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FELICIDADE ESTÁ NA PAUTA DO DIA

Raquel Lima – Profª. PUC-Campinas

Foi o ateniense Sócrates (470-399 a.C.) quem iniciou a discussão, há mais de dois mil anos.
Mas hoje, em pleno século 21, a humanidade ainda busca respostas sobre a felicidade.

O que é, onde e como encontrá-la? Será que todos podem ser felizes? É possível atingir a
felicidade plena?

A ciência já descobriu que a genética interfere, sim, na felicidade de uma pessoa. “Pesquisas já
comprovaram que há genes que a favorecem. Esses genes, porém, não necessariamente
trazem felicidade, mas oferecem o potencial para que a pessoa seja feliz”, explicou o professor
da Faculdade de Ciências Biológicas, do Centro de Ciências da Vida (CCV) da PUC-Campinas,
Edmilson Ricardo Gonçalves.

Por que isso ocorre? “Esses genes comandam a produção de determinados


neurotransmissores, relacionados à sensação de bem-estar, como a endorfina, que é liberada,
por exemplo, quando comemos chocolate ou praticamos exercícios físicos”, declarou. O que
ainda falta, no entanto, é a identificação desses genes para o aprofundamento dos estudos.
“Temos 26 mil genes e não sabemos a função da metade deles”, argumentou.

A própria Psicologia se rendeu à felicidade. Há cerca de 20 anos os estudos sobre sentimentos


negativos, como a tristeza, a angústia e a raiva, passaram a dividir espaço com a chamada
‘psicologia positiva’, que tem como objetivo analisar a relevância das emoções boas para o
nosso equilíbrio físico e mental. “É de extrema importância que a Psicologia tenha a
preocupação com tais aspectos, buscando descrever as contingências que controlam as
emoções positivas, tais como a felicidade, pois, ao fazê-lo, estará ajudando na promoção de
uma vida mais feliz e bem-sucedida”, disse Sofia Helena Porto Di Nucci, professora da
Faculdade de Psicologia, do CCV.

É a partir da Psicologia que compreendemos a influência do ambiente em que vivemos no


nosso grau de felicidade. “Com Skinner, psicólogo norte-americano, aprendemos que nossas
emoções, tal como todos os comportamentos, são resultado de mecanismos que envolvem
aspectos ontogenéticos e o ambiente. Portanto, ‘ser feliz’ é uma condição que aprendemos ao
longo de nossa vida, com as pessoas com quem convivemos e com as condições que esse
ambiente nos dispõe”, analisou. “A vivência da felicidade vem do aprendizado diário de
conhecer e expressar os desejos e sentimentos, construindo os próprios projetos de vida e
empenhando-se para realizá-los. À medida que o ambiente nos ensina a lidar desse modo com
nossas emoções e nos gratifica pelas conquistas que geram tais emoções, este tem papel
fundamental na construção da felicidade do ser humano”.

Filosofia
Diversas reflexões sobre o tema já foram feitas por diferentes filósofos, em momentos
distintos. De acordo com Arlindo Ferreira Gonçalves Júnior, professor da Faculdade de Filosofia
da PUC-Campinas, dentre algumas concepções de felicidade presentes na antiguidade, a noção
desenvolvida por Aristóteles (384 a 322 a.C.) é a que merece destaque para a história da
filosofia. “Aristóteles a faz reconhecer como sendo a própria realização de determinados bens,
tais como a virtude e a sabedoria, e tende a identificá-la como uma atividade de caráter
racional e moderado, associando-a com a faculdade de contemplação”, explicou.

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O professor de Filosofia escolheu uma afirmação de Bertrand Russel para sintetizar as várias
noções filosóficas atuais: “Uma vez satisfeitas as necessidades vitais, a felicidade profunda
depende, para maioria dos homens, de duas coisas: de seu trabalho e de suas relações com os
outros”.

No entanto, Gonçalves Júnior ressaltou que uma importante contribuição da filosofia


contemporânea, principalmente pela atualidade de sua interpretação, está na corrente
fenomenológica, sobretudo ao compreender a noção de felicidade como finalidade da vocação
pessoal. “Daí, podemos compreender a felicidade como a satisfação de estar cumprindo não
um dever entre tantos, mas o dever que preenche todos os poros da existência”, explicou.

De acordo com a professora Sofia, para a Psicologia não há uma definição sobre o que é
felicidade, mas considerações sobre que condições produzem tal sentimento. Ela explicou que,
de acordo com o norte-americano Martin Seligman (um dos expoentes da psicologia positiva) a
felicidade é a soma de três coisas diferentes: prazer, engajamento e significado. Segundo ele, o
prazer está relacionado a sensações positivas como, por exemplo, as que as pessoas costumam
sentir no corpo quando estão dançando uma boa música.

Já o engajamento, explicou ela, é caracterizado pela ênfase no envolvimento que a pessoa tem
em relação à sua vida, é uma pessoa que tem uma participação muito ativa na vida. “O
significado é nada mais do que a sensação de que nossa vida faz parte de algo que tem um
significado maior. Segundo esse cientista, a busca da felicidade deve ser feita considerando
esses três aspectos, não adianta se focar em apenas um, como por exemplo, o prazer sem se
atentar para os outros dois.” “Assim, podemos nos sentir felizes diante de algumas situações
gratificantes e prazerosas, mas trata-se de um estado ou uma condição momentânea”,
completou.

“Impossível necessário”
Na opinião do professor da Faculdade de Filosofia, não é possível atingirmos a felicidade plena.
“Se eu considerar que a felicidade é aquilo pelo qual designo a realização da pretensão de
minha biografia, e considerando que sou um ser projetivo, lançado sempre adiante, não posso
considerar a ideia de felicidade plena, uma vez que me reinvento a cada instante e sou
condenado a isso”, disse. “Creio que a essência da felicidade seja sua condição de ‘impossível
necessário’.”

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