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As Fontes de direito no Estado Visigótico

As primeiras leis dos Visigodos eram normas consuetudinárias. Aceita-se, em geral, a


existência de leis promulgadas pelos monarcas visigodos logo a seguir a sua
instalação na Gália. Essas leis – chamadas Leis Teodoricianas, porque devidas a
Teodorico I e a Teodorico II – ocupam-se, além de outros aspectos de direito privado,
sobretudo, da repartição de terras consequente ao acordo de hospitalidade militar
ocorrido entre Visigodos e Romanos.

I – Código de Eurico (Códex Euricianus)


A primeira colectânea importante do direito visigótico foi o Código Euriciano,
promulgado pelo rei Eurico, à volta de 476. Trata-se de uma fonte tradicionalmente
enquadrada na categoria das leis dos bárbaros (“leges barbarorum”). Mas é de todas a
que mais se ocupa do direito privado. Este código teve larga receptividade do direito
romano vulgar.

Parece, porém, que sem embargo de se reconhecer a aceitação pelo Direito Visigótico
de muitas normas do direito romano vulgar, isto é, tal como era interpretado e aplicado
pelas populações peninsulares, não pode ser excluída a vigência inicial e, depois, a
prática corrente de normas consuetudinárias germânicas, traduzidas mais tarde em
leis.

O Código de Eurico foi uma lei pessoal dos Godos (Paulo Merea).

II – Breviário de Alarico
Alarico II manda fazer uma compilação que aprova em 506: é a Lex Romana
Visigothorum, também conhecida por Breviarum Alaraci ou Breviarium Aniani.
Integrase na categoria das leis romanas dos bárbaros (“Lex Romanae Barbarorum”).

Ela é uma compilação de “leges” e de “iura”, relativa tanto ao direito público como
privado aplicável nas relações entre romanos.

Compreende de entre as leges:


- Constituições do Código Teodosiano (438)
- novelas pós – teodosianas promulgadas até 463.

Quanto aos iura, encontram-se os seguintes textos:


- Epítome de Gaio – resumo das instituições deste mesmo jurista.
- Sentenças atribuídas a Paulo, outro notável jurisconsulto da época clássica.
- disposições dos códigos Gregoriano e Hermogeniano.
- um texto das “respostas” de Papiniano.

Todos os textos compilados na Lex Romana Visigothorum, com excepção do Epítome


de Gaio, são seguidos de uma paráfrase, tendente a interpretar ou esclarecer-lhes o
sentido, mas que algumas vezes diz coisa diversa do texto ou modifica completamente
o sentido do preceito interpretado: esta explicação ou comentário chama-se
Interpretatio.
A razão por que o Epítome de Gaio não é seguido de Interpretatio reside no facto de já
por si consistir num resumo adaptado das Institutas de Gaio.

A Lex Romana Visigothorum teve enorme influência não só no território ocupado pelos
Visigodos como em todo o ocidente europeu. O seu conteúdo foi considerado, durante
muito tempo, como genuína representação do prestigioso Direito Romano que a igreja
continuou a adoptar nas suas relações.
III – Código Revisto de Leovigildo
Posteriormente ao Breviário de Alarico, conhece-se o diploma promulgado pelo rei
Teudis, em 546, a chamada Lei de Teudis, que se destinou a reprimir os abusos
cometidos na cobrança das custas judiciais. Todavia, o Código Revisto de Leovigildo
representa a grande colectânea que se segue ao Breviário.

Parece de admitir, com efeito, que o Código de Eurico foi refundido e actualizado por
volta do ano 580, por iniciativa do rei Leovigildo.

Ele esforça-se pela unificação dos dois povos (godos e hispano-romanos), abolindo a
proibição do casamento entre visigodos e romanos.

Desconhece-se o texto original deste código revisto. Só podemos reconstitui-lo


através dos preceitos que dele passaram ao Código Visigótico e 654, sob a epígrafe
de leis antigas (antiquae).

IV – Código Visigótico
A estabilização dos Visigodos na Península facilitou, pois, a fusão com os habitantes –
os hispano-romanos, sem a qual o novo Estado não poderia considerar-se radicado.

A conversão dos Visigodos ao catolicismo destruiu uma das mais poderosas barreiras
a essa fusão. Depois, foi brotando dos concílios uma legislação comum para godos e
hispano-romanos, embora de início restrita às matérias eclesiásticas. Os próprios reis
legislam, uma vez ou outra, para ambas as raças: a primeira lei que se conhece
aplicável a todos os habitantes da Península é a lei de Teudis sobre custas judiciais.

Do Código Visigótico conhecem-se três formas: forma recesvindiana, forma


ervigiana do tempo de Ervígio e forma”vulgata”, de época incerta e de iniciativa
particular.

Na verdade dá-se o nome de forma vulgata do Código Visigótico a um conjunto de


manuscritos de épocas muito diversas que vão desde a última fase da dominação
visigótica até à Reconquista. Trata-se de revisões não oficiais, de origem privada, que
tomam por base a forma ervigiana, introduzindo-lhe modificações e acrescentos
diversos.

Quanto à natureza intrínseca das suas disposições, o Código Visigótico pode


considerar-se um produto do cruzamento de três correntes jurídicas: romana,
germânica e canónica. A que maior influência exerceu foi a romana.

Ao contrário das anteriores compilações, de aplicação pessoal, o Código Visigótico


teve carácter territorial, isto é, as suas leis obrigavam a todos os habitantes da
monarquia visigótica qualquer que fosse a raça

O Código Visigótico está sistematizado em 12 livros, como o código de Justiniano, que


se subdividem em títulos e estes em leis.
O Código Visigótico é um dos mais notáveis monumentos jurídicos da Idade Média.
O Código aparece como expressão do ideal jurídico dos governantes da monarquia
visigótica, proposto aos juízes, não como repositório do direito geralmente observado.
Era uma lei que estava adiantada em relação às possibilidades sociais da época.

Outras Fontes
Além das fontes de direito que ficaram analisadas, outras merecem especial atenção.
Cânones dos concílios - Assim, tinham grande autoridade sobre os fiéis as leis
eclesiásticas decretadas nos concílios ecuménicos, nacionais e provinciais, que se
denominavam cânones. Normas próprias da igreja que constituía o Direito Canónico.
(As leis não só aplicável nos fieis da igreja mas sim aplicava nas relações entre
pessoas que não iam a igreja)
Dada a importância e influência da Igreja neste período, o seu direito peculiar (Direito
Canónico) era observado não só nas relações dos fiéis com a hierarquia e na
disciplina interna desta, como em muitas relações da vida civil.

Após a conversão de Recaredo, tornou-se católica a generalidade da população


hispânica.

Os princípios canónicos exerceram grande influência sobre os institutos jurídicos


seculares, no âmbito do direito público e do direito privado. Existia uma conexão íntima
entre a legislação civil e os cânones conciliares: umas vezes, nestes se recolhiam
normas temporais, já consagradas em leis régias, enquanto, outras vezes, lhes
serviam de base ou eram transformados em leis civis, mediante disposições
confirmativas.

Foi especialmente valiosa a legislação secular emanada dos concílios sobre questões
de Estado, portanto, matérias que hoje seriam consideradas de direito constitucional
(as relativas à eleição e protecção do monarca, à condição dos juízes e aos direitos
das pessoas em face do rei).

Fórmulas visigóticas – os formulários têm, como já foi dito, grande importância


prática na vida do Direito: por eles se pauta a redacção dos actos jurídicos que devem
respeitar certas solenidades para serem válidos ou eficazes.

A fórmula é uma fonte da história jurídica do maior valor porque nos mostra como as
leis eram aplicadas.

Ora, conhecemos hoje uma colecção de 46 fórmulas redigidas, provavelmente entre


615 e 620, por um notário de Córdova encontradas num códice da Catedral de Oviedo
e que mostram qual o Direito Romano Vulgar de então. Sã essas as fórmulas
visigóticas que também estão publicadas nos textos…, da Faculdade de Direito de
Coimbra.

A maioria delas refere-se a actos privados: manumissões, vendas, doações,


testamentos, permutas, etc.

. A Personalidade ou a Territorialidade na aplicação do direito Visigótico


(Princípios Germânicos)
Como já tínhamos observado, em certos Estados Germânicos vigorou o princípio da
personalidade ou da nacionalidade do direito, ou seja, havia um ordenamento jurídico
para a população germânica e outro para a população romana. Diverso é o princípio
da territorialidade do direito, segundo o qual se aplica em todo o Estado um único
ordenamento jurídico.

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