Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1
UNIDADE 1 – ARCABOUÇO JURÍDICO
Objetivo da unidade
Ao final desta unidade, você será capaz de:
Conceituar o direito internacional enumerando suas fontes e entender a
responsabilidade dos Estados no âmbito internacional;
Conceituar o Direito Internacional Humanitário, identificar suas principais
normas, entender seus princípios e explicar os âmbitos de sua aplicação; e
Conceituar o Direito Internacional dos Direitos Humanos, explicar suas
características bem como sua relação com o trabalho policial e identificar os
principais instrumentos e normas internacionais.
Esta unidade está dividida nas seguintes aulas:
Aula 1 – Direito Internacional: conceito, fontes e responsabilidade dos Estados;
Aula 2 – Direito Internacional Humanitário;
Aula 3 – Direito Internacional dos Direitos Humanos.
1
Expressão latina, comumente empregada na terminologia do direito para exprimir tudo o que se faz ou se
resolve, "segundo a equidade e o bem". Assim, decidir ou julgar ex aequo et bono, significa decidir ou julgar por
equidade.
3
sobre estas: os princípios gerais do direito reconhecidos pelas nações civilizadas; as decisões
judiciais de cortes e tribunais internacionais; os ensinamentos dos publicistas mais
altamente qualificados das várias nações e as resoluções da Assembleia Geral da ONU.
De acordo com Rover (2005), a importância legal das resoluções da Assembleia Geral
da ONU é cada vez mais um assunto em debate. No que diz respeito ao funcionamento
interno da ONU, essas resoluções possuem efeito jurídico pleno. A questão que permanece,
no entanto, é até que ponto tais resoluções são legalmente obrigatórias aos Estados
Membros, principalmente àqueles que votaram contra as mesmas.
Os critérios importantes para se determinar a obrigatoriedade subsistem no grau de
objetividade que cerca a adoção das resoluções e, ainda mais importante, até que ponto
uma resolução pode ser considerada a expressão da consciência legal da humanidade
como um todo. Este último aspecto é ainda mais importante do que a maioria dos Estados
simplesmente adotar a resolução. As resoluções emanadas da Assembleia Geral estão
recebendo um apoio cada vez maior por parte de escritores e publicistas como um meio
subsidiário para se determinar estados de direito.
RESPONSABILIDADE DOS ESTADOS
Uma vez que um Estado assume obrigações no âmbito da comunidade internacional,
por exemplo, assinando e ratificando tratados, convenções e protocolos, muitas vezes isso
significa que concordou em cumprir suas obrigações de maneira específica (assegurando
que seu governo, sua constituição e suas leis o possibilite a cumprir suas obrigações
internacionais).
Frequentemente é esse o caso na área dos direitos humanos, onde os Estados
assumiram a responsabilidade de fazer com que certas condutas sejam consideradas crimes,
como por exemplo, a tortura e o genocídio, e de puni-las por meio de seus sistemas jurídicos
nacionais.
Um Estado não pode alegar disposições em sua Constituição ou legislação nacional como escusa
para furtar-se a cumprir suas obrigações perante o direito internacional.
Em direito internacional, a responsabilidade surge a partir da violação de qualquer
obrigação devida às normas internacionais ratificadas. Assim, todo ato ilícito internacional
por parte de um Estado resulta na responsabilidade internacional daquele Estado. Este é
tido como real quando:
A conduta resultante de uma ação ou omissão é atribuível (imputável) ao
Estado perante o direito internacional; e
4
A conduta resulta na violação de uma obrigação internacional daquele Estado.
A responsabilidade existe nos casos onde o próprio Estado - por intermédio dos
poderes Legislativo, Executivo ou Judiciário, suas normas ou atos de qualquer outra
autoridade - é o perpetrador e em situações onde a conduta de uma pessoa ou órgão pode
ser imputada a esse Estado. O Estado não é responsável perante o direito internacional pela
conduta de uma pessoa ou grupo de pessoas que não agem em seu nome.
É um princípio do direito internacional que qualquer inobservância ou violação de um
compromisso resulta na obrigação de fazer uma reparação.
A reparação deve, tanto quanto possível, eliminar todas as consequências do ato
ilegal, e restaurar a situação que teria existido, com toda a probabilidade, não fosse o ato
cometido.
6
também distinguir entre objetivos militares (que podem ser atacados) e bens
de caráter civil (que não podem ser atacados).
Proporcionalidade: quando são atacados objetivos militares, as pessoas civis
e os bens de caráter civil devem ser preservados o melhor possível de danos
colaterais. Não devem ser excessivos os danos colaterais com respeito à
vantagem militar direta e concreta esperada de qualquer ataque contra um
objetivo militar.
Boa fé: deve prevalecer a boa fé nas negociações entre as partes beligerantes.
A essência do direito da guerra abrange:
Atacar somente alvos militares;
Poupar pessoas e objetos sujeitos à proteção que não contribuam com o
esforço militar;
Não usar mais força do que o necessário para cumprir sua missão militar.
O DIH está dividido em Direito de Genebra e Direito de Haia.
Direito de Genebra
O Direito de Genebra trata da proteção das vítimas de guerra, sejam elas militares
ou civis, na água ou em terra. Protege todas as pessoas fora de combate, isto é, que não
participam ou não estão mais participando nas hostilidades: os feridos, os doentes, os
náufragos e os prisioneiros de guerra. As quatro Convenções de Genebra de 12 de Agosto
de 1949 constituem o conjunto dessas normas de proteção.
O Brasil ratificou as quatro Convenções em 29 de junho de 1957.
A Primeira Convenção de Genebra visa melhorar a situação dos feridos e doentes das
Forças Armadas em campanha.
A Segunda Convenção de Genebra visa melhorar a situação dos feridos, doentes e
náufragos das Forças Armadas no mar.
A Terceira Convenção de Genebra é relativa ao tratamento dos prisioneiros de
guerra. A Quarta Convenção de Genebra protege a população civil em tempo de guerra.
O Artigo 3º - comum a todas as quatro Convenções de 1949, tem sido chamado de
uma «mini-convenção» por direito próprio, pois contém regras que são aplicáveis não só a
conflitos internacionais, mas também a conflitos internos.
Essas regras são hoje consideradas como sendo regras do direito internacional
consuetudinário, isto é, uma coisa à qual os beligerantes estão obrigados,
independentemente das obrigações que eles possam ter em relação a tratados. Elas
7
representam um mínimo que tem de ser observado em todas as circunstâncias.
O Direito de Haia
O direito de Haia preocupa-se mais com a regulamentação dos métodos e meios de
combate, e concentra-se na condução das operações militares. O direito de Haia é, portanto,
de interesse fundamental ao comandante militar em terra, mar e ar.
São exemplos atuais do direito de Haia, e suas ratificações pelo Brasil:
Convenção sobre a proibição do desenvolvimento, produção, e destruição de
armas biológicas e tóxicas (1972) – Brasil: 27 de fevereiro de 1973.
Convenção sobre proibições e restrições do emprego de certas armas
convencionais que causam danos excessivos (1980) – Brasil: 03 de outubro de
1995.
Convenção sobre a proibição do emprego, armazenamento, produção e
transferência de minas antipessoal e sua destruição (Tratado de Ottawa –
1997) – Brasil: 30 de abril de 1999.
A aplicação do DIH em tempo de conflito armado é necessária, pois:
Obriga juridicamente aos Estados e aos indivíduos nos Estados;
As graves violações do DIH são consideradas crimes de guerra que podem ser
julgados perante tribunais, nacionais ou internacionais;
Você quer conhecer mais sobre o Direito Internacional Humanitário? Acesse o site do
Comitê Internacional da Cruz Vermelha no endereço: < https://www.icrc.org/pt >.
9
Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as
Mulheres (disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4377.htm) –
ratificada pelo Brasil em 01 de fevereiro de 1984;
Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, (disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0040.htm) – ratificada pelo
Brasil em 28 de setembro de 1989;
Convenção sobre os Direitos da Criança (disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm) – ratificada pelo
Brasil em 24 de setembro de 1990;
Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados (disponível
em http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1960-1969/decreto-50215-28-janeiro-
1961-389887- publicacaooriginal-1-pe.html ) – ratificada pelo Brasil em 15 de novembro de
1960;
Protocolo Facultativo ao Estatuto dos Refugiados (disponível em
http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=96932&norma=121310) -
aderido pelo Brasil em 07 de abril de 1992.
Os funcionários encarregados de aplicar as leis devem estar familiarizados com os
relevantes sistemas de tratados regionais sobre Direitos Humanos, a saber:
A Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos (disponível em
http://www.gddc.pt/direitos- humanos/textos-internacionais-dh/tidhregionais/carta-
africa.html);
A Convenção Americana dos Direitos Humanos (disponível
em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm) - aderida pelo Brasil em 25
de setembro de 1992;
A Convenção Europeia sobre a Proteção dos Direitos Humanos e das Liberdades
Fundamentais (disponível em http://www.echr.coe.int/Documents/Convention_POR.pdf).
Para aprofundar seus estudos, você pode acessar as páginas eletrônicas dos
seguintes órgãos internacionais e nacionais: ONU, ACNUR e MRE.
10
UNIDADE 2 - PREMISSAS BÁSICAS NA APLICAÇÃO DA LEI
Objetivo da unidade
Ao final desta unidade, você será capaz de:
Compreender o significado de “Estado de direito”;
Apontar as funções e os deveres dos encarregados da aplicação da lei;
Compreender a importância do código de conduta para os encarregados pela
aplicação da lei; e
Compreender a importância de adotar padrões de policiamento que sejam
condizentes com a ordem democrática, bem como com a promoção e
proteção dos direitos humanos.
O conteúdo desta unidade está dividido nas seguintes aulas:
Aula 1 – Aplicação da lei nos Estados democráticos;
Aula 2 – Conduta ética e legal da aplicação da lei.
11
O respeito absoluto pela liberdade de todas as pessoas na jurisdição do
Estado;
A eleição dos governantes pelo voto popular;
A divisão de poderes;
A responsabilidade dos governantes;
O pluralismo político.
O Estado de Direito e a democracia são pilares fundamentais da vigência dos
direitos humanos, tornando esses dois conceitos indissolúveis e interdependentes.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 1°,
estabelece que o Estado Brasileiro constitui-se em Estado Democrático de Direito, tendo
como fundamentos:
A soberania;
A cidadania;
A dignidade da pessoa humana;
Os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
O pluralismo político.
Acrescenta, ainda, em seu Parágrafo único que:
“Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos
ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Da mesma forma, o artigo 21 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH),
estipula que: “A vontade do povo é o fundamento da autoridade do governo”, e
complementa:
“(...); esta vontade será expressa em eleições periódicas e legítimas, por sufrágio
universal, por voto secreto ou processo equivalente que assegure a liberdade de voto.”
“Toda pessoa tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou
por intermédio de representantes livremente escolhidos”.
“Toda pessoa tem igual direito de acesso ao serviço público do seu país.”
A existência do estado de direito e o respeito por ele origina uma situação onde os
direitos, liberdades, obrigações e deveres estão incorporados na lei para todos, em plena
igualdade, e com a garantia de que as pessoas serão tratadas equitativamente em
circunstâncias similares (ROVER 1998, p. 143)
Esse aspecto fundamental pode ser encontrado no artigo 26 do Pacto Internacional
dos Direitos Civis e Políticos, que estipula que Todas as pessoas são iguais perante a lei e
12
têm direito, sem discriminação, à igual proteção da lei ..., bem como no caput do artigo 5º
de nossa Constituição Federal:
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se
aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. (Grifo nosso)
Você pode perceber que esses ideais são interdependentes e fundamentais para que
os direitos humanos sejam melhor protegidos pelo processo democrático e pela aplicação da
lei.
Democracia e direitos humanos caminham juntos. “Não há democracia sem direitos
humanos e não há direitos humanos sem democracia” (PIOVESAN, 2003).
APLICAÇÃO DA LEI
Ao Estado incumbe promover o bem comum, sendo essencial, para isso, a ordem
pública, que se dá por meio dos seus aspectos de salubridade, tranquilidade e segurança.
Este último aspecto objetiva a não ocorrência de delitos.
Para a manutenção dessa situação antidelitual, o Estado confere investidura pública
aos órgãos encarregados de aplicar a lei e a seus agentes, para agir em seu nome.
A principal missão dos órgãos encarregados de aplicar a lei é para servir à
comunidade, protegendo as pessoas contra atos ilegais, sendo suas responsabilidades
básicas:
Prevenir e detectar o crime;
Manter a ordem pública e a segurança; e
Proporcionar assistência a pessoas em situações de emergência.
Essas funções integradas devem garantir a segurança das pessoas que vivem no
território do Estado.
O processo de fazer cumprir as leis é levado a cabo pelos funcionários encarregados
pela aplicação da lei (FEAL), que podem ser agentes da polícia, gendarmeria, guarda
municipal ou outras denominações equivalentes. No entanto, em situações específicas, as
forças militares também podem ser chamadas para cumprir com tais obrigações.
Como ensina Osse (2007, pg. 49), para garantir a segurança, os agentes de segurança
pública podem legitimamente restringir os direitos dos indivíduos, o que é chamado de
obrigações negativas; mas os agentes de segurança pública também têm a obrigação
positiva de contribuir com um ambiente no qual as pessoas se sentem livres e seguras. Para
cumprir essa missão, são outorgados aos agentes de segurança pública os seguintes poderes
13
básicos: de prisão, de detenção, de uso da força e armas de fogo.
No entanto, esses poderes não são ilimitados. No cumprimento da sua missão,
agentes de segurança pública devem agir de acordo com os parâmetros da lei do Estado, que
deve ser coerente com as normas internacionais estabelecidas em instrumentos
internacionais de direitos humanos.
Conforme Vianna (2001, pg.16), os poderes de prisão, de detenção, de uso de força e
armas de fogo são meios poderosos na missão de aplicação da lei. Paradoxalmente esses
poderes também podem acarretar grandes riscos, uma vez que seu uso indevido pelos
agentes de segurança pública pode violar os direitos que devem manter e defender.
Infelizmente, muitas vezes ocorre o uso indevido desses poderes em todo o mundo.
Como as práticas ilegais ou inaceitáveis de aplicação da lei, pode-se citar: prisão ou detenção
arbitrária ou ilícita, manipulação de provas, uso excessivo da força e maus-tratos e tortura de
pessoas detidas.
Independentemente do nível que ocupam na estrutura de suas instituições, os FEAL
devem assumir responsabilidades corporativas e entender que são pessoalmente
responsáveis por suas ações. Os FEAL com responsabilidade, comando e gestão – tema que
será abordado adiante – podem realizar mudanças estruturais, como mecanismos de
controle e vigilância, e têm a responsabilidade adicional de evitar que outros funcionários
violem os direitos humanos.
Nos estados democráticos de direito, os organismos encarregados de aplicação da lei
devem agir em conformidade com o marco legal, de forma ética e render contas à sociedade
que servem.
15
esses padrões de conduta deixam de ter valor prático, a não ser que o seu conteúdo e
significado - através de educação, treinamento e acompanhamento - passem a fazer parte
da crença de cada indivíduo encarregado da aplicação da lei.
O Código consiste em oito artigos, acompanhados por seus respectivos comentários
explicativos.
O artigo 1o estipula que “os encarregados da aplicação da lei devem sempre cumprir o dever
que a lei lhes impõe (...)”
Nos parágrafos a. e b. dos comentários do Artigo 1, a seguinte definição é fornecida:
O termo ‘Funcionários Encarregados pela Aplicação da Lei’ inclui todas as autoridades
legais, tanto nomeadas quanto eleitas, que exercem poderes policiais, especialmente
poderes de prisão e de detenção.
Nos países onde os poderes policiais são exercidos por autoridades militares, quer
estejam uniformizadas ou quer não, ou por forças de segurança do Estado, a definição de
Funcionários Encarregados pela Aplicação da Lei deve ser considerada incluindo as
autoridades desses tais serviços.
16
ser usadas, a não ser quando um cidadão suspeito oferece uma resistência armada ou,
ainda, coloca em risco a vida de outras pessoas, e que medidas menos extremas não são
suficientes para detê-lo ou apreendê-lo. O mesmo parágrafo obriga à rápida apresentação de
um relatório às autoridades competentes cada vez que uma arma de fogo é utilizada pela
polícia.
As normas sobre o uso da força pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei,
incorporadas no artigo e nos comentários, reiteram a importância dos princípios de
proporcionalidade (a força sendo usada somente até a necessária extensão) e da
necessidade (a força sendo usada somente quando é estritamente necessária).
O terceiro parágrafo dos Comentários exclui a utilização das armas de fogo por
qualquer outra razão que não seja a legítima defesa. O significado da exigência, como
expressa naquele parágrafo, pela qual um relatório deve ser apresentado quando uma arma
de fogo é disparada por um policial, é parte do processo para assegurar uma
responsabilidade efetiva da polícia para com seus atos. Não se trata de uma mera
formalidade. É de fato um elemento importante na investigação obrigatória que segue uma
morte causada por uma autoridade policial, e pode agir como uma dissuasão contra o uso
ilegítimo de armas de fogo pela polícia.
Como se verifica, o poder do uso da força e emprego de armas de fogo pelos FEAL têm
implicações de grande alcance e profundidade e, por essa razão, foi elaborado um
instrumento internacional específico que estabelece princípios para seu emprego. Este
documento, denominado Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo foi
adotado pelo Oitavo Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o
Tratamento de Infratores em 07 de setembro de 1990.
17
desumano ou degradante.
Econômico e Social das Nações Unidas, em 24 de maio de 1989, por ocasião de sua 15a
sessão plenária, adotou os Princípios Orientadores para a Aplicação Efetiva do Código de
Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, que prevê uma série de
providências, dentre as quais se destacam:
Os princípios consagrados no Código deverão ser incorporados na legislação e
práticas nacionais [...]
Os Governos devem adotar as medidas necessárias para que os funcionários
responsáveis pela aplicação da lei recebam instrução, no âmbito da formação
de base e de todos os cursos posteriores de formação e de aperfeiçoamento,
sobre disposições da legislação nacional relativas ao Código assim como
outros textos básicos sobre a questão dos direitos do homem[...]
REMUNERAÇÃO E CONDIÇÕES DE TRABALHO.
Todos os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem ser satisfatoriamente
remunerados e se beneficiar de condições de trabalho adequadas [...].
DISCIPLINA E SUPERVISÃO.
Devem ser estabelecidos mecanismos eficazes para assegurar a disciplina interna e o
controle externo assim como a supervisão dos funcionários responsáveis pela aplicação da
lei [...].
18
IMPLEMENTAÇÃO DO CÓDIGO
O Código deve estar à disposição de todos os funcionários responsáveis pela
aplicação da lei e das autoridades competentes na sua própria língua[...]
IMPORTANTE!
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha tem contribuído significativamente com a
difusão dessas normas, através da capacitação de profissionais de várias Forças Policiais e de
Segurança pelo Mundo e mais recentemente com o trabalho de Integração das Normas
Internacionais de Direitos Humanos aplicáveis às Funções Policiais, nas matrizes curriculares
de Cursos de Formação, na área de Treinamento e na área de Doutrina Policial de algumas
Polícias no Brasil e outros Países Latino- Americanos, com os quais firmou convênio para
esse fim.
19
UNIDADE 3 - RESPONSABILIDADES BÁSICAS DA ATIVIDADE POLICIAL
21
Também a Constituição brasileira faz esta previsão em seu artigo 5º, LVII:
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal
condenatória;
Como é possível verificar, o direito da presunção da inocência está contido em vários
instrumentos e normas internacionais e nacionais, do que se entende:
A culpabilidade ou a inocência só podem ser determinadas por um tribunal
regularmente constituído, com base em um processo regular no âmbito do
qual tenham sido concedidas ao acusado todas as garantias necessárias para
a sua defesa;
O direito à presunção de inocência, até prova em contrário, é essencial para
garantir um julgamento justo.
Rover (2005) reforça esse entendimento enfatizando que uma das tarefas primárias
na aplicação da lei é a de trazer os infratores à justiça e não compete aos encarregados da
aplicação da lei decidir sobre a culpa ou inocência de uma pessoa capturada por um delito.
Sua responsabilidade é registrar, de forma correta e objetiva, todos os fatos relacionados a
um crime cometido. Os encarregados da aplicação da lei são responsáveis pela busca de
fatos, ao passo que o judiciário é o responsável pela apuração da verdade (analisando esses
fatos com o propósito de determinar a culpa ou inocência da(s) pessoa(s) acusada(s)).
O DIREITO DE TODAS AS PESSOAS A UM JULGAMENTO JUSTO.
Em relação ao direito a um julgamento justo, tem-se que ter em mente que essa
garantia se aplica tanto aos processos civis, como aos criminais e administrativos.
É imprescindível oferecer às partes do processo o direito à ampla defesa e ao
contraditório, ou seja, dar às partes a chance de contra argumentar e expor os argumentos
de sua defesa.
Esse direito está consagrado no artigo 10 da Declaração Universal dos Direitos do
Homem:
Todo ser humano tem direito, em plena igualdade, a uma justa e pública audiência
por parte de um tribunal independente e imparcial, para decidir sobre seus direitos e
deveres ou do fundamento de qualquer acusação criminal contra ele.
O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos em seu artigo 14 estabelece
disposições e uma série de garantias mínimas consideradas necessárias para assegurar o
direito a um processo justo. Essas garantias mínimas foram incorporadas na legislação da
maioria dos países do mundo.
22
O Respeito pela Dignidade, Honra e Privacidade.
De acordo com Rover (2005), as ações e investigações conduzidas por policiais na
prevenção ou detecção do crime conduzirão a situações em que muitas das ações tomadas
resultarão na invasão da esfera privada de indivíduos.
Há que se ter em conta que todos os países têm um código do processo penal ou
orientações que definirão os poderes de investigação e as competências dos policiais e seu
alcance prático.
Veja a seguir alguns dispositivos internacionais que preveem a proteção da
privacidade, a honra e a reputação dos indivíduos.
Declaração Universal dos Direitos do Homem:
Artigo 12: Ninguém será sujeito à interferência em sua vida privada, em sua família,
em seu lar ou em sua correspondência, nem a ataque à sua honra e reputação. Todo ser
humano tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.
Convenção Americana sobre Direitos Humanos:
Artigo 11: Proteção da Honra e da Dignidade
Toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua
dignidade.
Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada,
na de sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua
honra ou reputação.
Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas.
Você já deve ter percebido que essas normas têm repercussões óbvias sobre as ações
e investigações policiais. Como exemplo, podemos citar as revistas e buscas de pessoas,
instalações, veículos e outros bens, bem como a interceptação de correspondência,
mensagens telefônicas e outras comunicações. Todas essas ações deverão respeitar
escrupulosamente a lei e ser absolutamente necessárias para fins legítimos de aplicação
da lei.
Outro instrumento internacional que você estudou no unidade 2 é o Código de
Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei onde a proteção da
intimidade é reforçada pelas disposições do artigo 4º que estabelece:
Artigo 4.º
As informações de natureza confidencial em poder dos funcionários responsáveis
pela aplicação da lei devem ser mantidas em segredo, a não ser que o cumprimento do
dever ou as necessidades da justiça estritamente exijam outro comportamento.
23
Comentário:
Devido à natureza dos seus deveres, os funcionários responsáveis pela aplicação da
lei obtêm informações que podem relacionar-se com a vida particular de outras pessoas ou
ser potencialmente prejudiciais aos seus interesses, e especialmente à sua reputação. Deve-
se ter a máxima cautela na salvaguarda e utilização dessas informações, as quais só devem
ser divulgadas no desempenho do dever ou no interesse. Qualquer divulgação dessas
informações para outros fins é totalmente abusiva.
As responsabilidades dos policiais e suas práticas de aplicação da lei nessa área
requerem supervisão estrita, tanto internamente na organização (superiores hierárquicos e
corregedoria) como um controle externo (ouvidorias de polícia, Ministério Público entre
outros). O registro e controle das ações é fundamental, pois permitirão que um juízo justo e
imparcial seja feito a respeito de sua legitimidade e não arbitrariedade, quando um caso em
particular vier a julgamento.
Rover (2005) ressalta que a prevenção e detecção do crime são áreas da aplicação da
lei que exigem padrões altos de moralidade e ética dos policiais, pois é justamente na
condução de investigações que se verificam grande parte das violações dos direitos e
liberdades individuais das pessoas capturadas e/ou detidas. Cita como exemplos: o
preconceito por parte dos encarregados das investigações, o uso de provas obtidas por meio
de práticas ilícitas, a pressão sutil sobre a pessoa acusada para obter testemunho.
Nesse viés, o modo como você e seus colegas desempenham sua atividade
profissional é que dará a exata noção do que significará a presunção da inocência, um
julgamento justo e o respeito pela dignidade da pessoa humana. O modo profissional de se
trabalhar resultará na contribuição individual para os resultados coletivos e a imagem da sua
corporação como um todo.
É possível concluir que a polícia e outros profissionais encarregados pela aplicação da
lei são, muitas vezes, a primeira linha de defesa dos direitos fundamentais da pessoa
humana e, agindo assim, reforçam a noção de Estado Democrático de Direito.
32
colocar em perigo a ordem pública, a segurança das pessoas e, em última instância, o
próprio Estado. São circunstâncias provocadas por conflitos armados, distúrbios civis ou
desastres naturais, que requerem do Estado uma atuação especial para restaurar a ordem e
a normalidade.
A ruptura da condição normal da ordem pública associa-se, muitas vezes, à ideia de
violência que ultrapassa aquela dos tempos “normais” * (CAPUTO, 1996).
* Por violência “normal” entenda-se, por exemplo, a delinquência comum de todos
os dias, ou em outro plano, as medidas da repressão corrente que desempenha o
aparelhamento policial nos limites do consentimento legal.
As Nações Unidas (2001) classificam e definem uma hipotética hierarquia da
violência em pelo menos cinco níveis. É importante considerar que as fronteiras entre os
diferentes níveis de violência não são sempre claras, entretanto, de maneira didática, pode-
se considerar que cada situação requer a aplicação das seguintes categorias de normas. O
quadro a seguir demonstra essa relação:
Hierarquia da Violência Categorias de normas aplicadas
Nível 1: situação normal. Nível 1: todos os direitos humanos, sem qualquer
derrogação.
Nível 2: tensões internas, Nível 2: todos os direitos humanos, sem qualquer
distúrbios internos, tumultos, derrogação, sob reserva única das restrições autorizada
atos de violência isolados e pela lei com o único fim de garantir plenamente o
esporádicos. reconhecimento e respeito pelos direitos e liberdades
de terceiros, bem como as justas exigências da moral,
ordem pública e bem-estar geral numa sociedade
democrática.
Nível 3: estado de exceção Nível 3: todos os direitos humanos, salvo algumas
proclamado no seguimento de exceções limitadas, as quais permitem derrogações não
tensões internas e de discriminatórias, nos estritos limites necessários pelas
violências esporádicas que exigências da situação. Não é autorizada qualquer
ameaçam a existência da derrogação no que diz respeito ao direito à vida, à
nação. proibição de tortura, à proibição da escravidão ou à
proibição de sujeitar uma pessoa à prisão por
incapacidade de execução de uma obrigação contratual.
Nível 4: conflito armado não Nível 4: o artigo 3º comum às quatro Convenções de
internacional (guerra civil). Genebra de 1949, o Protocolo Adicional II a essas
Convenções de 1977, bem como as restantes
disposições de direitos humanos, incluindo a proteção
dos direitos não derrogáveis.
Nível 5: conflito armado Nível 5: as quatro Convenções de Genebra e o
internacional. Protocolo Adicional I a essas Convenções de 1977, bem
como as outras disposições relativas aos direitos
humanos, incluindo a proteção dos direitos não
derrogáveis.
Fonte: Elaborado pela consultora pedagógica com base nas informações. (ONU,2001)
33
Distúrbios e tensões internas
A doutrina vigente não atribuiu uma definição objetiva e precisa sobre distúrbios e
tensões internas, e nenhum instrumento internacional correu o risco de fazê-lo. Entretanto,
para os efeitos deste curso, e com intuito de padronizar e esclarecer seu significado,
adotaram-se os seguintes conceitos constantes do “Diccionario de Derecho Internacional de
los Conflictos Armados – Pietro Verri (1998)”:
Distúrbios internos: Segundo definição dada pelo CICV: (Comitê Internacional da Cruz
Vermelha) em 1971, essa expressão cobre as situações em que, sem que haja um conflito
armado propriamente dito, existe, não obstante no plano interno, um enfrentamento que
apresenta certo caráter de gravidade ou de duração e que implica atos de violência. Esses
últimos podem revestir formas variáveis que podem ir desde a geração espontânea de atos
isolados de revolta até a luta entre grupos mais ou menos organizados e as autoridades no
poder. Nessas situações, que não degeneram necessariamente lutas abertas, as autoridades
no poder recorrem a vastas forças da polícia, inclusive as forças armadas, a fim de
restabelecer a ordem interior.
Tensões internas: Segundo uma definição dada pelo CICR em 1971 (com motivo de
uma consulta a peritos governamentais), trata-se de situações que podem se caracterizar
por:
Grande número de detenções;
Grande número de detidos políticos ou de segurança;
Prováveis maus tratos infringidos aos detentos;
Promulgação do estado de emergência;
Alegações de desaparecimentos.
Ao contrário das situações de distúrbios internos – em que rebeldes estão
suficientemente organizados e são identificáveis – no caso de tensões internas, a oposição
raramente está organizada de maneira visível.
Estado de Emergência: Situação jurídica similar ao estado de sítio, mas que produz
efeitos menos severos que este último. Em geral, é declarado um perigo do momento ou
iminente, resultante de uma catástrofe, de uma perturbação grave da ordem pública, de
uma crise internacional ou de um conflito armado.
Estado de Sítio: A situação de perigo em que se encontra uma localidade sitiada,
impõe, em geral, medidas que limitam ou suspendem os direitos e liberdades fundamentais.
Daí a expressão “estado de sítio” que, por extensão indica a proclamação de uma situação
34
de gravidade particular, no interior de um Estado, causada pelo estado de guerra ou por
outras circunstâncias excepcionais, assim como as medidas conseguintes adotadas para
garantir ou restabelecer a ordem pública. Essas medidas podem até delegar poderes civis à
autoridade militar.
Tanto Caputo (1996-1997), como Rover (2005) compartilham do entendimento que
nenhum dos instrumentos do direito internacional oferece uma definição adequada do que
se entende pelos termos: distúrbios interiores e tensões internas. Indicam-nos que, para
tentar dar uma definição, devemos confrontá- los com uma categoria mais ampla, que é o
conflito armado não internacional (guerra civil). Remetem-nos ao artigo 1º, parágrafo 2º, do
Segundo Protocolo Adicional às Convenções de, Genebra de 1949, que estabelece:
Artigo 1.2 O presente Protocolo não se aplica às situações de tensão e perturbação
internas, tais como motins, atos de violência isolados e esporádicos e outros atos análogos,
que não são considerados conflitos armados. (grifo nosso)
Importante!
O diploma legal não oferece uma definição, ou melhor, indica-nos uma definição
“negativa”, isto é, por exclusão. Assim sendo, “situações de tensão e perturbação
internas” não podem ser caracterizadas como conflitos armados (guerra). Portanto, o
Protocolo II não se aplica a elas.
Caputo (1996-1997) afirma que o direito internacional distingue três categorias de
conflito armado não internacional:
A guerra civil no sentido clássico do direito internacional;
Conflito armado não internacional no sentido dado pelo art. 3° comum às quatro
Convenções de Genebra de 1949; e,
Conflito armado não internacional no sentido do P.A. II de 1977.
A classificação de um conflito, segundo essa categoria juridicamente reconhecida, é
difícil à luz da complexidade dos vários conflitos existentes e da frequente divergência
doutrinária. É certo dizer que a aplicação de uma norma jurídica em detrimento de outra a
um caso concreto ou evento específico depende de sua qualificação, isto é, devemos
sempre perguntar a que tipo de conflito nos referimos.
Rover (2005) menciona que nem sempre fica claro quando incidentes separados (tais
como reuniões, passeatas, manifestações, desordens e atos isolados de violência) tornam-se
relacionados e, vistos conjuntamente, adquirem um padrão consistente descrito como
distúrbios e tensões.
Todos os esforços devem ser focalizados na eficaz aplicação da lei, na prevenção e
35
detecção do crime e no restabelecimento da segurança pública. Quando tais esforços
falham, um senso de ilegalidade aliado à impunidade pode crescer dentro de uma
sociedade, exacerbando ainda mais os níveis de tensão existentes.
Importante!
Distúrbios e tensões podem eventualmente levar a situações que ameacem a
existência da nação, e, dessa forma, deixar o governo tentado a declarar o estado de
emergência.
A conceituação do CICV sobre o tema
Rover (2005) verificou que o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) tentou
definir distúrbios e tensões. Entende que, embora a fórmula do CICV não seja plenamente
reconhecida como tal, proporciona uma descrição completa, que serve aos propósitos de
aprofundamento dos estudos: em um documento do CICV oferece a seguinte descrição de
distúrbios interiores:
Envolvem situações em que inexiste um conflito armado não internacional como tal,
mas consistem numa confrontação dentro do p Envolvem situações em que inexiste um
conflito armado não internacional como tal, mas consistem numa confrontação dentro do
país, que é caracterizada por certa gravidade ou duração e que envolve atos de violência.
Estes últimos podem assumir várias formas, desde a geração espontânea de atos de revolta à
luta entre grupos mais ou menos organizados e as autoridades no poder. Nessas situações,
que não necessariamente degeneram em confronto aberto, as autoridades no poder
utilizam-se de forças policiais em grande número, ou mesmo das Forças Armadas, para
restaurar a ordem interna. O alto número de vítimas tornou necessária a aplicação de um
mínimo de regras humanitárias.
Com relação a tensões internas, indica que o termo geralmente refere-se a: Situações
de grave tensão (política, religiosa, racial, social, econômica, etc.), ou Sequelas de um
conflito armado ou distúrbios interiores.
Direito / Legislação aplicável
Deyra (2001), assim como Rover (2005) e Caputo (1996-1997) verificam que o artigo
1.2 do II PA (Protocolo Adicional II) exclui de sua proteção as situações de tensões e
distúrbios interiores, tais como os motins, os atos isolados e esporádicos de violência e
outros atos análogos não considerados como conflitos armados.
Entende que se trata, por isso, de uma situação extra convencional, na qual a
proteção conferida às vítimas não pode ter por base o Direito Internacional Humanitário
(DIH). Conclui que os critérios para a qualificação dos conflitos armados não internacionais
36
enunciados no art. 1.1 do II Protocolo Adicional são suficientes para excluir as tensões e
distúrbios interiores do campo de aplicação do DIH.
Nas situações de distúrbios interiores, as regras do DIH somente podem ser
invocadas por analogia. Por outro lado, os Estados devem respeitar certos princípios
humanitários universalmente reconhecidos e os instrumentos de direitos humanos dos quais
são parte. Devem respeitar, em particular, aqueles direitos que não admitem derrogação,
mesmo quando a vida da nação estiver ameaçada por um perigo público de caráter
excepcional. Isso nos remete aos princípios basilares de toda operação de segurança interna:
Primazia do poder civil se deve ao fato das Forças Armadas normalmente
serem empregadas para manter e restaurar a ordem em nome das
autoridades civis, baseando-se nas normas de direito contidas no direito
penal e civil do Estado em questão.
Uso mínimo da força entende-se a mínima necessária para levar a cabo uma
missão lícita que pode ir desde a defesa própria até o emprego de técnicas
tradicionais de guerra.
Legitimidade diz respeito às operações que devem ter como objetivo a
proteção do estado de direito. Deve-se velar para que as forças militares
sejam parte da solução e que não se convertam em parte do problema. A
legitimidade existe quando se considera que a missão militar e seu
desempenho são justos. Quanto mais alta a legitimidade, maiores são as
probabilidades de êxito. É fundamental que as forças armadas atuem
respeitando o direito interno e o direito internacional.
Saiba mais...
São instrumentos internacionais básicos de direitos humanos que devem ser do
conhecimento dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei quando atuarem na
manutenção da ordem pública:
Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) (disponível em
http://www.dhnet.org.br/direitos/deconu/textos/integra.htm)
Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP) (Disponível em
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm)
Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) (Disponível
em www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0591.htm)
Convenção contra a Tortura e outros tratos ou penas cruéis, desumanas ou
37
degradantes (Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-
1994/D0040.htm)
Código de Conduta para os funcionários encarregados de cumpri a lei (Disponível
em http://www.gddc.pt/direitos-humanos/textos-internacionais-dh/tidhuniversais/dhaj-
pcjp-18.html)
Princípios básicos sobre o emprego da força e armas de fogo pelos funcionários
encarregados de cumprir a lei (Disponível em
http://www.dhnet.org.br/direitos/codetica/codetica_diversos/funclei.html)
Princípios relativos a uma eficaz prevenção e investigação das execuções
extralegais, arbitrárias ou sumárias (Disponível em
https://www.unodc.org/documents/justice-and-prison-
reform/projects/UN_Standards_and_Norms_CPCJ_-_Portuguese1.pdf) - Conjunto de
Princípios para a Proteção de todas as pessoas submetidas a qualquer forma de detenção
ou prisão (Disponível em http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/fpena/lex51.htm)
Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos
Um dos instrumentos mais importantes do Direito Internacional dos Direitos
Humanos é o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP), de 1966. Este prevê,
em seu art. 4º, as situações de emergências públicas que uma nação pode-se confrontar:
O art. 4º do PIDCP indica de maneira imperiosa a proibição da derrogação de certos
direitos fundamentais à pessoa humana quando submetida a essas circunstâncias.
As Nações Unidas se preocuparam em comentar e interpretar o art. 4º do Pacto.
Comentam que se permite a um Estado-parte revogar de maneira unilateral e temporária
algumas obrigações previstas no Pacto, mas, por outro lado, o art. 4º sujeita tanto as
medidas de derrogação como suas consequências materiais a um regime específico de
salvaguardas.
As medidas derrogatórias do conteúdo do Pacto devem ser excepcionais e
temporárias. Antes mesmo de o Estado invocar o art. 4º, duas condições fundamentais
devem ser preenchidas:
A situação deve ser uma emergência pública que ameace a vida da nação e,
O Estado-parte deve proclamar oficialmente o estado de emergência. Este
último requisito é essencial para a manutenção dos princípios de legalidade e
império da lei nas situações em que são mais necessárias.
O Art. 4º (2) dispõe que não autoriza derrogação dos seguintes artigos, que
38
contemplam os seguintes direitos inalienáveis:
Art. 6º, direito à vida;
Art. 7º, proibição da tortura, penas ou tratamentos cruéis ou degradantes;
Art. 8º, proibição da escravidão e servidão;
Art. 11, proibição de prisão por falta de cumprimento de obrigação contratual;
Art. 15, princípio da anterioridade da lei penal;
Art. 16, reconhecimento da personalidade jurídica da pessoa; e
Art. 18, direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião.
Já no Sistema Interamericano de Direitos Humanos, no mesmo sentido, encontra-se
a Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH), Pacto de San José de 22 de novembro
de 1969.
O uso da força e armas de fogo em manifestações
Apesar de ser objeto de estudo específico na aula sobre uso da força e armas de
fogo, o tema merece aqui uma consideração mais especial. A questão do emprego da força
e armas de fogo é muitas vezes uma questão de doutrina da instituição ou corporação
policial, colocando-se sempre em evidência a questão do serviço e do interesse público.
Entretanto, atualmente, enfatiza-se que os policiais e outros funcionários responsáveis pela
aplicação da lei devem ter conhecimento teórico e prático sobre o uso diferenciado da força.
O uso diferenciado da força é a possibilidade da seleção adequada de opções de força
em resposta ao nível de acatamento/submissão do indivíduo a ser controlado.
O policial deve perceber o grau de risco oferecido quando se depara com pessoas
que deve abordar. Sua percepção desse risco é que vai permitir ao policial escolher pelo
aumento ou diminuição do grau de força a ser empregado em cada situação específica. Isso
requer muito treinamento e experiência profissional.
O exercício do poder para usar da força e armas de fogo não é uma questão
individual, mas sim uma questão funcional. Qualquer uso que não esteja dentro da
legalidade estará sujeito a uma crítica por excesso, desvio, abuso de autoridade ou de poder.
Recorde que as disposições que se referem ao uso da força e de armas de fogo se
baseiam sempre em três princípios:
LEGALIDADE: A ação a ser praticada é legal? Tem previsão na lei?
NECESSIDADE: A ação a ser praticada é necessária para preservar ou restabelecer a
ordem pública e proteger a vida humana (própria ou de terceiros)? Existe outra opção?
PROPORCIONALIDADE: Os meios a serem empregados são moderados e estão em
proporção à gravidade do delito cometido e ao objetivo legítimo a ser alcançado?
39
Outro instrumento internacional que faz referência ao uso da força e armas de fogo
são os Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários
Responsáveis pela Aplicação da Lei (PBUFAF).
Os dispositivos dos Princípios Básicos do Uso da Força e de Armas de Fogo devem ser
lidos e interpretados integralmente. De particular importância para o policiamento de
reuniões e manifestações estão os Princípios Básicos 12 , 13 e 14: Policiamento de reuniões
ilegais.
Como todos têm o direito de participar de reuniões legítimas e pacíficas, de acordo
com os princípios expressos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e no Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos, os governos, entidades e os responsáveis pela
aplicação da lei deverão reconhecer que a força e as armas de fogo só podem ser usadas nos
termos dos Princípios 13 e 14.
Ao dispersar grupos ilegais, mas não-violentos, os responsáveis pela aplicação da lei
deverão evitar o uso da força, ou quando tal não for possível, deverão restringir tal força ao
mínimo necessário.
Ao dispersar grupos violentos, os responsáveis pela aplicação da lei só poderão fazer
uso de armas de fogo quando não for possível usar outros meios menos perigosos e apenas
nos termos minimamente necessários. Os responsáveis pela aplicação da lei não deverão
fazer uso de armas de fogo em tais casos, a não ser nas condições previstas no Princípio 9.
Ao estudar o PB 14, a conclusão inicial poderia ser de que esse apresenta uma
circunstância adicional para o uso legal de armas de fogo. Isso porém não é verdade, pois
apenas reitera que somente as condições mencionadas no PB 9 (quais sejam: uma ameaça
iminente de morte ou lesão grave) é que justificam o uso de armas de fogo.
Os riscos acrescentados por uma reunião violenta - grandes multidões, confusão e
desorganização - fazem com que seja questionável a conveniência ou praticabilidade do uso
de armas de fogo nessas situações, tendo em vista as consequências em potencial para as
pessoas que estejam presentes, porém não envolvidas.
O Princípio Básico 14 não permite o disparo indiscriminado contra uma multidão
violenta como uma tática aceitável para dispersar aquela multidão.
40
UNIDADE 4 - PODERES BÁSICOS NA APLICAÇÃO DA LEI
Nesta unidade, você estudará os poderes de captura, detenção e o poder de uso da
força e armas de fogo.
Ao final desta unidade, você será capaz de:
Listar os poderes básicos para aplicação da lei;
Definir e compreender o sentido das expressões Captura e Detenção;
Enumerar e compreender os princípios pelos quais os poderes básicos de usar
a força e armas de fogo precisam ser aplicados pelos funcionários
encarregados de aplicar a lei quando no exercício de sua atividade;
O conteúdo desta unidade está dividido nas seguintes aulas:
Aula 1 – Poderes básicos na aplicação da lei: definições
Aula 2 – Captura
Aula 3 – Detenção
Aula 4 – Uso da força e armas de fogo.
41
Detenção significa a condição das pessoas detidas nos termos referidos nos itens
“captura” e “pessoa detida”;
Prisão significa a condição das pessoas presas nos termos referidos nos itens
“captura” e “pessoa presa”;
Autoridade judicial ou outra autoridade significa uma autoridade judicial ou outra
autoridade perante a lei cujo status e mandato assegurem as mais sólidas garantias de
competência, imparcialidade e independência.
AULA 2 – CAPTURA
Definição e esclarecimento inicial
Utiliza-se o termo “captura” como tradução da palavra “arrest” em inglês, de forma a
padronizar este curso aos instrumentos internacionais aqui referidos, e também para marcar
a distinção entre a captura da pessoa sob suspeita e a prisão da pessoa sentenciada.
O artigo 9.1 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (PIDCP) prescreve:
Ninguém será privado de liberdade exceto com base em e de acordo com os procedimentos
estabelecidos por lei (PIDCP, art. 9.1).
Para que alguém seja capturado ou detido é necessário que os motivos estejam
claramente estabelecidos na legislação nacional, ou não sejam contrários a esta.
A norma internacional chamada de Conjunto de princípios para a proteção de todas
as pessoas sob qualquer forma de detenção ou prisão, nos apresenta condições e requisitos
mínimos a serem observados pelos Estados quando de captura, detenção ou prisão de
pessoas. Entretanto, é possível encontrar diferentes conceitos, às vezes mais abrangentes
em legislações nacionais dos Estados. Para efeitos deste curso verificaremos o que nos
apresenta a normativa internacional.
O Conjunto de Princípios declara que a captura, detenção ou prisão somente deverão
ser efetuados em estrita conformidade com os dispositivos legais e por encarregados
competentes (Atribuição legal, conhecimento e habilidade), ou pessoas autorizadas para
aquele propósito (Princípio 2).
Direitos no ato da Captura
Sempre que uma pessoa for capturada, a razão deve ser pela suspeita da prática de
um delito ou por ação de uma autoridade (Conjunto de Princípios, Princípio 36.2).
Toda pessoa capturada deverá ser informada, no momento de sua captura, das
razões da captura, devendo ser prontamente informada de qualquer acusação contra ela
(PIDCP, artigo 9.2; Conjunto de Princípios, Princípio 10).
42
A pessoa capturada deverá ser levada a um local de custódia, devendo ser
conduzida prontamente perante um juiz ou outra autoridade habilitada por lei a exercer
poder judicial, que decidirá sobre a legalidade e a necessidade da captura (PIDCP, artigo 9.3;
Conjunto de Princípios, Princípios 11 e 37).
Não há uma definição clara do que se entende por prontamente. Em muitos Estados o
período máximo permitido antes que uma pessoa capturada seja trazida perante um juiz ou
autoridade similar é limitado a 48 horas; em outros Estados este período é limitado a 24
horas. Este período de 48 ou 24 horas é mais comumente chamado de custódia policial. O
período que o segue é chamado de prisão preventiva.
As autoridades responsáveis pela captura devem, no momento da captura, ou pouco
depois, prestar-lhe informação e explicação sobre os direitos e sobre o modo de os exercer
(Conjunto de Princípios, Princípio 13).
Importante!
Para proteger a situação especial das mulheres e das crianças e adolescentes
existem disposições adicionais a respeito de sua captura, detenção e prisão. Procure se
informar na legislação específica sobre essas questões.
AULA 3 - DETENÇÃO
Esclarecimento inicial
Nos vários instrumentos de direitos humanos relativos à detenção, é feita uma
distinção entre aquelas pessoas que aguardam julgamento e aquelas que foram condenadas
por um delito. O primeiro grupo é chamado de detidos, e o segundo grupo é chamado de
presos. No entanto, esta distinção não é aplicada uniformemente em todos os instrumentos.
As Regras Mínimas para o Tratamento de Presos (RMTP), embora aplicável a ambas as
categorias acima, somente usa o termo presos, e subsequentemente os divide em presos
não condenados e condenados.
Independente da terminologia usada, a distinção entre pessoas condenadas e não
condenadas é importante, pois os direitos que os indivíduos de cada um dos grupos têm,
não são exatamente os mesmos, tampouco as normas para o tratamento de cada categoria.
É também importante observar-se que, como regra geral, os encarregados da
aplicação da lei que exercem atividade policial somente serão responsáveis por (e exercer
autoridade sobre) pessoas que ainda não foram condenadas por um delito, e que, além
disto, ficam um tempo relativamente curto em locais de detenção policial.
43
Instituições Penais
Conforme exposto, a maioria dos Estados desenvolveu um sistema no qual os
encarregados da aplicação da lei (policiais) não têm responsabilidade pelos presos
condenados, ou não exercem autoridade sobre eles. Esta responsabilidade e autoridade são
deixadas aos encarregados da aplicação da lei que são chamados de agentes penitenciários,
guardas penitenciários ou gendarmerias, que tenham recebido instrução e treinamento
especiais para o desempenho de suas funções.
O treinamento dos policiais, geralmente não os qualifica como pessoal competente
para exercer funções em instituições penais ou correcionais. Caso recebam estas funções, ao
menos treinamento e instruções adicionais serão necessários.
Como já visto, o instrumento básico que estabelece a boa prática no tratamento de
presos e na gestão de instituições penais é a Regra Mínima para Tratamento de Presos
(RMTP). Este é dividido em duas partes: Normas de Aplicação Geral e Normas Aplicáveis a
Categorias Especiais.
44
documento, denominado Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo
pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei foi adotado pelo Oitavo Congresso
das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento de Infratores em 07 de
setembro de 1990.
Portaria interministerial no. 4.226, de 31 de dezembro de 2010
O tema sobre o uso diferenciado da força no Brasil conta desde o final do ano de 2010
com a Portaria Interministerial (Ministério da Justiça e Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República), que estabelece diretrizes sobre o uso da força pelos agentes de
segurança pública.
A referida Portaria teve como referência instrumentos internacionais importantes do
sistema de direitos humanos das Nações Unidas.
As NAÇÕES UNIDAS (1997, p. 87) expressam sua preocupação com o uso da força de
maneira legal e ao mesmo tempo eficaz. Reconhece que o trabalho policial na sociedade é
difícil e delicado e também entende que o uso da força em circunstâncias claramente
definidas e controladas é inteiramente lícito. Ressalta, entretanto, que o uso excessivo da
força afeta diretamente o princípio em que se baseiam os direitos humanos, ou seja, o
respeito à dignidade inerente à pessoa humana. Por essa razão considera necessária a
adoção de uma série de medidas para impedir que esses abusos ocorram, e caso isso
aconteça que se disponha de mecanismos de correção e sanção apropriados.
Deve-se levar em consideração o caráter normativo de uma Portaria. Portanto, suas
diretrizes são de observância obrigatória apenas pelos:
Departamento de Polícia Federal;
Departamento de Polícia Rodoviária Federal;
Departamento Penitenciário Nacional; e
Força Nacional de Segurança Pública.
Para as forças de segurança (PC, PM, Guardas Municipais, etc.) dos entes federados
(Estados, Distrito Federal e Municípios), ela não tem caráter obrigatório, mas esses serão
estimulados a tomar iniciativas que visem à implementação de ações para efetivação das
diretrizes tratadas pela portaria.
Entretanto, mesmo não tendo caráter obrigatório para as forças estaduais e
municipais, passa a ser uma excelente ferramenta para a orientação e padronização dos
procedimentos da atuação dos agentes de segurança pública aos princípios internacionais
sobre o uso da força. Dá-se com isso um grande passo na melhoria da formulação e ajustes
45
da doutrina, da educação, de técnicas operacionais, além de instrumentalizar os órgãos de
controle e correição com parâmetros mundialmente aceitáveis de profissionalismo.
Normalmente as corporações policiais nacionais têm normas ou diretrizes internas
que orientam seus integrantes quanto ao emprego da força e de armas de fogo. A prática
pode variar de uma corporação para outra, mas os princípios são quase sempre os mesmos.
Portanto, o uso da força e de armas de fogo deve ser limitado por leis e regulamentos,
colocando sempre em evidência as questões do serviço e do interesse público.
46
UNIDADE 5 - COMANDO, GESTÃO E INVESTIGAÇÃO DE VIOLAÇÕES
DE DIREITOS HUMANOS.
Nesta unidade, você estudará a responsabilidade dos funcionários com atribuições
de Comando e Gestão.
Ao final desta unidade, você será capaz de:
Compreender a importância de um efetivo controle das atividades
operacionais dos agentes de segurança pública.
Compreender a necessidade de adotar medidas internas de sanção quando
constatar abuso de poder por parte de um agente de segurança pública;
Conhecer os mecanismos de investigação de violações de Direitos Humanos;
O conteúdo desta unidade está dividido nas seguintes aulas:
Aula 1 – Procedimentos de supervisão e revisão
Aula 2 – Mecanismos de investigação de violações de direitos humanos
49
tal uso. (Princípio Básico 24)
Os governos e as organizações de aplicação da lei deverão assegurar que não seja
imposta qualquer sanção criminal ou disciplinar a encarregados da aplicação da lei que ao
atuarem de acordo com o Código de Conduta e esses princípios se recusarem a cumprir uma
ordem [ilegal] para usar força ou armas de fogo ou comuniquem tal uso [ilegal] realizado
por outros encarregados.
Obediência a ordens superiores não será nenhuma justificativa quando os policiais:
Tenham conhecimento de que uma ordem para usar força e armas de fogo
que tenha resultado em morte ou ferimento grave de alguém foi
manifestamente ilegítima; e
Tiveram oportunidade razoável para se recusar a cumpri-la.
Importante!
Nessas situações, a responsabilidade caberá também ao superior que tenha dado
as ordens ilegítimas.
O que é deixado claro pelos Princípios Básicos sobre o Uso da Força e de Armas de
Fogo pelos funcionários encarregados pela aplicação da lei é que a responsabilidade cabe
tanto aos encarregados, envolvidos em um incidente particular com o uso da força e armas
de fogo, como a seus superiores. Esses princípios afirmam que os chefes têm o dever de zelo
sem que isso retire a responsabilidade individual dos encarregados por suas ações.
A relação existente entre essas disposições e as disposições sobre o uso indevido de
força e armas de fogo (PB 7 e 8) deve ser compreendida pelos encarregados da aplicação da
lei.
Mecanismos de Queixa
Os cidadãos que consideram que foram vítimas de procedimentos arbitrários ou
abusivos por parte de um funcionário encarregado pela aplicação da lei, devem ter a
possibilidade de apresentar uma queixa.
O artigo 9.5 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos estabelece que as
vítimas têm direito de reparação.
Muitos países possuem mecanismos e recursos para tratar das queixas de seus
cidadãos. Esses recursos vão desde as comissões internas de revisão até serviços especiais.
Sejam quais forem os mecanismos existentes em um país, as queixas sobre o trabalho dos
funcionários encarregados pela aplicação da lei são sempre um assunto delicado. Para um
agente não é fácil encarar críticas de um cidadão. A resistência coletiva por parte dos agentes
50
de uma determinada organização em receber queixas oriundas dos cidadãos é muito comum
em geral e, as vezes, vê-se estas reclamações de modo muito questionável, fruto de um
corporativismo natural.
Por essa razão, os superiores em função de chefia, comando ou direção devem levar
em conta todas as queixas, registrá-las e investigá-las de maneira pronta, completa e
imparcial. Além disso, devem orientar seus subordinados que todos os cidadãos têm direito
de apresentar queixas. Diz-se que a organização ainda é digna de crédito quando os cidadãos
a procuram para resolver seus problemas e esperam uma resposta aceitável.
Como você já estudou, em um sistema democrático as organizações encarregadas
pela aplicação da lei devem prestar contas sobre suas atividades. Isso é agir com
transparência.
Ao final deste tema cabe apresentar os Princípios Orientadores para a Aplicação
Efetiva do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei
(24/5/1989) adotado por ocasião da 15a sessão plenária do Conselho Econômico e Social
das Nações Unidas, que prevê uma série de providências, dentre as quais se destacam:
Seleção, educação e formação.
Deve ser dada uma importância primordial à seleção, educação e formação dos
funcionários responsáveis pela aplicação da lei. Os Governos devem igualmente promover a
educação e a formação através da frutuosa troca de ideias a nível regional e inter-regional.
Remuneração e condições de trabalho. Todos os funcionários responsáveis pela
aplicação da lei devem ser satisfatoriamente remunerados e se beneficiar de condições de
trabalho adequadas.
Disciplina e supervisão.
Devem ser estabelecidos mecanismos eficazes para assegurar a disciplina interna e o
controle externo assim como a supervisão dos funcionários responsáveis pela aplicação da
lei.
Queixas de particulares. Devem ser adotadas disposições especiais, no âmbito dos
mecanismos previstos pelo parágrafo 3, para o recebimento e tramitação de queixas
formuladas por particulares contra os funcionários responsáveis pela aplicação da lei, e a
existência destas disposições será dada a conhecer ao público.
56
Referências Bibliográficas
CICR. Servir y proteger. Comité Internacional de La Cruz Roja. CIRQUEST- The Learning and
Training Company. 2003. (DVD)
IIDH. Derechos humanos, seguridad ciudadana y funciones policiales. San José: Instituto
Interamericano de Derechos Humanos. 2011. (Unidade instruccional)
LAZZARINI, Álvaro. Poder de Polícia e Direitos Humanos. Roteiro para exposição no "Curso
internacional de aperfeiçoamento de instrutores policiais em direitos humanos e prática
policial". Revista "A Força Policial", n°30, abril, maio, junho 2001. São Paulo: Polícia Militar do
Estado de São Paulo, 2001.
MEIRELES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 22ª edição. São Paulo: Malheiros,
1997.
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral. comentários aos arts.
1° a 5° da Constituição da República Federativa do Brasil. Doutrina e Jurisprudência. 3a.ed.
Editora Atlas S.A., São Paulo, 2000.
58
ONU. Human rights and law enforcement. Professional Training Series Nº 5; Geneve
an New York: United Nations. High Commissioner for Human Rights. Center of Human
Rights, 1997 (nº 41, 42 e 43).
OSSE, Anneke. Entender la labor policial: recursos para activistas de derechos
humanos, Editorial Amnistía Internacional (EDAI), 2007
Parecer AGU GM - 025 - cita o estudo intitulado: A segurança pública na constituição,
de Diogo de Figueiredo Moreira Neto. Disponível em: <http://www.agu.gov.br/agu.htm
http://200.181.70.163/pareceres/index_default.htm> acessado em 09 de março de 2006.
PIOVESAN, Flávia. Anais da V Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do
Adolescente.
Brasília, 2003. palestra de Flávia Piovesan <
http://www.mj.gov.br/sedh/ct/conanda/anais.pdf>.
POLICÌA DEL PERU. Manual de derechos humanos aplicados a la función policial.
Policía Nacional del Peru, 2006.
RAMIREZ, Freddy José Granados. Nociones sobre el mantenimiento del orden
Público. San Cristobal: impreso en los talleres graficos de Liticentro S.R.L.
ROBERTS, David. The law of armed conflict, internal security operations, Part A and
B, Teaching File, ICRC, 2002.
ROVER, Cees de. No war, no enemy… low intensity operations: LOAC and Human
Rights Law. SLAC 1998, Chavannes-de-Bogis/Gnenève.
ROVER, Cees De. Para servir e proteger. Direitos humanos e direito internacional
humanitário para forças policiais e de segurança: manual para instrutores. Trad. Sílvia Backes
e Ernani S. Pilla. 4.ed. Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Brasília – DF 2005.
VERRI, Pietro. Diccionario de derecho internacional de los conflictos armados.
Primera edición en castellano: abril de 1988. Tercer Mundo Editores. Comité Internacional
de la Cruz Roja – Ginebra 1998.
VIANNA, André Luiz Rabello. Comitê Internacional da Cruz Vermelha e Regimes
Jurídicos Aplicáveis em Situação de Violência Armada. Santiago: Revista Académica –
Academia de Ciencias Policiales de Carabineros de Chile, 2011- ISSN:0712-4438, pg16.
VIANNA, André Luiz Rabello. O Uso da Força e de Armas de Fogo na Intervenção
Policial de Alto Potencial Ofensivo sob a Égide dos Direitos Humanos (CSP). CAES/PMESP,
2000.
59