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INSTITUTO CENECISTA DE ENSINO SUPERIOR DE SANTO ÂNGELO


DISCIPLINA: DIREITO CONSTITUCIONAL I
CURSO: CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS – DIREITO – 2º PERÍODO
PROFESSOR: ADRIANO NEDEL DOS SANTOS.
PONTO 5 – PRINCÍPIOS E VALORES CONSTITUCIONAIS

PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
1. NOÇÕES GERAIS (Dos princípios em geral):
a) Conceituação comum: Princípio, no vernáculo, conforme o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira:
[Do lat. principiu.]
S. m.
1. Momento ou local ou trecho em que algo tem origem; começo.
2. Causa primária.
3. Elemento predominante na constituição de um corpo orgânico.
4. Preceito, regra, lei.
5. P. ext. Base; germe: 2
6. E. Ling. Restrição geneticamente imposta a uma gramática (5). [ V. gramática universal e parâmetro (4). ]
7. Filos. Origem de algo, de uma ação ou de um conhecimento.
8. Lóg. Na dedução, a proposição que lhe serve de base, ainda que de modo provisório, e cuja verdade não é
questionada.
b) Evolução dos princípios e normatividade jurídica:
- Jusnaturalismo: Nesta fase do pensamento jurídico, os princípios são inspiradores de um ideal de justiça, cuja eficácia
se limita a uma dimensão ético-valorativa do direito. A normatividade dos princípios neste período é nula, devendo estes
servir para orientar o correto pensar. São um conjunto de verdades objetivas derivadas da lei divina e humana.
- Juspositivismo: Nesta fase, os princípios entram nos Códigos como fonte normativa subsidiária da inteireza dos textos
legais. Aqui, os princípios surgem para suprir as lacunas da lei, ou seja, são válvulas de segurança que garantem o reinado
absoluto da lei. Somente se invoca um princípio se houver lacuna nas leis.
-Pós-positivismo: Nesta fase (atual) os princípios conquistam a dignidade de normas vinculantes, vigentes eficazes, não
somente suprindo lacunas, mas impondo o dever-ser. Isto deve-se a sua inserção no âmbito do Direito Constitucional.
Princípios = Jusprivatismo Juspublicismo
Ver: artigo 4º da LICC C.F.
In claris cessat interpretatio Hermenêutica Constitucional
c) Princípios como normas: Os princípios, inicialmente, eram considerados como apartados das normas. A metodologia
jurídica tradicional distinguia os princípios das normas. Hoje, há a inserção dos princípios nas normas, ou seja, os
princípios são espécies de normas.1
“Seguidamente, não se contrapõem regra e princípio , e sim norma e princípio ou norma e máxima. Aqui as regras e os
princípios serão resumidos sobre o conceito de norma. Tanto as regras como os princípios são normas porque ambos
dizem o que deve ser. [...] Os princípios, do mesmo modo que as regras, são razões para juízos concretos de dever ser,
ainda quando sejam razões de um tipo muito diferente. A distinção entre regras e princípios é pois uma distinção entre
dois tipos de normas”. (ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. 1. ed. 3. reimpressão. Madrid : Centro
de Estudios Políticos y Constitucionales, 1997, p. 83)
d) Conceituação jurídica: “Princípios são normas que exigem a realização de algo, da melhor forma possível, de acordo
com as possibilidades fácticas e jurídicas. Os princípios não proíbem, permitem ou exigem algo em termos de «tudo ou
nada»; impõem a optimização de um direito ou de um bem jurídico, tendo em conta a «reserva do possível», fáctica ou
jurídica”. (CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Coimbra : Almedina,
2003, p. 1255)
“...os princípios são mandados de otimização (o conceito de mandado é aqui utilizado em um sentido amplo, que abarca
também permissões e proibições), que estão caracterizados pelo fato de que podem ser cumpridos em diferente grau e que

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A respeito deste tema, para uma leitura mais aprofundada, deixa-se aqui a sugestão da leitura dos autores: Robert Alexy e Ronald
Dworkin, bem como J.J. Gomes Canotilho e Jorge Miranda.
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a medida devida de seu cumprimento não só depende das possibilidades reais como também das jurídicas”. (ALEXY,
Robert. Teoría de los derechos fundamentales. 1. ed. 3. reimpressão. Madrid : Centro de Estúdios Políticos y
Constitucionales, 2002, p. 86)

2. DISTINÇÕES ENTRE PRINCÍPIOS E REGRAS: Veremos a partir de agora a distinção entre as regras e os
princípios, na ótica de alguns dos principais doutrinadores que trataram do tema.
a) Ronald Dworkin: Para este pensador norte-americano, os princípios são standards juridicamente vinculantes
radicados nas exigências de justiça2, e se diferenciam das regras pelos seguintes critérios:
- Tudo ou nada: As regras jurídicas são aplicáveis por completo ou não são. Já, os princípios não se aplicam automática e
necessariamente quando as condições previstas como suficientes para a sua aplicação se manifestam.
- Peso ou importância: Quanto às regras não podemos afirmar que uma seja mais importante que a outra. No caso de
conflito entre regras, uma delas prevalece. Em outras palavras, se duas regras entram em conflito, uma delas não é válida.
Já, no que diz respeito aos princípios, estes apresentam um peso ou importância, que em caso de conflito, deverá ser
levado em conta o peso relativo de cada um deles.

Dworkin também assevera que existe uma resposta correta para cada caso e esta resposta está baseada em argumentos de
princípios (que estão embasados na moral institucionalizada) e não em argumentos de política.

Baseado na obra de Dworkin, Lênio Streck sustenta que os princípios constitucionais trazem o mundo-da-vida pro direito,
eis que há uma relação de co-originariedade (nascem juntos) entre direito e moral. Segundo Streck os princípios não
alargam as possibilidades de decisão dos juízes, mas sim restringem, eis que conduzem à resposta correta, a qual ele
denomina de “resposta adequada constitucionalmente”.
b) Robert Alexy: Para este pensador germânico, a diferença fundamental entre regras e princípios é que os princípios
funcionam como mandatos de otimização.
c) José Joaquim Gomes Canotilho: Para o ilustre constitucionalista de Coimbra, o ordenamento jurídico constitucional
deve ser um sistema aberto de regras e princípios, sendo que as regras e os princípios se distinguem seguido vários
critérios. São eles:
- Grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração; de modo diverso, as regras possuem uma
abstração relativamente reduzida;
- Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por serem vagos e indeterminados carecem
de mediações concretizadoras (do legislador? Do juiz?); enquanto as regras são suscetíveis de aplicação direta;
- Caráter de fundamentalidade no sistema das fontes de direito: os princípios são normas de natureza ou com um
papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex: princípios
constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex: princípio do Estado de Direito);
- Proximidade da idéia de direito: os princípios são standards juridicamente vinculantes radicados nas exigências de
justiça (Dworkin) ou na idéia de direito (Larenz); as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo meramente
funcional;
- Natureza normogenética: os princípios são fundamento de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a
ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.

3. FUNÇÕES DOS PRINCÍPIOS: Os princípios, segundo Paulo Bonavides, teriam três funções relevantes na ordem
jurídica:
a) Fundamentadora: Com esta função os princípios adquirem eficácia derrogatória (de revogação) e diretiva
(direcionamento de todo o ordenamento jurídico. Enfim, todas as normas que se contrapõem aos princípios perderão a sua
validade (no caso da eficácia diretiva) e/ou a sua vigência (no caso da eficácia derrogatória).
b) Interpretativa: Cumprem o papel de orientar as soluções jurídicas para o intérprete do Direito
c) Supletiva: Aqui, os princípios cumprem a função de integrar o direito, preenchendo e suplementando os vazios legais.

4. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: São os princípios que se traduzem em normas da Constituição ou que delas
diretamente se inferem.

5. CLASSIFICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS:

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Para outro pensador, Karl Larenz, os princípios se radicam na idéia de direito
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5.1) Princípios Constitucionais Gerais: São aqueles que pertencem ao Direito Constitucional geral, como ciência
universal. São científicos, doutrinários. Podem ser aplicados, e o são, por qualquer ordem estatal. Contêm postulados fácil,
unânime e universalmente compreendidos e aceitos, mantendo estreita ligação com a Ética, a Moral e a Lógica Jurídica.
São eles:
- CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES;
- FLEXIBILIDADE OU RIGIDEZ;
- SUPREMACIA CONSTITUCIONAL;
- DIFERENÇA ENTRE MATÉRIA CONSTITUCIONAL E ORDINÁRIA;
- PODERES CONSTITUINTE E DERIVADO;
- GARANTIA E INDEPENDÊNCIA JUDICANTE;
- HOMOGENEIDADE QUE DEVE HAVER NO SISTEMA FORMADO PELO CONJUNTO DE UMA
CONSTITUIÇÃO;
5.2) Princípios Constitucionais positivos: Estes são os que, sem excluírem os princípios gerais ou com estes colidirem,
apresentam-se particulares a cada ordem estatal.
a) Princípios Fundamentais (político-constitucionais): São os que, em cada ordem jurídica e social em espécie,
explicitam as valorações políticas fundamentais do legislador constituinte . Conforme Canotilho, traduzem as opções
políticas fundamentais conformadoras da Constituição.
- REPUBLICANO
- FEDERATIVO
- ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO
- SEPARAÇÃO DOS PODERES
- PRESIDENCIALISMO
- PRINCÍPIO DA SOBERANIA POPULAR
- PRINCÍPIOS DE ORGANIZAÇÃO SOCIAL (ART. 3º)
- PRINCÍPIOS RELATIVOS A COMUNIDADE INTERNACIONAL (ART. 4º)
b) Princípios Jurídico-Constitucionais: São aqueles princípios constitucionais gerais informadores da ordem jurídica
nacional. “Decorrem de certas normas constitucionais e,não raro, constituem desdobramentos (ou princípios derivados)
dos fundamentais” (SILVA, José Afonso da. Op. Cit). São eles:
- LEGALIDADE (art. 5º, II CF)
- LIBERDADE (art. 5º, IV, VI, VI CF etc.)
- ISONOMIA (art. 5º, caput e inc. I CF)
- AUTONOMIA INDIVIDUAL
- AUTONOMIA ESTADUAL (art. 18 CF)
- AUTONOMIA MUNICIPAL (art. 18 CF)
- ACESSO AO JUDICIÁRIO (art. 5º, XXXV CF)
- SEGURANÇA JURÍDICA (art. 5º, XXXVI CF)
- PRINCÍPIOS-GARANTIA (inafastabilidade do controle jurisdicional, do devido processo legal, do juiz natural, do
contraditório, da pessoalidade da pena, da ampla defesa, etc.)
- PRINCÍPIOS DA PROTEÇÃO DA FAMÍLIA, DO ENSINO E DA CULTURA
c) Princípios Setoriais ou Especiais: “São aqueles que presidem um específico conjunto de normas afetas a determinado
tema, capítulo ou título da Constituição. Eles se irradiam limitadamente, mas no seu âmbito de atuação são supremos”.
(BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. São Paulo : Saraiva, 1996, p. 145-146)
- DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA:
* LEGALIDADE (ADMNINISTRATIVA) (art. 37 caput CF)
* IMPESSOALIDADE (art. 37 caput CF)
* MORALIDADE (art. 37 caput CF)
* EFICIÊNCIA (art. 37 caput CF)
* PUBLICIDADE (art. 37 caput CF)
* CONCURSO PÚBLICO (art. 37, II CF)
* PRESTAÇÃO DE CONTAS (arts. 70, par. Único; 34 VII, d; 35, III)
- DA ORGANIZAÇÃO DOS PODERES:
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* MAJORITÁRIO (arts. 46 e 77, §2º CF)
* PROPORCIONAL (arts. 45 e 58 §1º CF)
* PUBLICIDADE E MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS (art. 93, IX e X CF)
* INDEPENDÊNCIA E IMPARCIALIDADE DOS JUÍZES (arts. 95 e 96 CF)
* SUBORDINAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS AO PODER CIVIL (art. 142 CF)

- DA TRIBUTAÇÃO E DO ORÇAMENTO:
* CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
* LEGALIDADE TRIBUTÁRIA
* ISONOMIA TRIBUTÁRIA
* ANTERIORIDADE DA LEI TRIBUTÁRIA
* IMUNIDADE RECÍPROCA DAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO
* ANUALIDADE ORÇAMENTÁRIA
* UNIVERSALIDADE DO ORÇAMENTO
* EXCLUSIVIDADE DA MATÉRIA ORÇAMENTÁRIA
- DA ORDEM ECONÔMICA:
* GARANTIA DA PROPRIEDADE
* FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE
* LIVRE CONCORRÊNCIA
* DEFESA DO CONSUMIDOR E DO MEIO AMBIENTE
- DA ORDEM SOCIAL:
* GRATUIDADE DO ENSINO PÚBLICO
* AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
* AUTONOMIA DESPORTIVA
5.3 Princípios Constitucionais Decorrentes: São os que decorrem da necessidade de observância aos postulados do
sistema federativo. Dividem-se em dois:
* Princípios constitucionais sensíveis: São aqueles indicados pela própria Constituição e sua violação importa em
automática reação. São os previstos no art. 34, inciso VII, da Constituição Federal. sua violação implica na intervenção
federal.
* Princípios constitucionais estabelecidos: São aqueles que limitam a autonomia de organização dos Estados e
municípios, revelando previamente a forma de sua organização política, social e econômica. O modelo estabelecido para a
União deve ser seguido pelos Estados e Municípios (princípio da simetria).
5.4) Princípios constitucionais extensíveis: São normas centrais comuns à União, Estados, Distrito Federal e
Municípios, de observância obrigatória na organização do Estado.
6) Antinomias jurídicas (Conflitos entre normas):
a) Próprias (Regras): Quando houver conflito entre regras, exclui-se do sistema jurídico a regra conflitante, em face da
incompatibilidade entre essa e outra norma situada no mesmo plano de validade, pertencentes ao mesmo ordenamento. Há
3 critérios:
* Lex superior derogat inferiorem (critério hierárquico)
* Lex specialis derogat generalem (critério da especialidade)
* Lex posterior derogat priorem (critério cronológico)
b) Impróprias (princípios): A colisão entre princípios não conduz a exclusão da ordem jurídica de uma das normas
conflitantes. Há incompatibilidade, porém não exclusão. O aplicador do Direito opta por um princípio sem excluir do
sistema o outro, ou excluir o outro de casos em que possa ser aplicado.

7) VALORES CONSTITUCIONAIS
7.1) CONCEITUAÇÃO COMUM E FILOSÓFICA: No vernáculo, valores estão assim definidos: “As normas,
princípios ou padrões sociais aceitos ou mantidos por indivíduo, classe, sociedade, etc.”.
“O conceito moderno de valor tem seu antecedente imediato na teoria dos entia moralia de Pufendorf são os modos ou
métodos que os seres racionais aplicam às coisas ou aos movimentos físicos para orientar e regular os comportamentos e
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atribuir ordem e harmonia à vida humana. Os valores são modos de preferências conscientes e generalizáveis. Os valores
são, portanto, os critérios básicos para ajuizar as ações, ordenar a convivência e estabelecer seus fins. De aqui se deduz
que os valores constitucionais suponham o sistema de preferências expressas no processo constituinte como prioritárias e
fundamentadoras da convivência coletiva. Se trata das opções ético-sociais básicas que devem presidir a ordem política,
jurídica, econômica e cultural”. (PEREZ LUÑO, Antonio Enrique. Derechos Humanos, Estado de Derecho y
Constitución. 8. ed. Madrid : Tecnos, 2003, p. 288)

7.2) FUNÇÕES DOS VALORES CONSTITUCIONAIS:


a) Fundamentadora: Sentido estático (conjunto de disposições e instituições constitucionais) Aqui se acentua seu
significado de núcleo básico e informador de todo sistema jurídico-político.
b) Orientadora: Sentido dinâmico, estabelecendo metas ou fins predeterminados que fazem ilegítima qualquer
disposição normativa q ue persiga fins distintos ou obstaculize a consecução dos enunciados no sistema axiológico
constitucional..
c) Crítica: Sua função reside na sua idoneidade para servir de critério ou parâmetro de valoração para julgar fatos ou
condutas.
7.3) DISTINÇÃO ENTRE VALORES E PRINCÍPIOS: A doutrina na matéria é escassa, mas Perez Luño nos dá uma
luz acerca da distinção entre valores e princípios. Distingue, portanto da seguinte forma:
a) Grau de concretude (concretização): Os valores não contêm especificações a respeito dos casos em que devem ser
aplicados, nem sobre as conseqüências jurídicas que devem seguir à sua aplicação; constituem idéias diretivas gerais que
fundamentam orientam e limitam criticamente a interpretação e aplicação de todas as restantes normas do ordenamento
jurídico. Os princípios, por sua vez tem um grau maior de concretude e especificação que os valores a respeito das
situações a que devem ser aplicados e às conseqüências jurídicas de sua aplicação. Os princípios já possuem um
significado hermenêutico (metodológico), já atuam como fontes do direito ou como determinações de valor, recebem sua
peculiar orientação de sentido daqueles valores que especificam ou concretizam. Os valores funcionam como metanormas
em relação aos princípios e como normas de terceiro grau em relação com as regras.

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