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FICHAMENTO

ARTIGO: SILVA, Virgílio Afonso da. Princípios e regras: mitos e equívocos acerca
de uma distinção. Revista Latino-Americana de Estudos Constitucionais, p. 607-
630, 2003.

O Autor do artigo científico, tece uma discussão entre duas espécies de


normas os princípios e regras e o conceito de norma , as quais são temas de várias
controvérsias. O seu ponto de partida foi a base teórica difundida por Robert Alexy
em sua teoria dos direitos fundamentais (p. 607 e 608).

1. Princípios e regras

A grande discussão entre a distinção de princípios e regras ganhou força as


obras de Ronald Dworkin e Robert Alexy. Eles são representantes da tese da
separação qualitativa entre regras e princípios, alegando que a distinção entre elas é
de caráter lógico. Porém a tese mais difundida no Brasil é que a distinção entre elas
é de grau (grau de generalidade, abstração ou de fundamentalidade). Porém para
alguns não há distinção entre regras e princípios (p. 609).

1.1. Ronald Dworkin

A teoria de Dworkin é uma crítica ao positivismo jurídico, o positivismo, ao


entender o direito como um sistema composto exclusivamente de regras, não
consegue fundamentar as decisões de casos complexos.
Ele defende que junto com as regas estão os princípios. Os princípios
diferente das regras que possuem apenas a dimensão da validade, possuem
também uma outra dimensão: o peso. Assim, quando há colisão entre princípios se
dá preferência aquele princípio que tiver maior peso (p. 610).
1.2. Robert Alexy
Alexy semelhantemente a Dworkin indaga que a distinção entre princípios e
regras é uma distinção qualitativa e não de grau. Onde desenvolveu a ideia de
princípios como mandamentos de otimização.
Conforme Alexy princípios são normas que estabelecem que algo deve ser
realizado na maior medida possível, diante das possibilidades fáticas e jurídicas
presentes, sendo chamados de mandamentos de otimização (p. 610).
Já para ele, as regras, expressam deveres e direitos definitivos. No caso dos
princípios, o grau de realização pode, variar (p. 610).

2. Um problema terminológico e tipológico

Para Robert Alexy, o conceito de princípio, é bastante diferente do conceito


de princípio tradicionalmente usado na literatura jurídica brasileira. Tradicionalmente
"Princípios" são, "mandamentos nucleares" ou "disposições fundamentais" de um
sistema, ou seja, princípios seriam as normas mais fundamentais do sistema,
enquanto que as regras costumam ser definidas como uma concretização desses
princípios (p. 612).
Porém, vários autores tentaram classificar os princípios constitucionais, como
Canotilho que fala de princípios jurídicos fundamentais, princípios políticos
constitucionalmente conformadores, princípios constitucionais impositivos e
princípios-garantia. José Afonso da Silva fala em princípios constitucionais
fundamentais e princípios constitucionais gerais Jorge Miranda, traz os princípios
axiológicos fundamentais, princípios político-constitucionais e princípios
constitucionais instrumentais e Luís Roberto Barroso que fala em princípios
fundamentais, princípios gerais e princípios setoriais (p. 612).
Já para Alexy, princípios é um conceito que nada diz sobre a
fundamentalidade da norma, podendo ser um "mandamento nuclear do sistema"
como também pode não ser (p. 613).
Desta forma, não há que se falar em classificação mais ou menos adequada
(p. 614).
Se se define "princípio" pela sua fundamentalidade, faz sentido falar-se em
princípio da legalidade ou em princípio do nulla poena sine lege. Caso, no entanto,
se prefira usar os critérios estabelecidos por Alexy é preciso cuidado ao se fazer
uma "tipologia de princípios", visto que elas, a despeito de sua fundamentalidade,
não poderiam mais ser consideradas como princípios, devendo ser incluídas na
categoria das regras (p. 614).
Assim, na teoria de Alexy, o conceito de princípio é axiologicamente neutro e
seu uso não expressa nenhuma opção por esta ou aquela disposição fundamental,
nem por este ou aquele tipo de constituição (p. 615).

3. Texto e norma

Para Humberto Ávila a diferença entre regras e princípios é simplesmente


uma diferença no grau de abstração, sendo os princípios mais abstratos do que as
regras, assim, para ele as regras não são aplicadas seguindo o modelo "tudo ou
nada", pois, tanto quanto os princípios, devem passar elas por um processo
interpretativo (p. 616).
Diante da diferença entre texto e norma, o argumento de Ávila perde força. A
diferença entre regras e princípios é uma distinção entre dois tipos de normas e não
entre dois tipos de textos, desta maneira tanto as regras, quanto os princípios
pressupõem uma interpretação prévia, porém não significa que ambos tenham a
mesma estrutura. Pode-se dizer que o sopesamento é característico dos princípios
(p. 617).

4. Deveres prima facie e deveres definitivos

Pode-se considerar como falsa tal pressuposto: Os princípios não possuem


uma hipótese e uma conseqüência abstratamente determinada; se não há
conseqüência determinada, não há como haver colisão (p. 618).
Porém , os princípios têm, sim, conseqüências abstratamente determinadas
(p. 618).

Para Ávila, a colisão é aparente porque o problema que surge na aplicação


dos princípios "reside muito mais em saber qual dos princípios será aplicado e qual a
relação que mantêm entre si (p. 618).
Este dilema é bem complexo devendo trazer a distinção entre deveres prima
facie e deveres definitivos.
Assim, diante das possibilidades do caso concreto, o dever pode não se
revelar um dever definitivo, realizável. No caso concreto, o dever definitivo é aquele
que é produto de uma ponderação ou sopesamento. A colisão entre ambos os
deveres, não é apenas aparente, mas real. Isso, contudo, não suaviza a colisão que
existe entre dois deveres prima facie (p. 619).
Desta forma, a característica que distingue princípios e regras não é a
existência de uma "conseqüência determinada" ou de "vagueza". A diferença é de
outra natureza: regras expressam deveres definitivos, enquanto princípios
expressam deveres prima facie (p. 620).

5. Mandamentos de otimização

Ávila rejeita a ideia de princípios como mandamentos de otimização, ele


sugere que as colisões entre princípios sejam classificadas em quatro categorias
distintas: a realização do fim instituído por um princípio leva à realização do fim
determinado pelo outro; a realização do fim instituído por um exclui a realização do
fim determinado pelo outro; a realização do fim instituído por um só leva à realização
de parte do fim determinado pelo outro; e a realização do fim instituído por um não
interfere na realização do fim buscado pelo outro (p. 620).
Pode-se observar que apenas a segunda configura uma colisão de princípios.
Nas outras três hipóteses, não há colisão, assim, se não há colisão entre princípios,
as condições jurídicas para a sua otimização são ideais e nada impede que eles
sejam realizados na máxima medida (p. 621).
Outra ponderação a ser vista é que no caso da primeira categoria, não se
pode dizer que o simples fato de que a realização de um princípio leve à realização
de outro implicaria, como diz Ávila, que o primeiro deva ser realizado apenas na
medida necessária à realização do fim instituído pelo segundo (p. 621).
Essa afirmação pressupõe não somente que o primeiro princípio exista
exclusivamente em função do segundo, mas, além disso, que o primeiro seja apenas
um instrumento para a realização do segundo (p. 621).

5.1 Colisão total de princípios


Ávila, afirma que a realização do fim instituído por um princípio exclui a
realização do fim determinado por outro, o problema só poderia ser solucionado com
a rejeição de um dos princípios. Porém, não há como sustentar tal argumento. No
caso de conflito total entre regras, uma delas, necessariamente, deverá ser
declarada inválida, já que ambas não podem conviver no mesmo sistema (p. 621 e
622)..

5.2 Realização "no todo" e realização "na máxima medida"

Ávila explana que "a diferença, entre regras e princípios, não está no fato de
que as regras devem ser aplicadas 'no todo' e os princípios só na 'máxima medida'
(p. 622).
Os princípios expressam deveres prima facie. Na aplicação concreta deles,
contudo, o dever definitivo poderá diferir do dever prima facie expressado pelos
princípios isoladamente considerados. Desta maneira o "conteúdo de dever-ser" dos
princípios continua sendo prima facie e, por isso, realizável em medidas diversas (p.
622).

6. A liberdade estrutural

Neste tópico o autor traz o pensamento de Ana Paula de Barcellos que indica
dois critérios suplementares para a distinção entre regras e princípios: o primeiro
relaciona-se à indeterminação de seus efeitos e o segundo refere-se à multiplicidade
de meios para atingi-los. O primeiro critério, se assemelha o que defende Ávila (p.
623).
A existência de vários meios para atingir o fim pretendido pela norma seria, é,
uma característica dos princípios, não sendo apenas uma característica dos
princípios, mas de qualquer norma que não imponha uma omissão, mas uma ação,
uma prestação ou o alcance de uma finalidade (p. 624).
Quase todas as normas de direitos fundamentais, impõem tanto uma omissão
quanto uma ação (p. 624).
Porém, a "multiplicidade de meios para atingir efeitos pretendidos", é,
portanto, uma característica apenas parcial dos princípios, ou seja, ela é somente
aplicável ao âmbito positivo deles, não estando presente no seu aspecto meramente
negativo, conhecido como "direito de defesa". Isso fica ainda mais claro nos casos
de direitos fundamentais que são precipuamente direitos de defesa. Assim, ainda
que se trate de um princípio, não há que se falar em "multiplicidade de meios para
atingir os efeitos pretendidos". Portanto, se essa característica não é uma
característica imprescindível dos princípios, não pode ela ser usada como critério
para distingui-los das regras (p. 625).

7. A teoria estruturante do direito e a distinção entre princípios e regras

O autor trouxe como conclusão , fenômeno que ela chama de "sincretismo


metodológico", que consiste na adoção de teorias incompatíveis, como se
compatíveis fossem. Como exemplo desse fenômeno, ele trouxe a recepção da
distinção entre regras e princípios e a recepção da chamada teoria estruturante do
direito. A distinção entre regras e princípios, tem como uma de suas principais
características exatamente a exigibilidade de sopesamento de princípios como forma
de aplicá-los (p. 625).
Desta forma ele colocou a seguinte indagação: Como explicar, porém, que
ambas as teorias, a despeito de serem incompatíveis, sejam defendidas, no Brasil,
como se complementares fossem? E sua resposta foi que a essas questões exige a
análise de outras manifestações do chamado "sincretismo metodológico" (p. 626).

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