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Unidade 1 - O teletrabalho no novo paradigma

das relações de trabalho

O teletrabalho e os paradigmas da organização do trabalho

Thiago Kamon Macedo Monteiro de Castro Hyodo


Na unidade anterior, foram feitas algumas provocações no intuito de
desnaturalizar algumas ideias sobre o teletrabalho e, até mesmo, sobre o trabalho em
si, utilizando-se, para isso, alguns estudos históricos e científicos sobre a organização
do trabalho e algumas observações empíricas obtidas durante o acompanhamento do
Projeto Experimental do Teletrabalho no TJMG.

Todavia, uma questão se mantém: como tais ideias são naturalizadas em nosso
senso comum, mesmo com diversas verificações da prática apontando para sentido
diverso? Por que, no dia a dia, continuamos a ouvir que o teletrabalho é algo novo,
voltado àqueles muito familiarizados com os avanços tecnológicos e com o objetivo de
aumentar a produção individual e setorial? Por que essa sensação de estranhamento?

Para os fins da presente capacitação, utilizaremos a ideia de paradigmas para


tentar responder a tais perguntas, tendo como objetivo demonstrar que a implementação
adequada e com sucesso do teletrabalho em uma unidade deve passarpela introjeção
de uma nova forma de conceber a organização do trabalho em si.

Paradigmas

Mas, afinal, o que seriam paradigmas?

A palavra vem do verbo grego παραδείκνυμι (paradeiknumi), no sentido de


“representar”, sendo que para significa “estar além” e deiknumi “mostrar, apresentar,
expor”. Sendo assim, de forma simplificada e literal, paradigma significa uma
representação, uma parte, um modelo de algo maior.

O termo foi popularizado pelos trabalhos de Thomas Kuhn nas disciplinas de


história e filosofia da ciência, sendo utilizado para se referir a um conjunto de padrões
de entendimentos, conceitos e práticas que domina certas áreas da ciência por um
período de tempo, até serem substituídos por outro.

Os paradigmas existem por nossa incapacidade de perceber e tratar a realidade


por completo a um só tempo. É como se só pudéssemos enxergar a realidade fática por
meio de lentes limitadas, que só podem ser usadas uma de cada vez e que são
escolhidas de acordo com as necessidades do momento.

Veja, por exemplo, essa imagem:


Qual animal você consegue ver?

 Um coelho?
 Um pato?
 Ambos? Mas não ao mesmo tempo, não é mesmo?

Veja que o desenho (realidade) não muda, mas somente a sua maneira de
enxergá-lo e interpretá-lo. Para Kuhn, os paradigmas funcionariam da mesma forma.

Entretanto, com relação aos paradigmas, a troca de percepção não é tão fácil
como no experimento da figura. Isso ocorre em razão do processo de formação dos
paradigmas e da inércia das nossas concepções e hábitos.

Com efeito, quando nos deparamos com um problema ou necessidade da


realidade, criamos todo o aparato conceitual e prático para tratá-los, desenvolvendo,
com isso, um paradigma, que ganha sucesso na medida em que nos ajuda a resolver o
problema ou a necessidade original. Entretanto, paradigmas são construções sólidas e,
no surgimento de novos problemas/necessidades não abarcados pelo paradigma em
vigor, a mudança é sempre lenta e custosa.

Veja o vídeo, a seguir, sobre os efeitos de tal inércia dos paradigmas:

[“Como nascem os paradigmas - Grupo dos Macacos - autoria desconhecida - Originalmente


disponibilizado pelo canal do youtube “Entretimentos” 2011]

Clique na imagem acima para seguir para o vídeo da apresentação, que será
aberta em seu navegador de Internet.

Entretanto, uma coisa interessante com relação aos paradigmas é que, por mais
que se considere a sua inércia, uma vez que conhecemos um novo paradigma que trate
os novos problemas/necessidades de nossa realidade, não conseguimos mais ignorá-
lo.

Na figura analisada, se você começou enxergando apenas um dos animais (ex.:


o pato) e depois passou a enxergar também o outro (ex.: o coelho), você não conseguirá
mais ignorar esse último, conseguindo, entretanto, realizar as trocas mentais para ver
ora o pato, ora o coelho.

Esse é exatamente o objetivo desse módulo: fazê-lo enxergar o paradigma das


relações de trabalho adequado à implantação com sucesso do teletrabalho, fazendo
com que ele passe a compor o seu arcabouço conceitual e de práticas de trabalho,
fazendo com que o teletrabalho, indiretamente, atue também como um propagador de

uma nova cultura de trabalho, nos termos do art. 3º, VII, da Resolução do CNJ nº
227/2016.
Para ajudá-lo nessa mudança e utilizando como base a mudança gestalt do Pato-
Coelho, identificamos dois paradigmas principais na organização do trabalho: um deles,
que está bem cristalizado em nossas práticas do regime presencial, ao qual
denominaremos, para fins didáticos, de Paradigma Clássico; e o outro, que leva à
implantação do teletrabalho com maior sucesso, o qual denominaremos de Paradigma
Contemporâneo.

Vamos lá?

O Paradigma Clássico da organização do trabalho

Como dissemos anteriormente, todo paradigma surge de


problemas/necessidades impostos pela realidade, os quais se busca tratar e resolver.
Isso não é diferente na esfera do trabalho.

Sendo assim, para entender cada um dos paradigmas, devemos analisar,


primeiramente, as suas bases histórica e teórica para, assim, entender a construção de
seus pilares de entendimento do trabalho e das relações de trabalho.

Base histórica do Paradigma Clássico - A Revolução Industrial

Desde o final da Idade Média, o aumento da demanda pela lã inglesa levou a


Inglaterra a realizar a política de cercamentos, pela qual os campos comunais utilizados
livremente pelos servos feudais foram gradualmente consolidados em grandes
propriedades de uso restrito, normalmente voltadas à criação de ovelhas para a
produção de lã. Tal política estimulou a produção interna e, ao mesmo tempo,expulsou
o trabalhador dos campos, fazendo com que ele, cada vez mais, buscasse trabalho no
artesanato e na manufatura.

Mesmo durante o processo de êxodo rural ocasionado pelos cercamentos, as


primeiras manufaturas britânicas, sem a possibilidade de emprego dos adultos que
estavam ocupados nas fazendas, tinham as crianças como sua principal força de
trabalho, sendo que, não raramente, essas primeiras fábricas se desenvolveram ao
redor de orfanatos, onde se reunia uma “mão de obra” abundante e um pensamento
religioso que via o trabalho, mesmo sem remuneração, como o maior combate ao
pecado do ócio (incluindo aqui as brincadeiras infantis). Como bem mostra a imagem,
as crianças trabalhavam supervisionadas de perto, com regras que definiam cada parte
de sua atuação junto ao maquinário disponível, visando à produção.
As grandes navegações e o colonialismo que se seguiu aumentaram o
comércio internacional, bem como abriram mais mercados aos produtos manufaturados
da Inglaterra e de toda a Europa, aumentando exponencialmente a sua demanda.

Do lado da oferta, o mundo assistiu ao aumento das inovações tecnológicas


nas ferramentas de produção, bem como no transporte dos insumos e produtos, com
destaque para o motor a vapor, impulsionado pelo abundante carvão inglês. Ao mesmo
tempo, o êxodo rural lotava os centros urbanos com mão de obra barata, porém não
especializada, que era direcionada para a produção. O aumento das cidades também
implicava, por sua vez, um aumento na demanda por produtos, uma vez que,
diferentemente dos campos, os centros urbanos não eram autossuficientes.
O casamento entre demanda, tecnologia, capital humano e modelos de
organização herdados das primeiras manufaturas culminou no desenvolvimento das
primeiras fábricas - o motor fundamental da revolução industrial.

Base teórica do Paradigma Clássico - Taylorismo-Fordismo

Frederick Winslow Taylor foi um


engenheiro mecânico que, trabalhando na
indústria de aço, tomou o trabalho e a
organização deste como um objeto de estudo
científico, sendo considerado um dos primeiros
sistematizadores da Administração enquanto
ciência.

Seu trabalho, que passou a ser conhecido


como Administração Científica ou, mais tarde (e,
principalmente, por seus críticos), como
Taylorismo, buscava, de forma geral, uma
abordagem lógico-racional do trabalho, em
substituição aos conhecimentos empíricos,
provenientes da prática laboral.
De forma resumida, mas de acordo com os nossos propósitos neste curso, e
partindo da base histórica que já descrevemos, podemos dizer que Taylor desenvolveu
o seu trabalho conceitual para tratar os seguintes fenômenos observados no trabalho
industrial de sua época (final do século XIX e início do século XX):

1. A intensa urbanização e a abertura de novos mercados aumentaram a


demanda por produtos industrializados, levando a um aumento na expansão
(desordenada), no tamanho e na complexidade das fábricas.
2. Entretanto, mesmo com a alta oferta de mão de obra, decorrente do êxodo
rural, os trabalhadores não produziam de forma eficiente com relação aos
esforços e ao trabalho dedicado à produção. Taylor observou dois fenômenos
principais que poderiam explicar isso:
a. elevado empirismo e improvisação nas tarefas, com cada trabalhador
aplicando conhecimentos próprios provenientes de experiências prévias

(“regra do polegar” - lembrando que muitos vieram da indústria artesanal), o


que gerava desperdício de esforço e de tempo, ocasionando muito
“retrabalho”;
b. os trabalhadores, de forma intencional e sistemática, não trabalhavam tão
arduamente quanto, de fato, poderiam, mantendo o ritmo mais lento possível,
apenas acima do que poderia levá-los à punição. A esse fenômeno, Taylor
chamou de “soldadização” (soldiering), também conhecido como “vadiagem
sistemática”, uma vez que verificou que, apesar de alguns trabalhadores
serem mais talentosos/esforçados que outros, não havia motivação suficiente
para se diferenciarem dos demais “soldados”, uma vez que não havia
qualquer mecanismo que recompensasse financeiramente o trabalho mais
árduo em relação ao trabalho mediano. Por outro lado, os gestores agiam
como simples supervisores e disciplinadores, seguindo aquela cultura das
primeiras manufaturas e do trabalho infantil.
Será que não observamos o fenômeno do soldadismo na nossa realidade
laboral? Na grande maioria dos órgãos da Administração Pública brasileira,
com servidores objetiva e isonomicamente selecionados por meio de
concurso público, há mecanismos de motivação para aqueles mais
talentosos/esforçados? Ficando apenas na dimensão financeira, o salário
dos servidores é diretamente proporcional ao seu rendimento? É previsto
algum prêmio por resultados alcançados?

3. A alta oferta de mão de obra e os baixos resultados para a empresa levavam


a baixos salários e péssimas condições de trabalho, aumentando o conflito entre
empresários e operários, que, não raramente, direcionavam a sua insatisfação
para as suas parceiras inanimadas na produção: as máquinas.

4. Era o auge do positivismo científico, com a aplicação, com sucesso, do


método científico nas mais diversas áreas do conhecimento humano, com
destaque para as ciências exatas e naturais, que eram vistas como modelos a
serem seguidos.
Para os fins deste módulo, basta que observemos que o positivismo científico
parte de uma dualidade fixa entre o objeto de estudo (que possui a função
passiva de ser observado e reagir aos estímulos dos experimentos do estudo) e
o sujeito do conhecimento (que possui a função ativa de observar o objeto,
“descobrir” os princípios e regras fundamentais e experimentar), tal como no
esquema abaixo:
Para tratar essas questões, Taylor desenvolveu o que chamou de Organização
Racional do Trabalho (ORT), que tinha, de forma resumida:
1. Como objetivo: o aumento da eficiência do trabalho, nas duas dimensões:
a. Do trabalhador: aumentando entregas e diminuindo tempos e esforços.
b. Da empresa: aumentando produção e diminuindo custos e desperdícios.
2. Como pressupostos:
a. Foco nas tarefas: variável controlável e mensurável (pelo tempo).
b. Simplifica o ser humano, para fins de estudo (retomando concepções de
John Stuart Mill e Adam Smith), como um homo economicus - agente que atua
racionalmente em direção a um fim principal: maximização de seus interesses
individuais ao menor custo/esforço possível.
c. O interesse que motiva o trabalhador é material e financeiro (recompensas
salariais ou incentivos financeiros).
3. Como princípios:
a. Planejamento
b. Preparo
c. Controle
d. Execução
4. Como métodos:
a. Racionalização do trabalho e da produção através da aplicação do método
científico.
b. Introdução de políticas de remuneração variável e/ou incentivos financeiros
como tentativa de combater a “soldadização” e de conciliar os interesses
antagônicos de empregadores e empregados.
5. Como principal entusiasta: Henry Ford, magnata norte-americano,
fundador da Ford Motor Company, que passou a aplicar os conceitos de Taylor
à produção de automóveis, adicionando algumas de suas próprias ideias (ex.: a
linha de montagem), a ponto de adicionar o seu nome ao apelido dado à
Administração Científica, que é, por diversas vezes, chamada de Taylorismo-
Fordismo.

O trabalho e as relações de trabalho no Paradigma Clássico

Seguindo as suas estudadas bases histórica e teórica, o que denominamos de


Paradigma Clássico aborda o trabalho conforme o seguinte esquema simplificado:
A variável principal do trabalho nesse paradigma é o tempo, uma vez que é a
unidade de medida por excelência, considerando o foco nas tarefas e o objetivo de
diminuir desperdícios para o aumento da produção.

O trabalho em si, por sua vez, é abordado de forma científica, através de um


processo de análise e síntese:

1. Primeiro, ele é quebrado para a identificação de suas unidades mais simples


e fundamentais: as microtarefas cotidianas.
2. Depois, essas tarefas são distribuídas entre os trabalhadores, de forma que
cada trabalhador se especialize em uma delas. Ao invés de um único trabalhador
realizar diversas tarefas para a transformação de insumos em um produto final,
a divisão das tarefas gera diversos produtos intermediários, que, por sua vez,
tornar-se-ão os insumos de uma etapa posterior dentro de uma cadeia de
produção. Da mesma forma, não são os trabalhadores que se revezam nos
insumos, mas são estes é que se deslocam dentro da cadeia, em uma linha de
montagem idealizada por Ford.
3. Cada aspecto da tarefa é meticulosamente estudado, visando encontrar os
princípios e regras fundamentais, bem como diminuir esforços, tomadas de
decisão e retrabalho.
4. Por fim, as tarefas e seus fluxos são compilados em padrões, que podem ser
seguidos por qualquer trabalhador, com um mínimo de treinamento, e podem ser
controlados por um supervisor. Ao trabalhador cabe seguir os procedimentos
padronizados, sem nenhum ou com um mínimo de possibilidade de tomada de
decisões e sem necessariamente visualizar o todo.

Sugestão:
Se você ainda não assistiu, vale a pena
conhecer o filme “Tempos Modernos”, de
Charlie Chaplin, que retrata, de forma crítica e
bem exagerada (e, portanto, caricata), a
abordagem do trabalho que identificamos no
Paradigma Clássico.
Ao assistir, fique com a seguinte questão para
reflexão: Qual é o produto final da fábrica
onde trabalha o personagem principal?

Para suportar essa abordagem do trabalho, as relações laborais são


estruturadas da seguinte maneira:

As relações são vistas em uma dicotomia fundamental, entre gestor e


funcionário, espelhando a separação de sujeito e objeto do positivismo científico, e são
estruturadas em forma de pirâmide, com um verticalismo rígido para aumentar controle
e evitar desperdício de esforços e tempo com discussões.
Sendo assim, de um lado, vemos o gestor, o “sujeito do conhecimento” da
relação laboral. Como tal, cabe a ele:

1. Observar o trabalho realizado, pensando sobre ele, no sentido de analisar as


tarefas, desenvolver padrões e planejar a produção.
2. Determinar ao funcionário o “que” e o “como” fazer, sendo a única instância
de tomada de decisões.
3. Supervisionar o trabalho, a fim de controlar os resultados esperados,
repetindo o ciclo sempre que houver necessidade de revisão de procedimentos.

O funcionário, por sua vez, coloca-se como o “objeto do conhecimento” da


relação laboral, cabendo-lhe:

1. Executar o que lhe é determinado pela chefia, nos exatos termos indicados.
2. Buscar um desempenho melhor que o de seus colegas, aplicando, de forma
diligente, os padrões que lhe são passados, motivando-se financeiramente por
recompensas salariais e/ou prêmios, que compensam o esforço despendido a
mais.

Historicamente e de forma resumida, foram observados os seguintes impactos


dessa abordagem do trabalho e de suas relações:

Resultados obtidos Novos problemas criados

Aumentos significativos de produção e da Simplificação dos produtos.


eficiência do trabalho, diminuindo os
custos e aumentando o retorno para as
empresas.
(ex.: Ford ficou famoso pela frase:
“Qualquer um pode ter o carro da cor que
quiser, desde tal cor seja preta”)
(ex.: sucesso das montadoras de
automóveis norte-americanas)

Melhoria das condições de trabalho, Desqualificação do trabalhador (emrazão


diminuição das horas trabalhadas, da simplificação das tarefas e da alta
desenvolvimento de carreiras e aumento especialização), fadiga física e mental,
do salário dos trabalhadores. autoaceleração, desumanização
(objetificação do trabalhador) e criação
de um ambiente de trabalho de
“sobrevivência dos mais aptos”.
(ex.: jornadas de 8 horas diárias e 40
horas semanais)
Melhor organização do trabalho, Discussões sobre a eficácia e a
facilitando o seu estudo e efetividade do trabalho, na medida em
acompanhamento. que o foco se transfere da quantidade
para a qualidade dos produtos, dos
procedimentos para o produto final e o
efetivo atendimento ao cliente.

Maior significação da figura do gestor,não Não diminuição (na verdade, até um


mais visto como um mero supervisor do aumento) dos conflitos entre
trabalho, alçando a Administração ao empregadores e empregados, sendo
conhecimento fundamental para o ainda refletidos em conflitos entre
trabalho em uma empresa. gestores e funcionários.

Como vimos, todo paradigma, dado o seu caráter de corte deliberado da


realidade sempre complexa e mutante, resolve alguns problemas e necessidades
(normalmente aqueles para os quais foi desenvolvido) e, ao mesmo tempo, gera outros,
que, por sua vez, podem levar ao desenvolvimento de novos paradigmas.

Entretanto, os novos paradigmas não assumem automaticamente o lugar dos


anteriores.

Na verdade, a mudança paradigmática, como bem observou Kuhn, é uma luta,


uma revolução, na medida em que um novo paradigma, munido de soluções para os
novos problemas, “desafia” o paradigma dominante, que tem a inércia, o sucesso e a
resistência à mudança como aliados.

O Paradigma Clássico apresenta alguma familiaridade com a sua realidade


laboral? Em quais aspectos? Quais as consequências disso para o seu
trabalho?
O Paradigma Contemporâneo da organização do trabalho

Diferentemente do paradigma anterior, o paradigma que identificamos como


contemporâneo ainda não criou raízes fortes o suficiente para que seja considerado
dominante na realidade laboral, em especial da Administração Pública, apesar de suas
questões serem amplamente discutidas nos meios acadêmicos e profissionais.

Sendo assim, faremos um tratamento um pouco diferente do anterior: mostrando


as bases históricas que geraram os problemas e as necessidades para o seu advento,
mas tratando as suas abordagens do trabalho e de suas relações através de um
comparativo com aspectos do paradigma clássico, no sentido de mostrar os caminhos
para uma transição paradigmática que entendemos necessária à devida implantação do
teletrabalho.

Base histórica do Paradigma Contemporâneo - o século XX

O século XX foi um período caracterizado por intensas e rápidas transformações


da sociedade mundial, a ponto de poder ser dividido em dois momentos principais com
relação aos impactos de tais mudanças na organização do trabalho:

Primeira metade:

Nas primeiras décadas do século, o mundo passou por duas Guerras Mundiais,
com um pequeno e desolado interstício entre elas (o chamado Entreguerras). Pela
primeira vez, a humanidade assiste a conflitos de abrangência mundial e de proporções
nunca antes vistas.

Entretanto, foi também um período de intenso desenvolvimento tecnológico, que,


ao contrário das inúmeras vidas ceifadas, não se perdeu com o fim dos conflitos.

No período Entreguerras, o mundo enfrenta ainda uma grande depressão


econômica, de dimensões também inéditas. Mais do que suas origens e causas, motivo
de intensa discussão acadêmica, importa para este estudo os seus impactos: falências
de empresas, desemprego generalizado e composto, em sua maioria, por trabalhadores
desqualificados pela simplificação das tarefas, produção sem consumo.

Durante as guerras, uma nova força de trabalho desponta no mercado. Com os


homens adultos recrutados para os frontes de batalha e a já existência de leis que
coibiam o trabalho infantil, as mulheres passaram a assumir os postos de trabalho.
Porém, não sem impactos consideráveis para a organização do trabalho, uma vez que
traziam consigo novas demandas (ex.: a licença-maternidade com a manutenção do
emprego) e uma característica fundamental: a “dupla jornada”, com a acumulação do
trabalho externo e os afazeres domésticos que eram delas esperados por uma
sociedade que identificava a polis (a vida externa, pública) com o homem, e a oikos (a
vida interna, doméstica) com a mulher.

Durante esse período, o mundo também assistiu à organização dos


trabalhadores, com o desenvolvimento do sindicalismo e o de partidos e ideologias
voltados ao fortalecimento dos proletários nas estruturas laborais e sociais
estabelecidas, culminando com a Revolução Russa de 1917, a criação da União
Soviética e os seus impactos significantes na sociedade mundial.

Segunda metade:

A tecnologia produzida na primeira metade do século, voltada, a princípio, para


os esforços de guerra, foi, em um segundo momento, incorporada às fábricas. Isso
afetou, de um lado, positivamente, a produção e a qualidade dos produtos. Todavia, por
outro lado, expulsou mais trabalhadores das fábricas.
Com a mecanização do setor secundário, o foco do trabalho humano passou a
ser o setor terciário que, por sua vez, trazia novas e diferentes exigências, tais como: a)
uma maior diversificação dos produtos; b) consequentemente, uma maior necessidade
de qualificação da mão de obra; c) a diversificação de atividades e de perfis adequados.

A segunda metade do século XX também assistiu a desenvolvimentos


tecnológicos próprios, com destaque para a tecnologia da informação e comunicação
(TIC), com o advento dos computadores pessoais e da internet, que diminuiu a distância
não só entre os diversos países e regiões do mundo, mas também entre o trabalho e a
vida pessoal.
Com o declínio do positivismo científico, em especial após o desenvolvimento de
teorias relativistas e pós-positivistas, o mundo assistiu a um fortalecimento das ciências
ditas “humanas”, que trouxeram consigo a possibilidade de abordagem do ser humano
nas suas mais variadas dimensões, sem reducionismos e sem medo da confusão entre
o sujeito e o objeto do conhecimento.

Esse, portanto, foi o cenário em que puderam despontar novas abordagens sobre
o trabalho, especialmente em razão do surgimento de novas demandas que, cada vez
mais, ganham espaço e não conseguem ser tratadas, de forma satisfatória, pelo
paradigma dominante:

1. Utilização intensiva de uma tecnologia agora disponível, sob risco de perda


de competitividade das empresas. O fantasma da “desatualização” está sempre
presente.

2. Fragmentação e internacionalização das linhas de produção, com a


diminuição das distâncias e a diversidade de legislações e forças de trabalho,
levando a fenômenos tais como a terceirização e a externalização.

3. A demanda crescente por produtos cada vez mais diversificados e com alto
valor agregado, exigindo das empresas novas estruturas e configurações, e, dos
trabalhadores, maior qualificação e diferenciação.

4. Foco nos resultados, em especial de médio e longo prazo, com exigências de


efetividade, e não mais só de eficiência.

5. Participação democrática nas tomadas de decisão, seguindo a linha das


demandas no pós-guerra, por autodeterminação dos povos e do fortalecimento
do modelo das democracias capitalistas ocidentais após a queda da União
Soviética.

6. Maior significação das tarefas e motivação dos trabalhadores não voltada


apenas ao aspecto financeiro, na medida em que se critica a desumanização do
trabalho e se defende o ser humano completo contra reduções do tipo homo
economicus.

7. Crescente repúdio às rígidas estruturas das relações de trabalho e demandas

maiores por diversidade e inclusão, na medida em que se sucedem as diversas


gerações laborais (geração baby boomers  geração “X”  geração “Y”
ou millenials  geração “Z ”  geração “alpha”...), fazendo com que
migremos do “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, para o “quero ser
o meu próprio chefe e trabalhar do meu jeito”, com o paralelo aumento da
familiaridade com a tecnologia.

8. Críticas crescentes ao modelo burocrático, com exigência do foco no cliente


e na prestação efetiva do serviço.

O trabalho e as relações de trabalho no Paradigma Contemporâneo

Para atender às novas demandas/questões/necessidades não abarcadas pela


abordagem do Paradigma Clássico, a construção de um Paradigma Contemporâneo a
tornar-se dominante deve passar pelas seguintes mudanças paradigmáticas das
abordagens do trabalho e de suas relações:

1. Com relação ao trabalho:

1.1. Jornada x Resultados

O Paradigma Clássico, no seu tratamento do tempo como variável fundamental


para o trabalho, no intuito de aumentar o controle e a mensuração, não consegue fazer
frente a uma demanda por maior efetividade das entregas e apresentação de resultados.
Como vimos no módulo anterior do curso, a “ditadura do relógio” leva à diminuição da
produtividade de trabalhadores com perfis que não se encaixam no padrão definido
pelo “horário comercial”, fazendo com que a Organização Internacional do Trabalho
recomendasse a adoção de jornadas flexíveis.

Nesse sentido, exigências de “trabalhe mais”, o que, muitas vezes, significava se


perder nos meandros burocráticos das tarefas (entendendo os procedimentos como um
fim em si mesmos), são paulatinamente substituídas por exigências de “trabalhe
melhor”, caracterizadas pela efetiva satisfação das finalidades buscadas com aquele
produto.

Resultados, portanto, distinguem-se de produção, indo além desta última.


Como vimos, a produção era uma questão de extrema importância para o Paradigma
Clássico, surgido em um contexto de alta demanda por produtos industrializados,
apenas na dimensão quantitativa, característica de uma sociedade em início de
urbanização e com foco no setor secundário.

Por sua vez, o Paradigma Contemporâneo enfrenta uma demanda mais


qualificada, característica de sociedades mais complexas, com foco no setor terciário:
não importa só a oferta do produto em si, mas o que o diferencia e as necessidades a
que atende (foco no cliente), ou seja, a sua qualidade.

Nesse sentido, enquanto o foco da produção é aquele que produz e, portanto, a


questão da eficiência (aumentar entregas diminuindo custos) possui importância crucial,
o foco dos resultados é aquele que recebe e, portanto, a questão da eficácia
(atendimento às finalidades pretendidas) é fundamental.

Além disso, tomados dentro da realidade laboral, podemos dizer que o foco na
produção considera apenas as entregas individuais que são tomadas coletivamente
apenas em sua soma (entrega final - soma das entregas individuais). Por sua vez, o foco
nos resultados considera as entregas coletivas, definidas pela integração dos trabalhos
individuais voltados ao cumprimento das finalidades principais da organização.

Para isso, em uma cultura organizacional orientada a resultados, fundamental é


que todo o trabalho seja realizado com a visão da entrega final: ou seja, que haja
compartilhamento da identidade da empresa - o que ela faz, quem ela atende e aonde
ela quer chegar. Isso quer dizer que ao “o que” e ao “como” fazer deve ser adicionado
o “por que” fazer.

Em forma de anedota, um representante do Paradigma Contemporâneo poderia


questionar:

“De que adianta ocupar-se em limpar o convés de forma impecável em um navio


que está afundando?”

1.2. Fragmentação e especialização x visão do produto final

O “por que fazer”, do ponto de vista do trabalhador, remete à demanda


contemporânea por maior significação no trabalho, fazendo com que a cultura com foco
nos resultados exija a expansão da perspectiva do trabalhador, não mais entendido
como mero executor.

Verificou-se historicamente que a fragmentação e simplificação das tarefas do


Paradigma Clássico acabam por gerar fadiga e desmotivação do trabalhador, que passa
a se integrar apenas à tarefa, e não à missão da organização como um todo, e, com
isso, não consegue contribuir com a melhoria dos resultados da organização, os quais
se tornam algo distante do seu trabalho.

Ora, vimos que, no Paradigma Contemporâneo, a familiaridade de todos com as


finalidades principais da organização é fundamental para a entrega de resultados e, por
consequência, para o atendimento às demandas contemporâneas. Nesse contexto, a
especialização pode até continuar existindo como estratégia válida para aumentar a
celeridade e a qualidade da entrega, desde que não importe na desqualificação do
trabalhador. Para isso, a especialização deve se dar não pela divisão de tarefas simples
e sem sentido, mas por meio do aproveitamento de forças identificadas e integradas, a
partir do vislumbre contínuo da prestação final, que deve direcionar todo o fazer.

1.3. Padronização x diversidade

A demanda por produtos cada vez mais diversificados exige um processo de


constante inovação por parte das empresas e organizações. Tal processo, por sua vez,
exige mudanças:

 Na concepção do trabalhador: não mais como um executor não pensante, a


longa manus do gestor (este, na primeira figura, caracterizado como o único
indivíduo “colorido”), mas, sim, como um ser humano, capaz e pensante, com
perfis diferentes que podem levar a abordagens diversas e mais efetivas dos
problemas laborais, desde que bem aproveitados e integrados.

 No tratamento do ambiente de trabalho: com a diminuição do foco no controle


e na equalização, largando de vez a cultura medieval da infantilização do
trabalhador, para o estímulo à colaboração e ao desenvolvimento de talentos,
aceitando a diversidade e entendendo a interação entre perfis e experiências
como uma fonte fundamental de inovações.
2. Com relação ao trabalhador:

2.1. Motivação financeira x Valorização - a questão do mérito

A palavra “mérito” aparece, não raras as vezes, como um tabu no mundo do


trabalho, em especial na Administração Pública. Entre as causas desse estranhamento,
podemos sugerir o problema criado no Paradigma Clássico da transformação do
ambiente de trabalho em uma luta de desempenho em busca dos incentivos financeiros
e da escalada na carreira.

Outro fator, mais forte no serviço público, é a busca incessante pela isonomia no
tratamento, a fim de não caracterizar favoritismos familiares ou políticos.

Entretanto, para lidar com demandas por resultados e por significação e


motivação para o trabalho, a ideia de mérito deve ser recuperada, todavia, em uma nova
abordagem.

O mérito no Paradigma Clássico relaciona-se a um prêmio/estímulo individual,


considerando a performance do trabalhador mensurada a partir de critérios de eficiência.
Tal estímulo é sempre financeiro, uma vez que o pressuposto daquele paradigma é o
homo economicus.

Por sua vez, o mérito no Paradigma Contemporâneo deve extrapolar o indivíduo


e os incentivos financeiros, tomando o ser humano em sua completude e considerando
os aspectos sociais do trabalho. Num mundo de oportunidades e produtos
diversificados, ninguém vai trabalhar apenas motivado pelo salário, mas incorpora
aquele fazer à sua vida e à sua identidade na sociedade.

“Com o que você trabalha?” - Não é uma das primeiras perguntas que fazemos
quando conhecemos uma pessoa?

Mérito, nesse contexto, deixa de ser uma característica pessoal para ganhar
contornos relacionais, vinculados à ideia de legitimidade.

A afirmação “eu tenho mérito” perde espaço para afirmações do tipo “ele tem
mérito”, uma vez que a ideia passa a identificar o processo de reconhecimento e
valorização do trabalhador como contribuinte fundamental para os resultados do setor
e da organização, seja pela identificação de perfis e forças significantes, seja pela
cooperação e ajuda indispensáveis. Ademais, identifica também o estabelecimento de
um relacionamento de confiança, com a construção de previsibilidades
comportamentais essenciais para o desenvolvimento saudável das atividades laborais.

Na sua unidade, há pessoas com mérito em tal sentido relacional - pessoas


reconhecidas por sua contribuição fundamental para o trabalho realizado? O
setor ou área desenvolve algum mecanismo de incentivo a esses
comportamentos?

Ademais, percebendo o ser humano como um ser multidimensional, o mérito


reconhecido no sentido de um Paradigma Contemporâneo não pode ser recompensado
com incentivos apenas financeiros. De fato, mecanismos como a valorização de
conhecimentos e experiências de trabalhadores veteranos, a indicação/referência para
a assunção de cargos de confiança ou mesmo a integração de servidores nas tomadas
de decisões fundamentais para o trabalho passam a ser tão ou mais efetivos que o
aumento salarial em si.

A importância da abordagem relacional do mérito se verifica nos benefícios não


só individuais, mas também sociais dos mecanismos de recompensas de tais
indivíduos, na medida em que geram estímulos e sensação de justiça para os demais
trabalhadores da unidade.

2.2. Treinamento x Desenvolvimento de competências laborais

O Paradigma Clássico, desenvolvido para tratar um cenário industrial de


empirismo e improvisação dos trabalhadores, provenientes do trabalho artesanal,
trabalha com a fragmentação e simplificação das tarefas para a criação de padrões a
serem adotados por qualquer pessoa. Nesse sentido, o trabalhador é valorizado quanto
menor a sua bagagem de conhecimentos e experiências prévias, que atrapalhariam a
internalização dos padrões de trabalho concebidos. O treinamento, nesse contexto,
volta-se ao aprendizado de “o que” e “como” fazer. Ensinam-se, portanto, as tarefas ou
os padrões esperados de comportamento.

Por sua vez, como vimos anteriormente, o Paradigma Contemporâneo nasce de


demandas de um mundo laboral focado no terceiro setor, com suas exigências de
constante qualificação, diversificação e inovação. Nesse sentido, a capacitação laboral
dos trabalhadores não pode ser vista meramente como treinamento/orientação para a
execução de padrões, mas como o desenvolvimento de competências para lidar com a
realidade laboral.

Tais competências se referem à capacidade de mobilização de conhecimentos,


experiências, habilidades, comportamentos e atitudes em direção à resolução de
problemas e à produção de resultados para a organização, que, por sua vez, reconhece
a bagagem e estimula a formação e o desenvolvimento contínuo de seus trabalhadores,
aumentando a sua integração e valorização no trabalho.

3. Com relação à estrutura das relações laborais:

3.1. Verticalismo x Horizontalismo/Transversalismo

O Paradigma Clássico, considerando seus objetivos de controle e


direcionamento para evitar a dispersão e o desperdício de tempo, trabalha com uma
estrutura hierárquica rígida nas relações de trabalho. A verticalização cria não só uma
cadeia rígida para as tomadas de decisões, como também afeta o panorama de cada
degrau da cadeia.

Nesse sentido, quanto mais alto se escala a cadeia de comando e decisão, mais
abrangente a visão do agente e, com isso, maior a sua responsabilidade. Entretanto, o
contrário também é verdadeiro: ao descer a escala, vemos diminuir, na mesma
proporção, a visão e a responsabilidade dos agentes.

Ora, quanto menor a visão e a responsabilidade de um agente, mais distante ele


estará dos fins perseguidos pela organização, perdendo-se no trabalho burocrático, que
vê nos procedimentos o seu próprio fim.
Em um contexto de demanda por resultados, a internalização e a colaboração de
todos com relação ao produto final da empresa e ao atendimento de seus clientes
tornam-se fundamentais. Por isso, a rígida verticalização deve ceder espaço para
cadeias horizontais e transversais, em que vigem a cooperação, a autonomia e o
consequente compartilhamento e solidarização da responsabilidade.

Horizontal é a cadeia de comando e decisões compartilhadas, em que cada


colaborador goza de autonomia e assume responsabilidades.

Transversal é a atuação conjunta e não hierárquica, que não se limita a fronteiras


setoriais ou de matérias e se volta à solução de questões complexas e
multidimensionais.

Em um contexto vertical em formato de pirâmide, quanto menor a


quantidade de pessoas, maior a exigência de tomadas de decisões. Em
um contexto de inovação e dinamismo, tais gargalos são viáveis?

Quantas vezes você, como cliente, não se zangou com conversas do


tipo:

“Desculpe-me, essa questão deve ser verificada com o meu superior.”

“Tudo bem, então eu poderia falar com ele?”

“Desculpe-me, mas o meu superior não se encontra no momento.”

Nesse contexto, surge a figura da equipe: uma cadeia de cooperação em que as


diferenças não são necessariamente hierárquicas, para fins de tomada de decisão e de
responsabilização, mas se relacionam às funções/papel de cada colaborador com
relação à entrega do grupo como um todo. Em uma equipe, cada colaborador possui a
visão do todo, age com autonomia e compartilha da responsabilidade total, na medida
de sua função. Sendo assim, os perfis e forças se integram em benefício dos resultados
para a organização e visando à satisfação dos clientes.
3.2. Gestão: Chefia x Liderança

No Paradigma Clássico, vimos que o gestor assume um papel de “sujeito do


conhecimento”, gerindo a tarefa (o experimento científico) e tratando funcionário (o
“objeto do conhecimento”) como um mero executor de seus desígnios.

Em que pese a geração de algum resultado em um contexto de motivação


simplesmente financeira e de uma cultura da infantilização e do “manda quem pode,
obedece quem tem juízo”, essa modalidade de gestão perde completamente a
efetividade em um contexto de diversidade, inovação, foco nos resultados e quando se
trabalha com gerações que crescentemente repudiam ordens desvinculadas de um fim
compartilhado.

Ora, num contexto como esse, o Paradigma Contemporâneo deve retomar uma
figura originária de esferas militares e políticas: o líder.

Por mais desgastada que esteja a palavra liderança, com tanta discussão e
cursos sobre o assunto na atualidade, podemos identificar alguns aspectos e
considerações fundamentais:

 A palavra liderar vem do verbo inglês to lead (do inglês arcaico lǣdan),
significando “ir na frente, iniciar, guiar, conduzir”. Não há, portanto, liderança sem
pensarmos em estruturas com características mais horizontais que verticais, uma
vez que pressupõe atuações paritárias do gestor.
 Liderar é uma atuação voltada às pessoas. Não se lidera tarefas. O gestor-
chefe gere tarefas, utilizando os funcionários como a sua longa manus. O gestor-
líder gere pessoas, visando criar as condições adequadas para a atuação
cooperativa nas tarefas e para o realce de perfis e forças, com foco nos
resultados finais.
 Liderança não se confunde com autoridade, conferida pelo cargo ocupado em
uma cadeia hierárquica. A liderança, portanto, não é prerrogativa apenas do
gestor. Entretanto, a gestão adequada em um contexto de trabalho em equipe e
cadeias horizontais deve, com certeza, passar pela escolha e a assunção da
função de liderar.
 Não há líder sem liderados. A liderança possui um aspecto relacional
fundamental, na medida em que depende do reconhecimento e legitimidade
conferidos pelos liderados. Envolve, portanto, a construção de uma relação de
confiança. Sem ela, o papel do líder é esvaziado e, muitas vezes, acaba sendo
assumido por outra pessoa do grupo, não necessariamente no cargo de gestor.

3.3. Conflito x Cooperação

Vimos, no Paradigma Clássico, que uma das preocupações de seus principais


expoentes conceituais - Taylor e Ford - era com um contexto de crescente embate entre
patrões e empregados, fomentado por condições de trabalho sub-humanas e ausência
de mecanismos de incentivo.
Entretanto, também vimos que, mesmo com tal preocupação e com os avanços
consideráveis nas condições e remunerações do trabalho, o Paradigma Clássico não
conseguiu frear o crescimento do conflito, que se fortalecia na medida em que os
empregadores, de um lado, não repassavam aos trabalhadores os retornos alcançados
com o aumento da produção e da eficiência do trabalho; e, de outro, os trabalhadores
buscavam aumentar seu poder de barganha, por meio de agrupamentos transversais,
que extrapolaram os limites da fábrica e adquiriram, no decorrer do século XX, contornos
políticos fundamentais.

Uma tentativa de explicar tal fenômeno seria argumentar que o Paradigma


Clássico não superou os contornos históricos das relações de trabalho nas sociedades
ocidentais, herança de culturas em que o trabalho era realizado principalmente no
regime de escravidão ou servidão. Nesse contexto, as relações de trabalho aparecem
como relações conflitivas e de busca por dominância, em que uma parte, que detém
menor poder de barganha, se submete à outra parte.

Ademais, mesmo que se empenhe na criação de mecanismos que equilibrem tal


balança de poder, o máximo que se obtém é um impasse: um jogo de soma zero, em
que a melhora para uma das partes implica necessariamente a piora para a outra,
fazendo com que, por anulação, não haja ganhos para a relação em si, vista de um
ângulo geral (1 + (-1) = 0).

O Paradigma Clássico, além de não superar tal abordagem, acabou por


fortalecê-la, ao: a) reduzir os agentes da relação de trabalho ao homo economicus, que
visa maximizar seus próprios interesses ao menor custo/esforço possível; b) importar,
do positivismo científico, a dicotomia incontornável entre sujeito (agente) e objeto
(paciente) da atividade; c) estruturar as relações de trabalho em hierarquia rígida; e c)
vincular mérito ao desempenho pessoal, com incentivos financeiros que, na prática,
criaram um ambiente de competição e sobrevivência.

Basta utilizar a Teoria dos Jogos e o Equilíbrio de Nash para mostrar que o
resultado não poderia ser outro: uma situação de ganhar-perder (jogo de soma zero).

Para ilustrar, vamos criar uma matriz simples, imaginando a seguinte situação:

 De um lado, um empregador, que quer aumentar o lucro a baixos custos,


submete-se a um dilema: dar (como incentivo) algum retorno financeiro (ou não)
ao empregado ou não conferir tal retorno, apenas exigindo a entrega.
 De outro, um empregado, que quer garantir os seus benefícios individuais
(financeiros ou não) ao mínimo esforço possível, submete-se a outro dilema:
produzir bastante ou não.
 Ambos os “jogadores” podem tomar decisões livremente (nenhum tem poder
sobre o outro) e, a princípio, podem ir trocando de decisões até estarem
satisfeitos.

Quatro cenários, então, se desenvolvem:

1º cenário: O empregador escolhe não dar incentivo além do salário fixo


(retenção de benefícios), e o empregado, por sua vez, escolhe não produzir mais
do que o mínimo possível (“soldadização”).
2º cenário: O empregador escolhe dar um incentivo para o aumento da
produção, e o empregado aceita o desafio e maximiza a sua produção.
3º cenário: O empregado escolhe aumentar a sua produção, para garantir um
incentivo, mas o empregador escolhe não conceder o retorno, o que faz com que
o trabalhador tenha mais esforços que benefícios.
4º cenário: O empregador adianta o incentivo, mas o empregado escolhe manter
sua produção baixa, o que aumenta os custos do empregador sem qualquer
benefício a mais.

Entendendo que:

 3= maior benefício individual com menor esforço/custo envolvido.


 2= alto benefício individual, porém com aumento de esforço/custo.
 1 = baixo benefício individual, porém com baixo esforço/custo.
 0 = nenhum benefício individual com alto esforço/custo.

Vamos montar a seguinte matriz de escolhas (células cinza) e respectivos


resultados (células verdes):
Empregado

X Y
Produz pouco Produz muito
Empregador

A
Não incentiva 1 /1 3/ 0

B
Incentiva 0/3 2/ 2
Utilizando a teoria de Nash, essa matriz possui uma situação de equilíbrio: AX,
ou seja, quando o empregador não incentiva e o empregado não produz bem, resultando
em um retorno baixo (1) para cada uma das partes. Isso ocorre, pois, em um cenário em
que os agentes possuem total liberdade de trocar suas ações a partir da ação do outro,
as outras situações são todas instáveis. Senão vejamos:

 Se o empregador incentiva e o empregado aumenta a produção (BY), ambos


os agentes (lembre-se que cada um é um homus economicus) terão maior
incentivo para quebrar o compromisso, visando alcançar maior benefício
individual (pois, 3 > 2);
 Se o empregador quebrar o acordo primeiro, não concedendo o incentivo à
produção aumentada, a situação vai para AY, que, por sua vez, vai acabar caindo
em AX quando o empregado, não querendo ser prejudicado, diminui a sua
produção novamente (pois, 1 > 0);
 Se o empregado quebrar o acordo primeiro, diminuindo a sua produção sem
abrir mão do incentivo, a situação vai para BX, e, em seguida, para AX também,
na medida que o empregador não vai manter o custo do incentivo sem receber
uma maior produção como contrapartida (1 > 0).
 Na situação AX, nenhum agente possui estímulo para trocar de escolha,
considerando que a outra parte permaneça no comportamento mais egoístico,
uma vez que isso significaria uma diminuição nos benefícios individuais (pois, 0
< 1).

Agora, mudando um pouco o cenário, imagine que os participantes desse jogo,


ainda livres e sabendo que cada um é um homo economicus, tenham que tomar uma
única decisão (A ou B; X ou Y) ao mesmo tempo (como se fosse em um “par ou ímpar”).
Qual decisão você acha que tomariam?

Novamente, o mais provável é que tomassem a decisão AX, levando ao impasse


- a infeliz situação de equilíbrio desse jogo.

Mas, agora reflita: qual seria a melhor situação para ambos tomados em conjunto
(ou seja, para a relação de trabalho em si)?

Não seria a BY, com a possibilidade de ambos saírem com altos benefícios?

Então, como chegaríamos e nos manteríamos nesse resultado tão instável a


princípio?

Vejamos um trecho do filme “Uma mente brilhante”, que conta a história de John
Nash e sugere, de forma romantizada, uma solução para a questão:

Clique na imagem acima para seguir para o vídeo da apresentação, que será aberta
em uma página no ambiente virtual do curso.

“O melhor resultado é obtido quando todos do grupo fazem o que é melhor para
si e para o grupo” – ou seja, quando há cooperação.

Portanto, para que haja cooperação, cada agente deve abrir mão de um alto
resultado individual para alcançar um resultado individual favorável cumulado com um
resultado coletivo favorável. Dessa maneira, agindo em conjunto, os agentes criam uma
situação de ganhar-ganhar (jogo de soma não zero).

Mas cooperar exige a existência de 3 aspectos principais:


1) Agentes que possuam autonomia – ou seja, que possam estabelecer
regras e compromissos para si próprios e assumir a responsabilidade pelas suas
ações.
2) Relação que se baseie na confiança – ou seja, a previsibilidade com
relação ao comportamento alheio e a segurança quanto à manutenção de
compromissos firmados.
3) Uma sensação mútua de compartilhamento de interesses, na medida
em que ambas as partes identificam e visualizam um “bem comum” e
reconhecem a significância da atuação de cada uma para o alcance daquele
interesse.

Ora, mas esses são aspectos eivados daquela “marca humana” tão odiosa a
olhos positivistas, refugiados no mundo maravilhoso da matemática e dos axiomas. Para
buscar tais aspectos, devemos abrir mão do controle da variável “homem” e aceitaro seu
mundo multidimensional e, com isso, toda a carga de imprevisibilidade que acompanha
tal constatação.

É, sobretudo, “conceder o benefício da dúvida”, tratando a todos da relação


laboral como adultos responsáveis.

E não é isso que o Paradigma Contemporâneo defende?

O teletrabalho no paradigma adequado

O teletrabalho, tal como preconizado na regulamentação que o institui como


regime de trabalho possível no Poder Judiciário, aparece precisamente como um
mecanismo para estabelecer um cenário de ganhar-ganhar na relação laboral:

 De um lado, o servidor ganha:


o Qualidade de vida, em especial com a preservação da relação familiar.
o Reconhecimento de sua diversidade (adequação a perfis diversos) e
da importância de sua efetiva inclusão e integração ao trabalho.
o Mérito, enquanto reconhecimento de suas forças e de seu valor para
o trabalho e os resultados da organização.
o Motivação, com a significância do seu fazer, o estímulo à criatividade
e à inovação e o reconhecimento de seu mérito.
o Economia de tempo, custos, esforços.

 De outro lado, o Tribunal ganha:


o Melhoria de seus resultados e a construção de uma cultura
organizacional voltada a esses.
o Alcance da efetividade (eficiência e eficácia) na prestação à
sociedade.
o Melhoria na produtividade e na qualidade do trabalho realizado.
o Melhoria na alocação de seus recursos.
o Economia de custos e melhoria de programas socioambientais.

Como tentamos demonstrar neste módulo, o estabelecimento de tal “jogo de


soma não zero” só é possível dentro do que denominamos Paradigma Contemporâneo
– um conjunto de entendimentos e práticas sobre a organização do trabalho e as
estruturas das relações laborais que devem permear a implantação do teletrabalho no
Tribunal.
Argumentamos, ainda, que a legislação aplicável (Resolução do CNJ nº 227/2016) confere ao
teletrabalho todas as ferramentas para a sua implantação adequada. Vejamos algumas:

 O teletrabalho é um regime excepcional e facultativo tanto para o servidor


quanto para o Tribunal, garantindo, com isso, a liberdade necessária para não se
estabelecer a dominância de uma parte sobre outra no “jogo de ganhar- ganhar”.
 A definição do teletrabalhador é realizada por meio da conjugação do
interesse do servidor com a indicação pelo gestor imediato, por meio da
identificação de perfis. Quais são os principais? Sim, aqueles que garantem o
estabelecimento da relação de cooperação:
o Autonomia - em especial quando a norma fala em “habilidades de
autogerenciamento”, na responsabilidade do servidor quanto à sua própria
estrutura de trabalho e no estabelecimento conjunto com o gestor (por
consenso) do Plano de Trabalho e das metas de desempenho.
o Confiança - quando a norma fala em servidores que “demonstrem
comprometimento” e estabelece compromissos tais como o Plano de
Trabalho Individual e a declaração de cumprimento dos requisitos para a
realização do trabalho em casa como complementos da norma geral.
 A indicação e o acompanhamento do teletrabalho são realizados in loco, com
a atuação primordial do gestor, mantendo a possibilidade de convívio,
cooperação e integração do teletrabalhador com o restante da equipe, que
realiza o trabalho presencial.
 O teletrabalho deve ser implementado tendo como objetivos: “promover a
cultura orientada a resultados, com foco no incremento da eficiência e efetividade
dos serviços prestados à sociedade”; “promover mecanismos para atrair
servidores, motivá-los e comprometê-los com os objetivos da instituição”,
“estimular o desenvolvimento de talentos, o trabalho criativo e a inovação” e
“respeitar a diversidade dos servidores”.
 A legislação não estabelece padrões de procedimentos, deixando a cargo do
Plano de Trabalho individual, estabelecido conjuntamente entre o gestor e o
teletrabalhador e que constitui requisito para o início dos trabalhos. Nesse
sentido, também respeita a diversidade de perfis, respeito esse que é reforçado
com a independência do tempo (jornada), substituída pelo alcance de metas de
desempenho conjuntamente estabelecidas, e com a possibilidade de
flexibilidade total de horários, de acordo com o plano estabelecido.

Nesse sentido, fica clara a vinculação do teletrabalho, implantado nos termos da


legislação aplicável, ao que chamamos de Paradigma Contemporâneo, sendo suas
características principais:

Aumento de produtividade e foco nos resultados.

Aumento da qualidade de vida (incentivo não financeiro).

Flexibilidade de horários/independência do tempo.

Autonomia/responsabilidade.
Confiança/legitimidade (mérito).

Trabalho em equipe/cooperação.

Respeito à diversidade/estímulo à inovação.

Utilização intensiva da tecnologia disponível.

O teletrabalho como ferramenta de gestão de pessoas

No módulo anterior (“Provocações”), desafiamos um errôneo e comum


entendimento do teletrabalho como ferramenta de aumento da produção do
servidor/unidade, mostrando até mesmo alguns perigos práticos de tal concepção –
como a geração de gargalos nas etapas posteriores da cadeia de produção do Tribunal.

No presente módulo, verificamos que tal entendimento tem origem em um


paradigma dominante relativo ao trabalho e suas relações, que denominamos de
Paradigma Clássico. Desnaturalizamos tal paradigma e apresentamos uma outra
alternativa, que chamamos de Paradigma Contemporâneo, mais alinhado às atuais
demandas da realidade.

Por fim, demonstramos que a devida implantação do teletrabalho exige a


incorporação de concepções e entendimentos desse novo paradigma, aparecendo o
novo regime de trabalho como um mecanismo para o estabelecimento de relações
cooperativas com resultados “ganhar-ganhar”.

Nesse sentido, diferentemente do errôneo entendimento que combatemos no


módulo anterior, advindo do foco na gestão de tarefas, o que é característico do
Paradigma Clássico, o teletrabalho, no âmbito do Paradigma Contemporâneo, deve ser
visto como uma ferramenta de gestão de pessoas.
Com efeito, a Resolução do CNJ nº 240/2016, que dispõe sobre a Política
Nacional de Gestão de Pessoas no âmbito do Poder Judiciário, assim conceitua o
instituto:

Art. 2º [...]

I - gestão de pessoas: conjunto de políticas, métodos e práticas de


uma organização, voltados a propiciar condições para que os
trabalhadores de uma instituição possam desenvolver o seu
trabalho, favorecendo o desenvolvimento profissional, a relação
interpessoal, a saúde e a cooperação, com vistas ao alcance
efetivo dos seus objetivos estratégicos; [...].

Em resumo, uma ferramenta de gestão de pessoas é voltada diretamente às


pessoas da organização (seu foco imediato), com políticas e práticas voltadas ao seu
desenvolvimento, valorização, cooperação e participação; enquanto que, indiretamente,
se volta aos objetivos e resultados da organização (seu foco mediato).

Veja bem que falamos de “pessoas”, e não de “recursos humanos” ou de “mão


de obra”. Isso, pois as demandas da atualidade e situações do tipo “ganhar-ganhar” só
podem ser alcançadas com o tratamento do ser humano (em especial, o trabalhador)
como tal: uma pessoa em suas mais diversas dimensões.

Com base no presente estudo e na experiência obtida no Projeto Experimental,


podemos nos arriscar a dizer que o teletrabalho divorciado da gestão de pessoas está
fadado ao fracasso. Podemos, por exemplo, identificar algumas questões:

 Indicações sem a devida análise de perfis e identificação de forças e sem o


reconhecimento de méritos legitimados (como, por exemplo, teletrabalhadores
“forçados” ao gestor ou ao setor) podem levar ao descontentamento e à
desmotivação dos demais servidores do setor, prejudicando os resultados
esperados no curto, médio e longo prazos.
 Indicações visando ao aumento da produção individual ou mesmo para isolar
“servidores-problema” podem levar ao desalinhamento e à desintegração do
trabalho realizado a distância com relação ao trabalho presencial, podendo
prejudicar os resultados da unidade e a sua devida atuação na cadeia de
produção da área e do Tribunal. Lembrando que outros mecanismos de gestão
de pessoas, tais como as avaliações de desempenho, são mais indicados para
o tratamento de tais casos.
 Tentar transformar o teletrabalho em uma situação de “ganhar-perder” (jogo
de soma zero) ao, por exemplo, forçar metas de desempenho desproporcionais
como “pagamento” pela indicação, pode condenar o teletrabalhador a uma
situação pior, levando-o à desistência do regime e perdendo-se a oportunidade
de aumentar os benefícios para ambas as partes (volta ao equilíbrio em uma
situação não ótima).
 Do lado do servidor, entender o teletrabalho como direito ou simples
atendimento a uma necessidade individual de ficar em casa ou próximo da
família, sem a devida análise de perfil ou do comprometimento com os resultados
da unidade e da instituição, pode levar à incapacidade de atender às metas
estabelecidas, à criação de maiores problemas para o setor e para o gestor e à
quebra das relações de confiança com os demais servidores. Lembrando que
tais necessidades podem ser atendidas com outras soluções, tais como o gozo
de licenças e outros afastamentos regulamentares.
 Tentar estabelecer padrões fixos e genéricos para o teletrabalho em uma área
ou na instituição como um todo pode frustrar o respeito à diversidade, que, por
sua vez, tem sentido prático na medida em que é o verdadeiro responsável pelo
aumento da produtividade e da qualidade do trabalho, como vimos na
recomendação da OIT, estudada no módulo anterior, bem como pela
oportunidade de trabalho criativo e de desenvolvimento de novas soluções para
as questões laborais do setor.

Por sua vez, entender o teletrabalho como ferramenta de gestão de pessoas,


utilizando-o de forma adequada, pode gerar oportunidades para:

 A integração de toda a unidade ao novo paradigma de organização e relação


do trabalho, com todos os benefícios vinculados.
 A melhoria do ambiente de trabalho, com a construção de círculos de
confiança que permitem o foco das atenções no trabalho em si, evitando o
estresse mental e os desperdícios de tempo e de esforços.
 A retenção e a revelação de talentos, bem como a melhoria na organização
e divisão dos trabalhos e no aproveitamento das forças identificadas.
 A construção de círculos virtuosos de motivação e valorização, incentivando
comportamentos cooperativos e desestimulando comportamentos egoísticos e
“caroneiros” (free riders). Lembrando, como veremos mais adiante no curso, que
o teletrabalho pode ser realizado em regime de revezamento.
 A desconcentração das tomadas de decisões, seja pelo estímulo à autonomia
e à consequente assunção de responsabilidades, seja pelo desenvolvimento da
visão ampla dos teletrabalhadores, que, muitas vezes, atuam como verdadeiros
“sub-chefes a distância”, desafogando gestores e setores.
 A construção de “novas soluções para velhos problemas”, muitas vezes,
gerados pela própria natureza do trabalho presencial em jornadas fixas. Uma
dessas soluções passa pela possibilidade de o teletrabalhador atuar fora dos
picos de tráfico dos sistemas informatizados, comuns durante o expediente
presencial.
 A criação de verdadeiras forças-tarefas, ao, por exemplo, concentrar no
teletrabalho as atividades que exigem um grau de concentração incompatível
com a rotina de interrupções do trabalho presencial ou aquelas de natureza mais
complexa ou que exigem estudos mais aprofundados.
 A manutenção da capacidade operacional de unidades em localidades
remotas, de difícil acesso ou de pouco interesse de lotação (tal como utilizado
em experiências no Tribunal de Justiça do Amazonas), bem como em situações
tais como a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional - ESPIN, que
exigiu medidas de isolamento social para o enfrentamento da propagação da
infecção pelo novo coronavírus.

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