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Catequese e comunidade
A catequese em todas as formas em que é concebida ou sonhada,
está ligada por laços muito estreitos à comunidade cristã. A
referência à comunidade é fundamental: diz-se que não existe
catequese sem comunidade, que a comunidade é fonte, lugar e meta
da catequese (DGC n.158), que as novas formas de comunidade
oferecem possibilidades inéditas ao desenvolvimento da catequese.
É uma instância pastoral rica de promessas, mas não isenta de
dificuldades e problemas.
A exigência de que a toda catequese corresponda uma comunidade cristã autêntica muitas
vezes nos leva a uma constatação amarga: onde está essa comunidade? Onde estão hoje as
comunidades cristãs da fé adulta e do testemunho convincente?
Hoje existe na Igreja um vasto movimento comunitário que assiste ao surgimento de
novas formas de comunidades desejosas de viver mais autenticamente a comunhão de fé
e de vida cristã. Nessas novas comunidades se desenvolve também um modo novo de
fazer catequese. Esse novo modo, porém, ao mesmo tempo em que goza de inúmeras
vantagens, padece de muitas problemas e tensões: problemas de comunhão entre as
novas comunidades e as paróquias e dioceses; problemas relacionados ao estatuto
eclesiológico, nem sempre claro, das novas experiências comunitárias: autenticidade
eclesial, critérios de discernimento, superação dos conflitos etc. É toda uma problemática
que também se reflete no terreno da catequese.
Em especial, oferecem vantagens indiscutíveis, mas também dificuldades, as experiências
de alguns grupos e movimentos com uma tradição catequética própria, que, no entanto,
também suscitam dúvidas sobre sua autenticidade. Muitas vezes se cai num
“espontaneísmo” cheio de emotividade ou no subjetivismo; acontece também de surgir a
figura de um líder carismático que é seguido mais ou menos cegamente; ou então se
valoriza de forma unilateral o carisma do movimento. São situações que tornam
problemática a presença de uma catequese fiel à sua identidade eclesial e ao seu papel de
educação da fé.
265
E ainda: a instância comunitária às vezes põe em questão o valor de alguns lugares
tradicionais da catequese, como a paróquia, e sobretudo a escola. A propósito desta, cabe
perguntar: é a escola um autêntico lugar de catequese? Em que medida? Pode ser
considerado catequese o ensino da religião dado na escola (ERE) (“aula de religião”)?
Esses e outros problemas semelhantes convidam à reflexão que vamos iniciar. Trata-se de
apreender o significado da realidade comunitária (expressão do sinal da koinonia) na Igreja
de hoje e aprofundar-lhe as implicações para a compreensão da função catequética.
1
Cf. Max Delespesse, Revolução evangélica? São Paulo, Loyola, 1973.
2
Recorde-se a conhecida obra de D. Riesman - N. Glazer - R. Denney, The lonely crowd. Garden City, Doubleday,
1953 (La folla solitaria. Bolonha, Il Mulino, 1956).
266
No campo da sociologia conhece-se a distinção entre comunidade (Gemeinschaft) e
associação ou sociedade (Gesellschaft).3 Na associação ou sociedade as pessoas se unem tendo
em vista um objetivo a atingir, e cada um vale de acordo com o que tem e de acordo com sua
atuação, deixando na sombra a pessoa em si, em seu ser. A comunidade, ao contrário,
toma a pessoa em seu valor original e único, criando relações fraternas de acolhimento e de amor
e propiciando a livre troca interpessoal. Na vida moderna, tão rica de organizações e de
instituições, sente-se a necessidade imperiosa de experiências de comunidade, em meio às quais
seja possível o encontro, a comunicação, o amor, a aceitação recíproca.4
Essa busca de uma comunidade exprime e canaliza diversas exigências do homem
contemporâneo: a necessidade de integração afetiva; o desejo de participação em todos os níveis;
a reafirmação da própria identidade cultural e histórica, contra todas as formas de alienação ou
colonização; o reconhecimento efetivo da própria dignidade pessoal e social.
3
A distinção remonta ao sociólogo alemão F. Tönnies: cf. F. Tönnies, Comunità e società. Milão, Ediz. Di
Comunità, 1963.
4
Cf. André Tange, Análise psicológica da Igreja. São Paulo, Loyola, 1975.
5
Ver capítulo 6, item 3.1.2.
267
Assim se explica a busca de novas formas de comunhão e de comunidade na Igreja de hoje;
ela se dá com tal força que se pode falar de “revolução evangélica”, de “novo nascimento” da
Igreja,6 através do tecido renovado das novas comunidades. Em sua base há a convicção,
apoiada no testemunho bíblico, de que a Igreja deve configurar-se sobretudo como
comunidade, como fraternidade,7 no sentido pleno da palavra. Não se ignora a sua dimensão
institucional, mas deve prevalecer o fato da Igreja como convocação por meio da fé,8 para que a
instituição não impeça o exercício autêntico da comunhão e da missão.
Pois bem, atualmente se constata na Igreja uma distância muito grande entre a
realidade e o que ela deveria ser. A Igreja se apresenta, de muitos pontos de vista, mais como
instituição do que como comunhão, mais rica de estruturas institucionais do que de
experiências autênticas de comunidade. Assim se explicam muitos becos sem saída da pastoral
sacramentária e catequética, muitas crises de pertença eclesial, não poucos casos de contestação
e de abandono da vida cristã, sacerdotal e religiosa. O relativo sucesso de tantas seitas e
movimentos esotéricos tem também em sua base a procura de uma fraternidade não
experimentada na comunidade eclesial.9 A excessiva institucionalização, o predomínio das
estruturas jurídicas, a prevalência de critérios de eficiência e visando à conservação obscurecem
com frequência o aspecto humano e libertador da comunhão de fé, sufocam o exercício da
vida comunitária e diminuem a credibilidade da Igreja.10
Compreende-se assim esse fenômeno típico da presente situação eclesial: a criação de novas
formas de viver a comunhão e de realizar a comunidade. Já apresentamos os traços principais
desse dinamismo, que entremostra a nova fisionomia da koinonia eclesial.11 Cabe agora
salientar o surgimento de um fenômeno de grande importância para o futuro da pastoral e
para a renovação da catequese: a decisão pela criação das pequenas comunidades.
6
Cf. Max Delespesse, Revolução evangélica? São Paulo, Loyola, 1973 e a conhecida obra de Leonardo Boff.
Eclesiogênese: as comunidades eclesiais de base reinventam a Igreja. Petrópolis, Vozes, 1977.
7
Cf. P. F. Schmid, Im Anfang ist Gemeinschaft. Personzentrierte Gruppenarbeit in Seelsorge und Praktischer
Theologie. Beitrag zu einer Theologie der Gruppe. Stuttgart/Berlim/Colônia, W.Kohlhammer, 1998, cap. 4 (“La
comunità è la forma sociale della Chiesa. L´ekklesia come luogo di convocazione dei credenti”).
8
Cf. Klostermann, Kirche, Ereignis und Institution. Viena, Herder 1976; P. A. Liégé, Lo stare insieme dei cristiani tra
comunità e istituzioni. Brescia, Queriniana, 1979.
9
“A Igreja faz a opção pelos pobres e os pobres optam pelas seitas”, in: Coincat, “Catequese para viver
num mundo pluralista e secularizado”. Revista de Catequese 15 (1992), n. 59, p. 59-64.
10
Cf. A. Tange, op. cit., p. 23-37.
11
Cf. cap. 6, item 3.2.
268
2.3 Refazer o tecido comunitário: as pequenas comunidades
Essas novas comunidades oferecem novas possibilidades à Igreja: com efeito, podem ser um
fermento na massa e no mundo em transformação; contribuem para manifestar mais claramente a
13
verdade e a unidade da Igreja; devem ser sinal de caridade recíproca e de comunhão.
Menção especial merece o fenômeno das comunidades eclesiais de base (CEBs) na América
Latina, elemento propulsor de uma renovação geral do tecido eclesial. Já nessa perspectiva
saudava o evento a conferência de Medellín:
A vida de comunhão a que foi chamado, o cristão deve encontrá-la na “comunidade de base”: ou
seja, em uma comunidade local ou setorial que corresponda à realidade de um grupo homogêneo
com uma dimensão que permita a convivência pastoral fraterna entre seus membros [...]. A
comunidade cristã de base é, assim, o primeiro e fundamental núcleo eclesial, que, em seu
âmbito, deve responsabilizar-se pela riqueza e expansão da fé e pelo culto de que é expressão.
Portanto, ela é uma célula inicial da estrutura eclesial, centro de evangelização e atualmente um fator
14
primordial da promoção humana e do desenvolvimento.
12
Além da América Latina (cf. bibliografia no fim do capítulo), fizeram essa opção diversas Igrejas: cf. por
exemplo: Ásia (Cingapura 1995) III D; J. M. Calle, “Catechesis for the 80´s in the asian context”, East Asian Pastoral
Review 17 (1980), n. 2, p. 187-94; J. Guiney, “Les communautés ecclésiales de base: échos d´Afrique de l´Est”,
Lumen Vitae 43 (1988), n. 4, p. 407; L. Boka di Mpasi, Verso una cattolicità-Arcobaleno [...] Saggio documentario. I.
Problematica africana dell´inculturazione. Roma, 1998; Id., Verso una cattolicità-Arcobaleno [...] Saggio
documentario. II. All´appuntamento del dare e del ricevere: dinamica della missionarietà. Roma, 1999; Espanha CC
n. 277-80.
13
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13.
14
Medellín (Pastoral de conjunto), n. 10.
269
As CEBs, nascidas principalmente em ambientes populares, se tornaram uma esperança de
renovação eclesial e um lugar de redescoberta da comunhão evangelizadora. Elas foram
saudadas como “Igreja que nasce do povo”,15 sinal dos tempos,16 lugares de conscientização,
primavera promissora para a Igreja.17 Elas receberam um reconhecimento oficial na
Evangelii Nuntiandi, que as chama de “lugar de evangelização” e “esperança para a Igreja
universal” (EN n. 58), e principalmente no documento de Puebla:
As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), uma experiência que mal começava em 1968,
amadureceram e se multiplicaram, principalmente em alguns países, e agora constituem um dos
motivos de alegria e de esperança para a Igreja. Em comunhão com o bispo, como se postulou em
Medellín, elas se transformaram em polos de evangelização e em agentes de libertação e de
desenvolvimento (Puebla n. 96).
15
Cf. Una Chiesa che nasce dal popolo: le comunità di base. Roma, Quaderni Asal 1975, n. 21-22.
16
Cf. Comunidades cristianas de base: signo de los tiempos, opción pastoral. Chapinero-Bogotá, Indo-American
Press Service, 1970.
17
J. F. Marins, “Comunidades eclesiais de base”. Nuevo Dic. Cat., p. 505.
270
2.4 Critérios de autenticidade e sintomas patológicos dos grupos e das comunidades eclesiais
Toda comunidade cristã autêntica deve ser reconhecida pela Igreja e viver em
comunhão com a Igreja, aberta, portanto, à universalidade eclesial. Não se pode conceber
uma comunidade cristã nascida por iniciativa própria e atuando de forma autônoma,
autossuficiente. Vão contra esse critério fundamental as diversas formas de isolacionismo e
fechamento nas relações com a comunidade mais vasta: grupos incoerentes, espírito de seita ou
gueto, isolamento de atuação, situação de conflito ou de contestação exasperada etc.
18
Assim se expressou a CNBB: “A tarefa de construir “comunhão e participação” deve ser encarada com
continuidade e perseverança. Exige uma mudança de mentalidade, que muitas vezes ainda não aconteceu. Em alguns
casos, existem queixas de retrocesso na prática da comunhão e participação para um “clericalismo” incompatível com
os ideais evangélicos e a eclesiologia de comunhão” (Diretrizes gerais 20032-2006, n. 108). Cf. também: Espanha CC
n. 257-265; Servicio pastoral a las pequeñas comunidades cristianas: documento de la Comisión Episcopal de
Pastoral. Madri, Edice, 1982; o documento da CEI: criteri di ecclesialità dei gruppi, movimenti, associazioni, Nota
Pastorale (1981).
19
Ver bibliografia no fim do capítulo.
20
Cf. P. A.Liégé, Lo stare insieme dei cristiani, p. 18-22.
271
2.4.3 O critério da globalidade das funções eclesiais
Toda comunidade autêntica deve dar o devido espaço às funções próprias da mediação
eclesial: a caridade-serviço (diaconia) a fraternidade (koinonia) o ministério da palavra
(martyria) e a celebração da fé (liturgia). Se falta alguma dessas funções, ou se é realizada
de forma inadequada, não se pode qualificar um grupo ou uma associação como comunidade
cristã. Isso acontece, por exemplo, no caso do desenvolvimento inadequado do anúncio da
palavra ou das celebrações, ou pelo modo de conceber a atuação social e política etc. Por vezes
não se respeita a globalidade das funções eclesiais, concentrando-se a atenção em alguma delas e
negligenciando as outras.
21
Cf. M. Dujarier, “Le catéchuménat, fonction de l´Église”, Spiritus 35 (1994), n. 134, p. 46-54. Luiz Alves de
Lima, “Catequese com adultos e iniciação cristã”, in: CNBB-Grecat, Segunda Semana Brasileira de Catequese. São
Paulo, Paulus, 2002, p. 318-54 (Estudos da CNBB n. 84).
272
2.4.6 A conciliação dos conflitos
Além disso, a estrutura eclesial, em seus diversos níveis, demonstra sua maturidade (ou a
sua imaturidade) no modo de gerir e conciliar – sem os suprimir – os conflitos e as tensões
presentes em seu interior. Tradicionalmente, três princípios ou valores são considerados critérios
para a resolução de conflitos eclesiais: a fé (pístis), o amor (ágape) e a edificação (oikodomé).22
A aplicação desses critérios nem sempre é fácil, mas é através deles que se podem enfrentar e
resolver as questões conflituosas.
Eis, pois, um quadro dos critérios de discernimento comunitário que permite esboçar os
traços característicos e os diversos níveis de maturidade da comunidade eclesial, assim como
já vimos as exigências da maturidade da fé das pessoas.23 São dois aspectos de grande
urgência pastoral, especialmente no que se refere à catequese.
A experiência catequética moderna confirma, mais uma vez, que em primeiro lugar vêm os
catequistas e depois os catecismos; ou melhor, as comunidades eclesiais vêm ainda antes. Com
efeito, não se concebe uma comunidade cristã sem uma boa catequese, assim como não se pode
conceber uma boa catequese sem a participação de toda a comunidade (RdC n. 200).
Pode-se falar, nesse sentido, de opção comunitária na catequética moderna, opção que
proclama a comunidade cristã como condição, lugar, sujeito, objeto e meta da catequese (cf.
DGC n. 158, 254). Examinemos mais de perto seus aspectos significativos.
22
Cf. G. Chiaretti, “Comunità”, in: V. Bo et al. (eds.). Dizionario di Pastorale della comunità cristiana.
Assis, Cittadella, 1980, p. 173.
23
Cf. cap. 5, item 3.4.
273
3.1.1 A comunidade, condição necessária para a catequese
A pedagogia catequética se faz eficaz na medida em que a comunidade cristã se torna referência
concreta e exemplar para o caminho da fé dos indivíduos. Isso acontece se a comunidade se
apresentar como fonte, lugar e meta da catequese (DGC n. 158).
24
DCG (1971), n. 35. “O catequista é enviado. Sua missão possui duplo sentido: é enviado por Deus, constituído
ministro da Palavra pelo poder do Espírito Santo, e é enviado pela comunidade, pois é em seu nome que ele fala”
(CNBB. Formação de catequistas. 7ª ed. São Paulo, Paulus, 1990, n. 46 (Documentos da CNBB n. 59).
25
R. Mendes de Oliveira, “A comunidade: fonte, lugar e meta da catequese”. Revista de Catequese 6 (1983), n. 21,
p. 7-16. Cf. B. Dreher, “La catechesi in seno all´organismo complessivo della pastorale generale”, in: B. Dreher et
al., La sterilità della catechesi infantile. Modena, Paoline, 1969, n. 71. “Em certo sentido, ela [a catequese] nada
mais faz senão explicitar, com todos os recursos da Tradição, aquilo que a comunidade vive, aquilo por que ela
o vive, para que possa servir de referência.” A. Fossion, La catéchèse dans le champ de la communication:
ses enjeux pour l´inculturation de la foi. Paris, Cerf, 1990, p. 354.
26
Cf. J. Colomb, “De quelques conditions doctrinales et spirituelles pour l´annonce de Jésus Christ à
l´homme d´aujourd´hui”. Vérité et Vie 20 (1967-68), série 78, n. 577.
274
3.1.2 Comunidade, lugar natural da catequese
É uma convicção que se tornou comum: “[a comunidade] por aquilo que é, anuncia, celebra,
opera, permanece sempre lugar vital, indispensável e primário da catequese” (DGC n. 141).
A complexidade do fato comunitário levará a distinguir, no interior da comunidade eclesial,
diversos lugares para a catequese ou a falar de novos lugares da catequese, em referência a
novas formas de comunidade.27 Na França prefere-se falar de “lugar catequético”28 para
designar o contexto comunitário da catequese. Mas resta sempre a convicção de que a ação
catequética encontra seu ambiente de referência natural e fundamental na comunidade eclesial.29
A exigência comunitária obriga, assim, a repensar e verificar os ambientes da
catequese, quer os tradicionais (paróquia, escola, associações etc.), quer os novos (grupos,
comunidades, movimentos etc.) Critério decisivo é a qualidade comunitária ou a
possibilidade de referência comunitária nos diversos ambientes de catequese.
Também essa é uma convicção bastante comum: toda a comunidade eclesial deve
considerar-se agente solidariamente responsável pela obra catequética.30 O verdadeiro sujeito da
catequese é a comunidade, ainda que concretamente se utilize de pessoas ou de estruturas
particulares.
Portanto, está superada a concepção verticalista da catequese, concebida como relação entre
alguém que ensina e que se encontra em posição elevada e o grupo de discípulos que recebe a
instrução. Em um contexto comunitário não existem propriamente destinatários, mas
participantes da catequese, todos sujeitos de palavra e de experiência, ainda que com papéis
diferenciados: “Na comunidade todos somos ao mesmo tempo catequistas e catequizandos,
mestres e discípulos, agentes e destinatários da ação catequética, dado que somos todos servos
da única palavra que nos edifica através da boca e do testemunho de todos” (México GP n. 71).
27
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13.
28
“Um lugar de acolhimento que significa a Igreja [...] Esse lugar pode ser assim definido: é um lugar de
acolhimento no qual se levam em conta as realidades vividas por uns e por outros; é um lugar no qual os desejos
profundos e os projetos dos participantes são considerados em si mesmos; é um lugar no qual a Boa Nova de Jesus
Cristo é expressa em vista da vida de cada um; é um lugar no qual o testemunho daqueles que nele se reúnem [...]
permite que a fé seja realmente vivida em conjunto”: França (Texte de référence) 3.1.1.1. Cf. G. Vogeleisen,
“Lieu catéchétique”, Diz.Cat., p. 382-83; J. Audinet - S. Duguet - J. Joncheray, “Dans quels lieux catéchiser?”,
Lumen Vitae 43 (1988), n. 4, p. 377-86.
29
Ásia (Cingapura 1995) III D, insiste na necessidade de uma catequese comunitária, exatamente pela falta
desta dimensão na práxis catequética concreta.
30
Cf. DGC n. 220; Brasil CR n. 118, Celam-Decat, A comunidade catequizadora no presente e futuro da América
Latina: conclusões da I Semana Latino-Americana de catequese. Quito, 3-10 de outubro de 1982. São Paulo,
Salesiana, 1983 (Coleção Pastoral Catequética n. 9); Alemanha KWK A 4; Puebla n. 983; Espanha CC n. 266;
CAL n. 184.
275
3.1.4 A comunidade, destinatário último da catequese
A catequese não se destina exclusivamente a indivíduos, mas tem ante si a comunidade e o seu
crescimento na fé como verdadeiro destinatário de sua atuação: “A catequese conduz à maturidade
da fé não apenas os catequizandos, mas também a própria comunidade enquanto tal (DGC n.
221).
Com efeito, a catequese é “a ação eclesial que conduz as comunidades e os indivíduos cristãos à
maturidade da fé” (DGC [1971] n. 21); ela “se dirige à comunidade, sem descuidar dos fiéis, tomados
individualmente”.31 Dada a lei de salvação em comunidade (LG n. 9), a ação catequética tem em
mira a comunidade e seu amadurecimento na fé, e no interior dessa ação comunitária também faz
crescer a vida religiosa dos indivíduos. A catequese apresenta-se assim como o processo de
crescimento de uma comunidade eclesial que acolhe a palavra de Deus e a aprofunda, caminhando
rumo à maturidade da fé.
Portanto, também está superada a concepção individualista de uma catequese concebida
como relação entre um catequista e catequizandos tomados individualmente. A relação pessoal se
insere num contexto de comunidade, verdadeiro sujeito e ambiente da obra catequética.
Sob essa luz revê-se também a tradicional setorialização da catequese segundo o estado ou
condição (catequese para crianças, jovens, adultos, operários, intelectuais etc.). Sem negar a
conveniência de algumas separações parciais e temporárias, para responder melhor às exigências dos
participantes, são preferíveis formas globais de catequese na comunidade cristã, que se enriquece
com as trocas entre participantes de condições e sensibilidade diversas (cf. CT n. 45). A
experiência comprova a ineficácia de uma catequese que priva as crianças ou os jovens do diálogo
entre gerações e do contexto vital e enriquecedor da comunidade.
31
Ibid. n. 31.
276
3.1.5 A comunidade, objetivo e meta da catequese
Cumpre agora apontar alguns aspectos fundamentais da catequese comunitária: em que lugares
se dá, com que identidade, com quais catequistas?
32
Cf. Brasil CR, IV Parte: A comunidade catequizadora.
33
Parece-nos ser esta a exigência de uma “diversificação dos lugares de catequese” defendida, com razão, por A.
Fossion, op. cit., p. 333-71.
277
3.2.1 O papel do grupo e das pequenas comunidades
O grupo tem uma função importante no processo de desenvolvimento das pessoas. Isso vale
também para a catequese, quer das crianças, às quais propicia uma boa socialização, quer dos
jovens, para os quais o grupo constitui quase uma necessidade vital na formação da
personalidade, quer dos adultos, entre os quais promove uma atitude de diálogo, de
compartilhamento e de corresponsabilidade cristã (DGC n. 159).
34
Cf. P. Scilligo, “Gruppo”, in: J. Vecchi - J. M. Prellezo (eds.), Progetto educativo pastorale: elementi
modulari. Roma, LAS, 1984, p. 389-90.
35
L. Berrical de la Cal, “Grupo en la catequesis, el”. Nuevo Dic. Cat., p. 1059.
36
“Onde há três, aí está a Igreja”: De exhortatione castitatis 7,3.
37
Cf. P. F. Schmid, Im Anfang ist Gemeinschaft, p. 110.
38
L. Berrocal de la Cal, “Grupo en la catequesis, el”, p 1.061.
278
É fácil entender a importância catequética do grupo como lugar de aprendizagem da
fé e de crescimento na fé. No grupo vivenciam-se atitudes e experiências de grande valor
educativo: a comunicação, a liberdade, a criatividade, o diálogo. Ele pode se tornar um
grupo de referência eficaz, essencial para a socialização e a educação. O grupo permite o
amadurecimento de verdadeiras experiências religiosas e em seu interior podem
amadurecer processos de identificação. Essas são características ideais para a
aprendizagem da fé e para a interiorização das atitudes de fé, objetivo principal da
catequese. Desse ponto de vista, pode-se dizer que aprender a crer é antes de mais nada
começar a crer juntos.
Para defender-nos das famosas “intempéries”, na sociedade secularizada, não é necessário criar
uma espécie de submundo católico na sociedade, com seus próprios meios de comunicação,
seus partidos políticos e serviços de todo tipo, como se poderia pensar. Basta poder ter pequenas
comunidades cristãs nas quais exista fé compartilhada e calor humano.40
39
CAL n. 189. Cf. DGC n. 263; Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13; Brasil CR n. 118; Espanha CC n. 277-
280.
40
L.Gonzalez-Carvajal, Evangelizar en un mundo postcristiano. Santander, Sal Terrae, 1993, 100. Ítalo
Gastaldi, Educar e evangelizar na pós-modernidade. 4ª ed. São Paulo, Salesiana, 2003.
279
3.2.2 Catequese comunitária: uma mudança qualitativa
41
Cf. a análise de N. Mette, “De la catéchèse dans la communauté à la catéchèse de la communauté”. Lumen
Vitae 43 (1988), n. 4, p. 387-96.
42
Cf. DGC n. 159; Espanha CC n. 283-285;
43
Mensagem do Sínodo de 1977, n. 13.
44
Cf. “Session Nationale de Notre-Dame de Laus (Juillet 1969)”, Catéchèse 10 (1970), n.40, p. 350.
45
Cf. A. Aparisi, Invitación a la fe. Madri, ICCE, 1972, p. 42-52; R. Tonelli, La vita dei gruppi ecclesiali.
Leumann (Turim), Elledici, 1972.
280
3.2.3 Catequese comunitária: uma nova abordagem da mensagem cristã
Com esses grupos, a Igreja se mostra em pleno processo de renovação da vida paroquial e
diocesana, por meio de uma nova catequese, não apenas na sua metodologia e no uso dos
meios modernos, mas também na apresentação dos conteúdos que se orientam no sentido
de introduzir na vida motivações evangélicas para um crescimento em Cristo (Puebla n.
100; cf. DCG n. 76).
281
3.2.4 Uma metodologia de caráter comunitário
46
Cf. P. Scilligo, “Gruppo”, loc. cit., p. 397-98; P. Babin, Opzioni per una educazione della fede dei giovanni.
Leumann (Turim), Elledici, 1967, p. 99.
282
A época moderna, felizmente, está forjando um novo tipo de personalidade mais de acordo –
esperamos – com a natureza fundamentalmente social do ser humano, uma personalidade que lhe
permitirá finalmente encontrar-se em plena harmonia com seu ser-em-comunicação. Se
quiséssemos tentar descrever essa nova personalidade, diríamos que ela não busca
desenvolver e ostentar qualidades individuais que revelem a própria perfeição, mas se traduz
numa atitude fundamental de acolhimento e de abertura para a experiência pessoal e para a dos
outros. Essa nova personalidade não atrai para si os olhares admirados e extasiados das massas
que desejam venerar o herói, mas antes, promove as capacidades dos outros, permitindo que esses
também desabrochem. O homem de amanhã se sentirá mais dependente dos outros. Mas longe de
o empobrecer, essa dependência o enriquecerá.47
4. CATEQUESE E ESCOLA
Sabe-se que, por muito tempo e em muitas nações, a escola foi um ambiente normal de
catequese, geralmente na forma de ensino da religião (ou instrução religiosa, ou catequese
escolar). Em muitos casos, foi o lugar privilegiado e praticamente exclusivo para o
desenvolvimento da obra catequética na idade escolar.49 Em alguns países, motivos de ordem
política ou cultural levaram à exclusão, de forma mais ou menos violenta, do ensino religioso
na escola pública.50 Em algumas Igrejas jovens, a escola dos missionários constituiu o
instrumento principal que, em conjunto com a obra educacional, desenvolveu também a
atividade evangelizadora e catequética, não sem aspectos problemáticos e ambíguos.51
47
André Tange, Análise psicológica da Igreja. São Paulo, Loyola, 1975.
48
Sobre a figura do catequista falaremos de forma mais aprofundada no capítulo 11.
49
É o caso, por exemplo, da Alemanha, Áustria, Holanda, Inglaterra. Cf. F. Pajer (ed.), L´insegnamento
scolastico della religione nella nuova Europa. Leumann (Turim), Elledici, 1991; Istituto di Catechetica
dell’Università Salesiana (ed.), Scuola e religione, I. Una ricerca internazionale: situazioni, problemi,
prospettive. Leumann (Turim), Elledici, 1971. Ver também os verbetes relativos às diversas nações in Diz.Cat.
50
É o caso clássico da França, dos países comunistas e de diversas repúblicas latino- americanas.
51
Para uma visão da situação brasileira quanto ao ensino religioso cf. Anisia de Paulo Figueiredo, O ensino
religioso no Brasil: tendências, conquistas, perspectivas. Petrópolis, Vozes, 1996; para conhecimento da discussão
atual cf. bibliografia em português no final do capítulo. Cf. W. Bühlmann, O terceiro mundo e a terceira Igreja:
uma análise do presente e do futuro da Igreja. São Paulo, Paulinas, 1976, cap. XVI; M. Fievet, École,
mission et l´Église de demain. Paris, Cerf, 1969.
283
Essa práxis tradicional sofreu um forte questionamento, principalmente no período
pós-conciliar, que em alguns casos se tornou contestação polêmica. Isso estimulou não
apenas o estudo do problema e a experimentação de novas fórmulas, mas também
importantes posicionamentos autorizados.52 É verdade que as situações locais são muito
diversas no que se refere aos sistemas escolares, mas podemos tentar apontar as tendências
mais gerais do problema e apresentar um quadro que sirva de orientação sobre as relações
entre catequese e escola nos dias de hoje.
4.1.1. Um olhar para o passado: o ensino da religião (ER) como “catequese escolar”
52
Cf. bibliografia no fim do capítulo.
53
Cf. Rémond, Religion et société en Europe: essai sur la sécularisation des sociétés européennes aux XIX e XXe
siècles (1789-1998). Paris, Éditions du Seuil, 1998.
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