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Fatores de risco para ocorrência de doenças ocupacionais na


atividade de teleatendimento/telemarketing
Helen Karoline Pereira Elgaly1
Helen.elgaly@hotmail.com

Dayana Priscila Maia Mejia2


Pós-graduação em Fisioterapia do trabalho - Biocursos

Resumo

A evolução dos tecnológicos auxiliou na crescente demanda de serviços com


teleatendimento, que se multiplicaram na mesma velocidade que as queixas
relacionadas à função. O presente estudo é uma revisão bibliográfica qualitativa com o
objetivo de analisar quais os fatores na atividade e como esses fatores influenciam no
desenvolvimento de doenças ocupacionais. Os resultados demonstraram que há grande
ocorrência de queixas auditivas, visuais, musculoesqueléticas e principalmente de
caráter psicológico, desde os anos 80. Apesar da existência de um anexo específico na
norma reguladora 17, elaborado em 2007, a organização do trabalho, as condições
físicas de mobiliário e equipamentos e as condições ambientais ainda não são adequadas
ao exercício da função, resultando no surgimento de condições irreversíveis na saúde
destes trabalhadores.
Palavras-chave: telemarketing, teleatendimento, call centers, doenças
musculoesqueléticas, doenças ocupacionais

1. Introdução

Os atuais sistemas de produção dependentes de informática permitiram o crescimento


do ramo do telemarketing, centrais de atendimento ou call centers, em diversas
funções1.
Problemas associados à função de operador de telemarketing/teleatendimento ou call
centers são uma preocupação desde a década de 80. Diversas entidades sindicais e
associações de trabalhadores procuraram o Ministério do Trabalho e Emprego no
decorrer dos últimos anos buscando apoio e ações de fiscalização para atender às
queixas de seus associados. Os relatos demonstram sofrimento dos trabalhadores
relativos a Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT), problemas
vocais, problemas auditivos e adoecimentos de ordem mental e psicológica, além de
grande rotatividade2.
Por ser uma categoria profissional predominantemente jovem, feminina, a preocupação
volta-se para o conhecimento dos fatores de risco a fim de evitar o adoecimento
precoce.
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2. Conceitos
2.1 A atividade do telemarketing/teleatendimento
Os serviços de teleatendimento foram criados como ferramentas competitivas na busca
por maior eficiência no alcance ao público alvo das empresas através do contato
telefônico direto com o cliente. Neste serviço, os operadores atendem os clientes de
empresas que as contrataram para fornecimento, via telefone, de informações,
reclamações, oferta de produtos e mesmo assistência técnicas3.
A Norma Reguladora – NR 17 define a atividade de teleatendimento/telemarketing
como “aquela cuja comunicação com interlocutores clientes e usuários é realizada a
distância por intermédio da voz e/ou mensagens eletrônicas, com a utilização simultânea
de equipamentos de audição/escuta e fala telefônica e sistemas informatizados ou
manuais de processamento de dados”4.
Sobre as condições gerais de exercício da profissão, o Código Brasileiro de Ocupações,
explicita ser “comum o trabalho sob pressão quando as filas de espera de atendimento
aumentam”, sendo características do teleatendimento a necessária e contínua utilização
do telefone, a variedade de formas de trabalho, a necessidade de relacionamento com os
usuários e a organização do trabalho baseada em “roteiros e scripts planejados e
controlados para captar, reter ou recuperar clientes”5.
Os operadores de telemarketing lidam com uma diversidade de exigências cognitivas
tais como raciocínio rápido, concentração e memória, tendo ainda de depender de frases
e expressões prescritas para lidar com situações constrangedoras, exigências afetivas,
como alterações de humor do cliente e físicas em função de permanecer sentado durante
grande parte do tempo, pela postura e uso constante da voz e mãos6.
Além do gerenciamento estrito pelo tempo, as rotinas de trabalho são também impostas
rigidamente. Os operadores estão constantemente submetidos a situações problemáticas,
exigindo estratégias cognitivas específicas para a resolução das diversas e variáveis
demandas. O conteúdo das respostas dadas pelos operadores e o modo de resolução dos
problemas variam de acordo com essas demandas, sendo formatados em tempo real por
suas competências e pela pressão temporal a que se encontram submetidos7.
O forte predomínio do taylorismo indica que a organização do trabalho implantada
nesse setor da economia encontra respaldo na sofisticação da tecnologia, posto que toda
a movimentação seja registrada por software: o número de ligações feitas e recebidas, o
tempo de atendimento, as pausas, as vendas realizadas, as estatísticas dos resultados das
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ligações, a indicação de clientes à espera e o tempo excedido de atendimento, entre


outros dados8.
2.2 Sofrimentos físicos e psíquicos na atividade
As situações de trabalho que podem causar sofrimentos mental e físico de maior
intensidade são aquelas que aliam a forte carga de trabalho com as exigências do
atendimento ao público9.
É claro que o entendimento que a associação da informática à telefonia, apesar de ter
trazido novas possibilidades de controle e intensificação do trabalho, no caso do
teleantendimento, esse novo tipo de trabalho trouxe também repercussões sobre a saúde
dos operadores10.
Os reflexos das situações existentes nem sempre são explícitos. A presença constante de
queixas e sintomas de estresse e o alto absenteísmo são evidências de desgaste,
resultante de regulações cognitivas, altas exigências afetivas e psíquicas num ambiente
sonoro desconfortável, utilizando-se mobiliário precário11.
No Brasil, desde 1944, o desgaste da atividade da telefonista foi reconhecido pela
legislação mediante jornadas reduzidas e obrigação de pausas12 e reafirmada pela
promulgação da Norma Regulamentadora 17 (NR-17), anexo II em 20074.
Em relação ao sofrimento mental, um estudo de 1910, de Julliard, levou à criação da
expressão “neurose das telefonistas”, a partir de sintomas de fadiga, tensão nervosa,
cefaléias, insônias, dificuldades para refletir e para fixar sua atenção e “violento
nervosismo”, associados principalmente com a exigência de rendimento e o controle no
trabalho13. É queixa corrente das telefonistas o intenso esforço mental necessário em
razão do número de operações a realizar simultaneamente9.
Quanto aos DORT, o trabalho em telemarketing envolve a utilização intensiva de
microcomputadores, permitindo grande intensificação do trabalho e agregando riscos
associados ao trabalho com computadores às exigências mentais e comunicacionais
características das tarefas desses trabalhadores. Também são relacionados com a função
sintomas osteomusculares dos ombros, pescoço e membros superiores com o aumento
de pressão gerencial e de carga de trabalho, incluindo rotinas de trabalho com poucas
oportunidades de tomada de decisões, altas demandas de processamento de
informações, posturas desconfortáveis pelo mobiliário, temperaturas inadequadas e
número reduzido de pausas14, 15,16.
Doenças musculoesqueléticas podem ser causadas por postura inadequada, uso contínuo
de dedos, pulsos e braços em movimentos repetitivos no uso do computador ou por
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posto de trabalho inadequado com espaço insuficiente para o trabalho e falta de suporte
do antebraço. Leva- se em conta também o fator das prolongadas horas sentadas17.
A organização do trabalho é o mecanismo por meio do qual se regula o funcionamento e
a atividade dos trabalhadores. Nessa categoria, situam-se as definições de ritmo,
horários, turnos de trabalho, revezamentos, treinamentos, determinações quantitativas e
qualitativas de produção, repartição das responsabilidades, hierarquia, comando,
controle18, 19.
A rigidez da organização do trabalho retira a participação dos trabalhadores desse
processo, limitando-os totalmente às determinações superiores. Sendo assim, não há a
possibilidade de os trabalhadores buscarem uma adaptação espontânea do trabalho a sua
realidade, o que pode gerar conflitos, insatisfações, sentimentos de indignidade,
inutilidade, desqualificação e até depressão20. Esses sentimentos podem provocar ou
agravar problemas de saúde dos trabalhadores, prejudicando seu desempenho, a
produção e a instituição21.
Evidências apontam vínculos entre trabalho repetitivo, tarefas fragmentadas e
executadas sob pressão, pouca possibilidade de defender e replanejar a prescrição das
tarefas, submissão a controles organizacionais rígidos e a ocorrência de LER/DORT. Os
contextos de trabalho que oferecem riscos à saúde mental também o oferecem para o
desenvolvimento das LER22.
Aspectos adicionais presentes nos relatos dos trabalhadores aos sindicatos e em análises
ergonômicas realizadas referem-se à manutenção de posturas inadequadas, estáticas e
estereotipadas, por longos períodos, sem liberdade para alternativas posturais; utilização
contínua da voz como ferramenta de trabalho; exposição continuada aos sons gerados
pelo fone de ouvido e ao ruído ambiente de conversação; ambientes confinados, dotados
de ar-condicionado centralizado, com baixas temperaturas e baixa umidade relativa do
ar; iluminação deficiente para leitura, reflexos em monitores, manutenção de distância
focal visual por períodos prolongados; restrições à satisfação das necessidades
fisiológicas, incluindo distúrbios do ritmo circadiano por trabalho noturno e em turnos e
necessidade da realização de outras atividades remuneradas para complemento de
renda6, 23.
3. Metodologia
O estudo trata-se de uma revisão bibliográfica, as bibliografias foram reunidas com o
objetivo de compreender como e quais os fatores de risco que podem afetar a saúde do
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funcionário de teleatendimento/telemarketing. Utilizou-se abordagem qualitativa na


pesquisa permitindo grande abrangência de bibliografias, de vários países.
O estudo bibliográfico foi realizado através da base de dados Scielo, revistas científicas
consagradas nas áreas de fisioterapia, medicina e engenharias, MEDLINE, LILACS e
livros na área de fisioterapia, medicina e psicologia.
As palavras-chave utilizadas na busca foram: telemarketing, teleatendimento, call
centers, doenças musculoesqueléticas, doenças ocupacionais.
Os primeiros estudos na área datam de 1984, especialmente voltados para a análise do
sofrimento psíquico entre os trabalhadores da atividade. Conforme foi aumentando o
número de queixas de doenças musculoesqueléticas, surgiram os estudos relacionando a
atividade às queixas, logo foram utilizados artigos publicados de 1993 a 2015.
Por ser uma atividade mundial, os estudos analisados são originários de diversos países,
originalmente publicados na língua inglesa, além de publicações nacionais para maior
abrangência do tema.
Ao longo da seleção da bibliografia, foi possível perceber que a produção científica na
área é vasta, dando-se maior ênfase para as queixas psicossociais originadas da função.
4. Resultados e discussão
Estudos sobre prevalência de sintomas entre os trabalhadores de atendimento telefônico
vêm sendo realizados em diferentes países.
Os principais fatores de risco para doenças musculoesqueléticas são ergonômicos,
como: ritmo elevado de trabalho, movimentos repetitivos, pouco tempo para
recuperação, esforço, posturas inadequadas e dinâmicas, pressão mecânica e vibração.
Porém, fatores psicossociais também se apresentam como risco para o desenvolvimento
de doenças musculoesqueléticas, como alta demanda psicológica e tensão, baixos
controle e suporte social no trabalho e poucas oportunidades para pausas24.
O sofrimento mental aparece como intermediário necessário à submissão do corpo. Da
mesma forma, o autor salienta haver uma contradição entre um serviço destinado à
comunicação e a proibição de qualquer relação psicoafetiva, já que é proibido se
expressar e passar, nas respostas ao interlocutor, qualquer parcela de desejo próprio20.
No estudo da Confederação Sindical Francesa envolvendo 3.500 operadores franceses
de teleatendimento, verificou-se a prevalência de ansiedade, estresse e fadiga em 71%
dos operadores pesquisados, além de problemas visuais e auditivos (16%) e dorsalgias
(6%)12.
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Teleatendentes mostraram uma prevalência mais alta de distúrbios de pescoço e


extremidades superiores em relação a outros usuários profissionais de computadores,
como ficou demonstrado em estudo amplo de 28 centros de atendimento na Suécia25.
Estudos mostram problemas vocais em operadores de teleatendimento26, assim como
sintomas relacionados à exposição aguda a “choques acústicos” em operadores de
telemarketing na Austrália27, causados por ruídos de alta frequência e intensidade, tais
como sensações de parestesia ao redor da orelha, perda de audição, zumbido no ouvido
afetado, alterações do equilíbrio, dores recorrentes, ansiedade, depressão e episódios de
síndrome do pânico.
A norma NR 17 afirma no item 4.2 Anexo II que os ambientes de trabalho devem
oferecer níveis de ruído de acordo com o estabelecido na NBR 10152, onde é
considerado aceitável para efeito de conforto de até 65 dB4.
Ainda no início do século, já reconhecia o prejuízo da fadiga e observou que “mesmo
depois de reduziras horas de trabalho de 10,5 para 8,5”, após hora e meia de serviço
consecutivo, as moças “começavam a mostrarem-se nervosas”. Para redução dos sinais
de fadiga, estabeleceu pausa de dez minutos ao fim de cada hora e um quarto de
trabalho28.
A NR 17 afirma no item 5.4 que as pausas devem ser concedidas fora do local de
trabalho, em dois períodos de 10 minutos contínuos, após os primeiros e antes dos
últimos 60 minutos de trabalho, sem incluir a pausa para alimentação e descanso
estipulada em 20 minutos4.
A satisfação dos operadores de uma empresa de telemarketing com o sistema de pausas
implantado foi objeto de um estudo, mostrando evidências de insatisfação
principalmente por parte dos operadores com maior tempo de serviço, constatando
“baixa motivação” e “alta pressão psicológica” em entrevistas. As pausas (cinco
minutos durante a jornada) não eram compatíveis com a natureza de suas tarefas e não
atendiam às exigências da NR-17 do MTE para processamento eletrônico de dados12.
Analisando o efeito de diferentes configurações de pausas na fadiga e no desempenho
dos operadores de ajuda à lista telefônica, um estudo recomendou a adoção de pausas de
10 minutos após 60 minutos trabalhados29. Essa recomendação é consistente com os
achados de outro estudo16 que mostrou o efeito positivo de pausas de 10 minutos após
50 minutos de trabalho na redução do número de casos de distúrbios osteomusculares
relacionados ao trabalho.
7

Marcus e Gerr30 verificaram, em trabalhadoras de escritório, que existiu associação


entre a presença de sintomas de pescoço/ombro e punhos/mãos quando existiu situação
estressante nas duas últimas semanas que precederam o preenchimento do questionário,
fato também observado neste estudo quando houve associação a sentir-se tenso na
última semana e à presença de sintomas no pescoço/ombro e punhos/mãos.
Em relação ao peso da insatisfação no trabalho no perfil de morbidade, Seligmann-
Silva31 analisa que diversos componentes da organização do trabalho que podem ter
influência na saúde do trabalhador, com ênfase no fato de que divisões técnica e social
do trabalho são perpassadas por relações de poder.
No estudo de Fernandes et al.32, em 155 trabalhadores, 79% tinham menos de um ano e
meio na empresa, folgando apenas dois domingos em cada mês. Em seis horas de
jornada, apenas quinze minutos para lanche e tolerância de dez minutos para situações
emergenciais tais como idas ao banheiro ou assuntos pessoais urgentes, sendo que os
intervalos eram determinados pelos supervisores, com pouca ou nenhuma participação
dos trabalhadores. Unanimemente os operadores apresentavam descontentamento em
relação à duração dos intervalos, que eram encarados como insuficientes para o
descanso.
As trabalhadoras avaliadas no estudo que deu origem ao termo “neurose das
telefonistas” queixavam-se não só do ruído, mas também dos defeitos materiais, das
questões de iluminação e aeração, com certeza situações muito mais críticas e penosas
do que as encontradas nos call centers atuais. A maioria insistia, conforme o autor, nas
queixas sobre a organização do trabalho, especialmente a necessidade de rendimento e o
controle exercido. Os ritmos impostos excediam as possibilidades normais de adaptação
e traduziam-se nas telefonistas por sensações de sobrecarga e pressão. Estímulos
individuais, gerando competitividade foram também vistos como fatores de tensão e
angústia13.
Em concordância, outro autor32 mostrou a existência de bônus e prêmios de
produtividade individual em call centers, que podiam variar de zero a 50% do salário do
trabalhador, gerando acelerações do processo e ambiente de competitividade contínuo.
Em acréscimo, ocorrem reclamações com a forma não participativa e a pouca
antecedência de programação das jornadas, que envolvem trabalhos noturnos e em dias
de feriados. Pesquisa33 revelou como consequências dessas restrições a ocorrência de
queixas de dores de cabeça, infecções, astenia, depressão e irritabilidade, além de
8

prejuízos na alimentação e sono, com sensações variadas e generalizadas de humor


negativo.
Foram descritas relações claras entre a atividade de trabalho e os sintomas apresentados
pelos grupos de telefonistas estudados, incluindo fadiga visual, distúrbios do sono,
sintomas digestivos e gerais, distúrbios da personalidade e da vida relacional, mostrando
os efeitos do trabalho sobre a personalidade, sobre a vida extra profissional e sobre o
estado de saúde desses trabalhadores34.
Um estudo descritivo realizado em empresa nacional do setor de teleatendimento com
4.900 funcionários, predominantemente do sexo feminino (75%) e de faixa etária entre
18 e 25 anos (55%). Foram evidenciados casos de atestados com diagnósticos do
grupamento CID-10 M60 – M79 (transtornos dos tecidos moles) que pela legislação
previdenciária estabelece nexo técnico epidemiológico previdenciário (NTEP) com a
atividade econômica da empresa35.
Rocha et al15 buscou identificar os fatores de risco para sintomas musculoesqueléticos
entre operadores de central de atendimento telefônico de um banco em São Paulo.Os
trabalhadores permaneciam em postura estática, sentada, durante 95% do tempo, com
fone de ouvido para escutar e falar com os clientes, consultando a tela e entrando com
dados através do teclado. A jornada de trabalho era de 6 horas, com uma pausa de 30
minutos. A prevalência dos sintomas osteomusculares encontradas nas mulheres foi de
43% no pescoço/ombro e 39 % nos punhos/mãos. Dentre os operadores, a prevalência
foi de 7,7% no pescoço/ombro e sem nenhuma queixa nos punhos/mãos. A prevalência
dos sintomas foi maior para as mulheres podendo este fato estar relacionado à idade
mais jovem dos operadores, seu menor tempo na função e também ao maior controle
sobre o processo de trabalho.
Os achados de maior risco de distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho para
mulheres que trabalham com computadores levaram a conclusão que o gênero é uma
construção social, e que se confunde pela presença no trabalho de mulheres em postos
de trabalho com maior imobilidade, maiores exigências de repetitividade, maior
monotonia no trabalho e menor controle nas decisões do trabalho, aspectos também
observados neste estudo36.
Para estes autores, os fatores associados aos sintomas dos ombros e do pescoço
incluíram o medo de ser substituído por computadores, aumento de pressão no trabalho,
aumento da carga de trabalho, rotina de trabalho com poucas oportunidades de tomada
de decisões e alta demanda de processamento de informações36.
9

Halford &Cohen37 investigaram a relação entre fatores psicossociais e do auto-relatode


sintomas musculoesqueléticos entre usuários de computador. Eles descobriram que o
monitoramento pela gerência, carga de trabalho e pressão foram significativamente
relacionados como auto-relato de sintomas musculoesqueléticos. Outros fatores incluem
o volume de dados processados,a velocidade da informação a ser dada e recebida e o
uso simultâneo de tecnologias.
Most38 verificou que 50% dos operadores de telemarketing sentem dores nos pescoço e
ombro, mas que não reclamam por medo de perder o emprego.
A região lombar também é alvo de queixas, uma vez que é intimamente afetada pela
manutenção da posição sentada. Esta posição possibilita pouca margem de
movimentação, tendo como consequência carga estática sobre certos segmentos
corporais, impondo uma carga biomecânica sobre os discos intervertebrais,
principalmente na região lombar39.
Pivetta e Vey40 se dedicaram a avaliar a frequência de dor lombar em operadoras de
telemarketing. A amostra estudada apresentou características laborais de permanência
na postura sentada por seis horas com dois intervalos de dez minutos. Das oito
voluntárias, cinco apresentaram dor lombar, caracterizando-se com dor de média
intensidade. Outra informação identificada nos instrumentos de pesquisa foi o cansaço
referido por todas as participantes ao final da carga horária de trabalho sendo,
principalmente, o cansaço mental.
Um estudo em uma grande empresa de telecomunicações relatou que a prevalência de
doenças de membros superiores relacionadas ao trabalho foi de 22% entre usuários de
computadores41.
Seguindo essa mesma linha de pesquisa, El-Bestar42 concluiu que a prevalência global
de doenças relacionadas ao trabalho em pescoço e membros superiores em uma empresa
de telecomunicações foi maior entre os usuários de computadores. Dentre as patologias
mais comuns na função, foram identificadas a espodilose cervical, estreitamento do
espaço do disco cervical e radiculopatia cervical.
Hassan e Abou El-Soaud43 informou que 66,7% da entrada de dados operadores tinham
distúrbios cervicais ocupacionais com radiculopatia, enquanto que 33,3% deles tinham
distúrbios cervicais sem radiculopatia.
No trabalho de escritório, a carga estática do pescoço combinada com os movimentos
repetitivos dos pulsos e mãos são fatores desencadeantes para reclamações pescoço-
ombro, particularmente entre os usuários de computadores devido à contração muscular
10

isométrica prolongada. Exposição psicossocial no local de trabalho, tais como medo de


ser substituído e baixo apoio social, podem preferencialmente afetar músculos da região
pescoço-ombros41.
No estudo de Poochada e Chaiklieng17 foi observado que os trabalhadores de call center
atendiam ligações de clientes 6 a 10 vezes por hora em média. Eles mantinham-se
sentados por um prolongado período de tempo sem muito tempo para relaxar, o que
pode ser associado com dor nas costas. Estes trabalhadores passam de 4 a 8 horas
contínuas por dia trabalhando com computadores, o que demonstra um risco, uma vez
que a tarefa contínua de interação com computadores associada à fatores ambientais
podem desencadear doenças musculoesqueléticas.
Em um estudo44 com operadores de caixa de supermercado, o considerável índice de
sintomas músculo-esqueléticos relacionou-se à necessidade de manutenção em posição
estática por tempo prolongado, incapacidade de alternação da postura no intervalo de
tempo preconizado, manutenção de posturas desequilibradas algumas vezes associadas à
rotação do tronco, número reduzido de pausas programadas, dentre outros, também
muito comuns entre os operadores de telemarketing.
O estudo de Charbotel et al45 avaliou o impacto das condições de trabalho em
funcionários de call centers, identificando fatores de risco. Foram avaliados 2130
funcionários. 60% destes apresentaram alguma queixa durante os 12 meses anteriores à
pesquisa. As queixas mais comuns durante esse período envolviam queixas
musculoesqueléticas em região cervical (59%), fadiga visual (77,3%) e fadiga auditiva
(50%). Grande parte da amostra também apresentou sintomas psicológicos, recorrendo à
medicação por estresse.
Outros estudos prévios também reportam a alta incidência de desordens
musculoesqueléticas entre funcionários de call centers. É o caso do trabalho46 que
concluiu que 68% dos funcionários apresentaram desordens musculoesqueléticas
durante os 12 meses prévios à pesquisa. Para estes autores os fatores associados foram:
uso do telefone por mais de 8 horas diárias, as posturas desconfortáveis pelo mobiliário
e a percepção da falta de controle sobre o trabalho.
Outro autor realizou grupos focais em uma central de atendimento com 200 operadores,
observando a presença de queixas de dores musculares associadas a conflitos entre a
qualidade exigida e o tempo de atendimento, a falta de treinamento para utilizar os
computadores e a má qualidade do mobiliário47.
11

A NR 17 refere sobre o mobiliário do posto de trabalho, afirmando que o mesmo deve


proporcionar ao trabalhador condições de boa postura, visualização e operação,
atendendo a requisitos de altura e características compatíveis, fácil alcance e
características dimensionais que permitam posicionamento e movimentação adequada
dos segmentos corporais. As exigências se estendem aos assentos e suportes dos pés, de
acordo com os itens 17.3.2, 17.3.3 e 17.3.4 da norma4.
Moraes48 em um estudo feito em uma empresa de telecomunicações em Fortaleza
avaliou o cumprimento da norma em relação a treinamento em riscos ergonômicos. A
pesquisa mostrou a importância de educar o trabalhador sobre riscos ocupacionais e
adotar medidas preventivas. A empresa avaliada oferecia treinamento a 100% dos
colaboradores e 90% avaliou o treinamento como importante e útil na prevenção dia-a-
dia.
A capacitação dos colaboradores é obrigatória, de acordo com o item 6.1 da NR 17,
anexo II. A conscientização deve proporcionar conhecimento sobre as formas de
adoecimento envolvendo a sua atividade, suas causas, efeitos sobre a saúde e medidas
de prevenção, com no mínimo 4 horas na admissão e reciclagem a cada seis meses4.
6. Conclusão
Apesar das recomendações específicas do ministério do trabalho e emprego através da
Norma Reguladora 17, anexo II, publicada em 2007, ainda pode ser observado alto nível
de queixas, absenteísmo e ocorrência de doenças ocupacionais musculoesqueléticas,
visuais, auditivas e psicológicas.
O trabalho na atividade apresenta diversos fatores de risco variados a incluir condições
materiais inadequadas de trabalho (equipamentos de informática, mobiliário e espaço
físico) somadas a fatores organizacionais e psíquicos (a não execução do trabalho
operacional, a falta de privacidade, a desvalorização do trabalho do atendente e a
conseqüente desvalorização pessoal por parte da hierarquia, ausência de pausas
adequadas).
Estas podem ser consideradas como causas do adoecimento do atendente, causando
estresse, crises nervosas, alterações de humor, insônia, angústia, falta de apetite,
dificuldades no trabalho intelectual, isolamento, com interferência nas relações sociais e
sintomas de LER/DORT e outras doenças ocupacionais.
Os fatores e como eles afetam o trabalhador devem ser de interesse e conhecimento do
empregado e principalmente do empregador, uma vez que a prevenção e a eliminação
do risco reduzem a prevalência de acometimentos, diminuindo assim os custos das
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empresas com o absenteísmo, além de reduzir os custos dos sistemas público e privado
de saúde com condições irreversíveis.
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