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Portfólio - Março

David Uchoa Cavalcante

IV
A fenilcetonúria é uma das doenças genéticas mais comuns que afetam os seres humanos, com
uma incidência aproximada de 1 em 10 mil para brancos e entre 1 em 12 mil e 1 em 15 mil
nascidos vivos no Brasil segundo dados do ministério da saúde . É possível, porém, que a
incidência seja variável em populações especí cas.

Trata-se de uma doença de herança recessiva, que ocorre por variantes patogênicas no gene
PAH (fenilalanina hidroxilase). Constitui portanto um erro inato do metabolismo de um
aminoácido, uma aminoacidopatia.

Existe um fenótipo clássico, mais severo, que quando não há tratamento leva a uma de ciência
intelectual potencialmente grave, epilepsia, transtorno de movimento, hipopigmentação de pele e
cabelos, e malformação dos fetos.

O screening pode ser feito através da espectrometria de massas em tandem, que revelam níveis
elevados de fenilalanina no sangue em papel ltro, podendo ser con rmada por uma dosagem de
fenilalanina plasmática com valor elevado, além de aumento da relação fenilalanina:tirosina. O
diagnóstico pode ser feito apenas com os marcadores bioquímicos, embora também se encontre
variantes patogênicas por NGS em até 97% dos casos, e CNVs maiores em 1 a 3%

Para os pacientes tratados, o prognóstico depende da efetividade do tratamento em reduzir os


níveis de Phe. Há uma relação bem demonstrada entre maiores níveis de Phe e redução no QI.
Há ainda uma relação entre abandono da dieta na vida adulta com redução do QI e sintomas de
desatenção, irritabilidade, ansiedade, depressão, fobias. Isso contribui para a ideia de que deve
se tratar a PKU durante toda a vida.

Há também pacientes com níveis de Phe elevados, porém não em níveis da PKU clássica,
provavelmente por variantes que reduzem menos a atividade enzimática. Para casos entre 10 a
20mg/dL, considera-se o risco de prognóstico adverso maior, porém há maior debate para
aqueles pacientes com níveis acima do normal, porém abaixo de 10mg/dL

Há ainda um maior risco para de ciência de vitamina B12, especialmente para pacientes que
diminuem a suplementação de fórmula e continuam com uma dieta hipoproteica e para
osteoporose.

Há risco de teratogênese pelos valores elevados de Phe para mulheres grávidas. Se observa
de ciência intelectual, Problemas de comportamento, microcefalia, malformações cardíacas e
CIUR nesses casos.

Um diagnóstico diferencial é a de ciência de BH4 (tetrahidrobiopterina), um cofator da


hidroxilação da fenilalanina, tirosina e triptofano. Existem diversos genes envolvidos na síntese e
reciclagem desse cofator, alguns com fenótipos mais graves.

O manejo da PKU envolve uma dieta com restrição de fenilalanina, que geralmente é encontrada
em maior concentração em proteínas de origem animal. Deve-se monitorar a Phe periodicamente
ao longo da vida, com níveis mantidos entre 2 e 6 mg/dL — sem manter os níveis muito baixos, o
que também é detrimento para o neurodesenvolvimento

Pode ser necessária a suplementação de nutrientes como Vitamina b12, Vitamina D e cálcio por
de ciências no consumo dietético destes, além de suplementar aminoácidos com fórmulas
isentas de fenilalanina.

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A sapropterina (Kuvan) também é útil no tratamento da PKU, a depender da responsividade de
cada paciente, com um teste feito por pelo menos 48h para determinar uma redução em até 30%
nos níveis de Phe, podendo continuar o uso da medicação e ter menor restrição dietética. O
tratamento de PKU não clássica varia a cada centro, mas em geral pacientes com níveis acima
de 20mg/dL sempre são tratados.

Os níveis de Phe devem ser mantidos estritamente no valor de 2 a 6mg/dL durante a gravidez,
pelo potencial teratogênico, com a possibilidade também de suplementar a sapropterina.

Um caso interessante que vi no ambulatório envolvia uma paciente de 3 anos de idade que tinha
PKU de difícil controle, apesar da aparente aderência à dieta e baixa estatura muito importante.
Pesquisando, descobri que o gene PAH é próximo ao gene IGF1, e encontrei o relato de caso de
uma paciente que também tinha PKU e uma deleção em 12qter, afetando os genes PAH, IGF1,
ASCL1 e TRA1. A paciente tinha PKU, baixa estatura e também um registro eletro-oculográ co
anormal em ambos olhos.

A paciente do caso apresentava também baixa estatura proporcionada e hipertricose em


membros. Aos 2 anos encontrava-se com altura abaixo de -4.9 desvios padrões. Tinha medida
de GH basal de 33mU/l e após estímulo de 104mU/l, com IGF1 plasmático de 97ng/ml (referência
de 80 a 234) com aumento após tratamento com GH.

Inicialmente o estudo molecular revelou uma mutação em homozigose (é interessante notar que o
estudo é de 2000, anterior ao advento do NGS, a técnica para o estudo molecular era bastante
diferente da atual). A mutação foi encontrada no pai também, em heterozigose, porém não na
mãe, o que sugeriu dissomia uniparental ou deleção do alelo materno.

A hipótese de dissomia uniparental foi descartada a partir do estudo de microssatélites, porém a


partir da análise de VNTR (Variable Number tandem repeats) percebeu-se que a paciente não
tinha um alelo materno do gene. A citogenética convencional não mostrou alterações do cariótipo
da lha ou da mãe. Útilizou-se então uma sonda de FISH representando o segmento 12q22-q23
que revelou hibridização de apenas um dos cromossomos 12.

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Defeitos em heterozigose do IGF1 podem estar relacionados com casos de baixa estatura
idiopática, e sabe-se que o tecido fetal expressa IGF1 desde um estágio precoce. Há descrição
de um menino com baixa estatura grave, de ciência intelectual e surdez sensorial com uma
deleção parcial do IGF1 em homozigose. Ambos pais tinham baixa estatura e IGF1 em níveis no
limite inferior, com uma deleção em heterozigose.

Achei isso interessante, pois poderia ser o caso da paciente do ambulatório, que tinha níveis de
IGF1 em valores próximos ao limite inferior, além de PKU e baixa estatura bastante importante.
Seria interessante fazer um sequenciamento do gene PAH além de uma análise para CNVs na
região em questão.

Referências

Monteiro, Lenice & Cândido, Lys. (2006). Fenilcetonúria no Brasil: evolução e casos. Revista De
Nutricao-brazilian Journal of Nutrition - REV NUTR. 19. 10.1590/S1415-52732006000300009.

Regier DS, Greene CL. Phenylalanine Hydroxylase De ciency. 2000 Jan 10 [Updated 2017 Jan 5].
In: Adam MP, Ardinger HH, Pagon RA, et al., editors. GeneReviews® [Internet]. Seattle (WA):
University of Washington, Seattle; 1993-2022. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/
books/NBK1504/

Mallolas, J., Vilaseca, M. A., Pavia, C., Lambruschini, N., Cambra, F. J., Campistol, J. Milà, M.
(2000). Large de novo deletion in chromosome 12 a ecting the PAH, IGF1, ASCL1, and TRA1
genes. Journal of Molecular Medicine, 78(12), 721–724. doi:10.1007/s001090000160 
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