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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

UNIDADE ACADÊMICA DE SERRA TALHADA


Licenciatura plena em Letras (Português/Inglês)
Linguística II - Professora: Dorothy Brito

O primeiro pós-saussuriano: Charles Bally1

Charles Bally, profundo conhecedor de grego e sânscrito, fez do francês o alvo de


suas reflexões sobre estilística. O seu interesse pela enunciação está registrado no prefácio
que faz, com Albert Sechehaye, ao Curso de Linguística Geral (CLG), em que aponta que “a
ausência de uma ‘Linguística da fala’” torna o CLG incompleto.

Charles Bally não foi apenas um discípulo de Saussure, foi o primeiro linguista a
formular um raciocínio voltado à enunciação. Na sua obra Traité de stylistique française,
Bally propõe que a estilística deixe de ser normativa para tornar-se descritiva, para ser uma
estilística da língua, propriamente linguística, e não somente da literatura ou dos escritores.
Essa distinção é importante porque enfatiza o fato de que não se trata de estudar o estilo
artístico pessoal, mas o uso da língua para a expressão dos sentimentos.

 “a estilística abarca toda a linguagem. Todos os fenômenos linguísticos, desde os


sons até as combinações sintáticas mais complexas podem revelar algum caráter
fundamental da língua estudada.” (BALLY)

Para Bally, a estilística deve se preocupar com a presença da enunciação no enunciado


e não apenas com o enunciado propriamente dito.

 Efeitos naturais – a informação sobre os sentimentos experienciados pelo locutor,


normalmente marcados na escolha lexical;
 Efeitos de evocação do meio – a informação sobre o seu meio linguístico, ou seja,
certas palavras e/ou construções sintáticas que podem ser percebidas como
identificadoras do meio no qual são mais frequentes.

A estilística de Bally é um estudo que busca, na investigação dos processos linguísticos


por intermédio dos quais o falante se expressa, dar conta do caráter coletivo da
expressividade linguística. Bally também demonstrava grande interesse pelas questões
pedagógicas do ensino de língua materna, reforçando o caráter pedagógico da estilística,
mostrando a inadequação do estudo da linguagem baseado em noções como a de “certo” e
“errado”.

1
Notas extraídas de FLORES, Valdir do Nascimento; TEIXEIRA, Marlene. Introdução à linguística da
enunciação. São Paulo: Contexto, 2005, p.15-19.
A partir da oposição saussuriana entre língua e fala, Bally considera que a língua,
como padrão linguístico, é a base para o discurso, opondo a virtualidade da língua à
realização da fala.

 “o próprio da linguagem humana é ser falada por sujeitos, situados hic et nunc,
que não se contentam com exprimir um conteúdo representativo, mas atribuem
um ponto de vista sobre esse conteúdo”. (AUROUX, 1998, p.42)

Para Bally, a frase comporta um dictum correlativo dessa representação e um modus


correlativo à avaliação modal de quem fala.

ORAÇÃO = DICTUM + MODUS

 Dictum – base da oração


 Modus – operação do falante sobre o dictum

Assim, o que são enunciado e enunciação para Bally, e que noção de sujeito está aí
implicada?

 Enunciado: “a analisibilidade em dictum + modus é constitutiva de qualquer


enunciado linguístico e, logo, de qualquer comunicação em língua natural”
(AUROUX, 1998, p. 43).
 Enunciação: conversão do estudo lógico da frase em análise que considera o
sujeito que fala.
 Sujeito: há o sujeito falante manifestado explicitamente (modus em que o
sujeito se identifica ao sujeito falante) e há o sujeito implícito (modus
implícito), ou seja, há o sujeito falante e o sujeito modal.

A teoria de Bally integra ao estudo da língua o contexto linguístico. A língua, para o


autor, é conceito oriundo daquele formulado no CLG, mas com outra amplitude já que leva
em consideração a atividade do sujeito falante:

“[...] se a língua é o acervo dos signos e das relações entre os signos, enquanto todos
os indivíduos lhes atribuem os mesmos valores, a fala é o funcionamento desses signos e de
suas relações para expressar o pensamento individual: é a língua em ação, a língua
realizada” (BALLY)

Assim, se a estilística estuda os fatos da expressão do ponto de vista de seu conteúdo


afetivo, então a subjetividade, pensada em termos de emotividade, está inscrita na língua
e, em especial, na língua falada em situações concretas de comunicação.

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