a
atuação de um banco central independente para, com isto, evitar a adoção de
decisões de cunho político. Esse requisito se justifica na medida em que a classe
política, interessada em receber a preferência pelo voto, quase sempre busca
Ocorre que as decisões do governo relativamente à inflação e ao desemprego oferecer ganhos de curto prazo para a sociedade mesmo que a decisão que venha
buscam minimizar ambas as variáveis. Entretanto, considerando que, quando uma a tomar contribua, no momento seguinte, para um aumento da inflação, criando
aumenta a outra diminui, o processo é orientado para uma escolha (trade-off) o que se chama de inconsistência intertemporal. O terceiro requisito está
mediante a qual busca-se responder à indagação seguinte: quanto de inflação relacionado com as economias abertas, ou seja, as que transacionam com outras
pode-se tolerar para que uma baixa taxa de desemprego seja alcançada? economias, caso mais geral no mundo. Nesses casos, o tratamento dado à
inflação precisa levar em conta a taxa de câmbio, não necessariamente para
estabelecer uma meta para esta taxa, antes para permitir-lhe variar, pois a
experiência, pelo menos de países emergentes como o Brasil, já demonstrou que

124
uma âncora cambial (taxa de câmbio invariável) constitui um engessamento que informando as medidas adotadas para fazer a inflação retornar à meta com a
empurra a economia para crises monetário-cambiais. A variação da taxa de indicação do prazo em que a recuperação ocorrerá.
câmbio, para mais ou para menos, pode ser operada por meio de bandas Fig. 03.19 – Histórico das metas de inflação no Brasil e seu acompanhamento
cambiais ou de câmbio flutuante. Essa flexibilidade é de extrema relevância para
o trabalho do conjunto binário formado pela taxa de juro com a taxa de câmbio
no controle inflacionário.
A própria meta é projetada com uma tolerância para mais ou para menos, uma
flexibilidade necessária ao controle ao longo do ano, pois que permite que se vá
controlando a estabilidade do produto ao mesmo tempo em que se acomodam
os movimentos que a taxa nominal de câmbio precisa realizar. Essa faixa de
tolerância para a meta de inflação pode ser simétrica ou assimétrica em relação à
meta. O fato de a faixa apresentar simetria em relação à meta é indicativo de que
se está tratando preventivamente tanto a inflação quanto a deflação. Bandas
assimétricas com a folga para cima, de outro lado, são indicativas de
probabilidade de a inflação poder ficar fora de controle.
No Brasil, a operacionalização do regime de metas inflacionárias começa com a
proposta do Ministro da Fazenda ao Conselho Monetário Nacional – CMN, que
estabelece as metas para os três anos imediatamente seguintes e suas faixas de
tolerância. O acompanhamento do desempenho da economia em relação à meta
é feito pelo Comitê de Política Monetária – COPOM, que administra a taxa de juro
de curto prazo, a SELIC. Presentemente, a meta da inflação brasileira é de 4,5%
aa, válida até 2015 como demonstrado na tabela da Figura 03.19, extraída do A revisão da taxa SELIC é feita mensalmente em reunião do COPOM para esta
website do Banco Central. específica finalidade.
No entanto, se for percebida a necessidade de proceder-se a alguma alteração na
Quando do final do exercício financeiro coincidente com o calendário gregoriano,
taxa entre uma reunião e a imediatamente seguinte, esta medida é adotada por
apura-se o resultado quanto ao cumprimento da meta. O referencial é o Índice de
seu presidente devidamente autorizado pelo Comitê.
Preços ao Consumidor Amplo – IPCA, editado pelo Instituto Brasileiro de 10. Desemprego e emprego
Geografia e Estatística – IBGE. Em caso de descumprimento como já ocorreu por
quatro vezes (2001, 2002, 2003 e 2004), o presidente do Banco Central envia O desemprego é um dos temas mais relevantes dos estudos de macroeconomia
carta aberta ao Ministro da Fazenda explicando as razões do insucesso e porquanto afeta diretamente uma das variáveis socioeconômicas mais sensíveis

125
que é a que quantifica a ocupação e desocupação do ser humano. O impacto desempregada é d.Ep. Como o desemprego não cresce nem decresce, o mesmo
principal do desemprego se dá justamente sobre o agente econômico que ocorrendo com o emprego, então a quantidade de pessoas encontrando emprego
cumpre o duplo papel de consumidor e de detentor do fator de produção mais resulta ser igual à quantidade de pessoas perdendo o emprego, isto é:
nobre que é o trabalho, tomando decisões em ambas as circunstâncias, o que,
e.Dp=d.Ep,
por si só, põe em relevo a importância deste estudo.
E considerando que Ep=FT-Dp, a expressão acima pode ser re-escrita da forma
Além do aspecto acima considerado, as crises de desemprego, ou mesmo as
seguinte:
crises econômicas em que este é apenas uma de suas facetas, trazem grandes
preocupações coletivas, podendo causar pânico na sociedade. O objetivo do e.Dp=d(FT-Dp),
estudo do desemprego é, pois, identificar e analisar suas causas para contribuir
Dividindo-se ambos os membros da equação imediatamente anterior por FT,
com a formulação de políticas públicas que promovam a redução desse
tem-se:
fenômeno indesejável. Complementarmente, o estudo sobre a busca de emprego
é útil para indicar linhas de políticas públicas voltadas para o combate ao e.Dp/FT=[d(FT-Dp)]/FT,
desemprego. donde:
Como ponto de partida, define-se Taxa de Desemprego TD como sendo a razão eDp/FT=(dFT/FT)-(dDp/FT),
Dp/FT, onde Dp é a quantidade de pessoas desempregadas e, FT, como a Força de
Trabalho, igual a FT=Dp+Ep, isto é, à soma dos desempregados com os donde:
empregados. Considere-se, adicionalmente, a existência, em um mesmo período, (eDp/FT)+(dDp/FT)=d,
de um fluxo permanente de pessoas que se encontram em uma das duas fases de
donde:
um ciclo fechado que são: (i) pessoas que estão obtendo emprego; e (ii) pessoas
que estão sendo desempregadas. Adicionalmente, adote-se o mês como período (e+d)(Dp/FT)=d,
referencial para essa análise e considere-se que o ritmo de obtenção do emprego
donde finalmente:
seja e, e que o ritmo de perda de emprego seja indicado por d. Mais ainda: que
tanto e quanto d sejam taxas fixas, uma simplificação que contribui para melhor (Dp/FT)=d/(e+d)
entendimento sobre como estas taxas determinam, em conjunto, o desemprego. A expressão acima é indicativa de que as políticas públicas voltadas para a
Acrescente-se, ainda, como hipótese simplificadora, a suposição de que o redução do desemprego devem atuar sobre as causas que promovem a obtenção
desemprego se encontre em estado estacionário, ou seja, nem aumente nem do emprego, fazendo aumentar e, e sobre as causas que geram o desemprego,
diminua no período de aferição já indicado como mensal.
fazendo diminuir d. Entre as medidas de curto prazo, relacionam-se aquelas
Com base nos pressupostos ora formulados, a quantidade de pessoas que está localizadas em setores intensivos no uso de mão de obra que podem, por
encontrando emprego é igual a e.Dp, e a quantidade de pessoas que está sendo exemplo, se beneficiar de uma redução provisória dos tributos que recolhem

126
(desoneração). Capacitação e treinamento para desempregados também dessa natureza. O estudo de políticas públicas que incluam tais medidas,
contribuem para uma ágil busca de nova oportunidade de trabalho. Por igual, adicionado da análise das conseqüências no campo econômico da política de
incentivos à abertura de negócio próprio pode atenuar o problema do salário mínimo e da negociação sindical entre outros temas correlatos, é objeto
desemprego com o aparecimento de novos pequenos empreendedores. E como de uma área especializada dos estudos econômicos, a da economia do trabalho.
solução comum a todos os desempregados, o seguro-desemprego e outras
11. Câmbio
formas de transferência dão o fôlego de que precisam enquanto se encontram na
transição entre o emprego anterior e o seguinte. Em termos de longo prazo, as As relações entre economias abertas são uma forma de ampliar as possibilidades
medidas de combate ao desemprego podem incluir o estímulo ao investimento, de atuação dos agentes econômicos de um país, produtores, consumidores e
fator gerador de novos postos de trabalho, e a substituição de importações, as governo, permitindo-lhes efetuar transações em um contexto mais amplo de
quais geram novos mercados com a oferta de vagas. opções. Um brasileiro pode, por exemplo, adquirir um automóvel que tenha sido
fabricado em seu país, mas pode também comprar um veículo que tenha sido
É interessante notar que, para o desempregado, a busca do novo emprego não
fabricado, por exemplo, no México. Esse mesmo brasileiro pode, também,
constitui uma jornada tão curta quanto se pretende. Há um intervalo de tempo
preparar um churrasco com carne da pecuária nacional tanto quanto pode
necessário à compatibilização do trabalhador com o emprego, pois os
prepará-lo com carne importada da Argentina ou do Uruguai. Pode ainda escolher
trabalhadores são diferentes entre si em termos de habilidades e vocações, ao
o Pantanal Matogrossense para gastar seu dinheiro com o lazer tanto quanto
mesmo tempo em que os empregos também são diferentes entre si em termos
pode viajar para os Andes chilenos ou visitar Machu Pichu, no Peru, onde
de atributos e exigências.
despenderá a parte de sua renda destinada ao lazer. A importância em estudar-se
De outro lado, as economias das regiões em geral não costumam apresentar um o câmbio reside justamente no fato de essas transações que refletem o
cenário estático. Como exemplo, várias regiões do Brasil experimentaram, entre movimento de bens e serviços entre um país e outro e, correspondentemente, de
os segundo e terceiro quartis do século XX, transformações econômicas mediante fluxo monetário no sentido inverso, terem, como traço de união, a taxa de
as quais o padrão de economia agrária foi em grande medida substituído por câmbio, que é a razão do estudo desta variável macroeconômica. O ponto de
novos cenários baseados na indústria, apresentando ao trabalhador outros tipos partida para o estudo do câmbio é a observação de que a moeda estrangeira é
de exigências em termos de conhecimento e habilidades. Em outras situações, uma mercadoria que os agentes econômicos nacionais podem precisar comprar
pessoas desempregadas por desempenho insatisfatório, mesmo que busquem ou vender.
emprego no mesmo ramo que vinham atuando, precisam reciclar-se. O que é
Embora a taxa de câmbio seja o preço das moedas entre elas, é comum referir-se
importante destacar é que, por uma série de razões, existe sempre um
ao câmbio em relação ao dólar, dado o predomínio dessa moeda nas relações
contingente de trabalhadores desempregados em busca de trabalho que constitui
internacionais.
o que se denomina desemprego friccional. Há uma série de medidas de combate
ao desemprego friccional, algumas vantajosas, outras trazendo vantagens e O câmbio exerce um papel saliente na macroeconomia do país uma vez que influi
desvantagens. O treinamento, o seguro desemprego, são entre outras, medidas na balança comercial e, também, na inflação. O Brasil é um país exportador, o que

127
significa dizer que o saldo do comércio exterior é positivo, ou seja, costuma reflete os preços relativos das moedas, enquanto que a taxa real de câmbio real
apresentar saldo da balança comercial positivo. Quando o dólar se desvaloriza em TRC resulta da relatividade dos preços dos bens e serviços nos distintos países.
relação ao real, os possuidores desta última moeda veem ampliada sua Em outras palavras, a TRC corresponde à taxa de troca dos bens e serviços de um
capacidade de adquirir bens de outros países (importar), e os produtores país por bens e serviços correspondentes de outro país. Tome-se, como exemplo,
nacionais que habitualmente exportam bens e/ou serviços perdem parte de sua a aquisição de um mesmo tipo de automóvel que seja ofertado no Brasil e no
capacidade de vender para agentes econômicos de outros países porquanto a México. Considerem-se os seguintes preços: no Brasil, determinado tipo de
moeda brasileira terá ficado mais forte e, em conseqüência, os produtos em Real automóvel é vendido por R$20.000,00 enquanto que, no México, seja vendido
se tornam mais caros para compradores de outros países (importadores de outros por 160.000,00 pesos mexicanos. Adicionalmente, considere-se que a taxa
países) já que estes pagam em dólar que terá se enfraquecido. Portanto, quando nominal de câmbio seja igual a 10,00 pesos mexicanos por cada Real. Sob essas
o preço do dólar cai, o que corresponde a uma valorização do real, o produtor condições, alguém que disponha de R$20.000,00 e esteja viajando para o México,
nacional de soja, por exemplo, é prejudicado pois grande parte de sua produção é poderá transformar esta quantia em 200.000,00 pesos mexicanos e adquirir o
destinada à exportação e a demanda externa por seu produto se contrai. Sucede automóvel ofertado no México, restando-lhe 40.000,00 pesos mexicanos, isto é, o
o mesmo com o fabricante de calçados e com os mineradores que exportam seus equivalente a R$4.000,00. Conforme se percebe, enquanto a taxa nominal de
produtos, sapatos e minérios respectivamente. E esse prejuízo se transmite à câmbio TNC é de R$1,00=10,00PM, a taxa real de câmbio TRC é igual a
balança comercial que vê seu saldo reduzir-se. Eventualmente, com a R$1,00=1,25PM, resultante de:
permanência de um câmbio favorável ao Real, alguns produtores nacionais de
TRC=(TNC.Pn)/Pe,
calçados decidirão fechar suas fábricas e os comerciantes (também nacionais) de
calçados poderão substituir a fonte de fornecimento passando a importar sapatos Onde:
da Coreia do Sul, por exemplo, para vendê-los no mercado interno. Esse TRC é a taxa real de câmbio;
fenômeno, além de empurrar para baixo o saldo da balança comercial, contribuirá
também para a redução do emprego no Brasil e para o aumento do emprego na TNC é a taxa nominal de câmbio;
Coréia do Sul. Pn é o preço do bem nacional; e
O que interfere na taxa de câmbio é a relação entre as economias internas dos Pe é o preço do bem estrangeiro.
países cujas moedas são comparadas. Nessa relação, entram em jogo a taxa de
A expressão acima comprova o significado da TRC que é, enunciado de outro
juro, a inflação e o nível de desenvolvimento de cada um.
modo, a relação entre os preços dos bens nacionais e estrangeiros em termos de
10.01. Taxa nominal e taxa real de câmbio taxa de troca entre as economias envolvidas.
Conforme já mencionado, a taxa de câmbio representa o preço de um bem ou Como já referido, as taxas de câmbio estão estreitamente vinculadas às
serviço na moeda de um país convertido para a moeda de outro país. Ela se economias dos países envolvidos. De modo particular, o saldo da balança
apresenta nas versões nominal e real. A taxa nominal de câmbio nominal TNC comercial entre dois países e a necessidade de um dos países de usar poupança

128
do outro, isto é, usar poupança externa (M-X), são variáveis que comandam o Estados Unidos. O produto brasileiro custa, no Brasil, R$2.400,00; e o mesmo
câmbio. Quando o país A precisa exportar mais para o país B, seu governo produto fabricado nos Estados Unidos, custa nos Estados Unidos e na moeda
desvaloriza a moeda em relação à de B para que, a moeda de B, uma vez ficando brasileira, R$1.200,00. Qual a taxa de câmbio real?
relativamente mais forte em relação à de A, os agentes econômicos de B passem Solução
a comprar mais dos agentes econômicos de A. A necessidade de A exportar mais A taxa de câmbio real é a taxa mediante a qual são trocados os bens de um país
para B em determinado momento pode advir de uma balança comercial que, em pelos bens de outro país.
tal momento, seja negativa para A em relação a B. Na prática, todos os países, à Chamem-se:
exceção dos Estados Unidos, tratam o tema do câmbio fazendo o confronto de TCN, a taxa de câmbio nominal;
TCR, a taxa de câmbio real;
suas respectivas moedas com o dólar americano que é a moeda internacional de
PBN, o preço do bem nacional; e
maior conversibilidade (aceitação). Nesse caso, a necessidade de exportar que PBE, o preço do bem estrangeiro.
pode ter um país, A ou B, corresponde à necessidade desse país de acumular A taxa de câmbio real será dada por:
dólares, o que pode ser-lhe útil para diversas finalidades, uma das quais fazer TCR=TCNxPBN/PBE,
pagamentos no exterior caso seja, por exemplo, devedor líquido (deve mais do Donde:
que tem a receber). TCR=(1/1,50 dólar/real)x(R$2.400,00/bem brasileiro)/(R$1.200,00/bem
americano)
Portanto, a redução da taxa de câmbio de um país faz com que uma mesma Donde:
quantidade de dólares possibilite, depois da redução, comprar uma quantidade TCR=R$1,33/US$1,00
maior de bens e/ou serviços do país que teve a moeda desvalorizada em relação Esta soluçã considerou a taxa de câmbio nominal como sendo a relação (R$/U$$).
ao que se comprava antes da referida redução (desvalorização ou depreciação da Normalmente representaria o cálculo feito no Brasil. Se fosse feito nos EUA, a
razão da TCN seria o inverso (quanto vale cada dólar em termos de real). Nesse
moeda do país). Então, como à exceção dos Estados Unidos o dólar vem de fora,
caso, o cálculo seria feito do modo seguinte:
ao desvalorizar sua moeda, um país estimula as exportações. Contrariamente, a TCR=(1,50/1real/dólar)x(US$600,00/bem americano)/(US$1.200,00/bem
elevação da taxa de câmbio de um país faz com que uma mesma quantidade de brasileiro)
dólares já não se possa, depois da elevação, comprar a mesma quantidade de Donde:
bens e/ou serviços em relação ao que se comprava antes da referida elevação TCR=US$0,75/R$1,00.
(valorização ou apreciação da moeda do país) mantidos os preços de bens e/ou Com efeito, 1,33 é o inverso de 0,75. Note que o americano trabalhou com os
serviços em seus níveis originais. Então, ao valorizar sua moeda, um país estimula preços do bem na moeda dele. Em qualquer caso, a forma de expressar a taxa de
câmbio pode ser uma ou outra. Não há uma regra definida para isso.
as importações.
10.02. Regimes cambiais
Exemplo de Aplicação 03.15
Suponha que a taxa de câmbio nominal entre o dólar americano e o real seja de A taxa de câmbio pode ser fixada por decisão da autoridade econômica do país
R$1,50 por US$1.00. Determinado bem é fabricado tanto no Brasil quanto nos ou com base no mercado, caso em que a flutuação da taxa é comandada pela

129
oferta e demanda por moeda estrangeira. No último caso, as taxas de câmbio são A vantagem da taxa de câmbio fixa reside no fato de não haver espaço para
ditas flutuantes ou flexíveis. Deste ponto em diante, o texto considerará que a instabilidade cambial facilitando a previsibilidade para os agentes econômicos
moeda estrangeira objeto da discussão sobre o tema do câmbio seja o dólar que dependem da divisa48. A taxa de câmbio fixa, quando em nível mais elevado
americano ou, simplesmente, dólar47. do que seria o nível de equilíbrio, tem a vantagem de contribuir para o controle
da inflação pois estimulará a importação de bens e/ou serviços de fora que
A demanda por dólar em um país qualquer que não os Estados Unidos depende
competirão com os nacionais, forçando estes últimos a não subirem.
da necessidade que o conjunto dos agentes econômicos (produtores e/ou
consumidores) tenha para importar ou para realizarem outras operações que A taxa de câmbio fixa traz consigo, entretanto, a desvantagem de, quando fixada
impliquem utilizar a referida moeda estrangeira. em patamares muito elevados e por muito tempo, ao promoverem a competição
dos preços dos importados com os preços domésticos, passar a operar em
A oferta de dólar depende da quantidade de bens e/ou serviços exportados bem
desfavor da base produtiva nacional contribuindo para dificuldades dos
como da realização de outros tipos de operação dos quais resultem a entrada de
produtores nacionais podendo chegar até mesmo ao fechamento de algumas
dólar no país. No caso de câmbio flutuante, repete-se, é do confronto das funções
firmas. Portanto, do mesmo modo como enunciou-se que taxas de câmbio
de demanda e de oferta da moeda estrangeira que resulta o estabelecimento da
superiores à de equilíbrio constituem uma vantagem, quando essa elevação for
taxa de câmbio. Conforme se comenta adiante, nesta seção, o Banco Central
exagerada e perdurar muito tempo, pode tornar-se uma desvantagem para a
desempenha importante papel na definição de demanda e oferta de dólar. Os
economia do país.
regimes de câmbio se apresentam de três modos: o da taxa de câmbio fixa, o da
taxa de câmbio flutuante e o regime de bandas cambiais. Comenta-se, à O câmbio fixo também pode criar dificuldade quando a moeda nacional estiver
continuação, mais detidamente cada um desses regimes. muito valorizada caso a demanda no país por moeda estrangeira aumente
significativamente. O aumento da demanda forçará a subida da taxa e o Banco
(i) Taxa de câmbio fixa
Central precisará dispor de reservas suficientes para vender ao câmbio que fixou.
No regime de taxa de câmbio fixa, o Banco Central estabelece o nível da taxa
Ainda no rol das desvantagens da taxa de câmbio fixa, este regime é capaz de
mediante a qual o mercado de moeda estrangeira deve operar. Uma vez fixado
fazer com que a política monetária deixe de ser um instrumento de política
esse nível, o Banco Central se obriga a colocar em disponibilidade as reservas de
econômica, principalmente quanto à administração do estoque de moeda
dólar para atender às demandas. Tais demandas são exercidas pelos agentes
estrangeira, o qual fica dependente da taxa de câmbio fixa. Uma outra
econômicos que precisam importar bens e/ou serviços (principalmente as firmas)
desvantagem reside no fato de que o Banco Central pode eventualmente não
bem como os consumidores que precisam do dólar ou de outras moedas
escolher a taxa mais adequada, ocasionando movimentos especulativos que
conversíveis para viagens, profissionais ou a turismo, ou ainda para a importação
colocarão em dúvida a adequabilidade do regime de câmbio.
de bens. O Banco Central obriga-se a vender e a comprar pela taxa fixada.
(ii) Taxa de câmbio flutuante
47
Alguns países têm moeda denominada dólar: dólar canadense e dólar australiano são exemplos de moedas
48
desses países. Sinônimo de moeda estrangeira, conversível ou não.

130
No regime de taxa de câmbio flutuante, esta é determinada, conforme já referido, desestruturação da economia do país, razão porque adotou-se no Brasil o câmbio
pelo mercado em função da demanda e oferta por moeda estrangeira. A oferta é flutuante sujo.
suprida pelos exportadores e todos os que trazem moeda estrangeira para o país.
(iii) Bandas cambiais
E a demanda é exercida pelos importadores que precisam do dólar para comprar
bens e/ou serviços de outros países. O regime de bandas cambiais consiste no estabelecimento de uma faixa de
Entre as vantagens do câmbio flutuante, está a não interferência do Banco Central variação para a taxa de câmbio. O Banco Central somente intervém quando a taxa
em sua condição de autoridade monetária. Mas o Banco Central pode atuar, sob se aproxima de uma das extremidades dessa faixa. Quando da edição do Plano
este regime, como agente econômico, seja comprando dólares que estão no país Real (julho de 1994), o Brasil adotou o regime de bandas cambiais, uma faixa de
quando pretende desvalorizar o câmbio seja vendendo dólares a agentes no país variação admissível que limitava o dólar entre R$0,86/US$1,00 e R$1,00/US$1,00.
quando pretende valorizar o câmbio. Nesse caso, tem-se o câmbio flutuante dito Por esse regime, quando o dólar saísse do balizamento dado, o Banco Central
sujo (dirty float), assim denominado por ser contaminado pela ação intervinha. Esse regime foi substituído pelo câmbio flutuante sujo, acima referido.
governamental por meio do Banco Central que, neste caso, atua como agente Tal mudança ocorreu no mesmo momento em que o Brasil adotou o critério de
econômico e não como autoridade monetária. metas de inflação, abordado49 neste texto.
Uma segunda vantagem do regime de câmbio flutuante está na administração,
10.03. Atuação dos governos no mercado externo
pelo Banco Central, dos instrumentos de política monetária para alcançar outros
objetivos. Desses instrumentos, a taxa de juro é o mais notável uma vez que pode Conforme mencionado, a taxa de câmbio constitui o instrumento central na
ser utilizada para estimular ou desestimular a atividade econômica e o emprego. execução da política de comércio exterior. Além da vigilância sobre a taxa de
Como desvantagem, há a possibilidade de a taxa de câmbio tornar-se volátil em câmbio (política cambial), os governos costumam adotar práticas de uma política
função dos movimentos dos mercados financeiros nacional e internacional. Essa comercial que inclui a introdução de tarifas aduaneiras de importação, a fixação
volatilidade pode ser provocada, também, pela especulação com a moeda. de quotas de importação e os subsídios à exportação, entre outras medidas.
No câmbio flutuante, pode ocorrer uma grande valorização ou uma grande
desvalorização da moeda nacional. O Banco Central, mantendo-se vigilante, No caso das tarifas aduaneiras de importação, estas podem ser cobradas por
atuará vendendo ou comprando dólares, respectivamente, com o objetivo de meio de um preço por unidade do bem ou serviço importado, ou como uma
fazer a taxa de câmbio situar-se em um nível de equilíbrio. Em outras palavras, a percentagem sobre este, isto é, uma tarifa ad valorem. Há, ainda, as restrições
moeda nacional desvalorizada por interferência do Banco Central comprando não tarifárias que podem se basear em critérios técnicos ou sanitários. É
dólares no mercado nacional, fenômeno que no economês cambial é referido importante assinalar a atuação da Organização Mundial do Comércio – OMC, que
como flutuação suja (dirty floating) pressiona a inflação. Inversamente, quando o substitutiu, em 1994, o antigo Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), que
Banco Central precisa fazer com que a inflação arrefeça, ele injeta (vende) dólares atuava desde o final da Segunda Grande Guerra.
no mercado para que este se desvalorize e as exportações se reduzam ao mesmo 11. Tópicos especiais
tempo em que as importações aumentem, colocando freio na inflação. Por fim, o 49
Mesmo o câmbio flutuante sujo leva em conta bandas cambiais que não são divulgadas. O Banco Central as utiliza
câmbio flutuante puro, versão oposta ao dirty float, pode contribuir para a sem necessariamente publicá-las.

131
Apresentam-se, à continuação, alguns tópicos de interesse dos estudos de em termos de proporções deste. Como o PIB é a riqueza anual produzida por um
macroeconomia objetivando familiarizar o estudante com temas relativos ao país, o fato de a dívida pública refletir uma elevada percentagem deste é
arcabouço institucional e instrumental onde se operam os conceitos indicativo de a administração da dívida tem pouca sustentabilidade, o que é uma
desenvolvidos neste capítulo. perspectiva desfavorável para o equilíbrio macroeconômico. Contrario sensu,
quando a relação Dívida Pública/PIB é baixa, a dívida é considerada sustentável.
11.01. Dívida Pública
Não há um limiar fixo para a análise desse percentual. O limite da
A dívida pública é o montante de todos os recursos tomados pelo governo por sustentabilidade da dívida pública muito depende do tamanho da economia do
meio da emissão e venda de títulos de sua responsabilidade com o objetivo de país do contexto vivido por esta economia, como também pode se modificar em
sustentar o apparatus oficial sempre que a arrecadação não é suficiente para decorrência de fatos novos que afetem positiva ou negativamente a economia.
fazê-lo. O primeiro real de uma dívida nasce de um desequilíbrio entre o gasto e a
O segundo fator de sustentabilidade da dívida pública está em sua composição,
arrecadação, gerando um déficit primário e criando um fluxo deficitário real que é
isto é, do portfólio dos diferentes títulos que estão em poder dos credores.
alimentado por novos desequilíbrios e/ou por um fluxo financeiro que faz
Particularmente, é relevante saber se tais títulos são pré-fixados ou se dependem
aumentar o estoque da dívida.
de algum indexador de preços, se depende do câmbio (caso da dívida externa) ou
Quando o governo não consegue pagar parcelas da dívida que vão vencer, ou de alguma taxa oficial de juros que o governo adote 50. O terceiro fator é o
seja, quando não consegue resgatar nos vencimentos os títulos que estão em eventual descompasso entre os índices que corrigem as receitas do governo e os
poder dos credores, o governo negocia com o mercado e vende novos títulos. correspondentes índices que corrigem os títulos que o governo tem de resgatar.
Essa negociação envolve a rentabilidade esperada dos títulos, o indexador Quando os resultados dessas correções se afastam muito em desfavor da
adotado e os prazos de vencimento. O que sucede, nesse momento, é que as arrecadação, o governo enfrenta dificuldades para reduzir a dívida e, na maior
autoridades monetárias estão sempre inclinadas a minimizar o custo da parte dos casos, passa a negociar mais, o que contribui para que o governo passe
administração da dívida, tentando colocar títulos de baixa rentabilidade, com a dever mais. A esse descompasso também se dá o nome de descasamento.
prazos longos e adotando um indicador que assegure a previsibilidade.
Por fim, há o fator credibilidade. Se, em determinado período, o governo não
De outro lado, o mercado pretende maximizar seus lucros e os adquirentes de gozar de bom conceito com o mercado enquanto pagador de seus compromissos,
títulos do governo dão preferência a comprar aqueles papeis cujos prazos de as autoridades monetárias são induzidas, por pressão dos próprios mercados a
vencimento sejam curtos, tenham rentabilidade elevada e um indexador oferecerem títulos com prazos mais curtos e rentabilidade mais alta.
vantajoso, ou seja, um indexador com histórico corrente de significativas
Quanto às estratégias para a administração da dívida pública, estas variam desde
variações para mais
uma extremidade onde se adotam medidas economicamente ortodoxas, até a
A sustentabilidade da dívida pública resulta de quatro fatores principais. O outra extremidade, de heterodoxia agressiva, passando por estágios
primeiro desses fatores é o tamanho da dívida. O método corrente de avaliação
do tamanho da dívida pública é o da comparação com o Produto Interno Bruto, 50
No caso do Brasil, a SELIC, já referida neste texto.

132
intermediários. Brevemente, comentam-se essas estratégias de administração da controle sobre a dívida pública é rigoroso para não transmitir ao mandato
dívida pública. A estratégia ortodoxa consiste em promover-se um superávit seguinte uma condição desfavorável. De outro lado, observa-se, também, que,
primário elevado, manter-se o câmbio livre e estabelecer e perseguir metas de governos fracos são mais relaxados em termos fiscais, sem um maior controle
inflação. Nesse caso, as autoridades monetárias supõem que o juro afeta a sobre o orçamento público, com riscos para o crescimento da dívida.
inflação e elegem a disciplina fiscal baseada na inequação Receitas não-
11.02. Algumas notas sobre o crescimento econômico
Financeiras>Despesas não-Financeiras para contribuir com o cumprimento das
metas de inflação e maneja a taxa de juro para complementar este controle. O crescimento econômico é medido habitualmente pelo Produto Interno Bruto –
PIB do país ou região a que se refere. Pode-se medir, também, o PIB de um estado
A segunda estratégia, considerada de heterodoxia atenuada, consiste em
federado ou mesmo de um município ou de um grupo de estados ou municípios
promover-se um superávit primário elevado, combinado com juros baixos e
que integrem uma região de interesse para a avaliação que se pretenda fazer.
câmbio desvalorizado. Nessa estratégia, supõe-se que o superávit primário tem
Além do PIB, a medida da variação do PIB per capita também se torna necessária
uma importância maior no controle da inflação do que a taxa de juro. As
e, mesmo assim, ambas as medidas são insuficientes porque ignoram o
conseqüências das medidas dessa estratégia são o aumento das exportações, o
crescimento do bem-estar da economia em toda a sua extensão.
aquecimento dos investimentos e o fato de não ensejar o crescimento do estoque
da dívida. As duas últimas conseqüências são motivadas pela baixa taxa de juro. Em se tratando de um país, a medida do crescimento econômico poderia ser
tomada, também, em relação ao Produto Nacional Bruto – PNB e, neste caso,
A terceira estratégia, considerada de heterodoxia forte, é baseada em um
estar-se-ia incluindo no cálculo o saldo líquido das receitas enviadas ou provindas
superávit primário menor, juros baixos e câmbio desvalorizado. Por essa
de outros países. Essa prática é, entretanto, pouco comum.
estratégia, considera-se que o juro afeta pouco a inflação. Ela opera em favor de
uma redução gradual da relação dívida pública/PIB sem o sacrifício do aperto A presente seção se ocupa em estudar, ainda que de modo sumário, as causas do
fiscal. crescimento econômico dos países, fazendo uso, para tanto, do Modelo de Solow,
nome dado em homenagem ao economista Robert Solow, detentor do Prêmio
Por fim, a quarta estratégia, considerada heterodoxa agressiva, baseia-se em uma
Nobel de Economia de 1987 e que desenvolveu o referido modelo.
atitude radical para re-estruturar ou renegociar a dívida ública ou, ainda, aplicar
moratória, seja porque o tesouro não possa efetivamente pagar seja por razões (i) Relevância do estudo
de cunho ideológico dos governantes. A importância de estudarem-se as causas do crescimento econômico decorre,
Conforme se percebe a partir do comentário imediatamente anterior, o contexto preliminarmente, da própria importância do crescimento, um imperativo de todo
político pode afetar o tratamento da dívida pública. Observa-se que, em países e qualquer país ou região. E trata-se de um imperativo porque as sociedades
onde a reeleição é permitida, o governante que vai tentar um mandato estão em busca permanente de níveis cada vez mais elevados de bem estar, de
subseqüente ou mesmo quando não se trata de reeleição e o governante tenta combate à pobreza, o que coloca o crescimento econômico com ponto de
manutenção de seu grupo político no poder (tenta “fazer” seu sucessor), o

133
passagem obrigatória para o aumento da renda individual dos integrantes da importante peça motora do crescimento, pois que afasta o capital de seu estado
sociedade, implicando a necessidade de fazer-se crescer o produto global. estacionário.

É claro que o bem estar social na acepção da expressão somente é alcançado com Para a compreensão do modelo é necessário que se analisem os aspectos que
o problema distributivo também solucionado. E, solucionado de uma maneira tal possam explicar como a acumulação do capital é afetada pelo comportamento da
que as disparidades entre as classes sociais sejam dissipadas ou, pelo menos, oferta e da demanda de mercadorias; a relação entre a poupança e o
acentuadamente mitigadas. crescimento, questão já tangenciada no último parágrafo; os efeitos das
flutuações demográficas sobre o crescimento econômico; e o papel do progresso
Mas essa condição também obriga a que se cresça economicamente para que a
tecnológico sobre o crescimento econômico.
repartição da riqueza seja procedida de modo tal que as rendas média, mínima e
modal se situem em um patamar minimamente aceitável. 11.3. Medida do custo de vida

Em segundo lugar, mas não menos importante, o estudo do crescimento significa As variações do custo de vida são medidas por meio de indicadores que são
um passo à frente em relação ao modelo de equilíbrio geral brevemente referido produzzidos por instituições de pesquisa econômica. Esses indicadores costumam
neste capítulo, o qual reflete a análise de uma situação estática que permita, ser publicados pela internet e nos jornais e revistas com o objetivo de manter os
evidentemente, fazer a abstração em relação à vida real para fins exclusivamente cidadãos informados sobre o comportamento de diversos setores da economia.
didáticos.
Uma breve visita a tais números-índice aqui é feita com o objetivo de familiarizar
o estudante com os elementos que são utilizados na vida real, principalmente em
contratos, reforçando uma série de aspectos teóricos estudados.
(ii) Modelo de crescimento de Solow
Os índices de preços são indicadores que mostram a evolução do comportamento
O Modelo de Crescimento de Solow, além de explicar como os fatores poupança,
dos preços dos bens e serviços bem como os dos produtos primários, agrícolas,
demografia e progresso tecnológico afetam o produto, também se ocupa em
industriais e da mineração e mesmo de sub-setores específicos. Quando a cesta
estudar o modo como a política econômica influi no nível e no aumento do
de bens e serviços é fixa entre os dois anos de cálculo (ano-base e ano para o qual
padrão de vida de uma sociedade.
se determina o índice), o indicador é do tipo de Laspeyres e, quando a cesta varia,
Na construção do modelo, utiliza-se o conceito do estado estacionário do capital, o indicador é do tipo de Paasche. Comentam-se, brevemente, alguns desses
que resulta da existência de um dado nível de estoque deste para o qual o indicadores:
investimento e a depreciação se equilibram. Isso significa afirmar que a variação
(i) IGP-DI
para mais do estoque de capital depende de o investimento no período de análise
ser superior à depreciação corrente no mesmo período. E, considerando que o Os Índices Gerais de Preços IGP-DI são produzidos pela Fundação Getúlio Vargas
investimento corresponde à poupança, então a poupança resulta ser uma desde 1944 com o objetivo de medir o comportamento dos preços em geral dos
produtos de disponibilidade interna, o que explica o sufixo DI, aposto à

134
abreviatura IGP. Por disponibilidade interna, indica-se o conjunto de todas as Até 1969, as duas versões do IPA eram denominadas IPA-Total e IPA-Exclusive o
cestas de bens e serviços que, produzidas e ofertadas internamente ao país, Café. A maior parte do café brasileiro era destinada à exportação, pouco ficando
afetam as atividades econômicas dentro do Brasil. Exluem-se, portanto, os bens e disponível para o mercado interno, o que justificava o cálculo de um índice em
serviços exportados. O IGP-DI é um índice mensal cujos resultados aferem o separado excluindo o café.
comportamento dos preços entre o primeiro e o último dias de cada mês. É
A partir de 1969, a terminologia foi alterada e o IPA-Total passou a ser referido
formado a partir de três parcelas conforme a expressão seguinte:
como IPA-OG (Oferta Global) e o IPA-Exclusive o Café passou a ser indicado como
IGP-DI=0,60.IPA+0,30.IPC+0,10.INCC, IPA-DI (Disponibilidade Interna). Mas as alterações de maior significado em 1969
estiveram centradas em três pontos principais:
onde:
- ampliação da coleta de dados para 243 produtos e ampliação do território da
IPA é o Índice de Preços por Atacado;
coleta, conferindo uma maior fidelidade da amostra ao conjunto da economia;
IPC é o Índice de Preços ao Consumidor; e
- adequação da ponderação dos bens à nova estrutura produtiva do país em razão
INCC é o Índice Nacional da Construção Civil. das expressivas transformações da economia brasileira em relação à primeira
O IGP-DI apresenta a variante IGP-10 que segue o mesmo processo de cálculo do metade do século pela política de industrialização e de substituição de
IGP-DI com a diferença de que o período se estende do dia 11 de cada mês ao dia importações; e
10 do mês seguinte, sendo o primeiro dos dois meses o chamado mês de - adaptação ao novo cenário econômico com a presença da correção monetária,
referência para o índice; e a variante IGP-M, que é o IGP de mercado, igualmente criada em 196451.
diferenciando-se do IGP-DI apenas pelo período de coleta dos dados, que vai do
O IPA-DI é calculado a partir de dezoito índices especiais e abrange 481
dia 21 do mês de referência ao dia 20 do mês imediatamente seguinte.
mercadorias extraídas do conjunto de produtos regularmente negociados no
(ii) IPA atacado. Sua publicação é mensal e o período de coleta de dados segue o mês
O Índice de Preços por Atacado foi criado em 1944 e é publicado pela Fundação calendário.
Getúlio Vargas, com o objetivo de medir o comportamento dos preços do O Índice de Preço por Atacado IPA-OG é calculado mediante os mesmos critérios
comércio atacadista entre empresas, isto é na fase que precede ao varejo. No do IPA-DI, com a diferença que as séries são relativas aos setores produtivos e
início, coletavam-se dados relativos a 25 produtos, número que se elevou para 90 não aos indicadores de bens e serviços.
em 1955. A ponderação de cada item era feita com base nos dados
(iii) IPC
complementares do Censo e nas informações relativas à importação. Em seu
cálculo, considera-se o valor adicionado por cada setor ou o valor da
51
transformação industrial (VTI) para evitar erros de dupla contagem no O IPA foi o índice adotado para corrigir o valor das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional – ORTN,
criadas com a implantação da correção monetária, um dos fatores de inflação inercial. Mais tarde, foram
comportamento do indicador. transformadas em OTN, medida adotada no contexto do controle do processo inflacionário.

135
O Índice de Preços ao Consumidor começou a ser publicado em 1920, com dados Donde
retroagindo a 1912, e tinha como universo geográfico da coleta apenas o antigo
IPC2008=1,314
Distrito Federal, hoje município do Rio de Janeiro. Além disso, abrangia apenas as
famílias ricas, o que o tornava um indicador irreal do acompanhamento dos É interessante notar que o valor do IPC corresponde ao deflator da cesta
preços. estudada. O conceito de deflator ora evocado é o mesmo adotado no início do
presente texto onde se comentou a variação do produto bruto de uma sociedade.
Até 1939, o IPC era publicado pela Fazenda Nacional. Em 1949, o Ministério do
Trabalho criou o primeiro sistema de acompanhamento do custo de vida para Entretanto, há diferenças a assinalar entre o deflator do PIB e o deflator de uma
todo o país. O intervalo de 1939 a 1949 foi suprido pelo índice relativo ao custo cesta de mercadorias e serviços. Enquanto no primeiro caso o deflator mede a
de alimentação nas capitais estaduais, editado pelo Serviço Estatístico da variação de preços entre todos os bens e serviços produzidos, o IPC mede a
Previdência do Trabalho – SEPT. O IPC passou por sucessivos aperfeiçoamentos. variação de preços de uma limitada quantidade de bens que compõe uma cesta.
Em 1993, foi instituído o IPC-10, por demanda do mercado financeiro. A segunda diferença reside no fato de que o IPC relaciona o efeito das variações
O Índice de Preços ao Consumidor – IPC costuma ser o indicador ao qual mais se de preços para os mesmos bens em iguais quantidades entre o ano para o qual é
recorre para avaliar-se o custo de vida de uma sociedade. Sua determinação é calculado e o ano-base. Em outras palavras, os pesos que afetam os preços são os
feita estatisticamente observando-se o comportamento dos preços de bens, mesmos em ambos os anos, o de cálculo do IPC e o ano-base.
mercadorias e serviços que constam de uma cesta básica definida segundo No caso do deflator do PIB, há uma variação natural nas quantidades dos itens
critérios também estatísticos para refletir o custo de vida que é enfrentado pelo produzidos no país ou sociedade para o qual ele é calculado e o ano-base, pois a
consumidor típico entre os que percebem salário mínimo. composição do PIB pode sofrer alteração entre um ano e outro.
O IPC corresponde à razão entre o custo da cesta básica a preços do ano que se (iv) Índice Nacional de Custo da Construção Civil – INCC
estiver apurando e esta mesma cesta básica a preços do ano tomado como ano-
base. Suponha-se que a cesta básica seja constituída apenas de feijão e arroz em Este índice começou a ser publicado em fevereiro de 1985, com base em uma
quantidades, respectivamente, de 3kg e 5kg a cada vez que o consumidor faz sua articulação dos dados do Índice de Custo da Construção – Rio de Janeiro (ICC-RJ),
compra. Seja o ano de 2000 o ano-base e 2008 o ano corrente para o qual a série mais antiga do Brasil para esta finalidade, com a série do Índice de
pretende-se determinar o IPC. Admita-se que os preços dos dois bens em 2000 Edificações, que tinha um alcance regional maior em termos do território
fossem 1 u.m. por quilo de feijão e 1,50 u.m. por quilo de arroz e que estes nacional.
mesmos preços no ano de 2008 houvessem sido, respectivamente, 1,60 u.m. por Exemplo de aplicação 03.16
quilo de feijão e 1,80 u.m. por quilo de arroz. O contrato de construção de uma pequena estação de tratamento de efluentes
Com esses dados, o IPC relativo a 2008 para a referida cesta será igual a: urbanos – ETE monta a R$30x106 e prevê o pagamento em quatro parcelas de
25% do valor original cada uma. Essas parcelas são mensais, sendo a primeira no
IPC2008=[(1,60x3,00)+(1,80x5,00)]/[(1,00x3,00)+(1,50x5,00), ato de assinatura do contrato (jan-2010), e as demais em fevereiro, março e abril

136
de 2010. O contrato também prevê que as segunda, terceira e quarta parcelas Consumidor – SNIPC. A coleta de dados é feita em nove regiões metropolitanas,
sejam reajustadas com base no INCC, cuja tabela, publicada pela FGV durante o além do Distrito Federal e do município de Goiânia.
período da obra, é dada a seguir. Calcule o valor nominal de cada parcela e o
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor – INPC coleta informações referentes
montante total recebido pela execução da obra. O mês de janeiro de 2010 é o
a famílias com rendimentos mensais até oito salários-mínimos, enquanto que o
mês-base para o cálculo do reajuste.
Índice de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA é produzido a partir de coleta de
informações de famílias com rendimentos mensais até quarenta salários-
Janeiro Fevereiro Março Abri mínimos. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA é utilizado
2010 2010 2010 2010 pelo Banco Central para o monitoramento das metas de inflação.
423,740 425,268 428,476 432,079
A fórmula de reajuste é: 12. Elementos do arcabouço institucional e componentes do instrumental da
PR=PO x Ii/Io aplicação dos conceitos macroeconômicos
Onde:
PR é a parcela reajustada; A abordagem a problemas macroeconômicos implica necessariamente referir-se a
PO é o valor original da parcela; institucições no seio das quais e a instrumentos por meio dos quais as políticas
Ii é o índice do mês da parcela que se está reajustando; e públicas relativas aos agregados econômicos são propostas, implementadas e
Io é o índice do mês-base para o cálculo do reajuste. acompanhadas.
Solução Sem a preocupação de aprofundar o conhecimento sobre essas instituições e
PR1’=PR1=7,5 x 106 instrumentos, apresentam-se, a seguir, rápidos comentários e exemplos que
permitem travar-se contato com os tópicos essenciais
PR2’=PR2=7,5 x 106 x (425,268/423,740), donde PR2’=7.527.044,89 u.m.;
12.01. Contabilidade nacional
PR3’=PR3=7,5 x 106 x (428,476/423,740), donde PR3’=7.583.824,99 u.m.;
O conjunto ordenado de informações relativas às grandes contas das atividades
PR4’=PR2=7,5 x 106 x (432,079/423,740), donde PR4’=7.647.596,40 u.m.; econômicas internas e externas de um país é chamado Contabilidade Nacional.
O total pago pelo contratante ao contratado foi de: Sua finalidade principal é a de medir o desempenho da economia, ao mesmo
tempo que serve de subsídio ao planejamento e à execução da atividade
PR1+PR2’+PR3’+ PR4’=22.275.846,63 u.m.
econômica.
(v) INPC e IPCA
A Contabilidade Nacional se estrutura em cinco contas básicas: (i) conta de
Estes dois índices são produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e produção; (ii) conta de apropriação; (iii) conta de capital; (iv) conta-corrente de
Estatística – IBGE integrando o Sistema Nacional de Índices de Preços ao governo; e (v) contas externas. A conta de produção reflete a identidade existente
entre o Produto Nacional e as Despesas Nacionais.

137
A conta de apropriação mostra como a renda é distribuída entre consumo e A história dos bancos está intimamente relacionada com a história da própria
poupança. A conta de capital corresponde à identidade entre poupança e moeda, cujos passos mais relevantes são comentados nas sub-seções seguintes.
investimento. A conta-corrente de governo permite acompanhar o
12.03. Breves notas sobre a história da moeda
comportamento das receitas e despesas do setor público. E as contas externas
retratam as relações econômicas do Brasil com o resto do mundo. Vista pelo prisma da Teoria do Consumidor, a moeda também é uma mercadoria,
pois, ao ser recebida, preenche um desejo do ser humano, que a canaliza para
A responsabilidade pela Contabilidade Nacional do Brasil entre 1947 e 1986 era
alguma dentre quatro finalidades53 bem definidas que a moeda tem. A moeda
do Centro de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação
produz, assim, utilidade para o consumidor.
Getúlio Vargas – FGV. A partir de 1986, o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística – IBGE passou a se ocupar dessa relevante atribuição, cujos dados Ocorre que a moeda tem a faculdade de poder atuar como equivalente geral para
podem ser acompanhados no website da instituição52. todas as demais mercadorias54, o que a diferencia dos demais bens, conferindo-
lhe uma importância jamais superada por qualquer outro bem ou serviço em
termos de versatilidade para atuar em não importa qual seja o tipo ou o ramo,
natureza ou gênero das transações econômicas.

12.02. Moeda e bancos A importância da moeda para uma economia é tão significativa que os governos,
em geral, mantêm-na sob controle, nada deixando que circule livremente, sem
A moeda tem uma importância muito grande no contexto dos estudos
um monitoramento por meio do qual se possa utilizá-la como instrumento da
macroeconômicos, pois em se tratando de estudos do comportamento dos
política econômica.
agregados econômicos, um número expressivo de variáveis não poderia ser
aferido, de forma prática, caso inexistisse um referencial único para medir tais A moeda, ao longo de sua milenar história, passou essencialmente por seis fases
variáveis. Esse referencial é o numerário de cada país. principais. Seus primeiros vestígios estão nas relações de trocas que as primitivas
comunidades precisavam fazer entre si com o objetivo da sobrevivência. É que
De outro lado, o trato da mercadoria moeda implica a existência da
essas comunidades, como não produziam necessariamente tudo quanto
intermediação financeira, a qual é exercida, principalmente, pelas instituições
precisavam, tinham que fazer trocas de algumas mercadorias com membros de
bancárias.
outras comunidades. Essa foi a primeira fase da história da moeda, conhecida
Os bancos são, pois, instituições, públicas ou privadas que ofertam serviços como Fase do Escambo, ou era da troca de mercadorias. O escambo era essencial
financeiros aos demais agentes econômicos (não-bancários) para apoiar a porque, nessa fase, algumas comunidades se dedicavam à caça, enquanto que
atividade mercantil fazendo a captação de dinheiro de agentes superavitários e outras consagravam o seu tempo ao plantio de tubérculos ou grãos, fazendo com
emprestando este mesmo dinheiro a agentes que precisam de recursos para
finalidades diversas como investimentos, cobertura de desencaixes, entre outras. 53
Comentadas na seção imediatamente seguinte.
54
Segundo Wassily Leontief, pai da Teoria Econômica do Insumo e Produto, moeda é uma mercadoria que serve de
52
www.ibge.com.br equivalente geral para todas as mercadorias.

138
que elas tivessem que permutar bens para satisfazer suas necessidades. Com o DURANTE A IDADE Austrália Rum, trigo, carne
MODERNA (1453-1789) Canadá Peles, cereais
crescimento das relações de trocas, estas foram se tornando mais trabalhosas Estados Unidos Fumo, cereais, madeira, gado
porque, cada indivíduo deveria encontrar outro que tivesse a mercadoria de que França Metais preciosos, cereais
Japão Arroz
necessitasse, ao mesmo tempo que também estivesse procurando a mercadoria Fonte: Lopes, J. C. et Rossetti, J. P.. Economia Monetária. Atlas. São Paulo. 1992.
de que o primeiro dispusesse. Como esse tipo de coincidência dificilmente ocorria
Tais atributos são a aceitação, o caráter de raridade, a durabilidade, a
na maior parte das situações, surgiu a necessidade de se facilitarem as trocas,
divisibilidade, a homogeneidade e a facilidade de manuseio e transporte. Veja-se
com o que foi se firmando uma nova prática, que veio a caracterizar a segunda
que algumas mercadorias-moeda como o gado, por exemplo, dificilmente
fase, denominada Fase da Mercadoria-Moeda. Diversas mercadorias foram
poderiam prosperar nessa função, principalmente levando-se em conta a grande
utilizadas como moeda ao longo da história. O quadro da Figura 03.20 ilustra
quantidade e a repetição das trocas entre pessoas e homens de negócio. A
algumas dessas mercadorias-moeda, associadas à época e região em que foram
dificuldade de sua movimentação e manuseio, aliada a seu limitado período de
adotadas. Algumas foram sendo substituídas à medida que perdiam os atributos
vida, explica o desuso em que foram caindo.
necessários a ser utilizadas como meio de troca.
Fig. 03.20 – Exemplos de Mercadorias-Moeda De outro lado, os metais foram, aos poucos, se firmando como mercadorias-
moeda de maior aceitação, porquanto preenchiam, como preenchem, a maior
PERÍODO PAÍS OU REGIÃO MERCADORIA-MOEDA parte dos atributos que permitem o enquadramento como meio de troca, e
DESDE A ANTIGÜIDADE ATÉ Assíria, Babilônia Cobre, prata, cevada medida e reserva de valor. A fixação no uso de metais como mercadorias-moeda
O ANO 410 Bretanha Barras de ferro, escravos
privilegiou, no início, o cobre, o bronze e o ferro, principalmente. Esses metais
China Conchas, seda, sais, cereais
Egito Cobre foram, no entanto, sendo deixados de lado, porquanto não serviam como reserva
Índia Animais domésticos, arroz, metais de valor, em razão de sua abundância com a descoberta de novas jazidas e o
Pérsiax Gado
DURANTE A IDADE MÉDIA Alemanha Gado, cereais, mel conseqüente barateamento das operações de beneficiamento 55.
(410-1453) China Arroz, chá, sal, estanho, prata
Ilhas Britânicas Moedas de couro, gado, ouro, prata A era imediatamente seguinte à da mercadoria-moeda viria a ser, então, a Fase
Islândia Gado, tecidos, bacalhau da Moeda Metálica, que privilegiou os metais preciosos, notadamente o ouro e a
Japão Anéis de cobre, pérolas, arroz
Noruega Gado, escravos, tecidos prata, significativos de riqueza concreta, e que poderiam facilmente passar de
Rússia Gado, prata mão em mão. Com o tempo, o porte desses metais começou a representar risco
para o detentor de sua propriedade. As operações comerciais e de crédito,
sobretudo aquelas entre as cidades italianas e a região de Flandres, entre Bélgica
e França, tornaram-se arriscadas pelo transporte de valores em moedas

55
Os metais são encontrados na natureza em suas respectivas formas brutas, misturados com outras substâncias do
solo e sub-solo. São os minérios, que precisam passar por operações de beneficiamento, das quais resultam as
formas puras do metal.

139
metálicas, fazendo com que surgisse a operação de depósito, um dos primeiros terminou por levar o sistema ao fracasso, o que fez com que os estados
vestígios da atividade bancária. passassem a assumir o mecanismo de emissão e o controle da circulação do
papel-moeda.
Com efeito, apareceriam nessa fase as chamadas Casas de Custódia, onde os
comerciantes podiam depositar suas moedas metálicas ou quaisquer outros Pouco a pouco, foram sendo emitidas notas inconversíveis, o que caracteriza
valores, sob garantia. Tais instituições emitiam, então, os Certificados de praticamente todos os sistemas monetários existentes, ou seja, a inexistência de
Depósito, que deram origem à Fase da Moeda-Papel. No início, a moeda-papel lastro metálico, a inconversibilidade absoluta e o monopólio estatal das emissões
era 100% lastreada, pois existia na casa de custódia igual valor depositado em de moeda. As cédulas, juntamente com o que vulgarmente se chama de moedas
moeda metálica. metálicas, constituem, portanto, o papel-moeda.

Sucede que os proprietários de casas de custódia perceberam que aqueles Finalmente, veio a Fase da Moeda Bancária, que atualmente convive com o
comerciantes que depositavam o seu dinheiro em moeda metálica não faziam a papel-moeda. A moeda bancária, ou escritural 56, resultou da evolução do próprio
reconversão ao mesmo tempo, além do que, outros comerciantes vinham fazer sistema bancário. Ela é constituída pelos depósitos a vista e a curto prazo nos
novos depósitos em ouro e prata,o que permitia emissões adicionais de bancos, sendo movimentada por meio de cheques, ordens de pagamento e
certificados. Com isso, as casas de custódia podiam emprestar a outros transferências eletrônicas.
comerciantes o equivalente à parte do dinheiro que remanescia sob custódia.

Os tomadores de dinheiro por empréstimo também não retiravam o total


12.04. Funções da moeda
tomado, deixando parte na própria casa de custódia que lhe emprestou ou então
depositando em outra, ou em outras casas de custódia. O significado dessa São quatro as funções da moeda. A primeira dessas funções tem origem
operação era que a casa de custódia criava moeda, isto é, de uma determinada sobretudo histórica, pois está ligada à sua própria gênese, pois a moeda nasce
quantia depositada em seu cofre, ela promovia a circulação de um valor bem para servir como meio ou instrumento de troca, o mais frequente de seus usos. E
maior na economia. foi, o uso da moeda como meio universal de troca que criou facilidade para as
transações comerciais e deu maior eficiência à economia.
O fenômeno da criação de moeda, distinto de emissão de moeda, levava a que a
moeda-papel que estava circulando não estivesse mais 100% lastreada, pois as Em segundo lugar, a moeda reflete a medida de valor, posto que, sendo uma
casas de custódia emprestavam mais do que dispunham em termos de moedas mercadoria, pode ser comparada a outras mercadorias e ser trocada por essas
metálicas dos depositantes. outras mercadorias. O que sucede é que a moeda é uma mercadoria padrão que
serve para medir o valor de todas as outras mercadorias, simplificando
Surge, daí, o conceito de moeda fiduciária, ou papel-moeda, que caracterizaria a
sobremaneira os registros contábeis. Assim, a moeda é a unidade de avaliação do
Fase do Papel-Moeda, que se seguiu à fase da moeda-papel. O papel-moeda
também é denominado moeda-fiduciária, de livre conversibilidade e com lastro
apenas fracionário em ouro. Mas a emissão de papel-moeda por particulares 56
Controlada pela escrituração contábil dos bancos, com lançamentos de débito e crédito.

140
valor de todos os bens, sendo o numerário57 de uma economia. Em outras financiado o comprador antecipando o pagamento ao credor deste antecipando o
palavras, a moeda é o referencial de valor que serve como denominador comum pagamento.
a todas as relações de troca. É também referida também como função de unidade
12.5. Demanda por moeda
de conta.
A demanda por moeda advém de três motivos principais: (i) motivo transacional;
Como terceira função da moeda está a sua condição de reserva de valor. Trata-se
(ii) motivo precaucional; e (iii) motivo especulativo. Os dois primeiros motivos
de uma decorrência natural da faculdade que tem a moeda de significar riqueza
dependem da renda do indivíduo e, o terceiro, depende da taxa de juros.
sob quaisquer circunstâncias, podendo ser transformada em bens e serviços
quando em circulação, e tornando-se um estoque, entesourado, quando fora de A demanda por moeda para transação constitui o mais natural dos três motivos
circulação. dessa demanda pois resulta ser aquela que tem como objetivo a canalização dos
recursos para o pagamento das despesas dos indivíduos e suas famílias com bens
Essa função somente tem sentido quando ausente a inflação. Para o indivíduo, a
e serviços. A demanda precaucional, distintamente da anterior, reflete a procura
moeda exerce a função de reserva de valor a partir do momento em que é
de moeda para ficar preventivamente em reserva, com a finalidade de atender a
recebida até o instante em que é utilizada, seja para consumo seja para
necessidades inesperadas do indivíduo ou de sua família, atuando como se fôra
investimento.
um seguro contra eventuais circunstâncias de desemprego, enfermidade ou outra
Mas é importante que a moeda não se deprecie facilmente, ou seja, que a que implique a necessidade de um montante de dinheiro superior àquele que o
inflação não corrôa significativamente o seu valor, pois quando isto ocorre, a indivíduo normalmente despende. A demanda precaucional depende, para um
moeda perde exatamente a capacidade de atuar como reserva de valor. Daí a mesmo nível geral de preços, da renda de cada pessoa e, evidentemente, de quão
importância da estabilidade da moeda, perseguida por muitas sociedades. mais − ou menos − precavida seja essa pessoa.

Por fim, a moeda carrega consigo, também, a função de padrão de pagamento A demanda por motivo especulativo é a procura de moeda para se fazerem
diferido58. Isso significa afirmar que a moeda também pode ser utilizada como aplicações com o objetivo de lucro, que é o retorno do capital ampliado. Como
meio de pagamento futuro, para transações em que a mercadoria ou serviço é esse retorno depende da taxa de juros, a demanda especulativa é governada
entregue ou prestado e tendo a contrapartida que é o pagamento feito a prazo. pelos juros que são pagos. Quando a taxa é elevada como sucede ainda hoje, no
São transações ditas a crédito, nas quais o agente vendedor somente recebe o Brasil, os detentores de dinheiro se inclinam mais a emprestá-lo e, quando as
pagamento mais tarde, ou recebe imediatamente de um banco, o qual terá taxas caem de modo significativo, esses detentores de recursos preferem mantê-
los líquidos, pois o custo de mantê-los em caixa também é baixo.

12.06. Características da moeda


57
A palavra numerário é utilizada em economia para significar uma unidade de referência monetária. O numerário,
por exemplo, do real, é R$1,00. No linguajar corrente, o termo é, também e frequentemente, confundido com As características principais da moeda são: (i) homogeneidade; (ii)
dinheiro. Inspeções bancárias, por exemplo, costumam começar pela atividade de contagem do numerário, isto é,
do dinheiro existente na agência. indestrutibilidade e inalterabilidade; (iii) divisibilidade e multiplicidade; (iv)
58
Alguns economistas preferem não considerar o padrão de pagamento diferido como função da moeda.

141
transferibilidade; e (iv) facilidade de porte. Finalmente, a moeda deve ser dotada de facilidade de porte, justamente para que
o usuário possa levá-la a toda a parte, manuseando-a sem desconforto e
A homogeneidade é uma característica da moeda que não somente é necessária
passando-a àqueles com quem transacionar.
para criar uma certa familiaridade de parte do usuário quando de seu manuseio,
como também para refletir a sua condição de mercadoria padrão, numerário e 12.5. Papel dos bancos
denominador comum às trocas entre os agentes econômicos, produtores,
Conforme já mencionado, os bancos são instituições que fazem a intermediação
consumidores e governo59.
financeira em geral, lucrando com a diferença entre as receitas que auferem
No que se refere à indestrutibilidade e inalterabilidade, a moeda deve ser dotada mediante a prestação dos serviços os custos em que incorrem para disporem dos
de condições que lhe ensejem uma vida útil perene, uma vez que será objeto de recursos necessários a realizarem estes serviços. Em praticamente todos os
manipulação e guarda por seu portador em seguidas operações de troca de que países, esse papel dos bancos é desempenhado sob o controle e o apoio de um
participará. banco central que atua como gestor da política monetária do país. No caso do
Brasil, o Banco Central executa a política emanada do Conselho de Política
A divisibilidade, tanto quanto a multiplicidade, é a característica que permite, nas
Monetária – COPOM.
transações, materializar-se a troca, qualquer que seja o valor estabelecido,
observada a unidade mínima que é a fração cxentesimal. Em outras palavras, a Uma diferença bem marcada entre o papel desempenhado pelo Banco Central e
moeda é o único tipo de mercadoria que permite realizar-se uma transação os demais bancos é que compete somente ao primeiro a emissão de moeda,
comercial qualquer que seja o valor ajustado entre as partes. Revendo-se as fases enquanto que os demais bancos, com o apoio do Banco Central, criam moeda. A
da história da moeda, percebe-se facilmente que isto nem sempre era possível na emissão de moeda faz aumentar o estoque de moeda em circulação,
era da mercadoria-moeda, eis que algumas mercadorias ofereciam, como diferentemente da criação de moeda que, dado um mesmo estoque, os bancos
ofereceriam sempre, limites quanto à divisibilidade. multiplicam artificialmente por meio dos empréstimos que fazem aos agentes
tomadores. Esse mecanismo de criar moeda será retomado na sub-seção no
A transferibilidade da moeda nos dias de hoje está perfeitamente assegurada
presente texto. Comenta-se, antes, o conceito de oferta monetária e seus
pelo caráter fiducial de que é dotada, isto é, da confiança com que é dada e
distintos níveis.
recebida em pagamento. O papel-moeda, por definição, é gravado com
fideicomisso, assegurado pela autoridade monetária que o emite, em sua 12.08. Oferta monetária
condição de testador ou fideocomitente. A condição de fideocometido que tem a
A moeda, ao lado de ser uma mercadoria referencial de valor, é um bem
moeda implica uma relação de confiança entre seus usuários que a farão passar
institucional controlado pelas autoridades monetárias. No Brasil, são o Conselho
de mão em mão.
Monetário Nacional – CMN e o Banco Central – BC as autoridades que, em
59
conjunto, exercem o controle do Real.
O euro, por exemplo, é produzidos por alguns países da Comunidade Européia. As moedas, tanto quanto as
cédulas, têm pequenas diferenças indicativas do país de origem dessa fabricação. No entanto, todas guardam
homogeneidade em tamanho, resistência e aparência, justamente para serem percebidas pelo portador como um
bem padronizado.

142
Há quatro níveis de oferta da moeda, que são os distintos meios de pagamento. M3=M2+Depósitos em Poupança
São identificados por M1, M2, M3 e M4. Antes de apresentá-los, comentam-se os
E o quarto e último nível dos meios de pagamento, o M4, resulta da adição do M3
conceitos de moeda manual, que são: (i) papel-moeda emitido – PME; (ii) papel-
com os depósitos a prazo fixo, que são títulos privados, apresentando-se de
moeda em circulação – PMC; e (iii) papel-moeda em poder do público – PMP.
acordo com a expressão seguinte:
O PMC é igual ao PME deduzido o montante retido temporariamente no caixa do
M4=M3+CDB+RDB,
Banco Central. O PMP resulta do PMC, deduzido o montante em caixa sob a
forma de moeda corrente no Banco do Brasil, nos bancos comerciais e nas caixas Onde:
econômicas. CDB são os certificados de depósito bancário; e
O primeiro nível dos meios de pagamento, o M1,, é expresso por: RDB são os recibos de depósito bancário.
M1=PMP+DVBC+CCCE, A oferta total de moeda no Brasil é controlada pelo Banco Central através da
onde: gestão do M4. Entre março de 1990 e agosto de 1992, os meios de pagamento no
Brasil tiveram um quinto nível, o M5, que incorporava ao M4 os saldos de
PMP é o papel-moeda em poder do público, também chamado de moeda
cruzados60 bloqueados pelo Plano Econômico do governo Collor.
corrente, ou moeda manual;

DVBC são os depósitos a vista nos bancos comerciais, públicos e privados,


incluído o Banco do Brasil; e 12.09.O processo de criação de moeda

CCCE são as carteiras comerciais das caixas econômicas. Os correntistas de um banco comercial depositam seu dinheiro na agência onde
têm conta-corrente gerando um ativo e um passivo para o banco. O ativo é
O segundo nível dos meios de pagamento, M2, tem a seguinte expressão:
denominado Caixa e o passivo é denominado Depósitos a vista. Sobre o montante
M2=M1+TPP+FAF+FRFcp+DER, de depósitos, o banco recolherá ao Banco Central uma proporção denominada
Depósito compulsório cuja proporção é determinada pelo Conselho de Política
onde:
Monetária – COPOM. Se a taxa de Depósito compulsório for igual a 10%, então
TPP são os títulos públicos, federais, estaduais e municipais em poder do público; para cada R$100,00 de novos depósitos o banco recolherá R$10,00 ao Banco
FAF são os saldos dos fundos de aplicações financeiras; Central. Os restantes R$90,00 são utilizados pelo banco recipiendário do depósito
para fazer suas operações. As operações principais são as de empréstimos, em
FRFcp são os fundos de renda fixa de curto prazo; e geral a outros correntistas, o que corresponde ao papel da intermediação
DER são os depósitos especiais remunerados. financeiraa que cabe ao banco comercial. O banco empresta, portanto, ao

O terceiro nível dos meios de pagamento é o M3, definido por: 60


Padrão monetário brasileiro vigente àquela altura.

143
tomador o dinheiro de correntistas que não estão precisando de dinheiro naquele MC=(100x0,90)+(100x0,902)+(100x0,903)+….
momento. Mas tem que garantir a cada correntista depositante, em qualquer
Donde:
momento, a devolução do montante depositado caso ele queira resgatar o seu
dinheiro. Como nem sempre todos os depositantes resgatam ao mesmo tempo MC=100x(0,90+0,902+0,903+…)
tudo quanto depositaram, o banco usa o Caixa para fazer empréstimos e, ao fazer Donde:
este tipo de operação, ele está multiplicando cada R$1,00 dos Depósitos a vista
por dois, sendo R$1,00 que é utilizado pelo tomador do empréstimo e R$1,00 que MC= 100x(0,90/0,10)
está na agência à disposição do correntista que o depositou. Nisso reside o Donde:
mecanismo de criação de moeda que é uma faculdade dos bancos comerciais
MC=900.
com o apoio do Banco Central que limita o montante que os bancos podem
operar por meio da taxa do Depósito compulsório. Na verdade, o dinheiro que O novo montante depois que a série de todos os empréstimos se realizarem é a
saiu de uma agência bancária por empréstimo a um correntista terminará sendo soma da reserva inicial com a moeda criada, ou seja, é igual a (100+900)=1.000
multiplicado por um número maior do que 2 como acima mencionado, porquanto u.m. Esse é o limite de expansão dos meios de pagamento que, como se observa,
o correntista tomador do empréstimo fará pagamentos que fluirão para outros pode ser controlado pelas autoridades monetárias mediante a alteração na taxa
bancos (ou para o mesmo banco emprestador original) sob a forma de depósitos do Depósito compulsório. Observa-se que o montante total decuplicou a reserva
(novos depósitos), os quais estão sujeitos a novos Depósitos compulsórios, inicial, confirmando que o inverso da taxa do Depósito compulsório é o
fazendo com que o processo de multiplicação se repita. multiplicador monetário, também referido como coeficiente de expansão.

É possível demonstrar-se que a moeda criada adicionada a seu montante original Esse mecanismo demonstra, também, que a movimentação de uma economia
tem um limite que é dado pelo inverso da taxa de Depósito compulsório. Admita- pode acontecer por meio de um estoque de moeda bem inferior ao montante de
se por exemplo que a taxa do depósito compulsório seja de 10,00%, isto é transações realizado por essa economia. E quanto menor for o estoque de moeda
DC=0,10. Seja o caso de o banco ser detentor de uma reserva de 100 unidades para movimentar uma economia de PIB constante, tanto maior será a velocidade
monetárias (u.m.) resultante de dinheiro de seus depositantes. Ele emprestará 90 de circulação da moeda.
u.m. e fará um depósito compulsório ao Banco Central igual a 10 u.m. Os
12.10. Encaixe técnico
tomadores do montante de 90 u.m. farão pagamentos que serão depositados em
agências bancárias de outros bancos e/ou do próprio banco emprestador. Esses A sub-seção imediatamente anterior ocupou-se em apresentar o processo de
novos depósitos implicarão um compulsório de 9 u.m. e deixarão reservas de 81 criação de moeda por meio da atividade bancária. Ali, explicitou-se o papel da
u.m. para novos empréstimos. Essa série infinita de empréstimos corresponderá à taxa de Depósitos compulsórios que são feitos ao Banco Central pelos bancos
moeda criada (MC) e representa a soma de uma progressão geométrica de razão comerciais. Esses depósitos são uma reserva obrigatória para dar segurança ao
0,9, como se segue: sistema monetário.

144
O total dos depósitos nos bancos corresponde às reservas bancárias, compostas São instrumentos da Política Monetária: (i) controle direto da quantidade de
dos já mencionados Depósitos compulsórios e do Encaixe técnico que reflete a dinheiro em circulação; (ii) operações no mercado aberto; (iii) fixação da taxa de
maior parcela do montante dos depósitos. Essa maior parte também é referida reservas; (iii) fixação da taxa de re-desconto; e (iv) controles seletivos de crédito.
como Reserva voluntária. O Encaixe técnico é administrado por cada banco de
No que concerne ao controle da circulação, a emissão de moeda é normalmente
modo a atender a saída de dinheiro por meio de saques dos depositantes.
destinada a financiar déficits orçamentários do governo, além de socorrer
Quando o banco enfrenta um desencaixe, isto é, quando o montante de dinheiro
instituições financeiras bancárias quando se prenunciarem crises de liquidez
que sai é superior ao que entra (por novos depósitos e/ou por recebimento de
destas, e de servir para operações de câmbio de moeda.
parcelas dos empréstimos concedidos), o banco pode tomar emprestado ao
Banco Central para equilibrar o seu balancete diário. Esses empréstimos tomados Quanto ao mercado aberto, este é constituído pelas operações que permitem a
ao Banco Central são feitos mediante o pagamento de uma taxa de juro hoje regulação diária da oferta monetária e da taxa de juro promovendo a liquidez dos
conhecida no Brasil como taxa SELIC, abordada no presente capítulo. Daí dizer-se títulos públicos negociados.
que o Banco Central é o banco dos bancos, uma vez que se trata de um banco que No que se refere às taxas de reservas, estas são estreitamente relacionadas com
empresta dinheiro a todos e quaisquer bancos. O dinheiro tomado ao Banco os depósitos compulsórios, e são definidas pelo Banco Central que está limitado a
Central juntamente com alguma proporção do Encaixe técnico é emprestado ao 100% sobre os depósitos à vista e a 60% sobre os depósitos a prazo (uso de títulos
público (pessoas físicas, jurídicas privadas ou públicas) mediante a cobrança de públicos). Em 2013 praticaram-se as seguintes taxas de depósito compulsório: (i)
uma taxa superior à taxa SELIC. A diferença entre a taxa cobrada ao público e a 44% para os recursos a vista; (ii) 20% para os depósitos em cadernetas de
taxa SELIC corresponde ao spread bancário, o qual abriga parcelas relativas aos poupança; 45 % sobre recursos de garantias realizadas; e 60% sobre posições de
custos administrativos dos bancos, provisão para fazer face ao comportamento de câmbio vendidas.
devedores duvidosos (inadimplência) e o lucro da instituição.
O redesconto é uma assistência que o Banco Central presta às instituições
12.11. Base monetária. Política monetária financeiras quando estas correm o risco de terminar o dia com saldo negativo 61
A Base Monetária corresponde ao conjunto de exigibilidades monetárias líquidas entre os montantes que recebem (por depósito) e os que saem (por saques de
da autoridade monetária em poder do público e dos bancos comerciais. Engloba correntistas ou por empréstimos que as instituições fazem). As taxas de
o papel-moeda emitido e o saldo dos depósitos no Banco Central. redesconto são determinadas com base na taxa SELIC com um adicional de 1% ao
ano (a.a.) para o redesconto de um dia; SELIC acrescida de 2% a.a. para descontos
A Política Monetária é o conjunto de medidas adotadas pelo governo com o
com ressarcimento até 90 dias. Esses percentuais vigoram atualmente desde abril
objetivo de controlar a oferta de moeda e a taxa de juro, de forma a assegurar a
de 2013, por resolução do Banco Central.
liquidez ideal da economia do país. O objetivo da Política Monetária é atuar via o
controle da moeda para: (i) aumentar o nível de emprego; (ii) manter a
estabilidade dos preços; (iii) operar com uma taxa de câmbio realista; e (iv) 61
A legislação proíbe o fechamento diário negativo de qualquer instituição financeira, o que equivale a “saque a
adequar a taxa de crescimento econômico. descoberto” contra o Banco Central.

145
Por fim, os controles seletivos do crédito está relacionado com a supervisão capital das empresas ao mesmo tempo em que criam oportunidade de ganhos
bancária, principalmente nos dias correntes em que os mercados financeiros de financeiros para os adquirentes das ações e títulos.
todo o mundo estão interligados.
O mercado de crédito abrange as operações de financiamento, pelos bancos
Nessas condições, quanto mais elaborados forem os instrumentos do mercado da comerciais, de investimentos e mesmo os bancos múltiplos, para pessoas físicas
moeda e quanto mais criativos forem os agentes econômicos que atuam nesse e/ou jurídicas com o objetivo da aquisição de bens e serviços. Incluem-se não
mercado tanto maior é o risco uma vez que os mercados financeiros funcionam somente o desconto de promissórias e/ou duplicatas como também operações de
com base em uma relação fiduciária, isto é, baseada na confiança. longo prazo para finalidades diversas como, por exemplo, o financiamento de
capital de giro de firmas, o financiamento de projetos e outras formas de
A supervisão bancária tem o caráter de supervisão prudencial mediante critérios
investimentos.
definidos nas reuniões de Basileia (Suíça) da qual o Brasil passou a ser signatário a
partir de 1994, quando do estabelecimento do Plano Real. O mercado monetário constitui o espaço onde se realizam as operações de
curtíssimo prazo. Operações como as de overnight, que são operações de
mercado aberto, de um dia, para empresas ou pessoas físicas, além de
empréstimo a bancos comerciais que fecham o expediente diário em vermelho
] (saldo negativo entre captação e desembolso). As operações de overnight podem
socorrer também o próprio Tesouro Nacional.

13. Alguns comentários à economia brasileira recente


12.12. Mercados financeiros
Este tópico tem o objetivo de aliar os estudos teóricos ao conhecimento prático
Os mercados financeiros estão divididos em quatro segmentos: (i) mercado de da macroeconomia brasileira. A sua leitura contribuirá para um entendimento
câmbio; (ii) mercado de capitais; (iii) mercado de crédito; e (iv) mercado mais claro do debate nacional que se trava, dia a dia, pelas ações do governo por
monetário. meio de seus três Poderes, pelas opiniões oferecidas por economistas,
O mercado de câmbio reúne as operações com moedas estrangeiras. As empresários, consultores, jornalistas, professores, pesquisadores e inúmeras
transações diárias com moedas de outros países é que determinam as cotações outras categorias profissionais.
de cada uma delas. Conforme discorrido na seção relativa a câmbio, trata-se de Os temas escolhidos são os veiculados na grande imprensa e evitam, sob todos os
um mercado de grande importância por afetar não somente o produto bruto do aspectos, as componentes de ordem política e ideológica. A finalidade deste
país como também o controle da inflação. tópico é antes a de introduzir o estudante no mundo das instituições dos
O mercado de capitais inclui a compra e venda de ações e títulos em bolsas de mercados de crédito, de capitais, monetário e cambial, além de aspectos
valores e instituições financeiras que operam com ações e títulos das empresas. A inerentes à política fiscal.
função do mercado de capitais é contribuir para a formação e/ou reforço do

146
Lidar com alguns elementos da terminologia própria e regras básicas de O quadro da Figura 03.21 mostra a taxa de juros em países que utilizam o mesmo
funcionamento desses mercados e políticas públicas, auxilia o(a) aluno(a) a conceito que o Brasil para informar o FMI sobre suas respectivas taxas de juros na
construir um conjunto razoavelmente extenso de conceitos, os quais precisam ser ponta, isto é, para o tomador de empréstimos a bancos. O quadro da mencionada
bem compreendidos, condição essencial para a participação no debate sobre os Figura 03.21, embora não apresente dados inteiramente homogêneos, é útil para
rumos da sociedade brasileira. acusar a posição pouco privilegiada que o Brasil ocupa em termos de taxas de
juros no contexto de uma série de países. A falta de homogeneidade entre as
13.01. Sobre a taxa de juro
informações dos países decorre, inicialmente, do fato de estes não adotarem um
O Brasil tem uma das maiores taxas de juros do mundo. A taxa básica, que é a mesmo critério de cálculo ao informarem-nas ao Fundo Monetário Internacional
SELIC62, é atualmente (dezembro de 2013) de 10,00% ao ano, e é orientadora das – FMI, fonte original dos dados.
operações de crédito. Como a concorrência entre os bancos, no Brasil, não é
Enquanto a maior parte dos países  caso do Brasil  informa ao FMI a taxa de
vigorosa, estes chegam a cobrar taxas acima de 150,00 % a.a. em empréstimos a
empréstimo (lending rate)63, outros informam a taxa para capital de giro (working
pessoas físicas, caso, por exemplo do cheque especial cuja média dos
capital loan), como sucede com a Grécia e a Indonésia, por exemplo.
empréstimnos nesta modalidade pelos sete maiores bancos no Brasil alcançou
158,78% a.a. até outubro de 2013.. A diferença entre a taxa básica e a taxa que é A leitura do referido quadro mostra que o Brasil tem a mais alta taxa de juros no
cobrada pelo banco ao tomador do dinheiro para empréstimo ou financiamento é conjunto dos países considerados emergentes, o que é indicativo de sua
o que se denomina spread. O spread bancário é uma prevenção, como já referido desvantagem na corrida pelo crescimento, uma vez que elevadas taxas de juros
em seção anterior, para fazer face a despesas administrativas, operacionais, inibem o investimento, fator essencial para esse crescimento.
tributárias, o risco do não recebimento que é medido pela inadimplência, além da
taxa de lucro da instituição emprestadora do dinheiro. Tem-se observado, Fig. 03.21 – Taxas de juros em diversos
também, que sempre que o Comitê de Política Monetária – COPOM decide pela países (% a.a.)
redução na taxa SELIC, os spreads têm sido reduzidos do mesmo percentual. Isto PAÍS 2003 2013
significa dizer que não se promoveu nenhuma redução real no spread bancário Brasil* 56,60 10,0
Indonésia* 15,50 7,50
brasileiro. Áfr do Sul* 11,50 5,00
Filipinas* 9,20 3,50
México* 6,60 3,75
62 Canadá 4,50 1,00
O Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC foi criado em 1979 pelo Banco Central e pela Associação
Nacional das Instituições do Mercado Aberto – ANDIMA, com o objetivo de tornar mais transparente e segura a E Unidos 4,00 0,25
negociação com títulos públicos. Trata-se de um sistema eletrônico que permite a atualização diária das posições das Japão 1,80 0,10
instituições financeiras, assegurando maior controle sobre as reservas bancárias. Hoje a SELIC identifica, também, a Fonte: Folha de São Paulo. 23 Fev 2004;
taxa de juro, a qual reflete a média da remuneração dos títulos federais negociados com os bancos. A SELIC é e www.fxstreet.pt (2014)
considerada a taxa básica porque é utilizada em operações entre bancos e, por isso, tem influência sobre os juros de * Países considerados emergentes.
toda a economia. Em 04 de março de 1999, o Banco Central extinguiu o Sistema de Bandas de juros, criado em 1996.
O Governo passou a usar uma taxa apenas para sinalizar os juros de toda a economia, criando a Taxa Referencial
63
SELIC. Reflete a média dos financiamentos a curto e médio prazos ao setor privado .

147
Nessa competição desigual com a produção de outros países, a economia 13.02. O Risco-País
brasileira tem recorrido ao desconto em padrões salariais e/ou desvalorizações
O risco-país é um indicador adotado na economia internacional para orientar os
cambiais. Aliado a isso, o crédito ao setor privado no Brasil é muito restrito, uma
investidores a respeito do risco que têm em aplicar seu capital nos diversos
vez que é mais atraente para os bancos canalizarem seus recursos para títulos da
países. Um dos indicadores mais utilizados para avaliar o risco-país é intitulado
dívida pública, que oferecem boa rentabilidade e baixo risco. Os grandes bancos
Embi+64, que reflete a visão dos próprios investidores sobre qual a possibilidade
brasileiros têm a maior parte de seus recursos aplicada nesses títulos da dívida
de determinado país pagar ou não suas dívidas interna e, principalmente,
pública do que emprestados ao setor privado. Para se ter uma idéia da escassez
externa.
do crédito no País, os empréstimos representam somente cerca de 24,8% do PIB
nacional, uma das menores taxas do mundo. Nos Estados Unidos, esse percentual O risco-país reflete, em verdade, o ponto de vista dos investidores internacionais
chega a 45,3%. sobre a possibilidade de determinado país pagar, ou deixar de fazê-lo, suas
dívidas interna e, sobretudo, externa. O seu cálculo parte do pressuposto de que
A inexistência de concorrência entre os bancos, já referida, o que é uma
o risco-Estados Unidos é zero, ou seja, esse país não oferece nenhum risco em
conseqüência do pequeno número de instituições de crédito, termina por agravar
receber aplicações de capitais dos investidores internacionais e, evidentemente,
esse quadro dos juros altos no País, mas deve-se observar, também, que os
nacionais. Um outro indicador utilizado é o Credit Default Swap (CDS). Quanto
procedimentos judiciais para recuperação de crédito junto a devedores
maior for a taxa de risco de um país, tanto maiores serão os juros que esse país
inadimplentes tem um processamento lento, o que contribui para a fixação dos
terá de pagar para renovar seus empréstimos ou obter novos. O risco-país pode
juros na ponta, ou seja, para o tomador de empréstimo, com elevados níveis de
sofrer variações elevadas em curtos intervalos de tempo.
spreads. Também é elevado o nível dos depósitos compulsórios, que é um
percentual de recursos que os bancos são obrigados a depositar no Banco Veja-se, por exemplo, o caso do risco-Brasil durante os primeiros cinco meses de
Central. 2004. Em 12 de janeiro era de 410, mas chegou a 761 pontos em 7 de maio,
variando, portanto, de 85,61% em pouco menos de quatro meses.O quadro da
Finalmente, a nova Lei de Falências, ora tramitando no Congresso Nacional, ao
Figura 03.22 ilustra essa variação do risco-Brasil no contexto da avaliação de risco
estabelecer mecanismos mais simples de re-estruturação de dívidas, assegurando
de outras economias.
maiores chances de recuperação de empresas em dificuldades, poderá contribuir
para a baixa da taxa de juros. Há, todavia, analistas que não tomam como certa a Constata-se que, no período indicado, aplicar capital no Brasil, pelo menos na
queda dessa taxa apenas com a edição da referida lei, porquanto o volume de visão dos investidores internacionais, tornou-se mais arriscado do que em países
insolvência dos bancos não é tão grande, além do que o recebimento de créditos como a Venezuela e a Nigéria que vinham enfrentando situações mais
vencidos se transformou em grande negócio para os bancos, exatamente pela desfavoráveis do que a brasileira em meses então recentes.A significativa subida
elevada taxa de juros praticada no Brasil.
64
O índice Embi+ foi criado pelo banco americano JP Morgan Chase & Company. Trata-se de um indicador de preços
de títulos da dívida externa de países diversos, no caso do Brasil, o “C-Bond”. Embi+ é a abreviatura de Emerging
Markets Bond Index Plus e é determinado pela diferença entre a taxa de juros dos títulos do Tesouro americano e a
dos títulos dos países emergentes.

148
do risco-Brasil passou por uma variação de 14,8% somente em uma semana, a subitamente passar a olhar o panorama político-econômico
primeira do mês de maio de 2004. brasileiro com dúvidas.
O cenário político, tanto quanto fatos relevantes da economia, podem influir no Fig. 03.22 – Variação do risco-país de alguns países
comportamento desse índice.No caso do referido aumento de 14,8% do risco- entre janeiro e maio de 2004
País Risco País
Brasil, este sucedeu em uma semana durante a qual o governo foi afetado,
Em 12jan2004 Em 7mai2004
negativamente, por alguns fatos que deixaram transparecer um certo grau de
Argentina 5.287 Argentina 4.696
fraqueza.Foi o caso da derrota, no Congresso, na votação da Medida Provisória Equador 718 Equador 1.021
sobre a proibição de funcionamento dos bingos, aliada à constituição de uma Nigéria 665 Brasil 761
Venezuela 571 Venezuela 740
comissão mista, também no Congresso, para discutir o valor do novo salário- Filipinas 414 Nigéria 652
mínimo aprovado pelo Poder Executivo. Brasil 410 Colômbia 529
Colômbia 363 Turquia 498
Panamá 298 Peru 481
Na mesma semana, as perdas da Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA foram
Turquia 293 Filipinas 457
de 5,4%, acumulando uma desvalorização de mais de 16% somente durante os Ucrânia 257 Ucrânia 374
Peru 257 Panamá 362
primeiros quatro meses de 2004. Além disso, o dólar teve uma alta de 4,4% na Rússia 227 Rússia 338
primeira semana de maio, a mesma durante a qual o Embi+ elevou-se em Marrocos 182 México 229
México 182 Bulgária 195
14,8%.Conforme se percebe, mesmo em se tratando de um indicador que é Bulgária 160 Marrocos 182
seguido pelos investidores, o Embi+ tem sido questionado pelos países com risco Egito 141 África do Sul 168
África do Sul 126 Malásia 108
elevado, porquanto varia bruscamente em curto espaço de tempo, mesmo que Malásia 77 Egito 75
não haja mudança significativa nos fundamentos econômicos de um país. No caso Polônia 65 Polônia 59
Fonte: Folha de São Paulo. Caderno Dinheiro. 08mai04.
brasileiro, por exemplo, o Emb+ variou de 748 pontos em 15 de abril de 2002 para
1525 pontos em 12 de julho do mesmo ano, isto é, em apenas cerca de três A evolução anual do Embi+Brasil, entretanto, foi favorável às avaliações que
meses. Ora, sabe-se que nesse período de 2002 a inflação continuava vieram a ser feita posteriormente. Para tanto concorreu a melhoria do indicador
razoavelmente sob controle e os resultados fiscais se situavam em níveis como mostram os dados do quadro da Figura 03.23.
Fig. 03.23 – Evolução anual do Embi+Brasil entre 2004 e 2013 *
adequados. Além disso, o déficit da conta de serviços havia diminuído, Ano Índice Ano Índice
o sistema bancário continuava sólido e o país não se encontrava 2004 541 2009 302
2005 394 2010 211
diante de qualquer crise político-institucional.Alguns analistas 2006 232 2011 193
2007 183 2012 185
avaliavam que o previsível resultado das eleições presidenciais 2008 300 2013 212
daquele ano é que seriam o motivo de a comunidade internacional * Posição em 31 de dezembro de cada ano

149
A melhoria do conceito do Brasil no seio da comunidade financeira internacional resultado primário do setor público em abril de 2004. Um resultado primário
deveu-se sobretudo à manutenção, pelo governo brasileiro, dos fundamentos significativo como os que o governo brasileiro produziu no período é de grande
macroeconômicos que haviam sido estabelecidos no marco regulatório do Plano utilidade tanto para o pagamento da dívida pública quanto para a realização de
Real, de 1994 e seus ajustes posteriores. investimentos públicos, distribuição esta que é feita em função de critérios de
política monetária e fiscal. Além disso, como o montante do superávit primário
13.03 – Superávit primário
corresponde, em um primeiro momento pelo menos, a dinheiro arrecadado e não
O superávit primário, também referido como resultado primário, é a diferença gasto, isto significa uma menor quantidade de dinheiro em circulação,
entre as receitas e as despesas do governo, excetuados os juros da dívida pública. contribuindo para o controle da inflação, permitindo, em tese, que a taxa de juros
Em outras palavras, trata-se da diferença entre o que é arrecadado e tudo quanto seja reduzida. Adicionalmente, o superávit primário elevado faz parte de um
é pago, à exceção dos referidos juros da dívida pública65. cenário de austeridade fiscal, despertando a confiança de credores do governo.
O quadro da Figura 03.24 mostra o comportamento desses resultados entre abril No caso do Brasil, esses credores são, em sua maioria, fundos de investimento,
de 2003 e abril de 2004, deixando clara a vontade política do Governo em que tendem a cobrar juros mais baixos em novos empréstimos.
promover elevados resultados para, além de cumprir as metas acordadas com o Fig. 03.25 – Origens dos recursos do resultado primário do setor
Fundo Monetário Internacional – FMI66, ainda poder contar com um saldo extra, à público
Origem Contrib. p/ Particip no Participação no
guisa de prevenção contra possíveis turbulências da economia no futuro. Para result prim result prim (%) PIB nacional (%)
alcançar os resultados primários ora comentados, o governo tem inibido de (R$109)
Gov Federal e B Central 9,507 79,88 7,25
maneira significativa os gastos públicos. A compressão que o Executivo Federal
INSS (1,946) (16,36) (1,48)
tem imposto a esses gastos é fortíssima. Governos estaduais 1,727 14,51 1,32
Governos municipais 0,118 0,99 0,09

)
Empresas estatais federais 2,484 20,87 1,89
Fig. 03.24 – Contas públicas nacionais em abr/2003 e em abr/2004 (R$10 9 Empresas estatais estaduais 0,016 0,13 0,01
Ano\Caracterização Resultado Juros Nominais Resultado Empresas estatais municipais (0,005) (0,02) 0,00
primário Nominal Total 11,901 100,00 9,08
2003/abril 9,849 6,353 3,496 Fonte: Folha de São Paulo. Caderno Dinheiro. 29 mai 04.
2004/abril 11,901 9,904 1,997 Mas o efeito do elevado superávit primário sobre o crescimento é negativo,
Fonte: Folha de São Paulo. Caderno Dinheiro. 29 mai 04.
porque os meios de se produzir altos resultados primários são apenas os de
O governo central é o que participa com a maior parcela do esforço na formação
aumentar a arrecadação via aumento de impostos ou de cortar gastos, inibindo
do superávit primário, ficando as estatais em segundo lugar e os governos
os investimentos. Em qualquer das duas vias, o crescimento econômico é
estaduais em terceiro. O quadro da Figura 03.25 ilustra o perfil da formação do
prejudicado.Em 2004, o Brasil produziu, em termos percentuais, o sexto mais
65
Dívida da União, estados, municípios e empresas estatais. elevado superávit primário em todo o mundo. O quadro da Figura 03.26 mostra o
66
O governo brasileiro começou a perseguir de modo perseverante um elevado resultado primário a partir do final ranking dos maiores, encabeçados pela Argélia, com o percentual de 6,4%.
de 1998, por exigência de acordo com o FMI.

150
Fig. 03.26 – Maiores resultados primários entre países (em % do França e a Alemanha, que superam os 3% de seus respectivos produtos internos
PIB) brutos.
País Sprvt-Prim País Sprvt-Prim
Argélia 6,4 Argentina 4,5 A dívida pública do governo no final de 2004 estava em R$811,87x10 9, total dos
Turquia 5,7 Bulgária 3,3 títulos em circulação no país. Desses títulos, 57,1% são corrigidos pela SELIC, o
Rússia 5,5 Finalândia 3,1
que implica dizer que a aumentos dessa taxa de juro corresponde aumento na
Equador 5,4 Espanha 2,8
Bélgica 4,7 Canadá 2,7 mesma proporção dos 57,1% da dívida pública. A parcela da dívida pública que
Brasil 4,6 ---- ---- depende da variação cambial experimentou uma forte redução em 2004 em
Fonte: Folha de São Paulo. Caderno Dinheiro. 2005.
decorrência da variação do dólar que, com a queda, fez com que os títulos
Conforme se percebe, há países desenvolvidos e países em desenvolvimento no corrigidos por este critério passassem a corresponder a apenas 5,2% em lugar dos
quadro da referida Figura 03.26. No primeiro grupo estão a Bélgica, Finlândia, 10,8% da dívida, nível em que se encontravam no início de 2004. Ainda em
Espanha e Canadá. Entretanto, o percentual de superávit primário desses paíse relação aos R$811,87x109, vinte por cento deste montante são de títulos pre-
não são os mais altos, à exceção da Bélgica. Tais países não costumam abrir mão fixados, que implicam risco menor, uma vez que não se alteram com a variação da
do crescimento, fazendo uma opção por um nível de investimento relativamente SELIC ou do câmbio, em nada afetando o estado da dívida. Como a dívida não
maior quando comparados com aqueles do topo da lista. pode ser quitada em curto espaço de tempo, o governo procura melhorar o seu
13.04 – Déficit público perfil, e é o que vem sucedendo, uma vez que os títulos pré-fixados que
correspondiam a 12,5% do total da dívida em 2003, passaram a 20% no final de
Na seção anterior foi abordada a questão do superávit primário e o pagamento de
2004. Aliado a isso, os papeis baseados na variação do dólar foram reduzidos e os
juros da dívida. Sucede que nem sempre o resultado primário alcançado é
prazos dos investimentos foram alongados.
suficiente para pagar os referidos juros. A parcela não paga dos juros da dívida
pública é o déficit público. Por exemplo, em 2003, o resultado primário das contas 13.05. Política tributária e desigualdade: consumo das famílias
brasileiras foi de R$66,17 bilhões, insuficientes para o pagamento de Embora a política tributária seja instrumento de redução de disparidades
R$145,20x109 de juros, tendo produzido um déficit público de R$79,03 bilhões. econômicas e sociais, nem sempre é o que se observa na economia brasileira. A
A parte dos juros não coberta pelo superávit primário é financiada pelo déficit carga tributária do país é assaz elevada, tendo alcançado mais de 37 % do PIB em
público. O déficit público do Brasil em 2004 foi de 2,68% do PIB, o menor entre 2004. Dez anos mais cedo este indicador era de aproximadamente 27 %.
este e os quatorze anos anteriores 67 e inferior inclusive aos de países como a Atualmente (2014), o percentual de 37% sobre o PIB se mantém. No que se refere
à incidência sobre a renda das famílias, os impostos e contribuições relativos aos
bens e serviços de consumo comprometem relativamente mais os ganhos das
67
A significativa redução do déficit público observada em 2004 decorreu do aperto fiscal conduzido pelo setor famílias de baixa renda e bem menos os ganhos das famílias com nível de renda
público, que produziu um superávit primário de R$81,112x10 9, equivalente a 4,61% do PIB, superior ao ajustado
com o Fundo Monetário Internacional, de 4,25%. Esse superávit primário foi produzido ao custo de uma drástica alto. Em 2004, para as famílias com renda inferior a R$400,00 por mês, a
redução nos investimentos governamentais associada a um aumento da arrecadação de tributos e à queda da
parte da dívida pública dependente do câmbio com a queda do dólar, além do expressivo crescimento do PIB.

151
incidência desses impostos e contribuições foi de 24,4% sobre a renda 68. No renda mais elevada, e menos daqueles de menor renda, havendo, inclusive uma
entanto, para as famílias com rendas elevadas, acima de R$10.000,00 por mês, faixa de isenção em relação a essa obrigação.
esses impostos e contribuições significam um comprometimento médio de
Em relação aos gastos com alimentação, uma família com renda inferior a
apenas 17,3% sobre a renda. O quadro da Figura 03.27 exibe as taxas médias para
R$400,00 mensais precisa despender cerca de 32% de seus gastos, em média.
diversas classes de renda entre os dois níveis de renda ora mencionados. Nesse
Para famílias com renda superior a R$6.000,00 por mês, o percentual do
cálculo estão incluídos o Imposto sobre os Produtos Industrializados – IPI, o
orçamento para a mesma finalidade da aquisição de gêneros alimentícios é de
Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS e as contribuições
9%, também em média. Como os impostos regressivos estão embutidos nessas
como o PIS e o COFINS. Todos são tributos pagos pelas empresas, porém
compras, então reforça-se que os menos abastados pagam proprocionalmente
repassados nos preços dos bens e serviços, afetando a economia do consumidor.
mais impostos indiretos do que aqueles de maiores rendas.

Não há nenhuma controvérsia sobre o fato de que os impostos devam ser


Fig. 03.27 – Proporção da renda gasta com
progressivos. Contrariamente, há consenso entre os economistas sobre esta
os impostos sobre o consumo (%)
Classe de Renda (R$) Imposto (%) questão. No Brasil, entretanto, os impostos sobre o consumo, que respondem por
<400,00 24,40 aproximadamente cinquenta por cento de toda a arrecadação, são regressivos,
400,00 a 600,00 23,90
600,00 a 1000,00 23,50 impondo sacrifícios proporcionalmente maiores aos mais pobres.
1000,00 a 1200,00 23,40
1200,00 a 1600,00 23,20 13.06. Política tributária: o peso das obrigações sobre setores produtivos
1600,00 a 2000,00 22,30
2000,00 a 3000,00 21,80 A legislação tributária brasileira é uma das mais complexas do mundo. As
3000,00 a 4000,00 20,90
4000,00 a 6000,00 20,10 obrigações tributárias implicam custos que são alheios aos custos de produção e,
6000,00 a 10000,00 17,70 por esta razão, deveriam ser minimizados. Não é o que sucede, entretanto, no
>10000,00 17,30
Fonte: Folha de São Paulo. Caderno Dinheiro. 24mai04. caso do Brasil.
O que sucede é que uma família de renda elevada, ao comprar um produto como Do total da carga tributária brasileira, 70,3% recaem sobre as empresas e 29,7%
o feijão, por exemplo, paga indiretamente o mesmo ICMS e o mesmo IPI que uma sobre as pessoas físicas. No caso das firmas, a taxa sobre o faturamento é, em
família de baixa renda. Isto significa que os impostos sobre o consumo, no Brasil, média, de 33,25%, sendo de 47,14% sobre os custos e despesas, e de 52,23%
são regressivos, pois aqueles que ganham mais consomem uma proporção menor sobre o lucro. Existem no país mais de sessenta tipos diferentes de obrigações
de suas respectivas rendas no custeio das referidas obrigações tributárias. entre impostos e contribuições, sobrecarregando excessivamente os custos finais
Distintamente, há impostos que são progressivos, como o Imposto sobre a Renda, dos bens e serviços e ampliando, em conseqüência, o nível geral de preços. No
que cobra mediante alíquotas mais altas daqueles contribuintes que têm uma setor de medicamentos, por exemplo,determinado produto cujo custo de
fabricação seja US$1,00 deverá ser vendido no mercado consumidor a US$2,08.
68
Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário – IBPT.

152
Esse mesmo produto no México seria vendido por US$1,44 e, na Argentina, por Ramo de atividade Tributação
média (%)
US$1,76. Energia elétrica 38,65
Comunicações 36,97
Setores como o de energia elétrica, comunicações, o industrial, de combustíveis e Indústrias 35,47
a construção civil estão entre os que pagam as maiores cargas tributárias, Combustíveis 32,74
conforme ilustra o quadro da Figura 03.28. Construção civil 30,93
Transportes 29,56
Além dos percentuais elevados das obrigações, também pesam sobre os setores Comércio 23,53
Serviços 23,83
produtivos os efeitos do verdadeiro “caos tributário” que se vive no Brasil. As Instituições financeiras* 17,58
empresas em geral se queixam da perda de tempo que têm que dedicar a Administração de bens (holdings) 14,94
noventa e cinco obrigações acessórias entre preenchimento de guias e Agropecuária 14,29
Micro e pequenas empresas 9,78
formulários, manutenção de livros-caixa, o acompanhamento da edição Fonte: Folha de São Paulo. Caderno Dinheiro. 30Jan05.
incessante de normas da Receita Federal, cerca de trezentas a cada ano, o que
Na verdade, as empresas passam a atuar preventivamente em termos de suas
impõe custos que em alguns casos chega a 1,5% sobre o faturamento dos agentes
respectivas gestões tributárias, produzindo relatórios e informações e
produtores.
apresentando-os à Receita, o que implica custos de manutenção de
Em países emergentes a carga tributária média se situa ao redor de 20% do PIB, departamentos cada vez maiores e mais sofisticados, ampliando os custos alheios
portanto 13,25 pontos percentuais abaixo da brasileira de 33,25% consoante já à produção, com ônus para a sociedade.
referido.

Essa diferença expressiva retira do Brasil as condições de competitividade em


14. Comentários finais
atração de novos investimentos e, o que parece ser mais grave, as elevadas somas
arrecadadas não retornam para a sociedade, pelo menos na medida esperada, a Os tópicos apresentados no presente capítulo são úteis para introduzir o
título de justiça social. conhecimento do(a) (aluno(a) no espaço do debate sobre a macroeconomia em
geral e sobre a macroeconomia brasileira em particular. Particularmente, os
A grande empresa brasileira em geral arca com elevados custos preventivos, não
estudantes de engenharia e de química industrial defrontar-se-ão, no futuro, com
somente na área contábil mas também na área do Direito Tributário, pois, com o
a necessidade de compreender o ambiente institucional, técnico, e legal em que
verdadeiro emaranhado de normas e leis, as firmas precisam se manter
se insere o papel da empresa ou entidade de natureza outra em que estiverem
atualizadas com a interpretação dos textos legais que são constantemente
prestando seus serviços profissionais. O conhecimento econômico perpassa todos
editados.
esses aspectos, o que, mais uma vez, vem corroborar a importância do presente
Curso de economia e finanças. O grau de profundidade na abordagem desse
Fig. 03.28. – Setores mais onerados pelos impostos conhecimento se cinge, entretanto, à reflexão, discussão e fixação dos conceitos

153
básicos da matéria, para o quê, o presente texto, acompanhado de listas de
exercícios que serão distribuídas em sala, pode dar uma siginificativa
contribuição.

154
tomar, como ponto de partida, a verificação clara dos objetivos, diretos e
aspectos econômicos e financeiros de um empreendimento de engenharia indiretos, a que este se prestará, e do contexto socioeconômico em que se insere.
capítulo 4
Quanto ao contexto socioeconômico, um aspecto a ser observado está
relacionado com o fato de o empreendimento fazer parte das prioridades
regionais, normalmente definidas pelas instâncias de governo, o que pode revelar
a maior ou menor probabilidade de ser elegível para fins de financiamento oficial,
isto é, por meio de recursos públicos, além de oferecer pistas seguras para a
avaliação dos benefícios sociais. Na avaliação dos benefícios sociais, recorre-se ao
cálculo das externalidades69 que o projeto poderá gerar.

Uma segunda averiguação a fazer está relacionada com o conjunto de


informações contido no projeto, especialmente no que se refere a fatores
produtivos demandados por este. Tais informações fazem parte do escopo do
projeto e incluem a necessidade de matérias primas, mão de obra, energia,
transportes, entre outros fatores.

Em inúmeros casos de decisão sobre empreendimento, a análise a ser feita é


comparativa entre duas ou mais opções de investimento, isto é, entre dois ou
1. Notas preliminares
mais projetos postos em competição para que se indique o de melhor resultado
A análise econômico-financeira de empreendimentos é um capítulo relevante no econômico-financeiro.
contexto dos estudos de economia por constituir uma das ferramentas mais
Há várias técnicas de análise econômica comumente aplicadas à avaliação de
potentes para decisões sobre investimentos, decisões essas que são essenciais
projetos. A análise de custos e benefícios sociais e privados é a mais utilizada
para as estratégias de desenvolvimento de empresas, instituições públicas,
pelos agentes financiadores de projetos como os bancos de fomento e agências
regiões e países.
financeiras, nacionais e internacionais, entre outras fontes. Em alguns casos,
As estratégias de desenvolvimento da empresa implicam definições importantes procede-se à técnica da análise de custo-efetividade, normalmente aplicada para
sobre o que, quando, quanto e onde investir no presente para colher benefícios comparar alternativas de projetos com níveis de produto assemelhados, embora
futuros. O objeto do investimento (no quê investir) corresponde, na imensa não substitua a análise de custos e benefícios. Uma terceira técnica é a análise
maioria dos casos, a algum tipo de empreendimento. Particularmente, a avaliação multicritério, que pode ser complementar à análise de custos e benefícios quando
econômico-financeira do projeto de um empreendimento de engenharia deve o projeto não apresenta um nível adequado de taxa de retorno econômico. Essa

69
O conceito de externalidades é abordado mais adiante, neste capítulo.

155
técnica também é utilizada quando, na análise de custos e benefícios por mais entidades financeiras. Mesmo quando o capitalista não padece de limitação
exemplo, os preços sociais não capturam com precisão os efeitos de recursos e pode bancar integralmente o seu empreendimento, a análise é
macroeconômicos do empreendimento. necessária porquanto o emprego do capital próprio em projeto que não maximize
o retorno deste significa perda econômica do proprietário do recurso pela
No espaço deste curso, será apresentada apenas a técnica de análise de custos e
desoportunidade do projeto. Portanto, o projeto mais indicado entre alternativas
benefícios em suas dimensões de mercado, também referida como avaliação
é aquele que maximiza o retorno e este é um fator motivador da elaboração da
privada; e social, também genericamente referida como avaliação econômica.
análise de custos e benefícios, sociais e privados.
A abordagem do tema será voltada para empreendimentos de engenharia,
3. Níveis de abordagem do problema
incluindo projetos de infraestrutura como rodovias, portos, aeroportos e outras
obras públicas ou privadas, além de contemplar, também, fábricas, hospitais, Os produtos da engenharia são bens e/ou serviços que resultam da operação de
hoteis, instalações de telecomunicações, projetos de cunho ambiental, empreendimentos. O empreendedor, pessoa física ou jurídica, é o capitalista que
empreendimentos rurais, obras de saneamento como adutoras, plantas de resolve enfrentar o risco de um projeto tendo como expectativa o ganho ou lucro
potabilização de água e de tratamento de efluentes, redes de coleta de esgotos, que vai auferir mediante o emprego de seus recursos econômico-financeiros.
exploração de minas, instalações de entretenimento, entre muitas outras
Normalmente, quando as expectativas de lucro de um projeto apontam para um
iniciativas.
percentual acima da taxa de juro de mercado, o capitalista se inclina a
2. Motivação para o estudo empreender executando esse projeto. Mas, para que a expectativa de ganho seja
aferida com segurança, necessário é que se proceda a uma minudenciosa
Além das razões apresentadas na seção anterior, a experiência tem demonstrado
avaliação econômico-financeira do projeto, objeto central deste capítulo.
que a quantidade de projetos propostos costuma ser muito maior do que a
quantidade de projetos aprovados, o que significa que há uma seleção que o Como já referido, a análise ou avaliação de projetos comporta dois distintos níveis
empreendedor, e também o agente financeiro, fazem para se sentirem seguros de abordagem. A primeira é a abordagem sob a ótica de mercado, ou abordagem
quanto ao retorno ampliado do capital empregado. Essa é a principal razão para sob a ótica privada, que é do interesse primordial do empreendedor. E, a
que se proceda a uma avaliação econômico-financeira dos projetos em geral. segunda, é a abordagem de natureza social, a qual inclui os ganhos (benefícios) e
perdas (custos) para a sociedade como um todo. Na ótica de mercado, utilizam-se
Um segundo fator que motiva proceder-se à análise econômico-financeira de
os preços ditos privados, ou de mercado, que são os preços das transações
projetos de empreendimentos é a limitação de recursos que normalmente o
comerciais tal como elas são negociadas e concretizadas. São os preços com que
empreendedor enfrenta. Frequentemente, essa limitação é tal que ele precisa
todas as pessoas estão habituadas a lidar.
recorrer a empréstimo para implantar o seu projeto. Como o dinheiro tomado por
empréstimo tem um custo, a avaliação torna-se ainda mais necessária para Na ótica social, utilizam-se os preços ditos sociais, os quais incorporam os efeitos
esclarecer como o projeto promoverá o retorno do capital empregado, aí externos gerados pelo projeto, isto é, os efeitos, favoráveis e/ou desfavoráveis
embutido o montante tomado por empréstimo a terceiros, em geral a uma ou sobre terceiras partes. Como exemplo de efeitos externos, também referidos

156
como externalidades, relacionam-se, como exemplo, os impactos ambientais os tanto sob a ótica privada quanto sob a ótica social. Não há como identificar um
quais podem ser positivos ou negativos. Portanto, os dois níveis de abordagem da projeto possível no grupo IV, a menos que por absurdo, pois não integram o rol de
análise de custos e benefícios são o da análise social e o da análise privada ou de projetos possíveis.
mercado.

4. Breves notas sobre a análise de custos e benefícios


5. Indicadores de mérito dos projetos
A análise de custos e benefícios é uma técnica mediante a qual se comparam
Há vários tipos de indicadores disponíveis dentro do instrumental da Análise de
dados econômicos do presente com os do futuro por meio de indicadores que
Custos e Benefícios. O primeiro deles é o Payback, que é o mais simples de todos
refletem o mérito, ou o demérito, de determinadas alternativas de projeto.
e que apenas estabelece o período de tempo necessário para recuperar as
Contador70 classifica os projetos em quatro tipos em função da viabilidade de inversões do projeto71.
mercado, isto é, do ponto de vista privado, e da viabilidade social, também
O segundo é o do Valor Presente Líquido-VPL, que projeta o fluxo econômico do
referida como viabilidade econômica. Esses quatro tipos constam do quadro da
empreendimento, mostrando claramente os valores de entrada e saída
Figura 01. Os projetos do tipo I são viáveis tanto em termos privados quanto em
(benefícios e custos), atualizados com base em uma taxa adequada de desconto.
termos sociais.
Nesse caso, a escolha entre alternativas dar-se-á em favor daquela que oferecer o
maior valor presente líquido.
Fig. 01 – Classificação de Projetos
Um terceiro indicador é o chamado Valor Presente Líquido Unitário – VPLU que,
PONTO DE VISTA SOCIAL
+ - partindo do mesmo conceito do método anterior, estabelece uma relação entre o
PRIVADO + I II Valor Presente Líquido e a soma dos investimentos feitos com a implantação do
- III IV
Fonte: Contador (op. cit)
projeto, a valores atualizados. Trata-se, portanto, de um indicador percentual que
apontará como mais viável aquele projeto do qual resultar a maior relação
Os projetos do tipo II são viáveis em termos privados e inviáveis em termos
positiva.
sociais. Fábricas que emitam quantidades excessivas de poluentes, mesmo que
mitiguem este tipo de impacto negativo, tendem a ser classificadas no grupo II de O quarto processo de avaliação é o da Taxa Interna de Retorno – TIR, que consiste
projetos. Os projetos do tipo III são viáveis socialmente, porém inviáveis sob o na determinação de uma taxa de retorno que iguala a zero o valor presente
ponto de vista da avaliação privada. Para esse grupo, o capitalista não drena seus líquido de um projeto, isto é, é a taxa de desconto que permite igualar o valor
recursos, mas é papel do governo atuar no grupo III com o objetivo de promover presente dos benefícios ao valor presente dos custos de um projeto. A decisão
o bem estar social. Projetos na área da defesa tanto quanto projetos na área de entre projetos alternativos será tomada em favor daquele que ostentar a maior
segurança pertencem ao grupo III. Por fim, os projetos do tipo IV são indesejáveis 71
O Payback é comumente referido na literatura americana como “fish-bait method” (método da isca de peixe) por
70 estar relacionado apenas com a velocidade com que o capital é recuperado, sem necessariamente indicar o
Contador, Cláudio Roberto. Avaliação Social de Projetos. Editora Atlas. São Paulo. 2000. 375p. tamanho do empreendimento.

157
Taxa Interna de Retorno. Há ainda um quinto método, que é o da Relação período formará, no conjunto de todos os anos, um fluxo líquido cuja notação
Benefício/Custo, segundo o qual um projeto será viável sempre que esta razão, será Fi.Dando-se ao custo anual do capital (taxa de juro anual) a notação i, o VPL
que é claculada com base nos valores-presente, for superior à unidade. será calculado por meio da expressão72:

É de considerar-se, também, que, alguns desses métodos têm vieses próprios. Tal VPL={[F1/(1+i)]+[F2/(1+i)2]+...+[Fn/(1+i)n]}-I
é o caso do método da Taxa de Retorno do Investimento Incremental, que é uma
A operação representada pela expressão acima corresponde ao desconto do valor
variante do método da Taxa Interna de Retorno, que se presta à comparação de
do dinheiro no tempo, à taxa de i% a.a., “trazendo-o” para o valor atual ou
projetos alternativos que apresentam diferentes níveis de investimento, por meio
presente.
do cálculo da taxa de retorno para um projeto hipotético, equivalente, em termos
de fluxo de caixa, ao diferencial entre os dois projetos que se estejam Representa-se, com frequência, o fluxo de caixa por um gráfico cuja linha
comparando. Ainda como variante, há também o método do Mínimo Custo que é horizontal corresponde ao tempo de vida útil econômica do projeto, e os vetores
derivado do método da Relação Benefício/Custo e que é adotado quando os perpendiculares correspondem à receita líquida de cada ano, receitas estas que
benefícios de cada alternativa são iguais. E há, por fim, o método do Custo podem ser positivas ou negativas.
Periódico Equivalente, variante do método do Mínimo Custo, utilizado para a O VPL traz consigo a vantagem de revelar, por meio de sua cifra, a escala do
comparação de alternativas de projeto com horizontes de tempo diferentes. projeto, isto é seu tamanho, pelo menos em termos monetários. Entre dois
Muito embora aqui tenham sido relacionados inúmeros indicadores, ressalta-se projetos alternativos, a escolha deverá recair sobre aquele que ostentar o maior
que este breviário dos métodos de avaliação não esgota toda a literatura VPL.
existente a respeito do problema. Os que ora são objeto de comentários são os No caso de projetos de cunho social, caso em que as alternativas podem produzir
mais importantes e mais utilizados dos intrumentos disponíveis sobre a Análise VPLs negativos, o projeto a ser adotado é, mais uma vez, o de maior valor que, no
de Custos e Benefícios. Apresenta-se, a seguir, a sistemática operacional para o caso corresponde ao de menor valor absoluto. Um outro aspecto relevante é o
cálculo de cada um dos quatro principais desses indicadores. fato de que, para fins de comparação entre dois ou mais projetos pelo método do
5.1. Valor Presente Líquido VPL, os níveis de investimento devem ser aproximadamente iguais.

O valor presente líquido (VPL) resulta da atualização da renda econômica prevista 5.2. Taxa interna de retorno (TIR)
para o projeto por meio de seu fluxo esperado de receitas e custos, ou fluxo A taxa interna de retorno é o percentual da taxa de desconto que produz um
futuro de receitas e custos. Admita-se o caso de um projeto que esteja sendo Valor Presente Líquido nulo, isto é, aquela taxa para a qual o valor presente
concebido e que deverá produzir e vender apenas um produto. Se, no ano inicial
(ano zero), somente houver custo (custo com o investimento), cuja notação será I,
e, nos anos subsequentes houver receitas (das vendas do produto), cuja notação 72
Essa expressão é a mais utilizada em geral na avaliação dos projetos pelo VPL, embora constitua um caso
será Ri, e custos (operacionais) cuja notação será C i, a diferença Ri-Ci de cada particular da expressão VPL={[F1/(1+i1)]+[F2/(1+i2)2]+...+[Fn/(1+in)n]}-I, que abriga a condição de, tanto a taxa de
desconto anual quanto o fluxo líquido anual, ser variável.

158
líquido do fluxo esperado de receitas e custos é igual ao valor presente do fluxo 5.4. Payback
de investimentos.
De todos os indicadores de mérito dos projetos, o payback é o mais simples
Caso o investimento seja realizado integralmente no ano zero, então o montante I porque mede apenas o tempo de recuperação do capital empregado. Se
corresponde a seu próprio valor presente. A Taxa Interna de Retorno – TIR é a raiz determinado projeto estiver previsto de ter seu investimento total (I) realizado no
de “i” para a equação seguinte: ano zero, e o benefício líquido acumulado nos “n” primeiros anos for igual a “I”,
então o payback desse projeto é de “n” anos. O mérito do projeto será maior
{[F1/(1+i)]+[F2/(1+i)2]+...+[Fn/(1+i)n]}-I=0
quanto menor for “n”.
O mérito de um projeto avaliado mediante o cálculo da TIR será tão mais elevado
Apesar de sua simplicidade e de fornecer, ao capitalista que vai empregar
quanto maior for a taxa encontrada, desde que corresponda a um valor positivo e
recursos, uma relevante informação que é o tempo em que ele esperará para se
maior do que o custo de capital “i”. Esse método é vantajoso por não requerer um
beneficiar da liquidez produzida pelo empreendimento, o método do payback
conjunto muito elaborado de informações sobre o projeto, além de seu perfil e do
tem a desvantagem de não revelar a escala do empreendimento, de
custo de oportunidade do capital. Entretanto, o método da TIR apresenta a
desconsiderar o valor do dinheiro no tempo e de ser falho para projetos não
desvantagem de considerar constante a taxa de desconto ao longo da vida útil
convencionais.
econômica do projeto, ao lado de não ser aplicável a projetos ditos não
convencionais, que são os projetos que apresentam fluxos líquidos positivos e Para minorar a desvantagem de não levar em conta o valor do dinheiro no tempo,
negativos de modo aleatório. pode-se corrigir o método adotando-se o valor presente dos benefícios e custos
do projeto.
5.3. Razão de custos e benefícios
5.5. Síntese das vantagens e desvantagens dos indicadores considerados
O indicador de custos e benefícios, que também pode ser referido pelo seu
inverso, ou seja, a razão de benefícios e custos, sendo esta última a que é adotada Todos os métodos relacionados apresentam suas vantagens e desvantagens.
nesta definição, é uma fração em que figura o valor presente dos benefícios do Apenas o Valor Presente Líquido revela diretamente a escala (tamanho) do
projeto e, no denominador, o valor presente dos custos deste. Sua expressão é, projeto. Os demais são indicadores expressos mediante percentuais ou, então, de
portanto, simples, da forma: simples relação entre cifras que indicam o tempo de retorno do capital
empregado. O quadro da FIgura 02 mostra essa síntese acrescentando, em
B/C=VPB/VPc ,
relação aos métodos comentados na sub-seção precedente, o Valor Presente
Onde: Líquido Unitário – VPLU.
B/C é a razão de benefíco/custo;
VPB é o valor presente dos benefícios; e
VPc é o valor presente dos custos.

159
Fig. 02 – Vantagens e Desvantagens dos
Métodos de Avaliação de Projetos
6. Taxa mínima de atratividade
MÉTODO VANTAGENS DESVANTAGENS
Valor Presente a) Espelha rigorosamente o fluxo a) apresenta formatos complexos para A taxa mínima de atratividade é a menor taxa de juro que uma proposta de
Líquido . do projeto. projeto não convencionais.
b) Desconhecem-se falhas investimento deve oferecer para que o projeto seja atraente. Em outras palavras,
técnicas neste método. é a taxa mínima de retorno que que o projeto deve ter. Dito de outro modo, a
Valor Presente a) As mesmas do método do Valor a) As mesmas do método do Valor
Taxa mínima de atratividade é o menor ganho que o capitalista se propõe a
Líquido Unitário Presente líquido. Presente Líquido.
Taxa de Retorno a) É dos mais utilizados
a) Pressupõe constante a taxa de auferir quando faz um investimento. Ela é influenciada essencialmente por três
Interno. indicadores para decisão. desconto ao longo do tempo, o fatores:
b) Prescinde de informação que raramente é verdade.
externa do projeto b) Sua expressão algébrica pode (i) Custo de oportunidade
levar a raízes múltiplas,
dificultando a análise. O custo de oportunidade é a remuneração que o capitalista abandona (descarta)
c) Pode apresentar resultados
distorcidos para projetos não ao decidir-se pela aplicação de seus recursos no investimento. É quanto ele deixa
convencionais. de ganhar por não aplicar na alternativa disponível mais rentável dentre as que
d) Não diferencia escalas de
projeto. superam o tipo de negócio em que aplica seu dinheiro. Por exemplo, a aplicação
e) Algumas vezes chega à mesma em alguns tipos de ações na bolsa, na compra de títulos do Tesouro (Tesouro
taxa para projetos de mesma
escala, porém desiguais em
direto).
custos e benefícios.
Relação a) É um método bastante utilizado. a) O indicador tem inúmeras
(ii) Risco do negócio
Benef/Custo versões. O risco do negócio em que o investidor aplica seus recursos depende de uma
(B/C). b) A magnitude da relação B/C série de elementos. Destacam-se, entre outros, a sazonalidade do produto ou
varia sensivelmente com os
critérios de inclusão de parcelas serviço objeto do investimento; a dependência de ações de monopólios ou
no numerador e no oligopólios na área do negócio objeto do investimento; o estado da economia do
denominador da relação.
Payback a) Simplificado e cálculo imediato a) Não considera o valor ou
setor para o qual se destina o investimento, se em expansão, retração etc; e a
b) Fornece idéia de liquidez e custo de recursos no tempo. existência de barreiras à entrada do negócio objeto do investimento que podem
segurança do projeto b) Não esclarece o valor mínimo do ser representadas por necessidade de capital elevado, complexidade da
payback aceitável.
c) Ignora o problema de escala. tecnologia empregada, exigências de licenças especiais, além de dificuldades
d) Não aplicável a projetos de perfil relacionadas com outros fatores de produção como, por exemplo, obtenção da
não convencional.
matéria prima, energia, entre outros.
(iii) Liquidez

160
A liquidez é a facilidade de se converter um ativo em caixa. Quanto mais baixa for custos de oportunidade para a economia como um todo. Desse modo, a avaliação
a liquidez do negócio objeto do investimento, tanto mais alta será a Taxa mínima social, também referida restritivamente como avaliação econômica, é o processo
de atratividade. A liquidez depende do tempo que se tem que aguardar para que que submete aos métodos de cálculo dos mesmos indicadores acima referidos os
a venda do ativo seja feita, de tal modo que pode ser definida também como a benefícios e custos do projeto consoante níveis de preços que incorporem os
velocidade de conversão do empreendimento em dinheiro. efeitos externos que este produz. Para maior clareza, aborda=se, neste texto, o
conceito de externalidades ou efeitos externos.
7. As óticas de mercado e social na avaliação de projetos
8. Fases de elaboração e componentes do projeto para a avaliação econômica
A avaliação de mercado, também referida como avaliação privada, é o processo
que submete aos métodos de cálculo de indicadores de mérito estudados neste O projeto de um empreendimento de engenharia, uma vez estabelecida a ideia
texto os benefícios e custos do projeto consoante os preços que são praticados no inicial, passa por várias fases que se iniciam com a pesquisa de mercado, a
mercado, os quais incluem as interferências governamentais, mormente os definição do tamanho (produção-piloto) e do processo produtivo a ser adotado,
impostos e subsídios, além de custos de financiamento quando é o caso, entre além de proceder-se a uma análise das opções de localização, após a qual
outras distorções que estão presentes nos preços privados. Em outras palavras, as desenvolve-se o projeto básico que é uma versão prévia à de projeto executivo.
variáveis monetizadas do projeto são consideradas por meio de seus respectivos
Em alguns casos, em vez de um projeto básico, faz-se apenas um esboço desse
valores de troca, isto é, os preços observados nas relações de compra e venda dos
projeto. Ainda nessa fase preliminar, estimam-se os prazos, de construção e de
mercados, e a análise do projeto resulta ser a que consulta os interesses do
início de operação, ao mesmo tempo em que se faz a previsão da vida útil
empreendedor sem levar em conta os interesses dos demais agentes econômicos.
econômica do empreendimento.
Sucede que o mercado nem sempre é capaz de promover uma alocação eficiente
Com esses elementos, realiza-se a avaliação preliminar de custos e benefícios
de recursos de maneira a gerar a maior utilidade possível para todos os
privados que revelará o grau de viabilidade do empreendimento em termos de
indivíduos. Essa impossibilidade, que se verifica em inúmeras circunstâncias,
mercado. Uma vez sendo viável e tendo o empreendedor decidido por sua
constitui uma falha de mercado. Ditas falhas são observadas na oferta e uso de
realização, passa-se à etapa de elaboração do projeto executivo e seus
bens públicos, por meio de externalidades ou efeitos externos, ou pela
correspondentes orçamento de custo detalhado e cronograma de etapas de
informação imperfeita sobre bens e serviços, ou, ainda, pelos mercados
implementação.
incompletos
Quando se toma, como ponto de partida, a ideia de desenvolver-se um
São as externalidades que motivam a necessidade da análise social de um
empreendimento sem que outros elementos já estejam definidos, o estudo
projeto, porquanto este, como um sêr novo que será introduzido no ambiente
implica uma série de verificações que, em geral, começam com uma pesquisa de
econômico, causará efeitos sobre terceiras partes (externalidades) que precisam
mercado, avaliação de possíveis sítios para implantar o projeto, entre outras
ser avaliadas em termos de mérito (ou demérito). Portanto, os preços de
verificações que são alvo de técnicas distintas, as quais são brevemente
mercado, ou preços privados, precisam ser corrigidos para refletir os benefícios e
comentados nas sub-seções seguintes. Essas técnicas refletem as fases de

161
elaboração de um estudo completo de avaliação de oportunidade de inversão de o potencial do contingente ainda não atendido pela oferta corrente. Além disso, o
capital. que também é relevante, esse empreendedor em geral já conhece as políticas
públicas relacionadas com o setor em que se insere seu ramo de negócio. Essa
8.1. Pesquisa de mercado
circunstância é, evidentemente, diferente da pesquisa de mercado para a
A pesquisa ou estudo de mercado é o ponto de partida para determinar as linhas implantação de uma indústria nova, na qual a quantidade de dados
de contorno preliminares de um emprendimento que se pretende conceber e desconhecidos é bem maior.
projetar. Trata-se de um instrumento valioso que oferece, inclusive, as primeiras
Uma importante caracterização microeconômica que muito auxilia as pesquisas
pistas para a definição da produção-piloto, ou seja, uma ideia embrionária do
de mercado é a que resulta da observação de bens correlatos ao bem objeto da
tamanho do projeto. Uma das primeiras preocupações sobre o tema reside na
pesquisa. Nesse sentido, devem ser verificados os potenciais de demanda e de
verificação do regime de mercado em que se insere o ramo do negócio em
oferta de bens substitutos e de bens complementares. Uma ferramenta de grande
concepção, isto é, se se trata de concorrência perfeita ou de algum mercado
utilidade nessa tarefa são as elasticidades-preço, da demanda e da oferta, além
imperfeito. Os enfoques de um e de outro regimes são distintos e implicam
da elasticidade-renda da demanda.
tratamentos diferentes à análise do potencial de mercado.
Por fim, não é ocioso acrescentar, a pesquisa de mercado deve considerar os
A pesquisa de mercado comporta dois níveis de abordagem: a do mercado do
preços correntes do produto, as conjecturas de especialistas desse mercado
projeto em si, e a do mercado global. Projetos de grande envergadura não raro
como, por exemplo, expectativas de expansão ou de contração da demanda, as
implicarão a necessidade de ambas as abordagens. Nos grandes
questões relativas às facilidades comercialização do produto, aí incluída a
empreendimentos voltados para a produção de bens de consumo final, um
infraestrutura existente para o escoamento da produção, as condições de venda
conceito associado à abordagem do mercado global é o do consumo aparente,
que são praticadas, a oferta de matérias primas, entre outras.
que serve como uma primeira aproximação da demanda global. O consumo
aparente é o resultado da produção do bem no país, que corresponde à oferta
interna, acrescida das importações e deduzidas as exportações desse bem. A
8.2. Tamanho do empreendimento
expressão consumo aparente resulta do fato de o consumo, ao ser calculado
dessa forma, corresponder a uma estimativa não precisa de sua magnitude, uma A definição do tamanho de um projeto pode ser dada por diferentes parâmetros.
vez que variáveis como oscilação de preços, de estoques, bem como alterações na A produção, a área física ocupada, tanto quanto o efetivo de pessoal a ser
política de importações e de exportações afetam o resultado desse cálculo. utilizado, ou a quantidade da principal matéria prima utilizada estão entre tais
parâmetros. O mais relevante desses parâmetros, entretanto, é a sua capacidade
Um fator facilitador do estudo de mercado reside na eventual circunstância de o
de produção por unidade de tempo. Essa capacidade de produção está associada
projeto ser de ampliação de uma indústria já existente, o qual, naturalmente, é
a um nível de custo mínimo, refletindo o critério de eficiência econômica. Ela
indicativo de que o empreendedor já lida com consumidores do bem a pesquisar,
pode ser referida tanto em termos de unidades produzidas, isto é, a produção
conhecendo o comportamento destes e detendo algum grau de informação sobre
física quanto em termos de faturamento do empreendimento.

162
O estudo de mercado, apesar de fornecer informações relevantes para a definição calculado para o projeto é de 1200 u.m. por semana, e o custo variável unitário é
do tamanho, não deve ser o fator principal nesta tarefa. Seus resultados são úteis constante também e igual a 8,50 u.m.. Determinar o ponto de nivelamento desse
para assegurar que o empreendimento encontrará sua demanda, sugerir com que projeto.
tipo e intensidade de esforço de comercialização o empreendedor deverá atuar, e Solução
se há espaço para expansão futura; ou então, será extremanente útil para alertar O ponto de nivelamento é o nível de produção para o qual C t=RT, onde:
sobre a precariedade ou mesmo inexistência de demanda potencial a ser CT é o custo total, igual à soma do custo fixo (CF) com o custo variável (CV); e
RT é a receita total, igual ao produto do preço unitário (p u) pela quantidade
explorada.
produzida (q).
O tamanho do empreendimento, em si, deve resultar da lucratividade máxima O custo variável será igual a: CV=CVU.q, da[i:
que se pode alcançar. Nesse sentido, um dos primeiros approaches implica CF+ CVU.q=pu.q,
recorrer a estimativas da clássica condição de igualdade entre custo marginal e Donde:
1200+(8,5xq)=10xq
receita marginal para algumas opções de tamanho que se situem dentro dos
Donde:
limites dados pelas indicações do potencial de mercado, atual e futuro. Nessa q=800 unidades físicas (u.f.)/semana.
avaliação, convém simular possibilidades de instalação com mais de uma unidade
A análise desse resultado indica que o tamanho do projeto, dado por sua
produtiva em localizações distintas, localizações estas que satisfaçam a um ou
capacidade de produção, precisa ser superior a 800 u.f. mensais. Conforme já
mais fatores locacionais como a regionalização do mercado, ou da ocorrência da
mencionado, esse nível de produção serve como balizador do tamanho do
matéria prima principal, ou, ainda, da disponibilidade de energia, água ou outra
empreendimento, o qual deve ser superior a 800 u.f., muito embora não defina
utilidade industrial de relevo para o processo.
qual deve ser o tamanho ótimo.
Um método simples que pode oferecer uma estimativa prévia do intervalo a
Observados os critérios acima, é possível que se relacionem mais de um tamanho
partir do qual deverá situar-se o tamanho do empreendimento é o cálculo do
para o empreendimento. Nesses casos, devem ser postas em confronto as
ponto de nivelamento, o qual indica o nível de produção que corresponde à
diversas variáveis presentes em cada hipótese de tamanho. Essas variáveis são os
igualdade entre a receita e o custo totais, adotando-se como critério para
custos, variáveis e fixos, a capacidade de obter-se financiamento, a
definição de custo total o método contábil, isto é, não incluindo no custo a
disponibilidade dos insumos produtivos na localização mais adequada para o
remuneração dos fatores produtivos, a qual é considerada como lucro. O cálculo
empreendimento, a disponibilidade de mão de obra, a tecnologia a ser
do ponto de nivelamento, por depender de dados de custos e receitas, é
empregada, entre outros.
apresentado no exemplo dec aplicação 01.

Exemplo de aplicação 03.17

O preço de um produto cujo projeto de viabilidade está em curso de elaboração é


tomado como constante e igual a 10 unidades monetárias (u.m.). O custo fixo 8.3. Projeto de engenharia e processo associado

163
Dentre as várias definições dadas a projeto, uma das mais simples conceitua este Em projetos de engenharia, o estudo de localização é mais frequentemente
instrumento de planejamento como uma representação da ideia ou concepção de aplicado ao caso de indústrias, uma vez que outros tipos de iniciativas podem ter
um produto ou serviço com duração definida e sujeita a restrições técnicas, a definição de sua localização limitada por fatores específicos de seu processo, o
econômicas e ambientais. que nem sempre ocorre com a atividade fabril. Por exemplo, o estudo de
localização de empreendimento minerário está atrelado a um determinismo
Os projetos de empreendimentos de engenharia contêm os desenhos e
geográfico que oferece poucas opções de localização, uma vez que o projeto vai
especificações técnicas do objeto a ser construído ou implantado, e de sua fase
para onde houver ocorrência do minério a ser explorado. Uma barragem para
operacional (processo), bem como os memoriais de cálculo, o orçamento de
geração hidrelétrica terá como sítio um ponto que conduza ao que se denomina
custo, a previsão de receitas e o fluxo líquido de receitas e custos ao longo de sua
aproveitamento ótimo, o qual está relacionado com o potencial hidráulico que
vida útil econômica. Alguns projetos comportam, adicionalmente, modelos
depende, por sua vez, de quedas topográficas significativas associadas a vazões
reduzidos, seja por meio de recursos da informática seja por meio de maquetes
de água caudalosas. Um empreendimento de agricultura irrigada depende de
ou protótipos.
determinadas características do solo que terminam por limitar as opções
Na elaboração da avaliação econômica, todos esses elementos são compulsados prováveis de localização. Para decidir sobre a localização de um empreendimento
pelo analista em seu trabalho de construção de um entendimento completo do imobiliário urbano, por exemplo, seu empreendedor buscará terrenos em áreas
projeto, seus objetivos e particularidades, os obstáculos que podem surgir da cidade que condigam com o cliente-alvo, o que é medido por meio da renda,
durante sua implementação, sempre com o fito de traduzir em grandezas isto é, se o imóvel que será construído for de luxo, certamente será localizado em
monetárias as características do empreendimento. Essa leitura abrangente do uma região sofisticada da cidade e, caso contrário, pode ser construído em
projeto, entretanto, fixa-se tanto mais nas cifras orçamentárias e de previsão de bairros de classes de renda mais baixas.
receitas, nos prazos correspondentes às etapas de implantação e operação, e em
Diferentemente dos setores acima relacionados, a indústria oferece um leque
outras variáveis que tenham significado econômico.
amplo de possibilidades em relação aos fatores locacionais que são levados à
Uma vez reunidas as informações acima relacionadas, a análise econômica passa análise, embora, em alguns casos, ela seja também guiada por determinismos
a ser desenvolvida mediante o cálculo dos indicadores de mérito selecionados, a geográficos, sobretudo quando o volume e/ou peso da matéria prima principal
análise dos resultados, a análise de sensibilidade do projeto e considerações e for significativamente maior do que o volume e/ou peso do produto final, caso
recomendações finais para uso dos executores do empreendimento. em que a indústria tenderá a ser localizada proximamente à fonte dessa matéria
prima. Se, contrariamente, o produto final for de proporções físicas muito
avantajadas em relação ao volume e/ou peso de sua matéria prima principal, a
indústria tende a localizar-se mais proximamente a seu mercado consumidor, de
modo a incorrer em menores custos de transporte.

8.4. Localização

164
Em outro contexto, indústrias buscam localizar-se proximamente a cursos d’água, sindical e a propensão a greves e outros movimentos sociais, a segurança pública,
seja para obtenção dessa utilidade seja para utilizar o rio como via de normas do zoneamento, entre outros.
escoamento de sua produção ou de recebimento de matérias primas; podem
localizar-se, também, proximamente a ferrovias para tirar proveito de custos mais
accessíveis do frete; podem, ainda, localizar-se proximamente a fontes de energia 8.5. Investimento
de geração, transmissão ou subtransmissão de energia elétrica para ter acesso a O investimento é a aplicação de determinado montante de capital na implantação
esta utilidade com maior confiabilidade. As indústrias também tendem a e na operação da fase inicial de produção do projeto visando a concretização de
aglomerar-se, e as aglomerações industriais (polos, distritos e cidades industriais) um fluxo de benefícios durante sua vida útil econômica. O capital investido na
passaram a ser objeto de planejamento de infraestrutura para abrigar fábricas. O implantação do empreendimento, também referido como capital fixo, é destinado
Brasil conta hoje com muitas dezenas de aglomerações industriais planejadas. à aquisição ou construção de edifícios, compra de maquinário e outros itens do
Os elementos acima referidos constituem fatores de localização e são úteis para ativo fixo.
quaisquer tipos de projeto, seja industrial, minerário, agrícola, de geração de Uma outra parte do capital é destinada à operação da fase inicial de
energia e de outros ramos de negócio. O que é importante assinalar é que cada funcionamento do projeto, a qual pode limitar-se a seu primeiro ciclo de
fator pode ter um peso (importância) maior para determinado tipo de produção, ou a mais de um ciclo conforme a decisão do empresário, decisão esta
empreendimento e menor para outros. Essa ponderação é essencial para definir- que é tomada em função do momento em que o capital começa a retornar em
se a localização mais indicada de um emprendimento. virtude das vendas. Trata-se do capital de giro do projeto.
Há vários critérios de classificação dos fatores locacionais. Um dos critérios de uso Os ativos fixos se classificam em dois grupos: os tangíveis e os intangíveis. O
mais recorrente é o que os agrupa em fatores de avaliação quantitativa e em grupo dos ativos fixos tangíveis incluem itens sujeitos a depreciação e itens não
fatores de avaliação qualitativa. sujeitos a depreciação. Entre os primeiros, estão as construções, os maquinários,
São fatores de avaliação quantitativa as matérias primas, os transportes, a energia as jazidas, os veículos e móveis e utensílios. De outro lado, o terreno, embora seja
elétrica, a água, bruta e/ou potabilizada, infraestrutura de tratamento de classificado como ativo fixo tangível, não é sujeito a depreciação. Entre os ativos
efluentes industriais, facilidades para o abastecimento de combustíveis e de fixos intangíveis, relacionam-se as marcas e patentes, licenças de funcionamento,
outras utilidades especiais, os incentivos fiscais e governamentais; e a ambientais, os direitos autorais de projetos e processos, entre outros. O conceito
proximidade de zonas urbanas com os serviços básicos de comunicações e de depreciação estudado no Capítulo III deste curso aqui se repete, com a
agências bancárias. diferença que é aplicado a determinado projeto, enquanto que, em
macroeconomia, o conceito se aplica ao investimento bruto agregado de uma
De outro lado, são fatores de avaliação quantitativa o clima, a frequência de
economia.
ocorrência de acidentes naturais e/ou fenômenos cataclísmicos, o ambiente

165
O orçamento dos investimentos deve ser acompanhado do cronograma de 8.7. Financiamento
aplicação dos recursos durante a fase de implantação do empreendimento. Esse
O financiamento é a concepção e implementação de meios pelos quais se realiza
cronograma permite que seja elaborado o fluxo dos custos relativos às inversões
o provimento, parcial ou integral, de recursos financeiros, internos ao grupo
em capital fixo, a ser incorporado ao fluxo de custos e receitas do
empreendedor ou de terceiros, para realizar o projeto. No caso de recursos
empreendimento durante sua vida útil econômica.
internos ao grupo empreendedor, os recursos podem provir de lucros não
distribuídos ou de lucros retidos e de reservas. Quando se trata de recursos
externos ao grupo empreendedor, estes podem ser obtidos por meio de
8.6. Custos e receitas
empréstimos tomados a instituições financeiras, ou por meio de lançamento de
Os orçamentos de custos e de receitas (ou previsão de receitas) são a títulos no mercado financeiro ou, ainda, por meio da venda de ações da empresa
representação monetizada das rubricas um projeto. Constituem o conjunto de no mercado de capitais (bolsas de valores).
informações que subsidiará o empreendedor na condução de seu negócio
Os empréstimos, desde que se consigam prazo e custo do dinheiro (taxa de juros)
comercial. O orçamento de custo, tanto quanto o de receitas, deve indicar o
adequados, trazem a vantagem do menor custo em relação a venda de ações,
período, normalmente o ano-calendário a que os valores monetários utilizados se
uma vez que a taxa de juro paga à instituição financeira terá que ser menor do
referem. Daí serem habituais as expressões orçamento a custo de 2014, o que é o
que a taxa de dividendos paga aos acionistas, caso contrário, não valeria a pena
mesmo que orçamento em reais de 2014. Expressões correspondentes também
tomar o empréstimo. Além disso, são vantajosos também porque os juros pagos
são utilizadas para orçamento de receitas referido a algum ano, e, em ambos, os
são dedutíveis da renda tributável, o que não ocorre com os dividendos pagos, e,
casos, a razão de situar-se um orçamento no tempo é a inflação.
ainda, não representam redução da participação do empreendedor no capital de
Os orçamentos de custos e receitas oferecem, de pronto, uma avaliação da sua empresa.
rentabilidade do projeto ao mesmo tempo em que permitem o cálculo do ponto
As fontes de recursos financeiros podem ser nacionais ou internacionais. No caso
de nivelamento, também referido como break even point, que é o nível de
de empréstimos, as fontes nacionais incluem as agências de desenvolvimento
produção para o qual receitas e custos se igualam, e acima do qual as receitas
estaduais como a Desenbahia, por exemplo, os bancos múltiplos, públicos ou
suplantam os custos. Conforme se percebe o ponto de nivelamento pode ser
privados. No Nordeste, tem papel preponderante o Banco do Nordeste, sediado
utilizado como uma ferramenta auxiliar no estabelecimento do tasmanho do
em Fortaleza.
empreendimento.

Para facilitar a análise social do projeto, etapa que se segue à análise de mercado
ou privada, deve-se separar as rubricas orçamentárias por classes destacando, 9. Subsídios para a avaliação de projetos sob a ótica social
necessariamente, as matérias primas, os insumos, a mão de obra, especializada e
A avaliação social de um projeto constitui um campo dos estudos econômicos que
não-especializada, os encargos sociais e trabalhistas, o preço do terreno, a
visa apurar os benefícios líquidos que um dado projeto é capaz de gerar para a
energia, a depreciação e os subsídios.

166
sociedade. Ela se mostra tanto mais necessária em economias que convivam com Falhas de mercado são imperfeições do mecanismo de mercado que o afastam
imperfeições no mercado dos fatores, imperfeições estas que, em uma expressiva das condições de concorrência perfeita, e são devidas aos fatores seguintes: (i)
quantidade de casos, procede das interferências governamentais em existência de mercados imperfeitos (principalmente monopólios, oligopólios e
praticamente todos os mercados, seja sob a forma de tributos ou de subsídios, concorrência monopolística); (ii) informações incompletas dos agentes
seja sob a forma de políticas de preços máximos ou de preços mínimos, seja sob a econômicos; (iii) custos de transação elevados; e (iv) externalidades.
forma de quotas de importação ou, ainda, de racionamento. Essas interferências
A análise de mecanismos capazes de corrigir falhas de mercado é desenvolvida,
são incorporadas pelos preços privados distorcendo o valor real do projeto para a
no contexto da análise social de projetos, notadamente em relação a falhas
sociedade, criando a necessidade de proceder-se a uma análise de cunho social,
capazes de produzir externalidades.
além da análise baseada nos preços a custos de fatores que é a análise de
mercado ou análise de cunho privado. Há diversos tipos de externalidades e a sua tipificação depende da natureza dos
agentes causadores e dos agentes afetados. Em todos os exemplos de
A avaliação social de projetos tem como premissa básica o bem-estar da
externalidades, os agentes causadores buscam, em seus respectivos cálculos
coletividade e estabelece especificamente indicações nas seguintes direções: (i) o
econômicos, a igualdade entre custos e benefícios marginais privados, deixando
bem-estar do indivíduo é o objeto primordial que se sobrepõe a todos os demais
de lado os efeitos externos, positivos e/ou negativos, que sua atividade gera.
objetivos; (ii) a avaliação das mudanças no bem-estar de cada indivíduo deve ser
feita pelo próprio indivíduo; e (iii) o critério para julgar essas mudanças sociais é o É justamente o fato de o agente causador não corrigir os efeitos externos que
da Melhoria Potencial de Pareto. obriga o setor público, quando tais efeitos são prejudiciais a terceiras partes, a
adotar medidas para que o referido agente causador materialize a internalização
Diz-se que um projeto promove uma melhoria de Pareto, se os indivíduos
dos efeitos externos. Comentam-se, a seguir, os principais mecanismos de
beneficiários do projeto têm suas condições de vida melhoradas, sem contudo
correção de externalidades. Esse processo de corrigir uma externalidade é
reduzir as condições de vida dos outros. Alternativamente, para certos tipos de
comumente referido como processo de internalização da externalidade. Diz-se
projetos, pode-se adotar o Princípio da Compensação Potencial de Kaldor, o qual
que uma externalidade é internalizada quando o(s) indivíduo(s) e/ou firma(s) que
sugere que o bem estar social pode ser melhorado quando as partes beneficiadas
a geraram incorporam-na a seus cálculos internos de custos e benefícios. Quando
pelo projeto podem potencialmente compensar aquelas partes que perdem, de
determinada externalidade é integralmente internalizada, o consumo ou
modo a deixá-las exatamente como antes e ainda obter alguns benefícios pela
produção (conforme o agente causador seja consumidor ou produtor) passa a
troca. A análise social opera para corrigir as falhas de mercado, sendo as
situar-se em seu nível socialmente ótimo. Comentam-se a seguir alguns dos
externalidades o principal tipo de falha de mercado levado em conta em seus
instrumentos corretivos de efeitos externos.
mecanismos de cálculo.
(i) Tributos e subsídios
9.1. Correção de falhas de mercado como medida para a racionalidade dos
gastos públicos Os mecanismos dos tributos e subsídios, já estudados no capítulo 2 deste curso,
costumam ser utilizados para corrigir falhas de mercado. Um tributo (imposto,

167
taxa, preço público ou outra modalidade de obrigação fiscal) é utilizado para pensionato com um pequeno quintal. Admita, ainda, que um deles pretenda usar
ajustar uma externalidade negativa, enquanto que os subsídios se prestam a o terreno para manter uma horta e ou outro pretenda usar o mesmo espaço para
ajustar externalidades positivas. manter uma cancha de voleibol para cujo entretenimento convidaria amigos
regularmente. Se o dono da pensão estabelecer que o direito de usar assiste ao
(ii) Persuasão
que pretende usar o terreno para produzir cultivares, a externalidade negativa
São incontáveis os casos de externalidades negativas que são impostas a terceiras está instalada, prejudicando o esportista. Entretanto, se o que vai cultivar o solo
partes por agentes econômicos que simplesmente os ignoram. Muitas soluções, resolver internalizar a externalidade por meio de um pagamento mensal que
entretanto, têm sido encontradas pela ação e capacidade de persuasão dos permita seu vizinho entrar para o quadro de associados de um clube onde possa
agentes potencialmente alvo da externalidade negativa. Nesse sentido, as praticar o voleibol e que também custeie o transporte de ida e volta ao clube
campanhas educativas, o proselitismo cívico e outras ações indutoras do deduzida amortização dos custos com a instalação do quadra (rede, postes,
convencimento dos agentes em direção a atitudes sadias, são instrumentos que, revestimento do piso e pintura dos limites da quadra), a externalidade terá
em muitos casos, induzem os agentes econômicos geradores de externalidades desaparecido.
negativas a internalizá-las.
Nesse exemplo, fica clara que qualquer que seja a definição do direito de
Essas campanhas, hoje enormemente facilitadas pelo alcance da televisão e da propriedade ― propriedade do direito de uso do espaço, no caso ― permitirá
internet, normalmente têm o apelo moral como foco, ou seja, seus argumentos que a outra parte, ou seja, a não detentora do direito, possa ser compensada pela
procuram demonstrar ao administrado a importância e o ganho coletivo de uma externalidade sofrida. A notar, é essencial a definição do direito de propriedade.
atitude correta.
(iv) Regulação

Uma solução para que externalidades sejam internalizadas, especialmente as


(iii) Reconhecimento ou estabelecimento de direitos de propriedade externalidades negativas, é a aplicação de instrumentos regulatórios, pelo
Quando um agente proprietário de um bem ou ente de prestação de serviços governo, diretamente sobre a atividade causadora de externalidades. A regulação
pode ser prejudicado pela ação de outro agente econômico, a aclaração sobre o é aplicada, em geral, a serviços públicos essenciais e têm custo elevado, uma vez
direito de propriedade do primeiro é a solução normalmente encontrada para que exige do governo um grau aprofundado de conhecimento do setor regulado.
que o agente causador da externalidade promova a internalização da A atividade requer uma atuação criteriosa do ente regulador porquanto as ações
externalidade por meio do ressarcimento do dano causado ou que pode vir a ser dos agentes econômicos, uma vez reguladas, passam a contar com dispositivos de
causado. anuência de difícil remoção mais tarde, quando se mostram inadequados.

Em alguns casos, o direito de propriedade pode ser objeto de definição quando 9.2. Variações Compensatórias como medida de convivência com as
da possibilidade ou iminência da imposição de uma externalidade. Admita-se o externalidades
exemplo de dois consumidores que sejam os únicos moradores de um mesmo

168
O conceito de externalidades, ou efeitos externos, foi inicialmente abordado em ambiente em todas as partes do mundo. Isso sugere a ocorrência do fenômenos
1925 por Alfred Marshall e posteriormente aprofundado por Pigou. Dentre da Internalização dos efeitos externos. Deve-se ressaltar também a peculiaridade
algumas das situações mais representativas de externalidades estão os efeitos que têm os efeitos externos de não estarem sob o controle das pessoas ou
danosos decorrentes dos processos produtivos industriais sobre a flora, a fauna, entidades por eles afetadas, sejam eles vantajosos ou desvantajosos.
os cursos d’água, as florestas e outros bens da natureza que, uma vez alterados
Uma solução para internalizar um efeito externo é incorporar os dois processos
em sua qualidade e em seu equilíbrio, culminam por afetar o bem-estar social.
produtivos em apenas um. No caso do exemplo mencionado do curtume e da
Se determinada fábrica, um curtume por exemplo, vier a descartar seus rejeitos, fábrica de bebidas a jusante, é como se o proprietário da empresa poluidora
sem tratamento, nas águas de um rio que sirvam à captação, a jusante, por uma viesse a adquirir a empresa prejudicada, o que, certamente, traz-lhe a
empresa de bebidas já anteriormente instalada, ter-se-á, nesse caso, bem preocupação com a poluição das águas porque prejudica a qualidade da bebida
caracterizada uma externalidade negativa imposta à empresa de bebidas, visto que ele mesmo passa, agora, a fabricar. Assim, o custo da poluição das águas
que, ao se manter constante o custo de produção de bebidas, a qualidade do deixa de ser uma externalidade imposta por uma empresa à outra, e passa a ser
produto ficará comprometida com a poluição da água provocada pela indústria um custo do conjunto das duas empresas.
que se localizou a montante. Alternativamente, o efeito externo sobre a fábrica de
A avaliação da externalidade imposta por determinado projeto pode ser medida
bebidas fica também caracterizado porque, para produzir bebidas com a mesma
de várias maneiras. A maneira mais recorrente reside no cálculo da diferença
qualidade, será necessário, agora, um custo adicional. Esse acréscimo de custo
causada ao bem-estar das pessoas, com e sem a presença de projeto causador da
representa uma estimativa da externalidade negativa causada à fabricante de
externalidade. Essa diferença deve ser convertida em valores monetários
bebidas e que deveria, a rigor, ser internalizada pela empresa causadora de tais
equivalentes à quantia que as pessoas estariam dispostas a pagar para receber
efeitos.
um certo benefício, ou que estariam dispostas a receber para aceitar sofrer os
É digno de observação, também, o caráter não intencional do efeito produzido. efeitos de uma ação externa que lhe fosse de alguma forma nociva. O pagamento
Em geral, a pessoa ou organização que empreende alguma atividade da qual ou recebimento da referida quantia faz com que o bem-estar da pessoa
resultam efeitos externos, não tem uma percepção sequer razoável dos prejuízos permaneça inalterado. Por essa razão, essas diferenças são chamadas variações
– ou benefícios, no caso de externalidades positivas – que poderão gerar para compensatórias.
terceiros. Até 1972, esses efeitos externos negativos advindos do processo
10. Preços sociais
produtivo, quando impostos ao meio ambiente por exemplo, não preocupavam
como preocupam hoje as empresas e nem costumavam fazer parte da avaliação Para efetuar a avaliação das variações compensatórias e, com isto, poder-se
econômica destas. Entretanto, deve-se admitir que nos anos recentes, essa proceder à avaliação social, convém explicitar as diferenças entre as distintas
preocupação passou a estar cada vez mais presente no planejamento empresarial categorias de preços. Particularmente, interessa conhecer o que difere um preço
e governamental, e sobretudo no planejamento do setor industrial, em social de um preço de mercado e de um preço sombra.
decorrência dos movimentos desencadeados em favor da ecologia e do meio

169
Preço social é a estimativa de preço na qual certos objetivos econômicos e sociais que corresponde à soma dos excedentes do consumidor e do produtos, além dos
são levados em consideração, isto é, é uma medida do valor real de um insumo custos de produção; (ii)o custo dos fatores e recursos envolvidos em uma
ou de um produto para a economia como um todo, em termos de objetivos mudança na produção pode ser medido através da curva de custo marginal, com
econômicos ou sociais. O preço social reflete benefícios e custos de oportunidade fatores avaliados a seus preços sociais e incluídas as externalidades. O ramo
para todo o conjunto da economia, dependendo de estimativas das elasticidades- ascendente dessa curva acima do custo variável médio se confunde com a curva
preço da demanda e da oferta bem como da divergência entre custos sociais e de oferta do bem ou serviço; e (iii)os benefícios hauridos e os custos incorridos
preços dos fatores. por cada indivíduo ou agente de produção podem ser adicionados com a
equidade social.Com base nesses pressupostos, comentam-se, nas sub-seções
Preço de mercado é o preço efetivamente praticado nas transações, resultante do
imediatamente seguintes, os resultados dos métodos de cálculo dos diversos
equilíbrio entre a demanda ordinária (marshalliana) e a oferta, correspondendo a
preços sociais.
benefícios e custos de oportunidade para as firmas e indivíduos. O preço de
mercado de certos insumos é em geral um indicador não realístico do seu valor
real, em virtude de uma série de distorções nos mercados onde esses insumos
11.1. Preço social do capital ou taxa social de desconto
são comprados e vendidos.
O preço do capital é obtido pelo custo social que o projeto causa ao mercado de
Preço-sombra é o preço que reflete o equilíbrio em concorrência perfeita em
capitais, ao captar recursos nesse mercado. Em outras palavras, o projeto
ausência de distorções da economia. Sua determinação implica conhecer a
demanda recursos de duas fontes: em primeiro lugar de outros projetos que
equação de demanda e a equação de oferta em cada momento, o que torna o
agora são inviáveis devido ao aumento da taxa de juros de mercado, e, em
processo pouco prático. O preço-sombra também é referido como preço-de-conta
segundo lugar, do aumento de poupanças provocando pelo aumento de taxa de
ou, ainda, preço-contábil.
juros. Isso quer dizer que as necessidades de capital do projeto são atendidas
12. Determinação dos Preços Sociais com uma parcela oriunda dos investimentos postergados, e a outra parcela das
poupanças adicionais, o que conduz à definição da taxa social de desconto como
Há várias metodologia para o cálculo de preços sociais, entretanto as mais
sendo igual à taxa de produtividade marginal do capital medida pela taxa de
conhecidas são da UNIDO, do Banco Mundial e de Harberger. Autores e
retorno do investimento na economia. Daí, a razão de preço social do capital é
estudiosos divergem quanto à superioridade de umas sobre as outras, inexistindo
definida pela relação entre o preço social (taxa social de desconto) e o preço de
hoje uma preferência segura da maioria por esse ou por aquele método. Neste
mercado (taxa de juros de mercado) do capital, i. e.,
curso, adotar-se-á a metodologia desenvolvida por Harberger, também conhecido
como Método da Universidade de Chicago, o qual segue o princípio básico da RPS = i*/i. Essas taxas variam de economia para economia e, dentro de cada uma,
busca do bem-estar geral, em seu curso de ação, pelos seguintes postulados: (i) pode variar de época para época. Uma coletânea dessas taxas para economias
os benefícios obtidos com o consumo de um produto ou com o emprego de um
fator podem ser medidos através da área situada por baixo da curva de demanda,

170
latinoamericanas encontra-se nos diapositivos das Figuras 03 e 04, extraídos de levar em consideração a dimensão intertemporal do consumo, associada com a
Aldunate, Eduardo73. drenagem dos montantes poupados em direção aos investimentos, processo que
ocorre sacrificando-se o consumo presente em troca de um maior consumo
futuro.
Fig. 03 – Taxa de Desconto Social em economias latinoamericanas

Fig. 04 – Taxa de Desconto Social em economias latinoamericanas

Fonte: Aldunate, Eduardo, op. cit.

Sob o prisma de visada da OCDE, a Taxa Social de Desconto corresponde à taxa de


retorno dos projetos de investimentos mais rentáveis não realizados em razão da
exaustão do volume de poupança da economia.
Fonte: Aldunate, Eduardo, op. cit.
Pelo método de Harberger, a Taxa Social de Desconto é determinada com base
nos aumentos das taxas de juros decorrentes do lançamento público de títulos 11.2. Preço social da terra:
governamentais, nas decisões de poupanças dos indivíduos e nas decisões de
investimentos das empresas. O preço social da terra é o custo alternativo desta para a sociedade, ou seja, é
quanto a sociedade é sacrificada com a utilização da área pelo projeto. O ponto
Nitidamente, qualquer que seja a abordagem, a questão se relaciona com a
de partida para o preço social da terra, P*T, é o preço de mercado das áreas
intertemporalidade da decisão econômica. Portanto, o preço do capital precisa
adjacentes e de qualidade semelhante, P T. O preço de mercado da terra
73
corresponde ao valor presente do fluxo de benefícios líquidos privados FJ (isto é, à
Aldunate, Eduardo. Políticas Orçamentárias e Gestão Pública por Resultados – Avaliação Social. ILPES/CEPAL.
2009.

171
receita bruta menos custos) menos o valor dos impostos, FJ(1-t), descontados à WNER)>=VPC, onde  é a possibilidade de um trabalhador vindo do campo
taxa privada de juros, i. Por esse mecanismo, chega-se à expressão: encontrar trabalho na cidade, que depende negativamente do número de
migrações.
P*T=PTo/[(1-t).δ],
Onde: Como a mão de obra qualificada que migra para a cidade vem do campo,
P*T é o preço social da terra; principalmente de áreas circunvizinhas, e não existe um setor não protegido na
cidade capaz de absorver o excedente de mão de obra não contratada nesta,
PTo é o preço de mercado de uma unidade de terra;
então o preço social da mão de obra não especializada na cidade corresponde ao
t é a taxa de imposto cobrado sobre o benefício líquido do uso da terra; e
salário rural (nas áreas circunvizinhas), isto é:
δ é a relação entre a taxa de desconto nsocial e a taxa de desconto privada.
WNE*= WNER

11.3. Preço social do trabalho 11.4. Preço social de um insumo básico


Em geral, o preço social da mão de obra para uma dada economia não é único, O preço social de insumo básico utilizado é soma de duas parcelas. A primeira é o
dependendo de vários fatores, tais como: qualificação do trabalhador, a região e custo unitário para os antigos consumidores desse insumo por terem de reduzir o
as características do projeto. Enquanto o preço social do trabalho especializado seu consumo devido ao aumento do preço de mercado causado pela chegada do
WE*, corresponde ao salário de mercado, WE, isto é: projeto. A segunda parcela é o custo de oportunidade unitário para a sociedade,
WE*=WE, por ter de dispor de recursos produtivos para produzir uma quantidade adicional
do insumo. Essas parcelas, quando explicitadas em termos de elasticidades, dão
o preço social da mão de obra não especializada, W NE* depende, em geral de se o lugar à seguinte expressão para o preço social de um insumo básico:
projeto se localiza no setor urbano ou rural, bem como se este absorve
trabalhadores do setor rural ou do setor tradicional urbano. O salário social P*x =Px[|e d|+(1+)e]/(|e d|+es)
normalmente é mais baixo na área rural do que nos centros urbanos. Onde:

O preço social do trabalho não especializado deve levar em consideração a ed é a elasticidade-preço da demanda;
migração campo-cidade que existe motivada por salários mais altos nesta última es é a elasticidade-preço da oferta desse insumo;
(setor moderno protegido) WNEC, em relação ao salário no setor rural, W NER. É Px é o preço de mercado do insumo; e
exatamente a diferença positiva de salários entre a cidade e o campo (i. é, W NEC –  é a proporção de aumento da produção do insumo na região do projeto.
WNER> 0) que fará com que haja a migração. Um emigrante em potencial só se
desloca do campo para o cidade se o valor presente do diferencial de salários 11.5. Preço social da energia
esperados, VP (WNEC-WNER), for pelo menos igual ao valor presente dos custos de
migração e demais desvantagens do emprego na cidade, VPC isto é, se VP (W NEC-

172
O preço social da energia elétrica P e** depende, de um lado do sistema utilizado Há projetos que utilizam insumos que são produzidos no país para serem
para geração e, de outro, do período de utilização da energia, dentro e fora de exportados, e insumos produzidos em outros países que precisam ser
ponta. Se g for o percentual de ponta, então o seu preço social pode ser importados. Frequentemente, ocorre apenas uma dessas duas situações em um
determinado por: mesmo projeto.

Pe**=gPeP+(1-g)PeFP, Insumos que são exportados geram divisas para o país, enquanto que insumos
importados demandam divisas e insumos que substituem importações liberam
Onde:
divisas. Essas três condições são a base da análise social do câmbio.
PPe e PFPe são os custos (tarifas) marginais sociais por quilowatt-hora dentro e fora Adicionalmente, se há subsídios ou tributos às importações ou às exportações, o
da ponta. valor privado da divisa afastar-se-á do valor social desta. Mas não é somente na
fase da produção que o câmbio afeta a análise social. Muitos projetos também
Considerando a predominância, no Brasil, da geração hidrelétrica, então o custo
são de firmas exportadoras, isto é, atraem divisas para a economia do país
marginal social de energia nos períodos de consumo fora de ponta, é
praticamente nulo, isto é: Sem preocupação de modelar o cálculo do preço social do câmbio, apresentam-
se, no diapositivo da Figura 05, alguns exemplos de economias sulamericanas. No
PeFP=0,
Brasil, estudos anteriores indicaram que a taxa social de câmbio se situava entre
enquanto que este custo nos períodos de consumo de ponta é igual ao valor que 16% e 29% acima da taxa privada de câmbio, a depender do autor e sua
permite cobrir os custos de ampliação da capacidade do sistema. Dessa forma, o abordagem.
preço social da energia elétrica pode ser escrito da forma seguinte: Fig. 05 – Algumas RPS de câmbio em economias sulamericanas

Pe**=gPeP

Algumas dificuldades se apresentam para o cálculo de P eP (custo marginal social


de energia no período de consumo de ponta), pois as empresas geradoras de
energia elétrica cobram uma tarifa positiva, mesmo no período de capacidade
ociosa, o que representa um custo privado, porém não social. Além disso, as
tarifas brasileiras de energia elétrica são diferenciadas por classes de
consumidores.

11.6. Preço social da taxa de câmbio

Fonte: Aldunate, Eduardo (op. cit.)

173
A política cambial de um país pode sofrer alterações para adequar-se a novas Discriminação Custo (u.m.) RPS
Terrenos 20.000 0,70
circunstâncias do mercado externo e mesmo do mercado interno quando uma Construção civil (basicamente o cimento) 118.000 0,50
possível porta de saída é aumentar exportações. São inúmeros os aspectos a Mão de obra não especializada 95.000 0,20
Encargos sociais e trabalhistas 95.000 0,00
considerar na política cambial e praticamente todos afetam a taxa social de Remuneração dos fatores de produção 24.000 0,80
câmbio. Os custos operacionais do projeto ao longo dos nove anos restantes do horizonte
temporal do projeto são dados no quadro da Figura 07, acompanhados das
razões de preços sociais a considerar.
A oferta de dólares tanto quanto a demanda por dólares geram custos sociais e
fazem parte dessa política. De outro lado, câmbio e inflação se relacionam e,
Fig. 07 – Custos operacionais do projeto
Discriminação\ Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 Ano 6 Ano 7 Ano 8 Ano 10 RPS
neste caso, a análise do preço social da taxa de câmbio deve levar em Período
Mão de obra 4.000 4.000 3.500 3.500 3.000 3.000 3.000 3.000 3.000 1,00
consideração os efeitos sobre a estabilidade dos preços internos. especializ.
Mão de obra n- 20.000 18.000 18.000 17.000 16.000 12.000 12.000 12.000 10.000 0,20
especializ
12. Breve estudo de caso: um projeto pecuário fictício Encargos sociais 24.000 22.000 21.500 20.500 19.000 15.000 15.000 15.000 13.000 0,00
e trab.
O Projeto Pecuário Fictício – PPF ocupa uma área de 20 mil hectares em uma Energia elétrica 1.000 1.000 1.100 1.100 1.200 1.200 1.200 1.200 1,300 0,30
Medicamentos 500 500 500 500 500 500 500 500 500 0,60
região semiárida, abriga 200 famílias de baixa renda e tem por objetivo fortalecer p/gado
a atividade pecuária como meio de combater a pobreza rural por meio da
assistência ao pequeno produtor.
As receitas anuais do projeto são apresentadas no quadro da Figura 08.
Não há viabilidade de desenvolver-se atividade agrícola na região em função da Fig. 08 – receitas do projeto
climatologia e da baixa fertilidade dos solos. O programa prevê a construção e Discriminação\ Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 Ano 6 Ano 7 Ano 8 Ano 9 Ano
Período 10
manutenção de reservatórios de água e de instalações para satisfazer às Venda de 20.000 22.000 22.000 22.000 25.000 28.000 28.000 28.000 30.000
touros
necessidades de seus habitantes e da atividade pecuária. Venda de 30.000 35.000 35.000 35.000 40.000 40.000 40.000 40.000 40.000
bezerros
As expectativas em torno do projeto incluem (i) aumentar a produção pecuária na Manutenção 2.000 2.000 2.000 2.500 2.500 2,5000 3.000 3.000 3.000
de reservat.
região; (ii) melhorar as condições sanitárias do gado; (iii) formar uma cooperativa Assistência a 5.000 5.700 5.700 5.700 6.500 6.800 6.800 6.800 7.000
animal
de colonos; e (iv) melhorar o nível da qualidade de vida das 200 famílias.
Os benefícios sociais incluem o desligamento de duzentas pessoas do programa de
O horizonte temporal da análise é de dez anos, sendo o primeiro reservado para a
salário desemprego que paga 80 u.m. por ano a cada família. Além disso, a perda
implantação do empreendimento, e os nove restantes de operação efetiva. Os
de plantel de criação que o projeto deverá evitar corresponde a 10% do valor
custos com a implantação no primeiro ano e as razões de preços sociais (RPS) a
comercial do animal, previsto no quadro de receitas anuais.
adotar são dados no quadro da Figura 06.
Fig. 06 – Custos de implantação e RPSs

174
Por fim, observa-se que o empreendimento produzirá uma externalidade que é a Fig. 10 – Custos privados operacionais
decisão do governo, não prevista anteriormente, de asfaltar, em decorrência do Discriminação\ Período
Mão de obra especializ.
Ano 2
4.000
Ano 3
4.000
Ano 4
3.500
Ano 5
3.500
Ano 6
3.000
Ano 7
3.000
Ano 8
3.000
Ano 9
3.000
Ano 10
3.000
projeto, uma estrada que liga dois municípios importantes e que passa nas Mão obra n-especializ 20.000 18.000 18.000 17.000 16.000 12.000 12.000 12.000 10.000
Encargos sociais e trab. 24.000 22.000 21.500 20.500 19.000 15.000 15.000 15.000 13.000
imediações do empreendimento. Essa estrada trará inúmeros benefícios para a Energia elétrica 1.000 1.000 1.100 1.100 1.200 1.200 1.200 1.200 1,300
Medicamentos p/gado 500 500 500 500 500 500 500 500 500
região como a economia de combustível e, em conseqüência, dos preços dos bens Tot anual custos soc 49.500 45.500 44.600 42.600 39.700 31.700 31.700 31.700 27.800

e serviços transportados, além da economia de tempo no deslocamento de pessoas


As receitas privadas foram dadas na terceira tabela do enunciado e aparecem no
e cargas, aumento da vida útil da frota, entre outros benefícios.
quadro da Figura 11 já totalizadas em confronto com os custos anuais privados da
A construção dessa rodovia, não prevista anteriormente como referido, nos planos tabela imediatamente anterior. Desse confronto resultam o fluxo líquido anual,
governamentais, é tomado como uma externalidade positiva estimada em 200.000 mostrado no mesmo quadro da referida Figura 11.
u.m. já apropriada no segundo ano de vida do projeto agropecuário. Para a
Fig. 11 – Receitas privadas, totais e fluxo líquido de receitas
avaliação do mérito do empreendimento, é necessário calcular o VPL privado, o VPL
Discriminação\ Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 Ano 6 Ano 7 Ano 8 Ano 9 Ano 10
social, a TIR privada e a TIR social, considerando os elementos dados e que as taxas Período
de desconto privada e social sejam, respectivamente, 12% a.a. e 16% a.a.. O Receita privada anual
Custo privado anual
57.000
49.500
64.700
45.500
64.700
44.600
65.200
42.600
74.000
39.700
74.803
31.700
77.800
31.700
77.800
31.700
80.000
27.800
estudo, a partir deste ponto, resume-se aos cálculos desses indicadores. Fluxo líq. priva. anual 7.500 19.200 20.100 22.600 34.300 43.103 46.100 46.100 52.200

Em seguida, por meio de planilha Excel, determinam-se o VPL priv e a TIRpriv. São os
Solução seguintes os dados de entrada:
Os custos privados dos investimentos, isto é, os custos dos investimentos a valor (i) Para o VPLprivado (0,12;-
de mercado, totalizam 352.000 u.m., resultado da soma dos custos de terrenos, 352.000;7.500;19.200;20.100;22.600;34.300;43.103;46.100;46.1000;52.200);
construção e outros da primeira tabela do enunciado, como mostrado no quadro e
da Figura 09. (ii) Para a TIRpriv: (-
Fig. 09 – Cálculo dos investimentos 352.000;7.500;19.200;20.100;22.600;34.300;43.103;46.100;46.1000;52.200).
Discriminação Custo (u.m.) Os resultados obtidos são:
Terrenos 20.000
Construção civil (basicte o cimento) 118.000 VPLsoc=-180.117,62
Mão de obra não especializada 95.000
TIRsoc=-3,00%
Encargos sociais e trabalhistas 95.000
Remuneração dos fatores de produção 24.000 Os custos sociais de investimentos são obtidos multiplicando-se cada
Custos com investimentos 352.000 especificação de custo da primeira tabela por sua respectiva razão de preço
Os custos privados operacionais constam da segunda tabela dada no enunciado social. Os resultados são mostrados no quadro da Figura 12.
reproduzida no quadro da Figura 10 tendo-se acrescentado os totais anuais.

175
Com os totais de receita e custo sociais, calculam-se os fluxos líquidos anuais e,
Fig. 12 – Custos sociais dos investimentos empreendimento em seguida, por meio de planilha Excel o VPL soc e a TIRsoc. São os seguintes os
Discriminação Custo (u.m.) RPS Custo social (u.m.)
Terrenos 20.000 0,70 14.000
dados de entrada:
Construção civil (basicte o cimento) 118.000 0,50 59.000
Mão de obra não especializada 95.000 0,20 19.000 (iii) Para o VPLsoc:
Encargos sociais e trabalhistas 95.000 0,00 0,00 (0,16;-;33.470;34.840;37.590;50.840;60.523;63.820;63.820;71.809); e
Remuneração dos fatores de produção 24.000 0,80 19.200
Custos com investimentos 352.000 --- 111.200 (iv) Para a TIRsoc:
Os custos sociais resultam do produto de cada especificação de custo multiplicada (111.200;220.600;33.470;34.840;37.590;50.840;60.523;63.820;63.820;71.809).
por sua respectiva razão de preço social (RPS). Esse cálculo produziu os resultados Os resultados obtidos são:
constantes do quadro da Figura 13. VPLsoc=413.034,17
Fig. 13 – Custos sociais da operação do empreendimento TIRsoc=191,73%.
Discriminação\ Período Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 Ano 6 Ano 7 Ano 8 Ano 9 Ano 10
Mão de obra especializ. 4.000 4.000 3.500 3.500 3.000 3.000 3.000 3.000 3.000 A análise dos resultados permite constatar que o empreendimento é do tipo I
Mão obra n-especializ 4.000 3.600 3.600 3.400 3.200 2.400 2.400 2.400 2.000
Encargos sociais e trab. 0 0 0 0 0 0 0 0 0 (vide seção 4). Conforme se percebe, os resultados sociais são bastante
Energia elétrica 300 300 330 330 360 360 360 360 390
Medicamentos p/gado 300 300 300 300 300 300 300 300 300 favoráveis, o que é indicativo de que o empreendimento reúne o mérito para, por
Tot anual custos soc 8.600 8.200 7.730 7.530 6.860 6.060 6.060 6.060 5.690
exemplo, contar com apoio financeiros de órgãos oficiais de governo, uma vez
Os benefícios sociais resultam da adição do faturamento previsto da cooperativa que opera em favor do bem ester social, ao mesmo tempo em que atrai o capital
com o ganho social da exclusão dos colonos do auxílio-desemprego (valores privado.
anuais iguais) mais uma segunda parcela correspondente ao plantel preservado
REFERÊNCIAS UTILIZADAS NESTE CAPÍTULO:
na base de 10% do valor comercial deste, calculado ano a ano, e acrescido ainda ALDUNATE, Eduardo. Políticas Orçamentárias e Gestão Pública por Resultados – Avaliação Social.
da externalidade de 200 mil u.m.. Esses cálculos, elaborados em Excel, são ILPES/CEPAL. 2009.
CONTADOR, Cláudio Roberto. Projetos Sociais: Avaliação e Prática. ATLAS. São Paulo. 2000.
demonstrados no quadro da Figura 14.

Fig. 14 – Benefícios sociais


Discriminação\ Período Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5 Ano 6 Ano 7 Ano 8 Ano 9 Ano 10
Venda de touros 20.000 22.000 22.000 22.000 25.000 28.000 28.000 28.000 30.000
Venda de bezerros 30.000 35.000 35.000 35.000 40.000 40.000 40.000 40.000 40.000
Manut reservat. 2.000 2.000 2.000 2.500 2.500 2,5000 3.000 3.000 3.000
Assist a animal 5.000 5.700 5.700 5.700 6.500 6.800 6.800 6.800 7.000
Dispensa aux-desempr 16.000 16.000 16.000 16.000 16.000 16.000 16.000 16.000 16.000
Ganho preserv plantel 5.700 6.470 6.470 6.520 7.400 7.480,25 7.780 7.780 8.000
Externalidade (rodovia) 200.000 0 0 0 0 0 0 0 0
Receita social total 278.700 87.170 87.170 87.720 97.400 98.283 101.580 101.580 104.000

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