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Ressuscitação cardiopulmonar cerebral em cães e gatos

Raramente se faz ressuscitação em grandes com sucesso. A ressuscitação não está diretamente
relacionada ao ato anestésico, não necessariamente o anestesista que tem que fazer, mas é muito
importante saber fazer.

A parada cardiorrespiratória (PCR) é dita como a interrupção súbita e inesperada do funcionamento


cardíaco e respiratório efetivo (deve gerar débito cardíaco, fluxo cardíaco sistêmico), que pode ser
reversível por intervenção imediata, mas leva à morte na sua ausência. O quanto antes se inicia a
intervenção, melhor é o prognóstico do animal.

Ressuscitação cardiopulmonar cerebral (RCPC) – hoje em dia existe o conceito de que sobreviver não é
apenas não morrer, eu tenho que ter um animal vivo que tenha condições de se manter vivo (com
restabelecimento das funções orgânicas, com cérebro ativo). Quanto maior o tempo de parada, pior o
retorno das funções. A ressuscitação deve ser não só cardíaca e pulmonar, mas também cerebral. Três
tempos em que se divide o processo de ressuscitação:

Suporte básico – massagem cardíaca e ventilação

Avançado – medicação e monitoramento

Prolongado – cuidados gerais com o paciente até que ele restabeleça as funções completamente.

Os proprietários podem / devem ser questionados no ato da admissão sobre a autorização dos
procedimentos a serem realizados em caso de PCR. Opções: não ressuscitar, somente com compressão
cardíaca externa ou com compressão cardíaca interna. Sempre ter critério técnico com relação à condição
do animal a responder a ressuscitação (animais em quadros muito agravados têm poucas chances, por
exemplo). Durante a anestesia, animais que já têm complicações ficam mais propensos a terem parada,
por isso sempre se indaga ao proprietário. Durante a anestesia, se tenta todas as medidas para manter a
frequência cardíaca e respiratória do animal, evitando ao máximo a possibilidade de parada
cardiorrespiratória.

Causas comuns de PCR:

Hipóxia tecidual, que pode ser secundária à hipoventilação (cuidado com apneia transanestésica)

Hipovolemia extrema

Estímulo vagal excessivo (que leva à bradicardia extrema, comum em cirurgias cervicais. Tto é atropina)

Distúrbios ácido-base ou metabólicos graves (normalmente consequências de doenças, raramente têm


essas alterações por causa da anestesia e durante a anestesia)

Choque

Arritmias cardíacas importantes (pacientes cardiopatas)

Doses excessivas de anestésicos (ATENÇÃO acontece também com os pacientes que não têm doenças
associadas – cirurgias eletivas asa 1 ou 2, ou pacientes que tinham algum tipo de problema que não foi
reconhecido com doses excessivas).

RECONHECNEDO A PCR

Os animais que tem PCR são normalmente classificados em 3 categorias

1). Sucumbem devido à uma doença terminal ou multissistêmica (até que ponto vale a pena ressuscitar?)
2). Sofrem de condições severas porém possivelmente reversíveis (atropelamento, hemorragia etc chance
real de sobrevida)

3). Complicação anestésico-cirúrgicas (problemas na cirurgia, excesso de dose de anestésico, via de


administração equivocada).

Reconhecendo a parada:

Colapso, perda de consciência, ausência de movimentos respiratórios espontâneos (na anestesia,


percebemos somente a ausência de movimentos respiratória)

Ausência de movimentos cardíacos e pulso femoral (além de auscultar, é importante palpar os vasos
periféricos. Pressão arterial sistólica abaixo de 60 não faz pulso e precisa de intervenção, porque quer
dizer que não tem fluxo sanguíneo periférico. Importante lembrar que na hipotermia severa tem
vasoconstrição e prejudica a circulação periférica).

Equipamentos de monitorização possuem valor inestimável no reconhecimento da PCR.

A equipe

Primeiramente a sala deve ser organizada, com tudo o que for necessário organizado, e quem for
ressuscitar tem que saber o que está fazendo.

Ideal que seja uma equipe fixa. Cada um precisa saber sua função. Mínimo de três pessoas fazendo:
ventilação, compressão torácica, compressão abdominal (ao comprimir o abdome do animal faz
resistência à circulação do sangue na região caudal do animal, favorecendo a circulação onde é mais
preciso: coração, pulmão e cérebro), acesso venoso (importantíssimo! Muitas vezes é difícil fazer com
tanta gente mexendo no animal. Então, pode-se fazer os medicamentos por meio da traqueia, com
animal entubado – fazer diluição do fármaco – fazer administração por uma sonda, que pode ser uretral,
que coloca dentro da sonda traqueal), administração de fármacos.

REALIZANDO A PCR

Suporte básico para a vida

Famoso ABC. Deve ser iniciado imediatamente, tão logo a PCR tenha sido identificada. Manter via aérea,
prover ventilação e gerar fluxo sanguíneo.

*Ponto importantíssimo: durante a parada aparece midríase muito claramente e rápido. À medida que se
faz a ressuscitação com sucesso, a midríase vai diminuindo.

1). Vias aéreas

Intubação orotraqueal (com cuff) ou traqueostomia. Ter certeza que efetuou o procedimento
adequadamente (cuidado para não entubar o esôfago). Aspirar secreções na orofaringe/laringe antes de
entubar (enquanto está aspirando, não perder tempo, ir fazendo massagem cardíaca).

2). Ventilação

Ventilação pressão positiva (10-24 mov resp/min) com oxigênio, volume corrente de 10ml/kg e pressão
de pico de 15-20 cmH2O. Importante olhar para o animal para verifica se está tendo distensão adequada
do tórax.

FR pode ser maior (ppte em gatos e cães muito pequenos), entretanto tem efeito negativo na perfusão
coronariana e débito cardíaco.

Apertar o balão para prover ventilação e soltá-lo para permitir a expiração. Importante pressão zero de
intervalo (esperar o balão esvaziar por completo para encher de novo).
3). Circulação

Acesso venoso / Intraósseo (intraósseo ppte em filhotes, acesso em fêmur e úmero)

Compressão torácica (CT) duas teorias que explicam o retorno da circulação: Teoria da bomba cardíaca –
a CT gera compressão direta dos ventrículos (diminui o tamanho do ventrículo, gerando o débito
cardíaco). Teoria da bomba torácica- a CT eleva a pressão intratorácica, fazendo com que o sangue flua
dos vasos com paredes mais finas para os de parede mais espessas (pressão positiva de fora pra dentro, o
sangue sai dos vasos mais delgados e vai pros vasos de parede mais espessas – causa o enchimento
cardíaco e retorno da circulação).

Compressão torácica:

Pequenos animais – decúbito lateral com a mão sobre o coração.

Animais maiores – decúbito lateral com a mão na porção mais larga do tórax ou sobre o esterno, na área
mais alta, caso decúbito dorsal (por ex. durante a anestesia).

100 compressões/min (próximo da frequência do animal – cão 60-80, gato 100-120, mas isso é difícil de
conseguir, principalmente o do gato), deve reduzir o diâmetro do tórax em 1/3 (por isso o sucesso é raro
em grandes animais, a pressão necessária é muito grande), com proporção de 1:1 de compressão e
relaxamento.

As CT não são interrompidas para acesso venoso ou intubação.

*Na CT é comum acontecer fratura de costela, principalmente em animais mais velhos. Acontece também
hematoma pulmonar, mas a prioridade é a ressuscitação do animal.

Durante a ressuscitação, mantém-se circulação cerebral de 70% aproximadamente, função coronariana


de 80% e perfusão sanguínea de 20%. Com o passar do tempo, esses índices só pioram.

*Desfibrilador é usado pra tratar fibrilação, o que é raro em cães e gatos.

Se não for efetiva? Mudar o operador, a posição das mãos ou mesmo a intensidade e frequência das
compressões.

Massagem cardíaca interna:

Indicações – defeito da parede torácica, traumas penetrantes, tamponamento cardíaco, doença do


espaço pleural. Eficiência muito maior.

O problema é a condição que você dá pro animal depois de abrir o tórax dele – deve ter condição de
manter ele em UTI, deitado por 48 horas etc. problema muito grande em grandes animais.

Não esperar mais de 5 minutos se a externa for ineficaz (ninguém toma essa medida, só tá lá no livro. 5
minutos é muito pouco tempo).

Abrir entre o 4º, 5º ou 6º espaço intercostal.

Suporte avançado para a vida

Consiste na administração de fármacos (ex. adrenalina na parada por assistolia, por fibrilação usa o
desfibrilação e depois adrenalina), interpretação do ECG e desfibrilação elétrica.

4). Fármacos

Vias: venosa central, IO, venosa periférica e intratraqueal (IT). Utilizar cateter de grande diâmetro.

IT: dobrar a dose, em 5-10 ml de água para injeção ou NaCl 0,9% (para animais com menos de 10 kg,
apenas dobra o volume da dose da adrenalina).
Via periférica: administrar de 5 a 20 ml bolus de fluido IV depois para circular o medicamento e ele var o
membro.

Eletrocardiografia

É muito importante. Irá orientar as novas condutas a serem tomadas. Deve ser realizada de forma
constante. Ritmos cardíacos de parada mais comuns:

Assistolia, que é a atividade elétrica sem pulso (dissociação eletromecânica) e fibrilação ventricular.

Avaliar sempre em conjunto com a auscultação e avaliação de pulso.

Realizando a RCPC

Terapia da fibrilação ventricular. Usa-se desfibrilação elétrica e podem ser usados fármacos anti-
arrítimicos – Amidarona 5mg/kg indicação na fibrilação ventricular ou na taquicardia ventricular.

Administração de fluidos na RCPC

A administração de grandes quantidades de fluidos durante a RCPC deve ser evitada, pois pode reduzir a
pressão de perfusão coronariana (PPC). PPC representa a diferença entre a pressão aórtica e a pressão
arterial direita. Deve-se evitar na PCR devido a ICC. Ser conservador no paciente normovolêmico e
reservar grande volume para os hipovolêmicos.

Suporte prolongado para a vida

Refere-se ao período após o retorno da circulação espontânea e as medidas necessárias de suporte para
prover perfusão, circulação e oxigenação, bem como tratar outras condições.

Monitorar, dar suporte a todos os sistemas orgânicos e adotar outras medidas necessárias para manter
normocapnia, normoxia e pressão adequada. Monitorar produção de urina por meio da quantificação
(passar sonda).

Considerar o uso de vasopressores, inotrópicos positivos e manitol (utilizado ppte em animais com
trauma intracraniano para redução da pressão também).

Hipotermia

Hipotermia moderada (32—34º) por 12 a 24 horas está associado a melhor recuperação neurológica em
cães e gatos. O que se preconiza é que a recuperação da temperatura ocorra de forma lenta (1 grau por
hr, segundo al iteratura). Pode-se manter o animal em 35 º por meio só da regulagem do ar condicionado
da sala.

*Dosar glicemia, importante também a nutrição do animal.

Considerações finais

As melhores taxas de sucesso da RCPC ocorrem quando a PCR é identificada rapidamente e quando o
quadro clínico do paciente é favorável pela recuperação.

Treinamento e organização são fundamentais para a agilidade do procedimento.

*Ocorrência de cegueira cortical – o animal retorna as funções, mas volta cego. O quadro tende a evoluir
favoravelmente de 7 a 10 dias após a parada. É secundária à hipóxia cerebral.

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