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O Amor é Paciente e Bondoso

Texto: 1Coríntios 13.1-4a

Todos os anos, o Oxford Dictionary elege um termo inglês que é


determinado como “a palavra do ano”. Em 2013, de modo unânime,
a palavra escolhida foi “selfie”. As redes sociais são um meio de
interação válido e indispensável em nossos dias. Nas redes sociais, as
pessoas compartilham seu dia a dia, das mais diversas formas. Fotos
em grupo, fotos em casais, fotos com animais, fotos em locais muito
bonitos, fotos sensuais, fotos em locais de trabalho, fotos em lugares
radicais. Costumamos postar fotos de locais que nos marcam e,
mesmo de modo inconsciente, transmitimos uma mensagem sobre a
percepção que desejamos que as outras pessoas tem de sobre nós.
Vivemos na cultura da selfie que, pra que não sabe, é o mesmo
que autorretrato. Determinada celebridade da internet realizou 6.000
selfies durante 4 dias de viagem no México. Com tamanha
disponibilidade de recursos, como celulares e internet, muita gente
anda preferindo postar momentos na internet do que realmente vive-
los.
Corremos o risco de fazer algo parecido com as Escrituras: ao
invés de desfrutá-las em nossa vida diária, somos tentados a lidar
com a Bíblia como algo a ser postado ou até admirado, mas não como
algo para ser vivido. Textos belos, como este de 1Co 13 fazem parte
especificamente deste tipo de anseio. Ler que o amor é indispensável
é algo bom para nossos ouvidos, mas algo muito difícil de ser vivido.
A Palavra de Deus não nos foi dada para servir como objeto de nossa
admiração, mas como alimento para nossas vidas.
Paulo está falando com os coríntios a respeito do caminho de
sobremodo excelente e, tal como um guia turístico, ele nos mostra a
excelência desta jornada. Em um primeiro momento, o apóstolo trata
a indispensabilidade do amor: ele é superior aos dons, ao próprio
altruísmo e ao conhecimento. Sem amor, nada faço, nada sou e para
nada presto. Não há nenhuma valia, mesmo no gesto mais extremo e
generoso, onde falta o amor.
A partir do v. 4, a exposição toma um outro rumo: o que é o
amor? Ao invés de uma definição técnica e carregada de termos
difíceis, há exemplos do que o amor nos leva a fazer.

I. O AMOR É UM MANDAMENTO
1. O amor não é um sentimento, pois sentimentos não
podem ser ordenados,
“Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como eu
vos amei, que também vos ameis uns aos outros. Nisto conhecerão todos que
sois meus discípulos: se tiverdes amor uns aos outros” – João 13.34,35
“Sede, pois, imitadores de Deus, como filhos amados; e andai em amor, como
também Cristo nos amou e se entregou a si mesmo por nós, como oferta e
sacrifício a Deus, em aroma suave” - Efésios 5.1,2
“Nós sabemos que já passamos da morte para a vida, porque amamos os
irmãos. Quem não ama permanece na morte” – 1 João 3.14
“Permaneça o amor fraternal” – Hebreus 13.1
Deus, portanto, ordena o amor. Não se trata de uma escolha pessoal
ou de um espasmo de fim de ano. Não se trata de um sentimento bom
e generoso que devemos ter em público. O amor, diferente do que se
pensa por aí, não nos é natural, como respirar. Por natureza, somos o
oposto do amor e assim não conseguimos ter sentimentos amorosos
por nós mesmos.
2. O amor não é uma mera decisão que está em nosso
controle.
Quando o Senhor nos ordena a amar, nossa incapacidade fica
escancarada. Não sabemos amar como Ele ama. O outro extremo em
relação ao amor é o de pensar nele como uma escolha. É até coerente
pensarmos no amor nestes termos, mas o amor não é uma escolha
pessoal e autônoma. Da mesma forma que não consigo crer sem a
graça de Deus, também não consigo amar à parte da graça de Deus.
3. O amor é um mandamento divino,
É prudente considerarmos o amor não como um mero sentimento ou
uma simples escolha pessoal. É bíblico reconhecermos que o amor é
um mandamento. Jesus nos orienta a pensar desta forma:
“Mas eu digo: Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem”
(Mateus 5:44)
Não está em nosso poder amar do modo como Jesus ensinou. Deus
capacita sobrenaturalmente seu povo para que exista amor.
“Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o agricultor. Todo ramo que,
estando em mim, não der fruto, ele o corta; e todo o que dá fruto limpa, para
que produza mais fruto ainda. Vós já estais limpos pela palavra que vos tenho
falado; permanecei em mim, e eu permanecerei em vós. Como não pode o ramo
produzir fruto de si mesmo, se não permanecer na videira, assim, nem vós o
podeis dar, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira, vós, os ramos.
Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim
nada podeis fazer” (João 15.1-5).
É através do amor que a igreja é edificada. Não meramente
por intermédio dos dons, mas dos dons exercidos com amor.
II. O AMOR É PACIENTE
Na Bíblia, o amor não é um relaxamento que nos permite reencontrar
a verdadeira substância da nossa personalidade. Na Bíblia, o amor é
uma guerra que Deus declara a nós e ganha. O que nos concilia é o
confronto.
O amor impõe-se às comunidades de fé porque elas não estão à altura
de manifestá-lo e porque, por isso mesmo, devem render-se a ele para
que seja Deus a ganhar as guerras comuns entre homens dentro das
igrejas. O paradoxo é que somos chamados a amar como Deus ama
porque odiamos
como os homens odeiam. Logo, o amor não é algo que fica guardado
para quando nos damos bem uns com os outros, mas algo a que
somos obrigados por naturalmente nos darmos mal uns com os
outros.
Amar exige ter paciência.
O termo em grego descreve o homem que é lento para a irritação.
Utiliza-se para referir-se ao próprio Deus em sua relação com os
homens. Ao tratar com os homens, por mais recalcitrantes,
desumanos e ferinos que sejam, devemos exercer a mesma paciência
que Deus tem para conosco.
O amor tem uma infinita capacidade para suportar. Não perde o
domínio depressa, mas suporta pacientemente. A ACF traz a seguinte
afirmação: “o amor é sofredor”. Por natureza nossos relacionamentos
com outros são determinados por simpatia e antipatia, que se
alternam rapidamente. Em pouco tempo não queremos ter mais nada
a ver com algumas. Rapidamente nossa paciência se esgota. O
genuíno amor, porém, “é longânimo”. Também poderíamos traduzir:
Não perde o fôlego.
Num tempo em que os nervos das pessoas estão à flor da pele, o amor
paciente é necessidade vital. Há pessoas que têm o pavio curto, e
outras que nem têm pavio. As pessoas estão parecendo barris de
pólvora: explodem ao sinal de qualquer calor. O amor tem uma
infinita capacidade de suportar situações adversas e pessoas hostis. A
ideia é a mesma da longanimidade. Quem ama tem um ânimo longo,
um ânimo esticado ao máximo. O amor é paciente com as pessoas. Ele
tem a capacidade de andar a segunda milha. Quando alguém o fere,
ele dá a outra face. Ele não paga ultraje com ultraje.

III. O AMOR É BONDOSO


A palavra “benigno” dá a ideia de reagir com bondade aos que nos
maltratam. É ser doce para com todos. O amor possui aspectos
passivos (‘ser paciente’), e também aspectos ativos (‘ser bondoso’).
Tertuliano de Cartago, que foi um dos Pais da Igreja, afirma que os
cristãos eram chamados pelos pagãos de “povo da bondade”. Mesmo
que as pessoas não reconhecessem o povo de Deus como um povo de
Cristo, eles eram reconhecidos pelos gestos de benignidade.
É fácil dividirmos o mundo entre pessoas que merecem nossa
bondade ou não, mas o ensinamento de Jesus não é este. No sermão
do monte, Ele alerta:
“Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu,
porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem;
para que vos torneis filhos do vosso Pai Celeste, porque ele faz nascer o seu
sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos. Porque, se amardes
os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também
o mesmo? E, se saudardes somente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não
fazem os gentios também o mesmo? Portanto, sede vós perfeitos como perfeito
é o vosso Pai Celeste” (Mt 5.43-48).
Alguns crentes da igreja estavam levando os próprios irmãos a juízo
perante incrédulos. Eles faziam injustiça uns contra os outros. Eles
não apenas brigavam dentro da igreja, mas estavam levando essas
querelas para o mundo. O remédio para solucionar esse pecado é o
amor. O amor é paciente e é benigno.
O amor é magnânimo em suportar malefícios. Não permite que a
amargura e a ira operem. Tem firmeza de ânimo em sofrer afrontas.
Não dá guarida a ressentimentos. Perdoa — não somente sete vezes,
mas setenta vezes sete.

O amor mencionado por Paulo é personificado na pessoa de Cristo.


Vejamos de um modo bastante prático como Ele demonstrou seu
amor paciente e bondoso.

IV. O AMOR PACIENTE E BONDOSO DE CRISTO (Jo 21.15-


17)
Pedro fazia parte do grupo dos discípulos mais próximos de Jesus.
Até é perceptível que havia alguma espécie de liderança informal
confiada a ele. Pedro foi um homem que, em suas próprias palavras,
estava disposto a seguir Jesus até a morte.
Todavia, já conhecemos os spoilers desta história: Pedro acovardou-
se, negou Jesus e chorou amar- gamente. Pedro saiu de cena,
escondeu-se, com medo dos judeus. Na fatídica quinta-feira à noite,
Pedro abandona o recinto onde Jesus estava sendo cuspido e
esbordoado pelos membros do Sinédrio judaico e desaparece na
escuridão da noite.

Em Jo 21.3, Pedro diz: “Vou pescar”. Em outras palavras, ele afirma:


“Chegou o fim da linha. Acabou o sonho. Não dá mais para
prosseguir”. Durante a noite, não conseguiram pescar nada. Durante
a manhã do dia seguinte, acontece o inevitável encontro com Jesus.
Em um primeiro momento, Pedro se enconde. Mais tarde, o Senhor,
após satisfazer a fome dos discípulos, aborda a Pedro pessoalmente.
Por que Jesus perguntou a Pedro três vezes? Porque três vezes Pedro
negou Jesus. Para cada vez que Pedro negou Jesus, este lhe deu a
oportunidade de reafirmar o seu amor. Jesus está dando a Pedro a
oportunidade de se levantar onde ele caiu.
Jesus não perguntou a Pedro acerca de seu amor porque
desconhecesse seu coração. Essas perguntas não foram feitas por
causa de Jesus, mas por causa de Pedro. O próprio Pedro confessa três
vezes que Jesus conhecia seu amor (Jo 21.15-17). Pedro sabe que Jesus
é poderoso para sondar os corações, e nada fica oculto diante dos seus
olhos. Jesus faz essas três perguntas a Pedro para reacender em seu
coração a chama do amor. Pedro estava desistindo de tudo, mas Jesus
sabia que em seu coração Pedro o amava. O amor por Jesus é o
caminho da restauração.

A pergunta inicial de Jesus sonda Pedro na profundidade de seu ser.


Ele não tenta responder em termos da força relativa de seu amor
comparado com a de outros discípulos. Ele apela antes ao
conhecimento do Senhor. Apesar de meu amargo fracasso, ele diz,
com efeito, eu te amo — tu sabes que te amo. Jesus aceita essa
declaração, sem dúvida para alívio de Pedro, e o comissiona: Cuide
dos meus cordeiros. A ênfase agora é sobre o pastoral antes que o
evangelístico (cf v. 11). O amor de Pedro por seu Senhor e a evidência
de sua reintegração devem ser demonstrados no cuidado pastoral de
Pedro pelo rebanho do Senhor (cf. Jo 10).

Onde encontramos este amor? No próprio Senhor, pois só amamos


por que Ele nos amou primeiro.

Jesus não lançou no rosto de Pedro suas faltas ou levantou um cartaz


escrito “eu já sabia”. Ele suportou a fraqueza de Pedro e o amou. Foi
bondoso com Pedro e o restaurou. Não que devemos ser
complacentes com os pecados alheios, mas precisamos aprender a
entender as dificuldades de nossos irmãos. Precisamos nos acolher
mutuamente sabendo quem nós somos. Estamos em reforma, sendo
transformados pela graça do Senhor e, no meio deste processo,
certamente iremos nos decepcionar mutuamente.
Que tenhamos nossos corações abertos para amar como Jesus amou.
Este é o caminho de sobremodo excelente. Que sejamos pacientes e
bondosos.

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