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Formas de inferência válida

Explicitar em que consistem as conetivas proposicionais de conjunção, disjunção


(inclusiva e exclusiva), condicional, bicondicional e negação;
Aplicar tabelas de verdade na validação de formas argumentativas;
Aplicar as regras de inferência do modus ponens, do modus tollens, do silogismo
hipotético, das leis de De Morgan, da negação dupla, da contraposição e do
silogismo disjuntivo para validar argumentos.
Principais falácias formais
Identificar e justificar as falácias formais da afirmação do consequente e da negação
do antecedente.

2. Formas de inferência válida – lógica proposicional

As formas de inferência válida que iremos abordar no âmbito da lógica proposicional


referem-se, em geral, a argumentos constituídos por proposições de tipo diferente daquelas
que já referimos.
Assim, para estudarmos os aspetos mais elementares da lógica proposicional,
devemos começar por distinguir proposições simples de proposições complexas, referindo
também em que consistem os operadores proposicionais.

2.1. Proposições simples e complexas e operadores proposicionais

Uma proposição é o pensamento ou o conteúdo expresso por uma frase


declarativa, suscetível de ser considerada verdadeira ou falsa. As proposições têm,
portanto, valor de verdade.
Proposições simples são proposições em que não estão presentes quaisquer
operadores. Proposições complexas são proposições em que está presente um operador ou
mais do que um.
O valor de verdade das proposições simples depende do facto de elas estarem ou não
de acordo com a realidade.
O valor de verdade das proposições complexas depende do valor de verdade das
proposições simples e dos operadores utilizados.
Às palavras ou expressões como “e”, “penso que”, “acredito que”, “ou”, “mas”,
“se…, então”, etc., chama-se operadores proposicionais. Ligadas a determinada(s)
proposição(ões), elas permitem formar novas proposições.
Dentro dos operadores proposicionais, chamam-se operadores verofuncionais –
operadores lógicos ou conetivas proposicionais – quaisquer operadores que nos permitam,
uma vez conhecidos os valores de verdade das proposições simples, determinar, apenas com
base nessa informação, o valor de verdade da proposição complexa resultante. Nessa altura,
diz-se que a proposição complexa é uma função de verdade.

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Podemos representar as proposições usando letras maiúsculas – P, Q, R, etc. –, às
quais se chama letras proposicionais. Enquanto símbolos que representam quaisquer
proposições simples, elas designam-se por variáveis proposicionais.

2.2. Operadores verofuncionais e formas proposicionais

O quadro seguinte apresenta-nos os operadores verofuncionais, com a simbolização


respetiva – a estes símbolos também se chama constantes lógicas –, com a maneira como se
lê cada símbolo e com as formas proposicionais correspondentes.

OPERADORES VEROFUNCIONAIS
Símbolo Leitura Formas proposicionais exemplo
¬ não Negação O João não vai a Paris.
∧ e Conjunção O João vai a Paris e a
Londres
∨ ou Disjunção inclusiva O João vai a Paris ou a
Londres.
∨ ou… ou Disjunção exclusiva O João ou vai a Paris ou
a Londres
→ se..., então Condicional Se passar de ano(então)
o João vai a Paris.
↔ se, e só se Bicondicional O João vai a Paris se e
só se passar de ano

Vejamos agora exemplos concretos dessas formas proposicionais, simbolizadas pelas


letras maiúsculas referidas:
Forma lógica Exemplos
¬P Não P O João não vai a Paris.
P∧Q PeQ O João vai a Paris e a Londres
P∨Q P ou Q O João vai a Paris ou a Londres.
P∨Q Ou P ou Q O João ou vai a Paris ou a Londres
P→Q Se P, então Q Se passar de ano(então) o João vai a Paris.
P↔Q P se, e só se, Q O João vai a Paris se e só se passar de ano

Distingue-se operador singular, unário ou monádico – o que se aplica apenas a uma


proposição – de operador binário ou diádico – o que se aplica a duas proposições. O
operador “não” é o único operador unário.

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A negação é uma proposição que se representa por “¬ P”. Se P é verdadeira, ¬ P é
falsa; se P é falsa, ¬ P é verdadeira. A negação de uma negação equivale a uma afirmação.

Uma tabela de verdade – ou matriz lógica – apresenta as diversas condições de


verdade de uma forma proposicional específica, permitindo determinar de modo mecânico a
sua verdade ou falsidade.

Eis a tabela de verdade da negação:

P ¬
P
V F
F V

A conjunção (P ∧ Q) é uma proposição que é verdadeira se as proposições


conectadas forem verdadeiras e falsa se pelo menos uma delas for falsa.

P Q P∧Q
V V V
V F F
F V F
F F F

O operador “ou” pode ter um sentido inclusivo ou exclusivo.


A disjunção inclusiva (P ∨ Q) é uma proposição sempre verdadeira, exceto quando P
e Q forem simultaneamente falsas.

P Q P∨Q
V V V
V F V
F V V
F F F

A disjunção exclusiva (P ∨ Q), por sua vez, é uma proposição que é verdadeira se P
e Q possuírem valores lógicos distintos, e falsa se possuírem o mesmo valor lógico.

P Q P∨Q
V V F
V F V
F V V
F F F

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A condicional, ou implicação material (P → Q), é uma proposição que só é falsa se P
– o antecedente – for verdadeira e Q – o consequente – for falsa. Nas restantes situações, a
proposição é verdadeira. O antecedente é uma condição suficiente para o consequente, o qual
é uma condição necessária para o antecedente.

P Q P→Q
V V V
V F F
F V V
F F V

A bicondicional, ou equivalência material (P ↔ Q), é uma proposição que é


verdadeira se ambas as proposições tiverem o mesmo valor lógico e falsa se as proposições
tiverem valores lógicos distintos.

P Q P↔Q
V V V
V F F
F V F
F F V

2.3. Âmbito dos operadores e formalização das proposições

Os operadores incidem sobre proposições simples ou complexas. O âmbito de um


operador refere-se à(s) proposição(ões) sobre a(s) qual(is) esse operador incide. Ao operador
de maior âmbito chama-se operador principal.

Eu pinto e não canto. P∧¬Q


Não é verdade que eu pinto e não canto. ¬ (P ∧ ¬ Q)

Para formalizar proposições, deverão seguir-se os passos abaixo indicados:

● Colocar as proposições na forma canónica.


● Isolar as proposições simples e atribuir variáveis proposicionais a cada uma
(“construir o dicionário” ou proceder à “interpretação” das proposições).
● Simbolizar ou formalizar a proposição complexa.

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Vejamos um exemplo:

Expressão canónica Dicionário Formalização


Se é falso afirmar que o mal P: O mal existe.
não existe e o bem é ilusório, Q: O bem é ilusório. ¬ (¬ P ∧ Q) → R
então as normas morais têm R: As normas morais têm
sentido. sentido.

2.4. Tabelas de verdade, tautologias, contradições e contingências

As tabelas de verdade permitem-nos determinar se uma proposição complexa é uma


tautologia – fórmula proposicional sempre verdadeira –, uma contradição – fórmula
proposicional sempre falsa – ou uma contingência – fórmula proposicional que tanto pode
ser verdadeira como falsa.

Exemplo de uma tautologia Forma lógica

Se observo o céu e escuto o vento, então (P ∧ Q) → P


observo o céu.

P Q (P ∧ Q) → P
V V V V
V F F V
F V F V
F F F V

Exemplo de uma contradição Forma lógica

Não penso ou não sonho se, e só se, penso (¬ P ∨ ¬ Q) ↔ (P ∧ Q)


e sonho.

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P Q (¬ P ∨ ¬ Q) ↔ (P ∧ Q)
V V F F F F V
V F F V V F F
F V V V F F F
F F V V V F F

Exemplo de uma contingência Forma lógica

Se passeio ou corro, então passeio. (P ∨ Q) → P

P Q (P ∨ Q) → P
V V V V
V F V V
F V V F
F F F V

2.5. Inspetores de circunstâncias

Uma forma de inferência dedutiva é válida se, e somente se, a fórmula proposicional
(implicativa) que lhe corresponde for uma tautologia.
Para a determinação da validade das formas de inferência dedutiva, é habitual o uso
dos inspetores de circunstâncias – que, no fundo, consistem numa sequência de tabelas de
verdade, que são feitas para as premissas e para a conclusão.
Como num argumento dedutivo válido é impossível que as premissas sejam
verdadeiras e a conclusão falsa, num inspetor de circunstâncias um argumento válido será
aquele em que não existe nenhuma linha (circunstância) que torne as premissas verdadeiras e
a conclusão falsa.
Vejamos um exemplo.

Argumento Dicionário Formalização

Se canto, então sou feliz. P: Canto. P→Q


Canto. Q: Sou feliz. P

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Logo, sou feliz. ∴Q

Em vez do símbolo ∴, também poderemos usar o símbolo , que se designa por


“martelo semântico”. Ambos se leem “Logo”, um indicador de conclusão.

Teremos então o seguinte inspetor de circunstâncias:


Premissa 1 Premissa 2 Conclusão

P Q P → Q, P ∴Q
V V V V V
V F F V F
F V V F V
F F V F F

A primeira linha exprime a única circunstância em que as premissas são verdadeiras. Ora,
dado que tal circunstância também torna a conclusão verdadeira, o argumento é
considerado válido.

Analisemos outro exemplo.

Argumento Dicionário Formalização

Se canto, então sou feliz. P: Canto. P→Q


Sou feliz. Q: Sou feliz. Q
Logo, canto. ∴P

Vejamos agora o respetivo inspetor de circunstâncias:

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P Q P → Q, Q ∴P
V V V V V
V F F F V
F V V V F
F F V F F

O argumento é inválido. A primeira e a terceira linhas exprimem as únicas circunstâncias em


que ambas as premissas são verdadeiras. Contudo, se na primeira linha a circunstância
torna a conclusão verdadeira, já na terceira linha a circunstância em causa torna a
conclusão falsa.

Vejamos outro argumento, mais complexo, acompanhado do respetivo inspetor de


circunstâncias:

Argumento Dicionário Formalização

Se Manuel barafusta e Pedro não sorri, P: Manuel barafusta. (P ∧ ¬ Q) → R


então o ambiente é pesado. Q: Pedro sorri. R
O ambiente é pesado. R: O ambiente é pesado. ∴P∧¬Q
Logo, Manuel barafusta e Pedro não
sorri.

P Q R (P ∧ ¬ Q) → R, R ∴P∧¬Q
V V V F F V V F F
V V F F F V F F F
V F V V V V V V V
V F F V V F F V V
F V V F F V V F F
F V F F F V F F F
F F V F V V V F V
F F F F V V F F V

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Há três circunstâncias (1.ª, 5.ª e 7.ª) em que ambas as premissas são verdadeiras e a
conclusão é falsa. Logo, o argumento é inválido.

2.6. Formas de inferência válida

Apresentam-se de seguida algumas formas de inferência válida, acompanhadas de


exemplos:
P→Q
● Modus ponens: Se canto, então sou feliz. Canto. Logo, P
sou feliz. Q

● Modus tollens: Se canto, então sou feliz. Não sou feliz. P→Q
Logo, não canto. Q
P

● Contraposição: Se há sol, então vou caminhar. Logo, P→Q


se não vou caminhar, então não há sol. Q→P

● Silogismo disjuntivo (disjunção inclusiva): Penso ou PQ


sinto. Não penso. Logo, sinto. P
Q

● Silogismo hipotético: Se durmo bem, então descanso. P→Q


Se descanso, então tenho saúde. Logo, se durmo bem, Q→R
então tenho saúde. P→R

● Leis de De Morgan:
– negação da conjunção: Não é verdade que  (P  Q)
sou injusto e cruel. Logo, não sou injusto ou não sou PQ
cruel;
– negação da disjunção: Não é verdade que há  (P  Q)
sol ou chuva. Logo, não há sol e não há chuva. PQ

● Negação dupla: Não é verdade que eu não penso. Logo, P


eu penso. P

2.7. Variáveis de fórmula

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As letras maiúsculas do meio do alfabeto – P, Q, R – são usadas para representar
determinadas proposições simples. A fim de saber o que simboliza cada uma dessas letras
proposicionais, cria-se um dicionário ou uma interpretação.
Todavia, as proposições podem ser simples ou complexas. Assim, é costume usarem-
se as letras iniciais do alfabeto – A, B, C, etc. – para aquilo a que se chama variáveis de
fórmula, as quais representam qualquer tipo de proposição (simples ou complexa).

Exemplo Dicionário Formalização


Se tenho livros, então sou feliz e sábio. P: Tenho livros. P → (Q ∧ R)
Não é verdade que sou feliz e sábio. Q: Sou feliz. ¬ (Q ∧ R)
Logo, não tenho livros. R: Sou sábio. ∴¬P

A→B
¬B
∴¬A

Apresentam-se de seguida as formas de inferência válida, com base nas variáveis de


fórmula.

Formas de inferência válida


Modus ponens Modus tollens
A→B A→B
A ¬B
∴B ∴¬A

Silogismo disjuntivo Silogismo hipotético


A∨B A∨B A→B
¬A ¬B B→C
∴B ∴A ∴A→C

Contraposição Leis de De Morgan


A→B ¬B→¬A ¬ (A ∧ B) ¬A∨¬B
∴¬B→¬A ∴A→B ∧ ∴¬A∨¬B ∴ ¬ (A ∧ B)
O A→B≡¬B→¬A OU ¬ (A ∧ B) ≡ ¬ A ∨ ¬ B
U
Negação dupla ¬ (A ∨ B) ¬A∧¬B
∴¬A∧¬B ∴ ¬ (A ∨ B)

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¬¬A A ∨ OU ¬ (A ∨ B) ≡ ¬ A ∧ ¬ B
∴A ∴¬¬A
O ¬¬A≡A
U
Nota: o símbolo ≡ significa, no presente contexto, que tanto
se pode inferir validamente num como noutro sentido.

2.8. Principais falácias formais (formas de inferência inválida)

Duas das principais falácias formais são a:

● Falácia da afirmação do consequente: P→Q


Q
Se trabalho, então ganho dinheiro. Ganho dinheiro. Logo,
P
trabalho.

● Falácia da negação do antecedente: P→Q


Se trabalho, então ganho dinheiro. Não trabalho. Logo, P
não ganho dinheiro. Q

O discurso argumentativo e principais tipos de argumentos e falácias informais


Clarificar as noções de argumento não-dedutivo, por indução, por analogia e por autoridade;
Construir argumentos por indução, por analogia e por autoridade;
Identificar, justificando, as falácias informais generalização precipitada, amostra não
representativa, falsa analogia, apelo ilegítimo à autoridade, petição de princípio, falso dilema,
falsa relação causal, ad hominem, ad populum, apelo à ignorância, boneco de palha e
derrapagem;
Utilizar conscientemente diferentes tipos de argumentos formais e não formais na análise
crítica do pensamento filosófico e na expressão do seu próprio pensamento;

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Aplicar o conhecimento de diferentes falácias formais e não formais na verificação da
estrutura e qualidade argumentativas de diferentes formas de comunicação.

3. O discurso argumentativo e principais tipos de argumentos e falácias informais

3.1. Principais tipos de argumentos

Em qualquer discurso argumentativo são vários os tipos de argumentos que


poderemos usar quando queremos convencer alguém da razoabilidade de uma tese. Para além
dos argumentos dedutivos, podemos usar outro tipo de argumentos – os não dedutivos:
argumentos indutivos (ou induções), argumentos por analogia e argumentos de autoridade.
Os argumentos não dedutivos são aqueles em que a verdade das premissas apenas
sugere a plausibilidade da conclusão ou a probabilidade de ela ser também verdadeira.
Neste tipo de argumentos, as premissas apenas dão um suporte parcial à conclusão,
fornecendo razões a seu favor, mas não a tornando necessariamente verdadeira. Por isso, a
conclusão é apenas recomendada.
A validade dos argumentos não dedutivos depende do grau de probabilidade, de
razoabilidade ou ainda de relevância das proposições que compõem o argumento. Assim, tal
validade depende de aspetos que vão para lá da forma lógica do argumento. Um argumento
não dedutivo é válido quando é improvável, mas não propriamente impossível, ter
premissas verdadeiras e conclusão falsa.
Se as premissas não fornecem boas razões para apoiar a verdade da conclusão, o
argumento é inválido – também se lhe chama argumento fraco. Se fornecem boas razões, o
argumento é válido – também se lhe chama argumento forte.

Os argumentos indutivos ou induções podem ser de dois tipos: a generalização e a


previsão.

A indução por generalização consiste num argumento cuja conclusão é mais geral
do que a(s) premissa(s).

Exemplo:
Todos os peixes observados até agora respiram através da absorção do oxigénio
presente na água.
Logo, todos os peixes respiram através da absorção do oxigénio presente na água.

Uma generalização é válida se cumprir os seguintes requisitos:

– se partir de um número relevante de casos observados;

– se não se tiverem encontrado, depois de procurados, quaisquer contraexemplos;

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– se os casos observados forem representativos do universo em questão.

Uma das falácias decorrentes do não cumprimento destes requisitos é a falácia da


generalização precipitada, que ocorre quando se conclui abusivamente o geral de apenas
um ou poucos casos:

Exemplo:
Fiz um teste de Filosofia e foi difícil.
Logo, todos os testes de Filosofia são difíceis.

---------

Outra falácia decorrente do não cumprimento dos requisitos de validade é a falácia da


amostra não representativa, a qual consiste em concluir de um segmento da população para
toda a população, apesar de poder incluir um número significativo de casos.

Exemplo:
Com base em inquéritos realizados ao conjunto dos estudantes portugueses do ensino
superior, constata-se que todos eles valorizam este tipo de ensino.
Logo, todos os portugueses valorizam o ensino superior.

(Apesar de o número de casos da amostra ser significativo, os estudantes portugueses


do ensino superior não representam a população portuguesa.)

A indução por previsão é o argumento que, baseando-se em casos passados, antevê


casos não observados, presentes ou futuros.

Exemplo:
Todos os cavalos observados até hoje nasceram quadrúpedes.
Logo, o próximo cavalo a nascer também nascerá quadrúpede.

Apontamentos próprios: prevê o futuro

Uma indução por previsão é válida se cumprir os seguintes requisitos:

– se existir uma forte probabilidade de a conclusão corresponder à realidade;

– se não existir informação disponível contrária ao que se afirma no argumento.

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Quando estes requisitos não se cumprem, estamos perante a falácia da previsão
inadequada.

Exemplo:
A temperatura na Terra nunca apresentou variações significativas no passado.
Logo, ela nunca apresentará variações significativas no futuro.

(A conclusão é ilegítima porque existe informação disponível que dá conta do


aquecimento global.)

O argumento por analogia

O argumento por analogia consiste em partir de certas semelhanças ou relações


entre dois objetos ou duas realidades e em encontrar novas semelhanças ou relações.

Baseia-se, assim, na comparação que se estabelece entre as realidades, supondo


semelhanças novas a partir das já conhecidas.

Exemplo:
O cantor A canta bastante bem.
O cantor B tem um timbre e uma extensão vocal semelhantes aos do cantor A.
Logo, o cantor B também canta bastante bem.

Um argumento por analogia é válido se cumprir os seguintes requisitos:

– se as semelhanças entre as realidades forem relevantes no que diz respeito à


conclusão;

– se as semelhanças relevantes no que diz respeito à conclusão forem em número


suficiente;

– se não existirem diferenças relevantes no que diz respeito à conclusão.

O não cumprimento destes requisitos corresponde à falácia da falsa analogia:

Exemplo 1:
O carro da marca X é bastante potente.
O carro da marca Y tem a mesma cor e o mesmo tamanho que o carro da marca X.
Logo o carro da marca Y também é bastante potente.

(Neste caso, as semelhanças não são relevantes no que diz respeito à conclusão.)

Exemplo 2:

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O médico A, que estudou numa Universidade de prestígio, é um profissional
excelente.
O médico B estudou na mesma Universidade.
Logo, O médico B também é um profissional excelente.

(Neste caso, as semelhanças relevantes no que diz respeito à conclusão não são em
número suficiente.)

Exemplo 3:
As máquinas não são conscientes de si.
A mente humana é como uma máquina.
Logo, a mente humana não é consciente de si.

(Neste caso, existem diferenças relevantes entre a mente humana e as máquinas, no


que diz respeito àquilo que é afirmado na conclusão.)

O argumento da autoridade

O argumento de autoridade pode ser definido como o argumento que se apoia na


opinião de um especialista ou de uma autoridade para fazer valer a sua conclusão.

Exemplo:
Galileu afirmou que todos os corpos caem com aceleração constante.
Logo, todos os corpos caem com aceleração constante.

Para o argumento de autoridade ser válido deve cumprir os seguintes requisitos:

– deve referir-se o nome da autoridade e a fonte em que ela exprimiu essa ideia;

– a autoridade invocada deve ser um efetivo especialista ou perito na área em questão;

– não pode existir controvérsia entre os especialistas da área em questão, ou seja,


aquilo que é afirmado deve ser amplamente consensual entre as autoridades dessa
área;

– o especialista invocado não pode ter interesses pessoais ou de classe no âmbito do


assunto em causa;

– o argumento não pode ser mais fraco do que outro argumento contrário.

Quando estes requisitos não são cumpridos, comete-se a falácia do apelo ilegítimo à
autoridade.

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Exemplo 1:
Estudos indicam que comer um ovo por dia prejudica a saúde.
Logo, comer um ovo por dia prejudica a saúde.

(É falácia porque; Será necessário referir quem foram os autores do estudo; existe
controvérsia entre os especialistas relativamente a este assunto; além disso, o
argumento talvez seja mais fraco do que o argumento contrário.)

Exemplo 2:
Um membro do governo afirmou que, desde que o governo iniciou funções, a
felicidade dos cidadãos aumentou bastante.
Logo, desde que o governo iniciou funções, a felicidade dos cidadãos aumentou
bastante.

(Além de não ser referido o nome da pessoa invocada, talvez também não se trate de
uma autoridade efetiva na área em questão, sendo inclusive alguém com interesses
pessoais no âmbito do assunto em causa; além disso, existe certamente controvérsia
entre os especialistas relativamente a este assunto.)

3.2. Falácias informais

As falácias informais são argumentos inválidos, aparentemente válidos, e cuja


invalidade não resulta de uma deficiência formal, antes decorre do conteúdo do argumento,
da sua matéria, da linguagem natural comum usada nesses argumentos.
Uma vez que este tipo de falácias não depende da forma lógica do argumento,
pode haver argumentos com a mesma forma que sejam fortes ou fracos, bons ou maus,
válidos ou inválidos.
Algumas falácias informais foram já referidas – as da generalização precipitada, da
amostra não representativa, da previsão inadequada, da falsa analogia e do apelo ilegítimo à
autoridade.
Vamos agora ver outras, que são bastante comuns.

A falácia da petição de princípio é a falácia que consiste em assumir como verdadeiro


aquilo que se pretende provar. Neste tipo de argumento falacioso, a conclusão é usada, de
uma forma implícita, como premissa, encontrando-se muitas vezes disfarçada com palavras
de significação idêntica à daquelas que aparecem na conclusão propriamente dita. Também se
chama argumento circular ou falácia da circularidade à petição de princípio.

Exemplos:
Andar a pé é um desporto saudável. Logo, andar a pé é um desporto que faz bem à
saúde.

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O ser humano é inteligente, porque é um ser que possui inteligência.

A falácia do falso dilema é a falácia que consiste em reduzir as opções possíveis a


apenas duas, ignorando-se as restantes alternativas, e em extrair uma conclusão a partir dessa
disjunção falsa. “Falso dilema” é sinónimo de “falsa dicotomia”.

Exemplos de disjunções falsas:


Ou votas no partido x ou será a desgraça do país.
(Outros partidos são ignorados.)

Ou estás comigo ou estás contra mim.


(Ignora-se a possibilidade de se ser neutro.)

Vejamos agora o exemplo de um argumento baseado neste tipo de premissas:

Exemplo:
Ou votas no partido x, ou será a desgraça do país.
Não votas no partido x.
Logo, será a desgraça do país.

Embora seja válido em termos dedutivos, este argumento exprime um falso dilema:
ignora-se a possibilidade de todos os outros partidos poderem evitar a desgraça do país.

A falácia da falsa relação causal – conhecida também como “post hoc, ergo propter
hoc”, que significa “depois disto, logo por causa disto” – é a falácia que se comete sempre
que se toma como causa de algo aquilo que é apenas um antecedente ou uma qualquer
circunstância acidental. Trata-se, por isso, de concluir que há uma relação de causa e efeito
entre dois acontecimentos que se verificam em simultâneo ou em que um se verifica após o
outro.
Exemplos:
Sempre que eu entro com o pé direito no campo, a minha equipa ganha o jogo.
Logo, a causa das nossas vitórias é o facto de eu entrar com o pé direito no campo.

Quando faço testes em dias de chuva, tiro negativa.


Logo, a chuva é a causa das classificações negativas dos meus testes.

A falácia ad hominem é a falácia que se comete quando, em vez de se atacar ou


refutar a tese de alguém, se ataca a pessoa que a defende.

Exemplos:
A tua tese de que tudo é composto de átomos está errada, porque cheiras mal da boca
sempre que a proferes.

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Sartre estava errado a respeito do ser humano, porque não ia regularmente à missa.

A falácia ad populum é a falácia que se comete quando se apela à opinião da maioria


para fazer valer a verdade de uma conclusão.

Exemplos:
A maioria das pessoas considera que a leitura é uma perda de tempo. Logo, a leitura
é uma perda de tempo.

A maioria dos contribuintes considera legítimo fugir ao fisco.


Logo, é legítimo fugir ao fisco.

A falácia do apelo à ignorância é a falácia que se comete quando uma proposição é


tida como verdadeira só porque não se provou a sua falsidade ou como falsa só porque não se
provou que é verdadeira.

Exemplos:
Não existem fenómenos telepáticos, porque até agora ninguém provou que eles
existem.

A alma é imortal. Isto porque ninguém provou que a alma morre com o corpo.

A falácia do espantalho ou do boneco de palha é a falácia cometida sempre que


alguém, em vez de refutar o verdadeiro argumento do seu opositor/interlocutor, ataca ou
refuta uma versão simplificada, mais fraca e deturpada desse argumento, a fim de ser mais
fácil de rebater a tese oposta. Trata-se de distorcer as ideias do interlocutor para que elas
pareçam falsas.

Exemplo:
António defende que não devemos comer carne de animais cujo processo de
industrialização os tenha sujeitado a condições de vida e morte cruéis.
Manuel refuta António dizendo: “António quer que apenas comamos alface!“

(Note-se que em momento algum António defende que não devemos comer qualquer
tipo de carne, sugerindo que sejamos vegetarianos – “comer alface” –, mas apenas
aquele tipo de carne sujeito às condições descritas. O argumento é assim deturpado e
simplificado.)

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A falácia da derrapagem, “bola de neve” ou “declive escorregadio” é a falácia
cometida sempre que alguém, para refutar uma tese ou para defender a sua, apresenta, pelo
menos, uma premissa falsa ou duvidosa e uma série de consequências progressivamente
inaceitáveis. A partir da primeira premissa, outras vão surgindo, até se mostrar que um
determinado resultado indesejável inevitavelmente se seguirá.

Exemplo:
Se jogares a dinheiro, vais viciar-te no jogo. Se te viciares no jogo, perderás tudo o
que tens. Se perderes tudo o que tens, terás de mendigar. Se tiveres de mendigar,
ninguém te dará nada. Se ninguém te der nada, morrerás à fome. Logo, se jogares a
dinheiro, morrerás à fome.

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