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Princípios do Tratamento das

Infecções Odontogênicas
Vitor Pereira Rodrigues
Mestre e Doutorando em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial - FOUSP
Residência em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial - Hospital das Clínicas – FMUSP
Cirurgião Bucomaxilofacial – Poá – SUS
Clínica privada – Cirurgia Bucomaxilofacial e Implantodontia – www.burimrodrigues.com.br
• DIAGNÓSTICO

• IMAGINOLOGIA

DISCUSSÃO CLÍNICA E OBJETIVA:

• MICROBIOLOGIA
LIMITES DO TRATAMENTO EM AMBIENTE AMBULATORIAL E COMO FAZÊ-LO ?

QUANDO E COMO INDICAR O CASO PARA ATENDIMENTO EM AMBIENTE HOSPITALAR ?


Etiologia das Infecções Odontogênicas
Doença pulpar e periapical Periodontal

Pericoronária
• Análise retrospectiva de 8 anos;
• 18.981 atendimentos -> 814 infecções odontogênicas (4%);
• 14 pacientes (1,7%) = Tratamento cirúrgico intensivo;
• 01 óbito (0,1%)
Serviço de CTBMF – HCFMUSP -> março 2012 – fevereiro 2013
Pronto Socorro (Hospital terciário)

• 458 atendimentos

Infecções odontogênicas (28,6%)

Outros motivos
(71,4%)

(Silva FP, Atendimento das infeçções odontogênicas em um centro de atenção terciária em Sõo Paulo: Estudo epidemiológico de 1 ano, 2013)
7 meses (aprox. 210 dias) – 102 pacientes
Princípios Básicos
DETERMINAR AVALIAR DEFESAS DECIDIR AMBIENTE
SEVERIDADE DO HOSPEDEIRO DE TRATAMENTO

ESCOLHER E
PRESCREVER SUPORTE TRATAR
TERAPIA SISTÊMICO CIRURGICAMENTE
ANTIBIÓTICA

ADMINISTRAR
AVALIAR PACIENTE
ANTIBIÓTICOS
COM FREQUÊNCIA
CORRETAMENTE

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


1ª Etapa – Determinar a severidade da Infecção

• a. Localização Anatômica;

• b. Taxa de progressão;

• c. Comprometimento das vias aéreas;

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


1ª Etapa – Determinar a severidade da Infecção

• Localização anatômica -> Fatores determinantes da localização inicial:

Espessura das corticais e posição do ápice dentário

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


1ª Etapa – Determinar a severidade da Infecção

• Localização anatômica -> Fatores determinantes da localização inicial:

Inserções musculares

Espaço Vestibular Espaço Bucal


(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)
DELIMITAÇÃO ANATÔMICA DOS ESPAÇOS-> DISSEMINAÇÃO DA INFECÇÃO
➢ VESTIBULAR ➢ BUCAL

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


➢ Infra-orbital (caninos superiores)
➢ Submentoniano -> incisivos inferiores

(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008)


➢ Sublingual (pré-molares e molares inferiores)

abscesso sublingual

músculo milo-hióideo

(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008)


➢ Submandibular (molares inferiores)

Músculo milo-hióideo

(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008)


➢ Pterigomandibular (3º molar inf.)*

➢ Submassetérico;

➢ Faríngeo laterial;

(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008)


➢ Infra-temporal e Temporal profundo:
Molares superiores

➢ Temporal superficial:

Molares superiores e inferiores

(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008; Freitas, 2008)


INOCULAÇÃO RESOLUÇÃO -> ESPONTÂNEA*
CELULITE ABSCESSO
-> TRATAMENTO CIRÚRGICO E MEDICAMENTOSO
(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008; Freitas, 2008)
• risco baixo: vestibular, infraorbital, bucal;
1

• risco moderado: submandibular, submentoniano, sublingual,


2 pterigomandibular, submassetérico, infratemporal, temporal superficial;

• alto risco: faríngeo lateral, retrofaríngeo, pré-traqueal;


3

• extremo risco: mediastino; infecção craniana;


4
(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008; Freitas, 2008)
➢ Disseminação ascendente:

• A região maxilofacial tem uma relação anatômica de


proximidade com o SNC;

• Infecção na maxila ou periorbital pode alcançar a base do crânio


e estender-se ao cérebro através dos forames e fissura orbitária
superior;

• Espaços infratemporal, temporal e pterigomandibular podem,


por comunicaçăo entre os espaços, alcançar a base do crânio e
daí a intimidade do SNC;

Abscesso cerebral

(Cortezzi, 1995)
➢ Disseminação ascendente: Trombose de seio cavernoso

• O seio cavernoso é um dos seios venosos da dura-máter;

• A função do seio cavernoso é receber as veias do cérebro e da


órbita e drená-las para as veias jugulares internas;

• A infecçăo pode alcançar o seio cavernoso através da


disseminaçăo da infecção nos dentes maxilares, lábio superior,
nariz, seios da face e órbita.

• A via mais frequente é a disseminação através do sistema de


comunicação das veias faciais (facilitado pela ausência de
válvulas) com o seio cavernoso ou através de um trombo
infectado;

• Septicemia avançada, meningite e óbito.

(Cortezzi, 1995)
➢ Disseminação Descendente:

• Ocorre entre os planos e fáscias musculares (espaços fáscias);

• Angina de Ludwig;

• Mediastinite ;

• Fasceíte necrosante cérvico-facial;

(Cortezzi, 1995)
ANGINA DE LUDWIG Espaços submandibular bilateral +
sublingual + submentoniano

Disfagia
Dispnéia
Sialorréia
*elevação da língua*

“posição de cheirar”
• Fasceíte necrosante cérvico-facial:

• Disseminação rápida;

• Platisma-> pescoço -> parede torácica anterior;

• Necrose: músculo, subcutâneo e pele;

• Fatores predisponentes: alcoolismo e diabetes;

• Mortalidade aumentada: atraso na indicação


cirúrgica e mediastinite;

• Grandes defeitos teciduais.

(Goldberg; Topazian, 1997; Flynn, 2008)


• Obstrução da via aérea -> causa mais comum de óbito nos casos de
infecção odontogênica;

• Identificar obstrução existente ou iminente nos primeiros minutos


da avaliação do paciente:
- esforços inspiratórios,
- sons respiratórios anormais (estridentes/grosseiros),
- trismo: 20mm ou menos;
- “posição de cheirar”

➢ GARANTIR VIA AÉREA SEGURA:


❖ INTUBAÇÃO SE POSSÍVEL;

• Obstrução completa -> emergência cirúrgica -> cricotiroidotomia ou


traqueostomia.

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


2ª etapa – Avaliação das defesas do hospedeiro

Mecanismos de Defesa do Hospedeiro


• DEFESAS LOCAIS
• Barreira anatômica intacta
• Bactérias indígenas
• DEFESAS HUMORAIS
• Imunoglobulinas (IgG, IgA, IgM, IgE, IgD)
• Sistema Complemento
• DEFESAS CELULARES
• Fagócitos (Granulócitos e Monócitos)
• Linfócitos
2ª etapa – Avaliação das defesas do hospedeiro

Fatores associados com comprometimento do Sistema Imune:


• Diabetes
• Terapia com corticóides
• Transplante de órgãos
• Neoplasias malígnas
• Quimioterapia
• Doença renal crônica
• Desnutrição
• Alcoolismo
• Estágio terminal da AIDS

(Flynn, 2008)
2ª etapa – Avaliação das defesas do hospedeiro

• A febre pode aumentar a perda de fluídos e as necessidades calóricas;

• Uma febre prolongada pode causar desidratação, o que pode deprimir


Infecção leve/moderada pode ser uma ameaça significativa a paciente imuno-
comprometido;
o sistema cardiovascular, e esgotar as reservas de glicogênio, tornando o
Paciente com doença de base controlada -> estresse fisiológico causado pela infecção
metabolismo um estado catabólico;
pode romper o controle pré-estabelecido.
• Extremos de idade não toleram bem febres altas;

Leucocitose na entrada -> indicador do tempo de internação;


*Importante na detecção da severidade da infecção, assim como estimativa da estadia.

(Flynn, 2008)
3ª etapa - Decidir sobre o Ambiente de Tratamento
Abordagem ambulatorial ou internação?

Indicações para admissão hospitalar:

• Temperatura > 38º C;

• Desidratação;

• Tratamento para vias aéreas ou estruturas vitais;

• Comprometimentos dos espaços com escore 2 ou mais

• Necessidade de anestesia geral (espaços pronfundos – colaboração do paciente);

• Necessidade de controle sistêmico de doenças de base.

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


4ª etapa – Tratar Cirurgicamente
• Williams AC. Ludwig’s angina. Surg Gynecol Obstet 1940;70:140.
• 31 casos = 54% de óbitos Princípio de estabelecimento inicial
3 de via aérea segura;
A
N
O Drenagem cirúrgica agressiva e
S
precoce dos espaços fasciais
envolvidos;

• Williams AC, Guralnick WC. The diagnosis and treatment of Ludwig’s angina: a report of
twenty cases. N Engl J Med 1943;228:443.
• Estudo prospectivo de 20 casos = 10% de óbitos
• Hought RT, Fitzgerald BE, Latta JE, Zallen, RD. Ludwig’s angina: report of two cases and
review of the literature from 1945 to January 1979. J Oral Surg 1980;38:849–55.
• 4% de óbitos

Uso de antibióticos e
avanços nos cuidados
médicos de suporte!
Quando indicar o centro cirúrgico:

• Para estabelecer uma via aérea segura;

• Severidade moderada ou severa dos

espaços anatômicos;

• Múltiplos espaços fasciais envolvidos;

• Rápida progressão da infecção;

• Necessidade de anestesia geral;


(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)
Incisão e drenagem precoce impede a disseminação da infecção para espaços anatômicos
mais profundos e críticos, mesmo ainda no estágio de celulite.
• Anestesia local infiltrativa; • Incisão em tecido sadio e áreas
• Lateralmente ao abscesso; esteticamente aceitáveis
• Dissecção romba (preservar estruturas nobres) – pinça hemostática NUNCA deve ser fechada
dentro da ferida cirúrgica.
• Sem exposição direta do espaço anatômico;
• Dissecar o caminho para a drenagem desde a superfície até a loja com pus.
• Irrigação abundante da ferida cirúrgica com SF 0,9%;

• Instalação de dreno:

• Penrose ou rígido;
• Devem ser consistentes e não se romperem no interior do tecido;
• Picotados – maior retenção e drenam pelas perfurações;
• Suturados às margens da ferida;
• Mantidos enquanto houver drenagem ativa (48h->72horas);
• Tratamento padrão, como remoção do dente causal, incisão
intra-oral e drenagem e antibióticoterapia empírica são
efetivas na maioria das vezes.

• Cultura e testes de Sensibilidade bacteriana em infecções orais


menores NÃO são justificáveis.
É importante em casos com acometimento de espaços anatômicos moderados ou severos
e/ou quando há significante comprometimento clínico ou do sistema imunológico.

Infecões submetidas a múltiplos cursos de terapia com antibióticos previos ou infecções crônicas
resistentes à terapia padrão.

Portanto: Cultura e antibiograma devem ser realizados em infecções atípicas, ou com


comprometimento clínico ou do sistema imune do paciente e em todos os casos em que há
necessidade de hospitalização.
(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)
5º Passo – Dar Suporte Sistêmico

• Hidratação, nutrição e controle da febre em todos os pacientes;


(Um paciente de 70Kg com febre de 38º C tem uma necessidade diária de fluídos de
aproximadamente de 3,100 mL).

• Antipiréticos ;

• A febre também aumenta a demanda metabólica em 5 a 8% para cada grau de temperatura, por
dia. Para tanto, é necessário uma suplementação da ingestão em pacientes com infecção;

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


6º Passo – Escolher e Prescrever a Terapia Antibiótica

• À princípio de maneira empírica,


• Baseado na microbiota da cavidade oral e de acordo com o estágio da infecção:
• Inoculação -> aeróbios,
• Celulite -> mistos,
• Abscesso -> anaeróbios,

*Atentar para orientações da Comissão de Controle e Infecção Hospitalar;

➢ Após teste de cultura e sensibilidade -> antibióticos específicos para microorganismos


encontrados.

(Flynn, TR. 2008 - Miloro, M. 2008)


7º Passo – Administrar os Antibióticos Corretamente

• Respeitar intervalos entre doses


•nível tecidual dos antibióticos

• Via de administração
•efetividade: E.V. > V.O.

• Custo

(Flynn, 2008)
7º Passo – Administrar os Antibióticos Corretamente

Critérios para a troca antibiótica:


• Alergia, reação tóxica ou intolerância;
• Cultura e/ou teste de antibiograma indicando resistência;
• Falha na melhora clínica, apesar da:
• Remoção do fator causal;
• Adequada drenagem (exames de imagem indicados - TC);
•48-72 horas de mesma terapia antibiótica;

(Flynn, 2008)
8º Passo – Avaliar o paciente com frequência
Infecções Ambulatoriais
•2º dia pós-drenagem

Melhora dos Sinais e Sintomas + drenagem inativa

• remoção do dreno

• eliminar focos infecciosos

Sem melhora + drenagem ativa

• irrigação SF0,9% + manutenção do dreno

•reavaliar necessidade de Cultura e Antibiograma


48 horas após drenagem e antibioticoterapia
8º Passo – Avaliar o paciente com frequência

✓ Procedimento cirúrgico inadequado


Pacientes Internados
•Foram submetidos à drenagens de espaços ✓ Defesas do hospedeiro deprimidas
profundos:
✓Corpo estranho
•2º ou 3º dia de PO espera-se redução do
edema, melhora do quadro geral com
possiblidade de extubação; ✓Dosagem ATB insuficiente

•Se não há melhora investigar possíveis falhas ✓Medicamento não atinge o local
no tratamento;

✓ Diagnóstico bacteriano errado

✓ Manutenção do foco
(Flynn, 2008)
vitorprodrigues@usp.br

@vitorprodrigues

www.burimrodrigues.com.br

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