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Sala 12 (185)
2013
Giselle Viana
ÍNDICE
PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS 4
TEORIA RESTRITIVA 4
TEORIA AMPLIATIVA 5
Pressupostos de Existência 6
Pressupostos de Validade 7
Pressupostos Negativos 7
CRÍTICA 10
INTERESSE PÚBLICO E CONTRADITÓRIO 10
CONDIÇÕES DA AÇÃO 13
TEORIAS DO DIREITO DE AÇÃO 13
Teorias Concreta e Abstrata 13
Teoria Eclética 14
CONDIÇÕES 14
Legitimidade 15
Interesse de Agir 15
Possibilidade Jurídica 16
TEORIA DA ASSERÇÃO 16
PARTES NO PROCESSO 17
CAPACIDADE PROCESSUAL 17
Representantes 17
DEVERES DAS PARTES E SEUS PROCURADORES 18
Responsabilidade por Dano Processual 19
SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL 20
Primeiro Enfoque 21
Segundo Enfoque 21
SUCESSÃO PROCESSUAL 23
LITISCONSÓRCIO 24
Hipóteses ensejadores do litisconsórcio 27
Limitação do Litisconsórcio e Interrupção do Prazo 29
Relação entre Litisconsortes 30
Litisconsórcio Necessário 32
INTERVENÇÃO DE TERCEIROS 35
PARTES 35
ASSISTÊNCIA 36
Poderes do Assistente 38
ASSISTÊNCIA LITISCONSORCIAL 39
Poderes do Assistente Litisconsorcial 40
Eficácia da Intervenção 40
OPOSIÇÃO 41
Caderno de Direito Processual Civil
ATOS PROCESSUAIS 49
CONCEITO 49
CLASSIFICAÇÃO 49
Atos do Juiz 50
FATOS E NEGÓCIOS PROCESSUAIS 52
DEFEITOS DOS ATOS PROCESSUAIS 53
Nulidades Processuais 54
Contaminação dos Atos 56
LUGAR E TEMPO DOS ATOS PROCESSUAIS 57
CITAÇÃO 58
Modalidades de Citação 59
Efeitos da Citação 61
INTIMAÇÃO 63
CARTAS 63
Giselle Viana
PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS
A questão dos pressupostos processuais surgiu concomitantemente à própria história do direito
processual civil. Em 1868, OSKAR VON BULOW escreveu o que é considerado a primeira obra de
Direito Processual Civil, e nela postulou a teoria da dualidade do ordenamento jurídico, segundo a
qual existiriam dois planos jurídicos distintos: o plano material e o plano processual. Apesar de serem
independentes e possuírem cada qual uma função própria, tais planos se relacionam, e o ápice dessa
conexão dá-se com a sentença.
Teoria Restritiva
PRESSUPOSTOS DA
TEORIA RESTRITIVA
Órgão investido
Partes Pedido de jurisdição
1
O tema dos pressupostos difere das condições da ação. Enquanto estas consistem nos requisitos materiais necessários
para que a parte possa exercer seu direito à tutela jurisdicional, os pressupostos processuais são os requisitos
necessários para que o processo seja considerado existente e possa se desenvolver de forma válida e regular. O tema
das condições estabelece um link entre os planos material e processual, enquanto o dos pressupostos diz respeito,
sobretudo, ao plano processual.
4
Caderno de Direito Processual Civil
Se as partes não forem à justiça, portanto, não há um processo propriamente considerado, pois a
justiça não atua de ofício. Se a partes forem à justiça mas não formulam nada, também não fazem
nascer o processo. Se, por fim, as partes formulam um pedido mas o órgão não é provido de
jurisdição2, também não há processo.
Existe uma consistência nessa teoria pois é logico que, ausente um desses requisitos, o processo
não possa se perfazer.
Teoria Ampliativa
A teoria ampliativa é seguida pela maioria da doutrina, e subdivide os pressupostos do processo
em 3 planos: da existência, da validade, e dos pressupostos negativos.
PRESSUPOSTOS
DA TEORIA
AMPLIATIVA
Validade da Inexistência de
Citação do réu
citação do réu coisa julgada
Capacidade
Capacidade Inexistência de
postulatória do
autor
processual preempção
Imparcialidade
Petição inicial
do Juiz
2
Esse órgão investido de jurisdição pode ser juiz ou tribunal.
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Giselle Viana
Pressupostos de Existência
Segundo essa teoria o processo só existiria a partir da citação do réu. Essa requisito, porém, é
equivocado na medida em que o processo fisicamente existe sim antes da citação: dentro dos 3 ou 4
meses que demoram para a realização da citação, o autor encontrará no fórum os autos do processo,
então tecnicamente ele existe, mesmo que incompleto. A citação do réu é, portanto, um requisito de
continuidade do processo, e não um requisito de existência propriamente dito.
Mas, pergunta-se novamente: essa é realmente uma circunstancia que condiciona a existência do
processo? Por exemplo, uma criança de 5 anos não representada propõe uma ação. O juiz, mais tarde,
descobre que o autor tem 5 anos, e tendo em vista sanar esse problema chama um curador ao
processo. Resolvido o problema, o processo pode continuar, mesmo que alguns atos tenham que ser
refeitos. Isso vai no sentido da regra do art. 286 do CPC, que determina que, sempre que possível
sanar um problema, o juiz deve dar oportunidade às partes de solucioná-lo, ao invés de simplesmente
extingui-lo:
Assim, sempre que o juiz encontra problemas que podem ser sanados, ele deve solicitar às
partes que o corrijam. Diante disso, é problemático falar em requisitos de existência, pois se a
inobservância de um desses requisitos pode ser posteriormente sanada, garantindo a subsistência do
processo, não faz sentido afirmar que o processo não existia!
Por fim, essa teoria aponta a petição inicial4 como requisito de existência, mas o problema é o
mesmo! Se a petição inicial é falha, isso não significa que não existe processo...
Essas ressalvas colocam em xeque a concepção segundo a qual esses requisitos condicionam a
existência do processo.
3
A capacidade postulatória seria uma das três facetas da chamada tríplice capacidade. Esta desdobra-se na
capacidade para os atos da vida civil (pessoas maiores e capazes), na capacidade de estar em juízo (há
determinadas situações em que a lei exige a autorização para que uma pessoa possa litigar, como a outorga
marital) e por fim, justamente, na capacidade postulatória.
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Petição inicial é a peça onde se endereça a ação, diz quem é o réu, o pedido e a causa de pedir. É, no fundo, a
forma de se dirigir à justiça.
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Caderno de Direito Processual Civil
Pressupostos de Validade
A teoria ora tratada diz que para um processo ser válido, a petição inicial deve ser apta, ou seja,
deve ser isenta de quaisquer problemas e observar os requisitos do art. 282 do CPC.
O problema desse requisito é que, na ausência de aptidão, o juiz não determinará que o
processo é inválido... determinará que se conserte as falhas da peça! Assim, faria mais sentido dizer
que a aptidão da petição é um “requisito” de constituição e desenvolvimento do processo. Em outras
palavras, a ideia de aptidão está mais relacionada à continuidade do processo do que a um pressuposto
de validade.
Outro requisito seria a citação válida do réu. Mas imaginemos uma hipótese em que a citação
foi feita de forma errada, ninguém percebeu isso e ao final do processo o réu foi condenado. É
terminologicamente equivocado afirmar que o processo é válido ou inválido, pois ele é neutro! O que
pode ser considerado inválido, nesse caso, é a sentença, pois foi proferida sem a observância dos
termos da lei. O réu pode, portanto, entrar com uma ação rescisória no prazo de um ano para
questionar os problemas do processo. Este, por sua vez, é mera base, um rito, um instrumento.
A capacidade processual, segundo essa teoria, também é um requisito de validade. Como vimos,
a capacidade postulatória figuraria no plano da existência do processo. Aqui, remete-se à tríplice
capacidade, que a engloba ao lado da capacidade para os atos da vida civil e para estar em juízo.
Novamente questiona-se: a capacidade das partes é um pressuposto de validade do processo ou da
sentença? Entendemos que é na verdade um pressuposto de validade das decisões proferidas no
processo, um requisito de desenvolvimento.
Pressupostos Negativos
A expressão “pressupostos negativos” remete às coisas que não devem existir para que o
processo possa existir.
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Giselle Viana
Se o efeito negativo da litispendência incide sobre processos idênticos ao pendente, então cabe
determinar quando um processo é idêntico. Ora, se o processo é composto por três elementos, a
saber, as partes, os pedidos e as causas de pedir, então dois processos são idênticos quando esses três
elementos coincidem. Se algum deles não for igual, então o processo não é igual, e não sofre os
efeitos da litispendência do antecessor.
Se, por exemplo, num acidente de trânsito o autor propõe duas ações, uma para danos materiais
e outra para danos morais, estamos diante dois processos distintos. Afinal, apesar de as partes serem
as mesmas, e a causa idem, o pedido não é!
Mas esse requisito também é passível de críticas. Isso porque, na verdade, o segundo processo,
mesmo que igual ao primeiro, existe: o réu será citado e tudo. O processo então nasce e se desenvolve
até que o juiz o mande extinguir, o que torna difícil afirmar que a falta de litispendência é um
pressuposto para que o processo exista.
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Caderno de Direito Processual Civil
Art. 268. Salvo o disposto no art. 267, V, a extinção do processo não obsta a que o autor
intente de novo a ação. A petição inicial, todavia, não será despachada sem a prova do
pagamento ou do depósito das custas e dos honorários de advogado.
Parágrafo único. Se o autor der causa, por três vezes, à extinção do processo pelo
fundamento previsto no III do artigo anterior, não poderá intentar nova ação contra o réu
com o mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada, entretanto, a possibilidade de alegar em defesa
o seu direito.
Por exemplo, quando se propõe uma ação, pede-se ao oficial de justiça que cite o réu. Essa
citação requer uma série de despesas por parte do oficial, que devem ser pagar pelo autor. Se este não
paga, o juiz determina que ele deposite o valor das dirigências. Se, ainda, o autor não o faz, o juiz
extingue o processo e o arquiva por abandono do autor em relação aos deveres que nele tinha.
Imaginemos uma hipótese em que Tício move uma ação e deixa de recolher as despesas do oficial de
justiça. Depois de um tempo, o autor vai lá e faz a mesma coisa. E pela terceira vez... Na quarta vez,
todavia, ocorrerá a perempção.
Propositura Decisão
Litispendência Coisa Julgada
Ação X
Ação Y = X Ação Y = X
Assim como nos outros pressupostos negativos, a crítica que se faz é a mesma: ele está mais
ligado à continuidade do processo que ao seu nascimento. Afinal, o processo começa, o réu se
defende e o problema da perempção provavelmente só aparecerá quando o réu alegá-la.
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Giselle Viana
Crítica
Quanto ao pressuposto de existência do processo a teoria reducionista seria mais adequada, do
ponto de vista lógico. Ademais, os pressupostos da teoria ampliativa seriam antes requisitos de
continuidade do que de existência mesmo do processo.
Outra crítica a ser feita a essa teoria é que não podemos enxergar os pressupostos processuais
na ótica do direito civil, que define planos de existência, validade e eficácia. As diretrizes e regras do
processo são distintas das do direito civil. Seja qual for a gravidade do vício, o processo sempre existe.
O vício, uma vez detectado, ou é sanado ou é extinto. Mas para que seja extinto, tem que ter existido!
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Caderno de Direito Processual Civil
Portanto, de acordo com o parágrafo 3o do art. 267, o juiz poderá a qualquer tempo e grau de
jurisdição conhecer das matérias relativas aos pressupostos, pois são de ordem pública.
Ao se garantir a o
Se o autor contraditório, pela
O processo informação, abre-se
provar o
continua a chance de o
contrário
processo continuar
Isso é o ideal do ponto de vista do contraditório? Cada vez mais o sistema quer evitar surpresas às
partes. Mesmo que se trate de matéria de ordem pública e que a lei autorize o reconhecimento de
ofício do tema, há a ideia de que o juiz deve observar o contraditório antes, para não surpreender as
partes com decisões as vezes equivocadas. Essa seria a solução ideal na visão moderna no processo
civil: o juiz deve informar as partes, por exemplo, de que há uma provável litispendência.
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Giselle Viana
Um exemplo: o juiz, julgando a ação de Tício, verifica certo dia que há um processo anterior e
idêntico em litispendência. Por essa regra, ele poderia de ofício extinguir o processo de Tício. Mas
digamos que o processo “idêntico” em litispendência, que resultaria na extinção do processo de Tício,
é na verdade de um homônimo de Tício, outro Tício! Se o juiz avisar a Tício dessa possível
litispendência antes de extinguir o processo, Tício poderá provar que ela inexiste, pois o outro
processo não é dele. Respeitar-se-ia assim o contraditório, na medida em que a informação possibilita
que a parte se defenda.
Existe uma limitação temporal também: o tribunal pode conhecer das matérias de ordem
pública antes do trânsito em julgado. A decisão transitada em julgado passa para um estado de
imutabilidade. Não é justa nem injusta, nem legal nem ilegal, nem válida ou inválida: é indiscutível.
Pode-se, no máximo, abrir outra, uma ação rescisória, para discutir os problemas do processo anterior.
Para a ótica processual, dada essa característica do transito em julgado, não existe nulidade absoluta,
porque por pior que seja o vício, se ninguém recorrer, transita em julgado. E, ainda, se não interposta
ação rescisória, transita materialmente em julgado!
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Caderno de Direito Processual Civil
CONDIÇÕES DA AÇÃO
Direito
Concreta depende do
resultado
Teorias do Direito
Direito de Abstrata abstrato, não
Ação condicionado
Direito
Liebman abstrato, mas
condicionado
Para algumas correntes, só haveria direito de ação naquelas julgadas procedentes. Essa teoria,
que ligava a existência do direito de ação à procedência do pedido, é chamada teoria concreta.
Segundo esse entendimento, se o autor fosse derrotado, isso significava que ele não tinha o direito
que afirmava ter, e portanto não tinha desde o começo o direito de ação. Este, então, seria um direito
concreto pois dependeria de um fato da realidade (vencer).
Outra vertente, adotada principalmente na Alemanha, afirmava que o direito de ação era
abstrato, e portanto todos o teriam independentemente da procedência do pedido. Assim, todos
poderiam acionar o sistema para obter uma resposta, fosse ela positiva ou negativa. Essa concepção,
portanto, desvinculava o direito de ação de todo e qualquer resultado no plano prático.
Ambas as teorias padecem de uma certa inconsistência. Enquanto a teoria concreta era
excessivamente restritiva, a teoria abstrata tinha excessiva abrangência, que representava um grande
prejuízo à economia processual. Pela segunda teoria, qualquer pessoa poderia entrar com qualquer
ação. Essa abstração, que serviu de contraponto aos concretistas, per se não fazia muito sentido.
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Teoria Eclética
Em meados dos anos 1948, Liebman cria a teoria eclética do direito de ação, que mistura
elementos das teorias concreta e abstrata num meio termo mais adequado. Essa teoria não vincula o
direito de ação ao resultado do processo, mas também não significa que qualquer pessoa possa mover
qualquer ação a qualquer tempo. Afirma, então, que o direito de ação, embora abstrato, é
condicionado, pelas condições da ação. É a orientação seguida atualmente:
Embora abstrato e ainda que ate! certo ponto genérico, o direito de ação pode ser
submetido a condições por parte do legislador ordinário. São as denominadas
condições da ação (possibilidade jurídica, interesse de agir, legitimação ad causam),
ou seja, condições para que legitimamente se possa exigir, na espécie, o provimento
jurisdicional. A exigência da observância das condições da ação deve-se ao princípio
da economia processual: quando se percebe, em tese, segundo a afirmação do autor
na petição inicial ou os elementos de convicção já trazidos com ela, que a tutela
jurisdicional requerida não poderá ser concedida, a atividade estatal será inútil,
devendo ser imediatamente negada. (ADA, DINAMARCO E CINTRA)
Condições
Possibilidade
Jurídica
Utilidade
Interesse de
Legitimidade Agir
Adequação
Condições
da Ação
Existem pelo menos 3 condições que exercem o papel de elo entre o direito processual e
material, obstando abusos ao abstracionismo. As condições da ação remontam ao direito material,
pois envolvem elementos nele colhidos. São, nesse sentido, os pontos de estrangulamento entre o
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Caderno de Direito Processual Civil
plano processual e material. Quando não observadas, ensejam a extinção do processo, de ofício e sem
julgamento de mérito.
Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito:
VI - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade
jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual;
Legitimidade
Segundo essa condições, só pode propor ação quem tiver legitimidade para agir em juízo.
Num primeiro momento, só tem essa legitimidade a pessoa que também participar da relação
jurídica de direito material.
Por exemplo, a priori, só as partes de um contrato podem ir à justiça para discutir seu
cumprimento: deve haver uma perfeita correspondência entre as pessoas que estão no contrato
(direito material) e no processo (direito processual). Caso contrário, o processo é inviável. Por isso,
segundo Dinamarco, a legitimidade se aufere segundo o direito material.
A ideia geral, destarte, é que havendo uma absoluta correlação entre o direito material e o
processual há legitimidade. Há, contudo, algumas situações que relativizam esse preceito.
Interesse de Agir
LIEBMAN também incluiu entre as condições da ação o interesse de agir, subdividido, por sua
vez, em duas vertentes: utilidade e adequação. O juiz, ao receber uma ação nova, analisa se o que o
autor está pedindo é útil pra ele. Se não for, isto é, se por erro, ignorância, o autor tiver feito um
pedido inútil ou inadequado a seus objetivos, pra que levar adiante a ação?
Por exemplo, imaginemos que Tício é locatário de uma apartamento de Caio, e deixa de pagar o
aluguel por não ter dinheiro. Caio então fala com Tício para cobrá-lo, e Tício responde que não tem
como pagar o aluguel, mas entrega o apartamento sem problemas. Caio, então, move uma ação de
despejo contra Tício. Ora, se Tício não se recusou em nenhum momento a sair, essa ação não
corresponde a um litígio no plano material, então é inútil! O que Caio pode fazer é propor uma ação
de execução para obrigar Tício a pagar, pois é isto que ele se negou a fazer.
A necessidade de adequação parte do pressuposto de que em boa parte das vezes existe um
caminho processual a ser seguido, que em decorrência das particularidades do litígio é o caminho
adequado.
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Giselle Viana
Por exemplo, um imóvel é invadido e o advogado entra com ação de despejo. Mas ação de
despejo pressupõe o contrato de locação! O certo seria a ação de reintegração de posse. Por isso, o
processo é extinto pela inadequação da ação.
Possibilidade Jurídica
A última condição é a possibilidade jurídica do pedido. Nosso código trata dela no art. 267,
mas o novo código a excluiu como condição da ação. Isso porque sua incidência prática é quase nula, e
porque as hipóteses em que ela poderia incidir são meio absurdas (quem processaria alguém para
obrigá-lo a produzir cocaína???).
Mas a ideia central permanece a mesma: condições da ação são filtros, que devem funcionar no
começo do processo para repelir demandas manifestamente infundadas, com o escopo de evitar
excessos ao abstracionismo.
Teoria da Asserção
Filtros, como tais, devem existir no começo do processo e não no final. A teoria da asserção (in
status assertionis), nesse sentido, determina que essas condições devem ser analisadas no começo, pois
não faz sentido tratar de filtros durante o desenrolar do processo que já começou. Precisam ser
avaliadas segundo o que foi afirmado na petição inicial. Depois que o problema passou pelo filtro,
torna-se uma questão material, de mérito.
No Brasil essa teoria não funciona porque, como vimos no art. 267, parágrafo 3o, as condições
são de ordem pública, o que permite que sejam conhecidas e julgadas em qualquer tempo no
processo e em qualquer grau de jurisdição.
Mas, ao não reconhecer a teoria da asserção, criamos uma falha no nosso sistema que quebra o
compromisso constitucional de dar justiça a quem dela necessita. Enquanto não transitada em julgado
a ação, o juiz pode conhecer a matéria de ordem pública, e a decisão proferida fica imunizada. Mas
parte pequena da doutrina ainda por cima admite as condições da ação mesmo após o trânsito em
julgado! Alguém com um processo ganho, imunizado pelo transito em julgado, poderia ter seu
processo comprometido por uma condição referente ao começo da ação. Absurdo!
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Caderno de Direito Processual Civil
PARTES NO PROCESSO
Capacidade Processual
Representantes
Representante, no geral, é a pessoa elegida pela lei para gerir aquilo por determinado tempo.
Não tem legitimidade: tem capacidade. Observa, portanto, um dos pressupostos processuais.
Massa falida é o conjunto de bens e direitos de uma empresa que deixou de existir porque faliu.
Esse conjunto é administrado por um síndico, que é eleito pelas partes, pelos credores ou pelo juiz e
representa a massa falida. O réu na ação movida contra a massa falida é a própria massa falida: é ela
que está no direito material. A legitimidade para figurar como ré no processo é dela, portanto. Mas,
nesse ato, representada pelo seu síndico, já que ela é um ente abstrato e não pode portanto representar
a si mesma.
A herança jacente ou vacante, por sua vez, é representada por seu curador. É a situação do
conjunto de bens de direito para o qual não há herdeiro. A herança fica sem condições de ser
transmitida a alguém, e enquanto nesse estado, é chamada jacente ou vacante. Quem responde por ela
é seu curador, nomeado pelo juiz.
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Giselle Viana
Diretor financeiro é o representante da empresa. Mas quem está em juízo, analogamente aos
outros casos citados, é a própria empresa.
Por fim, cabe observar que por força do art. 13 do CPC, o juiz deve conceder um prazo às
partes para corrigir problemas de representação, quando estes forem passíveis de serem sanados.
Art. 14. São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam
do processo:
I - expor os fatos em juízo conforme a verdade;
II - proceder com lealdade e boa-fé;
III - não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de
fundamento;
IV - não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou
defesa do direito.
V - cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à
efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final.
Segundo o inciso I do artigo acima, as partes deverão expor os fatos de acordo com a verdade.
O primeiro problema é que a “verdade” é algo muito subjetivo, é antes uma questão filosófica que um
dado objetivo: cada pessoa terá uma versão da verdade, versão esta influenciada por fatores inerentes à
própria pessoa, como sua capacidade cognitiva, suas ideologias, seu grau de culpabilidade, etc. Além
desse problema de subjetividade, há um problema mesmo de exigibilidade: não temos como exigir,
num estado democrático de direito, que as partes falem sempre a verdade. O juiz não possui nem
mesmo instrumentos para isso.
Nos sistemas de civil law acredita-se que um processo de conduta muito agressiva no que
concerne a exigir que as partes falem sempre a verdade reduz o diálogo entre as partes, em prejuízo
do contraditório. Haveria nisso um retrocesso a um processo inquisitivo. Nos sistemas de common
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Caderno de Direito Processual Civil
law, como o estadunidense, há um tratamento distinto em relação a esse imperativo ético: nos EUA,
por exemplo, se o advogado afirma ao juiz que seu cliente não está mentido, sabendo que ele está,
pode incorrer em perjúrio, podendo até mesmo perder o direito de advogar na região. No Brasil, além
de inexistir essa possibilidade de penalizar o advogado, o falso testemunho em si possui uma pena
irrisória.
O inciso V, por sua vez, determina que é dever da parte cumprir com exatidão os provimentos
mandamentais, não criando embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória
ou final. Em suma, compete às partes cumprir as ordens judiciais.
Cabe fazer algumas ressalvas, no que concerne ao art. 14, ao seu parágrafo único:
Esse parágrafo ensejou uma ação direta de inconstitucionalidade, pois todos os advogados,
independentemente da sujeição ao Estatuto da OAB, estão obrigados a respeitar ordens judiciais. Não
faz sentido, portanto, a exceção com a qual o parágrafo se inicia.
Outro ponto a ser salientado é que, de acordo com o entendimento do STF, o advogado não
pode sofrer sanções, como multas por exemplo, pela sua conduta no processo, pois é provido de
imunidade. Essa imunidade tem como escopo garantir uma liberdade de atuação do advogado na
defesa da parte. Ademais, segundo o Estatuto da Ordem inexiste uma relação de hierarquia entre
advogado e juiz que possibilitasse ao último impor sanções ao primeiro. Com efeito, o advogado não é
nem mais nem menos que o juiz, e se este constatar uma falha no processo, pode tão somente
encaminhar o fato ao Tribunal de Ética da OAB.
Segundo o art. 16 do CPC, aquele que age com má-fé no processo responde por perdas e danos:
Art. 16. Responde por perdas e danos aquele que pleitear de má-fé como autor, réu
ou interveniente.
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Giselle Viana
O art. 17, por sua vez, buscando definir quais condutas incorrem na tal da “má-fé” do art. 16,
densifica o já analisado art. 14 detalhando um rol de hipóteses:
Finalmente, uma vez definido o que é litigar de má-fé, o art. 18 prevê a consequência decorrente
dessa infração na conduta das partes:
Percebe-se que há uma certa complacência no nosso sistema, que faz parte da nossa ideologia.
Se por um lado talvez isso favoreça o contraditório, como muito sustentam, por outro pode ensejar
uma atuação antiética no processo.
Substituição Processual
Art. 6o Art. 41
Substituição como Substituição como
exceção SUBSTITUIÇÃO flexibilização ao
legalmente PROCESSUAL princípio da
permitida à regra Estabilidade
da legitimidade subjetiva
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Caderno de Direito Processual Civil
O tema da substituição processual pode ser analisado sob dois enfoques distintos: pelo prisma
do art. 6o ou do art. 41.
Primeiro Enfoque
O primeiro enfoque parte da análise do art. 6o do CPC, segundo o qual ninguém pode pleitear
direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado por lei:
Art. 6o. Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando
autorizado por lei.
Essa vedação legal relaciona-se ao tema de legitimidade para agir, no âmbito das condições da
ação. A ideia é que a legitimidade para agir pertence, no processo, às mesmas pessoas que figuram no
plano material. O titular da relação de direito material, a priori, é quem deve estar no processo.
Então, não é só a pessoa que titulariza o direito material que pode pleiteá-lo, pois
excepcionalmente ela pode ter um substituto. São casos muito raros, e o mais comum é a hipótese de
processo coletivo. Determinados titulares, como associações e sindicatos, podem demandar em nome
de pessoas da sociedade.
A OAB por exemplo pode defender seus associados na justiça. Por exemplo, imaginamos que a
OAB descobre que seus advogados estão sofrendo a incidência de um imposto inconstitucional.
Como associação, pode ir à justiça com uma ação coletiva e pleitear que nenhum advogado pague mais
aquele imposto. A OAB não esta titularizando relações no plano do direito material, e se ela for
vencedora, o benefício da ação nem é dela, mas a lei autoriza que ela atue em nome próprio
defendendo direito alheio. Esse é o fenômeno da substituição processual, que no fundo consiste numa
exceção à regra do art. 6o.
Segundo Enfoque
A segunda ótica pela qual pode-se olhar o tema da substituição processual é a do art. 41:
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Giselle Viana
A regra geral então é que iniciado o processo, não se admite modificação das partes, de acordo
com o princípio da estabilidade subjetiva. As partes que iniciaram o processo, portanto, terminam o
processo. Essa estabilidade subjetiva do processo é um valor consagrado pelo sistema.
A doutrina tem criado uma atenuação da nitidez dessa estabilidade, dizendo que antes da
citação, o autor da ação pode alterar o polo passivo, a seu critério. Antes de o réu ser citado, o autor
pode alterar sua petição inicial e pedir a citação de outro réu, portanto. Depois da citação, em tese, se
o réu concordar, poderá haver alteração também. Se o réu não aceitar, uma hora ele será declarado
ilegítimo e o processo se extinguirá.
O que significa dizer que algo, um direito é litigioso? A citação tem vários efeitos, materiais e
processuais: interrompe a prescrição, torna prevento o juízo, etc. Um desses efeitos é justamente
tornar litigiosa a coisa, o que significa dizer que em relação àquela coisa pende um litígio. Por
exemplo, Tício está na posse de um imóvel, que Caio afirma ser seu, mas Tício se recusa a sair. Há, aí,
um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida, o que enseja a propositura de uma
ação. Caio então propõe contra Tício uma ação de reivindicação do imóvel. Durante o processo,
porém, Tício pode vender a coisa pra outrem, ou tem que esperar o resultado final da ação? Em outras
palavras, o fato de uma coisa tornar-se litigiosa obsta o direito de propriedade de forma a impedir a
alienação? Se um terceiro compra uma coisa sobre a qual pende um litígio: das duas uma, ou ele sabe
do litígio e assume o risco, ou ele não sabia e sofre a evicção.
Tício pode vender o imóvel na pendencia do litígio para um terceiro. Digamos que ele vende
para Mévio, que passa dessa forma a ser o titular do direito material sobre o imóvel. Mévio pode
ingressar no processo? Por um lado não é permitida a alteração das partes, mas por outro se formos
pensar, Tício já vendeu a coisa então não tem mais interesse em ganhar o processo, quem tem
interesse é o Mévio! Segundo o art. 42:
Art. 42. A alienação da coisa ou do direito litigioso, a título particular, por ato entre
vivos, não altera a legitimidade das partes.
É preciso, portanto, que Caio autorize. Primeiro, por uma questão de segurança jurídica.
Segundo, porque Caio pode preferir litigar com Tício, pois é ele o réu natural, ele que inicialmente
fraudou algo na compra e venda. Mévio é só um terceiro, e Caio não tem nada a ver com ele.
Se Caio é vencedor, quem perde a casa é Mévio. A partir do momento em que o imóvel foi
vendido, Tício se tornou substituto processual de Mévio, que passou a ser o titular da relação material
mas que não podia entrar no processo. É uma hipótese de substituição processual, na qual os efeitos
22
Caderno de Direito Processual Civil
do processo atingirão justamente quem não integra o processo. De certa forma, isso contraria o
princípio segundo o qual só podem sofrer os efeitos da sentença aqueles que participaram do
contraditório. Aqui, temos alguém que é titular no plano do direito material, que foi obstado de
ingressar na justiça, e que foi substituído por alguém que passou a litigar direito alheio em nome
próprio.
Sucessão Processual
Art. 43. Ocorrendo a morte de qualquer das partes, dar-se-á a substituição [sucessão]
pelo seu espólio ou pelos seus sucessores, observado o disposto no art. 265.
Antes de tudo, importante salientar que, ao falar de “substituição”, art. 43 está errado!
Ocorrendo a morte de qualquer das partes o que ocorre é a sucessão: os sucessores do falecido podem
e devem ingressar no processo. Não é um caso de substituição.
Inicialmente, temos que partir da premissa de que só há herança quando há bens. Se quem
morreu só deixou dívidas, não há herança e portanto não há sucessores. Mas, quando falece a parte, o
direito que estava sendo discutido passa a valer para o patrimônio dos sucessores: os filhos, os
cônjugues, etc.
O que acontece no âmbito do direito material? Se teve herança, chama-se os sucessores, isto é, os
conjugues e os filhos. Inicia-se, então, o processo de habilitação (art. 1.055), através do qual
demonstra-se a qualidade dos herdeiros, e a partir daí inicia-se o espólio (conjunto de bens e direitos
deixados pelo de cujus).
Quando o falecido é o réu, o fato é que nem sempre os herdeiros querem assumir sua posição.
O que acontece, então, é que o juiz manda intimar esses novos réus, dizendo que se eles não
aparecerem no prazo estipulado, serão considerados revéis, e o processo então correrá objetivamente
contra eles, e poderão ser condenados. É muito mais fácil encontrar sucessão e habilitação de autores.
No processo o autor morreu, e ninguém aparece para dar continuidade ao processo. O juiz
intima o advogado, que alias nem é mais advogado no processo pois a procuração venceu, mas não
descobre-se quem são os descendentes. Se o processo não tem condições de ir adiante, será extinto e
23
Giselle Viana
não terá julgado seu mérito. Essa barreira ao julgamento de mérito representa um pressuposto processual
ou uma condição da ação? O que falta não é uma condição da ação, não se trata de um problema de
legitimidade pois sabe-se quem era o autor, e sabe-se que os herdeiros são as partes legítimas... o que
não se sabe é quem são os herdeiros. Trata-se, antes, de um pressuposto de continuidade e
desenvolvimento válido e regular do processo. O processo depende de representação, donde a
ausência de habilitação dos herdeiros, para que pudessem dar continuidade ao processo, leva à
extinção deste por inobservância de um pressuposto processual.
No direito civil existe os direito personalíssimos, que não se transmitem a ninguém. Falecido o
autor ou o réu, chama-se os herdeiros, mas só se os direitos envolvidos não forem personalíssimos.
Por exemplo, no curso do processo numa ação de divórcio o autor falece. É óbvio que os filhos não
serão chamados pra dar continuidade ao processo. Tratando-se de direitos personalíssimos, portanto,
extingue-se o processo com o falecimento do autor. O correto é a condição da ação por falta de
interesse de agir, na modalidade necessidade.
Litisconsórcio
O termo litisconsórcio pode ser traduzido como “litigantes com a mesma sorte”. Esse termo é
impreciso na medida em que os litisconsortes não tem, necessariamente, “a mesma sorte”. Mas, em
todo caso, o litisconsórcio é um fenômeno que indica a possibilidade de duas ou mais pessoas estarem
no processo no mesmo polo, isto é, como autoras ou rés. A possibilidade do litisconsórcio significa,
portanto, a permissão da pluralidade de partes no processo.
O litisconsórcio facultativo se forma pela livre vontade das partes, e é o mais comum. No
litisconsórcio necessário, por outro lado, as partes são obrigadas a figurar conjuntamente no
processo. Essa obrigatoriedade pode derivar de dois motivos: de força legal ou da indivisibilidade da
relação jurídica de direito material.
Com efeito, há leis que exigem a presença de mais de uma pessoa num determinado processo,
como a Lei de Ação Popular, por exemplo. A ação popular é um instrumento democrático, na qual
qualquer cidadão pode tentar recuperar dinheiro público. No caso de fraudes a licitações, faz-se mister
que no polo passivo figurem tanto o agente público que autorizou o contrato, colaborando com a
24
Caderno de Direito Processual Civil
fraude, quanto a empresa da licitação. É uma exigência meramente legal, uma vez que, em tese, o autor
popular poderia optar por processar apenas a empresa.
Outro exemplo é o da ação de usucapião. Nesta, deve-se citar não só o proprietário do imóvel
que é objeto da ação, mas também os proprietários dos imóveis vizinhos, confrontantes.
Ativo
Quanto ao
polo Passivo
Misto
Voluntário
Quanto à
LITISCONSÓRCIO facultativi- Por lei
dade
Necessário
Por indivisibili-
dade
Unitário
Outras
Classificações Multidunitário
Ulterior
A segunda hipótese de litisconsórcio necessário diz respeito aos casos de direito indivisível.
Quando há incingibilidade do direito em questão, exige-se a presença como litisconsortes de todos os
titulares. Por exemplo, se duas ou mais pessoas titulam um direito real sobre um imóvel, é preciso que
todas estejam presentes na ação cujo objeto é esse imóvel, pois não seria cabível uma ampliação ou
redução da propriedade apenas para aqueles presentes na ação.
Um outro exemplo: imaginemos que o Ministério Público proponha uma ação de anulação de
casamento, tendo em vista que um dos cônjuges era menor de idade, e casou-se com documento falso.
Há um litisconsórcio passivo, não por força de lei, mas pela indivisibilidade da relação. Outro
exemplo é o da relação jurídica contratual que envolve diversas partes: se uma delas pretende invalidar
25
Giselle Viana
o contrato, todas as outras devem figurar no polo passivo, pois a relação é só uma e não pode ser
invalidada só pra uma das partes.
Por exemplo, imaginemos que numa empresa há 10 sócios e um diretor, que é o sócio
majoritário. Numa determinada deliberação sobre certo tema, 2 sócios votam contra. Caso esses 2
sócios proponham ação para rever a assembleia, o juiz pode ou anular a decisão para todos ou não
anular pra ninguém... não tem como ele anular só para os sócios que propuseram a ação! Trata-se,
portanto, de um litisconsórcio unitário. Todavia, não é necessário! De fato, não é preciso que todos os
sócios proponham a ação para que a decisão possa ser anulada. O que ocorre é que, se invalidada a
assembleia, a projeção dessa sentença extrapola o processo, atingindo todos membros, mesmo
aqueles que não participaram do processo. Os efeitos são iguais para todos.
No novo CPC não admite-se essa possibilidade de litisconsórcio unitário facultativo: portanto,
todo litisconsórcio unitário deve ser necessário. Mas isso cria um problema, pois pode resultar,
considerando as dificuldades da citação, na paralização de ações propostas contra mais de duas
pessoas.
26
Caderno de Direito Processual Civil
começo, ou que o ingresso não modifique a ação que já estava em curso, trazendo uma pretensão
diferente àquele processo.
Por exemplo, imaginemos que cinco professores, em litisconsórcio facultativo, ingressem com
uma ação contra o Estado, pedindo uma gratificação. Todavia, uma vez começada a ação, outros
professores ficam sabendo dela e então a eles surgem duas opções: podem ou propor uma ação nova,
ou ingressar naquela já em curso. A admissão dessas novas pessoas no processo representa uma
economia processual e uma maior celeridade, mas também é limitada pelas duas exigências
mencionadas. É uma hipótese de rara incidência na prática.
Art. 46. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa
ou passivamente, quando:
I - entre elas houver comunhão de direitos ou de obrigações relativamente à lide;
II - os direitos ou as obrigações derivarem do mesmo fundamento de fato ou de
direito;
III - entre as causas houver conexão pelo objeto ou pela causa de pedir;
IV - ocorrer afinidade de questões por um ponto comum de fato ou de direito.
Litisconsórcio é a possibilidade de duas ou mais pessoas litigarem no mesmo processo em
conjunto, ora no plano ativo, ora no plano passivo, ora em ambos. Essas hipóteses devem ser
entendidas no contexto de um sistema que quer a formação de litisconsórcios. Afinal, negar essa
formação de litisconsórcios implica multiplicar o número de processos, em detrimento da economia
processual.
27
Giselle Viana
Esse ponto de aproximação pode também, segundo o inciso II, ser relativo a um
fundamento de fato. Nesse sentido, basta que haja um fato que una duas ou mais ações
para que as pessoas possam se unir em litisconsórcio.
Mas e se cada autor pedir uma coisa diferente? Por exemplo, se nesse caso o primeiro
pleitear indenização por danos materiais e morais, o segundo por danos materiais,
morais e lucro cessante, e o terceiro por danos materiais sobre o veículo e sobre si
mesmo. Não há problema que, no litisconsórcio, haja pedidos diferentes! O único
requisito exigido pelo sistema é que haja um fundamento de fato comum a todos os
autores, seja qual for o pedido5 de cada um deles.
III) Conexão na causa de pedir ou pelo pedido: Segundo o inciso III, basta que as causas
tenham pretensões conexas para que tornem-se passíveis de litisconsórcio. Ou seja, não
precisa nem ter um fato em comum!
Por exemplo, Caio processa uma empresa porque a poluição por ela causada diminuiu a
qualidade do leite de sua fazenda. Determinados consumidores se sentiram prejudicados
pelo leite contaminado. O fato da contaminação ter atingido a fazenda de Caio guarda
uma conexão muito tênue com o fato de os consumidores terem se sentido prejudicados
pela queda da qualidade do leite. Mas mesmo assim, como eles tem uma conexão na
causa de pedir, admite-se o litisconsórcio.
IV) Afinidade de questões: por foça desse inciso, basta que haja uma afinidade de questões
por um ponto de fato ou de direito.
Ora, se basta uma afinidade de questões, seja de fato ou de direito, então esse inciso
absorve todos os demais! A simples afinidade já está um degrau abaixo de tudo isso aqui
que já foi dito, e se ela enseja litisconsórcio, não seria necessário discriminar as hipóteses
dos primeiros incisos.
5
Pedido no processo civil é sinônimo de objeto.
28
Caderno de Direito Processual Civil
Art. 46. Parágrafo único. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto
ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou
dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para resposta, que
recomeça da intimação da decisão.
Numa hipótese de uma ação na qual há vários autores, o réu, na medida em que se considera
prejudicado pelo litisconsórcio, pode fazer uma petição ao juiz e pedir o desmembramento do
processo, reduzindo a quantidade de litigantes. Esse pedido é em geral fundamentado no fato de que a
defesa do réu vai variar conforme o autor, e o litisconsórcio então prejudicaria a amplitude de defesa
do réu. Outro motivo alegável é que a excessiva quantidade de autores faz com que o processo ande
muito devagar, comprometendo a celeridade do processo.
Essa é a primeira possibilidade de defesa que um réu tem contra a formação de litisconsórcio
num número muito excessivo. É importante salientar que, uma vez feito o pedido, o prazo que o réu
tinha para se manifestar é interrompido!
Pedido de Deferimento ou
Desmembramento Indeferimento
Ação (com
litisconsórcio 15 dias 15 dias
ativo)
Interrupção Prazo
do Prazo recomeça
O prazo que o réu tem para se defender no processo, de 15 dias, é um prazo peremptório. Isso
significa que é um prazo de ordem pública. Mas enfim, o que importa nesse prazo em matéria de
litisconsórcio é que, se o réu alegar a quantidade excessiva de litigantes, o prazo é interrompido e volta
29
Giselle Viana
depois a correr na sua integralidade. Ou seja, feita essa contestação, o réu terá o prazo integral
devolvido para se manifestar depois.
Dado que o prazo para a defesa é de 15 dias, até o 15o dia o réu pode alegar a quantidade
excessiva de pessoas no litisconsórcio ativo. Depois de feito o pedido de desmembramento, o juiz
demorará provavelmente uns 3 ou 4 meses para decidir, deferindo ou indeferindo o pedido. Se ele
deferir, determinando o desmembramento, então começa a correr o prazo novamente, desde o
começo. Da mesma forma, se ele indeferir o prazo recomeça a contar a partir da intimação do
despacho que indeferiu o desmembramento. Ou seja, deferindo ou indeferindo o prazo é
interrompido e depois volta a contar integralmente, do zero.
Isso abre uma brecha para que o réu aja de má-fé, pedindo o desmembramento só pra poder
com isso interromper o prazo, ganhando tempo. Mas o código é muito pragmático a esse respeito e
preza sobretudo pela segurança jurídica, então o juiz mesmo diante da má-fé do réu não pode fazer
nada: o prazo é interrompido e ponto.
Dentro dessa mesma ideia, o juiz pode de ofício desmembrar o processo. Não precisa esperar
a manifestação do réu. Afinal, o juiz é como que o diretor do processo, o gerente. Assim, diante das
particularidades do caso concreto, pode pedir o desmembramento, mesmo que o número de autores
não seja a priori grande. Cabe recurso, mas ele pode.
Por exemplo, antes de citar o réu, um juiz constata que existem 500 autores na ação. Vendo
logo que é um número excessivo, e querendo dar agilidade ao processo, o juiz determina o
desmembramento da ação antes mesmo da solicitação do réu.
Normalmente isso é feito antes da contestação do réu. Se for feito depois, porém, é lícito
imaginar que o juiz vai reconstituir o prazo para a defesa, valendo-se desse parágrafo único do art.
46. Observe-se que esse dispositivo, ademais, só se aplica ao litisconsórcio facultativo, não ao
necessário.
30
Caderno de Direito Processual Civil
De acordo com o art. 48, portanto, o litisconsortes serão considerados como litigantes
distintos. Consequentemente, os atos e omissões de um não prejudicarão nem beneficiarão os
outros, cada um segue sua própria sorte.
Ora, o litisconsórcio não é uma comunidade de irmãos que ajudam uns aos outros em espírito
de solidariedade. Às vezes, eles agem até mesmo uns contra os outros! O litisconsórcio significa que
aquelas pessoas foram colocadas em comum como autores ou como réus, mas não que tenham
destinos em comum.
Art. 320. A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente:
A revelia tem como efeito a eliminação da presunção de inocência do réu. Ou seja, o juiz
passa a considerar como verdadeiros os fatos alegados pelo autor. Dessa forma, apesar de não ser
certeza, é provável que o réu será condenado.
O que o inciso I desse artigo traz é a possibilidade de um réu que estava inerte não incorrer
em revelia por causa da contestação de outro litisconsorte. Essa regra é interpretada de forma muito
restrita, e só incide quando a contestação é fundada numa matéria comum a todos os litisconsortes.
Assim, para que a defesa de um litisconsorte impeça a indução da revelia, ela deve ser uma defesa
aproveitável ao réu revel.
Por exemplo, se um dos réus alega que o contrato é absolutamente inválido, a defesa desse réu
obviamente vale para todos os réus, já que é uma defesa comum. Consequentemente, acarreta o
afastamento da revelia no réu inerte. Se não há essa absoluta identidade de defesas, entende-se que o
dispositivo do inciso I não incide.
Outro dispositivo no Código que aborda essa relação entre os litisconsortes é o do art. 509:
Art. 509. O recurso interposto por um dos litisconsortes a todos aproveita, salvo se
distintos ou opostos os seus interesses.
Assim, o recurso interposto por um dos litisconsórcios só aproveita aos demais que não
recorreram quando o tema for comum para eles.
31
Giselle Viana
Litisconsórcio Necessário
Art. 47. Há litisconsórcio necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza
da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as
partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os
litisconsortes no processo.
Vimos que o litisconsórcio pode ser necessário por força da lei ou por força da incindibilidade
da relação jurídica de direito material. As partes, nesses casos, não têm opção: têm que litigar em
conjunto, seja no polo ativo seja no passivo seja em ambos.
Se a relação jurídica de direito material é incindível, a sentença só pode ser dada na presença
dos legítimos contraditores naquele caso concreto, ou seja, os integrantes da relação jurídica
material incindível. A segunda parte do art. 47 trata justamente da violação a esse requisito, ou seja, o
que acontece quando um juiz dá uma sentença sem a presença no processo de um dos litisconsortes
necessários.
Segundo o artigo, essa sentença dada na ausência de um litisconsorte necessário foi dada
unitiler data, isto é, inutilmente, pois a lei retira a eficácia dessa sentença. Com efeito, o artigo
determina que a “eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo”.
Cabe observar que essa não é uma sentença inválida, nem nula, nem inexistente: só não produz
efeitos! É como o testamento de uma pessoa viva. É uma sentença que nem mesmo transita em
julgado.
Segundo a teoria do professor Bernardes, há coisas não tão intensas que sofrem uma
modulação no direito processual, sem serem tão ao pé da letra. Assim, o ideal seria que essa regra só se
aplicasse aos casos de litisconsórcio necessário por conta da incindibilidade do direto. Não haveria
porque tornar a sentença inútil por conta de hipótese de litisconsórcio necessário legal.
Imaginemos uma ação popular referente a danos realizados ao patrimônio público, na qual
esqueceu-se de colocar no processo um litisconsorte necessário. Como vimos, essa é uma hipótese de
litisconsórcio legal, e não por incindibilidade, já que se pode condenar ou absolver quaisquer das
partes. Não se aplicaria, segundo essa teoria, a previsão de ineficácia do art. 47. Assim, a sentença seria
plenamente válida e eficaz, e quem ficou de fora será chamado numa outra ação.
32
Caderno de Direito Processual Civil
por isso cada réu terá um destino próprio, então não faria muito sentido considerar que a sentença foi
dada inutilmente porque faltou um réu.
Bonício concorda com essa teoria, pois diz que seria excesso de formalismo levar essa situação
a ferro e fogo em determinadas circunstâncias.
Prosseguindo na análise do art. 47, vemos que no parágrafo único o código estabelece que, se
o juiz detectar a ausência de um litisconsórcio necessário, pode determinar o ingresso desse
litisconsórcio por intervenção iussu iudice (intervenção por ordem do juiz).
Art. 47. Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos
os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinar, sob pena de declarar
extinto o processo.
Essa intervenção não existe no nosso sistema (estava no Código de 39, mas não no de 73),
mas no italiano, e nem lá é vista com bons olhos. A ideia de um juiz incluir um réu sem que o autor o
tenha colocado no processo choca com a noção de liberalismo, de autonomia das partes para litigarem
com quem quiserem. Como conciliar essas ideias?
A forma que isso se dá é a seguinte: o juiz intima o autor, dizendo que aquela é uma hipótese
de litisconsórcio necessário. É uma espécie de “autor, determino que você promova a inclusão do
litisconsorte faltante, sob pena de exclusão do processo por conta de ilegitimidade de parte passiva
conjunta” ou “autor, promova a emenda da inicial para incluir o litisconsorte necessário”. A
intervenção iussu iudice só se dá nesse caso.
Caso o juiz determine que o autor inclua novos réus, o autor deve fazer isso sob pena do
processo ser extinto sem julgamento de mérito por falta de legitimidade da parte passiva conjunta.
Na prática, o juiz dá um prazo de 10 dias para o autor emendar a inicial; é bom cumprir, porém, o
prazo judicial, mesmo que não tenha a mesma força do prazo legal.
O autor apresenta, então, uma petição chamada emenda à inicial. O autor, além de pedir, tem
que providenciar a cópia do processo, pagar a diligência etc. Quem instrumentaliza a citação é o autor:
o juiz e o oficial de justiça apenas cumprem a vontade dele.
Essa inclusão tem de ser no início no processo. Imaginemos que o processo começa. Lá na
frente, o sistema descobre a ausência de um litisconsorte necessário. Não dá mais tempo para fazer
essa inclusão — todos já foram citados, as provas já foram produzidas, etc. Qual é a solução tomada
por um juiz nesse caso? O juiz extingue o processo por falta de legitimidade. Afinal, a falta de
legitimidade, como vimos, é um tema de ordem pública, e portanto aferível a qualquer momento do
processo.
33
Giselle Viana
O autor, então, que não quer mover a ação (o coproprietário do imóvel) é citado, para resolver
o problema de litisconsórcio necessário e incindível. Não é, tecnicamente, uma citação. Trata-se antes
de uma chamada, endereçada ao legítimo contraditor, para integrar o contraditório. Ele integra
como réu, embora tivesse de estar no polo ativo.
Se formos para teoria clássica (“se um não quer, dois não fazem”), privilegia-se o direito de
quem não quer ir à Justiça em detrimento de quem quer. Por outro lado, se admitir-se que quem não
quer seja citado, está-se privilegiando a vontade do que quer. No fundo, as duas soluções são ruins.
Em uma você quebra o acesso à justiça. Na outra, você força o acesso à justiça e fere a autonomia das
partes.
Na dúvida, segundo Marcato, deve-se usar o bom senso: ir para a questão material. No plano
material, a ideia é dar a cada um o que é seu. Não há um direito de se ter a fazenda exatamente no
tamanho que a comprou? Esse argumento é bom, mas pressupõe uma análise de mérito que nem
sempre é possível fazer a priori.
34
Caderno de Direito Processual Civil
INTERVENÇÃO DE TERCEIROS
Partes
Numa concepção tradicional e mais restritiva, a parte no processo é a pessoa que participa do
direito material. Assim, quem titulariza as relações de direito material pode ser parte do processo
judicial.
Todavia, a admissão da presença de partes meramente processuais exige uma concepção mais
abrangente do que seria parte. Na visão de ENRICO TULIO LIEBMANN, nesse sentido, parte é
qualquer pessoa que participa do contraditório instaurado diante do juiz. Essa pessoa pode integrar
a relação de direito material, mas em alguns casos pode ser também que não integre. E é aí aparece a
figura da pessoa que é parte em sentido estritamente processual, desvinculada do direito material: não é
parte materialmente, mas está no processo e é, portanto, parte exclusivamente processual.
Relação Jurídica de
Direito Material
Plano Material
Parte puramente
processual
Plano Processual
35
Giselle Viana
O Código não fornece uma teoria sobre intervenção de terceiros. Assim, para responder a
pergunta de quem é parte estritamente processual, temos que passar pelas várias modalidades a que o
Código alude. A primeira delas é a assistência.
(3)
Oposição
(6) (2)
Chamamento Assistência
ao Processo Litisconsorcial
Intervenção
de Terceiros
(5)
(1)
Denunciação
Assistência
da Lide
(4)
Nomeação à
Autoria
1) Assistência
O primeiro tipo de intervenção de terceiros é a assistência, prevista no art. 506 do CPC. O
assistente7 é um terceiro na medida em não é parte do litígio material. Todavia, os efeitos da decisão
o atingirão, e por isso a ele é possibilitado ingressar no processo como parte meramente processual.
6
Curiosamente, está fora do tópico das intervenções de terceiros; está no capítulo do litisconsórcio, o que não
faz o menor sentido. O novo Código, porém, corrige isso.
36
Caderno de Direito Processual Civil
Art. 50. Pendendo uma causa entre duas ou mais pessoas, o terceiro, que tiver
interesse jurídico em que a sentença seja favorável a uma delas, poderá intervir no
processo para assisti-la.
Esse terceiro não pode ser qualquer um. O Código explicita que só pode ingressar como
assistente no processo um terceiro que tenha interesse jurídico. Ou seja, se um indivíduo tem
interesse jurídico na vitória do autor, pode ingressar como assistente no processo para auxiliá-lo.
Cada sentença, no âmbito processual, é um ato do Estado que provoca um ajuste, um conserto
no plano do direito material. O tema da intervenção de terceiros tem que ser analisado a partir dos
efeitos da sentença. A sentença, de fato, não atinge só as partes, mas também terceiros, que podem
vir a sofrer seus efeitos mesmo não estando no litígio material e não podendo ser, portanto, partes no
processo.
Porém, o plano do direito material é uma malha composta por direitos daquelas pessoas que
estão no processo e por direitos de pessoas que estão fora do processo. O tecido material é uno. Cada
sentença provoca os efeitos desejados entre as partes, evidente, mas também produz efeitos para fora
disso. Liebmann, exemplificando com uma metáfora, diz que se jogarmos uma pedra num lago com as
águas perfeitamente paradas, veremos uma forte incisão e, no momento seguinte, ondas em círculo,
que se vão afastando do círculo, perdendo intensidade, até chegar à borda.
A sentença, de forma análoga, faz lei entre as partes, atingindo diretamente o núcleo da
relação. Todavia, as pessoas que estão próximas e possuem relações jurídicas próximas das partes
também são intensamente atingidas. Mas, por não estarem no processo, não tiveram a chance de
defender seus interesses.
É tendo isso em vista que se permite que o terceiro juridicamente interessado ingresse no
processo pela via da assistência
7
Existe a figura do chamado “Amicus Curiae”, isto é, o "amigo do tribunal". Este não se confunde com o
assistente! O amigo do tribunal aparece exclusivamente no STF para fornecer informações, dados técnicos,
opiniões, sobre um tema importante. Ele tem interesse social, político, mas não jurídico.
37
Giselle Viana
Ao contrário do que possa parecer, porém, a doutrina e a jurisprudência são restritivas no que
diz respeito à ingressão no processo por assistência, na medida em que adotam uma concepção estrita
do que seria um interesse jurídico. Desde 1973 até hoje, só se admite a intervenção em interesses
excepcionalíssimos, quando houver fundado interesse jurídico.
Poucas pessoas podem intervir como assistentes, pois é exigido que o terceiro possua interesse
jurídico. Então não basta que haja interesse econômico ou pessoal, por exemplo, para que se permita
o ingresso como assistente. A jurisprudência, aliás, é muito restritiva em relação as possibilidades de
assistência.
Um exemplo comum é o da locação. Proprietário aluga seu bem, que pode ser um imóvel, para
que um terceiro o utilize. O terceiro paga um aluguel. Imagine que eu aluguei um imóvel com 10
quartos. A pessoa que o alugou resolve sublocar dois quartos do imóvel para outras duas pessoas. É
óbvio que o contrato de locação é o dominante, e que o contrato de sublocação é dominado por ele. O
proprietário do imóvel um dia resolve anular o contrato de locação, entrando com um processo.
Nesse caso, o sublocatário também pode ingressar como assistente do réu, pois seu interesse jurídico
é de manter vivo o contrato de locação, mantendo, pois, o contrato de sublocação vivo também. A
jurisprudência nesse caso admite a presença de interesse jurídico e portanto a utilização da assistência.
Se as pessoas são partes no processo, a elas é dado todo o poder processual para gerir seus
interesses (de produzir provas, pedir a audição de testemunhas, etc). Isso porque, num estado
democrático de direito, a imposição do poder jurisdicional estatal precisa estar sempre precedida de
uma amplitude de defesa.
Portanto, se alguém for atingido por uma decisão judicial acerca da qual não participa como
parte, poderá ingressar no processo para ajudar o autor ou o réu. Pois, sendo assim, o assistente não
sofrerá efeitos ou os sofrera em menor intensidade. Admite-se que esse terceiro, portanto, ingresse no
processo para auxiliar a parte a ser vitoriosa evitando prejuízos jurídicos a si mesmo.
Poderes do Assistente
Quais são os poderes do assistente? O assistente pode atuar apenas como gestor de negócios. Os
poderes do assistente são reduzidos em comparação ao das partes. Essa redução tem em vista
preservar a autonomia das vontades das próprias partes, a quem é dado, como vimos, todo o poder
processual para gerir seus próprios interesses. Assim, partindo-se da premissa de que a cada um deve
ser permitido cuidar de seus interesses como achar melhor, e de a que conduta omissiva do assistido
diz respeito a seus próprios interesses autônomos, não se permite que o assistente interfira no
38
Caderno de Direito Processual Civil
processo de forma a contrariar a vontade da parte assistida, exercendo atos que não foram praticados
por ela.
Por exemplo, se o réu não contesta, o assistente não pode contestar, pois a contestação é ato
privativo do réu. Se o réu contestou, mas não quis produzir provas, o assistente também não pode
produzir ele mesmo. Se o réu perder e não recorrer por conta própria, ou se o réu tornar-se revel, não
há nada que o assistente possa fazer. O fato é que os protagonistas do processo são o réu e o autor... o
assistente aparece só para ajudar! Se o réu contestar, ou produzir provas, o assistente pode reforça-las.
Assim, se o réu ouviu 2 testemunhas, o assistente pode ouvir uma terceira. Não pode também
recorrer se o réu for condenado e não recorreu por conta própria.
Depois do trânsito em julgado, vem a fase de execução, na qual não cabe mais assistência. Se o
objetivo do assistente é ajudar a convencer o juiz, não faria sentido admiti-la depois que o juiz já se
decidiu e já proferiu a sentença.
A assistência, cabe por último salientar, é voluntária. Ademais, o assistente é uma figura
meramente processual (afinal, se estivesse no litígio de direito material seria caso de litisconsórcio e
não de assistência).
2) Assistência Litisconsorcial
O art. 54 do CPC traz a figura do assistente litisconsorcial. Considera-se litisconsorte o
assistente quando a sentença repercutirá na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido. Trata-
se de uma hipótese em que o terceiro está na relação jurídica de direito material mas ingressa no
processo como assistente. Ele poderia ter sido litisconsorte mas não foi porque o autor não quis.
Art. 54. Considera-se litisconsorte da parte principal o assistente, toda vez que a
sentença houver de influir na relação jurídica entre ele e o adversário do assistido.
39
Giselle Viana
Eficácia da Intervenção
Outra questão de suma importância em matéria de assistência litisconsorcial é sobre a eficácia
da intervenção: o assistente, ao término do processo, fica de alguma forma vinculado à decisão?
Segundo o código, o assistente não pode, em outro processo, rediscutir a justiça da decisão, isto é,
questionar os fundamentos da decisão:
Mas isso significa que a ele se fez coisa julgada? A coisa julgada é a imutabilidade que leva à paz
social. A decisão do judiciário soluciona o litígio, e na medida em que a decisão não pode mais ser
discutida as partes se conformam e o litígio desaparece. É algo que a lei agrega aos efeitos da decisão,
tornando-os imutáveis. A coisa julgada, em si, não é um efeito.
O assistente fica restrito à justiça da decisão, mas não fica adstrito à justiça da decisão. A
doutrina inclina-se a dizer que não há diferença.
40
Caderno de Direito Processual Civil
o sublocatário então discutir em outro processo a justiça dessa decisão? Não! Operou-se a eficácia
preclusiva da coisa julgada: ele fica preso à decisão final. O assistente então sofre os efeitos que uma
parte sofreria.
3) Oposição
Ao contrário do que ocorre na assistência, na oposição o terceiro ingressa para excluir a
pretensão dos demais, e não para ajudar autor ou réu. O opositor, isto é, quem está movendo a
oposição, tem interesse próprio, que ao final excluirá a pretensão dos demais.
Por exemplo, Caio e Tício discutem sobre a propriedade de uma casa. Mévio, então, ingressa no
processo, alegando que a casa é sua, e assim sua pretensão é autônoma e exclui a de Caio e de Tício.
Afinal, se a decisão for a seu favor, será inexoravelmente contrária a dos outros dois.
Art. 59. A oposição, oferecida antes da audiência, será apensada aos autos principais
e correrá simultaneamente com a ação, sendo ambas julgadas pela mesma sentença.
A audiência diz respeito à fase instrutória do processo8. Uma vez começada a fase de instrução,
a oposição é autônoma, também chamada oposição tardia. Caso contrário, estando ainda na fase
sanatória, a oposição é interventiva. O marco divisório, portanto, é a instrução.
8
A fase instrutória do processo é uma das 4 fases do processo de conhecimento. Este, com efeito, subdivide-se
nas fases postulatória, sanatória, instrutória e decisória. Depois do processo de conhecimento vem a execução.
41
Giselle Viana
Na prática, não obstante essa possibilidade, os juízes por uma questão prática acabam julgando,
em ambas os casos, tudo simultaneamente. Se o juiz fizesse dois julgamentos autônomo, haveria um
enorme prejuízo na economia processual e um alto risco de desarmonia decisório. Por exemplo, no
caso de Caio e Tício que discutem a propriedade de um imóvel quando Mévio entra com uma
oposição, se o juiz resolver o litigio entre Caio e Tício, depois terá que gastar tempo e dinheiro para
julgar se o imóvel era mesmo do vencedor ou se na verdade era de Mévio.
Na oposição tardia, portanto, o juiz não está obrigado, mas em prol da economia processual e
da harmonia de decisões deve procurar julgar conjuntamente.
A oposição tardia lembra o instituto da conexão9, por força da qual duas ou mais ações podem
ser reunidas, quando observar-se uma coincidência de pedido ou causa de pedir. A diferença é que na
conexão ambas as ações possuem as mesmas partes, enquanto na oposição a reunião se dá entre partes
diferentes (a ação original é de Caio contra Tício, a ação de oposição é de Mévio contra Caio e Tício).
Oposição e Assistência
A oposição é uma ação incidental ao processo que já esta em curso. Assim, na oposição há a
criação de uma ação nova. A assistência, por sua vez, é um simples incidente no processo, não
criando ação nova. Um incidente não amplia o processo, apenas reforça o que ele já tem. A ação
incidental, por outro lado, nasce no bojo de outra e modifica e amplia o processo: o juiz terá de dar
duas sentenças, mesmo que conjuntamente.
O fato é que quanto mais intensos os efeitos da decisão na vida do terceiro, maior sua
habilitação para intervir no conflito. Os efeitos na vida do opositor, por exemplo, são intensos, e isso
justifica a plenitude de poderes processuais de que ele goza na ação de oposição.
A oposição, assim como a assistência, não é obrigatória. O interessado pode, em vez de fazer a
oposição, esperar o resultado final da ação inicial. Tirando o aspecto prescricional, inexiste prejuízo
nessa hipótese. É possível também que o interessado mova uma ação a parte e peça a conexão. O
ponto é que a oposição existe para simplificar, reduzir os custos: é útil mas não é obrigatória.
9
Segundo o art. 103 do CPC, “Reputam-se conexas duas ou mais ações, quando lhes for comum o objeto ou a
causa de pedir”.
42
Caderno de Direito Processual Civil
Oposição e Litisconsórcio
Dentro da oposição, existe um litisconsórcio passivo necessário das partes originárias em
relação ao autor da oposição. O autor da oposição precisa por no polo passivo obrigatoriamente as
partes que estavam no processo antes dele entrar. Isso porque a pretensão do autor da oposição é
sempre de excluir a pretensão do réu e do autor da ação principal, então ambos tornam-se réus da ação
de oposição. Trata-se, cabe salientar, de um litisconsórcio passivo necessário por exigência legal, e
não por incingibilidade.
A contrario sensu, não se admite oposição apenas em relação a uma das partes que estava no
processo originário.
4) Nomeação à Autoria
O instituto da nomeação a autoria está regulado nos arts. 62 a 69 do CPC.
Art. 62. Aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome
próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor.
Uma hipótese é aquela em que um réu é demandado de forma equivocada pelo autor: há um
erro na percepção deste, e ele acaba tratando esse réu como se fosse o titular do direito material
contestado, mas ele não é! Esse réu dá ao autor a possibilidade de corrigir esse erro, de corrigir o polo
passivo, substituindo no processo o réu equivocadamente processado pelo réu certo.
Por exemplo, um litígio em que se discute a propriedade de um imóvel foi movido contra o
possuidor. Ora, a posse é mera situação de fato, não é o possuidor o titular do direito contestado, isto
é, o direito de propriedade, mas sim o proprietário. O que acontece, portanto, é que o autor de boa fé,
iludido por uma circunstancia de fato, move uma ação contra quem não é o proprietário.
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Giselle Viana
Primeiro, vale observar que é ônus do réu fazer essa nomeação. Não é obrigado, mas também se
não o fizer arcará com possíveis prejuízos, podendo até mesmo sofrer o risco de ser condenado.
Segundo, se o autor não aceitar essa nomeação, provavelmente seguirá no processo que será extinto
sem julgamento de mérito por falta de legitimidade.
Por fim, observe-se que se o réu não faz a nomeação a autoria, pode ser que a ilegitimidade de
parte dele seja reconhecida. Mas, nesse caso, é ele que pagará as despesas do processo e honorários do
advogado. É uma situação anômala na medida em que é o vencedor da ação que arca com o ônus da
sucumbência! Isso acontece como uma forma de penalizar o réu que não fez a autoria.
5) Denunciação da Lide
A denunciação da lide é uma intervenção de terceiros que ocorre de forma obrigatória,
coercitiva. Exige a presença de um terceiro no processo. Essa pessoa não tem opção — se não
aparecer, será considerar revel, e a ela serão aplicados os efeitos da revelia.
Segundo o art. 70 do CPC, a denunciação da lide é obrigatória em 3 casos, mas na verdade ela só
é realmente obrigatória no caso do inciso I.
I) Evicção: quem é réu na ação reivindicatória pode ao final perder o imóvel que comprou,
e se isso ocorrer pode voltar-se a quem lhe vendeu e exercer os direitos que da evicção
resultam, isto é, exigir o preço pago de volta. Nesse caso, é obrigatória a denunciação da
lide.
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Caderno de Direito Processual Civil
Por exemplo, Caio vendeu uma coisa pra Tício, mas Caio não era o legítimo
proprietário dela. Públio, então, move contra Tício uma ação de reivindicação. Nesse
caso, Tício deve denunciar a lide a Caio, e se ele perder a coisa poderá exigir o preço
pago para Caio. Essa denunciação é obrigatória, e se não feita, o evicto Tício perde o
direito de exigir o preço pago.
II) Autoria: é o caso de alguém que é denunciado em nome próprio por direito alheio.
III) Direito de Regresso: o inciso III do transcrito artigo trata da hipótese do direito de
regresso e tem altíssima relevância na vida prática. O direito de regresso é uma garantia
que em caso de condenação, o condenado poderá cobrar de outra pessoa o que teve que
pagar. É o caso das seguradoras: um terceiro se compromete a reparar os danos caso
alguém venha a ser responsabilizado.
Por exemplo, Caio processa Tício por m acidente de trânsito. Tício, cujo seguro cobria
esse sinistro, poderá cobrar da seguradora aquilo que gastar no processo. Tício então,
uma vez processado, instaura uma lide secundária pela denunciação da lide. Se for
condenado, tem o direito de cobrar da seguradora. Nesse caso, há uma ação principal
entre Caio e Tício na qual se discute o acidente de trânsito, somada a uma denunciação
da lide entre Tício e a seguradora: se Tício for condenado, a seguradora deverá indeniza-
lo.
O que está por traz disso é o direito de regresso, que enseja a possibilidade de ser
resolver dois litígios num mesmo processo. A denunciação, aqui, não é obrigatória!
Assim, a falta de denunciação não implica a perda do direito de regresso contra a
seguradora.
Por exemplo, dado que o Estado é responsável pelos atos dos deus servidores, quem sofre um
dano provocado por ato de agente estatal, não processa o agente em si, mas o Estado. A
responsabilidade civil do Estado é um responsabilidade civil objetiva, que independe de dolo ou
culpa.
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Giselle Viana
Se por exemplo alguém é atropelado por um veículo da polícia e move uma ação contra o
Estado, portanto, não precisa provar dolo ou culpa, mas apenas o nexo causal. Esse entendimento é
fruto de uma teoria do direito administrativo cujo escopo é facilitar essas indenizações.
Apesar de o Estado responder pelo dano diante do autor, segundo o art. 37, parágrafo 6o da
Constituição Federal, ele tem direito de regresso contra o servidor que causou o dano:
Teoricamente, dado que trata-se de um direito de regresso, o Estado poderia denunciar a lide ao
agente estatal. Todavia, a juriprudência vem dizendo que isso não é possível, pois a responsabilidade
do servidor perante a administração pública envolve culpa ou dolo, e a do Estado é meramente
objetiva. Por exemplo, numa ação contra o Estado, nem precisa de testemunhas. Nesse sentido, se
admitir-se a denúncia, a ação principal seria dificultada, pois introdur-se-ía um fundamento jurídico
novo na demanda: seria necessário ouvir testemunhas para aferir o dolo ou culpa do agente, por
exemplo.
Essa é uma visão restritiva. De fato, o inciso III do art. 70 não estabelece isso. Mas é a que
predomina hoje em termos jurisprudenciais, apesar de haver divergências. Alguns sustentam que ainda
é melhor ter apenas um processo, ainda que mais complexo, do que dois simples – pois isso contribui
para a harmonia e economia processual.
Prazo
A denunciação da lide precisa ser feita no prazo para defesa. Esse prazo é de 5 dias nos
procedimentos ordinários. Nos sumários ou de juizados especiais, o prazo é o da audiência (data
fixada pelo juiz para as partes apresentarem as provas, etc.). No prazo para a defesa o réu pode fazer a
denunciação da lide a alguém ou por evicção ou por direito de regresso. O autor também pode fazer
denunciação da lide, apesar de isso ser mais raro.
Denunciações Sucessivas
Ademais, pode haver várias denunciações num mesmo processo no mesmo polo. Por
exemplo, Caio processa Tício por evicção. Tício faz a denunciação da lide a Mévio. E Mévio, por sua
vez, faz a denunciação a Públio. São denunciações sucessivas da lide, ensejadas, por exemplo, por
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Caderno de Direito Processual Civil
sucessivas fraudes ocorridas no plano material. A jurisprudência estabelece um freio a isso: embora
admissível as sucessivas denunciações, cabe ao juiz garantir o andamento do processo, e se elas
dificultarem esse andamento, o juiz pode indeferir esses pedidos.
O autor da ação principal não possui relação jurídica material com o denunciado. Portanto, a
procedência do pedido principal deveria operar efeitos apenas em relação ao réu. E este sim é que
poderia exigir do denunciado o reembolso. No entanto, temos uma forte tendência hoje na
jurisprudencia de permitir que o autor da ação principal cobre diretamente do denunciado o valor da
condenação imposta naquele processo. Mas esse posicionamento não encontra suporte na lei.
Por exemplo, Tício, réu da ação principal, não tem dinheiro para pagar. Caio, então decide
cobrar diretamente de Mévio, do denunciado. Mas a dívida de Mévio não é com Caio, mas com o réu.
Mas, segundo essa posição jurisprudencial, o processo nesse caso "atropelaria" a relação material e
possibilitar-se-ia uma execução diretamente contra a seguradora. Apesar de não haver relação material
entre Caio e Mévio, permiti-se-ia excepcionalmente que Caio fosse diretamente à esfera jurídica de
Mévio. Na ótica da jurisprudência a seguradora vira litisconsórcio do réu. É uma questão de
praticidade. Mas é um pensamento um pouco autoritário e atropela a expectativa das partes. Além do
que aumentou a margem de risco das seguradoras elevando o valor dos seguros.
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Giselle Viana
Para haver uma denunciação é preciso que o direito de regresso seja evidente.
6) Chamamento ao Processo
II - dos outros fiadores, quando para a ação for citado apenas um deles;
O chamamento ao processo só pode ser feito pelo réu, e também no prazo para a defesa.
Ademais, é obrigatório para terceiros, que portanto não têm a opção de estar ou não no processo.
O fiador, por exemplo, pode chamar ao processo o devedor principal, quando demandado
sozinho, pois entre fiador e afiançado existe uma solidariedade. O fiador, nesse caso, poderá fazer
uma petição ao juiz fazendo um chamamento ao processo do devedor principal da dívida.
O objetivo do código é, com uma única ação, permitir que o réu chame ao processo todos os
devedores solidários para responderem juntamente com ele.
Se o réu não fizer o chamamento poderá cobrar a sua parte dos outros devedores em ações
autônomas. Se a pessoa paga uma dívida sozinha, ele obtém o direito de regresso contra os demais
devedores solidários para cobrar a cota-parte deles que pagou.
Quem faz o chamamento ao processo cria para si um titulo executivo judicial, permitindo a
cobrança dos demais devedores no mesmo processo. Se ele não o fizer, terá que cobrar a dívida dos
outros em outro processo. Portanto, quando o réu faz o chamamento obtém uma economia
processual.
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Caderno de Direito Processual Civil
ATOS PROCESSUAIS
O estudo dos atos processuais permite uma visualização mais clara do sistema como um todo.
Conceito
Se estivéssemos falando do direito material, enxergaríamos cada ato processual de maneira
isolada. Com efeito, nos atos de direito civil basta que o agente seja capaz, o objeto lícito e forma
adequada para que eles existam. Os atos processuais, por outro lado, nasceram para viver em
conjunto, e assim só fazem sentido dentro de um contexto.
Nesse sentido, uma defesa, uma contestação, só fazem sentido dentro do processo. Todos os
atos processuais estão ligados entre si numa relação de meio e fim. O processo tem um fim, e para
chegar nele faz-se mister um encadeamento lógico de vários atos processuais, como se fossem os
elos de uma corrente. Quando chega-se no final, quando o processo culmina numa sentença, olhamos
para traz e vemos vários elos, atos processuais coordenados entre si, partindo-se da ideia de que
nenhum dele vale por si só, pois cada um consiste em mera etapa do processo.
Há uma grande diferença em relação ao direito material, pois o que se exige é que o ato seja
praticado no processo, não importando por exemplo o animus do agente: os efeitos dos atos
processuais são inexoravelmente voltados para o fim que a lei quer, e não ao que as partes
pessoalmente querem. Assim, a vontade de quem denuncia a lide, por exemplo, pouco importa na
prática do ato. Erro, dolo, coação, culpa não fazem parte do universo processual, que é muito
pragmático.
Temos portanto, dentro dos procedimentos, a prática dos atos processuais. Se o processo é uma
relação jurídica abstrata, o procedimento por sua vez é a forma pela qual essa relação jurídica
processual se materializa no mundo real. Dentro do processo de conhecimento, por exemplo, temos
o procedimento ordinário (mais longo), o procedimento sumário (mais compacto, com
predominância oral) e os juizados especiais. Esses procedimentos apenas dão vida a algo abstrato.
Os atos processuais estão encadeados nos procedimentos, se modo a dar sustentação ao ato
final do processo: a sentença judicial.
Classificação
Há uma classificação doutrinária dos atos processuais, que os divide em:
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Giselle Viana
Atos do Juiz
Despachos de Mero
Expediente Decisões Interlocutórias Sentenças
Carga Decisória
Despachos de mero expediente são atos que o juiz pratica no processo que não possuem carga
decisória nenhuma. Sendo assim, esse ato também não pode prejudicar os interesses de nenhuma das
partes. Por exemplo, a decisão do juiz que fixa a data da audiência, a determinação da expedição de
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Caderno de Direito Processual Civil
uma carta precatória, são ambos atos de mera diligência, que impulsionam o processo mas não
possuem potencial algum de causar prejuízos às partes. Hoje, boa parte desses atos são praticados pelo
próprio cartorário.
Decisões interlocutórias, por outro lado, são decisões proferidas pelo juiz com certa carga
decisória, podendo portanto provocar prejuízos processuais a alguém. Todavia, apesar desse potencial
elas não têm aptidão para resolver o litígio, apenas para resolver uma questão incidental no curso do
processo.
Além das liminares, há outros exemplos de decisões interlocutórias, como a decisão do juiz que
não quer ouvir uma testemunha, que decide fazer perícia, etc. Em cada decisão interlocutória,
invariavelmente temos um vencido e um vencedor.
Na medida em que decisões interlocutórias possuem uma relevante carga decisória, são
passíveis de recurso: o agravo de instrumento ou o recurso retido.
Cabe observar que vezes uma decisão interlocutória pode até ganhar força de sentença, mas não
se confunde com uma sentença pois não extingue o processo! Essa é a distinção fundamental entre
esses dois atos do juiz. Por exemplo, imaginemos um caso em que há um autor e três réus. Os três
contestam, mas um deles se alega parte ilegítima. O juiz, ao ler a contestação, dá razão ao réu e
determina a sua exclusão do processo. No fundo, essa decisão tem conteúdo de sentença, pois teve
carga decisória máxima no que concerne ao destino de um dos réus, além de ter como fundamento o
art. 267 do CPC. Entretanto, trata-se de uma decisão interlocutória, pois apesar de resolver uma
questão incidental, ainda que importantíssima, e ter fundamento de sentença, ela não provocou a
extinção do processo. Mas como o processo precisa continuar para as outras partes, não foi resolvido,
então ela é apenas uma decisão interlocutória.
É importante ter em mente essa distinção pois não se pode trocar um recurso pelo outro: a
sentença cabe apelação, e à decisão interlocutória cabe agravo.
As decisões interlocutórias têm carga decisória restrita a uma questão incidental no processo, e
não podem ter forca suficiente para provocar o fim do processo, não é apta a resolver o litigio. Se
resolve, então é na verdade uma sentença.
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Giselle Viana
A sentença, por fim, estabelece uma ponte entre o que ocorreu no processo e o mundo real. Em
outras palavras, é o ato processual a partir do qual projeta-se os efeitos para fora do processo, para as
relações materiais. Há efeitos endoprocessuais e extraprocessuais, e quando o processo chega ao fim, a
sentença, com efeitos declaratórios, constitutivos, etc., projeta efeitos para o mundo extraprocessual.
É com a sentença, portanto, que se faz o acertamento dos problemas do mundo material.
Por isso, a sentença é o ato mais importante do processo: ela resolve o litígio, pondo fim ao
processo e criando um elo entre o plano do direito processual e o plano do direito material. Chega à
vida real das pessoas, dando a cada um o que é seu. É justamente por isso que os códigos me geral
procuram disciplinar bem a sentença. O art. 453, nesse sentido, disciplina a estrutura da sentença, que
é formada basicamente por três partes:
Fatos processuais seriam circunstâncias da natureza, que escapam à vontade humana, e que
poderiam produzir efeitos dentro do processo. Há uma grande divergência, mas a tendência é dizer
que existem, embora muito restritos. Por exemplo, o fato do fórum estar fechado por conta de uma
enchente: nesse caso, os prazos processuais ficam suspensos, e essa suspensão seria um fato
processual.
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Caderno de Direito Processual Civil
Acerca dos negócios jurídicos processuais, a questão seria: pode-se fazer um acordo com a outra
parte em relação a termos do processo? Boa parte da doutrina afirma que a arbitragem é justamente um
acordo de vontades cujo efeito é meramente processual, assim, seria um negócio jurídico processual.
O entendimento da admissão de negócios jurídicos processuais é corroborado pelas regras dos arts.
253 e seguintes, que, ao tratar do ônus da prova, dizem em um dispositivo que as partes podem
convencionar de forma diferente o ônus probatório.
Mas quais as consequências dessa invalidade? Nosso sistema adota a regra francesa segundo a
qual pas de nullite san grief, ou seja, não há nulidade sem prejuízo. Isso significa dizer que, se o desvio
de forma não levar a um prejuízo à parte, ele não pode ser alegado tendo em vista anula-lo: deve ser
desconsiderado.
Por exemplo, imaginemos uma ação em que o réu é absolutamente incapaz e não está sendo
representado. A ausência de representação é uma invalidade processual, mas se o juiz absorver o réu
este não terá nenhum prejuízo, então não faria sentido anular a sentença. Faltaria, inclusive, interesse
recursal para recorrer à decisão.
Percebe-se que há uma certa instrumentalidade das formas processuais. Nenhuma forma
processual é um fim em si mesma. De fato, como vimos, os atos processuais são todos eles
instrumentais em relação a um ato final: a sentença. Isso significa dizer que, não existindo prejuízo,
uma sentença pode ser proferida mesmo se diante do processo houve diversas invalidades. Se essas
invalidades foram relativas à parte que venceu o processo, tornam-se irrelevantes.
Esse raciocínio não se aplica ao direito material civil, que possui uma lógica interna distinta.
Nele, cada ato tem um fim em si mesmo. O contrato por exemplo tem por fim chegar aos efeitos
programados entre os contratantes. Por isso, é preciso avaliar se o agente é capaz, se o objeto é lícito,
se a forma utilizada foi a prevista, ou alguma não defesa em lei, pois é a partir dessa verificação que se
determina se o ato atingiu seu fim de forma válida. Se há algum defeito, o contrato é considerado nulo
ou anulável.
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Giselle Viana
Dessa distinção lógica entre os campos civil e processual, decorre a importância de não
interpretar as invalidades do processo civil sob a ótima do direito material. Isso deixa a descoberto a
ideia de instrumentalidade das formas processuais. Se os atos são meios para se chegar a uma decisão
final, e portanto não têm valor em si mesmos, se não quando inseridos no processo, o tema da
invalidade incide de forma distinta nos dois campos. A defesa é instrumental, as provas produzidas
também, por exemplo. Atos processuais não têm vida própria!
Nulidades Processuais
Outra diferença primordial em relação ao direito civil é que, em matéria de atos processuais,
não existe aquelas noções de absolutamente nulo, de relativamente nulo, etc. Isso porque nulidades
processuais precisam ser sempre reconhecidas pelo juiz, e é o juiz que vai dizer, em cada caso
concreto, se a nulidade atinge todo o processo – sendo absoluta – ou se é apenas em relação a alguns
atos – relativa, portanto.
Assim, ao contrário do direito civil, onde a nulidade absoluta fulmina tudo, no processo há
sempre a necessidade de análise do juiz pra saber quais atos serão anulados e quais serão mantidos.
Isso significa também que a validade ou invalidade dos atos processuais está sempre nos atos
dos juiz, e não das partes, como no direito civil. Por exemplo, uma contestação apresentada por um
absolutamente incapaz sem a presença dos responsáveis: não se pergunta se é valida ou invalida. O que
pode ser é o ato do juiz que recebe ou rejeita essa contestação. O que é invalido é sempre o ato do
juiz. O que nos deixa com toda a atenção voltada aos atos do juiz.
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Caderno de Direito Processual Civil
Como vimos, para que haja nulidade é imprescindível que tenha havido um prejuízo. Esse
prejuízo não é necessariamente econômico. Pode, com efeito, ser uma frustração de expectativas, um
prejuízo processual.
Art. 243. Quando a lei prescrever determinada forma, sob pena de nulidade, a
decretação desta não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa.
O art. 243 traz a ideia de que ninguém pode ser beneficiado pela própria torpeza. Nesse sentido,
quem causou as invalidades não as pode usar ao próprio favor. O art. 244, por sua vez, é uma
expressão da instrumentalidade do processo:
Art. 244. Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, o
juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, Ihe alcançar a finalidade.
Assentamos que as formas dos atos processuais é importante na medida em que garante a
segurança jurídica, mas tem caráter instrumental, isto é, só tem valor quando considerada uma etapa
a mais no caminho em direção à sentença. Disto decorre que, se consegue-se na prática chegar ao
resultado visado pelo ato mas por um caminho diverso daquele previsto pela lei, não é preciso
invalidar o ato.
Art. 245. A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que
couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão.
O art. 245 traz a ideia de que as nulidades de um ato processual precisam ser alegadas no
primeiro momento em que a partes tiverem que falar nos autos, sob pena de preclusão. Preclusão é
a perda de uma determinada faculdade processual, e pode se dar por três formas diferentes:
2) Preclusão lógica: o indivíduo pode-se ser obstado de praticar uma ato quando adotou no
processo uma postura incompatível com a prática daquele ato. Por exemplo, a prova
pericial vem antes da prova testemunhal. Primeiro, então, se produz a prova pericial.
Num determinado processo o juiz pergunta pro autor que provas ele quer produzir e ele
diz que testemunhal. Finda esta, ele fala que quer uma pericia. Mas, nesse caso, há uma
preclusão logica, pois o sistema pressupõe que a parte não quer uma prova pericial, pois
seu comportamento – pedir antes a testemunhal – foi incompatível com o que ele quer
praticar agora;
3) Preclusão consumativa: se a parte já praticou determinado ato, consumou-se o direito
que ela tinha à pratica desse ato, então ela não pode faze-lo de novo. Nesse sentido, uma
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Giselle Viana
vez interposto o recuso, certo ou errado, ocorre a preclusão consumativa, então a parte
nem pode alterar nem fazer de novo.
A cada vez que uma parte tiver que falar no processo é a oportunidade que ela tem pra arguir as
invalidades existentes no processo. Se elas não tocar no assunto, perde o direito de questionar depois
perante o tribunal. Essa ideia garante uma certa segurança jurídica, na medida em que impede que as
partes fiquem “guardando cartas na manga’, ou seja, deixem de alegar a nulidade enquanto estão
vendendo, guardando o trunfo para caso perderem.
Art. 245. (...) Parágrafo único. Não se aplica esta disposição às nulidades que o juiz
deva decretar de ofício, nem prevalece a preclusão, provando a parte legítimo
impedimento.
Por fim, segundo o paragrafo único do art. 455, há nulidades que o juiz deve declarar de oficio.
São aquelas nulidades que envolvem problemas de ordem pública, e por isso não precluem, podendo
ser alegadas a qualquer momento. Isso consiste, portanto, numa exceção à regra do caput.
Em suma, aplica-se o regime de preclusão à maioria das invalidades do processo, exceto quando
a questão for indisponível, de ordem pública. A lei não dá uma formula exata para o que é
“indisponível”, mas são em geral questões relacionadas ao estado da pessoa (direitos personalíssimos),
à saúde e à segurança.
Art. 248. Anulado o ato, reputam-se de nenhum efeito todos os subseqüentes, que
dele dependam; todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras,
que dela sejam independentes.
Os atos processuais, como vimos, não têm um fim em si mesmos. O que há, de fato, é uma
sequência de atos, na qual os atos posteriores dependem dos atos anteriores. Só se pode decidir, por
exemplo, se houve uma fase instrutória.
Esse encadeamento lógico dos atos processuais leva a uma relação de causa e efeito entre o ato
anterior e o posterior. A existência dessa relação, no campo das validades, enseja uma construção
interessante: o ato inválido pode comprometer os atos posteriores do processo, de dele forem
totalmente dependentes esses atos posteriores. Assim, havendo um ato inválido no processo, todos
os demais atos que dele forem dependentes podem ser contaminados pela invalidade. A contrario
sensu, os que forem independentes não serão contaminados.
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Caderno de Direito Processual Civil
A primeira questão que surge, então, é sobre quando um ato é dependente do outro. Se num
determinado processo, a perícia não foi válida, houve algum erro na fase de produção da prova
pericial, a fase da prova testemunhal não tem nada a ver com isso, por exemplo. A citação, por outro
lado, é um ato solene cuja falha pode levar à invalidação de todos os atos processuais – todos os atos
praticados sem a presença do réu não podem ser válidos.
Permeia nossa política judicial uma ideia de salvamento do processo. Assim, a questão do
gerenciamento das invalidades é feita sempre de forma tendente a salvar os atos processuais que
podem ser salvados. De fato, na prática raramente começa-se do zero, jogando fora tudo que já foi
feito, uma vez decretada a invalidade.
Há prazos judiciais ou meramente dilatórios, que não são de ordem pública e cuja
inobservância não acarreta nenhuma consequência grave. Podem, portanto, inclusive ser prorrogados
pelo juiz.
Os prazos podem ser, por outro lado, peremptórios. Estes, por sua vez, são prazos de ordem
pública, e consequentemente não podem ser suspensos, interrompidos ou modificados, nem mesmo
pela vontade judicial. É o caso, por exemplo, do prazo para recorrer, que geralmente é de 15 dias, e
nem que o juiz queira pode aumenta-lo.
O que nos interessa saber não é o prazo ou a quantidade de prazos, mas a forma como eles são
contados no direito processual. Segundo o art. 184 do CPC, salvo disposição em contrário,
computar-se-ão os prazos excluindo o dia do começo e incluindo o do vencimento. Essa regra é de
vital importância na vida prática.
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Giselle Viana
A exclusão do dia do começo concede à pessoa uma certa folga. Se o prazo do começo é por
exemplo hoje, começa-se a contar o prazo amanhã. Se o termo final cai num dia não útil, pula para o
dia seguinte.
Na maioria das vezes, os prazos se iniciam pela intimação pela imprensa, através do Diário da
Justiça Eletrônica10. Quando a intimação se dá dessa forma, exclui-se o dia do começo e exclui-se o dia
seguinte. Se estivéssemos num estado da federação em que o jornal fosse físico, o prazo seria contado
O fundamento dessa regra reside no fato de que quando o processo eletrônico estiver
disponibilizado por completo, o advogado receberá intimação a qualquer tempo, 24h por dia. O
sistema poderia por exemplo mandar intimação via e-mail às 23h55. Ora, como o prazo dele poderia
começar naquele dia? Para evitar esse tipo de distorção, então, exclui-se o dia do começo e o dia
seguinte.
Essas, porém, não são as duas únicas formas de intimação para o início de prazo. Há intimações
por mandado judicial. Nessas intimações, o juiz manda um mandado, pedindo que o documento seja
entregue à pessoa do réu. Nesses casos, é preciso que o mandado retorne cumprido, seja entregue para
o cartorário, e o que o cartorário faça a juntada aos autos. Feita a juntada aos autos, aí se exclui o dia
do começo, e computa-se o dia seguinte. É a forma de intimação mais eficaz e, ao mesmo tempo, a
mais lenta, uma vez que depende da burocracia do oficial de justiça, do cartorário etc.
Citação
A citação é um dos atos processuais mais importantes. Citação é um ato solene, pelo qual o juiz
não quer correr riscos. Se houver dúvidas sobre uma citação, juiz manda citar em dobro.
1) Dar ciência ao réu de que em relação a ele foi proposta uma ação: o mandado de citação é
acompanhado da chamada contra-fé, que é uma cópia da petição inicial;
2) Intimar o réu de que ele precisa apresentar defesa no prazo fixado pela lei sob pena de o
juiz considerar verdadeiros os fatos afirmados pelo autor: deve-se considerar aqui a
10
A cada intimação, saem os nomes dos advogados das partes. Permite-se, por um sistema de buscas (feito por
exemplo pela AASP), que o advogado saiba todos os processos em que seu nome foi mencionado.
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Caderno de Direito Processual Civil
advertência do artigo 285 do CPC, segundo o qual o mandado de citação tem de ser claro e
tenho de dar o prazo para ele se defender:
A pessoa que está recebendo a citação é, na maioria das vezes, leiga. Ela tem de ter noção da
importância desse ato solene.
Modalidades de Citação
Citação por
Correio
Modalidades
de Citação
Citação por Citação com
Mandato hora certa
1) Citação por Correio: o cartório expede uma carta, que é entregue ao correio, e o correio
devolve o chamado ‘aviso de recebimento’ assinado. A vantagem dessa modalidade é que
pode ser feita em qualquer lugar do país. A desvantagem reside na insegurança quanto ao
efetivo recebimento daquela citação.
A partir da juntada aos autos do aviso de recebimento, começa a contar o prazo para a
defesa. Quase nenhum advogado gosta de citação pelo correio, porque não se sabe de quem
é a assinatura, às vezes.
2) Citação por mandado: Não é a forma que o Código elege em primeiro lugar, mas é a
citação preferida dos advogados, porque é a mais segura. O oficial de justiça vai ao
endereço do réu, exige a presença do réu, exige sua assinatura, emite uma certificação caso
ele não assine, etc. É uma citação mais cara (20 reais) e mais lenta. A vantagem é que ela
permite um avanço na citação do réu: caso o réu não more mais naquele endereço, o oficial
de justiça vai lavrar que os vizinhos disseram que ele não mais mora ali etc.
3) Citação com hora certa (arts. 227 a 229 do CPC): É feita pelo oficial de justiça com
mandado. Porém, o oficial de justiça tem de ter ido ao endereço do réu pelo menos por três
vezes. Nessas três vezes, o oficial de justiça tem de ter tido a impressão ou a suspeita de
que o réu se oculta para não receber a citação.
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Giselle Viana
A partir dessa suspeita, que tem de estar escrita, estar fundamentada, o oficial de justiça
pode proceder da seguinte forma: ele avisa aos moradores da casa que retornará em dia e
horário pré-determinado; naquele dia e horário, ele pretende encontrar o réu; se não
encontrá-lo, dará o réu por citado.
É o único caso que temos de citação ficta, citação fictícia. O réu está sendo citado, mas não
sabemos se foi citado de fato ou não.
O advogado pode acompanhar qualquer dessas coisas com o oficial de justiça, mesmo que
não haja hora marcada.
A faculdade de escolher entre a citação por correio ou por mandado é do autor. No seu
silêncio, a citação é por correio. Caso haja os requisitos para a citação com hora certa, juiz ou oficial
de justiça determinam de ofício.
Depois de publicado em todos os meios possíveis, começa a correr o prazo. Como ninguém lê
edital, esse prazo geralmente passa em branco. Para resolver esse problema, o código estabelece que se
o réu for citado com hora certa e por edital e ele não se defender, o sistema lhe dará um curador
especial, um curador dativo, nomeado geralmente pelo juiz. Ele fará uma defesa vazia, afinal nem
conhece o réu, e o processo finalmente correrá, com o réu citado fictamente.
Essa série de formalidades existe porque a citação é um ato solene e importantíssimo para o
processo. Faz-se mister o máximo de segurança possível quando alguém move uma ação contra
outrem e essa ação pode culminar com a destituição do pátrio poder, com a perda de uma casa, com
uma indenização, etc. Num estado democrática, preza-se pela segurança, para que ninguém venha a
perder seus bens sem um processo seguro e previsível. Isso, por outro lado, é burocrático, oneroso e
lento.
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Caderno de Direito Processual Civil
processo, mas isolar o ato. Aqui a tendência, portanto, é oposta: a qualquer dúvida ou risco na
citação, por menor que seja, invalida-se todo o processo, começando do zero e dando novamente ao
réu a chance de se defender desde o começo.
Essa ideia é corroborada pelos arts. 275l, I, e 441 I. Nessas duas disposições processuais diz-se
que mesmo que uma decisão já tenha sido transitada em julgado, a coisa julgada pode ser
desconsiderada e o processo aberto novamente se descobertos erros na citação:
O art. 253 do código diz que o autor que ocultar o endereço do réu dolosamente, além de
responder com uma multa, tem novamente aberto o processo. Por exemplo, eu autora dou ao juiz o
endereço errado do réu, e por isso o oficial de justiça não o encontra. Depois, forneço o CPF errado
do réu, ao fazer uma busca na receita federal não o encontram também. Continuo então iludindo o
órgão judiciário fornecendo pistas falsas e induzindo o réu ao estado de revel. Transitada em julgado a
ação, o processo pode ser novamente aberto!
Efeitos da Citação
Torna
prevento o
juízo
Induz
Constitui litispen-
em mora
dência
Citação
Interrompe
a Faz litigiosa
a coisa
prescrição
Os efeitos da citação, que são tanto materiais quanto processuais, são abordados no art. 219:
Art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz litispendência e faz litigiosa a
coisa; e, ainda quando ordenada por juiz incompetente, constitui em mora o devedor
e interrompe a prescrição.
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O primeiro efeito da citação, portanto, é tornar prevento o juiz. Posso ter mais de um
processo sobre o mesmo tema. Por exemplo, um acidente de trânsito: uma vitima processa o réu em
São Paulo, e esse réu processa aquele autor em Santos. São as mesmas partes e o mesmo fato. São
ações conexas. Em que local se dará a reunião das ações? De acordo com esse artigo, no local em que
o juiz primeiro fizer a citação válida, pois esta lhe torna prevento.
Ademais, a citação válida faz litigiosa a coisa. Coisa litigiosa é a coisa em relação a qual existe
litígio. Quando falamos da substituição processual, no tema da evicção, vimos que considerar algo
litigioso produz efeitos tanto em relação às partes quanto em relação a terceiros. Com efeito, direito
litigioso é um direito constrito, privado de parte das suas atribuições. Assim, se estou discutindo
com Tício a propriedade de uma casa, posso vende-la, mas quem compra tem que estar ciente de que
se trata de coisa litigiosa, e assumir o risco de perder a casa de acordo com a sentença final. Quem
perde o imóvel, no caso de evicção, pode voltar-se a quem lhe vendeu a coisa.
A coisa litigiosa pode levar à evicção ou não, dependendo do grau de conhecimento que o
terceiro tinha do litígio. E por exemplo ele tinha pleno conhecimento, e arrematou a casa por um
preço mais baixo justamente por causa da existência do litígio, não leva à evicção.
Ainda quando realizada por juízo incompetente, a citação constitui em mora o devedor. A
mora é uma situação de atraso, e partir dela constata-se a inadimplência de alguém, e
consequentemente começam a correr os juros moratórios. Ademais, quem está em mora responde
pelos riscos da coisa. Quem está em mora, como pode-se perceber, fica numa situação de
desvantagem.
Por fim, a citação, mesmo que inválida, interrompe a prescrição. O prazo prescricional que
temos geralmente, por exemplo, para as situações indenizatórias, é de 3 anos. Não proposta a ação
nesse prazo, o direito material é extinto de uma forma anômala (o ideal seria o cumprimento da
obrigação): a prescrição. Essa inércia pode ser movida de varias formas: pela notificação pelo cartório,
uma carta enviada ao devedor, pela qual ele fica sabendo do estado de inércia, etc.
Existe prescrição durante o processo? Se, por exemplo, no curso do processo, o autor o abandona,
o prazo começa a ser recontado? Sim, existe a prescrição intercorrente, derivada de um prazo
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consciente de inércia (geralmente quando o processo fica parado por 3 anos). E depois do transito em
julgado, pode correr novamente? Sim! A súmula 150 do STF determina isso.
A extinção do processo sem julgamento de mérito por exemplo por inobservância de uma das
condições da ação, interrompe a prescrição? Depende. Se a citação válida interrompe a prescrição,
pouco importa o que foi decidido, se for extinto depois por impossibilidade jurídica do pedido por
exemplo. Se o réu for considerado parte ilegítima, a prescrição foi interrompida em relação a ele.. se
foi processado como verdadeira réu, ok.
Intimação
A intimação normalmente pressupõe um processo já em curso. É uma ordem que se dá ao réu,
ao autor, enfim, a qualquer sujeito do processo, para que se faça, se deixe de fazer, se entregue algo,
etc. Exemplo, intimo o réu para que compareça a uma audiência, intima-se o perito para que ele faça o
laudo pericial, etc. O processo contém diversas intimações, e elas estão tratadas nos arts. 234 e 235, e
especialmente o 236.
Cartas
Cartas
De uma instancia
Entre juízes de 1a Entre países superior a uma
Instancia distintos
inferior
Carta Precatória é um meio de colaboração entre juízes do primeiro grau de jurisdição. Essa
colaboração é essencial, uma vez que, por exemplo, as testemunhas que não residem na comarca não
são obrigadas a viajar pra lá só para prestar depoimento. Tendo isso em vista, o juiz da comarca em
que se está desenvolvendo o processo emite uma carta precatória para o outro, onde está a
testemunha. O outro juiz, então, fará o favor de ouvir a testemunha, e depois devolve a carta
precatória para o primeiro, que a junta aos autos.
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Fala-se em “pedidos de colaboração”, mas as cartas precatórias são mais que pedidos, porque há
uma ideia forte de reciprocidade. Um juiz não se negaria a ouvir a testemunha, por exemplo, pois
pode precisar desse favor do outro posteriormente.
Carta Rogatória, por sua vez, pressupõe um pedido a um outro país, uma outra jurisdição, em
relação a qual não se tem nenhuma relação de hierarquia, de mando. No país que a recebe, o juiz
recebe a carta, ouve a testemunha, e devolve. Quando mais parecido com o nosso sistema, mais rápido
será.
Carta de ordem, por último, pressupõe uma relação de hierarquia: o juiz pode determinar que o
juiz de uma instância inferior faça algo, ouça uma testemunha, faça uma perícia, etc. O STF pode
emitir por exemplo para um juiz de primeiro grau.
Fim...
Boa Prova!
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