No exercício de suas missões constitucionais, que dizem respeito à
preservação e ao restabelecimento da ordem pública, a Polícia Militar do Ceará (PMCE) atua orientada por alguns princípios elementares, dentre os quais podemos destacar o uso moderado e proporcional da força, a qualificação especial para a gestão de conflitos e o zelo pelo estado democrático de direito, pela cidadania e pelos direitos e garantias fundamentais (CEARÁ, 2012, p. 1). Como órgão de execução programática da PMCE, a unidade de policiamento de choque, denominada atualmente Comando de Policiamento de Choque (CPCHOQUE), caracteriza-se essencialmente por sua capacidade superior de intervenção operacional, decorrente de fatores organizacionais como doutrina, treinamento e equipamentos específicos, destinados ao emprego em circunstâncias extraordinárias, como os distúrbios civis, que exigem a mobilização de recursos humanos e materiais excepcionais, estando desse modo apta ao enfrentamento de situações mais graves de violência e anormalidade social (CEARÁ, 2019, p. 5). Nesse contexto de excepcionalidade, no qual estão inseridas as manifestações públicas reivindicatórias, a aglomeração de pessoas em torno de um objetivo comum, combinada com as características comportamentais típicas das multidões, têm o potencial de gerar graves perturbações da ordem pública, com reflexo na fruição de direitos por parte dos cidadãos que não estejam envolvidos direta e voluntariamente no evento. Nos cenários de exacerbação no exercício do direito à manifestação pública por parte de um grupo numeroso de cidadãos, as intervenções da tropa de choque resultarão inevitavelmente em uso de força física visando ao cumprimento da lei e ao restabelecimento da ordem. Contudo, em havendo margem para a supressão ou a mitigação do emprego da força, a opção da polícia pelo uso de ferramentas alternativas de resolução de controvérsias, como a mediação, tem o potencial de prevenir o acirramento de ânimos e levar as partes a uma composição pacífica de posições, contribuindo para a compreensão mútua e, consequentemente, permitindo o pleno exercício daqueles direitos difusos que inicialmente se mostravam colidentes, resultado que fortalece o papel essencial da Instituição como garantidora dos direitos de cidadania. Dessas suposições, extraem-se os seguintes questionamentos: 1. Há evidências empíricas de que o emprego de técnicas e estratégias de mediação de conflitos contribuem para a manutenção de um ambiente civilmente estável no contexto das manifestações públicas reivindicatórias, facilitando o entendimento entre as partes quanto ao exercício concomitante de direitos fundamentais ora colidentes e, consequentemente, promovendo a redução de danos pela máximo retardamento do recurso à ultima ratio? 2. Considerando a conjuntura atual do sistema estadual de segurança pública cearense, a institucionalização da mediação de conflitos como estratégia e ferramenta de intervenção por parte da tropa de choque da PMCE traria benefícios sociais relevantes?
2 JUSTIFICATIVA
Manifestações públicas reivindicatórias são uma constante na atual conjuntura
social brasileira, especialmente nas grandes cidades. A despeito das motivações – ideológicas, políticas, trabalhistas, religiosas – entidades ou lideranças independentes promovem com frequência atos em defesa das pretensões – legítimas ou não – daqueles que representam, normalmente em oposição a ações ou omissões do poder público, nas diversas esferas de governo. Por imposição da lei, a PMCE está inserida nesse contexto como órgão diretamente responsável pela preservação da ordem pública e pelo controle de eventuais distúrbios civis. Por óbvio, no cumprimento dessas missões, a Instituição tem sua atuação limitada por uma série de restrições de ordem legal e ética, notadamente em razão de seu compromisso objetivo com o respeito à cidadania, a preservação dos direitos individuais e coletivos e a natureza pacificadora da atividade policial, caracterizada pela promoção do desfecho menos gravoso para as situações de conflito que se apresentem. Nesse sentido, o aperfeiçoamento dos mecanismos de interação com a sociedade tem papel determinante na busca pela paz social. Apesar da ampla adesão institucional a esses compromissos, imposta inexoravelmente pelas normas e pelo contexto social vigente, os atuais protocolos para as intervenções em manifestações públicas reivindicatórias não preveem taxativamente o emprego de instrumentos de composição e solução pacífica de conflitos, embora seu uso empírico seja uma realidade facilmente observável. Portanto, há que se considerar a inadequação dessa prática, visto que a ausência
Conformação funcional em matéria de saúde: um panorama sobre os limites e potencialidades da participação judicial no desenvolvimento de políticas públicas para efetivação do direito constitucional