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Política

Externa

Prof. José Alfredo Pareja Gomez de La Torre

Indaial – 2022
1a Edição
Elaboração:
Prof. José Alfredo Pareja Gomez de La Torre

Copyright © UNIASSELVI 2022

Revisão, Diagramação e Produção:


Equipe Desenvolvimento de Conteúdos EdTech
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech UNIASSELVI

T689p

Torre, José Alfredo Pareja Gomez de La

Política externa. / José Alfredo Pareja Gomez de La Torre –


Indaial: UNIASSELVI, 2022.

241 p.; il.

ISBN 978-85-515-0544-1
ISBN Digital 978-85-515-0541-0

1. Gestão de política externa. - Brasil. II. Centro Universitário


Leonardo da Vinci.
CDD 900

Impresso por:
APRESENTAÇÃO
Olá, acadêmico! Seja bem-vindo aos estudos de Política Externa. Esta é uma
disciplina que faz parte essencial no percurso de aprendizagem de seu curso. Ela é
essencial porque envolve temas de interesse nacional que fazem da gestão de política
externa uma peça-chave no processo de decisões nas relações internacionais de um
país, temas que vão desde questões de geografia econômica, socioeconômicas, de
geopolítica e posições de interesse internacional do Estado Brasileiro. Já pensou como
um país do tamanho continental do Brasil consegue se posicionar de uma maneira clara
e eficiente nas suas atividades de Política Externa?

Neste livro de estudos, vamos analisar sobre isso desde o final do período
colonial, isto é, desde a Era Joanina quando o Brasil passou de ser uma colônia para se
converter parte integral dos reinos da Casa Real Portuguesa. Foi nesse período que o
Brasil começou fazer gestão de suas próprias decisões de Política Externa até os dias
atuais. Uma das questões chaves para ter uma Política Externa eficiente é saber qual
é posição geopolítica de uma nação perante o cenário internacional. Não é o mesmo
desenhar uma política externa de um país desenvolvido que esteja inserido no cenário
Europeu que de um país da América Latina. Inclusive dois países vizinhos com graus
de desenvolvimento relativamente semelhantes vão ter geopolíticas diferentes, por
exemplo, a realidade do Brasil – país vasto com uma diversidade geográfica e cultural
muito grande – terá uma posição geopolítica muito diferente da posição de países de
menor tamanho como o caso do Uruguai ou do Chile.

Geopolítica que pode ser expressa na estrutura da atividade econômica. Por


exemplo, conforme dados do Banco Mundial (2021), o Brasil é considerado uma economia
com um mercado doméstico muito grande de mais de 213 milhões de pessoas, onde
as exportações representam 16,9% de seu PIB; enquanto, o Chile com uma população
de 19 milhões as exportações representam 31,5%. Ou seja, são países que compartem
posições geográficas próximas, mas com realidades geopolíticas relativamente
diferentes que fazem da gestão de sua Política Exterior terem posições diferentes. São
justamente esse tipo temas, mas com foco na Política Externa que vamos estudar aqui
neste caderno de estudos ao longo da história do Brasil, iniciando na sua independência.

Para ajudá-lo com seus estudos apresentados ao longo deste livro, vamos
dividir os assuntos em três grandes unidades; cada uma delas contando com tópicos
de estudos e autoatividades de apoio. Assim, fique atento à leitura! Na Unidade 1,
abordaremos questões sobre à formação do território brasileiro no contexto da política
externa e os tratados que definiram as delimitações do Brasil e de seus países vizinhos,
especialmente da Região da Prata, período que abrange desde os começos do Brasil
como parte do reino de Portugal, Brasil, Algarves até o não 1889. Ou seja, desde antes
mesmo da independência de 1822 com a mudança da casa real de Portugal para Rio de
Janeiro no ano de 1807 até quando o Brasil virou uma república no ano de 1889.
Os temas de estudos da Unidade 1 vão se dividir em quatro grandes tópicos. No
Tópico 1, vamos estudar sobre a formação territorial desse vasto território que hoje é o Brasil
e sobre a importância da Era Joanina nos começos da Política Externa do Brasil. No Tópico
2, abordaremos temas sobre a independência do brasil e o processo de reconhecimento
internacional desta, finalizando esse tópico com o processo de consolidação nacional. Já
no último tópico da Unidade 1, Tópico 3, iremos estudar sobre a política externa durante o
Segundo Reinado do Imperador D. Pedro II, período que durou quase 50 anos, nos quais o
Brasil esteve envolvido em duas guerras na região da Prata.

Na Unidade 2, vamos focar nossos estudos na Política Externa durante


a Primeira República, aqui abordaremos temas tais como o fim da Monarquia e os
começos do Brasil já como uma república no ano de 1889. A unidade vai se dividir
em três grandes tópicos. O Tópico 1, onde vamos estudar sobre a consolidação da
república logo do fim da monarquia, 1889, e da abolição da escravidão, 1888. Assim
como nesse tópico iremos estudar sobre a liderança e impacto do Barão do Rio Branco
na reorientação da política externa brasileira. No Tópico 2, nossos estudos vão se
focar na participação do Brasil tanto na Primeira Guerra Mundial como na Liga das
Nações, período relevante que deu inícios ao século XX, começos de século que foi
caracterizado pelas grandes mudanças tecnológicas e socioeconômicas de grande
impacto aqui no Brasil e no resto do mundo. No Tópico 3, último da Unidade 2, o tema
de estudos será a importância das relações brasileiras com os EUA e demais países
das Américas antes de começar a Segunda Guerra Mundial.

Na última unidade deste livro, na Unidade 3, o assunto de nossos estudos será


a Política Externa logo da Segunda Guerra Mundial até os dias de hoje, passando pelos
governos de Vargas, o Regime Militar, e a volta a democracia a partir da década de 1880
até os doas atuais. No primeiro tópico o tema será a Política Externa sob o Governo de
Vargas, período muito relevante que começa com a grande depressão mundial e finaliza
na Segunda Guerra Mundial. No tópico 2, nosso estudo abordara a Política Externa
sobre o Regime Militar e suas implicações geopolíticas durante a gestão governamental
civil-militar dessa época, isto é, 1864-1984. No último tópico da unidade, nosso estudo
será sobre a Política Externa durante a crise da década de 1980 que nos levou para
uma hiperinflação, as implicações da Guerra Fria aqui no Brasil e a época após da
implementação do Plano Real.

Os assuntos que vamos abordar ao longo deste livro vão ser o principal material
de seus estudos em Política Externa. Contudo, ao longo do livro serão indicados vários
sites e materiais de interesse relacionados ao assunto de Política Externa, os quais
vão enriquecer seu aprendizado. Além disso, as autoatividades garantem a fixação e
discussão dos temas que vamos estudar nos tópicos ao longo das três unidades deste
livro didático. Portanto, é fundamental que você não deixe de fazê-las e tirar as dúvidas
posteriormente. Desejo você bons estudos!
GIO
Olá, eu sou a Gio!

No livro didático, você encontrará blocos com informações


adicionais – muitas vezes essenciais para o seu entendimento
acadêmico como um todo. Eu ajudarei você a entender
melhor o que são essas informações adicionais e por que você
poderá se beneficiar ao fazer a leitura dessas informações
durante o estudo do livro. Ela trará informações adicionais
e outras fontes de conhecimento que complementam o
assunto estudado em questão.

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os acadêmicos desde 2005, é o material-base da disciplina.
A partir de 2021, além de nossos livros estarem com um
novo visual – com um formato mais prático, que cabe na
bolsa e facilita a leitura –, prepare-se para uma jornada
também digital, em que você pode acompanhar os recursos
adicionais disponibilizados através dos QR Codes ao longo
deste livro. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura
interna foi aperfeiçoada com uma nova diagramação no
texto, aproveitando ao máximo o espaço da página – o que
também contribui para diminuir a extração de árvores para
produção de folhas de papel, por exemplo.

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apresentamos também este livro no formato digital. Portanto,
acadêmico, agora você tem a possibilidade de estudar com
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Preparamos também um novo layout. Diante disso, você


verá frequentemente o novo visual adquirido. Todos esses
ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos
nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos,
para que você, nossa maior prioridade, possa continuar os
seus estudos com um material atualizado e de qualidade.

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Olá, acadêmico! Para melhorar a qualidade dos materiais ofertados a você – e
dinamizar, ainda mais, os seus estudos –, nós disponibilizamos uma diversidade de QR Codes
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acesse um conteúdo interativo relacionado ao tema que você está estudando. Para utilizar
essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só
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suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem,
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Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!


SUMÁRIO
UNIDADE 1 - FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO, CONTEXTO
DIPLOMÁTICO E TRATADOS DE LIMITES COLONIAIS (1822-1889).................................... 1

TÓPICO 1 - FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO.........................................................3


1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................3
2 O BRASIL CONTINENTAL, REFLEXO DE SEU PROCESSO HISTÓRICO..............................4
3 A DIPLOMACIA JOANINA E A OPÇÃO INGLESA.................................................................8
3.1 A GEOPOLÍTICA DA ÉPOCA JOANINA E SUAS IMPLICAÇÕES NO BRASIL............................... 9
3.2 POLÍTICA EXTERNA E DIPLOMACIA NO BRASIL JOANINO.........................................................12
3.3 AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS DO BRASIL
JOANINO E A AMIZADE DO IMPÉRIO BRITÂNICO............................................................................... 13
3.4 AS GUERRAS NAPOLEÔNICAS E SEU IMPACTO GEOPOLÍTICO E SOCIAL......................................... 16
3.5 O FIM DA ERA JOANINA......................................................................................................................17
RESUMO DO TÓPICO 1.......................................................................................................... 21
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 22

TÓPICO 2 - INDEPENDÊNCIA DO BRASIL E RECONHECIMENTO...................................... 25


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 25
2 A INDEPENDÊNCIA DE BRASIL DE 1822......................................................................... 26
2.1 A REVOLUÇÃO DE PORTO E SEU IMPACTO NA
DECLARAÇÃO DE INDEPENDÊNCIA DO BRASIL................................................................................. 27
2.2 A INDEPENDÊNCIA DE BRASIL DE 1822 E A
DEMORA DO RECONHECIMENTO INTERNACIONAL...........................................................................29
2.3 O RECONHECIMENTO INTERNACIONAL DA INDEPENDÊNCIA DE 1825:
A política externa brasileira e o processo de consolidação do estado nacional........................30
3 A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA E O PROCESSO
DE CONSOLIDAÇÃO DO ESTADO NACIONAL..................................................................... 32
3.1 IMPACTOS DA GESTÃO GOVERNAMENTAL DE
BRASIL INDEPENDENTE A PARTIR DE 1825........................................................................................35
RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................... 40
AUTOATIVIDADE................................................................................................................... 41

TÓPICO 3 - A POLÍTICA EXTERNA DO SEGUNDO REINADO.............................................. 45


1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 45
2 AS INTERVENÇÕES BRASILEIRAS NO PRATA.................................................................47
2.1 FATOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DA REGIÃO
DA PRATA DE MEADOS DO SÉCULO XIX..............................................................................................49
2.2 A ESTABILIDADE BRASILEIRA DEPOIS DA GUERRA DA PRATA................................................51
2.2.1 O fim do tráfico de escravos......................................................................................................51
2.2.2 Política migratória.....................................................................................................................53
2.2.3 A modernização da economia................................................................................................55
3 A GUERRA DO PARAGUAI (1864-1870)........................................................................... 58
3.1 O TRATADO DA TRÍPLICE ALIANÇA...................................................................................................61
3.2 CONSEQUÊNCIAS DA GUERRA DO PARAGUAI............................................................................65
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................. 68
RESUMO DO TÓPICO 3.......................................................................................................... 71
AUTOATIVIDADE...................................................................................................................72

REFERÊNCIAS.......................................................................................................................75
UNIDADE 2 — A POLÍTICA EXTERNA DA PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1930)................. 77

TÓPICO 1 — A POLÍTICA EXTERNA DO BARÃO DO RIO BRANCO........................................79


1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................79
2 A CONSOLIDAÇÃO REPUBLICANA.................................................................................. 82
3 a reorientação da política externa.................................................................................87
3.1 O LITÍGIO ENTRE O BRASIL E A GUIANA FRANCESA E DO ACRE COM A BOLÍVIA.............. 88
3.1.1 O litígio do Acre com a Bolívia..................................................................................................89
3.2 O BARÃO DO RIO BRANCO AO COMANDO DO PALACIO DE ITAMARATY...............................92
RESUMO DO TÓPICO 1..........................................................................................................97
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................. 98

TÓPICO 2 - PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA NA PRIMEIRA


GUERRA MUNDIAL (1914-1918) E NA LIGA....................................................................... 101
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 101
2 A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL......................................................................................102
2.1 CONSEQUÊNCIAS DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL.................................................................108
2.1.1 Novas potências mundiais......................................................................................................109
2.1.2 O Tratado de Versalhes.............................................................................................................110
3 A LIGA DAS NAÇÕES.........................................................................................................111
3.1 A LIGA DAS NAÇÕES NO CONTEXTO BRASILEIRO......................................................................113
4 O FIM DA PRIMEIRA REPÚBLICA E A QUEDA DO PREÇO INTERNACIONAL DO CAFÉ......... 115
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................ 119
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................120

TÓPICO 3 - AS RELAÇÕES COM OS EUA E A AMÉRICA DO SUL.......................................123


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................123
2 AS RELAÇÕES COM OS EUA............................................................................................124
2.1 A CONVERGÊNCIA ECONÔMICA DA ERA VARGAS NO CONTEXTO INTERNACIONAL.............. 127
3 AS RELAÇÕES COM AMÉRICA DO SUL E A GUERRA FRIA.............................................128
3.1 A UTOPIA DO PRAGMATISMO DA ERA VARGAS.......................................................................... 133
3.2 APROXIMAÇÃO DOS INTERESSES DOS PAÍSES DA AMÉRICA LATINA................................. 135
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................139
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................ 147
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................148

REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 151

UNIDADE 3 — A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA: REGIME MILITAR


(1964-1985) E ÉPOCA DEMOCRÁTICA ATÉ OS DIAS ATUAIS..........................................153

TÓPICO 1 — A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO REGIME MILITAR............................155


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................155
2 A POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE (PEI) E GOLPE MILITAR..................................156
2.1 A POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE (PEI)............................................................................... 157
2.2 O GOLPE MILITAR NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS BRASILEIRAS............... 163
3 POLÍTICA EXTERNA PRAGMÁTICA NO GOVERNO CIVIL-MILITAR...............................166
3.1 O MILAGRE ECONÔMICO (1967-1973) E O ENDIVIDAMENTO EXTERNO AGRESSIVO................167
3.2 POLÍTICA EXTERNA PRAGMÁTICA E UNIVERSALISMO............................................................. 171
3.2.1 Diversificação das relações internacionais e do comércio exterior............................. 171
3.2.2 Desenvolvimento e ampliação do horizonte produtivo do brasil................................. 171
3.2.3 Coopeação e integração com os países latino-americanos........................................ 172
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................ 175
AUTOATIVIDADE................................................................................................................. 176

TÓPICO 2 - RETORNO À DEMOCRACIA E A CRISE DA DÍVIDA EXTERNA........................ 179


1 INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 179
2 SUL-AMERICANIZAÇÃO..................................................................................................180
3 ABERTURA AO MUNDO E O FINAL DA HIPERINFLAÇÃO...............................................185
3.1 O CONSENSO DE WASHIGTON........................................................................................................ 187
3.2 A CRIAÇÃO DO MERCOSUL E A RIO-92........................................................................................189
3.3 O FINAL DA HIPERINFLAÇÃO......................................................................................................... 193
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................195
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................196

TÓPICO 3 - MULTILATERALISMO E CRESCIMENTO ECONÔMICO...................................199


1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................199
2 ESTABILIDADE DA INFLAÇÃO, MULTILATERALISMO E A NOVA ORDEM MUNDIAL .......... 200
2.1 CONTINUIDADE DA ABERTURA ECONÔMICA............................................................................. 200
2.2 O MULTILATERALISMO.................................................................................................................... 205
3 ATIVISMO INTERNACIONAL E O BOOM DAS COMMODITIES ....................................... 208
3.1 A QUESTÃO DAS COMMODITIES..................................................................................................... 212
3.2 A POLÍTICA EXTERNA DE FINAIS DA DÉCADA DE 2010........................................................... 215
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................... 223
RESUMO DO TÓPICO 3....................................................................................................... 227
AUTOATIVIDADE................................................................................................................ 228

REFERÊNCIAS.....................................................................................................................231
UNIDADE 1 -

FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO
BRASILEIRO, CONTEXTO
DIPLOMÁTICO E TRATADOS
DE LIMITES COLONIAIS
(1822-1889)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• visualizar as dimensões, o posicionamento geográfico e a população do Brasil no


contexto da importância delas para a Política Externa do país;

• compreender como a era joanina fez que o Brasil se convertesse no centro das
decisões geopolíticas dos reinos de Portugal, Brasil e Algarve;

• entender a importância do primeiro e segundo reinado do Brasil Imperial na


consolidação de unidade nacional

• visualizar o posicionamento da Política Externa do Brasil Imperial.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO


TÓPICO 2 – INDEPENDÊNCIA DO BRASIL E RECONHECIMENTO
TÓPICO 3 – A POLÍTICA EXTERNA DO SEGUNDO REINADO

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

1
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 1!

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QR Code abaixo:

2
UNIDADE 1 TÓPICO 1 -
FORMAÇÃO DO TERRITÓRIO BRASILEIRO

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, neste Tópico 1 abordaremos a relação do território nacional, sua


população e seu contexto histórico a partir do século XIX, com fatos históricos que
datam desde o século XV assim como importantes elementos socioeconômicos para
entender o posicionamento do Brasil ante o resto do mundo, cujo objetivo é entender
como a política externa é uma ferramenta importante que serve aos interesses do Brasil.
Um fundamento importante da política externa é visualizar a correlação entre a posição
geográfica do território nacional e a população que aí habita. O território nacional de
uma nação, com seu espaço geográfico definido, vai moldando a sociedade conforme as
características próprias do desenvolvimento sociocultural nesse território. No caso do
Brasil, seu vasto território tropical e subtropical vem moldando a sua sociedade desde
antes mesmo da colonização portuguesa. Contudo, desde a ótica das relações do Brasil
com o resto do mundo e sua política externa, conteúdo deste livro didático, vamos nos
focar no contexto histórico e sua conexão com a política externa desde o século XV,
data que foi definida as delimitações geográficas nas Américas tanto para o território
colonial espanhol como para o território colonial português.

Assim, nosso caminho de estudos começa a finais do século XV. A última


década desse século é um momento importante para o Brasil, nessa época foi assinado
o Tratado de Tordesilhas entre Portugal e Espanha. Tratado assinando no ano 1494
diante do qual ficou delimitado as áreas geográficas nas Américas entre Portugal e
Espanha. Delimitação considerada relevante para a geopolítica dos países europeus com
interesses nas Américas. O tratado acabou com toda possibilidade de um conflito que
começava a se materializar desde o descobrimento das Américas que foi descoberta
apenas 2 anos antes do Tratado de Tordesilhas. A partir do Tratado de Tordesilhas ficou
firme a negação de direitos a qualquer outra nação, exceto da Espanha e de Portugal,
sobre os vastos territórios das Américas que se tinham conhecimento nessa época.

NOTA
Ficou curioso sobre o Tratado de Tordesilhas? Acesse ao link da UNESCO para
saber mais um pouco sobre esse tratado histórico: https://bit.ly/37ukUnf

3
No contexto brasileiro, foi a partir do Tratado de Tordesilhas que se foi delimitan-
do o território Nacional Brasileiro. Esse tratado mais outros fatores que vieram acontecer
a partir dessa data começaram estruturar o vasto território brasileiro de hoje, aliás, o
maior país da América Latina, ocupando 42% desse território com uma extensa fronteira
com quase todos os países da América do sul, exceto a fronteira do Chile e do Equador.
No contexto histórico, logo do Tratado de Tordesilhas, as principais épocas que contri-
buíram para a definição do território nacional e seu povoamento foram:

• Século XVI, época na qual a principal atividade era extração e exportação do pau-
Brasil e a produção de cana de açúcar a grande escala, mercadorias destinadas à
exportação para Europa. Plantações e produção extrativista concentradas no que
hoje são os estados da Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro.
• Século XVII e XVIII, época marcada pela entrada ao oeste do país para a lavoura
pastoril, e marcada também pela descoberta de grandes jazidas de metais nobres
(ouro e prata) e diamante nos territórios dos estados Minas Gerais e Mato Grosso.
Nesse momento foi o nascer de diversas cidades ao longo do território. E foi o nascer
do interesse geopolítico na Bacia da Prata, tanto para a colônia portuguesa como
para a espanhola. Interesse nessa vasta bacia que deu origem às guerras ao longo
do século XIX entre as novas nações independentes da Região da Prata, isto é, a
Argentina, o Brasil, o Uruguai e o Paraguai.
• Século XIX, época marcada pelas grandes extensões produtivas de café e processos
de urbanização principalmente da região sudeste do país e pelas guerras da Região da
Prata. Século que foi o nascer da grande cidade de São Paulo, com sua forte influência
inicial na produção de café para a exportação. Logo essa influência se foi estendendo
para outras atividades econômicas e financeiras, iniciando, assim, os fundamentos
para o coração econômico do Brasil que representa hoje a cidade São Paulo.

Então, é partir dessas três épocas é que deu forma à dinâmica socioeconômica
do Brasil moderno. Devermos refletir que cada um dos estados que fazem parte da
federação brasileira é do tamanho de muitos países de tamanho médio inclusive
grandes. Ou seja, o Brasil é um vasto território de dimensões continentais, onde cada
estado possui suas próprias particularidades históricas, econômicas e culturais. Antes
mesmo de começar nosso estudo da Política Externa desde antes da independência do
Brasil, ano de 1822, é relevante que possamos visualizar a posição geopolítica do Brasil
dos dias atuais para logo nos interessarmos no contexto histórico desse Brasil de hoje
e seu posicionamento no mundo.

2 O BRASIL CONTINENTAL, REFLEXO DE SEU PROCESSO


HISTÓRICO

Desde antes mesmo de sua independência o Brasil tinha direitos sobre um


vasto território posicionado na América do Sul tropical e subtropical, direitos que foram
consolidando a unidade nacional representativa do Brasil dos dias atuais. Hoje, o Brasil é

4
considerado um país continental, o quinto maior país do mundo com seus 8 515 767,049
km². Em ordem cronológica, o maior país do mundo é a Rússia, o segundo o Canada, o
terceiro a China, o quarto os Estados Unidos e o quinto o Brasil. Ou seja, o Brasil é uma
nação que com seu vasto território e seus imensos recursos naturais tem uma posição
geopolítica relevante no contexto das relações internacionais.

Em consideração, seu recurso humano e geração de riqueza o Brasil ocupa


uma posição de liderança junto aos Estados Unidos nas Américas, hoje o Brasil é o
segundo país com maior população das Américas, o primeiro é os Estados Unidos e o
terceiro o México. Se voltarmos ao ano 1960 o Brasil tinha 72 milhões de pessoas, e no
ano 2020 o Brasil tinha 213 milhões, isso é praticamente um crescimento exponencial,
conforme observarmos no seguinte gráfico comparativo entre as três nações com maior
população nas Américas:

GRÁFICO 1 – POPULAÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS, BRASIL E MÉXICO DESDE O ANO 1960 ATÉ 2020

FONTE: <https://bit.ly/3teN2mQ>. Acesso em: 30 jan. 2022.

Esse crescimento populacional do Brasil dos últimos 60 anos é de 196%!


Tendência semelhante acontece com os outros dois países mais populosos das
Américas. E paras as próximas décadas qual a perspectiva de crescimento populacional
do Brasil? Se nós observarmos a tendencia do crescimento populacional, ele passou de
2,99% ao ano no começo da década de 1960 para apenas 0.72% no ano 2020, e para as
próximas décadas já se está falando de crescimento negativo.

5
A perspectiva de crescimento populacional negativo já para as próximas
décadas tem uma série de implicações socioeconômicas, entre as mais importantes:
o Brasil passará de ser um país considerado jovem (população maioritariamente jovem)
para virar um país de população relativamente velha. Entre os maiores problemas de
se ter uma população relativamente mais velha é a pressão financeira para sustentar a
aposentadoria dos trabalhadores, nesse sentido, os jovens brasileiros que hoje, ano 2021,
estão entrando no mercado de trabalho possivelmente terão uma aposentadoria difícil
de se financiar. Esse fato de mudança populacional representa novas condições que
vão mudar a geopolítica do país, logo nas próximas décadas haverá novas estratégias
de Política Externa.

Outro contexto importante sobre a população do Brasil que devermos ponderar


é a distribuição desigual dela no território do país. Grande parte da população brasileira
habita no litoral, no Sudeste (São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo)
e no Sul (Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul). Se juntar essas duas regiões, o
Sudeste e o Sul, a sua população representa 117 milhões, isto é, 56% da população do
país; mas essas duas regiões representam apenas o 18% do território nacional. Ou seja, o
resto da população, 44% do total, habita no 82% do território nacional, isto representa 93
milhões de pessoas distribuídas no vasto território do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

E se considerar a distribuição da renda nacional, ela também é desigual ao longo do


território nacional. Para ter uma melhor percepção dessa distribuição da renda, vamos dar
um breve olhar ao Ingresso Nacional Bruto por pessoa, isto é, o INB per capita. Ele passou de
US$280 ao ano em 1960 para US$ 12.790 em 2013, mas logo dessa data despencando para
US$ 7.850 em 2020, conforme mostra o seguinte gráfico do Banco Mundial:

GRÁFICO 2 – INB PER CAPITA DO BRASIL, MÉTODO ATLAS EM US$, CONSIDERANDO PREÇOS ATUAIS

FONTE: <https://bit.ly/3ti93RX>. Acesso em: 30 jan. 2022.

6
Deste gráfico se consegue tirar algumas observações interessantes. Primeiro o
Brasil passou de ser um país de renda média baixa na década de 1970 para um país de
renda média alta no ano 2020, mas tendo uma queda drástica de sua renda per capita
a partir do ano 2013. Mas será que essa queda forte da renda a partir de 2013 é um
acontecimento isolado do Brasil? Conforme vamos estudar na Unidade 3, essa queda
é um acontecimento maioritário no contexto econômico dos países de América Latina,
países com um peso muito forte nas exportações de commodities (matérias primas).
Agora que já temos uma visão da renda média do Brasil, vamos dar um breve olhar dessa
renda e dos índices de pobreza, mas em cada uma das 5 regiões do território nacional.

GRÁFICO 3 – PERSPECTIVA DA RENDA POR REGIÕES


Concentração do PIB por região Pobreza relativa por região

FONTE: <https://bit.ly/3Jk0xHs>. Acesso em: 30 jan. 2022. FONTE: <https://bit.ly/3CPKNtf>. Acesso em: 30 jan. 2022.

Destes dados do Gráfico 3, conseguimos inferir que as regiões Sul e Sudeste


geram 71.3% do PIB nacional, mas sua população representa o 56% do total nacional,
ou seja, sua renda média é maior que da média nacional. Entretanto, as demais
regiões (Centro-Oeste, Nordeste e Norte) geram 28,7% do PIB nacional, e a sua
população representa o 44% do total nacional, ou seja, sua renda média e menor que
da média nacional. E se correlacionar essa informação com os índices de pobreza
relativa por região, as regiões Sul e Sudeste possuem 20% da pobreza relativa, e as
demais regiões levam o 80%.

Destas informações conseguimos inferir o que já se sabe na comunidade


brasileira, isto é, que desse vasto território nacional tanto a distribuição da população como
da renda é desigual ao longo dos estados da federação. Como estudiosos das relações
internacionais do Brasil, é importante nos lembrar e visualizar isso, pois assim podermos
ter uma melhor posição do que é o Brasil e assim fazer gestão de melhores decisões
no que tange a política externa que possam melhorar as condições de riqueza de sua
população. Mas será que essa distribuição desigual e as particularidades da população
são resultados do que o Brasil vem fazendo somente durante as últimas décadas?

7
Esse Brasil de mais de 200 milhões de cidadãos de hoje é o resultado de séculos
de história dos povos que habitam no território tropical e subtropical do Brasil, isto é,
os povos antes da chegada dos portugueses, os portugueses da colônia, os imigrantes
africanos, dos povos das ondas imigratórias do século XIX e XX, e a mistura cultural e
racial de todos eles. Nesse contexto histórico e territorial é que vamos estudar como o
território nacional foi se moldando à dinâmica socioeconômica dos dias atuais, e qual a
sua relevância na gestão da política externa do Brasil. Isso vamos fazer a partir do final
do período colonial português, ou seja, desde começos do século XIX. Nesse sentido,
vamos começar nossos estudos desde o período Joanino e a influência Inglesa na
gestão da política externa dessa época.

3 A DIPLOMACIA JOANINA E A OPÇÃO INGLESA



Antes de começar a estudar a diplomacia Joanina talvez devermos nos
perguntar, o que é o Período Joanino e por que é relevante no contexto da diplomacia
Brasileira? Basicamente ele marca um antes e um depois do período colonial português,
ou seja, o início do Brasil como território independente de Portugal com suas próprias
decisões comerciais e políticas com o resto do mundo. O período Joanino começa com
a mudança da Casa Real Portuguesa ao Brasil, especificamente para o Rio de Janeiro,
isso aconteceu a finais de 1807, e finaliza com a volta para Portugal de D. João VI em
1821. Nesse período de quase 14 anos muitos fatos importantes aconteceram para o
nascer do Brasil como país independente, conforme vamos ver mais adiante. Daí o seu
nome época Joanina, que vem do nome do Rei D. João VI quem ficou no Brasil desde
finais de 1807 até o ano 1821.

Diante desse grande acontecimento, a mudança da Casa Real Portuguesa,
talvez devermos nos perguntar quais foram os motivos do Rei João VI de Portugal vir
para os territórios coloniais do Brasil e marcar a sua residência no Rio de Janeiro? A
resposta curta, a expansão napoleônica da França que ameaçava a todas as nações
da Europa, logo, para evitar perder sus direitos o Rei D. João VI e toda a Casa Real se
mudaram longe do conflito aos territórios de sua maior colônia, o Brasil. A resposta mais
elaborada envolve mais detalhes, entre eles a geopolítica europeia e suas implicações
tanto em Portugal como em Brasil.

Neste contexto da situação europeia, para começos do século XIX a Europa


estava passando por uma série de transformações socioeconômicas que transformaram
sua geopolítica. Por um lado, a revolução industrial de finais do século XVIII tinha
convertido à Inglaterra e seu Império Britânico na nação mais poderosa da Europa e do
mundo. O Império espanhol que teve seu auge no século XVI e XVII estava em declive
e muito longe de ter sua própria revolução industrial. E a França monárquica tinha
colapsado ante o próprio processo da revolução industrial francesa, a qual mexeu a
estrutura social desse país, daí uma das consequências da própria Revolução Francesa
de 1789. Logo de pouco mais de uma década da Revolução Francesa, a França tinha
se convertido em uma nação ainda mais poderosa e que sob a liderança de Napoleão

8
Bonaparte desejava transformar e unificar a Europa, daí a rápida expansão da França
Napoleónica para quase toda Europa, mexendo as estruturas monárquicas dos países
europeus, entre esses Portugal.

3.1 A GEOPOLÍTICA DA ÉPOCA JOANINA E SUAS IMPLICAÇÕES


NO BRASIL
Nos começos da década de 1800, a França Napoleónica estava se expandindo
para quase toda Europa, com exceção do Império Britânico que se mantinha firme sob a
liderança de seu reino mais poderoso, isto é, a Inglaterra. Nesse contexto, para Napoleão
ficou praticamente impossível invadir o Reino Unido (Inglaterra, País de Gales, Escócia
e Irlanda), assim, ele quiz enfraquecer ao império Britânico com o decreto “Bloqueio
Continental”. Por meio desse decreto se proibia às nações da Europa comercializar com
o Reino Unido. Isso fez que qualquer nação que se aliasse com o Reino Unido ficasse
dentro desse “Bloqueio Continental”, o que veio acontecer com o Reino de Portugal
de maneira oficial quando toda uma frota Inglesa protegeu à família Real Portuguesa
na sua mudança para o Brasil bem a finais de 1807. Eis a opção Inglesa nas relações
internacionais que ficaram definidas com a casa Real de Portugal e logo com o Reino de
Brasil, conforme vamos ver mais adiante.

Nesse contexto histórico, a finais de 1807 as tropas de Napoleão estavam se


aproximando ao Reino de Portugal, assim, o Rei D. João VI de Portugal ao ponderar
quais seriam suas opções perante a eminente chegada das tropas de Napoleão tomou
a decisão de se mudar para seus territórios coloniais do Brasil. Foi sob essa pressão
de invasão que ele se mudou com toda a sua Casa Real, segundo o relato histórico de
(FAUSTO, 2013, p. 105):

Entre 25 e 27 de novembro de 1807, cerca de 10 a 15 mil pessoas


embarcaram em navios portugueses rumo ao Brasil, sob a proteção
da frota inglesa. Todo um aparelho burocrático vinha para a Colônia:
ministros, conselheiros, juízes da Corte Suprema, funcionários
do Tesouro, patentes do Exército e da Marinha, membros do alto
clero. Seguiam também o tesouro real, os arquivos do governo,
uma máquina impressora e várias bibliotecas que seriam a base da
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

Desse relato histórico cabe observar o trecho que diz: “[...] cerca de 10 a 15 mil
pessoas embarcaram em navios portugueses rumo ao Brasil, sob a proteção da frota
inglesa.” Deste trecho podermos inferir dois fatos históricos (FAUSTO, 2013, p. 105):

• O primeiro, que essa mudança da casa Real de Portugal implicava realmente uma
mudança da sede do Governo do reino de Portugal. Demandando de uma tremenda
logística de mais de 62 navios – conforme a revista histórica Multirio (2021) – para
trasladar a mais de 10.000 pessoas, entre elas: a família real, nobres e pessoal
burocrático da gestão governamental.

9
• O segundo, a proteção da frota Inglesa para proteger a logística desse mega
deslocamento da Casa Real Portuguesa implicava um acordo tácito entre o Império
Britânico e o Reino de Portugal. Acordo que ficou marcado historicamente como a
Opção Inglesa.

Então, a partir de finais de 1807 esse grande acontecimento da vinda do Rei. D.


João VI mudou para sempre as terras coloniais portuguesas no Brasil, entre as medidas
mais relevantes que marcaram o Brasil dessa época temos:

• A abertura dos portos brasileiros, mas somente para as nações amigas, ou seja, a
abertura dos portos para o comércio com o império Britânico. Pois existia o “Bloqueio
Continental” por meio do qual se proibia a toda nação europeia comercializar com a
Inglaterra e consequentemente com seus aliados, neste caso com o Reino de Portugal.
Contudo, logo que terminou as guerras napoleônicas em 1815 a abertura comercial
dos portos brasileiros às nações amigas implicou uma real abertura comercial para
diversas nações além do Império Britânico:

[...] com a chegada da paz, antigos inimigos também viriam a aportar


no Brasil, contribuindo para a diversificação da oferta e a importação
não só de bens materiais quanto de bens culturais, voltados para
uma nova forma de viver, expressa em novas necessidades, hábitos
e costumes (MENEZES, 2007, p. 121).

• Fábricas começaram a ser criadas, pois na época colonial estavam proibidas e perante
a mudança de Casa Real houve a necessidade de oferecer bens de qualidade que
sejam fabricados localmente.

• O início da educação superior no Brasil, com a vinda da família Real de Portugal e toda
sua comitiva de nobres e pessoal burocrático de seu governo houve a necessidade
de desenvolver a educação e cultura, dado que nas terras coloniais não se tinha
uma estrutura educativa e cultural ao nível da Casa Real. Assim, começou um
período de investimentos significativos nesse âmbito, entre os mais importantes as
universidades de Salvador e Rio de Janeiro, a construção de teatros e bibliotecas.
Nesse contexto, no ano 1808 aconteceu a instalação de primeira tipografia do Rio de
Janeiro, permitindo a abertura do primeiro Jornal “A Gazeta do Rio de Janeiro”, cujo
principal objetivo era a divulgação da informação oficial da Casa Real.

Essas foram as medidas mais importantes dessa época que colocaram o Brasil
colonial mais próximo para virar uma nação com infraestrutura mais alinhada para isso.
Enquanto isso acontecia aqui no Brasil, Portugal ficou arrasado, segundo artigo histórico
da UFSC (2016, p. 2): “Enquanto Portugal fora devastado pelas guerras napoleônicas na
Península Ibérica, a infraestrutura da ex-colônia foi modernizada e instituições estatais
foram criadas.”

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Todavia, há um acontecimento mais relevante, tanto no contexto de data
histórica como no posicionamento do Brasil nas relações internacionais, a mudança de
território colonial para virar reino. Isso aconteceu no Congresso das Nações de Viena no
ano 1815. A partir desse momento, o Brasil marcou o seu caminho para se transformar
em uma nação oficialmente independente somente uma década depois do Congresso
de Viena, isto é, 1825. Mas quais foram os motivos para que D. João VI tomasse a decisão
para que o Brasil se convertesse em um reino? A resposta está no Congresso das Nações
de Viena. No fim de 1814 e começo de 1815 ocorreu o Congresso das Nações de Viena,
cujo principal objetivo foi definir a nova ordem geopolítica das nações Europeias após
das guerras napoleônicas. Essa nova ordem geopolítica colaborou, historicamente, para
que as nações europeias pudessem evitar grandes enfrentamentos até o ano de 1914,
quando estourou a Primeira Guerra Mundial.

Mas qual era a relevância do Congresso de Viena para o contexto brasileiro


dessa época? As nações europeias que integravam o Congresso de Viena estavam
questionando que o Rei João VI de Portugal estivesse morando e governando de fato
desde a cidade de Rio de Janeiro. Ou seja, governando no território de uma de suas
colônias, e não desde seu Reino de fato, isto é, os reinos de Portugal e Algarves. Perante
esse questionamento o Rei João VI transformou a sua maior colônia como parte
integrante de seus reinos, eis o porquê da necessidade para que o Brasil mudasse a
sua condição de colônia para reino. Desse modo, a partir do ano 1815 oficialmente a
Casa Real de Portugal passou a ser conhecida como o Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarve e cuja capital oficial foi o Rio de Janeiro. Em resumo, no ano 1815 aconteceram
dois fatos essenciais para o processo do Brasil virar uma nação, esses dois fatos foram:
o Brasil passar de ser uma colônia para virar um reino da Casa Real Portuguesa, e que
no Reino de Brasil ficasse oficialmente a capital do Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarve, isto é, Rio de Janeiro.

ATENÇÃO
Vamos ver mais um pouco sobre o Reino Unido de Portugal, Brasil e
Algarve? União de reinos que durou desde 1815 até 1822? Acesse ao seguinte
link: Por que o Brasil foi elevado a reino unido? https://bit.ly/3tZs2zP

Assim, esses dois fatos históricos, o Brasil virar reino e que a capital do Reino
Unido de Portugal, Brasil e Algarve estivesse no Rio de Janeiro, fez que terminasse de
fato a época colonial e começasse a época do Brasil já como um reino e seu caminho
para virar oficialmente uma nação independente a partir de 1825. O Rei D. João VI de
Portugal morou no Brasil até 1821, terminando assim a era Joanina e as bases para
a independência do Brasil. Embora a data histórica da independência do Brasil foi no
dia 07 de setembro do ano 1822, o seu reconhecimento internacional já como nação
11
independente de Portugal só aconteceu três anos depois no ano 1825, tema de estudo
do seguinte tópico, mas antes disso vamos estudar sobre como era a política externa
do Brasil da era joanina.

3.2 POLÍTICA EXTERNA E DIPLOMACIA NO BRASIL JOANINO



Antes de começar nossos estudos sobre a política externa na época Joanina,
devermos observar que é partir dessa era é que realmente começa as relações
internacionais do Brasil. Na época colonial, as decisões nesse âmbito eram tomadas
desde Portugal, mas a partir de era joanina os interesses do Brasil, já como reino,
passaram a ser parte integrante dos interesses geopolíticos da Casa Real Portuguesa.

Além desse fato, a política externa brasileira da era joanina teve maior peso
dentro contexto do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve. Isso foi assim pelo simples
fato que a capital da Casa Real Portuguesa estivesse sediada no Rio de Janeiro e
já no mais em Lisboa. Nesse sentido, o Rei D. João VI deveria cuidar ainda mais dos
interesses e do desenvolvimento socioeconômico do Brasil. Ou seja, a partir de que o Rei
D. João VI se mudou para o Brasil, finais do ano 1807, grande parte de seu foco passou
para proteger os interesses de sua nova moradia, o Brasil, com isso novos interesses
geopolíticos estava sobre a mesa de decisões do Rei. E no contexto internacional quais
as implicações disso? Houve algumas implicações, mas antes disso vamos ler um pouco
sobre porque as nações têm “amigos”, e logo colocar esse conceito no contexto do reino
do Brasil da época de D. João VI.

NOTA
Sabe o qual o significado de geopolítica, especialmente no
contexto de política externa? Através da geopolítica as nações buscam
se posicionar perante as necessidades de seus espaços geográficos e
desenvolvimento socioeconômico de sua população, fazendo estratégias
de política tanto interna como externa em procura de posicionar melhor
seus interesses como nação. Para saber mais um pouco sore isso acesse
aqui: https://www.significados.com.br/geopolitica/

No contexto internacional, os interesses geopolíticos de uma nação estão


relacionados com os países “amigos” que um país possa ter em um determinado
momento. Nesse sentido, existe um ditado muito conhecido nas relações internacionais
dito pelo ex-secretário de estado dos Estados Unidos no ano 1953, John Foster Dulles:
“não há países amigos, mas interesses comuns.” (BRITANNICA, 2021, on-line). No caso
pontual do Brasil da época Joanina, quais eram os interesses da Casa Real Portuguesa?
Entre os mais destacados cuidar da geopolítica do reino de Brasil, o qual estava ainda
interligado ao de Portugal e ao aliado da Casa Real Portuguesa, a Inglaterra.

12
Nesse sentido, devermos nos lembrar que nessa época (começos do século XIX)
os reinos do Rei D. João VI vinham-se enfraquecendo e a posição geopolítica da Casa
Real Portuguesa, e de seus reinos, estava em constante ameaça de seus adversários
com maior peso internacional. Para o Brasil, isso implicava se cuidar com maior ênfase
da Francia e da Espanha, pois ambas as nações tinham territórios que faziam parte das
fronteiras do Brasil.

No caso da Espanha, praticamente todo o território brasileiro tinha fronteira


com as colônias espanholas, mas com maior poder de conflito e interesses geopolíticos
na fronteira sul, na Bacia da Prata, e principalmente nos territórios que hoje fazem
parte do Uruguai, já o resto dos territórios da fronteira eram ainda inóspitos cobertos
maioritariamente pela floresta amazônica. No caso da França, basicamente o Brasil
tinha que se cuidar de sua fronteira ao norte, o que hoje faz parte da Guiana Francesa.
Assim como devia-se de cuidar da ameaça do poder bélico e econômico da França
Napoleónica que já havia invadido quase toda a Europa Continental. Nesse contexto
histórico e geopolítico, qual poderia ser uma nação que pudesse ter interesses comuns
com os reinos de Portugal, Brasil e Algarve? O Império Britânico sob a liderança de seu
reino mais poderoso, a Inglaterra.

3.3 AS RELAÇÕES INTERNACIONAIS DO BRASIL JOANINO E A


AMIZADE DO IMPÉRIO BRITÂNICO

As relações internacionais do reino do Brasil deveriam levar em consideração
esse contexto histórico descrito anteriormente. Logo, como o Brasil Joanino poderia
se posicionar perante as ameaças e interesses das nações da época? E principalmente
perante os interesses da Espanha e da França? Entre outras cousas, se aliando e
procurando interesses comuns com uma nação ainda mais poderosa que essas nações.
Ou seja, uma nação que possa ajudar ao Brasil se posicionar com força firme em função
de seus interesses.

[...] a força pura, quer dizer, a força militar; a riqueza relativa. Quer
dizer a possibilidade econômica e financeira de se impor a outrem
seus próprios interesses; a influência ideológica que faz de um estado
modelo para os outros; o peso político que incita os ´pequenos’ a
buscar a proteção de um ‘grande’ para se proteger de outro ‘grande’
(GIRAULT, 1988, p. 95 apud MENEZES, 2007, p.110).

Assim, um aliado natural de Portugal e logo também do reino de Brasil seria uma
nação ainda mais forte que de seus adversários mais próximos, o Império Britânico. Nesse
contexto, o Brasil Joanino poderia se posicionar melhor com uma aliança estratégica
com o Império Britânico e assim apresentar uma imagem de força que seja firme em
função de sua posição geopolítica. Geopolítica que implicava um espaço geográfico

13
ideal para o comércio internacional, principalmente de mercadorias vindas de suas
colônias da África e da Ásia, e infelizmente o lucrativo tráfico de escravos africanos; e
exportação de suas commodities, entre os principais: o açúcar, a explotação do pau de
Brasil – embora nos começos do século XIX já explotação dele estava nos tempos finais,
em função do desmatamento agressivo da Manta Atlântica – e começando a produção
a grande escala do café e minerais preciosos.

Esses foram um dos mais importantes interesses que a Casa Real Portuguesa,
e consequentemente o Brasil, desejava proteger e que os britânicos tinham interesses
comerciais em proteger também. Porém, há ainda o fator político que afiançava ainda
mais o interesse de ter ao Império Britânico do lado amistoso, as ameaças do poder
político e bélico de França Napoleônica. Temos que nos lembrar que para começos do
século XIX a França Napoleónica se estava tomando quase toda a Europa Continental.
Esse avanço de suas tropas era de fato uma força que não era só bélica, mas implicava
mudanças geopolíticas e econômicas nas nações invadidas. Isso veio ser de grande
impacto para o Brasil, especialmente quando aconteceu a invasão para o Portugal
e log para Espanha por parte da França Napoleónica. A invasão da Península Ibérica
mudou para sempre a perspectiva histórica das colônias portuguesas e espanholas nas
Américas. No caso do Brasil com a vinda do Rei D. João VI de Portugal, e no caso das
colônias espanholas com o longo processo das guerras de independência.

Assim, a invasão de quase toda Europa Continental pela França implicava novos
posicionamentos geopolíticos e econômicos das nações europeias invadidas pela
França perante o comercio internacional. Implicava um confronto tácito com o maior
adversário da França Napoleónica, isto é, com a maior potência comercial e econômica
da época, o Império Britânico. Esse confronto tácito implicou o “Bloqueio Continental” ao
comércio internacional de todas as nações napoleónicas com o Império Britânico. Assim,
estrategicamente Napoleão poderia iniciar uma batalha econômica para enfraquecer à
Inglaterra, e demais reinos Britânicos, para logo iniciar uma estratégia de invasão às
Ilhas Britânicas. Coisa que nunca chegou a acontecer, pois às guerras napoleónicas
finalizam no ano 1815 com a perda da França Napoleónica de todas as nações invadidas.

ATENÇÃO
Qual o contexto geopolítico da Inglaterra e do Império Britânico?

O Império Britânico foi o maior império do século XVIII e XIX. Ele foi constituído pelos reinos
das Ilhas Britânicas que faziam parte do Reino Unido e de suas diversas e extensas colônias
ao redor do Mundo durante. Esses reinos das Ilhas Britânicas foram: a Inglaterra, o País
de Gales, a Escócia e a Irlanda. Reinos que foram liderados pela evidente força política e
econômica da Inglaterra e sua revolução industrial, daí que às vezes se pode confundir ao
Reino Unido como se fosse a Inglaterra. Hoje o Reino Unido está constituído pela seguinte
federação de países: A Inglaterra, o País de Gales, a Escócia e a Irlanda do Norte. A capital
do Reino Unido é Londres sediada na Inglaterra.

14
O Império Britânico depois da Independência de Estados Unidos do Reino Unido em 1776

Fonte: https://bit.ly/3wtkHeP

Assim, perante esse “Bloqueio Continental” os reinos da Casa Real Portuguesa


tiveram que se posicionar com quem lhe pudesse garantir seus interesses comerciais
intercontinentais e comércio entre seus reinos (basicamente entre o Brasil e o Portugal)
e suas diversas colônias na África e na Ásia. Nesse contexto, quem poderia ser um
melhor aliado para a Casa Real Portuguesa? O Império Britânico, que assim como o
Portugal era um império baseado no comercio internacional intercontinental, mas com
uma força econômica, industrial, comercial, superioridade marinha e bélica inigualável.

Nesse sentido, dos três maiores impérios intercontinentais (o Reino Unido, a


Espanha e o Portugal) tanto o Reino Unido como do Portugal tiveram uma longa aliança de
interesses comerciais e marinhos. Nos séculos XVI e XVII essa aliança tácita procurou um
balanço de forças contra o Império da Espanha (o maior desses séculos, mas começando
a se enfraquecer durante o século XVII) ponderando assim as forças e freando a excessiva
força geopolítica da Espanha, principalmente do século XVI. Para finais do século XVIII e
começos do século XIX, Portugal precisava da aliança do Império Britânico não somente
para ponderar forças contra a Espanha, mas também contra a França.

E o Império Britânico o que tirava em troca pela sua ajuda logística? Ter acesso
mais direto aos imensos recursos naturais do Brasil e comércio português de suas
colônias da África e da Ásia. Infelizmente, no contexto de abuso dos direitos humanos,
ambas as nações tinham interesses comerciais no comércio de escravos. Além dessas

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vantagens comerciais para o Império Britânico, também era conveniente ter um aliado
que tenha seu reino próximo na entrada do Mediterrâneo e proteção ao longo do litoral
africano, assim ficava mais fácil para o Império Britânico navegar pelo Mediterrâneo e
pela África, ambas rotas importantíssimas para o comércio internacional dessa época,
pois eram rotas que forneciam à Europa de diversas mercadorias vindas de Oriente.

Assim, nesse contexto econômico e geopolítico que o reino de Portugal foi


se posicionando como “amiga” da Inglaterra dos séculos XVI e XVII, e logo depois, da
Inglaterra como reino líder do Império Britânico. Essa aliança tácita que logo continuou
com o Reino de Brasil fez que um reino menos forte como do Brasil e Portugal pudessem
se posicionar no cenário internacional de uma maneira mais forte ante a França
Napoleónica e suas nações invadidas. E logo depois de 1814 se posicionar de maneira
firme contra a Espanha e França pós Napoleão.

Devermos nos lembrar que nessa data, 1814, a França Napoleónica tinha
praticamente a guerra perdida, o que de fato aconteceu um ano mais tarde, em 1815.
Quando a França perdeu a guerra voltou a suas fronteiras tradicionais; perdendo todos
os direitos de fato das nações europeias tomadas. Ou seja, a partir do ano 1814 já no
contexto regional daqui das Américas o Brasil tinha que se posicionar ante os interesses
das colônias espanholas e ante os interesses da França pós Napoleão e seu território
colonial da Guiana Francesa. No que tange a França Napoleónica e suas implicações à
geopolítica brasileira é necessário que podarmos entender quais foram as repercussões
das guerras napoleônicas tanto na Europa como nas Américas.

3.4 AS GUERRAS NAPOLEÔNICAS E SEU IMPACTO GEOPOLÍTICO


E SOCIAL

A partir de Revolução Francesa e da ascensão ao poder de Napoleão Bonaparte,


a Europa e o Mundo mudaram para sempre. Algumas das monarquias europeias caíram
e outras nunca mais conseguiram recuperar seu poder geopolítico, os povos dessas
nações europeias começaram ter mais representatividade política e houve um aumento
dos direitos de seus cidadãos, entre outras coisas. Essas mudanças não só ficaram
na Europa, se espalharam também para as Américas, começando com a ascensão da
dinâmica geopolítica dos Estados Unidos que passou de colônia do Império Britânico
para virar nação independente já para finais do século XVIII.

16
FIGURA 1 – NAPOLEÃO LIDERANDO SEU DESEJO DE UNIR A EUROPA SOB UMA SÓ NAÇÃO

FONTE: <https://bit.ly/3IiYeTE>. Acesso em: 30 jan. 2022.

Essas mudanças se espalharam também para os vastos territórios dos vice-


reinados espanhóis ao longo das Américas e para o Brasil. Assim, logo de 1814 quando a
França Napoleónica perdeu a guerra, as Américas já não eram mais as mesmas. O Brasil
tinha passado de ser uma colônia para fazer integrante do Reino Unido de Portugal,
Brasil e Algarves, logo das guerras napoleónicas o poder geopolítico dos Estados Unidos
ficou evidente perante as nações europeias, e os vice-reinados espanhóis não queriam
ser mais governados pela Espanha. Assim, a partir da década de 1810, o vasto território
colonial Brasileiro passou ser considerado um reino, e na América Espanhola começaram
as longas guerras pela independência.

DICA
Quer saber ainda mais sobre as Guerras Napoleônicas? Há muitos
livros de contexto histórico e geopolítico sobre isso, nesse link você pode
acessar para livros interessantes sobre essa época transcendental sobre
muitos contextos: https://bit.ly/3JpmDIU.
Assim como há diversos artigos interessantes, tal como: As Guerras
Napoleônicas mudaram as relações geopolíticas da Europa

Fonte: https://glo.bo/3MVOcLV

3.5 O FIM DA ERA JOANINA

Para finalizar a era Joanina vamos nos focar sobre a política externa do Brasil
perante os interesses da França no seu território colonial da Guiana Francesa, e dos
interesses geopolíticos e econômicos que tinha a Espanha Colonial na fronteira sul do

17
Brasil, o que hoje faz parte dos territórios de Uruguai. Devermos nos lembrar que os
interesses dessa época aqui na América do Sul era um reflexo do jogo da geopolítica
que vinha acontecendo na Europa, conforme o historiador Menezes (2007, p.124)

Em termos de política externa desenvolvida entre 1808 e 1821,


relativa ao continente sul-americano, podemos dizer que ele se
apresenta como desdobramento natural da política europeia, visto
envolver os dois inimigos principais de Portugal: França e Espanha,
ambos presentes nas fronteiras brasileiras.

Levando em consideração esse desdobramento natural mencionado pelo


historiador Menezes, logo depois que a Casa Real Portuguesa se estabelecera no Rio
de Janeiro D. João VI mandou suas tropas para invadir o território colonial francês da
Guiana Francesa. Qual era estratégia disso? D. João VI já estava pensando usar esse
território invadido como elemento de negociação contra a França uma vez que as
Guerras Napoleónicas terminassem e ele pudesse recuperar o território de seu Reino
de Portugal, coisa que de fato aconteceu no ano 1814 e nas negociações das nações
europeias durante o Congresso de Viena de 1815. Conforme o relato do historiador
Menezes (2007, p.125) podermos conferir esse acontecimento histórico da era joanina.

A declaração de guerra à França, por manifesto datado de 1º de maio


de 1808, pouco depois da Família Real chegar ao Brasil, tornou sem
efeito todos os tratados anteriores envolvendo as fronteiras com a
Guiana. Em janeiro de 1809 tropas portuguesas e brasileiras tomaram
posse de até então território francês, permanecendo o mesmo sob
domínio português durante os oito próximos anos.

E com os territórios colonais espanhois qual foi a estratégia do Rei. D João


VI? Devemos lembrar que a Espanha foi invadida também pela França, logo todos
seus territórios das Amércias estavam sob o dominio da França Napoleónica. Portanto,
D. João VI aplicou uma estratégia semelhante, mas com foco na fronteira sul, onde
acontecia com mais intesidade o comércio entre o Brasil e os territórios colonais da
Espanha, pois o resto da vasta fronteira do Brasil dessa época com os demais territórios
espanhois eram inóspitos cobertos na sua maior parte pela floreta amazônica. Porém,
na fronteira sul do Brasil o contexto da invasão além de se posicionar melhor ante a
França Napoleónica tinha também motivos econômicos e gepolíticos focados na rica
Bacia da Prata.

Nesse contexto, o conflito na fronteira sul da Banda Oriental, o que hoje é
o Uruguai, levou muito mais tempo, estrategias e recursos. Inclusive logo depois de
terminar as Guerras Napoleónicas em 1814, quando os territórios colonais da América
Espanhola voltaram para Espanha o conflito continou, com inclusão dos terriotórios da
Banda Oriental ao Reino de Brasil.

18
Enquanto o conflito na Guiana era mais de caráter efêmero, o caso
cisplatino, porém, sugeria uma própria agenda brasileira. Por motivos
geostratégicos e econômicos, a região da atual república do Uruguai
era incorporado ao Império, e o conflito continuou por muito tempo
(UFSC, 2016, p. 9).

No ano 1817, o Brasil acabou tomando grande parte da Banda Oriental e sua
capital, Montevidéu, anexando esse território, oficialmente, como a Provincia Cisplatina
no ano de 1821. Esse terrtório ficou sob dominio de Brasil até a independencia de Urugai
do Brasil no ano 1828, isso aconteceu logo de três anos de guerra intensa entre o Brasil
e a Argentina (seu nome oficial dessa época era as Províncias Unidas do Rio da Prata).
Nesse contexto, ambas as nações estavam interessadas em anexar esse território, mas
ao final da guerra em 1828 nenhuma das duas conseguiram isso. O território da Provincia
Cisplatina ficou como nação independente, o Uruguai de hoje, conforme vamos estudar
isso com mais detalhe no próximo tópico e seu impacto na abdicação de D. Pedro I.

CURIOSIDADE HISTÓRICA
O Uruguai fez parte do Brasil desde finais da década de 1810 até finais da década de
1820, mas acabou declarando a sua independência do Brasil no ano 1828. Esse território
foi a província mais austral do Brasil Imperial. Se quiser se aprofundar sobre a história
da Província Cisplatina acesse ao seguinte artigo: A Província Cisplatina do ponto de
vista brasileiro: <https://bit.ly/3tZA2AR>.

Bandeira da Província de Cisplatina no formato do mapa

Fonte: https://bit.ly/3CRgS3Z

19
Estamos chegando ao final de nossos estudos deste tópico, revise os temas
mais importantes com a ajuda de Resumo do Tópico 1. Depois disso, não deixe de realizar
as autoatividades!

20
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Exista a importância das dimensões, o posicionamento geográfico e a população do


Brasil no contexto da Política Externa do país.

• Há a necessidade de saber qual o Brasil de hoje no contexto de seu tamanho


continental e diversidade populacional para começar estudar a Política Externa do
Brasil desde os inícios de seu processo para virar nação independente.

• A relevância de visualizar a geopolítica europeia de começos do século XIX e suas


implicações para que o território colonial brasileiro virasse reino e virasse também o
centro das decisões geopolíticas dos reinos do Rei D. João VI são muito importantes.

• Existe a importância de saber o contexto histórico da política externa do Brasil


Joanino e a relevância da amizade com o Império Britânico para que o Brasil dessa
época se possa posicionar firme nas suas relações internacionais.

21
AUTOATIVIDADE
1 Existem diversos fatos históricos que fazem parte dos fundamentos que ajudaram a
delimitar o vasto território nacional do Brasil de hoje. Entre eles se tem o Tratado de
Tordesilhas, o qual a finais do século XV:

a) ( ) Logo de mais de um século de conflitos foi peça chave para delimitar os territórios
dos territórios coloniais de Portugal e da Espanha.
b) ( ) Deixou claro a negação de direitos sobre os vastos territórios das Américas a
qualquer outra nação, exceto os direitos definidos para a Espanha e o Portugal.
d) ( ) Acabou com o conflito pelos interesses que tinham a Espanha, o Portugal e a
Inglaterra sobre os territórios colônias que essas nações europeias tinham nas
Américas.
e) ( ) A Espanha, o Portugal e a Inglaterra estraram em conflito pelos territórios das
Américas, assim com esse tratado ficou definido quais seriam os diretos dessas
três nações, especialmente acabou o conflito entre a Espanha e o Portugal.

2 Considera-se que o Congresso das Nações de Viena que aconteceu entre finais de
1814 e 1815 foi uma peça-chave para a nova ordem geopolítica das nações após
das devastadoras guerras napoleônicas, as quais transforam para sempre as nações
europeias. Embora a França Napoleónica tivesse perdido a guerra, muitas casas reais
perderam seus direitos e outras tiveram que entregar espaço de poder político aos
representantes do povo. Mas qual a relevância do Congresso das Nações de Viena de
1815 para o Brasil? Com base nessa pergunta, analise as sentenças a seguir:

I- Assim como na Europa onde muitas casas reais perderam parte de seu poder político,
o rei D. João VI teve que renunciar parte de seu poder político aos representantes
da população de seu reino de Brasil. Eis a importância do Congresso das Nações de
Viena.
II- Perante a pressão das outras nações que faziam parte do Congresso das Nações
de Viena, as quais estavam questionando o porquê o Rei D. João VI estava morando
e governando desde os territórios coloniais do Brasil e não desde seu reino de fato
de Portugal, o Rei D. João VI tomou a decisão de converter ao Brasil em reino. Eis a
importância do Congresso das Nações de Viena.
III- O Congresso das Nações de Viena junto a pressão da França e da Espanha fez que
Portugal tivesse de abdicar seus direitos como sede do reino da Casa Real do rei
D. João VI e assim os territórios colônias do Brasil passaram a ser nova moradia da
Casa Real de Portugal. Eis a importância do Congresso das Nações de Viena.

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Assinale a alternativa correta:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença II está correta.
c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 A amizade dos reinos de Portugal, Brasil e Algarve com o Império Britânico foi uma
aliança que trouxe uma posição firme para que o novo reino de Brasil pudesse se
posicionar no cenário internacional. Definas quais das seguintes sentenças são
corretas sobre esse contexto de amizade com o Império Britânico.

( ) A amizade mais importante foi com a Inglaterra, país possuidor de todos os territórios
que fazem parte do Império Britânico.
( ) O reino de Brasil precisava se posicionar firme perante aos interesses territoriais e
comerciais das coloniais nas Américas tanto da França como da Espanha, assim
uma aliança com os britânicos ajudou nisso.
( ) Os interesses comuns entre o Império Britânico e os reinos de Portugal, Brasil e
Algarve foram os fundamentos para que essa amizade fosse firme.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta:

a) (   ) V - F - F.
b) (   ) V - F - V.
c) (   ) F - V - F.
d) (   ) F - V - V.

4 A França Napoleónica com sua perspectiva de unificar toda a Europa tinha o desejo de
aderir todas as nações europeias sob a sua liderança, assim, nos primeiros anos do século
XIX quase toda Europa Continental foi tomada sob a sua liderança. Porém, nessa visão
de uma Europa unificada ainda estava ficando de fora o Reino Unido, e ao não ter a força
suficiente para invadir as Ilhas Britânicas, principalmente à Inglaterra, Napoleão teve a
estratégia de fazer um “Bloqueio Continental” à Inglaterra e demais reinos Britânicos.
Nesse contexto, estrategicamente Napoleão poderia iniciar uma batalha econômica para
enfraquecer à Inglaterra para logo assim ter força suficiente e invadir as Ilhas Britânicas.
Sobre esse “Bloqueio Continental” determine a sequência correta:

I- A estratégia de Napoleão quase deu resultado, pois no ano de 1813 a França invadiu
as Ilhas Britânicas, ante uma Inglaterra enfraquecida. Porém, todos os reinos
Britânicos ficaram unidos e finalmente Napoleão perdeu a batalha de invadir as
Ilhas Britânicas, dando início ao final das guerras napoleónicas no ano 1815.
II- O Bloqueio Continental significava que todas as nações europeias invadidas pela
França Napoleónica, ou seja, quase toda a Europa, no pudessem comercializar com
o Império Britânico, logo, com as nações amigas da Inglaterra.

23
III- O Bloqueio Continental significou para o Brasil que com a única nação amiga que
poderia fazer comércio internacional seria com o Império Britânico, porém, a partir
de 1815 seu comércio internacional se abreu para todas as nações europeias pois
tinha acabado o Bloqueio Continental.

a) ( ) A sentença III é sequência da sentença I, e a sentença II é incorreta.


b) ( ) A sentença III é sequência da sentença II, e a sentença I é incorreta.
c) ( ) A sentença III não é sequência da sentença II, e a sentença I é incorreta.
d) ( ) A sentença III não é sequência da sentença I, e a sentença II é incorreta.

5 Segundo muitos historiadores, e expertos sobre o tema das relações internacionais


do Brasil, a época joanina foi uma era fundamental para os inícios da política externa
do Brasil. Sobre essa isso, disserte sobre a importância da era joanina na política
externa do Brasil e o porquê é considerada os começos dela.

6 A era joanina pode ser considerada como os primeiros passos para um Brasil mais
independente de Portugal, pelo simples fato que o Rei D. João VI passou governar
sues reinos desde sua a maior colônia, o Brasil. Assim, desde finais do ano 1807 o
Brasil passou a ser o centro do poder político da Cara Real de Portugal. A seguir
explique quais foram os motivos que levaram a D. João VI para governar seu império
desde a cidade de Rio de Janeiro.

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UNIDADE 1 TÓPICO 2 -
INDEPENDÊNCIA DO BRASIL
E RECONHECIMENTO

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste Tópico 2, abordaremos o processo de consolidação do Brasil
como nação independente e as implicações disso na política externa. No Tópico 1 foi
abordado a era joanina, a qual é considerada a primeira etapa para o Brasil começar
seu processo de independência, isto é, quando o Brasil passou de ser colônia para virar
reino. Na era joanina, com a mudança da Casa Real de Portugal para o Rio de Janeiro,
em 1807, o Brasil se converteu no centro do poder de decisão geopolítico de Portugal e
Brasil. Já ao final do Tópico 1 foi mencionado da volta do Rei D. João VI para Lisboa no
ano 1821, e logo depois no dia 07 de setembro de 1822 foi proclamada a independência
do Brasil. Porém, independência que foi reconhecida internacionalmente somente
quase três anos depois disso, no ano de 1825.

Quais foram os motivos que forçaram D. João VI retornar para seu reino de
Portugal e por que o reconhecimento internacional da independência demorou quase
três anos, desde 07 de setembro de 1822 até agosto de 1825? A resposta curta para isso
foi que D João VI estava pressionado pela onda liberal que se havia espalhado por todo
o território de Portugal, logo, ele tinha que voltar para Lisboa e se posicionar como líder
e monarca de Portugal. Antes de partir para Lisboa ele designou a seu filho mais velho,
D. Pedro de Alcântara de Bragança, como príncipe regente do Brasil, o qual logo depois
fez a declaração de independência no dia 07 de setembro de 1822. O príncipe regente D.
Pedro fez isso perante a ameaça iminente de que Portugal tomasse a decisão de que o
Brasil voltasse à condição de colônia.

Diante desses fatos históricos devermos nos perguntar, por que D. João VI
estava pressionado pela onda liberal que se estava espalhando por Portugal? No ano de
1820 aconteceu a Revolução Liberal de Porto que reclamava, entre outras coisas, o fim
do absolutismo, a implementação da primeira Constituição portuguesa e exigir que o
Brasil voltasse de novo para sua antiga condição de colônia. Assim, perante esses fatos
políticos que faziam colocar seu poder monárquico em perigo, D. João VI voltou para
Portugal, logo de ter morado no Brasil entre finais de 1807 até 1821 e ter feito do Brasil o
centro de poder político e econômico de seus reinos de Portugal, Brasil e Algarve.

Em 26 de abril de 1821, com receio de perder sua autoridade real, D.


João VI, após 13 anos no Brasil, retorna para Portugal e deixa seu
filho, D. Pedro (nome completo: Pedro de Alcântara Francisco Antônio
João Carlos Xavier de Paula Miguel).
Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança
e Bourbon), como príncipe regente do Brasil (ALVES, 2016, n.p.).

25
Diante desse contexto político em Portugal, D. João VI pensou estrategicamente
em manter seu reino do Brasil por meio da designação de seu filho mais velho como
príncipe regente do Brasil. Conforme o dito pelo próprio D. VI: “Pedro, se o Brasil tiver de
se separar, antes seja para ti, que me hás de respeitar, do que para qualquer um desses
aventureiros” (ALVES, 2016). Ou seja, o grande mentor da independência do Brasil de
Portugal foi o próprio D. João VI de Portugal. Com essa estratégia D. João VI estava
pensando acalmar o desejo das Cortes Portuguesas para que o Brasil voltasse a ser uma
colônia, e se a independência tivesse que acontecer, pelo menos ficaria sob o poder
monárquico de seu filho D. Pedro.

Contudo, apesar de que D. João VI tenha voltado para Lisboa e tenha deixado
a seu filho, D. Pedro, como príncipe regente do reino de Brasil, a pressão em Portugal
para que o Brasil voltasse a sua condição de colônia continuava firme, inclusive
as cortes portuguesas da nova ordem política exigiam que seu filho voltasse para
Lisboa. Diante disso D. Pedro, Príncipe Regente do Brasil, começou a liderar as forças
de independência do Brasil, e no dia 07 de setembro de 1822 o Brasil tinha feito a
declaração de independência. Porém, no contexto internacional a independência foi
somente reconhecida quase três anos depois, fato histórico com suas implicações na
política externa do Brasil que vamos estudar nas seguintes páginas.

2 A INDEPENDÊNCIA DE BRASIL DE 1822



Logo após Brasil ter mudado a sua condição territorial de colônia para reino,
os brasileiros dessa época começaram sentir a importância disso para seus interesses,
desenvolvimento socioeconômico e poder de decisão de sua própria gestão política
e interesses geopolíticos perante o cenário internacional. Assim, o almejo por parte
de Portugal para de que o Brasil voltasse a ser uma colônia foi um choque político e
emocional forte para os brasileiros da época. Esse almejo estava contra os interesses
das novas forças da política portuguesa de começos da década de 1820, principalmente
dos liberais. Nesse contexto, o processo de consolidação do Estado Brasileiro como
nação independente começa com esse fato histórico de Portugal ambicionar que o
Brasil voltasse para sua condição de colônia de Portugal.

Mas para entender melhor esse processo de independência vamos estudar


alguns fatos históricos que estavam acontecendo na Europa e no processo de
independência das colônias espanholas nas Américas. Embora as nações europeias
recuperaram seus espaços geográficos que tinham antes de começar as guerras
napoleónicas, a dinâmica geopolítica do continente europeu mudou para ficar, grande
parte das ideias da Revolução Francesa de igualdade de direitos e representatividade
política do povo nas decisões da gestão política de suas nações estava crescendo
intensamente. Também era pós Napoleão significou o final para grande parte das
monarquias absolutistas. Nessa movida de acontecimentos, um dos movimentos

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políticos que estava tomando força foi o liberalismo, se espalhando por toda a Europa.
Na Espanha foi um dos fundamentos para as longas guerras de independência que
aconteceram nas suas colônias nas Américas, as quais finalizaram em uma onda de
independências ao longo da América Latina nas décadas de 1810 e 1820, exceto Cuba
que só conseguiu a sua independência da Espanha no ano de 1898. No contexto
histórico de Portugal, o movimento liberal foi liderado pela Revolução do Porto, a qual
repercutiu diretamente na independência do Brasil.

2.1 A REVOLUÇÃO DE PORTO E SEU IMPACTO NA DECLARAÇÃO


DE INDEPENDÊNCIA DO BRASIL

Embora a invasão da França Napoleônica a Portugal tenha durado pouco


tempo, graças à intervenção do Império Britânico, ela devastou a economia portuguesa.
Enquanto isso, no outro lado do Atlântico o Reino de Brasil experimentava crescimento
econômico e desenvolvimento regional. Para os portugueses parecia que D. João VI
tinha abandonado seu reino principal. Nesse sentido, os portugueses sentiram que o
centro de poder de seu reino estava no outro lado do oceano Atlântico. “A ex-metrópole,
após ter se libertado das tropas francesas, era administrada como protetorado inglês,
enquanto o Brasil desvinculava-se da tutela britânica e tornou-se o verdadeiro centro
do Império Luso.” (UFSC, 2016, p.2) Foi sob esse contexto socioeconômico e político que
o movimento liberal se tornou ainda mais forte e acabou se manifestando de maneira
firme na Revolução de Porto do dia 24 de agosto de 1820.

NOTA
O Império Luso foi em termos históricos o que se conhece como o Império Português,
conforme relato histórico da Universidad Nacional de La Plata (2017, n.p.):

O Império Ultramarino Português é o primeiro império global


da história e o mais antigo dos impérios coloniais europeus
modernos. Sua duração abrange quase seis séculos de
existência. Desde a tomada de Ceuta em 1415 até à rendição de
Macau em 1999, o mundo português, a sua língua e a sua cultura
espalharam-se por um número considerável de territórios que
hoje fazem parte de 53 Estados soberanos diferentes.

27
Mapa da Influência Comercial do Império Luso nos séculos XVII e XVIII

FONTE: https://bit.ly/3wda1Rl

No ano 1820, a cidade de Porto era, e é ainda, a segunda maior cidade de


Portugal e muito importante em termos econômicos. Os comerciantes da cidade dessa
época experimentaram de maneira dramática na era joanina a queda comercial e
econômica de sua cidade, assim como o resto de Portugal. E sentiram como a dinâmica
do comércio internacional do reino passou para os portos de Brasil. Nesse contexto,
com o Tratado de Abertura dos Portos do Brasil em 1808, assinado pelo rei D. João IV, o
comércio dos portos brasileiros tomou conta de grande parte do comércio que os portos
portugueses estavam acostumados ter, principalmente com o Império Britânico.

Em 28 de janeiro de 1808, o então príncipe regente, d. João, ordenava


na Bahia a abertura dos portos às nações amigas. Apesar de ter sido
criada em caráter interino e provisório, as dimensões de tal medida
afetaram substancialmente as relações entre Portugal e Brasil
(ARQUIVO NACIONAL, 2018, n.p.).

E se somar nisso a onda liberal que estava tomando conta das nações europeias,
era questão de tempo para que a Revolução de Porto acontecesse. Quais foram as
implicações imediatas dessa Revolução para o reino de Brasil? A queda do absolutismo,
ou seja, o Rei D. João VI não tinha mais poderes absolutos; a partir desse momento as
cortes portuguesas se tornaram mais fortes e exigiam mudanças que estejam de acordo
com os princípios liberais da época, conforme o historiador Alves Filho (2008, p. 103):

A revolução de Porto contou com o largo apoio da burguesia mercantil,


dos militares e do Clero. Além de exigir a volta da Corte a Lisboa, o
movimento reivindicava o estabelecimento de uma monarquia
constitucional e a restauração do exclusivismo do comércio, da
maneira anterior a existente ao decreto de Abertura dos Portos (1808),
como forma de recompor a dignidade e as finanças portuguesas.

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Com essas exigências políticas e comerciais (a abolição do decreto da Abertura
dos Portos) o reino do Brasil ficava em uma posição enfraquecida, tanto assim que
logo foi exigido para que o Brasil voltasse a ser colônia. Esses fatos, entre os mais
importantes, forçaram a volta do Rei D. João VI para Lisboa. Embora dele ter voltado
para Portugal e ter deixado a seu filho D. Pedro como príncipe regente do Brasil, não foi
suficiente para frear a demanda para que o Brasil voltasse a sua condição de colônia.
Sob essa pressão política D. Pedro regente do Brasil liderou a independência do Brasil
no dia 07 de setembro de 1822.

ATENÇÃO
Como foi o retorno de D. João VI para Portugal?

D. João VI retornou para Portugal com aproximadamente quatro mil


pessoas em 1821, no entanto, deixou seu filho D. Pedro, futuro D. Pedro I,
como regente do Brasil. As tensões provocadas pelas cortes portuguesas
com o Brasil e com D. Pedro I criaram as bases para a ruptura que deu
início ao processo de independência do Brasil.

2.2 A INDEPENDÊNCIA DE BRASIL DE 1822 E A DEMORA DO


RECONHECIMENTO INTERNACIONAL

Assim como já foi descrito nas páginas anteriores, embora a independência do
Brasil foi declarada no dia 07 de setembro de 1822, levou quase três anos para que ela
fosse aceita no contexto internacional, no dia 28 de agosto de 1825. Quais foram os
motivos para isso? A resposta disso está na Europa e nas novas nações de América
Latina que tinham acabado de se tornar independentes. Temos que observar que a
declaração de independência do Brasil foi muito diferente, se comparar aos processos
de independência das ex-colônias da Espanha. Nesse sentido, para entender melhor o
processo de independência vamos ler sobre o que estava acontecendo na Europa.

Logo das guerras napoleónicas as grandes nações europeias monárquicas


- a Áustria, a Prússia e a Rússia – formaram a coalisão conhecida como a “Santa
Aliança”, que buscava conter a onda liberal que se estava espalhando na Europa.
Nesse sentido, a “Santa Aliança” liderou as forças que estavam contra do liberalismo
no continente europeu. Além de se opor contra o liberalismo também estavam contra
qualquer independência das colônias europeias. Assim, quando foi declarada a
independência de Brasil em 1822, os países europeus sob a forte influência da “Santa
Aliança” estavam contra disso. Das nações europeias, a única que não estava sob a
influência da “Santa Aliança” era o Reino Unido, o qual liderado por seu maior reino,
a Inglaterra, começou um processo de intermediação para conseguir a declaração
internacional de independência do Brasil.

29
Entretanto, as novas nações de América Latina tinham passado por um longo
processo de guerras contra a Espanha para conseguir as suas independências, sendo
que todas as independências desses países tiveram uma visão que estava alinhada ao
movimento liberal e de cunho republicano. Entretanto, no Brasil a independência foi
de cunho imperialista, liderada pelo próprio filho de D. João VI, ou seja, liderada pelo D.
Pedro d’Alcântara de Bragança e Bourbon, emparentado com as casas reais da Espanha,
da Áustria, da monarquia deposta da França e mais outras, ou seja, relacionado com os
interesses monárquicos da Europa.

D. Pedro tomou posse como Imperador do Brasil no dia 12 de outubro de 1822,


e seu nome oficial a partir dessa data foi Imperador D. Pedro I de Brasil, isto é, um mês
depois do “Grito de Ipiranga” quando foi declarada a independência do Brasil. Nesse
contexto, as novas nações de América Latina, ex-colônias da Espanha, tinham receio
que desde o Brasil Imperial pudesse começar uma onda de movimentos imperialistas
que acabassem com suas recentes independências da Espanha. Assim, essas nações
não estavam muito a fim do Brasil Imperial, e reconheceram a sua independência
somente depois que os países europeus e os Estados Unidos fizeram isso em 1824 e
1825 respectivamente.

Paradoxalmente, nesse contexto geopolítico, na Europa o movimento da


“Santa Aliança” que lutava contra o liberalismo se opôs em reconhecer qualquer tipo
de independência de colônias europeias, mesmo se a independência estava liderada
pelo filho do Rei D. João VI, quem procurava manter a linhagem imperial no Brasil. Por
outro lado, as novas nações da América Latina estavam desconfiadas do Brasil Imperial
que estava surgindo. Assim, internacionalmente não havia vontade para reconhecer a
independência do Brasil.

Qual foi o caminho para finalmente ter o reconhecimento internacional? O Brasil


Imperial de D. Pedro I conseguiu negociar a intermediação de Reino Unido, por meio da
liderança de seu reino mais forte, a Inglaterra. Assim, como conseguiu procurar o apoio
da maior nação das Américas, os Estados Unidos. Tanto as alianças feitas com o Reino
Unido como com os Estados Unidos tiveram um custo alto para o Estado Brasileiro,
conforme vamos ver a seguir.

2.3 O RECONHECIMENTO INTERNACIONAL DA INDEPENDÊNCIA


DE 1825: A política externa brasileira e o processo de consolidação
do estado nacional

O Reino Unido além de não fazer parte da “Santa Aliança” tinha interesses
importantes com o Brasil, especialmente os britânicos queriam garantir seus privilégios
comerciais e políticos que, aliás, já vinham aproveitando com o Brasil da era joanina,
conforme relato histórico do Arquivo Nacional (2018, n.p.):

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Em carta a d. Rodrigo de Souza Coutinho, de 7 de novembro de
1810, o conde de Aguiar, d. Fernando José de Portugal e Castro,
ministro e secretário dos Negócios do Brasil e da Fazenda, instrui o
conde de Linhares a fazer chegar a governadores das capitanias e
desembargadores do Rio de Janeiro a necessidade de se observar o
tratado de comércio feito entre as cortes de Portugal e Grã-Bretanha.
Esclarece ser imprescindível que os negociantes ingleses paguem
o exigido por lei no caso de depósito e baldeação dos produtos e
manufaturas inglesas, assim como os portugueses pagavam os
direitos sobre os gêneros da produção do Brasil quando utilizavam os
depósitos da Grã-Bretanha.
O Tratado de Comércio e Navegação a que se refere o conde de
Aguiar visava retomar as vantagens já consolidadas pelos ingleses
em Portugal no século anterior, enquanto ampliava sua presença na
América portuguesa. À frente da transferência da corte para o Rio de
Janeiro, os ingleses logo se tornaram uma próspera comunidade do
ponto de vista da atividade comercial e da influência política de que
era partidário um dos missivistas, d. Rodrigo de Souza Coutinho, de
notável biografia nos círculos ilustrados e nas pastas ministeriais - da
Marinha e Domínios Ultramarinos e agora da Guerra e Estrangeiros.

Desse relato histórico fica vivo o nível de influência dos britânicos já dentro das
atividades comerciais e políticas da gestão governamental do Brasil Joanino. Assim,
como os britânicos tinham interesses comerciais e políticos aqui no Brasil, também
os tinham com as nações na Europa Continental, porém, interesses de maior peso
geopolítico. Maior peso em função de serem nações vizinhas do centro de poder da
Inglaterra e de serem nações com interesses comerciais e políticos de muito maior peso
dos que tinham os britânicos com o Brasil.

Nesse contexto e sob essa visão de proteger seus interesses no Brasil e ao


mesmo tempo não confrontar a seus vizinhos do continente europeu, especialmente
Portugal, os britânicos começaram em fazer gestão diplomática com Portugal, visando
que seja a primeira nação europeia em reconhecer a independência do Brasil e assim
conseguir manter seus interesses geopolíticos em ambas as nações, ou seja, o Brasil e
o Portugal. Estrategicamente se Portugal reconhecesse a independência do Brasil, logo,
as demais nações fariam isso em sequência rápida.

Esse processo de negociações diplomáticas demorou alguns anos, até que no


dia 25 de agosto de 1825 Portugal reconheceu a independência do Brasil, logo disso as
demais nações europeias começando pelo Reino Unido reconheceram a independência
do Brasil. Porém, será que o Reino Unido fez todo esse processo diplomático só pela boa
vontade de amizade e interesses com o Brasil? Os britânicos aproveitaram a conjuntura
geopolítica para tirar alguns benefícios adicionais, principalmente comerciais e
financeiros, conforme vamos estudar mais adiante.

E nas Américas? Conforme temos visto, os demais países da América Latina, que
recentemente tinham feito a suas independências da Espanha, estavam desconfiados
em reconhecer a independência do Brasil Imperial. Foi a partir do reconhecimento dos

31
Estados Unidos que os demais países das Américas tiveram o incentivo de ponderar o
reconhecimento do Brasil como uma nação independente. Aliás, os Estados Unidos foi
o primeiro país em reconhecer a independência do Brasil, no ano de 1824.

Temos que observar que os Estados Unidos também foram ex-colônia, do


Reino Unido, assim a nova nação de Norte América tinha o interesse político que os
demais países das Américas começarem seus próprios processos de independência.
Reflexo disso foi o conhecido ditado, em 1823, do presidente James Monroe dos
Estados Unidos dessa época: “A América para os americanos", ele “defendia o direito à
soberania das nações e era contrária a qualquer intervenção europeia no continente
americano.” (Multirio, 2021) Mas seria só isso, a mera vontade de que a “A América para
os americanos”? Devermos observar que entre as nações não existe uma ‘amizade
pura”, vamos nos lembrar do conhecido ditado do ex-secretário de estado dos
Estados Unidos John Foster Dulles? ““não há países amigos, mas interesses comuns.”
(BRITANNICA, 2021)

Assim quais eram os interesses dos Estados Unidos para reconhecer ao Brasil?
Embora os Estados Unidos tivessem já feito a sua independência no ano de 1776 era
uma nação relativamente jovem que precisava mitigar o grande peso de ter sido colônia
do maior império da história moderna, o Império Britânico. Assim, reconhecendo a
independência do Brasil, os Estados Unidos conseguiam mitigar em parte a grande
influência geopolítica dos britânicos, e em troca do reconhecimento obter vantagens
comerciais e financeiras da maior nação de América do Sul. Para os Estados Unidos os
processos de independência da América Latina tanto da ex-colônias da Espanha como
de Portugal eram o cenário ideal para fundamentar e desenvolver seu peso geopolítico
que estava só começando ter força no cenário internacional.

3 A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA E O PROCESSO DE


CONSOLIDAÇÃO DO ESTADO NACIONAL

Conforme o dito anteriormente o Reino Unido estava numa posição que


desejava manter seus interesses políticos e comerciais com o Brasil, mas precisava
também manter o balanço de interesses geopolíticos com seus vizinhos da Europa que
estavam contra a independência do Brasil. Assim, os interesses comuns entre o Reino
Unido e o Brasil levaram para a intermediação dos britânicos, visando o reconhecimento
de independência do Brasil por parte de Portugal, e assim iniciar um efeito cadeia de
reconhecimento das demais nações europeias e do resto do mundo. Vamos lembrar
também que para o Reino Unido tanto o Brasil como Portugal eram nações aliadas
que protegiam os interesses comerciais e de logística das rotas marítimas dos Império
Britânico no oceano Atlântico, tanto do lado da América do Sul (ao longo do vasto litoral
brasileiro) como do lado da entrada do Mediterrâneo (próximo do litoral de Portugal) e
partes importantes do litoral da África (das colônias portuguesas).

32
Então, para os britânicos era de extrema importância para seus interesses
comerciais e geopolíticos manter a boa “amizade” tanto com Brasil como com Portugal,
daí o interesse de intermediar e claro tirar benefício dessas negociações diplomáticas.
Quais foram esses benefícios?

• Para que o Portugal aceitasse o reconhecimento da independência, o Brasil deveria


reconhecer uma dívida de 2 milhões de libras esterlinas que Portugal mantinha com
o Reino Unido. Logo de uma série de negociações o Brasil aceitou reconhecer essa
dívida e o acordo de reconhecimento por parte de Portugal foi assinado. Assim, no dia
29 de agosto de 1825 Portugal reconhece a Independência do Brasil, como também
nasce a primeira dívida externa significativa do Brasil.

• Os britânicos mantiveram benefícios comerciais similares ao Tratado de Aliança de


Comércio e Amizade do Brasil joanino de 1810. Entre essas vantagens comerciais,
as mercadorias britânicas que estivessem entrando ao Brasil continuavam com uma
taxa preferencial de 15%. Para o resto de países a taxa de importação era maior. Ou
seja, os britânicos por meio do poder da maior nação industrializada da época, a
Inglaterra, tinham a capacidade de invadir o mercado brasileiro com produtos mais
baratos do que as outras nações, inclusive inibir qualquer potencial crescimento
da indústria nacional da época. Dessa maneira, ao igual que os demais países da
América Latina, o Brasil ficou dependente da importação de produtos com valor
agregado (industrializados) da Inglaterra e dependente também da: exportação de
matérias primas para financiar sua economia e assim bancar as importações; e claro
ficar dependente do poderio da maior nação industrializada da época, a Inglaterra e
seu Império Britânico.

• O Brasil ficou comprometido em abolir o tráfico de escravos vindos da África até o


ano 1830, coisa que não foi bem aceita pelos proprietários de escravos e grandes
fazendeiros do Brasil. Ou seja, foi um acordo impopular que se viu refletido no âmbito
político, “[...] a grande maioria dos deputados brasileiros estava convencida de que a
abolição do tráfico negreiro, naquele momento, seria um desastre já que o Brasil era
economicamente dependente de braços escravos.” ((CLACSO, 2008, p.7) Inclusive foi
um dos motivos para a abdicação de D. Pedro I no ano 1831.

O governo brasileiro tentou adiar a data marcada para a abolição,


ou seja, 13 de março de 1830, mas o governo britânico não estava
disposto a ceder. Quando a data chegou, em função das crises
políticas que culminaram com a abdicação de D. Pedro I (07.04.1831),
o debate sobre a extinção do tráfico negreiro ficou relegado a segundo
plano (CLACSO, 2008, p. 8).

Vamos ver o peso desses benefícios aos britânicos para o Brasil? O Estado
Brasileiro oficialmente independente de Portugal nasce com uma dívida de 2 milhões
de libras esterlinas. Talvez em valores atuais possa parecer uma dívida pequena, mas
se visualizar essa dívida ao valor atual da Libra Esterlina seria uma dívida relativamente

33
grande, certo? Partindo do fato de que é um valor relativo ao ano 1825, é impossível de
visualizar isso sob os conceitos financeiros de Valor Presente, pois são quase dois séculos!
Assim, a melhor maneira de visualizar qual seria um valor relativo em valores atuais dessa
dívida seria por meio de uma análise do poder aquisitivo do dinheiro dessa época.

Para isso vamos fazer o cálculo baseados no que representava o poder


aquisitivo desses 2 milhões de libras esterlinas nessa época. Assim, qual poderia ser um
valor referencial? Uma alternativa pode ser pegar como referência a renda mensal do
famoso galã Mr. Darcy da conhecida obra literária romântica Orgulho e Preconceito
(Pride and Prejudice) de começos do século XIX, da autora inglesa Jane Austen. A
renda mensal do galã Mr. Darcy era de 10.000 libras esterlinas, que conforme a BBC
NEWS (dezembro de 2017) é o equivalente a US$ 80 milhões de renda mensal de hoje!
Então, partindo dessa renda equivalente podermos calcular o valor atual aproximado
dessa dívida de 2.000.000 de libras esterlinas que o Brasil teve que assumir para que
Portugal aceitasse a independência.

Então, se levarmos em consideração que 10.000 libras esterlinas da época


representam um valor aproximado de US$ 80.000.000 a valores atuais, isso é uma
valorização de 8.000 vezes do valor original. Assim, se pegarmos essa valorização de
8.000 vezes colocados na dividida do Brasil dessa época temos que isso representaria
uma dívida a valores atuais de aproximadamente US$ 16 bilhões (2.000.000 x 8.000). Ou
seja, o custo financeiro para o reconhecimento internacional da independência do Brasil
foi uma dívida de aproximadamente US$ 16 bilhões em valores equivalentes atuais.

Com essa dívida, além de se beneficiar financeiramente, o Reino Unido


conseguiu ainda mais poder geopolítico sobre o Brasil, pois o novo Brasil já independente
e reconhecida internacionalmente fico dependente do refinanciamento da dívida caso
contrário entraria em default (inadimplência financeira com os bancos da maior potência
econômica da época) com severas implicações para o financiamento de seu comércio
internacional e demais necessidades de seu orçamento público.

E para Portugal, qual foi o benefício de reconhecer a independência do Brasil?


Entre outras fatos, o cancelamento dessa forte dívida de 2 milhões de libras esterlinas
que tinha com o Reino Unido. Assim, os britânicos com a independência do Brasil
conseguiram manter a pressão de seu poder geopolítico tanto com o Brasil como com
o Portugal. Em resumo, embora o Brasil oficialmente já era uma nação independente,
a dependência financeira e comercial com o Império Britânico fez dele refém dos
interesses geopolíticos dos britânicos.

34
DICA
Quer saber como era vida no Império Britânico de começos do século
XIX? Época crítica para toda Europa ante o avanço da França Napoleónica e
do liberalismo. Procure pela obra literária “Orgulho e Preconceito” de Jane
Austen ou pelos diversos seriados e filmes disponíveis baseados nessa obra.
Um seriado legal sobre o tema é: Pride & Prejudice (Orgulho e Preconceito).

3.1 IMPACTOS DA GESTÃO GOVERNAMENTAL DE BRASIL


INDEPENDENTE A PARTIR DE 1825

Conforme o que estudamos, embora a independência do Brasil foi no dia 07 de


setembro de 1822, foi somente a partir de 1825 que a sua independência foi reconhecida
internacionalmente. Ou seja, a partir do ano 1825 o Brasil já poderia estabelecer acordos
internacionais formais com as demais nações aqui nas Américas e na Europa. Também
vimos que o custo para esse reconhecimento foi assumir uma dívida de 2.000.000
de libras esterlinas que tinha Portugal, dívida que em valores atuais seria uma dívida
bastante forte; assim como teve que manter benefícios comerciais e políticos aos
britânicos. Nesse sentido, um acordo polêmico, especialmente para os grandes
fazendeiros e elites políticas brasileiras, foi aceitar o fim do tráfico de escravos africanos
a partir de 1830, questão de especial interesse para os britânicos. O custo político desse
acordo foi tão difícil de se materializar, que, aliás, foi só realmente aplicada na prática a
partir de 1850, conforme iremos ver mais adiante.

E para os demais países da América Latina recentemente independentes da


Espanha? Eles também nasceram com dívidas fortes com os britânicos. A diferença é
que a dívida desses países foi em função do alto financiamento das longas guerras de
independência que se espalharam no tempo e nas vastas regiões de seus territórios,
assim, esses países tiveram que aprontar várias batalhas ao longo das diversas regiões
das Américas, começando em Norte América (México), Centro América, países andinos
e o que hoje é a região do Merco Sul e Chile.

Enquanto, a independência do Brasil foi mais uma transação de cunho diplomático


que concentrou todo o processo de independência sob uma só nação, o reino de Brasil.
No resto de países da América Latina a própria dinâmica das guerras e longos combates
regionais ao longo do vasto território das Américas levou para rompimentos radicais
contra a Espanha e para direitos de independência já reconhecidos internacionalmente
em tempos diferentes, exemplo: México, setembro de 1821; Venezuela, 1811; Colômbia,
1819; Peru, 1824; Chile, 1818; Argentina, 1816; entre outras.

Enquanto as ex-colônias espanholas sediadas na América Latina


tiveram um rompimento radical com a antiga Metrópole – pois
foi produto de guerra de libertação –, a emancipação do Brasil
de Portugal, que culminou com a Independência, foi produto de
paulatinas tomadas de decisões políticas (ALVES, 2018?, p. 102).

35
Ou seja, à medida que essas regiões conseguiam vencer as tropas espanholas
dos vice-reinos, elas começavam a consolidar sua gestão política para defender seus
interesses geopolíticos regionais, logo, desenvolvendo suas próprias necessidades, já
como nações, para sobreviver tanto no cenário nacional como internacional. Daí que uma
consolidação nacional por cada vice-reino que pudesse acolher essas extensas regiões foi
muito difícil de acontecer. Aqui no território do Brasil foi um só processo de independência
que levou a consolidar a gestão política em função dos interesses geopolíticos de toda as
regiões brasileiras sob a liderança política do Imperador D. Pedro I.

Assim, poder-se-ia dizer que o nascimento do Brasil, já como nação, sem


longas guerras regionais pela independência e com uma trajetória de mais de uma
década já como reino (antes de sua independência), inclusive como centro do Império
dos reinos de Brasil, Portugal e Algarve, levaram para o nascimento de um país que
consolidou todo esse vasto território que foi a colônia portuguesa em uma só nação, a
diferença dos países vizinhos ex-colônias da Espanha. No contexto da geopolítica da
região da América Latina, o Brasil Imperial jogava um papel importantíssimo para os
interesses britânicos nas Américas, conforme Boris (2006, p. 185):

Nesse jogo de interesses, a Inglaterra era, sem dúvida, a potência


dominante, mas o Brasil dispunha de um trunfo significativo, por ser
a única monarquia implantada na América do Sul. Na perspectiva de
Londres, o Império era encarado como uma garantia de ordem e um
freio à propagação de ideias republicanas no continente.

Mas será que os primeiros anos do Brasil Imperial, já como nação independente
a partir de 1825 foram tranquilos? Esses primeiros anos foram complicados, se
apresentaram algumas intenções separatistas de cunho republicano, inclusive a
província mais austral do país fez a sua independência do Brasil para se consolidar como
uma nova nação no ano de 1828, o Uruguai de hoje. O Brasil de 1825 era uma nação de
proporções continentais, porém, com pouca população no interior, os habitantes dessa
época se concentravam no litoral, nesse sentido, os desafios de manter a consolidação
nacional eram vários.

No contexto econômico, o capital produtivo era baseado na produção


agropecuária (propriedade fundiária), tendo uma concentração do poder econômico e
político nas oligarquias, tinha pouco capital humano com educação, e sua economia se
baseava na mão de obra escrava, assim como existia pouquíssima infraestrutura, entre
outros fatores econômicos de uma economia de pouco desenvolvimento, conforme o
historiador Alves Filho (2008, p. 104):

Constituído como Estado Soberano em 1822, o Governo


Brasileiro viu-se perante o dilema de como organizá-lo. O
legado colonial era o de um país com um território imenso, mal
povoado, descentralizado, com ocupação basicamente litorânea,
propriedade fundiária, produção rural, monocultura, domínio
oligárquico, mandonismo local, trabalho escravo, analfabetismo
em larga escala, infraestrutura precária etc.

36
Nesse contexto econômico, a gestão política para manter a nação unida
demandava de uma forte centralização que nessa época estava sob o governo
monárquico de D. Pedro I. Temos que observar que o Brasil já como nação independente
era uma Monarquia Constitucional, com quatro poderes: o Executivo, o Legislativo, o
Judiciário e o Moderador. Tanto o Poder Executivo como o Moderador estavam sob
o comando do Imperador D. Pedro I, ou seja, na prática todas as decisões do Estado
Brasileiro caiam sobre a responsabilidade dele. Sejam boas ou más decisões quem levava
o mérito ou a culpa era o Imperador, isto quer dizer que na prática não existia balanço
entre os poderes do Estado e todos os problemas complexos eram de responsabilidade
de D. Pedro I, assim, o descontentamento começou surgir em várias regiões do país.
Esse descontentamento levou para várias situações difíceis de serem resolvidas de
maneira pacífica, assim, as tropas imperais tiveram que intervir em vários momentos,
entre as rebeliões mais relevantes temos: a Rebelião da Confederação de Equador na
cidade de Pernambuco e a Rebelião da Província Cisplatina.

A Rebelião da Confederação de Equador liderada na cidade de Pernambuco do


ano 1824 teve a adesão de várias províncias do norte do país que estavam contra da
Monarquia e queriam uma solução republicana, ou seja, a formação de um Estado sem
monarquia no norte do país. Perante isso, as tropas imperais conseguiram acabar com
o movimento separatista e seu principal líder, Frei Joaquim, foi executado. Porém, em
termos políticos apesar de ter mitigado essa rebelião, foi um desgaste para a gestão
política e econômica do Imperador D. Pedro I.

A segunda rebelião de caráter separatista foi na Provincia Cisplatina, a província


do extremo sul do Brasil Imperial. Nessa vez as tropas imperais não conseguiram abafar
o movimento e em 1828 antiga província do Brasil tinha se convertido no que hoje é o
Uruguai. Porém, devermos observar que nessa rebelião houve o interesse geopolítico das
Províncias Unidas do Rio da Prata (a Argentina de hoje). Desde 1823 a Argentina vinha
fazendo gestões diplomáticas no Rio de Janeiro para que o Brasil faça a “restituição
da Banda Oriental” para à Argentina. Mas apesar das constantes negociações e
intermediações, inclusive do Reino Unido e do Império Austríaco (o maior império da
Europa Continental da época), as gestões diplomáticas acabaram em fracasso e no
dia 10 de dezembro de 1825 o Imperador D. Pedro I fez oficialmente a declaração de
guerra contra a Argentina, a conhecida “Guerra Cisplatina” para os brasileiros e para os
argentinos a “Guerra del Brasil”.

A guerra ficou indefinida, o Brasil defendendo o território de sua província mais


austral e a Argentina desejando anexar esse território para si, muito rico em recursos naturais
e humano. Sem um claro vencedor os britânicos estavam-se impacientando, pois sentiam
o prejuízo disso no comércio. Assim, sob pressão do Reino Unido houve finalmente um
acordo entre o Brasil e a Argentina, no qual ficou estabelecido a independência da Provincia
Cisplatina do Brasil, porém, a Argentina renunciava o desejo de anexar essas terras. Ou
seja, os uruguaios ficaram com o direito de fundar sua própria nação, logo, no ano 1828 o
Uruguai se converteu em uma nação independente. Mas será que o Brasil ficou contente?
Os brasileiros ficaram com o desejo de anexar de novo essas terras o qual nunca aconteceu.

37
Esses longos três anos de guerra, desde 1825 até 1828, que finalizaram na
perda da Provincia Cisplatina e a Rebelião da Confederação do Equador, foram de forte
desgaste financeiro e político para o governo monárquico de D. Pedro I, quem cada vez
mais sentia a pressão dos outros poderes do Estado Brasileiro. E se a isso se somar o
descontentamento dos proprietários de escravos e grandes fazendeiros que estavam
apreensivos diante à aproximação da data, ano 1830, da abolição do comercio de
escravos vindos da África - que o Brasil tinha assinado com o Reino Unido – as pressões
terminaram com a abdicação do Imperador D. Pedro I no ano 1831. “

Em 7 de Abril de 1831, D. Pedro I abdica ao trono do Brasil em favor de


seu filho, que, posteriormente seria coroado como D. Pedro II. Entre
os acontecimentos que os historiadores alinham como causadores
da abdicação estão a Confederação do Equador (1925) e a derrota do
Brasil na Guerra da Cisplatina (ALVES FILHO, 2008, p. 106).

Mas será que a abdicação de D. Pedro I foi suficiente para a acalmar o entorno
político? Devermos observar que o filho de D. Pedro I tinha somente 5 anos no ano
1831, ou seja, incapacitado para governar. Pensando nisso D. Pedro I fez um acordo com
o poder legislativo para que o poder executivo seja exercido por regentes nomeados
pelo Senado até que D. Pedro II esteja capacitado para governar quando tenha maioria
de idade. Assim, começou o período da regência, porém, na prática foi uma catástrofe
no que tange à questão da unidade nacional, aliás, entre 1830 até 1845 houve vários
movimentos separatistas, conforme o historiador Alves Filho (2008, p. 106):

Os principais movimentos que eclodiram durante o período regencial


fora: no Pará, a Cabanagem (1835-1840); na Bahia, a Sabinada (1837-
1838); no Maranhão, a Balaiada (1838-1841); e no Rio Grande do Sul,
o Farrapos (1835-1845).

Diante dessa situação dramática da Unidade Nacional o poder legislativo, por


meio da liderança dos libelares, aprovou o projeto que declarava a D. Pedro II com quase
15 anos de maioria de idade. Assim, com quase 15 anos de idade, no dia 6 de julho de
1840, D. Pedro II tomou posse como Imperador do Brasil, iniciando assim o segundo
reinado imperial que, aliás, durou quase 50 anos, desde 1840 até 1889. A posse de D.
Pedro II fez no curto-prazo mitigar o risco de movimentos separatistas, assim como fez
também fortalecer o poder central do Brasil Imperial. Mas no longo-prazo a questão do
poder monárquico ficou em aberto, terminado no fim da monarquia no ano de 1889.

No curto prazo, tanto a monarquia, quanto o poder legislativo tinham atingido


o objetivo de segurar a unidade nacional, mas existia a necessidade de harmonizar o
balanço de poderes. Assim, depois de 7 anos da posse de D. Pedro II estrategicamente
para conseguir manter a monarquia, e principalmente a Unidade Nacional, foi
estabelecido o regime parlamentarista no ano 1847, ou seja, foi introduzido a dinâmica
do parlamentarismo monárquico. Isso deu as bases definitivas para a Consolidação

38
Nacional do vasto território brasileiro que junto às Guerras Platinas do ano de 1851
consolidaram ainda mais a Unidade Nacional das diversas regiões e culturas do Brasil,
tema de estudos do seguinte Tópico desta primeira unidade.

Estamos chegando ao final de nossos estudos deste tópico, revise os temas


mais importantes com a ajuda de Resumo do Tópico 2. Depois disso, não deixe de
realizar as autoatividades!

39
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• O retorno de D. João VI para Portugal, no ano 1821, teve implicações geopolíticas para
o reino de Brasil. As cortes portuguesas estavam exigindo que o Brasil voltasse a sua
condição de colônia, assunto que estava contra os interesses e perspectivas dos
brasileiros. Pensando nisso D. João VI deixou a seu filho mais velho, D. Pedro I, como
príncipe regente do reino do Brasil, quem logo no ano 1822 liderou a independência
do Brasil no ano 1822.

• A Revolução de Porto levou a que o D. João VI tivesse que voltar para Portugal assim
como levou às Cortes Portuguesas pressionassem para que o reino do Brasil voltasse
a sua condição de colônia. Essa pressão para que o Reino de Brasil voltasse a ser
colônia foi um dos principais motivos para a declaração de independência.

• Embora a independência de Brasil foi no dia 07 de setembro, demorou quase


três anos para que ela tivesse reconhecimento internacional. O que veio logo do
reconhecimento por parte de Portugal no dia 28 de agosto de 1825.

• O reconhecimento internacional de independência do Brasil no ano 1825 – a diferença


das independências republicanas dos países que faziam parte da colônia espanhola
nas Américas – foi de cunho monárquico e executada por meio de negociações
diplomáticas, com poucos confrontos nas regiões do Brasil. Enquanto a independência
dos países vizinhos aconteceu depois de longas guerras de independência abrutas
e republicanas que foram acontecendo em tempos e regiões diferentes ao longo do
vasto território da Espanha Colonial das Américas.

40
AUTOATIVIDADE
1 A revolução de Porto teve um peso enorme para que o Brasil tivesse feito a declaração
de independência no dia 07 de setembro de 1822. Mas qual a ligação dessa revolução
com a Independência do Brasil?

a) ( ) A revolução de Porto foi de cunho liberal e levou, e como o Brasil estava sob
um regime imperial sob a regência do filho de D. João VI era inaceitável aceitar
que Brasil tivesse que o Reino de Brasil tivesse que virar liberal, embora sob um
regime de monarquia parlamentarista.
b) ( ) A cidade de Porto era, e é ainda, a segunda maior cidade de Portugal e sua
liderança industrial e comercial para Portugal era estratégica para D. João VI,
assim ele teve que voltar para Portugal, isso deixou ao Brasil sem regente, o que
levou aos Brasileiros Republicanos para a independência de 1822.
c) ( ) A revolução de Porto era de cunho liberal e estava exigindo o fim do absolutismo
e o retorno de Brasil para sua condição de colônia. Diante disso os brasileiros
declaram a independência sob a liderança do príncipe regente, filho mais velho
de D. João VI, que logo tomou posse como D. Pedro I.
d) ( ) A revolução de Porto era de cunho liberal e suas ideais se espalharam por todo
o território português, assim como também estava-se espalhando no Reino
de Brasil com um alto risco de ter também uma revolução de cunho liberal no
Brasil. Diante disso e aproveitando a vontade dos brasileiros para declarar a
independência o próprio filho de D. João liderou a independência, D. Pedro I.

2 A independência do Brasil aconteceu no dia 07 de setembro de 1822. Mas o seu


reconhecimento internacional só aconteceu depois de três anos, em agosto de 1825.
Os motivos para isso são vários, entre eles temos:

I- Logo da Independência houve uma série de confrontos bélicos dos brasileiros


contra as tropas portuguesas ao longo do território brasileiro. Pois os portugueses
imperais ainda tinham sob seu controle os principais portos do Brasil. Finalmente,
logo de quase três anos de batalhas isoladas, em agosto de 1825 Portugal reconhece
a independência.
II- O primeiro país em aceitar a independência foi o Reino Unido, os países já
independentes das Américas incluindo os Estados Unidos tinham o receio de ter
uma nação imperial que poderia liderar uma reconquista dos territórios das ex-
colônias espanholas e britânicas. Portanto, esses países só reconheceram a
independência a partir do momento em que Portugal a reconheceu em 1825.
III- A independência de 1822 levou para quase três anos de negociações diplomáticas,
pois as nações europeias sob a liderança da Santa Aliança estavam contra das
independências nas Américas. Foi por meio da intermediação do Reino Unido e só
logo que o Brasil teve que assumir uma dívida de Portugal de 2 milhões de libras
esterlinas, entre outras condições, que Portugal aceitou a independência do Brasil.

41
Assinale a alternativa correta:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença II está correta.

3 Salvo algumas exceções, como Cuba que declarou a sua independência no ano
de 1898, a grande maioria de países de América Latina, incluindo ao Brasil, fizeram
as suas independências entre a década de 1810 e 1820. Sobre as diferenças das
independências dos países Latino-Americanos ex-colônias da Espanha e a do Brasil,
defina quais das seguintes sentenças estão corretas.

( ) As independências dos países ex-colônias da Espanha eram de cunho republicano,


enquanto, a do Brasil foi de cunho imperial. Esses países, ex-colônias da Espanha,
tiveram longas guerras de independência que aconteceram em tempos e regiões
muito distantes entre si, logo, essas independências foram acontecendo ao longo
dos anos a partir da década de 1810 até finais da década de 1820. Isso levou a
condições geopolíticas que se desenvolveram independentemente em função
às condições regionais e populacionais diferentes do vasto território das colônias
espanholas ao longo das Américas.
( ) As independências em América Latina tanto dos países de língua espanhola, ex-
colônias da Espanha, como a do Brasil aconteceram em função da onda liberal
que se deu na Europa e nas Américas. Tanto assim que as nações europeias, sob
a liderança da Santa Aliança, estavam contra das independências nas Américas.
A única diferença é que no Brasil esse processo de independência republicana se
deu sob a liderança de D. Pedro I, quem, aliás, tinha afastado qualquer ligação de
linhagem de cunho monárquico com seu pai D. João VI.
( ) A independência do Brasil foi liderada por D. Pedro I, ou seja, foi de cunho imperial.
Essa liderança acolheu os interesses dos centros de poder político e econômico
dos brasileiros que já vinham experimentando uma forte independência graças à
condição de Brasil ter virado reino e ter experimentado ser o centro do poder político
dos reinos de Portugal, Brasil e Algarve. E sob a ameaça de Portugal decretar a volta
de Brasil a sua condição de virar colônia, os brasileiros declaram a independência,
mas continuo sendo uma monarquia. Enquanto, as independências dos demais
países da América Latina implicou uma ruptura abruta com a Espanha.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta:

a) ( ) V - F - F.
b) (   ) V - F - V.
c) (   ) F - V - F.
d) (   ) F - V - V.

42
4 Embora a independência do Brasil foi no dia 07 de setembro de 1822, demorou quase
três anos para que acontecesse o reconhecimento internacional, especialmente de
Portugal. Explique quais eram os motivos para esse reconhecimento acontecesse
somente três anos depois.

5 Durante a era joanina o Brasil incorporou a seu território as terras do que hoje fazem
parte de Uruguai, a conhecida Província Cisplatina. Porém, a partir de 1825, durante
os primeiros anos do Brasil já independente os uruguaios desejavam declarar a sua
independência do Brasil com a ajuda das Províncias Unidas do Rio da Prata (o que
hoje é a Argentina). Sobre esse assunto, a seguir explique qual era o motivo para
que a Argentina declarasse a guerra ao Brasil para ajudar aos uruguaios, e como
finalmente no ano de 1828 o Uruguai se converteu em uma nação independente.

43
44
UNIDADE 1 TÓPICO 3 -
A POLÍTICA EXTERNA DO
SEGUNDO REINADO

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, no último tópico estudamos sobre o nascimento do Brasil


já como nação independente e como essa independência se diferenciou do resto da
América Latina Espanhola. Enquanto o Brasil continuou sob um regime monárquico
o resto da América Latina se dividiu em várias nações republicanas, ex-colônias da
Espanha. Também estudamos como o processo de reconhecimento internacional dessa
independência do Brasil teve um intenso processo de negociações diplomáticas por meio
da intermediação do Reino Unido, negociações que tinham o objetivo para que Portugal
reconhecesse a independência. Porém, conforme estudamos, esse reconhecimento,
que se deu no ano de 1825, teve um forte custo financeiro e comercial para o Brasil.

Ao final do Tópico 3, estudamos sobre o processo de consolidação de Estado


Brasileiro sob o comando de um regime monárquico, que teve uma série de rebeliões
e pressões políticas que colocavam em risco a unificação nacional, pois algumas
regiões do nordeste e do sul do país desejavam uma independência republicana
contra um Brasil Imperial. Sob pressão e pensando salvar o regime monárquico como
a unificação nacional no ano 1831 D. Pedro I acabou abdicando, mas se assegurando
que seu filho de apenas 5 anos, D. Pedro II, seja o próximo imperador quando cumprir
a maioria de idade. Com isso D. Pedro I deixou espaço político, de pelo menos 10
anos, para que o poder legislativo por meio do Senado escolhesse regentes que
sejam o líder do poder executivo.

Durante a regência, a situação política não melhorou, inclusive continuaram se


apresentando algumas intenções de separação republicana ao longo do país, ameaçando
a unidade nacional. Diante disso o poder legislativo, sob a liderança dos liberais, aprovou
o projeto de lei para que D. Pedro II pudesse tomar posse com apenas 15 anos de idade.
Assim, ele virou imperador apto para governar no ano 1840, e de maneira inédita seu
período de governo imperial durou quase 50 anos até 1889, data na qual começou a
época republicana até os dias de hoje. Já na prática a posse de D. Pedro II fez fortalecer
o poder central e fez reduzir os riscos de movimentos separatistas. No que tange ao
poder central, a figura do imperador ajudou em obter objetivos concretos no processo
de centralização e seguridade nacional, pois:

O princípio eletivo, que na prática não funcionara, desapareceu


por completo. Os oficiais passaram a ser escolhidos pelo governo
central ou pelos presidentes de província, aumentando-se as

45
exigências de renda para assumir os postos. A hierarquia ficava
reforçada e se garantia o recrutamento dos oficiais em círculos
mais restritos. A partir daí, em vez de concorrência entre a Guarda
Nacional e o Exército, existiria uma divisão de funções. Caberia à
Guarda Nacional a manutenção da ordem e a defesa dos grupos
dominantes, em nível local, ficando o Exército encarregado de
arbitrar as disputas, garantir as fronteiras e manter a estabilidade
geral do país (BORIS, 2006, p. 176).

Durante os primeiros anos do governo imperial de D. Pedro II, além de melhorar o


poder central do Governo Nacional, tanto D. Pedro II como o poder legislativo planejaram
como melhorar a governabilidade entre os poderes do Estado. Assim, no ano 1847 -
pensando na estabilidade de longo-prazo e a unidade nacional - foram estabelecidos
acordos de estado para implantar no Brasil Imperial um regime parlamentarista sob a
liderança da monarquia. Nesse, sentido o poder executivo era liderado pelo Presidente
do Conselho de Ministros indicado pelo imperador e escolhido pelo poder legislativo,
conforme Boris (2006, p. 179) a partir de 1847:

[...] um decreto criou o cargo de presidente do Conselho de Ministros,


indicado pelo imperador. Essa personagem política passou a formar
o ministério cujo conjunto constituía o Conselho de Ministros, ou
gabinete, encarregado do Poder Executivo. O funcionamento do
sistema presumia que, para manter-se no governo, o gabinete devia
merecer a confiança, tanto da Câmara como do imperador.

Essa dinâmica de governabilidade deu as bases para uma longa estabilidade


política e da Gestão do Estado entre o poder executivo, liderado pelo Presidente do
Conselho de Ministros e moderado pelo imperador, D. Pedro II. Nesse sentido, o líder
do Poder Executivo era escolhido pelo Poder Legislativo sob indicação do imperador,
comparativamente o “Presidente do Conselho de Ministros” seria o que hoje se conhece
como o “Primeiro-Ministro” da maioria de governos da Europa. Sob essa dinâmica de
governo o imperador atuava como moderador, e caso tiver a necessidade, ou pressão
política, o imperador poderia solicitar ao poder legislativo a eleição de um novo Presidente
do Conselho de Ministros.

A estabilidade do governo imperial de D. Pedro II, graças a sua liderança, e


balanço de poderes entre o Executivo e Legislativo, permitiu uma estabilidade política
que junto às Guerras Platinas (intervenções brasileiras na região do Rio da Prata)
consolidou ainda mais a Unidade Nacional. A qual tinha ficado em risco durante as duas
primeiras décadas da independência do Brasil, inclusive havendo momentos críticos
quando grandes regiões do país estavam desejando virar independentes e republicanas.
Essa estabilidade também permitiu implantar uma série de programas de Estado para o
desenvolvimento socioeconômico do Brasil do século XIX.

No contexto da Política Externa, durante esses quase 50 anos do Brasil Imperial


de D. Pedro II se conseguiu estabelecer políticas tarifárias que sejam beneficiosas ao país,
se conseguiu empréstimos e investimentos diretos para o desenvolvimento econômico,

46
se fez políticas de migração e uma série de gestões para acabar gradativamente com
a escravidão, se resolveu uma série de problemas fronteiriços com os países vizinhos,
entre outros elementos importantes da política externa, conforme vamos estudar neste
último tópico da Unidade 1; o tópico vai se dividir em dois grandes momentos sob a ótica
militar-territorial importantes dessas quase 5 décadas de governo de D. Pedro II, aliás, o
terceiro e o último imperador que o Brasil teve. Esses dos momentos importantíssimos
foram as Intervenções Brasileiras na Região da Prata e a Guerra do Paraguai.

2 AS INTERVENÇÕES BRASILEIRAS NO PRATA

Conforme visto, a partir de 1947 o Brasil Imperial começou ter estabilidade


política, o que permitiu fazer gestão de projetos econômicos e de política externa.
Um desses projetos procurava garantir o desenvolvimento econômico e uma logística
estável de comércio. Esse logística estável estava comprometida na região sul do país,
pois era de interesse do Estado Brasileiro manter na região internacional da Bacia da
Prata a estabilidade e os direitos de navegação internacional ao longo da Bacia da Prata.
Vasta região que era – e é ainda hoje - compartilhada com a Argentina, o Uruguai e
o Paraguai. Aliás, bacia que ainda é importantíssima para o Sul e Sudeste do Brasil,
inclusive é essencial para os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Dessa
extensa bacia depende grande parte da economia desses países, incluindo o Brasil.

Temos que observar que nessa época a rede de transporte dependia em


grande parte do transporte fluvial e marítimo, assim, tendo sob o controle os direitos
internacionais de navegação da Bacia da Prata o Brasil poderia garantir o fluxo de
recursos produtivos necessários para as extensas regiões que o país tinha na Bacia da
Prata. Inclusive o comércio de mercadorias e deslocamento de pessoas para a província
de Mato Grosso dependia do transporte fluvial ao longo da bacia, conforme vamos ver
mais adiante. Nesse sentido, antes de adentrar nos detalhes dos fatos históricos e
interesses geopolíticos dos países da Bacia da Prata, vamos visualizar a importância da
Prata para as atividades econômicas desses países, inclusive de hoje em dia. Conforme
às informações da Revista Ecoa (2021, n.p.), a Bacia da Prata:

Com uma área de mais de 3,1 milhões de km² a Bacia tem a população
distribuída da seguinte maneira: 100% do Paraguai; quase 90% do
Uruguai; mais de 80% da Argentina; 55% da Bolívia e 54% do Brasil.
Buenos Aires, Montevidéu, Assunção e Brasília, quatro capitais, têm
seu território na Bacia.

Conforme podermos observar, é uma região importantíssima para todos os


países que fazem parte da Bacia da Prata, incluindo a Bolívia. Vejamos a extensão de
terra e população dos países que compartilham esse extenso território da bacia.

47
QUADRO 1 – ÁREA E PORCENTAGEM DA POPULAÇÃO DE 2015 QUE MORA NA BACIA DA PRATA, POR PAÍS

FONTE: <https://ecoa.org.br/agua/bacia-do-rio-da-prata/>. Acesso em: 21 nov. 2021.

A partir desse quadro, conseguimos observar que a maioria da população desses


país moram na Bacia da Prata. E em termos de geografia econômica todos esses países
dependem do recurso hídrico da bacia, vejamos quais são os principais rios da Bacia
da Prata: o rio Paraná, com 4.352 km de percorrido; o rio Paraguai, com 2.459 km; e o
rio Uruguai, com 1.600 km. O estuário da Bacia da Prata é o maior do mundo, conforme
dados da Revista Ecoa (2021). Vejamos um mapa desta enorme bacia.

FIGURA 2 – MAPAS DA BACIA DA PRATA

FONTE: <https://bit.ly/3N9owf0>. Acesso em: 21 nov. 2021. FONTE: <https://bit.ly/3N5Yc58>. Acesso em: 21 nov. 2021.

Logo de ter observado a importância da Bacia da Prata, fica mais fácil entender a
importância geopolítica dela para o Brasil, a Argentina, o Uruguai e o Paraguai dessa época,
inclusive para a geopolítica de hoje. Voltando para essa época, para o ano 1850 esses países
recentemente tinham passado por longos processos de independência, ou seja, ainda
seus limites territoriais estavam em processo de consolidação; inclusive o Brasil acabava
de perder sua província mais austral, a província Cisplatina se tornando no Uruguai. Nesse
contexto histórico e geopolítico, todos esses países queriam garantir direitos territoriais e
de navegação ao longo da Bacia da Prata. Direitos de navegação que para o Paraguai eram
de extrema importância, desde que esse país não tinha acesso direto ao Oceano Atlântico.
Assim, esse era o entorno muito sútil e instável na Bacia da Prata.

48
NOTA
Sabe qual o significado da palavra estuário? Conforme a revista virtual
Educação Ambiental em Ação (Revistea, 2021): Um estuário é um corpo d'água
parcialmente encerrado, que se forma quando as águas doces provenientes
de rios e córregos fluem até o oceano e se misturam com a água salgada do
mar. Exemplo disso é o Estuário da Prata, o maior do mundo.

FIGURA 3 – ESTUÁRIO DA PRATA

FONTE: <https://bit.ly/3JkQ1zM>. Acesso em: 22 nov. 2021.

2.1 FATOS HISTÓRICOS E POLÍTICOS DA REGIÃO DA PRATA


DE MEADOS DO SÉCULO XIX

Agora que já temos uma visão mais clara da importância de a Região da Prata,
podemos nos adentrar nos fatos históricos e políticos que iniciaram as intervenções
brasileiras nesta região em meados do século XIX. Nessa época, enquanto o Brasil
desejava manter os direitos de navegação ao longo da Bacia da Prata, algumas lideranças
políticas de Argentina, Uruguai e Paraguai desejavam que os territórios da Região da
Prata deveriam ser demarcados conforme aos limites previamente delineados no Vice-
Reinado da Prata, isto é, quando a região fazia parte das colônias da Espanha. Assim,
com essa demarcação esses países poderiam crescer territorialmente, inclusive aderir
parte do território da Provincia de Rio Grande do Sul, e assim melhorar suas posições
geopolíticas perante a forte influência na região do Brasil Imperial.

Para entender melhor a questão de os conflitos territoriais dessa região


devermos observar quais eram a lideranças políticas desses países que desejavam isso.
Nos começos da década de 1850, sob a liderança da Confederação Argentina – e de
seu presidente Juan Manuel Rosas – o partido “blanco” de Uruguai estava apoiando o
projeto de unificação do Prata. Por outro lado, na mesma Argentina também existiam

49
forças contra esse projeto, especificamente o dominante Governador “Justo José
de Urquiza” da Província Argentina “Entre Ríos”, quem depois da Guerra do Prata se
converteu em presidente da Argentina; e no Uruguai o “Partido Colorado”, contrário
ao projeto da Confederação Argentina, também assumiu o controle do governo logo
da Guerra do Prata. Nessa dinâmica se mantinha uma harmonia muito tênue entre os
interesses desses três países (Argentina, Paraguai e Uruguai) e o Brasil Imperial.

Entender a conjuntura política do Uruguai é importante, visando visualizar


melhor os conflitos que aconteceram. Para meados do século XIX no Uruguai existiam
dois grandes grupos políticos, o Partido Colorado, que representava os interesses
dos comerciantes e do liberalismo da época, aliás, grupo político que estava alineado
com a causa do Governador da província argentina “Entre Ríos” Justo José de
Urquiza; e o Partido Blanco (ou Partido Nacional), que representava os interesses
dos conservadores e dos que desejavam se aderir ao projeto de unificação da Prata.
Quando o Partido Blanco por meio da ajuda do ditador Argentino assumiu o controle
de Uruguai, logo depois o Uruguai se aderiu ao Projeto de unificação de Argentina e
Paraguai. Isso significou a ruptura do balanço tênue de interesses que existia entre os
países que compartem a região da Prata.

Sob essas condições de alto risco aos interesses geopolíticos do Brasil, D. Pedro
II fez aliança com os “Colorados” de Uruguai e com o Governador Justo José de Urquiza
da Província “Entre Rios” de Argentina. Assim, no ano 1851 começou a Guerra da Prata
e já mesmo no ano seguinte as tropas brasileiras conseguiram a vitória, atingindo a
desejada estabilidade na fronteira sul do Brasil. Entre os principais sucessos da vitória foi
que o Brasil conseguiu neutralizar, por enquanto, o risco da consolidação do projeto de
unificação da Confederação Argentina, a qual inclusive desejava incorporar à província
brasileira de Rio Grande do Sul.

A maior preocupação do governo imperial se concentrava


na Argentina. Temia-se a unificação do país, que poderia se
transformar em uma República forte, capaz de neutralizar a
hegemonia brasileira e atrair a inquieta província do Rio Grande do
Sul (BORIS, 2006, p. 211).

Com a vitória o Brasil foi conseguido importantes aliados na gestão


governamental tanto da Argentina como do Uruguai. Na Argentina com Justo José
de Urquiza como Presidente da República da Argentina; e no Uruguai com o líder do
“Partido Colorado”, Fructuoso Rivera, quem formou parte do triunvirato que governou
esse país depois da Guerra. Embora, para o Brasil significou uma nova era de relativa
estabilidade para seus interesses geopolíticos na região da Prata, para os outros países
a instabilidade continuava, aliás, instabilidade que depois levou para a longa Guerra do
Paraguai (1864-1870), conforme vamos estudar mais adiante.

50
2.2 A ESTABILIDADE BRASILEIRA DEPOIS DA GUERRA DA
PRATA

A década de 1850 foi um período que mudou positivamente ao Brasil. Sob uma
ótica militar-territorial e econômica, enquanto a unidade nacional se afirmou ainda
mais logo depois da Guerra da Prata, houve uma série de reformas socioeconômicas
que ajudaram muito para que o país pudesse se desenvolver e se modernizar para se
aproximar aos patamares de uma nação mais de acordo com a dinâmica econômica da
época. Nessa década, de 1850, houve mudanças que permitiram:

• Acabar com o tráfico de escravos.


• Iniciar uma política de imigração de acordo com às necessidades de capital humano
que o Brasil precisava.
• Delinear uma política de comércio exterior por meio de ferramentas práticas de
tarifas de importação que estejam de acordo com as necessidades comerciais e
industriais da época.
• Planejar um programa de investimentos diretos e empréstimos cujo objetivo era o
desenvolvimento logístico e industrial.
• Promulgar a lei de terras, assim como se definiu os tipos de empresas que poderiam operar.

Enfim, começou a implantar uma série de políticas socioeconômicas cujo


objetivo era de tornar ao Brasil mais moderno e unificado. Conforme o historiador Boris
(2006, p. 197), as mudanças traziam “inovações e ao mesmo temo integrava os textos
dispersos que vinham de período colonial. Entre outros pontos, definiu os tipos de
companhias que poderiam ser organizadas no país e regulou suas operações. Assim
como ocorreu a Lei de Terras, tinha como ponto de referência a extinção do tráfico”.

Essas mudanças trouxeram uma nova dinâmica socioeconômica com uma


série de inovações que estavam acompanhadas com reformas que ajudaram ao
desenvolvimento econômico e empresarial tanto nas atividades agrícolas como nas
mais diversas possibilidades da atividade empresarial dessa época. A seguir vamos ver
com mais detalhe os impactos dessas mudanças que começaram a se intensificar a
partir de 1850, especialmente no que tange ao fim do tráfico de escravos, as ondas
imigratórias e a modernização da economia.

2.2.1 O fim do tráfico de escravos

O fim do tráfico de escravos era uma das demandas do Reino Unido desde o
reconhecimento internacional de 1825, inclusive foi um dos motivos da abdicação de D.
Pedro I. Embora o Império Britânico (o maior império e potência econômica da época)
demandou o fim do comércio escravos, na prática o Brasil continuava com o tráfico.

51
Isso com o passar do tempo estava trazendo conflitos de interesses com os britânicos
e atrapalhando as fontes de capitais diretos e empréstimos para o Brasil, capitais
que, aliás, vinham da poderosa Inglaterra (a nação mais desenvolvida dos reinos que
formavam parte do Reino Unido).

Assim, perante a pressão britânica e ante a estabilidade política que o Brasil


vinha obtendo o Governo Imperial de D. Pedro II aproveitou a conjuntura do momento
para definitivamente extinguir com o tráfico. “A liberação de capitais resultante do
fim da importação de escravos deu origem a uma intensa atividade de negócios e de
especulação. Surgiram bancos, empresas de navegação a vapor etc.” (BORIS, 2006,
P.197) No ano de 1850 foi aprovado o projeto que reforçava a lei de 1831 que determinava
o tráfico de escravos como pirataria. “O projeto se converteu em lei em setembro de 1850.
Dessa vez, a lei “pegou”. A entrada de escravos no país caiu de cerca de 54 mil cativos,
em1849, para menos de 23 mil, em 1850, e em torno de 3300, em 1851, desaparecendo
praticamente a partir daí.” (BORIS, 2006, p. 195).

DICA
Um passo fundamental para terminar com a escravidão foi o fim do
tráfico de escravos. A Lei Eusébio de Queirós foi essencial para que isso
pudesse acontecer no ano de 1850. Sugiro entrar no seguinte artigo
ler sobre essa lei importantíssima no processo do fim da escravidão,
que se deu no ano de 1888.
Lei Eusébio de Queirós: https://bit.ly/36v1oXk

Por outro lado, essa abolição do tráfico trouxe uma série de pressões na oferta
de escravos para as lavouras especialmente de cana, café, algodão, produção agrícola
que estava destinada à exportação. Ou seja, acabou fluxo de escravos vindos da
África, implicando aumento no custo da mão-de obra. No que tange ao café – lavoura
que era altamente dependente da mão-de-obra escrava – nessa época a região com
maior produção desse grão era o Vale de Paraíba, pois contava com a constante oferta
de mão de obra barata vinda do tráfico de escravos, e a segunda maior região de
produção de café era o interior de São Paulo. Ambas as regiões foram impactadas pela
abolição do tráfico, pois a oferta de escravos começou depender 100% da população
afro-americana (ou seja, de escravos nascidos no território nacional) e não mais da
entrada de africanos ao país.

A área cafeeira do Vale de Paraíba nasceu mais cedo, tendo como


horizonte o sistema escravista. Só quando ela chegou ao apogeu, veio
a extinção do tráfico. Na medida em que a produtividade declinava,
a dificuldade de encontrar uma alternativa para o problema de mão
de obra tornou-se maior e não foi conseguida (BORIS, 2006, p.202).

52
Perante essa nova condição na oferta de mão de obra escrava a região do Vale
de Paraíba começou perder competitividade, pois seu processo produtivo dependia
precisamente dessa mão de obra barata. Enquanto, a região de São Paulo começou ter
maior competitividade relativa, em função de seu clima ideal para a lavoura do café e
sua capacidade de capitalizar os meios de produção do café, assim, embora a mão de
obra escrava ficou relativamente escassa a produtividade das plantações de café da
região de São Paulo foi melhorando.

Nesse contexto, e com o aumento da demanda internacional do grão de café


a região de São Paulo começou um processo de desenvolvimento acelerado, dando
início para uma economia moderna e capitalista. Devermos observar que para meados
do século XIX a revolução industrial na Europa e nos Estados Unidos estava trazendo
como uma de suas consequências o aumento da classe média e seu drástico aumento
no consumo de entre outras coisas do café, conforme o historiador Boris (2006, p.189):

O avanço da produção caminhou lado a lado com a ampliação


do hábito de consumir café entre a classe média cada vez mais
numerosa nos Estados Unidos e nos países da Europa. Os Estados
Unidos tornaram-se o principal país do café brasileiro, exportado
também para a Alemanha, os Países Baixos e a Escandinávia. A
Inglaterra, onde o costume de se tomar chá estava arraigado, nunca
foi uma grande consumidora.

Assim, enquanto o Vale do Paraíba começou perder competitividade, entre


outras coisas graças ao fim do tráfico de escravos, a região de São Paulo começava um
período de desenvolvimento acelerado em função de sua competitividade na produção
de café, lavoura que, aliás, diminuiu sua dependência de mão de obra escrava barata.
Para finalizar, devermos observar que o uso de mão de obra escrava não acabou com o
fim do tráfico de escravos de 1850, só fiz que ela se tornasse mais escassa mudando a
estrutura da oferta dessa mão-de-obra. Nesse sentido, o uso da mão-de-obra escrava
nas produções agrícolas, especialmente de cana, café, e algodão continuou até a
abolição definitiva da escravidão no ano de 1888.

2.2.2 Política migratória

Para meados do século XIX, a Europa tinha experimentado um aumento


demográfico acelerado em função à vacinação em massa da população, à nova
dinâmica econômica da revolução industrial que levou ao crescimento e concentração
populacional dos centros urbanos, às melhoras na higiene, entre outros fatores. Porém,
isso também trouxe uma rápida urbanização das cidades europeias, logo, crises severas
de excesso populacional, falta de emprego e pobreza urbana extrema. Conforme o
historiador Boris (2006, p. 207):

53
Vários fatores, de um lado e de outro do oceano, favoreceram afinal o
afluxo de imigrantes em grande número. A crise na Itália que se abateu
com mais força sobre a população pobre, resultante da unificação do
país e das transformações capitalistas, foi um fator fundamental.

Ante isso, países com vastas extensões territoriais nas Américas –


principalmente os Estados Unidos, o Brasil e a Argentina – precisavam de imigrantes
para povoar e fazer produzir suas extensas terras, assim, começaram aceitar ondas
imigratórias expressivas no século XIX e começos do século XX. Devermos observar
que em função às conjunturas socioeconômicas e políticas específicas, os países
europeus que mais migrantes mandaram às Américas foram a Irlanda (que conforme à
proximidade linguística e cultural os irlandeses emigraram para os Estados Unidos), os
Estados Germânicos (que estavam em um processo de unificação para se converter no
Estado Alemão em 1871) e a Itália (que também estava em processo de unificação para
se converter no Estado Italiano em 1861).

Assim, sob essa conjuntura a partir de 1850 o Brasil começou aplicar políticas
imigratórias e aceitar emigrantes que em sua grande maioria eram italianos e
alemães. Essa política imigratória permitiu orientar as ondas imigratórias conforme às
necessidades produtivas. No interior de São Paulo ante a escassez de mão de obra
escrava nas plantações de café começou receber imigrantes italianos como solução
alternativa. “A solução alternativa consistiu na atração de mão-de-obra europeia para
vir trabalhar nas fazendas de café.” (BORIS, 2006, p. 205). Enquanto a imigração que
aconteceu em partes do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul ajudou muito para
produzir alimentos (lacticínios, batata, cebola, leguminosas, maçã, uvas etc.) em função
à crescente demanda interna do país desses produtos. Conforme Boris (2006, p. 241):

Enquanto em São Paulo tinha por objetivo fornecer trabalhadores


para a grande lavoura, no Sul esteve ligada aos planos de colonização
baseados na pequena propriedade. [...] Os imigrantes dedicaram-
se à criação de porcos, galinhas, vacas leiteiras, batatas, verduras e
frutas até então inexistentes no Brasil, como a maçã. Tiveram também
um papel importante na instalação de oficinas e estabelecimentos
indústrias. Surgiram assim, a princípio modestamente, a indústria de
banha, de laticínios, de conserva de carne, de cerveja e outras bebidas.

Ou seja, por um lado os imigrantes europeus dessa época que começaram vir
para São Paulo era para suprir a falta de mão-de-obra dos grandes produtores de café
cuja produção tinha como destino a exportação. Essa mesma imigração mais outras que
vieram para finais do século XIX, passaram ter diversos empreendimentos produtivos e
comerciais, principalmente na cidade de São Paulo. Cidade que, aliás, não parava de
crescer, comparativamente a cidade de São Paulo tinha uma população de menos de
10.000 habitantes no ano da independência, para 1890 já tinha 65.000 e para 1930 já
era a maior cidade do Brasil com mais de 1 milhão de habitantes, comparativamente a
cidade de Rio de Janeiro tinha 522 mil habitantes no ano de 1890 (MULTIRIO, 2021).

54
Por outro lado, os imigrantes que foram para partes do Paraná, Santa Catarina
e Rio Grande Sul eram colonos que povoaram vastas regiões agrícolas de clima mais
temperado nas quais os brasileiros não estavam interessados, pois nessas regiões
não existiam grandes empreendimentos focados à exportação. Gradativamente, esses
colonos do sul do país começaram suprir a demanda interna de alimentos, e mais outros
produtos, da crescente população brasileira de finais do século XIX e começos do XX.

2.2.3 A modernização da economia

A década de 1850 não foi somente o início da estabilidade nacional e interesses


geopolíticos acertados com os países vizinhos da Bacia da Prata, foi também: o fim
do tráfico de escravos, o começo das ondas imigratórias, o começo de políticas de
comércio exterior que ajudava aos interesses da economia brasileira, o planejamento de
investimentos produtivos, a promulgação da lei de terras, normativas para definir o tipo
de empresas que poderiam operar no país, entre outras questões. Destes elementos,
conforme ao que acabamos de estudar, o que trouxe mudanças significativas foi
extinção do tráfico de escravos, pois o Império Britânico liderado pela nação britânica
mais poderosa, a Inglaterra, estava pressionando para isso há muito tempo, aliás, desde
o reconhecimento internacional da independência do Brasil em 1825.

A liberação de capitais vinda logo da abolição do tráfico – que na sua maioria


vinham de banqueiros e investidores da Inglaterra – junto à liderança diplomática
do próprio D. Pedro II trouxeram uma série de investimentos diretos e empréstimos
necessários para o desenvolvimento e modernização do país. Devermos observar
que D. Pedro II ao delegar à liderança do governo sob o Presidente do Conselho de
Ministros (nomeado pelo Poder Legislativo, mas em função de sua indicação) tinha o
tempo suficiente para se enfocar em questões de Políticas de Estado que sejam de
interesse nacional. Um desses interesses foi a Política Externa, sendo o próprio D. Pedro
II a imagem direta da diplomacia brasileira. Sua imagem como Imperador conciliador se
espalhou pelo mundo, o que ajudou ao Brasil em muitos aspectos.

A autoridade moral de D. Pedro II, devida ao seu espírito pacífico,


cresceu de tal maneira no concerto das nações que, em muitas
questões graves em que foi necessário recorrer à arbitragem, foi o
Imperador convidado a designar pessoalmente um dos membros do
tribunal chamado a julgar e a decidir esses conflitos. Prova evidente
da confiança que inspira às potências cujo interesse ou honra
estavam em jogo, a escolha deste soberano justo! Assim é que um
representante de D. Pedro II, o visconde de Itajubá, tomou parte no
congresso internacional de Genebra na questão de Alabama, entre a
Inglaterra e os Estados Unidos (BENJAMIN, 2015, p. 65).

55
Sob essa ótima imagem internacional de D. Pedro II, e políticas de estado
adequadas à época, o Brasil teve acesso à recursos financeiros e capital direto. Foi uma
época que houve desenvolvimento nos mercados de terras, de recursos produtivos
e no mercado de trabalho. A consolidação do mercado de trabalho incentivou o
crescimento de uma classe média profissional e empreendedora, gerando, assim, polos
de desenvolvimento econômico, um exemplo disso foi a cidade de São Paulo. Além de
melhoras nos mercados do setor produtivo, também houve melhoras importantíssimas
na competitividade do país, especialmente no que tange à logística para o deslocamento
tanto de pessoas como de mercadorias. Nessa época, aconteceu o empreendimento
rodoviário mais importante da época, a “Estrada União e Indústria”:

[...] construída por iniciativa de Mariano Procópio, que ligava


Petrópolis a Juiz de Fora. Iniciada em 1856, só em 1861 alcançou
Juiz de Fora, tendo uma extensão de 144 quilômetros. Era uma
via pavimentada com pedra britada, macadamizada, como se
dizia ne época, pois o sistema fora inventado pelo engenheiro
inglês Mac Adam. Impressionava por suas pontes metálicas e
pelas estações de cavalos de uma linha regular de diligências
que nela corria (BORIS, 2006, p. 198).

FIGURA 4 – PONTE DO PARAIBUNA, ESTRADA UNIÃO INDÚSTRIA

FONTE: <https://bit.ly/3NeTT7Y>. Acesso em: 24 nov. 2021.

Também houve fortes incentivos para o investimento de Estradas de Ferro


principalmente em Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Incentivos que procuravam
especialmente em melhorar a logística para escoamento de mercadorias de exportação
para os principais portos. Porém, esses incentivos precisavam ser acompanhados
com fortes investimentos seja por meio de capital direto ou por meio de empréstimos,
conforme Boris (2006, p. 199):

Esse requisito foi muitas vezes preenchido pelo capital inglês, seja sob
a forma de investimentos diretos, seja sob a forma de empréstimos.
A construção de ferrovias e a navegação a vapor revolucionaram
a economia inglesa entre 1840 e 1880, incrementando a produção

56
da indústria pesada do ferro, do aço e do carvão. A acumulação de
capitais tornou possível a concessão de empréstimos e investimentos
no exterior, sendo as inversões em ferrovias um setor privilegiado.

Essa acumulação de capitais ingleses junto à dinâmica diplomática liderada


pelo próprio D. Pedro II permitiu o desenvolvimento logístico e aquisição de recursos
produtivos para que os principais setores produtivos de Brasil pudessem se modernizar
e assim melhorar drasticamente a sua competitividade. Isso ajudou à expansão das
plantações de café na região de São Paulo, dando as bases para o desenvolvimento
industrial e comercial da cidade de São Paulo.

NOTA
O impacto positivo do capital direto na economia

No texto temos visto várias vezes o termo “capital direto”,


mas qual a sua importância no desenvolvimento? Ele é muito
importante pois ajuda ao crescimento econômico de longo
prazo, tanto no Brasil dessa época como nos dias de hoje. Por
meio do capital direto, que em termos financeiros é conhecido como
IDE (Investimento Direto Estrangeiro), os investimentos produtivos
são feitos pelas próprias empresas estrangeiras que montam projetos
no território nacional. Isso pode ser muito importante quando há uma
diferença tecnológica (gap tecnológico/produtivo) muito grande entre
nações desenvolvidas e países com menor grau de desenvolvimento
como era caso do Brasil dessa época, e de hoje também: “Havendo um
gap de “ideias” entre países pobres e ricos, o IDE seria um instrumento
importante de transferência tecnológica e de conhecimentos estratégicos
para países pobres.”

Disponível em: https://bit.ly/3im2FTq.

Para finais do período imperial sob a liderança de D. Pedro II, o Brasil tinha se
modernizado e se posicionado no cenário internacional. Porém, antes de finalizar o período
imperial devermos estudar dois fatos históricos importantíssimos que enfraqueceram
ao governo monárquico e mudaram a dinâmica política do Brasil para sempre, isto é, a
crise militar-territorial da longa Guerra do Paraguai e o final da escravidão de 1888.

57
3 A GUERRA DO PARAGUAI (1864-1870)

Existem vários fatores que se juntaram para dar início a Guerra do Paraguai; um
deles foi o próprio processo de consolidação política das novas nações independentes
da Bacia da Prata, isto é, o Brasil, a Argentina, o Uruguai, e o Paraguai. Nesse sentido,
antes de adentrarmos nos acontecimentos dessa Guerra vamos estudar sobre a
conjuntura política desses países um pouco antes de iniciar a Guerra do Paraguai, ou
seja, no ano 1864, questão indispensável para entender os motivos que deram início à
Guerra do Paraguai.

Na dinâmica da política brasileira, as forças políticas estavam consolidadas


entre os Conservadores e Liberais. Nesse jogo de poder político entre conservadores e
liberais, e conforme à conjuntura política, o Imperador D. Pedro II indicava os possíveis
candidatos para ser eleito Presidente do Conselho de Ministros, logo disso o poder
legislativo fazia a eleição do Presidente do Conselho. Só para nos lembrar o que foi
estudado no tópico anterior, o Presidente do Conselho de Ministros era o líder para
governar o poder executivo, sob a gestão de moderador do imperador. Assim, sob esse
jogo de poderes, o Presidente do Conselho de Ministros poderia ser em um momento
liberal e em outro conservador.

Ou seja, o balanço de poderes estava na capacidade de D. Pedro II junto ao


Poder Legislativo eleger ao Presidente do Conselho em função da conjuntura política
do momento. Nessa dinâmica política, o Brasil de 1864 estava governado sob a
liderança dos liberais, que no contexto de política externa dos países vizinhos apoiavam
aos “Colorados” (liberais) na Guerra Civil do Uruguai. Os Colorados lutavam contra os
“Blancos” (conservadores e contra a livre navegação na Bacia da Prata); tinham afinidade
com o governo da Argentina de 1864, sob a liderança do Presidente Bartolomé Mitre que
era liberal; e estavam apreensivos com o novo Presidente do Paraguai, Francisco Solano
López, que apoiava aos “Blancos” do Uruguai e assim como tinha afinidade com a causa
dos Federalistas da Argentina.

A dinâmica política da Argentina estava baseada na liderança do Presidente


da República, quem poderia ser de cunho mais liberal; ou poderia ser alineado aos
“Federalistas”, os quais eram de cunho mais conservador e que procuravam executar o
projeto político da “Confederação Argentina” por meio da união das nações da Bacia da
Prata. Esse projeto político implicava o desejo de anexar o Uruguai e o Paraguai à Argentina,
inclusive se almejava anexar a Provincia de Rio Grande do Sul do Brasil Imperial. Eis o
embate do Brasil Imperial contra a Argentina, que inclusive foi um dos motivos para que a
Província Cisplatina se convertesse em uma nação independente, conforme estudamos
anteriormente. A Argentina de 1864, estava governada pelo Presidente Bartolomé Mitre
de cunho Liberal, quem, assim como o Brasil, apoiava também aos “Colorados” na Guerra
Civil do Uruguai. Ou seja, existia afinidade política no Brasil e na Argentina nesse ano
crítico para ajudar ao Uruguai e enfrentar as intenções de expansão do Paraguai.

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A dinâmica política do Paraguai dependia de sua condição geopolítica de
uma nação sem acesso ao mar, nesse sentido, esse país buscava reforçar sua posição
regional disputando terras fronteiriças tanto do Brasil como da Argentina e assim ter
controle das terras próximas dos rios da Bacia da Prata. E principalmente buscava
uma solução logística para escoamento de suas exportações por meio de um aliado
confiável que tenha acesso direto ao mar, nesse contexto geopolítico, eles procuravam
ser aliados dos “Blancos” do Uruguai. No ano de 1862 tomou posse como Presidente de
Paraguai Francisco Solano López, quem apoiava a causa política tanto dos “Federalistas”
da Argentina como dos “Blancos” na Guerra Civil do Uruguai. Além disso, no contexto
brasileiro, desde 1850 o Paraguai tinha gerado algumas barreiras à livre navegação
de navios brasileiros pelo rio Paraguai, essencial para ter acesso à província de Mato
Grosso, logo, o Brasil de 1864 já estava apreensivo com o Paraguai.

A dinâmica política do Uruguai estava em função de uma longa Guerra Civil


entre os “Colorados” e os “Blancos”. Devermos observar que a luta política no Uruguai é
peça-chave nos conflitos que levaram à Guerra do Paraguai, conforme vamos ler mais
adiante. Os “Colorados” eram de cunho mais liberal que desejavam o livre comércio e a
livre navegação ao longo da Bacia da Prata. Enquanto os “Blancos” eram de cunho mais
conservador que recebiam o apoio dos Federalistas da Argentina e do Presidente do
Paraguai, Francisco Solano López. O projeto político dos “Colorados” de livre navegação
ao longo da Bacia da Prata vinha recebendo apoio do Brasil e do Presidente Mitre da
Argentina. Eis uns dos motivos do porquê da intervenção do Brasil no ano de 1864
na Guerra Civil de Uruguai, assim, a intervenção direta do Brasil ajudou ao líder dos
“Colorados”, Venancio Flores, assumir o poder político do Uruguai, conforme o historiador
Doratioto (2014, p. 40):

[...] os governos argentino e brasileiro, ambos governados por


adeptos do pensamento liberal, aproximavam-se, interessados na
vitória de Flores. Atendendo a demandas dos fazendeiros gaúchos
com interesses no Uruguai e buscando equilibrar a influência de Mitre
junto aos colorados, o governo imperial interveio a favor dos rebeldes
colorados. A intervenção foi possível porque havia a convergência
ideológica e de interesses entre Mitre e os novos governantes
brasileiros, com estes deixando claro que não tinham interesses em
relação ao Estado Oriental que fossem prejudiciais a Buenos Aires.

Conforme ao dito por Doratioto e pelos fatos históricos tanto o Brasil como a
Argentina estavam a favor dos “Colorados” e apreensivos com o novo presidente do
Paraguai, ambas as nações estavam sendo governadas pelos liberais. Nesse contexto,
a intervenção do Brasil com tropas imperais em território uruguaio foi permitido pela
Argentina, pois estava claro que essa intervenção tinha só fins de apoiar aos Colorados,
os quais de fato logo dessa operação militar por parte do Brasil conseguiram acabar
de vez com a Guerra Civil e assumir o poder político desse país por meio de seu líder
Venancio Flores.

59
Porém, o Presidente Francisco Solano López do Paraguai não pensava que a
invasão conjuntural do Brasil ao Uruguai era só para ajudar aos “Colorados”. Solano López
apoiava de maneira ativa ao projeto de um governo uruguaio liderado pelos “blancos”,
e assim ter um porto adicional – de um potencial país aleado – ao de Buenos Aires,
visando garantir a logística do comércio exterior de seu país. Nessa linha de raciocínio
e pensando nos interesses do Paraguai, ele assumiu que a intervenção militar por parte
das tropas imperais brasileiras tinham intenções de recuperar as terras de Uruguai e
depois disso tanto a Argentina como o Brasil ficariam contra o Paraguai com possíveis
repercussões geopolíticas para seu país. Sob esse cenário o presidente do Paraguai
montou uma estratégia pensando que poderia derrotar às tropas brasileiras e neutralizar
à Argentina sob um governo liberal, conforme ao historiador Doratioto (2014, p. 40):

[...] Solano López acreditou que poderia derrotar militarmente


o Brasil e anular o governo argentino. Este seria batido por um
levante federalista apoiado pelo Paraguai, enquanto no Uruguai os
blancos se uniriam às tropas paraguaias que iriam ao seu socorro e
venceriam as forças do Exército imperial, que invadiram o Uruguai
em outubro de 1864.

Convencido na sua estratégia, em dezembro de 1864, tropas paraguaias
invadiram o Mato Grosso e ocuparam Corumbá. E logo depois em abril de 1865 eles
invadiram a Provincia de Corrientes ocupando a capital da província, a cidade de
Corrientes. Enquanto isso o Presidente do Paraguai estava apoiando aos “Blancos”,
pensando que eles poderiam recuperar o poder político do Uruguai; assim como também
estava apoiando aos “Federalistas”, sob o entendimento que logo do desprestígio
do Presidente liberal Mitre por ter perdido a província de Corrientes os “Federalistas”
pudessem assumir o Governo da Argentina.

Ou seja, a estratégia do Presidente Paraguaio, Solano López, era que por meio
dessas intervenções – a de Mato Grosso no Brasil, e a de Corrientes na Argentina – a
Argentina iria-se converter para que seja governada pelos “Federalistas” e o Uruguai
ira-se converter para que seja governado pelos “Blancos”, e dessa maneira formar uma
“tríplice aliança”, isto é, a Argentina, o Paraguai e o Uruguai contra do Brasil. Dessa
maneira, sob essa linha de raciocínio, o desejo geopolítico do Presidente do Paraguai,
Solano López, era de converter seu país no “Grande Paraguai” se apoderando de Mato
Grosso e invadindo a província de Corrientes na Argentina para com isso conseguir
depois invadir Rio Grande do Sul. Com isso além de expandir consideravelmente o seu
território também poderia ter acesso direto ao mar.

Nesse sentido, para atingir isso além da estratégia de uma possível “tríplice
aliança” contra o Brasil, ele vinha se preparando militarmente, por meio do serviço militar
obrigatório e ter a disposição já para finais do ano de 1864 mais de 80.000 homens nas
suas tropas. Porém, a realidade histórica foi outra, a “tríplice aliança” foi ao contrário,
isto é, o Brasil, a Argentina e o Uruguai contra o Paraguai. Historicamente o Paraguai fez
uma coisa inédita, tornar ao Brasil e a Argentina em aliados em uma guerra.

60
Ocorria a inversão da política para o Prata implementada, há quase
duas décadas, pois o eixo Rio de Janeiro-Assunção, para conter
Buenos Aires, era substituído pela aliança Rio de Janeiro-Buenos
Aires, para conter Assunção; era uma situação inédita e que não se
repetiria após o término da guerra (DORATIOTO 2014, p.44)

3.1 O TRATADO DA TRÍPLICE ALIANÇA

Logo de quase 6 meses da invasão do Paraguai ao Mato Grosso no dia 1º de


maio de 1865 foi assinado o Tratado da Tríplice Aliança – o Brasil, a Argentina e o Uruguai
- contra o Paraguai. Os aliados pensaram que a guerra iria ser breve, mas os fatos
históricos mostraram todo o contrário, a Guerra começou oficialmente no ano de 1865 e
finalizou somente no ano de 1870. A guerra foi longa por uma série de fatores e detalhes
que não são do escopo de nossos estudos, mas vamos ver os principais destes.

• Na prática, o Brasil foi o país que tinha mais tropas, marinha preparada e melhor logística
de guerra dos aliados da Tríplice Aliança, ainda assim juntando os três países faltavam
tropas contra as numerosas tropas e logística do Paraguai. Nos começos, a guerra:

[...] se apoiava na falta de efetivos compatíveis com o valor do inimigo,


e da própria logística de guerra que necessitava de tempo e dinheiro
para ser redirecionada. Não foi por acaso que a Tríplice Aliança partiu
para a guerra com um efetivo de aproximadamente 65.000 homens,
diante de um inimigo que pensavam ser de igual número, sem falar
na sua reserva (REVISTA CELSA, 2006, p. 48).

• A Argentina não estava ainda bem-preparada, pois o Presidente Mitre precisava de


um projeto de guerra a ser analisado e aprovado, ainda menos o Uruguai que acabava
de finalizar uma longa guerra civil entre os “Colorados” e os “Blancos”. A Argentina
precisava-se preparar, pois para iniciar uma guerra “[...] somente com disponibilidade
de Marinha, coisa que ele não tinha, muito menos efetivo militar para aventurar-se
com um inimigo que já sabia ser muito numeroso.” (REVISTA CELSA, 2006, p. 48).

• A geografia era vasta e inóspita de pouco conhecimento por parte das tropas aliadas,
além disso os combates eram muito distantes dos centros logísticos dos aliados.

61
IMPORTANTE
Quer saber mais detalhes sobre o Tratado da Tríplice Aliança e a Guerra
do Paraguai. Acesse ao artigo: Guerra do Paraguai: o maior conflito sul-
americano: https://www.politize.com.br/guerra-do-paraguai

Nos primeiros meses da Guerra parecia que ela ia ser um confronto bélico breve,
inclusive houve sucesso dos aliados nos primeiros meses desta, na Batalha Naval do
Riachuelo no mês de junho de 1865. A partir dessa batalha o percurso da guerra mudou
a favor dos aliados. A batalha aconteceu às margens da ribeira Riachuelo, um afluente do
rio Paraná na província de Corrientes da Argentina. Nessa batalha os navios da marinha
imperial do Brasil saíram vitoriosas pois acabaram de vez com a frota naval do Paraguai.
Esse grande sucesso mudou a condição do Paraguai, pois esse país não tinha mais a
logística de sua frota naval para se deslocar e se abastecer. Assim, a logística de guerra
do Paraguai mudou de uma aposição ofensiva para uma defensiva.

Todavia, apesar da vitória dos aliados e ter colocado ao Paraguai numa posição
defensiva a guerra não foi breve. Tudo o contrário as batalhas continuaram por vários
anos, aos poucos as tropas do Paraguai foram se afastando dos territórios invadidos
até se isolar no interior do Paraguai. Logo de quase de quatro anos de guerra a capital
Assunção tinha sido ocupada pelas tropas brasileiras, bem no começo do ano 1869.

A Ocupação e saque de Assunção ocorreu a partir de 1 de janeiro de


1869 quando as forças brasileiras na Guerra do Paraguai ocuparam a
capital paraguaia. Assunção ficou deserta, evacuada por todos seus
habitantes e se viu cercada pelos 30.000 soldados do Conde d'Eu
(REVISTA JUS, 2019).

A ocupação de Assunção foi o começo do fim da Guerra, inclusive os aliados


começaram negociar com as forças políticas contrárias ao ditador Solano López as
condições de um tratado de paz. Porém, o ditador paraguaio Francisco Solando López
ainda se mantinha firme no interior do Paraguai, depois da ocupação de Assunção
ainda aconteceram longas batalhas que finalizaram somente no ano de 1870 com o
abatimento de Francisco Solano López na batalha do Cerro Corá.

Solano López morreu em combate com tropas brasileiras em 1o


de maio de 1870 e, no mês seguinte, os representantes Aliados
assinaram com o governo provisório protocolo declarando a paz e
no qual o Paraguai aceitava, no geral, o Tratado da Tríplice Aliança
(DORATIOTO, 2014, p. 47).

No contexto da conjuntura política, quando a capital Assunção foi ocupada, 1º


de janeiro de 1869 as forças políticas que governavam tanto o Brasil como a Argentina
já não eram as mesmas. No mês de julho de 1868 o Presidente do Conselho de Ministros

62
ficou nas mãos dos Conservadores, ou seja, o Partido Conservador assumiu a gestão
do Governo Imperial. Isso implicava que o Brasil ficou mais de olho nas intenções da
Argentina na Bacia da Prata. “Os governantes conservadores desejavam o fim da
aliança com a Argentina, mas de forma natural, com o desaparecimento dos motivos
que levaram à sua origem.” (DORATIOTO, 2014, p.46) Ou seja, por meio da iminente
derrota do Paraguai os conservadores brasileiros estavam aguardando o fim da guerra,
logo, também seria o fim da Tríplice Aliança. Dessa maneira, com o fim da Guerra o
Brasil poderia negociar com o novo Governo do Paraguai tratados de paz que possam
neutralizar os interesses da Argentina.

Entretanto, na Argentina em 1868 o mandato do Presidente Mitre tinha


finalizado, o novo Presidente, Domingo Faustino Sarmiento estava apreensivo com as
intenções de um Brasil Imperial sob o comando de um Governo Conservador. “O novo
presidente resistia à aliança com o Brasil, desconfiando de eventuais planos do Império
para tornar-se potência continental no período da pós-guerra à custa de seus vizinhos.”
(DORATIOTO, 2014, p. 47). Assim, com as mudanças dos governos tanto no Brasil como
na Argentina as negociações de paz com o novo governo de Paraguai demoraram mais
de dois anos logo de ter finalizado a guerra.

Por um lado, o Brasil queria se assegurar suas posições fronteiriças tanto


com o Paraguai como com a Argentina, e sobretudo queria assegurar o direito de
Livre Navegação na Bacia da Prata. Por outro lado, a Argentina queria assegurar os
territórios do “El Cacho”, traçando a fronteira entre a Argentina e o Paraguai ao longo
do rio Paraguai até que esse rio se adentrasse em território paraguaio, dessa maneira, a
nova delimitação deixava a capital Assunção literalmente na fronteira com a Argentina
às margens do Rio Paraguai, conforme podemos observar nos dois mapas expostos
mais adiante. Isso permitiria aos argentinos ter controle sob a navegação ao longo do
rio Paraguai. Com esses impasses de por meio, o processo de negociações finalizou
nos começos de 1872.

Em fevereiro de 1872, foram assinados os Tratados de Paz; de Limites;


de Extradição e de Amizade, Comércio e Navegação entre Brasil e
Paraguai. O Império brasileiro realizou, então, seus objetivos históricos
em relação ao Paraguai: as fronteiras foram definidas nos termos
perseguidos pelo Rio de Janeiro há duas décadas – restringindo-a,
inclusive, ao rio Apa conforme reivindicação tradicional, em lugar de
avançar até o Igurei, como estabelecera o Tratado da Tríplice Aliança
– e a livre navegação dos rios internacionais nos termos de Direito
Internacional. Esses tratados permitiram, ainda a continuidade, por
tempo indeterminado, da presença de tropas brasileiras em território
paraguaio (DORATIOTO, 2014, p. 52).

Os tratados de Paz permitiram ao Brasil reivindicar sua posição original e


sobretudo permitiram o direito de livre navegação dos rios internacionais ao longa da
Bacia da Prata. Esse direito de livre navegação vem permitindo ao Brasil navegar pelas
correntezas tanto do rio Paraguai como do rio Paraná, os quais contornam as fronteiras

63
ao longo do Paraguai e da Argentina; e do lado da fronteira com o Uruguai e a Argentina
ao longo do rio Uruguai. Nessa época o direito de livre navegação era uma questão de
logística importantíssima para o Brasil, já que era a única maneira de manter contato
– deslocamento de pessoas, correspondência e comércio de mercadorias – com a
província de Mato Grosso (hoje divide-se nos estados de Mato Grosso e Mato Grosso
do Sul). Essa logística fluvial era importante em função dos vastos e agrestes territórios
que afastavam essa extensa região com os centros de poder econômico e político da
região sudeste do Brasil.

FIGURA 5 – MAPA FLUVIAL DA BACIA DO PRATA

FONTE: <https://bit.ly/36vxX7J>. Acesso em: 12 dez. 2021.

No que tange à questão de segurança nacional, o direito de livre navegação


permitiu ao Brasil neutralizar possíveis intenções tanto do Paraguai como da Argentina.
Conforme podemos observar no mapa de acima, no rio Paraguai e Paraná a marinha
brasileira poderia contornear a divisa entre a Argentina e o Paraguai até a Capital
Assunção; e logo poderia continuar ao longo do rio Paraguai, atravessando esse país
até entrar de novo em território brasileiro no que hoje é o estado de Mato Grosso do
Sul, do mesmo modo, a marinha poderia navegar rio para baixo ao longo do rio Paraná
até ele convergir com o rio Uruguai no Mar do Prata. Ou seja, a Marinha Brasileira com
o direito de livre navegação poderia neutralizar qualquer possível tentativa militar tanto
da Argentina como do Paraguai. Por outro lado, os tratados de paz de 1872 deram à
Argentina o direito de ficar com a região do “El Chaco”, permitindo além de ficar com
esses territórios ter a sua fronteira literalmente do lado da Capital do Paraguai, Assunção.

64
3.2 CONSEQUÊNCIAS DA GUERRA DO PARAGUAI

A Guerra do Paraguai teve importantes consequências para os países envolvidos


tanto no contexto geopolítico como na consolidação nacional. No contexto geopolítico
dos países que conformam a Bacia da Prata os tratados de paz e a pós-guerra trouxe
estabilidade nas intenções desses países, a partir daí não houve mais conflitos
territoriais de grande relevância e as quatro nações puderam se concentrar nos seus
próprios desafios internos já como nações consolidadas. Contudo, cada uma dessas
nações tiveram caminhos de desenvolvimento político e econômico muito diferentes,
nesse sentido, vamos analisar essas consequências a partir do país que perdeu a guerra
para finalizar com o Brasil.

Para o Paraguai foi uma experiência traumática, o país perdeu grande parte
de sua população nesses longos anos de conflito, segundo o historiador Boris (2006,
p. 216): “Os cálculos mais confiáveis indicam que metade da população paraguaia
morreu, caindo de aproximadamente 406 mil habitantes, em 1864, para 231 mil
em 1872. A maioria dos sobreviventes era de velhos, mulheres e crianças.” Além de
perder quase a metade de sua população, o país ficou financeiramente quebrado sem
capacidade de retomar suas exportações, e teve perda territorial e destruição de seu
território. Assim como teve que renunciar a litígios territoriais que tinha tanto com a
Argentina como com o Brasil. No que tange ao impacto da redução de seu território,
vejamos o que era o Paraguai antes da guerra, os territórios ocupados ao início do
conflito e os territórios perdidos após da Guerra, se observarmos o mapa o país perdeu
mais de 1/3 de seu território.

FIGURA 6 – MAPA DO PARAGUAI ANTES E DEPOIS DA GUERRA DO PARAGUAI

FONTE: <https://journals.openedition.org/terrabrasilis/1908>. Acesso em: 12 dez. 2021.

65
Para a Argentina, a principal vitória talvez seja a consolidação como nação, pois
após da Guerra esse país conseguiu acabar de vez com os “Federalistas”. No contexto
geopolítico o país ganhou a região do “El Chaco”, o que permitiu à Argentina ter a sua
fronteira literalmente ao lado da Capital Assunção, conforme podermos observar no
mapa de acima. No contexto do fim dos “Federalistas”, como força política, permitiu aos
argentinos se concentrarem no desenvolvimento socioeconômico da nação, com uma
política econômica de cunho mais liberal e globalizada. Isso foi uma das bases para seu
acelerado desenvolvimento econômico das décadas depois de ter terminado a Guerra
do Paraguai, inclusive para começos do século XX a Argentina era considerada como
uma das nações mais ricas do mundo com um PIB per capita acima da Alemanha ou
da França. Eis um dos porquês Buenos Aires de começos de século XX era considerada
uma das capitas mais ricas e importantes do mundo.

Pouco antes da Primeira Guerra Mundial, sua economia podia


se orgulhar de solvência e de uma taxa média de crescimento
econômico de 6% nos últimos 35 anos. Para se ter uma ideia de sua
força econômica, se naqueles anos a França tinha uma renda per
capita de US $ 3.452, a Argentina chegava a US $ 3.797, ou seja, 10%
maior (EL BLOG SALMÓN, 2020, on-line).

Para o Uruguai o período de pós-guerra também foi uma época de consolidação,


pois finalmente acabaram com a constante luta bélica entre os “Colorados” e “Blancos”.
Sua economia assim como a da Argentina entrou em uma fase de crescimento acelerado,
para começos do século XX tanto o Uruguai como a Argentina eram considerados
países com um nível de desenvolvimento econômico de primeiro mundo. Diferente da
Argentina, o Uruguai é um país pequeno próximo das grandes regiões metropolitanas
Rio de Janeiro, São Paulo e Buenos Aires), daí seu apelido da “Suíça da América Latina”.

E para o Brasil, como foram as décadas da pós-guerra? Embora a vitória


gerou um sentimento de consolidação e força nacional, no Brasil ainda existiam
questões a serem resolvidas de sua estrutura política, principalmente entre as forças
políticas que defendiam o Brasil Imperial e as que estavam a favor da formação do Brasil
como república. Logo de finalizar a guerra vieram as críticas políticas do forte gasto
que isso representou, pois o país tinha arcado com a maior parte do gasto da Guerra.
Aliás, as tropas imperiais do Brasil foram as que mais estiveram envolvidas na Guerra,
o que implicava um forte orçamento público para dar conta de toda a logística de mais
de 5 anos de conflitos bélicos. Isso teve grandes repercussões, entre elas: a economia
brasileira ficou fortemente endividada, pois grande parte desse orçamento de guerra foi
financiado com dívida vinda de bancos ingleses.

Para o Brasil, uma das consequências do conflito foi que o país ficou
ainda mais endividado com a Inglaterra, com a qual tinha restaurado
as relações diplomáticas, no início das hostilidades. Mas a maior
consequência foi a afirmação do Exército como uma instituição com
fisionomia e objetivos próprios (BORIS, 2006, p. 216).

66
Assim como menciona o historiador Boris, outra consequência importante foi
o fortalecimento do Exército Brasileiro em detrimento da imagem do Brasil Imperial.
Nesse sentido, tanto o impacto econômico do orçamento para a Guerra como o
fortalecimento da imagem do Exército Brasileiro alimentaram as críticas que se vinham
produzindo ao sistema de governo monárquico. E se nessas críticas - mais outros
fatores de cunho político e socioeconômico - se acrescentarem o fim da escravidão
no ano de 1888 deram as ferramentas políticas que os republicanos precisavam para
pôr fim à monarquia e dar começos ao Brasil como república. Isso aconteceu de fato
no ano de 1889, assunto de estudos que vamos ver no começo da seguinte Unidade,
no subtópico “A consolidação da República”.

Antes de terminar a unidade, convido você para ler a interessante Leitura


Complementar desta unidade 1, cujo tópico é sobre como o Reino Unido encarou
a escravidão, nesse artigo vamos ver o real peso que tinha a escravidão no maior
império do século XIX. Além disso é fundamental revisar os temas mais importantes
deste último tópico com a ajuda de Resumo do Tópico 3. Depois disso, não deixe de
realizar as autoatividades!

67
LEITURA
COMPLEMENTAR
REINO UNIDO ENCARA SUA HISTÓRIA DA ESCRAVIDÃO

Jo Bryan Harper
DEUTSCHE WELLE BRASIL

Economia britânica lucrou muito com o tráfico de escravos, mas esse capítulo foi
esquecido nos currículos escolares do país, dizem historiadores. Protestos impulsionam
acerto de contas com passado colonial.

Com estátuas indo abaixo ou ameaçando ser derrubadas em todo o Reino


Unido, após os protestos iniciados pelo movimento Black Lives Matter (Vidas Negras
Importam) nos EUA, aumentou o interesse sobre a história do comércio de escravos e
seus impactos. O Reino Unido, que participou ativamente no tráfico negreiro nos séculos
17 e 18, tem um papel fundamental nesse que é um dos mais profundos erros históricos.

De acordo com o historiador David Richardson, navios britânicos levaram ao


menos 3,4 milhões de africanos capturados para as Américas dos cerca de 12 milhões
de africanos escravizados transportados por comerciantes europeus.

"A revolução industrial e a contribuição da escravidão para a economia


britânica estiveram profundamente entrelaçadas, dificultando a identificação exata
do impacto de longo prazo do comércio de escravos", afirmou à DW o historiador
Richard Toye, coautor do livro a ser lançado em breve The Churchill Myths (Os mitos
de Churchill, em tradução livre).

Nesse "comércio triangular", navios partiam do Reino Unido carregados de


mercadorias, que eram trocadas nas costas da África Ocidental por escravos capturados
por governantes locais. Após cruzar o Atlântico, esses africanos escravizados eram
obrigados a trabalhar em plantações. Nas Américas, os navios eram então carregados
com produtos do trabalho escravo – culturas de exportação e mercadorias como açúcar
e rum – para serem vendidas no Reino Unido.

As plantações de açúcar foram fundamentais para criar as colônias mais


rentáveis do Reino Unido. Até o final do século 18, Bristol, Glasgow e Liverpool se tornaram
os principais portos de movimentação de cargas trazidas dos territórios coloniais.

68
"A economia escravocrata britânica era imensa e extremamente complexa.
Embora não seja possível fornecer uma cifra exata de quanto dinheiro britânico esteve
vinculado aos lucros da escravidão, é claro que a economia se beneficiou enormemente
da exploração do trabalho escravo africano no Caribe", disse à DW Ryan Hanley,
historiador da Universidade de Exeter.

O comércio de escravos também foi peça-chave no desenvolvimento de


uma economia mais ampla. "As barras de cobre que alguns comerciantes britânicos
trocavam por africanos escravizados, por exemplo, eram produzidas no sul de Gales,
assim como as roupas de lã baratas usadas como uniformes para os escravizados nas
Índias Ocidentais", exemplificou Hanley.

"Obviamente, a escravidão e o colonialismo estiveram intimamente ligados


ao desenvolvimento de grande parte da infraestrutura financeira que permitiu ao
Reino Unido emergir como a potência econômica e imperial global do século 19",
acrescentou o historiador.

O comércio deu um grande estímulo ao setor de seguros. A necessidade


de grandes quantidades de crédito para os comerciantes de escravos também foi
significativa no estabelecimento de vários dos maiores bancos do país. O Lloyd's
de Londres, o Barclay's e o Banco da Inglaterra têm relação com a consolidação ou
expansão da escravidão praticada pelos britânicos, observou Hanley.

Edward Colston, cuja estátua foi derrubada em Bristol, deixou uma grande
contribuição para a Sociedade dos Mercadores Empreendedores, uma organização que
foi fundamental para o desenvolvimento da empresa ferroviária Great Western Railway
durante o período vitoriano. "De fato, grande parte do financiamento das ferrovias,
símbolo amado do progresso industrial vitoriano, tem sido associado aos pagamentos
de indenização concedidos a proprietários de escravos", disse Hanley.

Alguns historiadores, no entanto, questionam quanto do comércio de


escravos permeou a economia cotidiana do Reino Unido. "Geralmente, as pessoas
se alimentavam, se vestiam e se abrigavam sem usar nenhum produto fabricado
pelo trabalho escravo", apontou David Eltis, historiador da Universidade Emory, que
administra o site slavevoyages.org – um memorial digital sobre esse capítulo histórico
com vasta documentação da época. "Açúcar, café e rum englobam uma parcela trivial
das dietas britânicas".

O historiador vê com ceticismo os vínculos com a industrialização e observa


que os maiores comerciantes de escravos e o maior império de escravos das Américas
foi composto por portugueses e brasileiros. "O Reino Unido se industrializou, Portugal
não, pelo menos até muito mais tarde. Como a escravidão e o comércio de escravos
tiveram algo a ver com o desenvolvimento do Ocidente? Alemanha, Itália e outros
países não tinham vínculos com a África e as Américas, e mesmo assim conseguiram se
desenvolver", pontuou Eltis.

69
Abolição e indenização

Somente com a Lei de Abolição da Escravidão de 1833, a instituição foi finalmente


abolida no Império Britânico. Os proprietários de escravos nas Índias Ocidentais Britânicas
receberam uma indenização de 20 milhões de libras, quantia estimada atualmente em
cerca de 20 bilhões de libras (132 bilhões de reais).

Na época, isso representava aproximadamente 40% do orçamento público do


país. Esse foi o maior pagamento patrocinado pelo Estado na história britânica antes
da crise bancária de 2008. Entre os indenizados, de acordo com pesquisadores da
Universidade College London (UCL), estiveram ancestrais do ex-primeiro-ministro David
Cameron e a Igreja da Inglaterra.

"Após a abolição, um grande erro foi cometido quando se decidiu compensar


os ex-proprietários de escravos em vez daqueles que haviam sido escravizados",
destacou Toye.

Para Catherine Hall, chefe de um projeto de pesquisa sobre escravidão na


Universidade de Londres, a escravidão foi esquecida na história britânica convencional.
"O que tem sido lembrado é a abolição, e não o tráfico de escravos, e um número
extraordinário de pessoas não sabem sobre o passado colonial do Reino Unido em
relação à escravidão", disse num programa de rádio da emissora BBC.

Opinião semelhante tem o historiador David Olusoga. Segundo ele, por décadas,
o sistema educacional do país, rejeitou "apelos e pedidos" feitos por duas gerações de
negros britânicos para que a história dos negros se tornasse uma parte essencial do
currículo nacional. "Como resultado, isso se tornou um ponto cego nacional, uma lacuna
em nosso conhecimento coletivo que afeta a todos nós ‒ pretos e brancos", escreveu
no jornal The Guardian.

Hanley disse que, atualmente, o Reino Unido está fazendo um acerto de contas
com seu passado colonial e os efeitos desta história no presente. "Para muitas pessoas,
esse processo será doloroso. Contar a verdade histórica geralmente o é", acrescentou.

Fonte: https://bit.ly/3IiYCl7.

70
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• O Segundo Reinado de D. Pedro II durou quase 50 anos, época na qual o Brasil conseguiu
resolver problemas fronteiriços com seus países vizinhos da Bacia da Prata.

• A Bacia da Prata e sua vasta região era uma questão geopolítica muito importante
para o Brasil e demais países vizinhos, daí a importância do sucesso das intervenções
brasileiras na Região da Prata.

• O sucesso do Brasil da Guerra da Prata, ano 1851, permitiu ao Brasil se consolidar


ainda mais sua Unidade Nacional e deu ao país uma época de estabilidade política
que lhe deu espaço para iniciar uma série de Política de Estado que se focaram no
desenvolvimento de sua economia e consolidação de sua política externa.

• No ano 1850 o Governo Imperial de D. Pedro II conseguiu finalmente acabar com


o tráfico de escravos, isso permitiu uma melhora na imagem externa do Brasil
permitindo a entrada de capita direto e empréstimos para o desenvolvimento
socioeconômico do país.

• A Guerra do Paraguai trouce uma série de consequências ao Brasil, consolidou a


imagem do exército e dos que desejavam os fundamentos do Brasil como república
em detrimento da perda de imagem do Brasil Imperial.

71
AUTOATIVIDADE
1 Durante grande parte do século XIX os países que conformam a vasta região da
Bacia de Prata passaram por vários conflitos bélicos, entre eles a guerra que deu
a independência à Província Cisplatina do Brasil para se converter na república do
Uruguai, a segunda foi a Guerra da Prata e por último temos a Guerra do Paraguai.
Sobre a importância geopolítica da Bacia da Prata a seguir defina qual das sentenças
é a correta. A vasta região da Bacia da Prata era importante para os interesses dos
países que a conformavam, e conformam hoje, em função:

a) ( ) da exploração de recursos mineiros aí disponíveis, daí que vem o seu nome.


b) ( ) de seus solos muito ricos, daí do interesse tanto do Brasil como da Argentina de
se apoderar dos territórios do Paraguai, aliás, interesse que deu origem à Guerra
do Paraguai.
c) ( ) da logística de navegação e sua importância comercial e militar ao longo de seus
três maiores rios, o rio Paraná, o rio Uruguai e o rio Paraguai.

2 Entre um dos interesses sob os conflitos da Bacia da Prata estava o direito de


navegação ao longo dos principais rios que formam essa extensa bacia. Das
quatro nações que se envolveram no conflito da Guerra do Paraguai, esse direito
de navegação era importante tanto para o Paraguai como para o Brasil. Porém, a
maneira de abordar essa necessidade foi diferente. A seguir explique o porquê era
fundamental para essas duas nações e qual foi a maneira de abordar esse assunto
tanto para o Paraguai como para o Brasil antes de iniciar a Guerra do Paraguai.

3 A questão dos conflitos e da Guerra Civil no Uruguai entre os “Colorados” e “Blancos”,


é peça-chave para entender um dos motivos que iniciaram a Guerra do Paraguai.
Sobre esse conflito entre esses dois movimentos políticos do Uruguai, a seguir
determine quais das sentenças estão corretas:

I- Os “Colorados” procuravam entre outras coisas o livre direito de navegação


internacional na Bacia da Prata, daí uma das afinidades desse movimento com
o Brasil. Assim, como procuravam neutralizar os interesses dos “Federalistas” da
Argentina que eram aliados dos “Blancos”.
II- Esses dois movimentos procuravam o direito do Uruguai para se manter como
nação independente. O conflito radica no fato que os “Colorados”, que eram mais
conservadores, procuravam a ajuda do Brasil Imperial para neutralizar à Argentina.
Enquanto os “Blancos” recebiam ajuda tanto do Paraguai como do movimento
“Federalista” da Argentina para neutralizar ao Brasil.
III- O presidente do Paraguai, LOPEZ, apoiava aos “Blancos” desejando que esse grupo
pudesse ganhar a Guerra Civil do Uruguai e assim ter um aliado confiável que esteja
contra os interesses do Brasil, assim como lhe pudesse oferecer a logística de um
porto marítimo para escoar seu comércio exterior.

72
Dessas sentenças a seguir determine a sequência correta:

a) ( ) Somente a sentença III está correta.


b) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.

4 Entre um dos acontecimentos mais importantes do Segundo Reinado foi o fim


do tráfico de escravos a partir do ano de 1850. Sobre a importância disso a seguir
determine quais sentenças estão corretas:

a) ( ) Com o fim do tráfico de escravos, a única fonte de escravos foram os Afro-


Americanos, ou seja, os africanos nascidos em solo brasileiro. Isso encareceu o
custo de mão-de-obra nas lavouras agrícolas.
b) ( ) O fim do tráfico de escravos ajudou muito nas relações políticas e comerciais
do Brasil com o Reino Unido, desde que os britânicos vinham solicitando e
pressionando sobre assunto desde a declaração da independência do Brasil.
c) ( ) O fim do tráfico de escravos significou que no Brasil ficou proibido a compra e
venda de escravos no território nacional, isso parou de fato a entrada de novos
escravos ao país.

A seguir, determine a sequência correta:

a) ( )F-V-V
b) ( )V-V-F
c) ( )V-F-F
d) ( )V-F-V

5 A partir da década de 1850 o Brasil começou receber várias ondas migratórias, as quais
só vieram a se intensificaram a finais do século XIX e começos do XX. Mas as imigrações
que aconteceram até finais do Segundo Reinado e começos da República em 1889
tiveram finalidades específicas, especialmente no interior de São Paulo. Sobre essa
finalidade explique qual era demanda principal de imigrantes no interior de São Paulo.

73
74
REFERÊNCIAS
ALVES FILHO, A. Aspectos políticos e administrativos da formação e consolidação do
Estado nacional brasileiro (1808-1889). Revista Portuguesa e Brasileira de Gestão,
Rio de Janeiro, v. 7, n. 4, p. 100-110, 2008. Disponível em: https://bit.ly/3KTq9vi. Acesso
em: 16 nov. 2021.

ALVES, C. Independência do Brasil. Disponível em: https://bit.ly/3646uu1. Acesso


em: 13 nov. 2021.

ARQUIVO NACIONAL. A corte no Brasil: Abertura dos Portos. 2018. Disponível em:
https://bit.ly/36cu5bR. Acesso em: 15 nov. 2021.

ARQUIVO NACIONAL. Diplomacia e Política Externa na América Joanina. 2018.


Disponível em: https://bit.ly/3ikvbVn. Acesso em: 15 nov. 2021.

BANCO MUNDIAL. Datos de libre acceso del Banco Mundial. 2021. Disponível em:
https://datos.bancomundial.org/. Acesso em: 29 nov. 2021.

BBC NEWS. Cuán rico realmente era Mr. Darcy: el galán de "Orgullo y Prejucio", la
novela más popular de Jane Austen. Disponível em: https://bbc.in/3qhJ7ni. Acesso em:
13 nov. 2021.

BORIS, F. História do Brasil. 12. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006.

BORIS, F. História do Brasil. São Paulo: Editora de Universidade de São Paulo, 2013.

CLACSO. A Abolição do Comércio Atlântico de Escravos e os Africanos Livres no


Brasil. 2008. Disponível em: https://bit.ly/3CVBQyD. Acesso em: 15 nov. 2021.

DORATIOTO, F. O Brasil no Rio da Prata (1822-1994). 2. ed. Brasília: FUNAG, 2014.

EL BLOG SALMÓN. Argentina, de la superpotencia a principios del siglo XX


a una economía estancada y con problemas crónicos. 2020. Disponível em:
https://bit.ly/3whqWlx. Acesso em: 27 nov. 2021.

EOCA. Bacia do Prata: Área, População e outros números. 2021. Disponível em:
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MENEZES, L. M. de. Relações Internacionais: Mudanças dos dois lados do Atlântico


(1801-1821). Rio de Janeiro: HGB, 2007.

75
MULTIRIO. A vinda da família real para o Brasil: o embarque e a viagem da corte.
Disponível em: https://bit.ly/3N0ig9c. Acesso em: 5 nov. 2021.

MULTIRIO. O Barão de Mauá: a década de 1850. Disponível em: https://bit.ly/3qlnP8B.


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MULTIRIO. O reconhecimento político da Independência do Brasil no exterior.


Disponível em: https://bit.ly/3u3S3ha. Acesso em: 11 nov. 2021.

REVISTA CELSA. O Processo de Construção da Guerra do Paraguai. 2006.


Disponível em: https://bit.ly/37D18Gh. Acesso em: 26 nov. 2021.

REVISTA JUS. Para lembrar uma grande vitória militar do Brasil. 2019. Disponível
em: https://bit.ly/3N6Hov6. Acesso em: 26 nov. 2021.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA (UFSC). Quando se iniciou uma política


externa brasileira? 2016. Disponível em: https://bit.ly/36z5deh. Acesso em: 4 nov. 2021.

76
UNIDADE 2 —

A POLÍTICA EXTERNA DA
PRIMEIRA REPÚBLICA
(1889-1930)
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• identificar a grande mudança do Brasil Imperial para o Brasil Republicano.

• entender a relevância do Barão do Rio Branco como Ministro de Relações Exteriores


e sua transcendência na Política Externa Brasileira.

• identificar as grandes mudanças que vieram acontecer na geopolítica europeia após


a Primeira Guerra Mundial e sua relevância na Política Externa do Brasil.

• compreender as importâncias do Brasil na Liga das Nações e como isso influenciou


nas relações internacionais do Brasil, especialmente nas Américas.

• discernir a dinâmica das relações do Brasil com os países das Américas, especialmente com
os EUA e América do Sul, desde a década de 1930 até após da Segunda Guerra Mundial.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – A POLÍTICA EXTERNA DO BARÃO DO RIO BRANCO


TÓPICO 2 – PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA NA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL (1914-1918) E
NA LIGA DAS NAÇÕES
TÓPICO 3 – AS RELAÇÕES COM OS EUA E A AMÉRICA DO SUL

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

77
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 2!

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78
UNIDADE 2 TÓPICO 1 —
A POLÍTICA EXTERNA DO BARÃO
DO RIO BRANCO

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, nos Tópicos desta segunda Unidade, abordaremos a Política
Externa do Brasil a partir da Primeira República, o período entre 1889 até 1830. Ou
seja, a partir da queda monarquia até a Revolução de 1930, ano que por questões da
própria dinâmica histórica faz coincidência com o começo da Grande Depressão, que
começou nos Estados Unidos, a raiz da quebra da Bolsa de Valores de Nova York e
logo se espalhou pelo mundo inteiro. O período da Primeira República é relevante para
a consolidação da República Brasileira e para o rumo que iria tomar a Política Externa
do país até os dias atuais. Na foto de abaixo se mostra a Família Real um pouco antes
de eles irem embora para o exilio, imagem representativa do fim do Brasil Imperial e do
começo da República Brasileira.

IMAGEM 1 – O ÚLTIMO RETRATO DA FAMÍLIA IMPERIAL EM PETRÓPOLIS ÀS VÉSPERAS DO EXÍLIO

FONTE: <https://atlas.fgv.br/>. Acesso em: 7 dez. 2021.

No Subtópico 1, iremos estudar sobre a Consolidação Republicana e seu impacto


na Política Externa a partir de 1889, depois de um longo período do Brasil Imperial que durou
praticamente desde começos do século XIX. No segundo subtópico iremos abordar sobre
a reorientação da Política Externa sob a liderança do Barão do Rio Branco quem assumiu

79
o Ministério de Relações Exteriores (conhecido como Itamaraty) desde 1902 até 1912. A
Política Externa liderada pelo Barão de Rio Branco vem sendo peça-chave para a dinâmica
das relações internacionais do Brasil, conforme vamos ver ao longo da Unidade 2 e 3.

Antes de começar nosso estudo sobre a Consolidação da República, e sua


relevância nas relações externas do país, devermos analisar a conjuntura econômica
e política dos últimos anos do Brasil Imperial e quais foram os motivos da queda da
Monarquia. Desde a década de 1850 o Brasil passou por uma fase de consolidação
das oligarquias que baseavam seu poder principalmente no crescimento constante
na produção e exportação do café na região de São Paulo, desenvolvendo, entre
outras coisas, uma expressiva burguesia paulistana que girava em torno produção,
comercialização e exportação do café.

Esse poder econômico dos cafeicultores foi aos poucos se expandido ao entorno
da política brasileira. Desse modo, para finais da década de 1880 a dinâmica política estava
marcada também pelo peso do poder da oligarquia paulistana. Essa consolidação da
oligarquia paulistana foi-se manifestando de maneira mais expressiva a partir de 1870 em
detrimento da queda dos centros de poder político e econômico do Nordeste que, aliás,
eram uma das bases de apoio à gestão do Brasil Imperial, segundo Boris (2006, p. 238):

Por volta de 1870, consolidou-se a tendência de desenvolvimento


econômico do Centro-Sul e de declínio do Nordeste. Isso, em grande
medida, resultou de estímulos diversos provenientes do exterior para
a produção agrícola. Nos países consumidores do café, o número de
habitantes e sua renda aumentou enormemente entre 1850 e 1900
e o hábito de tomar café se ampliou. Esse fato, ao lado de outras
circunstâncias, permitiu aos produtores absorver as flutuações de
preço, ou seja, dada a expansão da demanda, foi possível enfrentar
eventuais perdas, nos períodos em que o preço do café caía no
mercado internacional.

Destas informações expostas pelo historiador Boris, podemos refletir que


boa parte do que possa vir acontecer em um país depende muitas vezes do comércio
internacional de suas exportações e da competitividade relativa destas, neste caso,
o café. Nesse caso, o aumento constante da demanda internacional de café durante
as últimas décadas do século XIX ajudou às exportações do café produzido na região
de São Paulo, colaborando assim para seu desenvolvimento econômico. Devermos
observar que os solos dessa região eram aptos para o plantio de café, os quais com
ajuda de capital produtivo, financiado nessas últimas décadas do século XIX, fizeram
desses solos entre os de maior competitividade relativa do mundo, resultado?

A partir do 1850, o Brasil se converteu no maior produtor e exportador de


café, trazendo desenvolvimento socioeconômico para São Paulo e o Brasil, permitiu
o crescimento da mão de obra livre, apoiado pelo fim de tráfico de escravos a partir de
1850 e pelas ondas imigratórias, conforme estudamos na Unidade 1. Isso permitiu os
fundamentos do desenvolvimento industrial e comercial da cidade de São Paulo.

80
ATENÇÃO
Qual a importância da competitividade relativa para o desenvolvimento socioeconômico de
uma região ou país? O mais claro exemplo disso é o que aconteceu com a região de São
Paulo e sua alta competitividade na produção, comercialização e exportação de café. Hoje, a
cidade de São Paulo é coração econômico do Brasil e uma das metrópoles mais importantes
do Mundo. Mas vejamos umas das definições de competitividade relativa para entender
melhor esse conceito a sua importância para o desenvolvimento de um país, conforme o
Fórum da FGV (2012):

Sob a perspectiva da eficiência operacional, a competitividade


global é definida por Harrison (1995) como produto da
tecnologia e da produção em escala: um país é competitivo
se possui um nível médio de produtividade maior ou igual
ao de seus concorrentes, ou, ainda, se tem um nível médio
de custo unitário menor ou igual ao de seus concorrentes. A
eficiência operacional, além de aumentar a competitividade,
pode aumentar os resultados internos, e, sob esse aspecto, a
OECD (1996) define competitividade como o grau com que um
país, sob as condições do mercado, produz bens e serviços
para um mercado internacional e simultaneamente mantém e
aumenta as receitas do seu povo.

Voltando para questão da queda da monarquia, além dessa concentração de


poder, tanto econômico como político, da oligarquia dos cafeicultores também houve
a ascensão dos militares na gravitação da nova política que se estava formando nas
últimas décadas do Brasil Imperial. Essa consolidação dos militares aconteceu, entre
outros acontecimentos, graças ao sucesso da longa da Guerra do Paraguai que afirmou
a imagem dos militares em detrimento da imagem do imperador e do alto custo do
endividamento dessa Guerra sob a gestão a sua gestão. Assim, essas duas forças – a
concentração de poder da oligarquia de São Paulo e a consolidação da imagem dos
militares – deram as bases para que o almejo de uma nação republicana, conforme
(BORIS, 2006, p. 235):

Duas forças, de características muito diversas, devem ser ressaltadas


em primeiro lugar: o Exército e um setor expressivo da burguesia cafeeira
de São Paulo, organizado politicamente no PRP. O episódio de 15 de
novembro resultou da iniciativa quase exclusiva do Exército, que deu um
pequeno, mas decisivo empurrão para a apressar a queda da Monarquia.
Por outro lado, a burguesia cafeeira permitiria à República contar com
uma base social estável, que nem o Exército, nem a população urbana
do Rio de Janeiro podiam, por si mesmos, proporcionar.

Conforme expressa o historiador Boris, no dia 15 de novembro de 1889 os


militares com o apoio da burguesia cafeeira conduziram a Proclamação da República.
Esses grupos foram liderados pelo marechal Deodoro da Fonseca, quem foi o primeiro

81
Presidente da República no período de transição, começando assim a era Republicana
no Brasil. E no contexto da Política Externa? O período da Primeira República pode ser
agrupado em dois grandes momentos:

• O primeiro momento, a Consolidação (1889 – 1902), no qual foi consolidada a


estrutura política e econômica da República, enquanto aconteciam uma série de
crises políticas.

• O segundo, a Reorientação da Política Externa até finais da Primeira República,


no ano de 1930. A Reorientação da Política Externa pode ser dividida em duas
fases. A de apogeu, liderada pelo Barão do Rio Branco que em seus 10 anos como
Ministro de Relações Exteriores (1902-1912), deu as bases para a gestão da Política
Externa até os dias atuais, conforme veremos mais adiante. E a segunda fase é
considerada a de isolamento, conhecida como a pós a liderança do Barão do Rio
Branco, desde 1912 até 1930.

ATENÇÃO
A importância do PRP na queda da Monarquia a na política da Primeira República,
conforme expressa o Centro de Pesquisa CPDOC FGV (2021):

O Partido Republicano Paulista (PRP) foi fundado com o


propósito de refletir os objetivos de uma sociedade em
ascendência econômica e percebeu, portanto, que, para
consolidar o seu domínio, era indispensável substituir um
sistema em estado de irremediável desmoronamento.

2 A CONSOLIDAÇÃO REPUBLICANA

Os primeiros anos da Primeira República foram caraterizados por serem de incerteza


e transição, época da história conhecida como a “República da Espada”. É reconhecida assim
em função do alto nível de confrontos entre grupos de poderes políticos, em função desse
motivo, a conjuntura política demandou de um governo de transição que possa conter
esses confrontos. Desse modo, esse foi um dos motivos para que seja um período que teve
dois governos de transição com presidentes de formação militar.

O primeiro presidente do Brasil republicano foi o Marechal Deodoro da Fonseca e


o segundo o Marechal Floriano Peixoto, após eles vieram presidentes fora da área militar.
Durante os governos destes dois presidentes militares, as disputas desse momento
de transição crítica foram entre os principais grupos de poder político e econômico,
entre eles a oligarquia do café e os militares. Suas diferenças que se concentravam,
principalmente, sobre o como se deveria estruturar a República, e grande parte dessas
diferenças estavam influenciadas pelo jogo de interesses regionais.

82
Os vários grupos de poder tinham interesses diversos e divergiam em
suas concepções de como organizar a República. Os representantes
políticos da classe dominante das principais províncias – São Paulo,
Minas Gerais e Rio Grande do Sul – defendiam a ideia da República
federativa, que asseguraria um grau considerável de autonomia às
unidades regionais (BORIS, 2006, p. 247).

Nesse contexto de incerteza, o governo de transição sob a liderança dos militares


teve como efeito que os dois primeiros Presidentes de República fossem militares, mas
com forte participação de republicanos no governo. Assim, o governo de transição foi de
cunho semi-militar e temporal que tinha o objetivo re-estabelecer a ordem e a consolidação
nacional sob um regime republicano. O tempo de governo de transição durou somente 5
anos, desde 1899 até 1894, tempo no qual foi feita a primeira constituição republicana.
“Como dizia Rui Borbosa – ministro de Fazenda do governo provisório –, era necessário
dar uma forma constitucional ao país para garantir o reconhecimento da República e a
obtenção de créditos no exterior.” (BORIS, 2006, p. 249).

No contexto internacional, a formalização “constitucional" da Primeira


Constituição teve uma boa aceitação. Os países das Américas reciberam a mudança
de um Brasil Imperial para um Brasil Repúblicano de maneira muito amigável,
especialmente por parte dos Estados Unidos que se tornaria o principial aliado do
Brasil até 1950 em detrimento do Reino Unido que foi um aliado essencial do Brasil
Imperial durante o século XIX.

Enquanto ao momento mesmo da formalização da República do Brasil, é


interessante de observar que essa formalização aconteceu durante a Primeira Conferência
Internacional Americana na capital dos Estados Unidos, Washigton D.C., uma coincidencia
interessante da própria dinâmica da história, conforme Boris (2006, p. 248):

Recebida com restrições na Inglaterra, a proclamação da República


brasileira foi saudada com entusiasmo na Argentina e aproximou
o Brasil dos Estados Unidos. A mudança de regime se deu quando
estava em curso, em Washigton, a I Confêrencia Internacional
Americana, convocada por inicativa dos Estados Unidos. O
represnetante brasileiro à conferência foi substituido por Salvador de
Mendonça, republicano histórico, que se aproximou dos pontos de
vista norte-americanos.

Assim, bem mesmo desde os primeiros dias da Proclamação da República ficou


claro a mudança de rumo de quem seria um aliado importante do Brasil Republicano.
Isso Implicou de fato um deslocamento de foco diplomático de Londres para a nova
nação Norte-Americana que, aliás, estava se tornando em uma nação poderosa com
forte peso nas questões da geopolítica internacional, os Estados Unidos.

No contexto das Américas, um ponto importante que devermos analisar é que


com a mudança do regime do Brasil, praticamente todo o continente americano ficou
sob regimes republicanos, salvo algumas exceções. O caso mais relevante é do Canadá,

83
que, aliás, ainda hoje é uma monarquia cujo chefe de Estado é a mesma Monarquia
Britânica. No entanto, é uma nação independente, pois quem governa o Canada é o
primeiro-ministro desse país e não o primeiro-ministro do Reino Unido que seria a nação
principal da Monarquia Britânica. Ou seja, os chefes de Estado tanto do Reino Unido
como do Canadá é a Monarquia Britânica – que hoje está sob a chefia da Rainha Isabel
II –, mas ambas as nações estão sob a gestão governamental de primeiros-ministros
totalmente independentes.

NOTA
Você sabia que hoje 53 países têm suas origens no Império Britânico? Eles fazem parte do
“Commonwealth” e 15 desses países ainda mantem como chefe de Estado à Monarquia
Britânica, entre eles a Austrália, o Canadá e a Nova Zelândia. Um
desses países acabou de declarar a sua independência da Monarquia
Britânica, Barbados. Se desejar saber mais acesse ao artigo “Fim da
monarquia em Barbados: os lugares do mundo que ainda têm
Elizabeth 2ª como chefe de Estado”, da BBC Brasil.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-59483451

Outro fato que fez o Brasil se aproximar mais dos Estados Unidos, é própria
condição geográfica de tamanho continental das duas nações. Em termos de política
externa, os Estados Unidos colocaram o olho no Brasil como um potencial país que
poderia liderar a geopolítica da América Latina. Inclusive no contexto da estrutura
federal, o Brasil Republicano dado sua circunstância de ter um vasto território com
diversos interesses regionais se inspirou na estrutura Federativa dos Estados Unidos,
conforme Boris (2006, p. 249):

A primeira Constituição da República inspirou-se no modelo norte


americano, consagrando a República federativa liberal. A chave da
autonomia dos Estados – designação dada às antigas províncias –
estava no artigo 65, 2º da Constituição. Aí se dizia caber aos Estados
poderes e direitos que não fossem negados por dispositivos do texto
constitucional. Desse modo, os Estados ficaram implicitamente
autorizados a exercer atribuições diversas, como as de contrair
empréstimos no exterior e organizar forças militares próprias: as
forças públicas estaduais. Tais atribuições eram do interesse dos
grandes Estados e, sobretudo, de São Paulo.

No entanto, no contexto brasileiro o poder federativo não ficou com uma


delegação de poderes tão expressiva para os estados como foi no caso dos Estados
Unidos. “A União ficou com os impostos de importação, com os direitos de criar bancos
emissores de moeda, de organizar as forças armadas nacionais etc.” (BORIS, 2006, p.
250) Enfim, o Brasil Republicano abandonou a estrutura territorial dividida em províncias

84
para ser constituída sob uma estrutura territorial federativa, sob o comando dos três
poderes, característicos, de uma nação republicana, isto é, o Poder Executivo, o Poder
Legislativo, e o Poder Judiciário.

No contexto externo, como já vimos anteriormente assim que foi feita a


Proclamação da República, o Brasil se aproximou dos Estados Unidos e demais nações
das Américas. Aproximação que foi um reflexo do rejeito que tinham os republicanos
brasileiros sobre a política externa do regime imperial, colocando, assim, na gaveta
praticamente todas as estratégias de uma política externa prudente e ponderada
que foi característico do Regime Imperial, conforme os autores Lessa e Altemani
(2014, p. 62):

Em 1889, ao chegar ao poder, os republicanos tornaram-se


prisioneiros do discurso de que tudo que vinha do Brasil Império era
negativo e que a República significava o surgimento de um novo país;
fazia-se tábula rasa do passado, como se o presente nada devesse
ao regime e às gerações anteriores. A arrogância dessa postura levou
o governo Deodoro da Fonseca a desconsiderar as diretrizes de
política externa imperial, embora os republicanos não tivessem um
pensamento sistematizado sobre o tema, exceto o de um ingênuo
idealismo americanista, que foi aplicado na definição da soberania
sobre o território litigioso de Palmas e era na postura brasileira na
Conferência Pan-Americana.

Conforme o dito pelos autores esse idealismo americanista fez desse período
da consolidação Republicana (1889 – 1902) como a época da Política Externa do
“Americanismo Ingênuo”, ou seja, uma ilusão “temporária” que a vizinhança e os
Estados Unidos atuariam pelo americanismo sem considerar os interesses próprios de
suas nações. Aliás, esse “Americanismo Ingênuo” por pouco levou ao Brasil perder parte
do território do oeste do Estado de Santa Catarina (até a cidade de Chapecó no oeste
catarinense), parte do sudoeste do Estado do Paraná e parte noroeste do Estado de Rio
Grande do Sul. Conforme aos autores Lessa e Altemani (2014, p. 63):

O Governo Provisório aceitou a proposta da Argentina de dividir


o território litigioso de Palmas, conforme tratado assinado em
Montevidéu, em 25 de janeiro de 1890, por Quintino Bocaiúva e
pelo chanceler argentino Estanislao Zeballos, mas como esse
acordo causou descontentamento à população, aos políticos e aos
intelectuais brasileiros, ele acabou sendo rejeitado pela Câmara dos
Deputados brasileira, em 10 agosto de 1891.

Ou seja, o Governo Provisório do Presidente Marechal Deodoro da Fonseca teria


aceitado dividir o território que estava em litígio, porém, a Câmara dos Deputados do
Brasil acabou rejeitando-o. Conforme podermos observar nos mapas abaixo fica claro o
território que a Argentina queria adicionar à sua província das Missões.

85
IMAGEM 2 – MAPAS DA PROVÍNCIA DE “MISIONES” DA ARGENTINA

Mapa da Provincia das “Misiones” considerando o


Mapa da Provincia das “Misiones” de hoje
litigio das Palmas

FONTE: <https://bit.ly/3N23FtP>. Acesso em: 9 dez. 2021. FONTE: <https://bit.ly/3u9Y786>. Acesso em: 9 dez. 2021.

Com a rejeição da Câmara de Deputados do Brasil, ambas as nações tiveram que


retomar as negociações para definir o litígio que ficou sob o arbítrio do Presidente dos
Estados Unidos. A delegação do Brasil estava sob a chefia do Barão Aguiar de Andrada, mas
que veio a falecer logo de ter iniciado as negociações na cidade de Washigton. Diante disso
o Governo do Brasil, sob o comando do Presidente Floriano Peixoto (1891–1894), teve que
designar um novo chefe da delegação, chefia que caiu nas mãos do Barão de Rio Branco.

Embora ele não tivesse experiencia em negociações diplomáticas, era um


grande conhecedor da Gestão Pública, História do Brasil e dinâmica da Geopolítica
Regional e Mundial. Seu pai foi o visconde do Rio Branco quem desempenhou o cargo
de Presidente do Conselho de Ministros durante o Regime Imperial, ou seja, o cargo de
primeiro-ministro sob os termos atuais dos países que tem primeiro ministro, talo como
o Reino Unido. O Barão de Rio Branco, cujo nome era José Maria Paranhos Júnior foi:

[...] conhecido principalmente por ser filho do visconde do Rio


Branco, um expoente do Partido Conservador que chefiara
diferentes ministérios, fora presidente do Conselho de Ministros e
desempenhara importantes missões diplomáticas no Rio da Prata.
Tendo crescido nesse ambiente, Paranhos Júnior era familiarizado
com negócios internos e externos da administração pública, e isso,
juntamente com sua condição de estudioso da História do Brasil, o
credenciavam para assumir a nova função em Washington (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 63).

Paradoxalmente, o Governo de Transição da nova República Federativa do Brasil


- que rejeitava todo o conhecimento e experiência dos funcionários que fizeram parte do
Regime Imperial - teve que procurar apoio dos conhecimentos e estratégias ponderadas

86
de pessoas que tiveram vivência com o Regime Imperial. Um desses funcionários foi o
Barão de Rio Branco, quem foi para Washigton, como chefe da delegação, onde montou
toda uma equipe de profissionais conhecedores do tema do litígio e do contexto histórico
que envolvia isso. Logo do processo de analisar e apresentar as argumentações tanto
da Argentina como do Brasil, em fevereiro de 1895 foi definido o laudo a favor do Brasil
por parte do Presidente Cleveland, conforme os autores Lessa e Altemani (2014, p. 63).

A Argentina reconheceu o laudo a favor do Brasil acabando definitivamente


o Litígio das Palmas. O grande sucesso das negociações deu muito prestígio para
Barão de Rio Branco, quem mostrou conhecimento, capacidade de gestão política e
capacidade para liderar negociações complexas, competências que logo de alguns
anos o levaram a comandar o Ministério de Relações Exteriores (MRE) por praticamente
uma década, 1902 até 1912. Sua gestão como ministro de MRE transformou a dinâmica
da gestão da Política Externa Brasileira até os dias de hoje, conforme iremos estudar
no seguinte subtópico.

ATENÇÃO
Quem era Barão do Rio Branco? Se deseja saber mais sobre um dos
personagens mais importantes da Política Externa e do Brasil, acesse ao
Atlas Histórico da FGV, Barão do Rio Branco.

Fonte: https://atlas.fgv.br/verbetes/barao-do-rio-branco

3 A REORIENTAÇÃO DA POLÍTICA EXTERNA

Foi a partir do Governo de Presidente Francisco de Paula Rodrigues Alves


(1902-1906) que houve uma reorientação da Política Externa da Primeira República. O
presidente Francisco R. Alves perante as necessidades urgentes de conflitos e interesses
internacionais precisava da experiência e competências de um conhecedor pragmático
sobre a gestão da Política Externa. Assim, o Barão de Rio Branco foi convidado pelo
Presidente Francisco R. Alves para comandar a gestão das relações internacionais do
Brasil, nomeando-o como Ministro de Relações Exteriores. Seu comando de Itamaraty
(1902-1912) teve a confiança de quatro Presidentes – Francisco R. Alves (1902-1906),
Alonso M. Pena (1906-1909), Nilo Peçanha (1909-1910) e Hermes da Fonseca (1910-1914)
e sua gestão da Política Externa transcendeu a sua época.

Mas prévio a nossos estudos sobre a sua gestão, vamos ver três grandes
litígios internacionais onde a gestão do Barão do Rio Branco foi fundamental antes
mesmo de ele comandar o Palácio de Itamaraty (Ministério de Relações Exteriores). O

87
primeiro sucesso do Barão do Rio Branco de grande relevância, conforme estudamos
nas páginas anteriores, foi definir a favor do Brasil o Litígio do território das Palmas
entre a Argentina e o Brasil.

Logo desse Litígio houve dois grandes conflitos, onde a intervenção do Barão
do Rio Branco foi necessária: a ameaça a região do norte da Amazônia por parte da
França por meio de seu território na América do Sul, a Guiana Francesa (1894-1900); e o
conflito entre o Brasil e a Bolívia no estado do Acre, região onde existiam interesses de
empresários Norte-Americanos e Britânicos (1898-1903). Ambos os conflitos estavam
vinculados aos interesses econômicos das grandes potências econômicas da época.

3.1 O LITÍGIO ENTRE O BRASIL E A GUIANA FRANCESA E DO


ACRE COM A BOLÍVIA

A ameaça por parte da França na região norte da Amazônia estava ligada ao


descobrimento de ouro no rio Calçoene no ano de 1894, próximo da fronteira com a
Guiana Francesa. Assim, a França queria estender o seu território até às margens desse
rio, “a descoberta de ouro no rio Calçoene atraiu aventureiros e causou conflito entre
brasileiros e militares franceses vindos da Guiana.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 67). O
conflito levou no ano de 1896 aos governos do Brasil e da França à mesa de negociações
por meio da arbitragem internacional da Suíça, e uma vez mais o governo republicano
do Brasil convidou a Barão do Rio Branco para comandar as negociações na Suíça.

O Barão do Rio Branco estabeleceu a mesma dinâmica de trabalho que fez


durante o Litígio do Território das Palmas, formou uma equipe de profissionais para
montar um argumento convincente com suficiente baseamento histórico. Finalmente
no ano de 1899 os representantes de ambas as nações apresentaram suas posições
ao Presidente da Suíça e no ano de 1900 a arbitragem foi favorável ao Brasil, conforme
dados históricos de Lessa e Altemani (2014, p. 68):

A sentença arbitral, proferida em 1o de dezembro de 1900, foi


inteiramente favorável ao Brasil. O resultado foi divulgado já no
governo Campos Salles, e Rio Branco foi recompensado pelo governo
brasileiro com uma pensão anual vitalícia no valor de 24 contos de
réis, extensiva a filhos e filhas, e um prêmio de 300 contos de réis.

Geopoliticamente, o sucesso das negociações do Barão do Rio Branco foi


de grande significado, daí o porquê dessa generosa recompensação. Foi de grande
significado porque primeiramente apesar do peso enorme que tem uma nação como
a França o Brasil conseguiu uma sentença favorável. E o Brasil demonstrou, por meio
de uma gestão diplomática competente, que não iria se deixar intimidar por parte dos
interesses das grandes nações, as quais vinham observando o grande potencial de
recursos naturais que tinha o Brasil, e ainda tem.

88
3.1.1 O litígio do Acre com a Bolívia

O conflito do estado do Acre com a Bolívia também tinha vínculo com os


interesses de explotação de recursos naturais por parte de empresas das grandes
nações da época. Embora o conflito do Acre fosse especificamente entre duas nações
da América do Sul, a Bolívia e o Brasil, ele tinha por trás interesses de empresas norte-
americanas e britânicas que estavam de olho no lucrativo negócio do “látex” – borracha
natural que tinha uma altíssima demanda na Europa e Norte América nessa época.
Porém, historicamente, o conflito do Acre teve a sua origem 30 anos antes do conflito,
na Guerra do Paraguai. Devemos nos lembrar que essa Guerra (1864-1870) foi muito
longa e envolveu uma aliança inédita entre a Argentina, o Brasil e o Uruguai contra o
Paraguai, a conhecida “Tríplice Aliança”.

No segundo ano da Guerra do Paraguai, o Brasil já vendo que ela não iria ser “tão
breve assim” entrou em negociações com a Bolívia com objetivos tácticos de guerra,
os quais visavam neutralizar o fornecimento de armas, alimentos e demais recursos
indispensáveis para o Paraguai durante a Guerra. O Governo da Bolívia em troca da
suspensão do fornecimento de insumos ao Paraguai demandou ao Brasil que lhe
entregasse os territórios do Acre, fechando assim o tratado de Limites de 1867 entre
esse país e o Brasil. Assim, na teoria o Acre deveria ter sido da Bolívia.

Porém, conforme Lessa e Altemani (2014, p. 69), o tratado nunca foi efetivado
em função da divergência de onde era a nascente do rio Javari, no que hoje é a divisa
entre o estado do Acre e Amazonas. Assim, em função disso nunca houve presença
boliviana no Acre, nem econômica nem de assentamentos. Porém, por parte do Brasil
houve assentamentos e atividade econômica de milhares de brasileiros que vinham
fazendo dessa região seus lares. A atividade econômica desses brasileiros girava em
torno da exploração e comercialização do látex, que foi o interesse de fundo por parte
da Bolívia para reclamar os territórios do Acre.

Conforme ia se consolidando o mercado internacional do látex, também se ia de


desenvolvendo os interesses de empresários locais, europeus e norte-americanos no
lucrativo negócio de extração dessa matéria prima na região amazónica, especificamente
no Acre. Nesse sentido, a Bolívia viu a oportunidade de reivindicar os direitos de reclamar
as terras do Acre. Para finais do século XIX a Bolívia reclamou os direitos assinados com
o Brasil no tratado de 1867, reivindicação que o Brasil aceitou. Entretanto, milhares de
brasileiros que aí moravam e dependiam do látex não queriam aceitar ser parte da Bolívia.

Em 1899, Luiz Gálvez Rodrigues de Arias declarou a independência


do Acre, no que contou com o apoio do governador do Amazonas, e
solicitou a incorporação desse território ao Brasil, a qual foi recusada.
O ministro das Relações Exteriores, Olinto de Magalhães, enviou
telegrama ao governador amazonense afirmando que a Bolívia
ocupava “o que lhe pertence” e que esses brasileiros se subordinavam
às leis bolivianas (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 70).

89
Nesse sentido, apesar de os brasileiros que moravam no Acre não aceitassem
ser parte da Bolívia, o Brasil estava disposto em ceder esse território para a Bolívia
conforme ao tratado assinado em 1867. Contudo, a Bolívia não tinha os recursos
suficientes para fazer valer sua soberania, ainda assim, o país vizinho queria executar
seu direito de reclamar o Acre em função dos interesses econômicos que giravam em
torno do lucrativo negócio da exportação do látex.

Diante disso a Bolívia enxergou a oportunidade de negociar esses territórios com


os empresários norte-americanos e britânicos envolvidos no negócio de explotação e
comercialização do látex. O acordo foi que a Bolívia entregaria em aluguel o território do
Acre, fazendo um contrato de arrendamento por trinta anos com a Bolivian Syndicate
que pertencia a norte-americanos e britânicos interessados no látex. Conforme os
autores Lessa e Altemani (2014, p. 70), “O Syndicate pagaria à Bolívia 40% dos lucros
que viesse a ter e, em contrapartida, receberia da Bolívia o poder de polícia e o direito de
arrecadar impostos e de manter tropas e barcos de guerra no Acre.”

Assim, conforme ao acordado, o Governo da Bolívia tentou começar em cobrar


impostos aos brasileiros aí morando, mas houve rejeição absoluta. Esses brasileiros
“liderados por Plácido de Castro, rebelaram-se, e, em janeiro de 1903, tomaram Puerto
Alonso, cidade fundada pelo governo boliviano, em 1899, na então fronteira com o Brasil.”
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 70). Ou seja, os brasileiros tomaram posse de uma região
da fronteira que estava do lado do território boliviano. Diante disso, o Governo da Bolívia
mandou tropas que nem conseguiram chegar para “Puerto Alonso”. Ou seja, a Bolívia
não tinha as condições de logística militar, nem presença mesmo de seu governo, para
proteger seu território próximo da fronteira, pior ainda administrar as terras do Acre.
Diante desse cenário o Barão do Rio Branco, já ao comando de Itamaraty, fez uma
estratégia para solucionar o conflito do Acre, a qual iria ser vantajosa tanto para a Bolívia
como para o Brasil, conforme vamos ver mais adiante.

No contexto geopolítico, a questão do Acre ia além do litígio entre duas nações


vizinhas em si. O problema de fundo nesse conflito era o envolvimento de empresários
norte-americanos e britânicos em assuntos de Estado entre nações da América
do Sul. Empresários que em função de seus interesses iam mostrando capacidade
de penetração no assuntos de Estado dos países da América Latina, interesses que
visavam explorar os vastos recursos disponíveis na América do Sul. No caso do Acre os
quase “supostamente” inesgotáveis recursos da região amazónica tanto do Brasil como
dos demais países que fazem parte da Bacia do Amazonas, aliás, a maior do mundo.

90
NOTA
Sabia que a Bacia do Amazonas é maior do Mundo? Ela nasce nos Andes
cobrindo uma vasta região de mais de 7 milhões de km2, dessa bacia
fazem parte a Colômbia, a Bolívia, o Brasil, o Equador, as Guianas, o Peru
e a Venezuela. Sendo que 70% desta bacia está no território brasileiro.

IMAGEM 3 – A BACIA DA AMAZONAS

FONTE: <https://bit.ly/3JvRdAr>. Acesso em: 20 dez. 2021.

A liderança do Barão do Rio Branco, no conflito do Acre, aconteceu no começo


de um novo período presidencial aqui no Brasil, do Presidente Francisco de Paula
Rodriguez Alves (1902-1906). Quem convidou ao Barão de Rio Branco para comandar
o Palacio de Itamaraty. Assim foi que começou a época da liderança ativa do Barão do
Rio Branco nas questões de Política Externa do Brasil, quem perante a sua trajetória,
sagacidade política e experiência de lidar com conflitos internacionais entre nações
vizinhas e potências econômicas mundiais tomou posse do Ministério de Relações
Exteriores (MRE) por mais de uma década desde 1902 até seu falecimento 1912. Sua
gestão como ministro de MRE transcendeu sua época, inclusive até os dias atuais.

91
3.2 O BARÃO DO RIO BRANCO AO COMANDO DO PALACIO DE
ITAMARATY

O Barão do Rio Branco quando tomou posse do Palácio de Itamaraty já tinha


uma vasta experiência em assuntos internacionais e vivência de mais de trinta anos de
ter morado nas principais cidades da Europa, e dois anos de ter morado em Washigton
(comandando a delegação brasileira no Litígio das Palmas). Ele era conhecido por ser
defensor do uso da diplomacia para mitigar e solucionar conflitos internacionais. E como
sabedor das relações internacionais foi conhecido pela sua estratégia de ponderar o
jogo geopolítico entre nações, visando colocar ao Brasil na melhor posição possível
dentro do cenário internacional da época.

O início de sua gestão foi caraterizado pelo conflito do Acre que ainda estava
por ser solucionado. Conforme foi exposto anteriormente, o conflito tinhas as seguintes
caraterísticas:

• A Bolívia reclamou seu direito de tomar posse do território do Acre, se baseando no


tratado de 1867 assinado pela Bolívia e pelo Brasil. Reclamo que o Brasil aceitou.
• O interesse da Bolívia nessas terras além de reclamar seu direito era econômico. Pois
nessas terras existia o auge da exploração e exportação do látex, atividade econômica
que os brasileiros vinham aí realizando.
• A Bolívia não tinha condições nem recursos suficientes para fazer valer sua soberania
na região do Acre. Mas tinha o interesse de aproveitar a atividade econômica dessa
região, assim, sem condições para administrar essas terras a Bolívia fez um acordo
de arrendamento com a “Bolivian Syndicate”, empresa que tinha por trás empresários
norte-americanos e britânicos.
• Os brasileiros que habitavam o Acre estavam apreensivos diante do fato de ter que
pertencer a Bolívia, logo, eles se rebelaram. A rebelião acabou invadindo o “Puerto
Alonso” do lado boliviano da fronteira. Diante disso tropas bolivianas foram enviadas
para “Puerto Alonso”, mas nem conseguiram chegar.

Diante dos acontecimentos, o que fez o chanceler Barão do Rio Branco? Ele
queria solucionar a situação dos brasileiros que moravam no Acre, e dar exemplo aos
empresários e especuladores de nações desenvolvidas no sentido que não podem se
envolver em questões de interesse nacional entre países dentro da América do Sul,
principalmente se isso tem impacto nos interesses do Brasil. Uma vez que analisou o
assunto, ele entrou em negociações diplomáticas diretas com o Governo da Bolívia,
procurando uma solução que possa ser vantajosa para as duas nações e assim neutralizar
o envolvimento de empresas e especuladores das grandes potências da época.

Procurando defender os interesses dos brasileiros do Acre e recuperar esse


território para o Brasil ele aplicou o princípio “uti possidetis” – posse de acordo aos fatos
– princípio que define que o território é de quem o ocupa, no caso do Acre a favor do

92
Brasil. Para impor esse princípio o Governo brasileiro mandou tropas para a região do
Acre com o pretexto de defender aos brasileiros que aí habitavam. Além disso, para
neutralizar as atividades econômicas da Bolivian Syndicate o Brasil proibiu a navegação
dos rios amazónicos para embarcações estrangeiras, assim, essa empresa não poderia
escoar o látex pelos rios que convergem no rio Amazonas para logo exportá-lo pelo
Oceano Atlântico para os mercados de Europa e Norte-América. Ou seja, a Bolivian
Syndicate ficou sem capacidade de continuar operando seu projeto empresarial.

Com o jogo táctico de impor a presença das tropas brasileiras no Acre e proibir
a navegação pelos rios do Amazonas para embarcações estrangerias o Brasil mostrou
sua capacidade de fazer valer seus interesses. Contudo, depois de fazer isso, o Governo
Brasileiro propôs para os empresários da Bolivian Syndicate uma compensação financeira
de 100 mil libras esterlinas, assim eles “[...] aceitaram as 100 mil libras oferecidas pelo
governo brasileiro, como compensação para cancelar suas pretensões, e foi afastado o
risco de intervenção de seus países na questão.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 70).

E ao Governo Boliviano, o Brasil propôs uma compensação financeira generosa


para essa época, e extensões de terras específicas que visem a logística para que as
exportações bolivianas possam ser transportadas pelos rios da vasta região das terras
do Brasil. Rios tanto da Bacia do Amazonas como da Bacia da Prata e assim a Bolívia
conseguir chegar até o Oceano Atlântico por meio das duas vastas bacias, tanto da
Prata como do Amazonas, conforme Lessa e Altemani (2014, p. 71):

Para se chegar a um acordo, o Brasil pagou à Bolívia 2 milhões


de libras esterlinas e cedeu lhe pouco mais de 2 mil quilômetros
quadrados, entre os rios Abunã e Madeira, o que permitiria aos
bolivianos acessar o rio Amazonas e, assim, alcançar o Atlântico, e,
para viabilizar esse acesso, o governo brasileiro comprometeu-se a
construir uma ferrovia entre os rios Madeira e Mamoré. Outra pequena
concessão territorial brasileira à altura da Bahia Negra permitiria o
acesso boliviano ao Atlântico também pelo Rio da Prata, por meio da
navegação dos rios Paraguai e Paraná.

O acordado com a Bolívia foi confirmado pelo Tratado de Petrópolis de 1903,


nesse tratado a Bolívia reconheceu que a região do Acre seria de soberania do
Brasil. É interessante observar a estratégia de negociação imposta pelo Barão de
Rio Branco, no litígio do Acre ele utilizou a estratégia de impor a força para logo
negociar, com argumentos de cunho históricos e geopolíticos para assim convidar
à mesa de negociações, com ofertas que possam ser do interesse dos envolvidos.
Com a Bolívia se fechou definitivamente o litígio do Acre, com benefícios para ambas
as nações, e com a Bolivian Syndicate mandou uma clara mensagem para as nações
europeias e aos Estados Unidos de não intervenção em assuntos de Estado do Brasil
e de sua vizinhança.

93
ATENÇÃO
O tratado de Petrópolis de 1903 fechou o litígio do Acre, reconhecendo
a soberania brasileira sobre o território do que hoje é o Estado do Acre.
Para se aprofundar sobre os detalhes desse tratado acesse ao artigo: O
Tratado De Petrópolis De 17 De Novembro De 1903.

Fonte: https://bit.ly/3whZV1z

Foi com o sucesso de recuperar o estado do Acre que o Barão do Rio Branco
começou seu longo período ao comando do MRE. Os exemplos dos litígios complexos
que temos visto aqui neste caderno de estudos demonstram a capacidade do Barão do
Rio Branco de fazer valer os interesses do Brasil por meio de ferramentas diplomáticas,
militares, políticas, técnicas e históricas, e que estejam sob os direitos internacionais das
nações. A demonstração de força só foi usada como maneira de mostrar a capacidade
de agir do Estado Brasileiro caso houver a necessidade. Essa maneira de executar
a Política Externa por parte do Barão do Rio Branco como ministro do MRE pode ser
resumida nos seguintes elementos de atuação.

• O BRASIL DEVERIA EVITAR SE ENVOLVER EM ASSUNTOS INTERNOS DOS


PAÍSES DA AMÉRICA LATINA

O Brasil não deveria se envolver em assuntos internos dos países da região,


neste caso de sua vizinhança mais próxima e demais países que fazem parte da América
Latina, porém, mantendo uma posição de liderança regional. Nesse sentido, durante o
comando do Barão do Rio Branco no MRE:

Passou a ser política do Itamaraty a não intervenção em assuntos


internos de outros países e o apoio aos governos sul-americanos
legalmente constituídos, no caso de tentativas de golpes de
Estado, evitando dar pretexto para intervenção extrarregional
− o princípio da não intervenção foi estabelecido em resposta a
instabilidades políticas no Uruguai (1903) e no Paraguai (1904)
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 73).

• O BRASIL DEVERIA APOIAR SEMPRE AO GOVERNO CONSTITUCIONAL DE


PAÍSES QUE ESTEJAM COM CONFLITOS INTERNOS

Nos casos que houver uma guerra civil ou conflitos internos, especialmente, em
um país da América Latina, o Brasil sempre deveria apoiar ao governo constitucional do
país em questão.

94
• O BRASIL DEVE SE FOCAR NO USO DA DIPLOMACIA E EVITAR A FORÇA

O foco do Brasil era de usar a diplomacia como ferramenta para os interesses do


Estado Brasileiro, porém, usar a força só como maneira de dissuasão em casos especiais.
A demonstração do poderio brasileiro tinha objetivos de dissuasão e defensivos, visando
assim ter uma melhor posição de negociação diplomática e já em casos mais severos
ter a capacidade de afastar qualquer possível ameaça externa. Isso ficou claro quando
em 1905 o Brasil repôs parte de sua frota naval que tinha ficado obsoleta para a época
que colocava em perigo os mais de 7.637 km de litoral. “O rearmamento naval do Brasil
não tinha intenção hostil em relação à Argentina, mas era o meio pelo qual se buscava
defender o longo litoral brasileiro, no qual se concentrava grande parte das maiores
cidades do país e cujos portos eram vitais para as atividades econômicas nacionais.”
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 75).

• O BRASIL DEVERIA MANTER ALIANÇAS COM NAÇÕES QUE CONSIGAM


CONTRAPOR NAÇÕES QUE PUDESSEM AMEAÇAR A SOBERANIA E
INTERESSES NACIONAIS

O Brasil deveria procurar manter alianças com nações que possam contrapor
o forte peso de nações que pudessem ameaçar os interesses e a soberania nacional.
Na época do Barão do Rio Branco esse balanço de poderes geopolíticos pode ser
exemplificado com a aliança tácita que existia com os Estados Unidos desde os começos
da Primeira República no ano de 1889, mas que ele fez dela mais prática e mais orientada
aos interesses do Brasil, e menos “ingênua” como aconteceu nos começos da República
na década de 1890, e que volveria acontecer na década de 1950, conforme veremos no
Tópico 3 desta unidade.

Rio Branco não inventou o movimento de aproximação entre o Brasil


e os Estados Unidos, mas reconheceu-o e aprofundou-o, valendo-se
dele na defesa dos interesses brasileiros, de modo a contrabalançar
o poderio político-militar europeu. Também seria um contraponto ao
robustecimento internacional da Argentina, que mantinha estreitos
laços político-econômicos com a Grã-Bretanha (LESSA; ALTEMANI,
2014, p. 73).

Conforme expressam os autores e levando em consideração que ambas


as nações eram, junto ao Canadá, as maiores das Américas essa aliança de países
republicanos de proporções continentais ajudou em contrabalançar o força política-
militar das nações mais poderosas da Europa na região da América Latina. Já no contexto
da América do Sul ajudou ao Brasil para se posicionar de maneira firme, contrapondo a
crescente influência da Argentina na região.

Além da aliança com os Estados Unidos no que tange a questões de geopolítica


também houve uma sinergia em questões comerciais, pois o mercado norte-americano
tinha se tornado no maior consumidor do café brasileiro já desde finais do século XIX,

95
conforme estudamos na Unidade 1. Nesse sentido, “à elite cafeeira paulista também
lhe convinha esse movimento, visto que os norte-americanos se tornaram o principal
mercado importador do produto brasileiro.” (UFRGS, 2016, p.11)

Os elementos de atuação do MRE expostos acima sob o comando do Barão do


Rio Branco foram as bases para uma Política Externa eficaz que vem caracterizando
aos diplomatas brasileiros desde essa época, assim, ele é considerado o “patrono da
diplomacia brasileira”. O legado do Barão do Rio Branco continua até os dias atuais,
inclusive a escola para seguir a carreira de diplomata leva o seu nome, o Instituto Rio
Branco, que foi criado no ano de 1945.

Mas será que logo de sua longa passagem pelo Palácio de Itamaraty a
Política Externa da Primeira República continuou igual? Houve algumas mudanças
significativas tanto no contexto nacional como no internacional que alteraram a
conjuntura do momento, no contexto internacional no ano de 1914 começou a
Primeira Guerra Mundial, assim como houve mudanças econômicas internacionais
drásticas que impactaram ao Brasil especialmente desde 1929 com a quebra da Bolsa
de Valores de Nova York que fez colapsar o preço do café nos mercados internacionais
e fechou as fontes de financiamento para a política de preços do café, entre algumas
das consequências disso.

ATENÇÃO
Quer saber mais sobre o Instituto Rio Branco? Além de formar ao corpo
diplomático do Brasil, hoje em dia é um Instituto contribui com estudos
de relações internacionais e é uma referência regional e internacional
em questões de academia diplomática. Acesse ao site do Instituto Rio
Branco: http://www.institutoriobranco.itamaraty.gov.br/.

Estamos chegando ao final de nossos estudos deste tópico, revise os temas


mais importantes com a ajuda do Resumo do Tópico 1. Depois disso, não deixe de realizar
as autoatividades! Vejo você no Tópico 2, até mais.

96
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Os motivos econômicos e políticos do fim do Brasil Imperial em 1889 e o porquê esses


motivos formaram parte das bases políticas para os começos do Brasil Republicano.

• Os primeiros presidentes da República Brasileira foram de formação militar, governos


de estrutura militar-civil necessários para uma fase de transição do Regime Imperial
para um Republicano.

• Os países das Américas vieram com bons olhos a formação da República do Brasil,
especialmente os EUA que se tornou o principal aliado do Brasil em detrimento da
Grã-Bretanha.

• Na Política Externa de começos da Primeira República houve um excesso de confiança


aos países das Américas, que foi conhecido como o “Americanismo Ingênuo”.

• O “Americanismo Ingênuo” quase levou ao Brasil perder o oeste do Estado de Santa


Catarina. Para resolver o litígio com a Argentina o Brasil designa ao Barão de Rio
Branco como chefe das negociações, resolvendo o litígio a favor do Brasil no ano de
1895.

• O Conhecimento das relações internacionais, sagacidade e capacidade de negociação


de litígios internacionais levaram ao Barão de Rio Branco comandar o RME. Entre os
litígios mais importantes que ele resolveu a favor do Brasil têm-se o Litígio da Palmas,
entre o Brasil e a Guiana Francesa e do Acre, litígios que envolveram interesses dos
países vizinhos e das grandes potências mundiais.

• A importância da Política Externa aplicada pelo Barão do Rio Branco, usada até hoje: 1)
O Brasil deveria evitar se envolver em assuntos internos dos países da américa latina;
2) O brasil deveria apoiar sempre ao governo constitucional de países que estejam
com conflitos internos; 3) O brasil deve se focar no uso da diplomacia e evitar a força;
4) O brasil deveria manter alianças com nações que consigam contrapor nações que
pudessem ameaçar a soberania e interesses nacionais.

97
AUTOATIVIDADE
1 Com a mudança do Regime Imperial para o Republicano houve uma série de alterações
nas relações internacionais do Brasil. Em relação às relações do Brasil com o resto
das Américas, é correto dizer que:

a) ( ) Os países da América Latina ficaram temerários ante um novo Brasil, o qual


sob uma visão republicana poderia iniciar uma Política Externa expansionista,
especialmente no que tange à Bacia da Prata.
b) ( ) Com um Brasil Republicano, os países das Américas ficaram menos apreensivos
e iniciaram aproximações de interesses comuns com o Brasil, exceto os EUA que
ainda pensavam que o Brasil iria manter sua aproximação com a Grã-Bretanha.
c) ( ) Com a mudança de Regime o Brasil Republicano começou uma aproximação
natural com o resto das Américas, que era maioritariamente republicana. Essa
aproximação causou um excesso de confiança por parte do Brasil ante os países
da América Latina e os EUA.
d) ( ) Os países das Américas ao conhecer da mudança de Regime do Brasil começaram
ter uma aproximação que causou excesso de confiança, especialmente a
Argentina que desejava ter a seu maior vizinho sob um regime republicano.

2 A partir da era do Barão do Rio Branco o Brasil passou adotar uma série de princípios
como parte de sua Política Externa. Dessa maneira houve princípios claros sob os
quais o país poderia manter diretrizes nas suas relações internacionais. Entre esses
princípios tem-se:

I- O brasil deveria evitar se envolver em assuntos fora de seus interesses como nação.
II- O Brasil deveria apoiar sempre ao governo constitucional de países que estejam
com conflitos internos.
III- O Brasil deve se focar no uso da diplomacia e evitar a força
IV- O Brasil não deveria manter alianças específicas com as nações, mas deveria
procurar interesses comuns do momento com países de seu interesse.

Destas sentenças determinar quais são verdadeiras:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença II está correta.

98
3 Durante a gestão do Barão do Rio Branco no comando de Itamaraty, o Brasil teve
alianças estratégicas importantes sob as quais se procurava interesses comuns que
possam servir para ambos os lados. Sobre isso é correto dizer que a Política de Rio
Branco foi de:

( ) manter alianças tanto com os EUA como com o Reino Unido. Assim, se procurava
estabelecer uma equidistância favorável para o Brasil.
( ) afiançar uma aliança estratégica com os EUA, mas de maneira mais pragmática,
aproximação natural que já vinha acontecendo desde os inícios da República.
( ) manter a aliança única com a Grã-Bretanha, dado o fato que ainda era a
superpotência do momento e ainda existia interesses comuns, principalmente o
Brasil precisava das fontes de financiamento que Londres poderia fornecer.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V - F - F.
b) ( ) V - V - F.
c) (   ) F - V - F.
d) (   ) F - V - V.

4 No ano de 1902, quando o Barão de Rio Branco tomou posse do MRE o Brasil estava
bem no meio do litígio do Acre, no qual existiam interesses tanto de Estado (do Brasil
e da Bolívia) como de empreendimentos de empresários das grandes potências do
mundo, neste caso dos EUA e do Reino Unido. O Brasil sob a liderança de Rio Branco
no Palácio de Itamaraty conseguiu finalizar esse litígio recuperando os territórios do
Acre para o Brasil. A seguir exponha e explique qual foi a estratégia de negociação do
Barão do Rio Branco.

5 Durante os primeiros anos da Primeira República e logo na gestão do Barão de Rio


Branco, o Brasil mudou sua aliança estratégica do Reino Unido do século XIX para
os EUA. Sobre a política do Barão de Rio Branco que orientava ao Brasil manter
alianças com nações que consigam contrapor nações que pudessem ameaçar a
soberania e interesses nacionais, faça uma relação dela com a mudança de aliança
a favor dos EUA.

99
100
UNIDADE 2 TÓPICO 2 -
PARTICIPAÇÃO BRASILEIRA NA
PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
(1914-1918) E NA LIGA

1 INTRODUÇÃO
Caro acadêmico, neste segundo tópico da Unidade 2, iremos abordar as
repercussões da Primeira Guerra Mundial na Política Externa do Brasil. A Primeira Guerra
Mundial pode ser visualizada com um conflito mundial que estabeleceu uma nova ordem
mundial perante as grandes mudanças geopolíticas, tecnológicas, socioeconômicas e
ideológicas que começaram a se manifestar desde finais do século XIX. Desde a ótica do
Brasil, todas essas grandes mudanças marcaram um novo rumo que o país iria iniciar a
partir daí. O Brasil ao igual que o resto das Américas tinha uma posição de neutralidade
perante o primeiro conflito mundial, mas um anto antes de finalizar a Guerra teve que
entrar na Guerra a favor dos aliados. Esse posicionamento a favor dos aliados deu ao
Brasil um assento privilegiado como membro da Liga das Nações, conforme iremos ver
mais adiante.

Essas grandes mudanças também trouxeram alterações econômicas tanto


nacionais como internacionais. Tanto o comércio exterior como as relações financeiras
do Brasil tiveram uma evidente alteração de eixo logo da Primeira Guerra Mundial,
onde os Estados Unidos ficaram de maneira implícita como o principal aliado político
e principal parceiro comercial do Brasil. Aliás, desde meados do século XIX os EUA
vinham-se convertendo no principal destino das exportações brasileiras, entre eles o
principal foi o café,

Ao longo das décadas desde finais do século XIX e começos do XX, as


exportações de café tomaram forte repercussão política e econômica por meio do
grande peso da “burguesia do café”. A influência e geração de riqueza da burguesia
do café teve um forte impacto, desde a transformação e crescimento acelerado da
cidade de São Paulo até decisões e controle político ao longo da Primeira República.
Contudo, depois da Primeira Guerra Mundial a dinâmica política entre a “burguesia do
café” e o Governo começou a ficar mais complexa até que terminou em uma ruptura
política, peça-chave para queda da Primeira República no ano de 1930, conforme
iremos ver mais adiante.

Nossos estudos deste tópico começam no ano de 1914, ano que marcou o
começo da Primeira Guerra Mundial. Em termos históricos, essa Guerra com repercussões
mundiais acabou com quase um século de relativa paz no cenário europeu, logo,

101
acabou também com uma relativa calma que existia no cenário mundial. A relativa paz
que existiu ao longo do século XIX, teve seu fundamento no Congresso de Viena em
1815, ano que marcou o fim das devastadoras Guerras Napoleónicas e suas implicações
geopolíticas na Europa e nas Américas. Assim, a Primeira Guerra Mundial marca um
antes e depois dessa relativa paz que durou quase um século.

2 A PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL

A primeira Guerra Mundial desde o ponto de vista da dinâmica da história,


é considerada o ponto referencial de começos do século XX, reflexo das grandes
transformações tecnológicas, sociológicas e políticas que se vinham produzindo desde
finais do século XIX. Entre uma das diferenças das Guerras Napoleónicas de começos
do século XIX (o primeiro grande conflito com repercussões intercontinentais) com a
Primeira Guerra Mundial, radica em que a Primeira Guerra Mundial foi o primeiro grande
conflito bélico com capacidade de destruição massiva que envolveu diretamente nações
ao redor do mundo. O conflito bélico mundial da Primeira Guerra Mundial demonstrou
pela primeira vez o grande poder destrutivo que a tecnologia trouxe à arte da Guerra.
“No conflito que acabou com a era da inocência, armas foram testadas sem que se
pudesse avaliar seu poder de destruição. O saldo: 15 milhões de mortos.” (VEJA, 2014)

IMAGEM 4 – O AVIÃO DE COMBATE FOKKER DR1, “UM DOS FRUTOS DA EVOLUÇÃO


TECNOLÓGICA DA PRIMEIRA GUERRA.”

FONTE:<https://bbc.in/3CVodzv>. Acesso em: 21 dez. 2021.

Nesta imagem podermos observar um dos modelos de aviões de combate


utilizados durante o conflito, devermos reparar que apenas uma década antes do conflito,
no ano de 1903 os irmãos Wright tinham feito seu primeiro voo, “percorrendo 37 metros
em 12 segundos. Pouco depois, Wilbur fez um voo de 260 metros em 59 segundos.”
(BRITANNICA ESCOLA, 2021, n.p.). Assim, logo depois de uma década desse primeiro
voo, milhares de naves de combate foram utilizadas na Primeira Guerra Mundial como
uma demonstração de avanço tecnológico com capacidade de destruição massiva sem
precedentes para os patamares de começo do século XX.

102
NOTA
Quer saber um pouco sobre esse primeiro voo? Acesse a história do
primeiro voo dos irmãos Wright e as implicações disso para a indústria
da aviação, em: https://bit.ly/3InmK6f.

Acabamos de ver um pouco da capacidade de potencial destrutivo, para os


patamares da época, que teve a Primeira Guerra Mundial. Mas quais foram os motivos
desse primeiro grande conflito bélico mundial? Para responder isso, antes de tudo
temos que entender quais eram as condições geopolíticas prévias à eclosão da Guerra,
assim como também devermos nos lembrar que para começos do século XX a Europa
era ainda o único centro de poder político, econômico e tecnológico do mundial.

No contexto geopolítico até finais do século XIX, a Europa estava em uma


harmonia relativa graças ao equilíbrio atingido nas negociações do Congresso de Viena
de 1815 logo depois das Guerras Napoleónicas, equilíbrio que estava fundamentado nos
seguintes elementos essenciais:

• Uma ordem e paz entre nações de acordo com a moral e normativa jurídica
internacional.
• Entre nações não deveria existir hegemonia de uma nação em particular sobre as
outras.

Essas condições de harmonia relativa favoreceram ao Império Britânico cuja


força estava baseada no comércio internacional praticamente com todas as nações
do mundo, na exploração de suas colônias e no seu poderio naval ao redor do mundo.
E como elemento essencial dessa liderança dos britânicos estava na capacidade de
desenvolvimento industrial da Inglaterra seu reino mais importante, aliás, a Inglaterra
converteu ao Reino Unido (ou Grã-Bretanha) na nação mais industrializada do século
XIX. Porém, para finais desse século essa liderança como a nação mais industrializada e
poderosa do mundo estava começando a diminuir.

Nesse sentido, para finais do século XIX no cenário europeu se consolidaram


dois grandes culturas por meio da formação de duas novas nações, que por sua
representatividade geopolítica e cultural se transformaram em duas potências, alterando
a harmonia geopolítica da Europa, isto é, a Alemanha e a Itália. A consolidação dos reinos
germânicos - com a exceção da Áustria - por meio da liderança do reino germânico
prussiano converteram ao povo germânico da Alemanha na nação mais poderosa do
continente europeu (o Reino Unido é a união política das Ilhas Britânicas, logo, fica fora
do contexto da Europa Continental). A Alemanha nasceu oficialmente como uma nação
consolidada dos estados germânicos no ano de 1871.

103
A segunda nação europeia que teve suas origens nessa época foi a Itália. Embora
o povo italiano, junto com à Grécia, seja o verso da civilização ocidental, na história
moderna estava fragmentado em diversos estados ao longo da península itálica. Porém,
no ano de 1861 esses diversos reinos se unificaram sob uma só nação, a Itália. Desse
modo, para finais do século XIX no continente europeu apareceram duas novas nações
que consolidaram a força de dois povos muito representativos, mudando a harmonia
geopolítica desse continente e do mundo.

A Alemanha com a força de seus estados germânicos juntou um poderio


com capacidade de inovar e aprender que levou à Alemanha em disputar a liderança
industrial e militar tanto do Reiuno Unido como da França. Para começos do século
XX a Alemanha tinha se convertido, praticamente na nação mais poderosa do
continente europeu.

A Alemanha em curto tempo se desenvolveu industrial e militarmen-


te posicionando-se entre as mais fortes nações da Europa. Detentora
do mais bem organizado, treinado e aparelhado exército do mundo,
o Império Alemão implementou um programa de modernização e ex-
pansão de sua marinha para ampliar sua esfera de influência na Eu-
ropa e disputar colônias e mercados na África e na Ásia. A Alemanha
buscava ocupar, ne cenário global, posição compatível ao seu status
de potência mundial, o que influenciou fortemente o caráter das re-
lações internacionais (MENDONÇA, 2008, p.17).

Além de se converter na nação mais poderosa do continente europeu a


Alemanha queria ser parte ao igual que o Império Britânico em uma potência mundial,
gerando assim um contrapeso a hegemonia britânica. Por outro lado, a nova nação
Italiana, embora considerada desde 1861 uma das principais nações europeias ainda
estava em processo de industrialização, logo sem muita força militar ao comparar ela
com as outras potências europeias, tais como o Reino Unido, a Alemanha, França, Rússia
e o Império Austro-húngaro.

Porém, a Itália era uma nação de cultura ancestral com desejos de ser parte
das grandes nações da Europa e desejando se expandir, especialmente para territórios
africanos. Devermos observar que ao adicionar tanto a Alemanha como a Itália no jogo
dos interesses geopolíticos houve também aumento das tensões na Europa, tensões
que foram se acrescentando até eclodir a Primeira Guerra Mundial.

[...] as potências europeias nutriam, uma para com as outras, questões


geradoras de tensão, a saber: a França queria a região mineradora da
Alsácia-Lorena, perdida para a Alemanha na Guerra Franco-Prussiana
(1870); as terras polonesas eram disputadas entre Alemanha e
Rússia; a Inglaterra pretendia expandir sua esfera de influência sobre
o Oriente Médio, sob dominação Turco-Otomana: França e Inglaterra
buscavam ajustar seus interesses no norte de África e na Ásia;
Áustria-Hungria e Itália disputavam o domínio sobre o Mar Adriático e
tinham conflito de interesses na ocupação das “Terras Irredentas”; e a
Alemanha era vista como ameaça à hegemonia britânica nos mares.

104
Nos Bálcãs, porém, os interesses das grandes potências convergiam
e se entrechocavam fazendo daquela península o “barril de pólvora”
da Europa (MENDONÇA, 2008, p.18).

Assim, conforme dito pela autora Mendonça e pela conjuntura dessa época, o
primeiro grande conflito a nível mundial teve como fundamento as disputas e interesses
geopolíticos entre as principais nações da Europa, conflito que logo se espalhou para
o resto do mundo, iniciando assim a Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Mas como foi
que essas tensões geopolíticas que vinham se acumulando explodiram? O fósforo que
deu início ao primeiro grande conflito mundial foi o assassinato do herdeiro do Império
Austro-húngaro em uma das regiões mais conflitivas da Europa, os Balcãs. Embora esse
assassinato fosse uma questão estritamente regional entre os interesses dos povos dos
balcãs e o Império Austro-húngaro, foi o “pretexto” para iniciar um efeito cadeia entre as
tensões que vinham-se acumulando entre as potências europeias.

Em termos estritamente históricos o conflito começou com esse assassinato,


na capital de Bósnia, na região da Servia – parte dos Balcãs – no dia 28 de junho de
1914. Devermos nos lembrar que nessa época a região de Servia estava anexada ao
Império Austro-húngaro, mas vinha lutando por declarar sua independência por
vários anos antes de 1914, até que aconteceu o assassinato do arquiduque Francisco
Fernando de Áustria-Hungria por parte de nacionalistas sérvios, conhecidos como “Mão
Negra”. Finalmente logo da Guerra essa região conseguiu sua independência formando
a Monarquia de Jugoslávia, 1918- 1941.

NOTA
Depois da Segunda Guerra Mundial a Monarquia de Jugoslávia passou
a se converter na República Socialista Federativa da Jugoslávia, 1945-
1992; e após de 1992 essa região se desintegrou em vários países:
Eslovênia, Croácia, Bósnia e Herzegovina, Sérvia e Macedônia.

105
IMAGEM 5 – MAPA DOS BALCÃS UMA DAS REGIÕES COM MAIOR DIVERSIDADE ÉTNICA DA EUROPA

“Balcãs ou Bálcãs ou ainda península balcânica é o nome dado a uma região peninsular a sudeste da
Europa caracterizada pela enorme diversidade étnica, cultural e religiosa dos povos que a habitam, além
dos drásticos conflitos que há séculos preenchem a história da região, derivados de tal pluralidade.”

FONTE: <https://bit.ly/3Jub2Z4>. Acesso em: 22 dez. 2021.

Desse mapa conseguimos observar a enorme quantidade de povos que habitam


a região dos Balcãs, daí um dos motivos dos vários conflitos que essa região confrontou
ao longo da história moderna e o porquê hoje os balcãs está conformado por vários
países. No contexto da Primeira Guerra Mundial, uma boa parte dos povos dos balcãs
compartem uma raiz em comum, os sérvios, os quais fazem parte dos eslavos que são
um grupo étnico originário da vasta região da Rússia, daí a proteção da Rússia a favor
dos sérvios quando explodiu a Primeira Guerra Mundial, conforme vamos ver a seguir.

Logo de um mês do assassinato, o Império Austro-Húngaro declarou a guerra à


Servia, com isso a Império Russo aliado de longa data dos sérvios declarou a guerra ao
Império Austro-Húngaro. Em defesa dos austríacos os irmãos germânicos da Alemanha
entraram no conflito começando assim um jogo de alianças de guerra entre os países

106
europeus, reflexo das tensões que se vinham acumulando entre as grandes nações da
Europa. Assim, por meio de interesses comuns, as grandes nações da Europa iniciaram
alianças estratégicas perante o conflito iniciado nos Balcãs.

ATENÇÃO
Sabia que a Áustria ao longo da história moderna conformou vários
impérios, se mantendo firme como uma das monarquias absolutas com
grande poder geopolítico na Europa Continental? Isso foi feito por meio
deu sua Casa Real, os Habsburgo. “Seu domínio se estendeu também,
durante alguns períodos, a muitos outros países da Europa, entre eles
a Boêmia (hoje parte da República Tcheca), a Hungria e a Espanha.”
(BRITÂNICA ESCOLA, 2021, on-line).

Quer saber mais sobre umas casas reais mais poderosas da Europa? Acesse
ao artigo: 1918: Fim do império dos Habsburgos: https://bit.ly/3in87p2

Por um lado, houve a tríplice aliança de Alemanha, Áustria-Hungria e a Itália,


porém, este último país logo de um ano ficou fora dessa aliança. Por outro lado, houve
a tríplice aliança dos aliados de Rússia, Reino Unido e França, contra os Alemães e
Austríacos. Ao conflito foram se somando as demais nações da Europa – incluindo a
Itália que no começo do conflito estava do lado dos germânicos –, os Estados Unidos
e o Brasil quase ao final da Guerra, e mais outros países do mundo. Assim, houve um
grande grupo de países ao redor do mundo que se juntaram do lado dos aliados contra
da Alemanha, da Áustria-Hungria e da Turquia (que se aderiu ao lado dos germânicos).

No começo da Primeira Guerra Mundial o Brasil se declarou neutro, mantendo o


posicionamento de neutralidade dos Estados Unidos e do resto da América Latina. Posição
de neutralidade que no caso da Primeira Guerra Mundial estava bem fundamentada,
considerando que era uma Guerra que tinha fins econômicos e geopolíticos das grandes
nações europeias. Lauro Müller, Ministro de Relações Exteriores da época “[...] persistiu
na defesa da neutralidade em uma guerra, na qual, afinal de contas, estavam presentes
motivações econômicas e colonialistas que nada tinham a ver com o nosso país.”
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 78).

Essa posição de neutralidade terminou no ano de 1917 para as ambas as nações.


A primeira em sair da neutralidade foram os Estados Unidos, que logo de fortes pressões
entrou na Guerra a favor dos Aliados em abril de 1917. O Brasil também se viu forçado em
finalizar sua posição de neutralidade logo depois dos Estados Unidos, quando as forças
navais da Alemanha torpedearam navios mercantes brasileiros.

107
Em 11 de abril de 1917, porém, já sob o governo de Venceslau Brás, o
Brasil rompeu relações diplomáticas com o Império germânico em
razão do afundamento, dias antes, do navio mercante brasileiro
Paraná por um submarino alemão. A agitação da opinião pública
promovida por aqueles favoráveis ao envolvimento brasileiro na
guerra levou Müller a demitir-se do Itamaraty, em 26 de outubro de
1917, após o afundamento de vários navios mercantes brasileiros
por submarinos alemães, o Brasil declara guerra à Alemanha
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 79).

Conforme expressam os autores Lessa e Altemani (2014, p. 79) a intervenção do


Brasil foi praticamente simbólica, mas teve fortes repercussões políticas regionais. Pois
foi o único país da América Latina que entrou na Primeira Guerra Mundial, os demais
países da região mantiveram a neutralidade. O Brasil entrou um ano antes de finalizar
a mais devastadora guerra conhecida até então. A Guerra parecia que não ia ter fim, o
conflito começou a finais de julho de 1814 e para quando o Brasil entrou ainda parecia
longe o fim dela. Porém, historicamente a Guerra começou a se tornar a favor dos aliados
quando o Império Austro-húngaro e o Império Otomano (a Turquia) já cansados e sem
recursos ser renderam durante o primeiro semestre de 1918.

Logo depois a Alemanha – a única nação ainda em pé contra os aliados – arruinada


pelo conflito começou ter sérios problemas internos de cunho socioeconômico. Nesse
sentido, com a ameaça de uma revolução comunista dentro da Alemanha, e com o exemplo
real que tinha acabado de acontecer na Rússia com a revolução bolchevique, em novembro
de 1918 o Império Alemão se rendeu, finalizando assim o primeiro grande conflito mundial.

2.1 CONSEQUÊNCIAS DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL

Após a Primeira Guerra Mundial, a estrutura geopolítica do mundo tinha mudado,


terminando assim a imagem de predomínio do Império Britânico no contexto mundial,
e no contexto europeu ficou claro que as grandes monarquias absolutas tinham
terminado. Por um lado, a Império Russo tinha colapsado, dando começo ao processo
do comunismo da revolução bolchevique que iria dar as bases para a segunda maior
potência mundial do século XX, a União Soviética.

Por outro lado, foi o fim da Casa Real dos Habsburgo na Áustria, a qual foi uma das
mais importantes monarquias que tinha comandado um dos maiores impérios da Europa
durante 4 séculos! Desde 1515 até 1918 (como potência europeia do período moderno),
conhecido como Império dos Habsburgo. Conforme o mapa de abaixo, o Império Austro-
húngaro foi a nação perdedora da Guerra que teve maior perda de território. Aliás, a Áustria
depois de Primeira Guerra Mundial não conseguiu se reestabelecer como grande potência
em termos geopolíticos. Porém, em termos de riqueza per-capita, conhecimento e cultura
a Áustria atualmente é uma das nações mais ricas e desenvolvidas da Europa. E os demais
países da Europa, como eram os mapas políticos deles antes e depois da Guerra?

108
IMAGEM 6 – MAPA POLÍTICO DA EUROPA, ANTES E DEPOIS DA PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL

FONTE: <https://bit.ly/3u9SVAZ>. Acesso em: 21 dez. 2021.

O mapa exposto acima expressa claramente as grandes mudanças nos territórios


dos países europeus logo da Primeira Guerra Mundial. Mas o conflito trouxe também
mudanças na geopolítica que vão além do contexto europeu. Para muitos historiadores
o fim desta Guerra representa o começo “implícito” do século XX. Vejamos quais são
essas grandes mudanças, que aliás, influenciaram na Política Externa do Brasil.

2.1.1 Novas potências mundiais

Embora a Alemanha tivesse perdido a Guerra e ficado na falência financeira,


ficou claro que sua dinâmica econômica, industrial e política – que, aliás, vinha se
estruturando desde finais do século XIX- daria a esse país um posto importante entre as
grandes potências dentro e fora de Europa até os dias atuais. O Império Russo durante a
Guerra tinha colapsado, porém, a revolução bolchevique deu as bases para o nascimento
da União Soviética que já logo na década de 1930 foi transformado em uma potência
mundial, dando início a uma briga ideológica mundial entre um “mundo comunista” e
um “mundo capitalista”.

O país que mais se destacou a partir da Primeira Guerra Mundial foi os Estados
Unidos, que ao longo do século XIX já vinha se desenvolvendo para ser uma grande
nação. Porém, foi somente após do conflito que todo esse poderio de um país continental

109
e bem-organizado entraria no cenário internacional como uma grande potência com
capacidade de influenciar a geopolítica mundial. Em termos de política externa, os
Estados Unidos aumentaram sua presencia no comércio internacional, especialmente
fornecendo aos aliados de matéria prima e insumos essenciais para dar conta de
uma longa Guerra. Além disso os Estados Unidos se converteram em prestamistas e
investidores da Europa para sua reconstrução, dando assim uma forte concorrência à
Inglaterra como centro financeiro mundial.

Com a entrada no cenário global dessas três nações, o Império Britânico não
seria mais a única superpotência com capacidade de influenciar todos os continentes
do mundo. Assim, a Primeira Guerra Mundial foi o começo do declive do Império Britânico
como a maior potência mundial. Hoje, o Reino Unido continua sendo uma potência e
mantem sua liderança em várias frentes, mas já não mais como uma superpotência.

2.1.2 O Tratado de Versalhes

Em junho de 1918 foi assinado o tratado de Versalhes. Nesse tratado foram


estabelecidas as sanções e punições pelos prejuízos produzidos na Guerra à Alemanha.
Entre as sanções estabelecidas, a Alemanha teve que amortizar indenizações da Guerra
aos aliados, ficou proibida a formação de um exército poderoso, assim como perdeu
colônias e territórios específicos para a França, Bélgica e Polônia, conforme podemos
visualizar no mapa anterior.

Todo esse conjunto de sanções levaram à Alemanha para a falência, que se


juntar à Grande Depressão de 1930 ajudaram ao nazismo tomar conta do Estado Alemão
durante a década de 1930, logo, as bases ideológicas para dar início à Segunda Guerra
Mundial sob a bandeira da Alemanha Nazi. Além das sanções estabelecidas contra a
Alemanha o Tratado de Versalhes estabeleceu a normativa para a criação da “Liga das
Nações”, organismo multilateral que procurou evitar futuros possíveis conflitos.

Embora o Presidente dos Estados Unidos, Woodrow Wilson, foi o idealizador que
propôs os pontos essenciais a serem abordados pela Liga de Nações, “[...] a recusa do
Congresso norte-americano em ratificar o Tratado de Versalhes acabou impedindo que os
Estados Unidos se tornassem membro do novo organismo.” (FGV CPDOC, 2021). Devermos
observar que os Estados Unidos como parte integrante dos países aliados estiveram
contra das punições severas à Alemanha estabelecidas do “Tratado de Versalhes”.

Essa oposição ficou refletida na recusa do Congresso dos Estados Unidos em


aceitar o Tratado de Versalhes, consequentemente ser membro fundador da Liga das
Nações. Com essa recusa dos Estados Unidos em participar da Liga das Nações, a partir
desse momento esse país inicia uma Política de Isolamento Continental. O Brasil foi
parte ativa do Liga das Nações, mas logo depois, em 1926, nosso país também entraria
em uma política de isolamento, conforme iremos ver mais adiante.

110
ATENÇÃO
Sabe qual a diferença entre tratados bilaterais e multilaterais?

Os acordos entre países são compromissos de Estado entre as nações,


eles podem ser somente entre dois países, isto é, um acordo bilateral;
ou podem ser entre vários países, isto é, um acordo multilateral. Os
acordos multilaterais podem ser regionais, internacionais e inclusive
globais. Um acordo multilateral que seja global é a OMC (https://www.
wto.org/indexsp.htm), e um acordo multilateral regional é o MERCOSUL.

Se quiser saber mais sobre o que é um acordo multilateral acesse a: O


que são acordos multilaterais?: https://bit.ly/3N3HvaB.

3 A LIGA DAS NAÇÕES

A Liga de Nações foi uma organização multilateral, sediada em Genebra,


considerada como o organismo antecessor da ONU. Ela foi formada oficialmente no
ano de 1919 como parte integrante do “Tratado de Versalhes”, e foi extinta no ano de
1946 quando a ONU, recentemente formada, assumiu todas as suas responsabilidades,
conforme vamos estudar no Tópico 3 desta unidade. Sua finalidade era de evitar o
surgimento de possíveis novos conflitos que pudessem levar para uma guerra com
repercussões mundiais. Ao longo de seus 27 anos de atuação a Liga das Nações foi
bem-sucedida evitando alguns conflitos, no “[...] arbitramento de disputas nos Bálcãs e
na América Latina, na assistência econômica e na proteção a refugiados, na supervisão
do sistema de mandatos coloniais e na administração de territórios livres como a cidade
de Dantzig.” (FGV CPDOC, 2021). Porém, não conseguiu evitar a maior das guerras, a
Segunda Guerra Mundial, 1939-1945.

Como já foi dito, o objetivo da Liga das nações era de restabelecer a ordem
mundial logo depois de ter finalizado a Primeira Guerra Mundial, porém, na sua estrutura
inicial faltou representatividade das novas potências mundiais.

• Os Estados Unidos, conforme acabamos de estudar, quiseram se isolar das


resoluções da Liga das Nações. Esse país pensava que a Liga das Nações estava mais
focada nas questões e nos interesses da geopolítica dentro do contexto europeu,
interesses que, aliás, prejudicaram fortemente às nações perdedoras, a Alemanha e
a Áustria. Além disso, a Liga das Nações não era muito representativa da nova ordem
mundial, que não somente representava à Europa Ocidental, mas sim outras regiões
do mundo com alta capacidade de influenciar, tais como os Estados Unidos e o Japão.
Alguns historiadores expressam que as mudanças geopolíticas que se mantiveram
relativamente estáveis ao longo do século XIX mudaram a partir da Primeira Guerra
Mundial, para historiador Hobsbawm: [...] o século XX começou quando a Primeira
Guerra Mundial terminou em 1917 e terminou com a queda do Muro de Berlim em 1989.

111
(BBC, 2012). Ou seja, grande parte do século XX foi influenciado pelos interesses e
decisões dos Estados Unidos, a União Soviética (hoje desintegrada em vários países),
e não somente da geopolítica das grandes potências europeias, tais como do Reino
Unido, a França e a Itália, as quais eram a cara da Liga das Nações.

• A Rússia, que no momento da formação da Liga das Nações estava passando pelo
processo de transformação socioeconômico da revolução bolchevique que levou
à formação da União Soviética, daí de sua ausência inicial da Liga das Nações.
Superpotência que oficialmente foi conhecida como a União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS) e cuja maior república era a Rússia. A URSS aderiu à
Liga das Nações no ano de 1934, mas foi expulsa no ano de 1939.

• A Alemanha, por ter sido a principal nação derrotada da Primeira Guerra Mundial, ficou
fora da Liga das Nações, pelo menos no início. A Alemanha foi fortemente prejudicada
por parte das decisões do Tratado de Versalhes em relação às indemnizações a serem
pagas da Primeira Guerra Mundial. Logo depois em 1926, ela foi aderida à Liga das
Nações, inclusive como membro permanente.

No contexto de sua estrutura organizacional, como organismo internacional,


a Liga das Nações foi representada por mais de 32 países nos primeiros anos, entre
elas o Brasil, nos anos seguintes de sua formação 13 nações adicionais aderiram ao
organismo multilateral. Sua gestão era estruturada, por meio de uma Assembleia Geral
e um Conselho Executivo com membros permanentes (no começo eram 4 países, logo
depois foram 6) e membros não permanentes (no começo eram 4 países, logo depois
foram 6). Uma vez por ano todos os representantes dos países membros se reuniam na
Assembleia Geral, sediada em Genebra.

Conforme dados da ONU Genebra (2021), ao início a Liga das Nações estava
conformada por quatro membros permanentes do conselho – Reino Unido, França, Itália
e Japão – e quatro membros não permanentes - Bélgica, Brasil, Grécia e Espanha. Em
1926 a Alemanha conseguiu entrar na Liga das Nações como membro permanente do
conselho, se convertendo no quinto membro permanente do conselho. Logo em 1934 a
União Soviética seria o sexto membro permanente.

Assim, pelo grande número de nações, praticamente todas as regiões do


mundo estavam representadas na Liga das Nações. Porém, para muitos historiadores
das relações internacionais “a Liga das Nações não passava de uma organização de
fachada.” (DW, 2021):

A invasão da Manchúria pelo Japão, em 1931, foi uma prova do fracasso da


Liga das Nações. Condenado um ano e meio depois pelo ato de agressão,
o Japão abandonou a organização. A Alemanha seguiu o mesmo caminho
a 14 de outubro de 1933. Adolf Hitler, interessado apenas em armar seu
país, usou uma série de pretextos para abandonar a conferência de
desarmamento e ridicularizar a Liga das Nações (DW, 2021, on-line).

112
O maior falho da Liga das Nações foi não ter conseguido frear as intenções da
Alemanha Nazista, conhecida como também como o Terceiro Reich. Na Alemanha a
convergência de sentimentos e um governo nazista levaram ao Europa para a Grande
Guerra em 1939 que logo se converteu na Segunda Guerra Mundial, conforme vamos
estudar no seguinte tópico. No contexto do Brasil, nosso país participou como membro
ativo – inclusive foi o único país da América Latina que participou como membro, não
permanente, do conselho – até o ano de 1926. Ano no qual deu aviso para se retirar da
Liga das Nações em função da negativa de não ser aceito como “membro permanente
do conselho”, conforme vamos ver a seguir.

3.1 A LIGA DAS NAÇÕES NO CONTEXTO BRASILEIRO

O Brasil foi o único país da América Latina que foi membro, não permanente, do
conselho da Liga das Nações, conforme estudamos anteriormente. Um dos principais
motivos para isso é porque o Brasil foi o único país da região que entrou na Primeira
Guerra Mundial, o resto dos países da América Latina se declararam neutros perante o
conflito.

O Brasil ao ser membro da Liga de Nações ficou em uma posição diplomática


privilegiada. Essa mesma posição do Brasil de pertencer à Liga de Nações, como parte
dos países que faziam parte do conselho, também o levou a se isolar politicamente
da vizinhança. “A ilusão de que, no plano diplomático, o Brasil compartilhava o mesmo
espaço das grandes potências resultou em certo desleixo dos governos brasileiros em
relação aos países hispano-americanos.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 78).

Esse espaço privilegiado dentro da gestão da Liga das Nações deixava ao Brasil
se sentir como parte das grandes nações. Nos primeiros anos da Liga somente 10
países faziam parte do conselho, 5 como membros permanentes (reservado as grandes
potências) e cinco como membros não permanentes (reservado para países com uma
relativa importância no cenário global). O Brasil fazia parte dos membros do conselho
não permanentes, mas desejava ser incluído como permanente.

Assim, ante esse desejo de ser parte do núcleo principal dos membros do
conselho, o Brasil no ano de 1926 solicitou ser parte dele. Mas foi negado, o argumento
foi se ele fosse aceito “outros países também reivindicassem a condição de membro
permanente, se o pleito do Brasil fosse aceito, eles, igualmente, teriam de ser atendidos,
o que era inviável.” Enquanto isso, nesse mesmo ano a Liga de Nações estava analisando
a entrada de Alemanha como país membro, inclusive como membro permanente do
conselho. E como era de esperar o Brasil iria votar a favor, mas como foi negada sua
petição de ser membro permanente do Conselho o país vetou a entrada da Alemanha,
como maneira de protesto.

113
Esse protesto feito pelo Brasil, vetando a entrada da Alemanha, isolou ainda mais
ao país do resto da América Latina, pois os representantes dos países vizinhos estavam
a favor da entrada da Alemanha. Conforme os autores Lessa e Altemani (2014, p.83): “Os
representantes dos países latino-americanos apelaram coletivamente para que o Brasil
suspendesse o veto e informaram ao Conselho que não apoiavam a posição brasileira,
desmentindo o argumento de que nosso país representava o continente americano.”

Diante do acontecido, o Brasil ao se sentir isolado, formalizou a saída da Liga


das Nações, se afastando da Europa e se aproximando ainda mais ao isolamento
hemisférico liderado pelos Estados Unidos. No contexto da Política Externa brasileira
foi assim que termina o período da Primeira República, com o isolamento do Brasil
na região da América Latina e se alienando ainda mais à posição de neutralidade dos
Estados Unidos. Em 1930 com a eleição da Getúlio Vargas começa um novo período da
história republicana e uma nova maneira de executar a Política Externa do país ante
um cenário internacional conturbado desses anos. Por um lado, estava começando a
Grande Depressão, e por outro, estava começando a forte polarização entre o fascismo
(extrema direita nacionalista) e o comunismo (extrema esquerda nacionalista), na Europa
e no resto do mundo.

Nesse contexto, a nova grande nação comunista, a União Soviética desejando


estender o estado socialista para outras nações do mundo; e as nações fascistas da
época, Alemanha e Itália, desejando expandir o estado nacionalista fascista. Esse
espectro político conturbado que, aliás, se estava espalhando por toda Europa se
consegue visualizar muito bem na Guerra Civil Espanhola, onde as forças comunistas
tiveram longos confrontos conta as forças nacionalistas fascistas. A Guerra Civil
aconteceu ao longo da década de 1930 e deixou à Espanha devastada com mais de
meio milhão de mortos. Finalmente no mesmo ano que começou a Segunda Guerra
Mundial, 1939, as forças nacionalistas fascistas ganharam a guerra civil, e o militar
Francisco Franco de ideologia fascista se afirmou no poder, ficando como Chefe do
Estado Espanhol até 1973, ano de seu falecimento.

No contexto brasileiro, essa década muito conturbada de 1930 foi o começo da


Segunda República do Brasil, conhecida como a “Era Vargas”. Época interessante de fortes
mudanças tanto nacionais como internacionais que levou a uma nova gestão da Política
Externa do Brasil conforme vamos estudar no seguinte tópico desta unidade. Mas antes disso
vamos estudar o impacto da política de preços do café e os começos da Grande Depressão no
fim da Primeira República, questões que tiveram forte influência na Política Externa Brasileira.

NOTA
Quer saber mais sobre essa devastadora guerra civil na Espanha? Acesse
ao artigo histórico: Guerra Civil Espanhola: https://bit.ly/3u5vdG8.

114
4 O FIM DA PRIMEIRA REPÚBLICA E A QUEDA DO PREÇO
INTERNACIONAL DO CAFÉ

Ao longo deste tópico estudamos as implicações na Política Externa durante


a mudança do Regime Imperialista para a Primeira República desde 1889. Logo disso
estudamos a liderança do Barão do Rio Branco ao comando do Ministério de Relações
Exteriores até 1912. Depois disso foi visto como a Primeira Guerra Mundial e a formação
da Liga das Nações refletiram o fim de uma época e o começo das novas condições
que marcaram a geopolítica mundial e do Brasil. Porém, para finalizar os estudos da
Política Externa durante a Primeira República devermos analisar também as implicações
do Política de Preços aplicadas ao café e como isso ficou refletido tanto na economia
brasileira como nas suas relações comerciais internacionais.

Para entender melhor as implicações da cadeia produtiva do café e sua


exportação devermos analisar dinâmica da exportação do café desde começos do
século XX, produto de exportação principal que alimentava a entrada de divisas
ao Brasil. Durante o período da Primeira República (ou República Velha), inclusive
durante as últimas décadas do Regime Imperialista, os produtores e exportadores do
café representavam um peso importante na economia nacional, logo, tinham uma
alta representatividade política, conhecida como a “burguesia do café”, durante a
Primeira República:

[...] o café manteve de longe o primeiro lugar na pauta das


exportações brasileiras, com uma média em torno de 60% do
valor total. No fim do período, representava em média 72,5%
das exportações. Dependiam do produto o crescimento e o
emprego, nas áreas mais desenvolvidas do país. Ele fornecia
também a maior parte das divisas necessárias para as
importações e o atendimento dos compromissos no exterior
(BORIS, 2006, p. 260).

ATENÇÃO
Sabia que a geração de divisas é fundamental para o comércio
internacional e bom funcionamento da economia de um país?
As divisas de um país são todas as moedas internacionais
fortes (US$, o Euro, a Libra Esterlina, e outas moedas), papeis
financeiros internacionais de fácil liquidação (tais como os
títulos do Tesouro Americano), reservas em ouro, entre outros
valores de liquidação imediata no mercado internacional. Todas
essas denominações de valor fazem parte da cesta de divisas
de um país, ou seja, a Reserva Internacional. Quer saber mais?
Acesse em: https://pt.mimi.hu/economia/divisas.html

115
Essa representação do 72,5% nas exportações fazia ao Brasil depender de
maneira excessiva da entrada de divisas vindas do café para sua economia. Essa
alta concentração das exportações em um só produtivo implicava um alto risco de
dependência, ainda mais se levarmos em consideração que o café é uma commodity.
Ou seja, a exportação do grão de café é uma matéria prima, sem maior geração de valor
agregado no seu processo de produção, o que implica que a formação de seu preço
depende 100% da oferta e demanda internacional.

Nesse sentido, embora o Brasil foi o maior exportador de café no mundo


durante essas décadas, o preço do café dependia 100% da demanda internacional.
Para tranquilidade financeira do Brasil, durante a primeira década do século XX o preço
internacional do café se manteve relativamente bom e estável. Inclusive esse preço era
muito atrativo para o setor exportador do café, contudo, houve momentos relativamente
curtos que o preço ficava abaixo do custo de produção, porém, logo voltava para o
patamar de preços atrativos.

Essa oscilação do preço internacional, embora a maior parte do tempo deixava


aos cafeeiros com preços bons, não deixava eles tranquilos, pois seria mais conveniente
ter um preço estável e assim planejar o negócio. Assim, a “burguesia do café” por meio
da influência desta na gestão governamental desenharam uma política de preços,
visando estabilizar o preço internacional do café. Mas aqui cabe perguntarmos, como o
Governo pode estabilizar o preço internacional do café? Devermos observar que o Brasil
era o maior produtor e exportador do café do mundo, logo, o país poderia aumentar ou
diminuir a oferta relativa no mercado internacional, assim:

• Quando o preço do café estava muito baixo, o Brasil poderia diminuir a sua oferta
do grão nos mercados internacionais, consequência? O preço tende a subir até se
estabilizar em um preço de equilíbrio adequado para a “burguesia do café”.

• Quando o preço do café estava muito alto, o Brasil poderia aumentar a sua oferta
relativa do grão nos mercados internacionais, consequência? O preço tende baixar
até se estabilizar em um preço de equilíbrio adequado para evitar a excessiva entrada
de concorrentes internacionais na produção.

Conforme essa dinâmica de aumentar ou diminuir a oferta relativa do café


brasileiro nos mercados internacionais, visando a estabilidade deste, o Governo
brasileiro conseguiu satisfazer a demanda da “burguesia do café”. Porém, para executar
essa política de preços o Governo deveria comprar e estoquear parte do grão produzido,
visando diminuir a oferta no mercado internacional, caso o preço estiver abaixo do preço
“desejável”, e logo depois quando o preço estiver em um preço bom o Governo poderia
vender seus estoques. Essa seria a teoria da Política de Preços, mas como em tudo
sempre há consequências, especialmente quando se intenta manipular o mercado de
uma commodity. Na política de preços do café houve das fortes consequências:

116
• Com o objetivo de criar estoques de grão de café o Governo criou um fundo de capital,
financiado, em grande parte, por empréstimos externos, e assim conseguir manter a
política de preços ao longo do tempo. Ou seja, houve um custo financeiro para o
Estado e aumento de sua dívida externa.

• O setor produtor ao ter uma competividade relativa muito boa em relação a outros
países, e ao ter um preço atrativo estável, aumentou drasticamente a produção
ao longo dos anos. “Como os lucros se mantiveram elevados, o negócio do café
continuou atrativo e, consequentemente, os investimentos no setor prosseguiram,
tornando cada vez mais robusta a tendência à superprodução”. (ATLAS FGV, 2016).

Essas duas grandes consequências logo depois teriam grandes impactos


econômicos e políticos que levaram ao final da década de 1920 para o fim da Primeira
República, conforme vamos ver mais adiante. A política de preços ficou formalizada
no governo de Presidente Alonso Pena (1906-1909), quem autorizou aos estados
interessados (São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro) em fazer a regulamentação
respectiva, conhecida como o “Convênio de Taubaté”, neste ficou estabelecido os
seguintes pontos importantes visando executar a política de preços:

A política de valorização do café seria operacionalizada por meio dos


seguintes mecanismos: a) o governo interviria no mercado comprando
os excedentes, propiciando assim o equilíbrio entre procura e oferta;
b) em virtude da debilidade das contas nacionais, o financiamento
para essas compras e para a manutenção dos estoques seria
realizado, especialmente, com empréstimos estrangeiros; c) uma
Caixa de Conversão seria criada para estabilizar o câmbio em um
nível remunerador; o empréstimo externo serviria de lastro à Caixa,
que emitiria papel-moeda destinado à compra do café; d) um novo
imposto, a princípio de 3 e depois de 5 francos, seria cobrado sobre
cada saca de café exportada para pagar o serviço da dívida externa
resultante; e) para solucionar o problema no longo prazo, os governos
dos estados produtores deveriam adotar medidas para diminuir a
expansão dos cafezais (ATLAS FGV, 2016).

NOTA
Quer sabes mais sobre o Convênio de Taubaté? Acesse aos detalhes deste
no Atlas da FGV: https://atlas.fgv.br/verbetes/convenio-de-taubate

Qual foi o resultado? Já para a década de 1920 a produção do café era


excessivamente alta e o governo foi forçado em ter que aumentar constantemente
o fundo de capital e assim continuar mantendo um preço relativamente estável. As
consequências não foram boas em 1929 com a quebra da Bolsa de Nova York acabou a
fonte de financiamento para estabilizar o preço do café. E para piorar a situação, diante
os começos da Grande Depressão (logo da quebra da Bola de Nova York) a demanda
internacional pelo grão de café despencou.

117
Ou seja, com uma baixa significativa na demanda e a oferta continuando firme,
o preço internacional teve uma forte queda por um longo período. Essa situação de
mercado para a “burguesia do café” implicou a falência de muitos e descontentamento
geral perante a gestão do Governo. E do lado do Governo a dívida externa contraída, ao
longo dos anos, para sustentar o fundo estabilizador do café ficou insustentável, ainda
mais com o começo da Grande Depressão. Os resultados do excessivo endividamento
por parte do Estado Brasileiro, e da falência de muitos produtores e exportadores do café,
trouxeram desvalorização da moeda, inflação e uma crise econômica sem precedentes
prévios. Esse enorme prejuízo do setor produtor e exportador de café, significou o
começo do fim da forte influência da “burguesia do café” nas questões do Governo, e
que se juntar com a forte crise econômica, ajudou fortemente na queda da Primeira
República logo da Revolução de 1930, comandada por Getúlio Vargas.

Talvez a política de preços do café não tenha uma relação direta com a Política
Externa dessa época. Mas influenciou bastante nas decisões do Palácio de Itamaraty,
pois um dos eixos das relações internacionais de um país é a dinâmica de seu comércio
exterior. Neste caso é um elemento importante para entender que a exportação de café
era a principal fonte de divisas ao longo da Primeira República, fonte de divisas que
acabou abruptamente a partir da quebra da Bolsa de Valores de Nova York de 1929 e
seu tsunami de consequências que levaram ao mundo para a Grande de Depressão da
década de 1930. No seguinte tópico, o último desta unidade, vamos estudar como esses
fatores influenciaram o início da Era Vargas, ou Segunda República, dando começos
para um novo momento da Política Externa.

118
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• A Primeira Guerra Mundial é considerada o ponto referencial de começos do século


XX, reflexo das grandes transformações tecnológicas, sociológicas e políticas que se
vinham produzindo desde finais do século XIX.

• No começo da Primeira Guerra Mundial o Brasil ao igual que os EUA e o resto da


Américas se posicionaram neutrais ante o conflito.

• Esse posicionamento neutral do Brasil mudou quando forças navais da Alemanha


torpedearam navios mercantes brasileiros em 1917.

• O Brasil foi o único país da América Latina que entrou na Primeira Guerra Mundial, os
demais países da região mantiveram a neutralidade.

• A Primeira Guerra Mundial trouxe uma série de mudanças geopolíticas que mudaram
ao mundo e ao Brasil. Entre essas mudanças foi o surgimento de novas potenciais
mundiais que tiraram ao Império Britânico de sua hegemonia mundial.

• Que que após a Primeira Guerra Mundial no Tratado de Versalhes, foi feita a normativa
para a criação da “Liga das Nações”, organismo multilateral que procurou evitar
futuros possíveis conflitos.

• Embora os EUA formaram parte do desenho da normativa da Liga das Nações,


esse país não foi membro dela. Nesse sentido, os EUA iniciaram uma Política de
Isolamento Continental.

• O Brasil foi o único país da América Latina que formou parte dos membros, não
permanentes, do conselho da Liga das Nações. Posição que o diferenciou do resto
de sua vizinhança.

• A partir de 1926 o Brasil abdicou a Liga das Nações, como protesto de sua rejeição
de formar parte do exclusivo grupo dos países mais poderosos que eram membros
permanentes.

• Com sua saída da Liga das Nações o Brasil se aderiu ao posicionamento de Isolamento
Continental dos EUA.

• A Política de preços do café e a quebra da Bolsa de Valores de Nova York tiveram uma
forte influência no fim da Primeira República e na Política Externa Brasileira.

119
AUTOATIVIDADE
1 Apesar que a Primeira Guerra Mundial começou em 1914, ela é considera o ponto de
partida do século XX, pois trouxe mudanças geopolíticas e tecnológicas que mudaram
o mundo dessa época. Entre essas mudanças temos:

( ) O surgimento de potências mundiais como a URSS os EUA, ambas as nações já


consideradas superpotências desde finais de 1920.
( ) A imagem de predomínio do Império Britânico no contexto mundial tinha mudado,
agora no cenário global existiam novas nações poderosas que entrariam no balanço
de hegemonia mundial.
( ) A queda de poderosas monarquias absolutas no continente europeu que tinham
mantido uma forte influência na geopolítica europeia desde o século XVI, exemplo
disso foi a Casa Real dos Habsburgo.
( ) A Alemanha embora tinha perdido a Guerra e ficou financeiramente quebrada
mostrou sua grande capacidade de recuperação, industrial e bélica,
competências que iriam colocar ao mundo perante um novo conflito mundial, a
Segunda Guerra Mundial.

Dessas sentenças, determine quais são verdadeiras:

a) (   ) V - F - F - V
b) (   ) V - V - F - F
c) (   ) F - V - F - V
d) (   ) F - V - V - V

2 Para o Brasil a Primeira Guerra Mundial trouxe um prestígio diferenciado do resto da


América Latina. Pois foi o único país da região que foi membro, não permanente, da
Liga das Nações. Sobre isso analise as seguintes sentenças:

I- O Brasil foi um dos cinco membros não permanentes do conselho da Liga das Nações
em função de sua posição de ser a maior nação da América Latina. Posição que
tinha disputado com a Argentina em função do grande nível de desenvolvimento
que tinha nosso país vizinho.
II- O Brasil foi um dos cinco membros não permanentes do conselho da Liga das
Nações em função de sua participação ativa, embora simbólica, na Primeira Guerra
Mundial. Pois foi o único país da América Latina de ter participado da Guerra.
III- Essa posição privilegiada dentro da Liga das Nações levou ao Brasil a se sentir
parte das grandes nações do mundo, situação que o distanciou do resto da
América Latina.

120
Dessas sentenças determinar a sequência correta:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) Somente a sentença III está correta.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença II está correta.

3 Os países que faziam parte do Conselho da Liga das Nações estavam divididos em
dois grupos, os membros permanentes e os não permanentes. Ao primeiro grupo
pertenciam os países com grande peso na geopolítica mundial, no começo eram
quatro: Reino Unido, França, Itália e Japão. E ao segundo grupo pertenciam países
relativamente importantes no contexto regional e internacional, no começo eram
quatro: Bélgica, Brasil, Grécia e Espanha. Mas o Brasil pensava que deveria estar
entre os países que faziam parte do conselho permanente da Liga das Nações, nesse
sentido, ele fez uma solicitação formal para ser incluído nesse grupo. Diante o exposto
determine a sentença correta:

( ) O Brasil fracassou no seu intento de ser parte do conselho permanente e como


protesto vetou a entrada da Alemanha para fazer parte da Liga das Nações. Isso
afastou o Brasil ainda mais de sua vizinhança, dado que os países latino-americanos
informaram ao Conselho que não faziam parte desse veto.
( ) O Brasil fracassou no seu intento de ser parte do conselho permanente e declarou
oficialmente sua saída da Liga de Nações, se posicionando oficialmente do lado do
Isolamento Continental dos EUA.
( ) O Brasil intentou se aproximar dos países latino-americanos, dessa maneira queria
reivindicar seu afastamento dos interesses da região da Latina América da qual o
Brasil fazia parte.

Destas sentenças determine a sequência de sentenças verdadeiras:

a) ( )F-V-F
b) ( )F-V-V
c) ( )V-V-F
d) ( )V-F-V

4 Os EUA fizeram parte ativa do Tratado de Versalhes e inclusive foi um dos países que
delinearam a normativa do organismo multilateral da Liga das Nações. Porém, os
Estados Unidos nunca fizeram parte da Liga, e partir daí esse país tomou uma posição
de Isolamento Continental. A seguir disserte quais foram os motivos pelos quais os
EUA nunca fizeram parte da Liga das Nações.

5 Nos começos do século XX o Brasil perante as oscilações do preço do café no mercado


internacional iniciou uma política de preços desse grão que ajudou aos produtores e
exportadores do café. Porém, essa política de preços trouxe graves consequências. A
seguir explique quais foram essas consequências.

121
122
UNIDADE 2 TÓPICO 3 -
AS RELAÇÕES COM OS EUA E A
AMÉRICA DO SUL

1 INTRODUÇÃO

O período da Primeira República estudado ao longo desta unidade marcou o


fim da aliança tácita que o Brasil Imperial teve com o Reino Unido ao longo do século
XIX. Conforme foi visto, desde começos da Primeira República houve uma aproximação
natural aos países das Américas, principalmente com os Estados Unidos. Porém, nos anos
após a Primeira Guerra Mundial o Brasil se isolou do resto da América Latina, pois como
membro do conselho - não permanente - da Liga das Nações (1919 - 1926) o Brasil tinha
o sentimento, talvez ilusório, de que fazia parte das decisões da geopolítica mundial, dado
que nenhum dos países da América Latina fazia parte desse conselho que somente as
grandes nações mundiais faziam parte.

Após de mais de meia década de ter participado como membro do conselho no


ano de 1926, conforme estudamos no tópico 2, o Brasil abdicou como membro da Liga
das Nações. Esse novo posicionamento brasileiro, de não fazer mais parte da Liga, foi
mais um elemento de aproximação à política de isolamento continental que os Estados
Unidos mantiveram desde o começo da formação desta, isto é, o isolamento continental
das Américas perante possíveis conflitos em outras regiões do mundo.

Para finais da década de 1920 no Brasil, a política de isolamento continental


junto aos fatores de crise política e econômica derivadas a partir do colapso da Bolsa de
Valores de Nova York em 1929 fizeram parte dos fatores determinantes para a revolução
de 1930 e a queda da Primeira República. No contexto da Política Brasileira, a partir
dessa revolução foi formado um governo no qual convergiam interesses dos militares,
das oligarquias (entre elas a do café), e de um novo setor que ia se desenvolvendo no
país, os empresários industriais.

Essa convergência de interesses foi liderando sob o Governo de Getúlio Vargas


que governou desde 1930 até 1946, período que o Brasil uma teve a aproximação muito
intensa tanto com os Estados Unidos como com a Alemanha, conforme iremos estudar
a seguir. Logo de Getúlio Vargas e com o fim da Segunda Guerra Mundial a geopolítica
mundial mudou mais uma vez com o advento de duas superpotências, os Estados Unidos
e a União Soviética (URSS), e o final do Império Britânico como uma superpotência.

A partir daí, 1945, os EUA com seu novo papel de superpotência deixaram
para segundo plano os interesses comuns que poderia ter com o Brasil e o resto da
América Latina. Assim, aos poucos a partir da década de 1950, o Brasil começou a se

123
aproximar de sua vizinhança. Inclusive o Presidente Juscelino Kubitschek (JK) liderou a
iniciativa “Operação Pan-americana”, a qual embora não teve o almejo de unir a região
da América Latina em função de um grande plano de desenvolvimento, teve algumas
consequências positivas, conforme veremos neste tópico.

2 AS RELAÇÕES COM OS EUA

Devermos observar que a revolução de 1930 é um divisor entre a Primeira


República (1889-1930) e o começo da Segunda República, ou Era Vargas (1930-1946),
que é caracterizada pela orientação ao comércio internacional e ao desenvolvimento
industrial. Esse foco econômico orientada ao desenvolvimento levou ao Brasil praticar
uma política exterior voltada para uma aproximação com as novas grandes potências
industriais da época, isto é, os Estados Unidos e a Alemanha, conhecida como uma
política exterior de “Equidistância Pragmática”. Conforme os autores Lessa e Altemani
(2014, p. 116, grifo do autor):

Equidistância pragmática. Equilíbrio observado nas relações


do Brasil com os Estados Unidos e com a Alemanha, em termos
comerciais, possibilitado pelo Tratado Comercial Brasil-Estados
Unidos, de 1935, e pelo Ajuste de Compensação Brasil- Alemanha,
de 1936. O equilíbrio no setor externo teve reflexos na esfera política,
aumentando, entre 1935 e 1937, a capacidade de barganha do Brasil.
Com o aumento das tensões na Europa, em 1938, e o advento da
guerra, em 1939, tal equilíbrio desapareceu.

Essa visão pragmática aumentou o comércio exterior com esses dois países, os
Estados Unidos e a Alemanha, exportando maioritariamente café e algodão e importando
bens de capital e tecnológica para desenvolver a indústria nacional. Em termos de
desenvolvimento houve alguns projetos interessantes que tiveram a assistência técnica
dessas duas nações. Porém, conforme o dito pelos autores com o aumento das tensões
na Europa de 1938 e o advento da Guerra esse equilíbrio desapareceu, e o Brasil passou
de maneira natural a intensificar suas relações comerciais e indústrias com os EUA.

Historicamente o começo da Era Vargas, ano 1930, é marcado pelo início de


uma década com fortes desafios no cenário internacional. Por um lado, se apresenta
o aprofundamento da Grande Depressão, e por outro, começa a se manifestar conflitos
reais dessa polarização característica de começos do século XX, entre a extrema esquerda
nacionalista liderada pela URSS e a extrema direita nacionalista fascista liderada pela
Alemanha e a Itália. Antes da Segunda Guerra Mundial, o conflito mais representativo dessa
polarização foi a Guerra Civil Espanhola da década de 1930, conforme foi visto anteriormente.

Diante esse cenário conturbado com “possíveis” ameaças de movimentos


de esquerda também aqui no Brasil, o Presidente Getúlio Vargas aplicou uma
semidemocracia, justificando uma ação política mais firme ante possíveis conflitos

124
internos que possam representar uma ameaça socialista. Nesse contexto, no dia 10
de novembro de 1937 aconteceu um Golpe de Estado “articulado pela própria cúpula
governista, que se valeu de um suposto plano comunista de tomada do poder − o
Plano Cohen – para justificar a ruptura institucional.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 93).
Ao mesmo que foi articulado o Golpe de Estado foi elaborada uma nova constituição,
aliás, muito semelhante ao modelo semifascista polonês, daí seu apelido como a
“Constituição Polaca”.

O texto constitucional apresentava sérias preocupações com as


ameaças à paz política e social do país, os “conhecidos fatores de
desordem”, os dissídios partidários, a propaganda demagógica em
favor da luta de classes e os conflitos ideológicos que poderiam
colocar o país à beira da guerra civil. Não por acaso, a nova Carta
concentrava os poderes executivo e legislativo nas mãos do
presidente, estabelecia eleições indiretas para presidente, com
mandato de seis anos e, entre outros dispositivos, retirava o direito
de greve dos trabalhadores. (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 94).

Nesse contexto conturbado e com uma visão de estado se aproximando aos


países fascistas de Europa (Alemanha, Itália e Espanha, entre os principais), seria
de esperar que o Governo do Presidente Getúlio Vargas tivesse feito uma gestão de
governo mais alinhada ao fascismo. Porém, sua gestão de governo e sua política exterior
continuou sendo pragmática e em função de geopolítica regional. Nesse sentido, logo
depois de ter começado a Segunda Guerra Mundial o Brasil se alineou com o resto da
América Latina e os EUA.

[...] em 1o de setembro de 1939, com a invasão da Polônia pela


Alemanha nazista, o Brasil e os demais países da região reuniram-
se na I Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores
Americanos, no Panamá, em 30 de setembro do mesmo ano,
quando ficou declarada a neutralidade do continente na guerra que
se iniciava. Na II Reunião de Consulta, realizada em Havana, em 20
de julho de 1940, foi aprovada a Ata de Havana, que estabelecia
que qualquer ataque a um país americano seria considerado uma
agressão ao continente, o que implicaria uma reação coletiva contra
o agressor (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 94).

O exposto pelos autores quer dizer que o Brasil se alineava com o posicionamento
de neutralidade das Américas, porém, caso houver uma agressão aos países das Américas
o Brasil entraria em defesa contra uma invasão ou agressão do “Eixo” (Alemanha, Itália
e Japão). Isso de fato veio a acontecer quando o Japão atacou Pearl Harbor nas ilhas
havaianas pertencentes aos EUA, no dia 7 de dezembro de 1941. A invasão a Pearl Harbor
fez aos Estados Unidos romper sua neutralidade e entrar na Segunda Guerra Mundial
em 1941. Isso colocou forte pressão ao posicionamento de neutralidade do Brasil, logo
depois disso em junho de 1942 o Brasil rompeu relações diplomáticas com o “Eixo”, e
no contexto de sua Política Externa Desenvolvimentista, finalizou também com sua
“Equidistância Pragmática”, entre EUA e Alemanha, que era uma ideia:

125
[...] de se manter fazendo um movimento pendular constante entre
as principais lideranças do sistema internacional, o que era uma
forma de justificar dois elementos do governo de Vargas: de um
lado, a tendência autoritária e, de outro, o projeto do American Way
of Life. Ele queria extrair dos dois países benefícios para o Brasil
(WORDPRESS, 2020, on-line).

Em termos de Política Externa isso implicava a ruptura de todo tipo de relações


com Alemanha, principalmente era o fim da dinâmica da “Equidistância Pragmática”
entre as duas potências industriais (EUA e Alemanha) e uma aproximação tácita aos
EUA. Um exemplo claro disso é a execução da Usina Siderúrgica de Volta Redonda
com financiamento e tecnologia norte-americana a partir de 1942. Grande projeto
industrial que antes mesmo da Segunda Guerra Mundial o Brasil vinha negociando e
ponderando qual das duas nações poderia lhe oferecer as melhores condições, eis
um reflexo da “Equidistância Pragmática”. Nesse sentido, a ruptura de relações com a
Alemanha “[...] foi decisiva para a realização da usina de Volta Redonda, a ser controlada
pela estatal brasileira Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Estava definido o futuro
posicionamento brasileiro diante do quadro aberto com o ataque japonês a Pearl Harbor
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 97).

Desde essa época até os dias de hoje a Usina Siderúrgica de Volta Redonda feita
com ajuda financeira e tecnológica dos EUA é a maior do Brasil e da América Latina. Além
da execução do projeto dessa usina com os EUA, a partir de 1942, foram assinados vários
acordos de cooperação no que tange a logística militar e desenvolvimento econômico.
“Tinha início uma nova fase nas relações Brasil-Estados Unidos, impulsionada pelo
fornecimento de armas e munições para o Brasil, pela oferta de investimentos e por
outras formas de cooperação, tendo como contrapartida a venda de material estratégico,
como borracha e minerais (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 98).

Logo da ruptura de relações com os países do “Eixo” o envolvimento do Brasil


na Segunda Guerra Mundial finaliza com sua participação ativa no conflito em 1944 por
meio da atuação da Força Expedicionária Brasileira (FEB) e da Força Aérea Brasileira
(FAB). As atuações tanto da FEB como da FAB embora tivessem acontecido em um
cenário secundário nas batalhas decisivas do fim da Segunda Guerra Mundial, elas
foram de sucesso e foram muito representativas tanto para a opinião pública brasileira
como para a imagem internacional do Brasil ao se posicionar de maneira ativa a favor
dos aliados no maior conflito bélico da história.

Os ganhos militares foram inquestionáveis, não apenas pela própria


experiência de combate, mas também quanto ao treinamento
logístico, ao manejo de armas mais ou menos modernas e,
principalmente, à vivência da guerra. No campo diplomático, o
Brasil passou a ser mais respeitado pelas nações aliadas, teve
papel relativamente importante na construção da ordem do
pós-guerra e ganhou prestígio em relação à vizinhança (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 99).

126
As consequências da participação bem-sucedida do Brasil fizeram que o país
possa participar na construção da nova ordem mundial da pós-guerra, constituída
pelo novo organismo multilateral a ONU que veio substituir à Liga das Nações, assim
como fez ao país ganhasse prestígio na América Latina. No contexto da atuação
externa, aí termina a Era Vargas, porém, além das implicações geopolíticas e da
aproximação aos EUA, a Era Vargas representa uma convergência econômica
e política entre os grandes setores econômicos do Brasil dessa época e dos dias
atuais, a setor agroexportador e o industrial.

2.1 A CONVERGÊNCIA ECONÔMICA DA ERA VARGAS NO


CONTEXTO INTERNACIONAL

Conforme vem se falando as relações com os EUA começaram a se intensificar a


partir de 1930 sob uma perspectiva de desenvolvimento comercial e industrial do Brasil.
Assim, podermos dizer que os anos da década de 1930 são uma convergência entre a
velha economia orientada à exportação de commodities – representadas pelas oligarquias
(principalmente o do Café) e sua forte articulação política – e a nova sociedade de geração
de valor industrial, conforme expõem os autores Lessa e Altemani (2014, p. 88).

A década de 1930 é considerada pelos historiadores brasileiros um


período de inflexão entre dois mundos: o da economia primário
exportadora e seu equivalente político, o Estado oligárquico e o da
sociedade industrial (ou semi-industrial), sendo o desenvolvimento
o principal fator responsável pelo processo de urbanização e de
crescimento populacional ocorridos nas décadas subsequentes.

Esse novo fator da economia brasileira, uma sociedade industrial com seu
processo de crescimento populacional urbano, levaram para o estabelecimento de
novas diretrizes no que tange às questões da Política Externa, interpretada como “a
passagem do paradigma primário exportador para o paradigma desenvolvimentista, não
deve, no entanto, ser considerada de maneira rígida. Lessa e Altemani (2014, p. 88).
Nesse sentido, o país começa um longo processo de convergência de seus agentes
econômicos entre o setor exportador de commodities e de produtos com geração valor
(industrializados), que, aliás, convivem até os dias atuais, porém, o que significa isso?

Significa que o Brasil desde essa época vem convivendo com os interesses
desses dois mundos, o setor exportador de commodities e o setor industrial. Esses
dois setores vêm influenciando a política e os interesses da política externa nacional.
Devermos que hoje, século XXI, o boom das commodities tem um peso de mais do
60% das exportações brasileiras, implicando maior dependência do país dos preços
internacionais e sujeito a maiores riscos quando houver uma queda forte no mercado
internacional, como já aconteceu com a queda do preço do café em 1929 e mais outras
de décadas mais recentes, conforme vamos estudar na Unidade 3.

127
3 AS RELAÇÕES COM AMÉRICA DO SUL E A GUERRA FRIA

Como já tínhamos falado ao finalizar a Segunda Guerra Mundial a geopolítica


mundial nunca mais seria a mesma. Tanto os EUA como a URSS passaram a ser
consideradas superpotências, os EUA sob a bandeira do capitalismo e a URSS sob a
bandeira do comunismo. O Império Britânico não era mais uma superpotência, logo
de manter essa supremacia diferenciada por vários séculos, ainda assim, devermos
observar que hoje o Reino Unido faz parte das potências mundiais sim, mas sem entrar
no eixo das superpotências.

A supremacia dessas duas superpotências a partir de 1945, os EUA e a URSS,


levou ao mundo para um balanço de poder novo nunca visto, polarizando ao mundo
entre as economias de mercado e as economias comunistas. Pêndulo de poder, aliás,
muito delicado que foi conhecido como a “Guerra Fria”. Foi uma Guerra que nunca
chegou a se materializar, era mais uma guerra de interesses geopolíticos e supremacia
econômica entre dois mundos, o capitalista e o comunismo.

Nesse contexto de Guerra Fria, por um lado, no ano de 1949 os EUA passaram
a liderar a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), aliança de cunho militar
que tinha como um de seus objetivos proteger a Europa Ocidental de qualquer possível
ataque dos países comunistas. Por outro lado, a URSS com o grupo de países do leste
europeu que passaram a conformar a “Cortina de Ferro”, cujo objetivo era de proteger
seus países de qualquer ataque dos países ocidentais.

Conforme a Nato Internacional (2021), os países fundadores da OTAN eram,


em ordem alfabética: Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, França, Islândia,
Itália, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Portugal e Reino Unido. Logo depois se
aderiram à OTAN: Alemanha Ocidental, Espanha, e mais outros países. E os países da
frente comunista que faziam parte da “Cortina de Ferro”, conforme a revista Isto é,
eram: a Albânia, Bulgária, Hungria, Iugoslávia, Polonia, República Democrática Alemã
(R.D.A), Romênia, Tchecoslováquia, URSS. Assim, o conflito de interesses geopolíticos
e ideológicos entre esses dois grandes blocos de países conformou a nova ordem
na Europa e no Mundo a partir de Segunda Guerra Mundial. Dois grandes blocos que
representavam visões totalmente diferentes da gestão socioeconômica da sociedade,
visões totalmente diferentes da sociedade que se confrontaram por várias décadas.
Por um lado, o mundo capitalista e por outro o comunismo, conforme conseguimos
observar no mapa político da Europa a seguir.

128
IMAGEM 7 – A CORTINA DE FERRO, FRONTEIRA E SÍMBOLO DA GUERRA FRIA

FONTE: <https://bit.ly/3wjiEd2>. Acesso em: 12 dez. 2021.

Os países em cor azul representam os membros da Otan na Europa, e os países


em cor rosa representam os países da “Cortina de Ferro”. No mapa fica fácil de visualizar
o grande peso do confronto geopolítico destes dois grandes blocos de países. Nesse
contexto, logo do final da Segunda Guerra Mundial o conflito de interesses geopolíticos
e o desejo de avanço da visão comunista da sociedade por parte da URSS levaram ao
mundo para um balanço de poder muito sutil entre as duas superpotências da época, os
EUA e a URSS e seus aliados respectivos, a conhecida como a “Guerra Fria”. As tensões e
possíveis conflitos finalizaram com o colapso da URSS no ano de 1991. Agora, a pergunta
que devermos nos fazer, o que isso influencia na Política Externa do Brasil?

Primeiramente os interesses regionais nas Américas por parte dos


EUA passaram para segundo plano, assim, a aproximação pragmática para o
desenvolvimento que tinha a Era Vargas não tinha mais o interesse prioritário dos
EUA. Nesse novo contexto, para manter um peso de alianças geopolíticas o Brasil
começou a se aproximar para sua vizinhança, a América Latina com especial ênfase
na América do Sul, conforme iremos estudar mais adiante. E segundo, o conflito de
interesses entre o mundo capitalista - representado pela liderança dos EUA – e entre
o mundo comunista – representado pelo URSS – se espalhou por todo o Planeta.
No contexto latino-americano praticamente todos os países da região sofreram
influências ideológicas e políticas de ambas as vertentes.

Onde ficou mais evidente isso foi tanto em Chile como em Cuba. No Chile,
alguns anos depois do pós Guerra, houve um golpe de estado que derrubou ao governo
socialista de Allende, passando esse país a ser liderado pela ditadura de direita de

129
“Augusto Pinochet” (1973 – 1990) cujo objetivo principal era de liberar aos chilenos
do comunismo. Por outro lado, em Cuba, país onde os EUA tinham muitos interesses
econômicos e geopolíticos, encarou uma forte revolução de cunho socioeconômico que
levou a seu líder Fidel Castro a comandar o governo cubano sob a proteção da URSS e
sua geopolítica comunista, ou seja, Cuba passou a ser parte dos países da Cortina de
Ferro bem na frente da maior potência econômica do mundo, os EUA. O comando do
governo cubano por parte da revolução começou no ano 1959 sob a liderança de Fidel
Castro (hoje já falecido), mas seu governo continua até os dias de hoje.

Esse foi o cenário geopolítico que o Brasil teve que afrontar logo da Segunda
Guerra Mundial, uma forte polarização entre dois maneiras de enxergar a realidade
socioeconômica. No contexto nacional, depois dos grandes impactos que causou a
Segunda Guerra Mundial, os regimes ditatoriais não tinham mais cabida, assim, aqui no
Brasil houve também a necessidade de mudar para um regime que seja mais democrático.
Em 1946, com a posse do Presidente Eurico Gaspar Dutra (1946-1951) finalizou a Era
Vargas, tanto pelo fim de sua gestão como pela mudança para uma nova constituição
que transformaria a que foi implementada no ano de 1937, a conhecida “Constituição
Polaca”, pela sua similitude com a constituição semifascista desse país dos anos de 1930.
A constituição de 1946 foi promulgada em setembro desse ano, e é considerada como a
primeira experiência mais democrática no país, segundo a FGV CPDOC (2021, n.p.):

A Constituinte de 1946, eleita em 2 de dezembro de 1945, iniciou seus


trabalhos em 2 de fevereiro seguinte sob o impacto da derrota do
nazi-fascismo na Europa e do fim do Estado Novo no Brasil. Não por
acaso, durante os primeiros meses de discussão, de fevereiro a maio,
promoveu-se um duro julgamento do regime anterior. Produziu-se,
em suma, o que se denominou a "autópsia da ditadura".
Outra marca distintiva da Constituinte de 1946 em comparação
com as anteriores foi sua heterogeneidade político-ideológica. Dela
participaram deputados e senadores eleitos na legenda de nove
partidos, ou seja, representativos de todo o espectro político e donos
de diferentes trajetórias políticas até aquele momento.

Nesse sentido, na construção da constituição de 1946 todos os espectros


políticos da política brasileira participaram na formulação da Constituição de 1946,
desde o Partido Comunista do Brasil (PCB) até o próprio Getúlio Vargas estiveram
presentes. Assim, sob esse novo cenário internacional, um novo presidente e uma nova
constituição mais democrática foi que começou o Brasil da Pós-Guerra.

O novo presidente Dutra desejava continuar a aliança com os EUA já estabelecida de


seu antecessor, porém, a partir de 1946 os EUA passaram considerar as questões de interesse
comuns de ambas as nações para segundo plano. Em 1946, apôs da Segunda Guerra Mundial,
o Brasil ainda pensava que seu principal aliado, os EUA, ia manter sua aliança tácita em
andamento. Mas o que veio acontecer foi um alinhamento do Brasil com os EUA, mas sem o
retorno desejado por parte dessa nação. Essa época foi conhecida na Política Externa do Brasil
como o “Alinhamento sem Recompensa” (1946-1951) que basicamente é um conceito:

130
[...] semelhante ao de alinhamento incondicional, o alinhamento
sem recompensa tem a vantagem de enfatizar a dimensão do
consentimento com o qual o governo de Eurico Dutra (1946-1951)
brindou o governo norte-americano e seus interesses na América
Latina. O cálculo estratégico do governo brasileiro baseava-se
na convicção de que as relações especiais, desenvolvidas entre
o Rio de Janeiro e Washington durante a guerra, teriam validade
para as relações internacionais do pós-guerra. O apoio às políticas
norte-americanas foi concedido sem contrapartidas, ou seja, sem
recompensas (LESSA; ALTEMANI, 2014, p.116).

Assim, com essa estratégia de manter a aliança com os EUA o Presidente


Dutra continuou pensando que a amizade com esse país iria ser benéfica para o Brasil,
mas na realidade o que aconteceu foi um “Alinhamento sem Recompensa”. Em termos
da política exterior para o continente americano, a atuação do Brasil seria de uma
“amizade e a colaboração com todas as nações do continente e o apoio à democracia
na consolidação da paz mundial.” (Lessa e Altemani, 2014, p. 101). Isso daria início a uma
abertura e aproximação à vizinhança, enquanto continuava a aliança com os EUA.

Na prática essa aliança de “Alinhamento sem Recompensa” significou que


nas atividades da ONU da pós-guerra mundial, “a delegação brasileira foi orientada a
seguir as posições de Washington, de se opor às iniciativas dos regimes comunistas
e de defender o equilíbrio de poder na América do Sul.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p.
102). Ou seja, o Brasil passou ser um aliado praticamente incondicional aos interesses
internacionais dos EUA da pós-guerra, que seu principal foco era combater as iniciativas
comunistas ao redor do mundo e liberar o mercado mundial.

Nesse sentido, na cidade de Rio de Janeiro aconteceu a Conferência


Interamericana de 1947 onde sob as diretrizes dos EUA o país aprovou a criação do
Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) cujo foco era a criação de uma
defesa intercontinental americana contra possíveis agressões externas, principalmente
se vierem de países comunistas. Nesse mesmo ano o Brasil rompeu relações com a
URSS e como represaria aos movimentos comunistas cassou ao Partido Comunista
Brasileiro, o PCB.

E no contexto comercial, nesse mesmo ano também foi criado o Acordo Geral
sobre Tarifas e Comércio (GATT) cujo objetivo era normatizar e regular o comércio
internacional, nesse acordo não estavam incluídos os países da Cortina de Ferro.
Devermos observar que em todos esses acordos multilaterais nos quais o Brasil
participou foi sob as diretrizes dos EUA, porém, em troca o país pouco tinha conseguido,
ou seja, estava em plena execução o “Alinhamento sem Recompensa”.

131
NOTA
Sabia que o GATT é o antecessor da OMC?

O GATT (General Agreement on Tarriffs and Trade), cujo significado em português seria
“Acordo Geral de Tarifas e Comércio”, representava uma série de acordos multilaterais entre
os países a nível mundial – que vinham acontecendo desde o ano de 1945 – com o objetivo
de reduzir as barreiras comerciais entre as nações, especialmente as tarifas de exportação.
Em janeiro de 1995, os acordos estabelecidos mediante o GATT foram incluídos na criação
em um organismo internacional específico para o comércio internacional,
a Organização Mundial de Comércio (OMC).

Se quiser saber mais sobre o GATT e a OMC, acesse ao site oficial da


OMC:

• El GATT y el Consejo del Comercio de Mercancías: https://bit.ly/3KZ1ndf

• Acerca de la OMC: https://www.wto.org/indexsp.htm

Assim como no Brasil, os EUA tinham estabelecido sua hegemonia no resto da


América Latina, se refletindo isso em várias frentes, uma delas era seguir as diretrizes
de Washigton nos acordos multilaterais. Porém, já para finais da década de 1950, apesar
dessa grande influência dos EUA tanto no Brasil como no resto da América Latina, os
países da região começaram articular posições dentro da ONU para definir acordos a
favor de seus países e assim compensar a excessiva hegemonia da maior economia
da região das Américas e do mundo, os EUA. Um desses acordos foi a criação da
Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), conforme expõem os autores
Lessa e Altemani (2014, p. 101):

Um movimento em favor dos países latino-americanos foi realizado


pelas Nações Unidas em outubro de 1948, quando foi criada a
Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), encarregada de
desenvolver pesquisas e estudos sobre o desenvolvimento latino-
americano, a despeito da oposição de Washington.

Assim aos poucos esse “Alinhamento sem Recompensa” vai cedendo para
mitigar essa hegemonia dos EUA por meio de acordos e aproximações com a América
Latina. Porém, ainda o Brasil estava longe de mitigar esse alinhamento com os EUA,
somente foi a partir do governo de JK em 1956 que o Brasil fiz uma estratégia efetiva
que aliviaria a hegemonia dos EUA na região Latino Americana, conforme veremos
mais adiante.

Agora, desde a perspectiva de os EUA também devermos visualizar que esse


país passou de uma posição de potência industrial e econômica que não parava de
crescer, mas que ficou em isolamento continental desde a Primeira Guerra Mundial até

132
os começos da Segunda Guerra Mundial. E de repente após 1945 esse país teve que
atuar como superpotência, tendo que agir em várias frentes geopolíticas (na Europa,
na Ásia, na América Latina, no Meio Oriente e na África), colocando uma forte ênfase
no avanço das intenções de expansão da URSS. Mas será que os EUA tiveram sucesso
nisso ou será que o próprio percurso da história deu fim a hegemonia da URSS? Foram
as próprias forças da economia de planejamento centralizada dentro da URSS que
iniciaram o debacle dessa superpotência, e como resultado disso o colapso de seus
espaços geopolíticos estabelecidos, como a “Cortina de Ferro”.

E no contexto da América Latina, enquanto os EUA manifestavam sua supremacia


e influência a nível mundial, os países da região, incluindo o Brasil, começaram a se juntar
e desenvolver um contrapeso nas relações intercontinental dos EUA. O exemplo disso
foi a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL) e a Organização dos
Estados Americanos (OEA), embora que sob esse último organismo multilateral os EUA
mantem uma forte influência. E foi precisamente por meio da OEA que o Presidente JK
começou a articular o conceito da “Operação Pan-americana” para finais da década de
1950, conforme iremos abordar mais adiante, mas antes disso vamos ver a atuação do
Brasil durante a “utopia do pragmatismo da Era Vargas”.

3.1 A UTOPIA DO PRAGMATISMO DA ERA VARGAS

Ao finalizar o período constitucional do governo do Presidente Eurico Gaspar


Dutra em 1951, Getúlio Vargas volta ser presidente até o ano de 1954 quando veio a
falecer. O Presidente Getúlio Vargas no seu segundo mandato quis colocar em prática
o planejamento da Política Externa Pragmática de seu governo da década de 1930 e da
Segunda Guerra Mundial, porém, a década de 1950 foi muito diferente. Nesse sentido,
seu intento de voltar ao Pragmatismo em questões das relações internacionais se
converteu no “Pragmatismo Impossível”, termo colocado pelos historiadores à Política
Externa de seu segundo mandato.

A política externa do segundo período Vargas (1951-1954), no qual o


presidente brasileiro procura reproduzir a política de barganha da
época da Segunda Guerra Mundial, considerada um exemplo do
pragmatismo brasileiro. No entanto, a conjuntura internacional da
primeira metade da década de 1950 não favorecia essa política, sendo
a barganha praticamente impossível (LESSA; ALTEMANI, 2014, p.116).

Nesse sentido, a Política Externa do segundo mandato do Presidente Getúlio


Vargas não deu os resultados almejados, pois além de ter uma nova conjuntura na
ordem mundial, também houve a herança das dificuldades que teve o Presidente Dutra
no contexto internacional. Entre essas dificuldades internacionais foi a crise da Guerra
de Coreia que começou no ano de 1950, onde as forças de interesse de expansão
comunista se encontraram com tropas Norte-Americanas em defesa dos coreanos

133
contra a revolução comunista. Diante as ameaças de um conflito desse estilo na América
Latina, os países da região desejavam que os EUA fizessem um planejamento tanto de
defesa militar como de desenvolvimento econômico na região e assim mitigar possíveis
ameaças tanto na frente militar como na frente econômica.

Perante esse objetivo dos países da América Latina, os EUA focaram mais seu
interesse na defesa militar, deixando para segundo plano a questão do desenvolvimento
econômico, o qual desde o ponto de vista histórico provavelmente foi um erro. Uma
das melhores maneiras de mitigar tentativas de revoluções de extrema esquerda é
precisamente planejar o desenvolvimento econômico e assim melhorar as condições
de vida e oportunidades para os cidadãos de um país. Nessa linha de pensamento o
Presidente Vargas se manteve, mas sem resposta por parte dos EUA, pensando que
a instabilidade internacional de começos da Guerra Fria poderia ser um meio para
implementar sua bem-sucedida política externa pragmática dos anos de 1930, com
foco no desenvolvimento.

“A conjuntura da guerra fria, no entanto, não favorecia o intento de Vargas, e seu


projeto de reativação de um alinhamento negociado com os Estados Unidos fracassou.”
(LESSA e ALTEMANI, 2014, p.106). Mas porque fracassou? Simplesmente pelo fato que a
Geopolítica Mundial tinha mudado drasticamente, e sob o novo cenário de instabilidade
mundial para os EUA a América Latina – incluindo o Brasil – era considerado uma região
de relativa estabilidade, logo, não existia esse poder de barganha que o Presidente teve
ao início da Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial com os EUA.

No novo cenário do pós-guerra, a América Latina foi marginalizada


no quadro das prioridades norte-americanas; ocupados com a
reconstrução europeia e com a contenção do comunismo em áreas
críticas como a Grécia e a Turquia, em um primeiro momento, e a China
e a Coreia, pouco tempo depois, os Estados Unidos consideravam
a vizinhança ao sul como uma área de influência segura e estável.
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 105).

Ou seja, nos anos de 1950 ao igual que o resto da América Latina, o Brasil aos
poucos foi entendendo que as condições da nova geopolítica já não era as mesmas,
algumas nações da vizinhança entenderam e visualizaram isso antes outras depois. Mas
no Brasil, o Presidente Getúlio Vargas manteve sua política externa ainda pensando que
poderia negociar posições com os EUA que sejam beneficiosas para seu planejamento
de desenvolvimento. Embora não teve o sucesso almejado para isso na Política Externa,
no contexto nacional ele manteve seu planejamento, nesse sentido, houve uma série
de empreendimentos de grande escala que inclusive ainda hoje fazem parte relevante
da economia nacional, tanto no contexto industrial como no contexto de melhorar a
estrutura financeira do país.

Entre esses empreendimentos figuravam o Banco Nacional de


Desenvolvimento Econômico (BNDE, hoje BNDES) e a Petrobras, e
ainda vários outros, de caráter setorial ou regional, como o Plano

134
Nacional do Carvão, a Superintendência do Plano de Valorização
Econômica da Amazônia, o Banco do Nordeste, que visavam o
mesmo objetivo de promover o desenvolvimento econômico a partir
do dirigismo estatal (FGV CPDOC, 2021, on-line).

Talvez se o Presidente Vargas tivesse conseguido um maior apoio dos EUA, seu
projeto nacional desenvolvimentista pudesse ter sido mais abrangente, logo, poderia ter
melhorado tanto a competitividade nacional e o bem-estar da população. Logo de seu
falecimento durante seu mandato, ano de 1954, seu vice-presidente, Café Filho, tomou
posse como presidente. No seu curto mandato de pouco mais de um ano ele continuo
com a Política Externa de Vargas, mas ele foi mais cauto ante os EUA e ficou mais atento
com as relações e interesses comuns com a vizinhança. Ao final de seu mandato essa
aproximação de interesses comuns com a vizinhança continental veio a se intensificar
com o Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira (1956-1961), JK.

3.2 APROXIMAÇÃO DOS INTERESSES DOS PAÍSES DA


AMÉRICA LATINA

Durante o governo do Presidente Juscelino Kubitschek (JK) a Política Exterior


foi marcada pela elaboração de dois frentes, a primeira foi uma fase de aproximação
aos EUA e demais países desenvolvidos, com o objetivo de receber recursos financeiros
paras as necessidades de desenvolvimento nacional. A segunda fase envolve uma
política de aproximação e alinhamento com os interesses econômicos do resto de países
da América Latina, o objetivo principal dessa aproximação era criar o ambiente para uma
integração favorável ao desenvolvimento da região. Essa aproximação foi conhecida
como a Operação Pan-Americana (OPA).

Pan-americanismo. Concepção política e diplomática que consi-


dera a possibilidade de aproximação e compatibilização dos interes-
ses dos países americanos, no sentido da integração regional. Dife-
rentemente do bolivarismo, o Pan-americanismo tem suas origens
na Doutrina Monroe, da década de 1820, e propõe a integração das
Américas sob liderança norte-americana. A Operação Pan-America-
na, proposta por JK, mesclava a liderança de Washington com um
viés latinoamericanista, ou seja, um interamericanismo autonomista
e favorável ao desenvolvimento econômico da América Latina. (LES-
SA; ALTEMANI, 2014, p.116, grifo do autor).

Como era de se esperar o OPA não foi do agrado dos EUA, pois tirava a sua
hegemonia da região, mas ajudou a criar uma integração natural com a vizinhança. E
no contexto da Guerra Fria ajudou ao Brasil a se posicionar numa posição mais neutra.
Mas antes de iniciar uma análise do OPA, vamos estudar sobre a primeira fase da Política
Externa de JK, a aproximação aos EUA e demais países desenvolvidos. Essa primeira

135
fase começou bem no começo de seu mandato, 1956, a qual se baseava na procura de
recursos financeiros cujo objetivo era financiar seu ambicioso plano de desenvolvimento
nacional, conhecido como o “Plano Metas”.

Procurando garantir o fluxo de recursos financeiros para o


desenvolvimento entre 1956 e 1958 o presidente JK se alinhou aos
interesses dos EUA e da OTAN (países de Europa Ocidental). Esse
alinhamento significava que o país acompanharia o posicionamento
norte-americano (e europeu ocidental) nos organismos multilaterais,
encamparia a bandeira norte-americana de combate ao comunismo
e adotaria na América do Sul uma atitude de cordialidade vinculada à
questão da segurança do Atlântico Sul (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 113).

Assim, estrategicamente na busca de recursos financeiros para seu projeto de


desenvolvimento de grande envergadura, o Plano Metas, o Presidente JK durante seus
dois primeiros anos de mandando se posicionou a favor dos interesses da OTAN. Com
isso o Brasil consignou viabilizar o financiamento de boa parte de seu Plano Metas, o
qual consistia em:

50 anos de progresso em 5 anos de realizações, com pleno respeito


às instituições democráticas. Esse ideal desenvolvimentista foi
consolidado num conjunto de 30 objetivos a serem alcançados
em diversos setores da economia, que se tornou conhecido como
Programa ou Plano de Metas. Na última hora o plano incluiu mais
uma meta, a 31a, chamada de meta-síntese: a construção de
Brasília e a transferência da capital federal, o grande desafio de
JK. Não se pode dizer que essa fosse a primeira experiência de
Juscelino de governar com base num plano de desenvolvimento
(FGV CPDOC, 2021, on-line).

O Plano Metas foi uma estratégia de desenvolvimento muito ambiciosa que de


fato mudou ao Brasil e as expectativas que os brasileiros dessa época teriam sobre
seu futuro. Porém, também trouxe muitas críticas no momento de sua execução,
pois era um plano de longo prazo, alta dependência de capitais estrangeiros e os
resultados esperados não seriam palpáveis no curto prazo. Enquanto o Plano Metas
tomava seu curso, tanto no Brasil como no resto da América Latina vinha crescendo
o descontentamento ante a política dos EUA. “Até então, o governo norte-americano
tratava os países da região como um rebanho submisso, sem aspirações próprias nem
autonomia.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 113).

O exemplo mais claro desse descontamento com os EUA foi a Revolução


Cubana que em 1959 levou a seu líder Fidel Castro ao poder. A revolução cubana foi uma
das maiores perdas dos EUA na região, pois Cuba desde sua independência da Espanha
em 1898 tinha sido aliada dos EUA tanto em questões econômicas como de interesse
geopolítico em função de sua proximidade ao território norte-americano. A partir de
1959 Cuba seria um ponto quente no delicado balanço da dinâmica da Guerra Fria.

136
NOTA
Conheça como a Revolução Cubana foi de grande impacto durante a
Guerra Fria, e quais foram os fatores para que Cuba esteja numa “Eterna
Guerra Fria” no livro CUBA E A ETERNA GUERRA FRIA: Mudanças
Internas e Política Externa nos anos 90.

Fonte: https://bit.ly/3tyRTzH.

Diante da polarização da geopolítica mundial do momento entre uma visão


capitalista por parte dos EUA e uma visão comunista por parte da URSS, o governo dos
EUA atribuía os protestos que vinham acontecendo em diversos países da América Latina
nos últimos anos de 1950, para um projeto comunista sem levar a consideração a fundo
a raiz do problema, a falta de oportunidades e a pobreza. Contudo, no Congresso norte-
americano houve “uma postura que favorecia mudanças na política para o continente.
Do ponto de vista latino-americano, abria-se um momento propício à renovação das
reivindicações de mudança” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 114).

Com o contrapeso do Congresso dos EUA houve um momento propício que


começou com uma integração de objetivos a favor da OPA dentro das atividades da OEA.
O mais claro exemplo disso foi a criação do Banco Interamericano de Desenvolvimento
(BID) que nasceu da OEA. Contudo, os EUA continuavam em manter uma visão diferente
ao projeto de desenvolvimento proposto na OPA, para os EUA a prioridade era combater
o comunismo de uma maneira reativa e assistencialista, e como segundo plano
estava o desenvolvimento como uma maneira efetiva no longo prazo para mitigar o
descontentamento social, muito propício para criar possíveis protestos sociais.

ATENÇÃO
Sabia que hoje o BID tem mais de 619 projetos na América Latina e
o Caribe?

Depois de sua criação há mais de 60 anos, atualmente o BID tem um


papel relevante no que tange ao desenvolvimento das nações da
América Latina. Por meio de projetos ao longo dos países da região
o BID é uma fonte de alavancagem em diversas áreas, tais como:
educação, infraestrutura sustentável, saúde, entre outras aéreas.
Aqui no Brasil atualmente o BID tem 84 projetos em andamento,
confira no site oficial do BID: ESTADÍSTICAS DE PROYECTOS https://
www.iadb.org/es/proyectos

137
Embora o grande projeto da OPA que o presidente JK quis executar na
América Latina não teve o sucesso almejado, mas teve sim grandes repercussões no
contexto que ajudou a criar instituições que ainda hoje estão aí para iniciar projetos
de desenvolvimento, o BID ainda hoje continua operando e ajudando ao longo da
América Latina. E no contexto da Política Externa brasileira, o OPA foi peça importante
no processo de aproximação do Brasil com sua vizinhança.

A OPA, embora tenha tido poucos resultados efetivos, contribuiu para


aproximar o Brasil de seus vizinhos hispano-americanos na primeira
tentativa de estabelecer uma coordenação regional em favor do
desenvolvimento, evidenciou o desinteresse e a falta de compromisso
de Washington quanto ao fomento do desenvolvimento econômico
da região e provocou um debate político interno sobre a busca de
alternativas em matéria de política exterior (IADB, 2020?, on-line).

A OPA conseguiu que o Brasil se aproximasse de seus vizinhos e deu uma visão
mais ampla da capacidade de ação internacional do Brasil. Despois desse divisor de
águas, a OPA, o Brasil se afastou de uma posição quase sempre favorável aos interesses
internacionais dos EUA, e teria uma atuação mais neutra diante o aquecimento da
Guerra Fria que estava por vir durante as décadas de 1960 e 1970. Como resultado
o Brasil se abriu para uma posição mais fundamentada nas questões de geopolítica
das Américas e do resto do mundo, valorizando o entendimento entre países por meio
do multilateralismo como meio de ação para as diversas questões a serem resolvidas
da política internacional. Ao final do mandato de JK o Brasil passaria por um período
conturbado que finalizaria no período da ditadura militar (1964-1985), questões
interessantes que teriam repercussões na Política Externa, conforme vamos estudar ao
começo da Unidade 3.

Mas ante disso vamos estudar o interessante assunto da Leitura Complementar


no final desta Unidade: Crise dos Mísseis: O ano em que a Venezuela Mobilizou
destróieres contra a Cuba. Neste artigo da BBC Brasil, vamos ter a oportunidade de
ver como a crise dos Mísseis Soviéticos em Cuba, no ápice da Guerra Fria, levaram ao
Mundo a beira de um conflito nuclear que teria sido o início da Terceira Guerra Mundial.
Também será interessante de analisar como a Venezuela e a OEA tiveram um papel
importante para evitar o conflito nuclear. Boa leitura.

138
LEITURA
COMPLEMENTAR
CRISE DOS MÍSSEIS: O ANO EM QUE A VENEZUELA MOBILIZOU DESTRÓIERES
CONTRA PAÍSES COMUNISTAS

Margarita Rodríguez
BBC News Mundo
11 março 2019

Houve uma época em que o mundo esteva à beira de um holocausto nuclear,


de uma Terceira Guerra Mundial

Naquela época, a Venezuela tinha clareza sobre o lado a que se aliaria. E, muito
especialmente, sobre quem enxergava como ameaça.

Ao contrário dos anos recentes, nos quais a nação sul-americana fortaleceu


seus laços com a Rússia e estabeleceu um sólido relacionamento com Cuba, nos anos
1960 sua política internacional estava alinhada a outros interesses.

Era o ano de 1962, sob a Guerra Fria, e a Venezuela assumiu uma posição firme
na chamada Crise dos Mísseis - que, para muitos, esteve perto de desencadear uma
guerra nuclear entre os Estados Unidos e a União Soviética.

O então presidente venezuelano, Rómulo Betancourt, não foi protagonista


direto neste capítulo da história, como o então presidente dos Estados Unidos, John
F. Kennedy, e o primeiro-ministro soviético, Nikita Khrushchev. Mas seu envolvimento
na crise é considerado importante por alguns historiadores, apesar de pouco lembrado.

A Crise dos Mísseis

Tudo começou em 14 de outubro de 1962, quando um avião espião americano,


depois de sobrevoar Cuba, confirmou o que Washington já suspeitava: a presença de
mísseis nucleares soviéticos na ilha.

Em meio a constantes negativas da União Soviética, os Estados Unidos tinham,


agora, fotos mostrando os componentes de mísseis balísticos de médio alcance em um
campo em San Cristóbal.

139
Análises posteriores dos serviços de inteligência confirmariam que os mísseis
poderiam estar operacionais em 18 horas.

Kennedy e seu Conselho de Segurança discutiram algumas opções: bloqueio a


Cuba, ataque aéreo contra as bases de mísseis ou até uma invasão.

Khrushchev disse que a atividade de seu país na ilha era de natureza defensiva
e questionou as bases americanas na Turquia e na Itália.

Em 17 de outubro, o embaixador dos Estados Unidos nas Nações Unidas, Adlai


Stevenson, pediu uma solução negociada para a crise.

Um dia depois, o chanceler soviético, Andrei Gromyko, reuniu-se com


Kennedy para detalhar a assistência a Cuba e acusou Washington de provocar uma
pequena nação.

O Ocidente

O presidente americano decidiu que a melhor estratégia era impor um bloqueio


à ilha para evitar a chegada de navios soviéticos com armas ou material adicional para
completar a instalação de baterias nucleares.

Embora tudo estivesse pronto para o bloqueio, Kennedy ordenou a preparação


de um ataque militar para 22 de outubro.

Navios que se aproximassem da linha de bloqueio ou quarentena seriam


recebidos com tiros de advertência ou mesmo disparos contra a embarcação.

140
Naquele dia, em uma mensagem televisionada, Kennedy anunciou sua estratégia
e emitiu um aviso:

"Ele disse que tinha avisado Khrushchev que, se um único míssil nuclear fosse
lançado a partir de Cuba para qualquer país no Hemisfério Ocidental, não apenas contra
os Estados Unidos, seu governo iria responder com força total contra a União Soviética",
disse à BBC James G. Hershberg, professor de História e Relações Internacionais na
George Washington University.

"Essa linguagem foi escolhida intencionalmente para unificar um hemisfério


contra Cuba e, mais importante, contra a União Soviética, para pressionar Khrushchev
a retirar os mísseis."

'A vulnerabilidade da Venezuela'

Nesse contexto, o historiador venezuelano Edgardo Mondolfi Gudat afirma à


BBC que é importante lembrar que a Venezuela já era um dos produtores de petróleo
mais importantes do Hemisfério Ocidental, principalmente para os Estados Unidos.

A Venezuela ainda não havia nacionalizado sua indústria petrolífera, e grande


parte de suas atividades estava nas mãos de transnacionais - a maioria delas,
americanas.

"Em meio a esta situação de bipolaridade tão extrema entre os Estados Unidos
e a União Soviética, um dos cálculos feitos foi que a Venezuela poderia ser vulnerável
por causa de sua posição estratégica como um país produtor de petróleo e, portanto, foi
extremamente importante para Washington que esta vulnerabilidade não fosse afetada
no caso de uma guerra", diz Mondolfi, autor de A Insurreição Procurada, Guerrilha e
Violência na Venezuela dos anos 1960.

Uma das hipóteses formuladas durante a crise é a de que os mísseis poderiam


colocar em perigo não apenas algumas cidades dos Estados Unidos, mas também os
centros de produção de petróleo na Venezuela.

"Analisando documentos do Departamento de Estado, pude ver que os Estados


Unidos recomendavam às empresas que operavam a indústria petrolífera venezuelana
que protegessem preventivamente suas instalações no caso de um ataque", disse o
especialista de Caracas.

O papel da OEA

Hershberg, da George Washington University, considera que a Crise dos Mísseis


não foi apenas uma demonstração da relação tensa entre os Estados Unidos e a União
Soviética, mas uma continuação do confronto entre Washington e Havana.

141
Foi a partir dessa perspectiva que a Organização dos Estados Americanos (OEA)
desempenhou um papel de peso.

"A OEA foi muito importante na primeira fase da crise porque permitiu que os
Estados Unidos obtivessem a aprovação (necessária) para implementar o bloqueio
contra Cuba", afirmou Hershberg.

"Kennedy sabia que haveria algumas questões referentes à legalidade de um


bloqueio porque, oficialmente, era um ato de guerra."

Por essa razão, em vez de usar o termo bloqueio, a Casa Branca preferiu propor
uma "quarentena marítima".

Segundo Hershberg, no mesmo dia em que Kennedy proferiu seu discurso


televisionado, "houve uma grande operação diplomática em que cada embaixada
americana enviou uma cópia da fala em espanhol e português (do Brasil) e cada
embaixador se reuniu com a liderança do país para obter apoio para ações de Kennedy".

Foi assim que a OEA votou a favor da "quarentena" e países como Argentina e
Venezuela assumiram papéis ativos no envio de navios para cooperar com os Estados
Unidos no patrulhamento do Caribe.

Os destroieres venezuelanos

O governo de Rómulo Betancourt decidiu mobilizar dois destroieres, o ARV


Nueva Esparta D-11 e D-21 ARV Zulia, além de "seu único submarino disponível naquele
momento", lembra o historiador venezuelano Edgardo Mondolfi Gudat.

A medida, em plena crise, é vista como algo meramente simbólico por


historiadores como Hershberg. Mas o aumento da segurança no país foi além.

"A Venezuela foi crucial durante todo o confronto entre os EUA e Cuba porque
Fidel Castro e os soviéticos realmente queriam a derrubada do governo de Caracas
pelos comunistas, especialmente para obter acesso ao petróleo venezuelano."

Desencanto com o comunismo

Rómulo Betancourt foi o primeiro presidente da Venezuela depois da queda do


regime militar de Marcos Pérez Jiménez, em 1958.

O político, oriundo da esquerda, conheceu Fidel Castro em 1948 e concordou


com a necessidade de mudança na América Latina.

142
"Uma das primeiras coisas que Castro fez após o triunfo da Revolução
Cubana foi visitar a Venezuela, porque pensava que Betancourt, que acabara de ser
eleito presidente, poderia lhe apoiar", afirmou à BBC Mundo a jornalista venezuelana
especializada em relações internacionais María Teresa Romero.

Mas Castro se deparou com um líder venezuelano que, ao longo dos anos,
tornou-se crítico do comunismo, um líder que já nos anos 1930 dissera que "não
concordava com a interferência da União Soviética em países europeus".

"Betancourt disse a ele de uma forma amigável que ele não poderia ajudá-lo,
mas Castro não queria entender isso", disse Romero.

Um conselho

O presidente venezuelano explicou ao comandante revolucionário cubano


que a dinâmica da indústria do petróleo em seu país o impedia de ajudá-lo, além dos
problemas econômicos que a Venezuela enfrentava.

"Nessa visita, Betancourt recomendou a Castro que não caísse nas mãos da
União Soviética e realizasse eleições abertas", diz a especialista.

A partir de 1959, as relações entre Betancourt e Castro começaram a ficar tensas.

"Betancourt acreditava em uma revolução democrática com eleições (...),


apelava a um socialismo democrático próprio (...) e considerava necessário resistir tanto
ao imperialismo dos EUA quanto ao soviético", disse Romero.

Além disso, defendia romper relações comerciais e diplomáticas com os governos


que chegaram ao poder por meio de golpes de Estado, de esquerda ou de direita.

Em 1961, a Venezuela rompeu relações com Cuba e tornou-se um dos


promotores da exclusão da ilha da OEA, que se materializou em janeiro de 1962.

Venezuela pró-EUA

Kennedy visitou a Venezuela em 1961 e Betancourt viajou a Washington em 1963.

Essa relação com a Casa Branca e sua forma de governar alimentavam críticos
de Betancourt dentro e fora do país: ele enfrentou levantes militares, tentativa de
assassinato e guerrilhas rural e urbana inspiradas na Revolução Cubana.

Em março de 1961, Kennedy propôs a "Aliança para o Progresso", enorme programa


destinado a promover reformas políticas e econômicas para, segundo Hersjberg, "encorajar
os governos mais democráticos e representativos mais sensíveis a pobreza e injustiça
social na América Latina mas sem serem comunistas, a serem mais pró-Estados Unidos".

143
O líder da Casa Branca estava à procura de aliados na América Latina "para além
das ditaduras de direita", afirma Hershberg.

Os Estados Unidos apoiaram os esforços da Venezuela para se opor a Cuba


e via o país como exemplo de como uma nação da região poderia se distanciar de
regimes autoritários.

"Mas no final dos anos 1960 e, especialmente, após o assassinato de Kennedy


em novembro de 1963, os Estados Unidos gradualmente se distanciaram da Aliança para
o Progresso e focaram mais em apoiar o anticomunismo mesmo que isso significasse
apoiar ditaduras que chegaram ao poder por meio de golpes de Estado."

O fim da crise

Em 26 de outubro, Kennedy considerou que a "quarentena naval" não estava


atingindo seu objetivo e analisou a possibilidade de uma invasão a Cuba.

Um dia depois, um avião de reconhecimento americano foi abatido sobre Cuba


e seu piloto morreu. Não houve represálias de Washington. Muitos temiam um confronto
armado, mas a intensa diplomacia entre os dois países triunfou.

Khrushchev propôs retirar os mísseis se os Estados Unidos prometessem não


invadir a ilha. A Casa Branca fez isso e, em troca, solicitou o desmantelamento imediato
das instalações em Cuba.

O líder soviético ordenou o retorno da frota que seguia em direção a Cuba e,


em 28 de outubro, anunciou em uma mensagem de rádio que as instalações seriam
desmontadas no país caribenho. O presidente dos EUA interrompeu os voos de
reconhecimento na ilha e permitiu a circulação de navios soviéticos. Meses depois,
Washington retiraria seus mísseis da Turquia.

A virada

Após o fim da Crise dos Mísseis, um capítulo ilustra a dramática virada da política
externa venezuelana. A relação entre Fidel Castro e Betancourt, considerado por muitos
um dos pais da democracia na Venezuela, não melhorou ao longo dos anos.

Já fora da Presidência, Betancourt disse, em 1978, ao canal de televisão


Venevisión: "O regime cubano de Fidel Castro é uma ameaça para a América Latina".

Castro descreveu o líder venezuelano como "desertor, traidor e venenoso (...)


invejoso da Revolução Cubana, aliado ao imperialismo, que cooperou com agressões
contra o nosso país".

144
Em 2011, o líder cubano escreveu sobre a Venezuela:

"Depois de Miami, aquela propriedade de petróleo dos Estados Unidos era o


centro principal da contrarrevolução contra Cuba, uma parte importante da aventura
imperialista, do bloqueio econômico e dos crimes contra nossa gente. Dessa forma a era
das trevas começou, terminando no dia em que Hugo Chávez foi empossado."

O líder bolivariano inaugurou uma estreita amizade com Castro e uma aliança
com a Rússia, estratégia que foi mantida por seu sucessor Nicolás Maduro, hoje
presidente da Venezuela e adversário dos Estados Unidos.

O presidente Maduro visitou seu colega russo, Vladimir Putin, em 5 de dezembro,


com quem acertou um pacote de investimentos russos nos setores de petróleo e
mineração no valor de US$ 6 bilhões.

Mas a cooperação vai além do petróleo e dos investimentos. Há também a


colaboração técnico-militar; em 10 de dezembro, dois aviões Tupolev 160 (TU-160), um
pesado bombardeiro supersônico de desenho soviético, chegaram à Venezuela.

À época, o ministro da Defesa venezuelano, Vladimir Padrino, disse: "Estamos


nos preparando para defender a Venezuela até o fim, quando necessário".

Os aviões partiram alguns dias depois, mas as ligações entre os dois países
devem durar muito mais tempo.

Fonte: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-47409922

145
146
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Que a revolução de 1930 é um divisor de águas entre a Primeira República (1889-


1930) e o começo da Segunda República, ou a Era Vargas (1930-1946), caracterizada
pela orientação ao comércio internacional e desenvolvimento industrial.

• O interesse desenvolvimentista da Era Vargas levou ao Brasil praticar uma política


exterior voltada para uma aproximação com as novas grandes potências industriais
da época, isto é, os EUA e a Alemanha.

• No contexto da Segunda Guerra Mundial, o Brasil, ao igual que o resto das Américas,
manteve uma posição neutral ante a Segunda Guerra Mundial.

• Como apoio aos EUA o Brasil rompeu sua neutralidade ante a Segunda Guerra
Mundial, depois da invasão de Pearl Harbour nos EUA, em junho de 1942.

• A partir da Segunda Guerra Mundial tanto os EUA como a URSS passaram a ser
consideradas superpotências, os EUA sob a bandeira do capitalismo e a URSS sob a
bandeira do comunismo.

• Que as visões socioeconômicas contrapostas e interesses geopolíticos tanto dos


EUA como da URSS levaram ao mundo para uma “Guerra Fria”.

• Conforme ia se esquentando a Guerra Fria, os interesses regionais nas Américas por


parte dos EUA passaram para segundo plano, o que levou ao Brasil se aproximar de
sua vizinhança.

• Durante a presidência de Juscelino Kubitschek houve uma Política Exterior marcada


por uma aproximação de integração de cunho desenvolvimentista com a América
Latina, por meio da a Operação Pan-Americana (OPA).

• O OPA não teve o grande sucesso esperado pelo Presidente JK, mas ajudou ao Brasil
para ter uma posição mais fundamentada nas questões de geopolítica das Américas
e do resto do mundo. Assim, como ajudou ao Brasil para se colocar em uma posição
mais neutra ante o aquecimento da Guerra Fria.

147
AUTOATIVIDADE
1 A revolução de 1930 é considerada como o fim da Primeira República e o começo
da Segunda, ou Era Vargas. Existem diversas diferenças entre essas duas primeiras
fases do Brasil Republicano, no que tange à Política Externa da Segunda República,
ela é caracterizada:

a) ( ) pelo enfoque de afirmar alianças que sejam beneficiosas aos interesses geopolíticos
do Brasil e da América do Sul.
b) ( ) pela liderança do Brasil nas questões geopolíticas e econômicas da América Latina.
c) ( ) pela orientação ao desenvolvimento industrial e incentivo ao comércio internacional.
d) ( ) pelo interesse de desenvolver tanto o Brasil como sua vizinhança, pois isso iria
garantir a hegemonia brasileira dentro da comunidade latino-americana.

2 Prévio ao começo da Segunda Guerra Mundial o Brasil tinha estruturada uma


estratégia de aproximação para as duas nações com maior nível de capacidade de
inovação e desenvolvimento do momento, isto é, os EUA e a Alemanha. A ideia atrás
disso era ter parceiros que possam ajudar ao Brasil no seu plano desenvolvimentista.
Porém, a partir da Segunda Guerra Mundial essa estratégia de aproximação tanto dos
EUA como para a Alemanha mudou, diante disso o Brasil na Segunda Guerra Mundial
se colocou numa posição de:

I- neutralidade durante o começo do conflito, mas com uma preferência às relações


com a Alemanha Nazi em função dos interesses desenvolvimentistas do Presidente
Vargas e pela própria orientação semifascista da constituição de 1937.
II- neutralidade no começo do conflito, posição que estava alineada com os EUA e o
resto da América Latina.
III- neutralidade no começo do conflito, porém, depois da invasão de Pearl Harbor em
dezembro de 1942 em apoio aos EUA o Brasil rompeu relações com os países do
Eixo (Alemanha, Japão e Itália), finalizando assim sua neutralidade.
IV- neutralidade até 1944, quando navios da Alemanha Nazi torpedearam navios
comerciais do Brasil, iniciando assim a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial
a favor dos aliados.
V- neutralidade no começo do conflito, pois além de ser uma posição que ia com o
resto da América Latina e os EUA, era uma posição ponderada que conseguia ainda
manter a dinâmica da “Equidistância Pragmática”.

Destas sentenças, determine quais estão corretas:

a) ( ) As sentenças I, III e IV estão corretas.


b) ( ) As sentenças I e IV estão corretas.
c) ( ) As sentenças I, II e IV estão corretas.
d) ( ) As sentenças II, III e V estão corretas.

148
3 Após a Segunda Guerra Mundial o cenário mundial tinha mudado drasticamente, o
Império Britânico parou de se considerar uma superpotência passando a pertencer
ao grupo de potências importantes, mas não mais com sua hegemonia mundial que
o manteve por vários séculos. Na nova estrutura mundial, a geopolítica tinha mudado
para a hegemonia de duas novas superpotências, os EUA e a URSS. Assim, esse fato
alterou os interesses regionais, dentro da América Latina, por parte dos EUA. Sobre
isso é correto afirmar que:

( ) Diante a polarização tanto de força geopolítica como ideológica entre os EUA e


a URSS, os interesses dos EUA na América Latina tinham mudado para segundo
plano. Dado que tinha começado a “Guerra Fria” que implicou um longo confronto
tanto geopolítico como ideológico entre a OTAN e a Cortina de Ferro, assim a
prioridade dos EUA estava nas questões da Guerra Fria.
( ) O Brasil antes mesmo de finalizar a década de 1940 já tinha percebido que os
EUA tinham mudado seu interesse para segundo plano na América Latina e no
Brasil, assim, logo após da Segunda Guerra Mundial, o Brasil liderou a Operação
Pan-Americana (OPA) para criar uma aproximação de integração de cunho
desenvolvimentista com a América Latina.
( ) O Brasil logo após da Segunda Guerra Mundial continuava acreditando que sua
aliança pragmática com os EUA iria ser ainda beneficiosa para os interesses do Brasil,
conforme tinha sido durante a Era Vargas. Mas os EUA não tinham mais um enfoque
de relevância no Brasil, o que foi conhecido o alinhamento sem recompensa.

Destas sentenças determine quais são verdadeiras:

a) ( )F-V-F
b) ( )V-F-V
c) ( )V-V-F
d) ( )V-F-F

4 Durante a década de 1930, o Brasil praticou uma política exterior desenvolvimentista


tanto com os EUA como com a Alemanha, nesse sentido, o Presidente Vargas poderia
melhorar e desenvolver o setor industrial no Brasil. Essa política exterior para com
essas duas nações foi conhecida como a dinâmica da Equidistância Pragmática.
Disserte sobre esse conceito de Equidistância Pragmática.

5 Logo de ter passado mais de uma década após da Segunda Guerra Mundial, o Brasil
estava mais ciente de que os interesses dos EUA na região da América Latina tinham
passado para segundo plano. Assim, durante o mandato do Presidente JK foi feita
uma estratégia para que o Brasil possa se aproximar do resto dos países Latino-
Americanos para criar um ambiente de integração da América Latina favorável ao
desenvolvimento da região, o que foi conhecido como a Operação Pan-Americana
(OPA) liderado pelo Brasil. Embora a operação OPA não tinha sido o sucesso esperado,
teve alguns determinantes no contexto da Política Externa do Brasil. A seguir explique
quais foram esses determinantes.

149
150
REFERÊNCIAS
ATLAS FGV. Convênio de Taubaté. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3inSMVi. Acesso
em: 16 dez. 2021.

BANCO MUNDIAL. Datos de libre acceso del Banco Mundial. 2021. Disponível em:
https://datos.bancomundial.org/. Acesso em: 29 nov. 2021.

BBC NEWS. La historia de Eric Hobsbawm es la historia del siglo XX. 2012.
Disponível em: https://bbc.in/36er8az. Acesso em: 19 dez. 2021.

BORIS, F. História do Brasil. 12. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo,
2006.

BORIS, F. História do Brasil. São Paulo: Editora de Universidade de São Paulo, 2013.

CPDOC FGV. Partido Republicano Paulista (PRP). Disponível em: https://bit.


ly/3qmJ8q6. Acesso em: 7 dez. 2021.

DORATIOTO, F. O Brasil no Rio da Prata (1822-1994). 2. ed. Brasília: FUNAG, 2014.

DW BRASIL. 1946: Fim da Liga das Nações. 2021. Disponível em: https://bit.ly/3IpyJ3o.
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FGV CPDOC. 50 anos em 5: o Plano de Metas. Disponível em: https://bit.ly/3IqcCd3.


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FGV CPDOC. Liga das Nações. Disponível em: https://bit.ly/3qmJ8q6. Acesso em: 23
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FGV CPDOC. Vargas e as bases do desenvolvimento. Disponível em: https://


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FÓRUM FGV. Competitividade das nações: análise da métrica utilizada pelo World
Economic Forum. 2012. Disponível em: https://bit.ly/3NgNetY. Acesso em: 7 dez. 2021.

LESSA, A.; ALTEMANI, H. (coord.). História das relações internacionais do Brasil.


São Paulo: Saraiva, 2014.

MENDONÇA, V. A experiência Estratégica Brasileira na Primeira Guerra Mundial,


1914-1918. 2008. Disponível em: https://bit.ly/36gZmdz. Acesso em: 21 dez. 2021.

151
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1914-1918. 2008. Disponível em: https://bit.ly/36gZmdz. Acesso em: 21 dez. 2021.

MENEZES, L. M. de. Relações Internacionais: Mudanças dos dois lados do Atlântico


(1801-1821). Rio de Janeiro: HGB, 2007.

ONU GINEBRA. Leage of Nations. Disponível em: https://bit.ly/3ikhvtl. Acesso em: 23


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Universidade Federal do Rio Grande do Sul. História das Relações Internacionais


e História da Política Externa. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3N4qygm. Acesso
em: 15 dez. 2021.

VEJA. As armas que ceifaram uma geração na I Guerra Mundial. 2014. Disponível
em: https://bit.ly/3ioL9ho. Acesso em: 21 dez. 2021.

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WORDPRESS. História do Brasil – Um resumo da Política Externa Brasileira na


Era Vargas. 2020. Disponível em: https://bit.ly/3IqcCd3. Acesso em: 29 dez. 2021.

152
UNIDADE 3 —

A POLÍTICA EXTERNA
BRASILEIRA: REGIME
MILITAR (1964-1985) E
ÉPOCA DEMOCRÁTICA
ATÉ OS DIAS ATUAIS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• discernir a problemática socioeconômica e política da época do Regime Militar e suas


implicações na Política Externa.

• dentificar as mudanças da Política Externa depois do Regime Militar.

• compreender como a crise da dívida dos anos 1980 impactou ao Brasil e como isso
influenciou na dinâmica de sua Política Externa.

• entender como o fim da hiperinflação e a execução do Plano Real fizeram com que o
Brasil apresentasse uma época de estabilidade econômica.

• visualizar a influência do boom das commodities durante a primeira década do século


XX e seu impacto na política externa brasileira.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer dela, você encontrará
autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA NO REGIME MILITAR


TÓPICO 2 – RETORNO À DEMOCRACIA E A CRISE DA DÍVIDA EXTERNA BRASILEIRA
TÓPICO 3 – MULTILATERALISMO E CRESCIMENTO ECONÔMICO

CHAMADA
Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure
um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

153
CONFIRA
A TRILHA DA
UNIDADE 3!

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154
UNIDADE 3 TÓPICO 1 —
A POLÍTICA EXTERNA BRASILEIRA
NO REGIME MILITAR

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, estamos iniciando a última unidade deste livro sobre a Política
Externa Brasileira. Neste primeiro tópico, abordaremos a política externa durante o
Regime Militar (1964-1985). No contexto das relações internacionais, a década de 1960
foi um pouco instável em função das fortes mudanças, tanto no contexto externo
quanto no nacional. A década será lembrada como uma política externa de autonomia
e o universalismo. Logo depois dos anos 60 veio o Regime Militar (1964-1985), que teve
uma gestão governamental civil-militar. Durante esse período, principalmente na década
de 1970, a Política Externa brasileira teve coma pauta o pragmatismo como elemento
das relações internacionais.

Antes mesmo de iniciar o regime militar houve alguns elementos importantes a


serem considerados no cenário internacional com implicações nacionais ao longo das
próximas décadas. No contexto Latino-americano no ano de 1959 aconteceu o processo
revolucionário cubano que acabou tomando o controle do Estado Cubano, depois disso
esse país se incorporou aos interesses geopolíticos da URSS e de seu grupo de países do
Leste Europeu, a conhecida “Cortina de Ferro”. Essa mudança de regime em Cuba para
uma economia comunista com o apoio logístico e financeiro da URSS deixou ao resto
da América Latina numa posição de tensão geopolítica e socioeconômica em função da
forte desigualdade social muito presente nos países da região. Muitos países da região,
incluindo o Brasil, tinham seus próprios movimentos comunistas que reivindicavam
direitos trabalhistas e igualdade social. Essas reivindicações sociais estavam ligadas
internacionalmente, nesse sentido, a tensão regional tinha forte vínculo com as
intenções geopolíticas da URSS, potência líder do mundo socialista.

No meio dessa tensão entre o mundo de livre mercado liderado pelos EUA e
pelo mundo socialista liderado pela URSS aconteceu a Crise dos Misseis em Cuba no
ano de 1962, crise que é conhecida como o ponto mais crítico da Guerra Fria, tema
bem interessante da Guerra Fria da leitura complementar da unidade 2. O Brasil diante
desse cenário conturbado regional e global nos começos da década de 1960 continuou
com sua posição neutra perante a Guerra Fria adotada a partir do Presidente JK. Essa
posição neutra, além de outras questões de interesse para o Brasil, foi formalizada
por meio da Política Externa Independente (PEI), exposta nos primeiros anos de
1960, antes de começar o regime militar de 1964. Por meio da PEI, o Brasil buscava a
diversificação dos laços internacionais em função dos interesses nacionais brasileiros
sob uma perspectiva política de centro-esquerda moderada. Porém, essa maneira

155
de atuar no cenário internacional – e ante os riscos de uma possível escalada das
reivindicações dos movimentos comunistas dentro do território nacional – chamou
a atenção dos setores conservadores e militares da sociedade brasileira os quais
acabaram articulando o golpe militar de 1964.

Conforme abordaremos nas páginas a seguir, após o Golpe Militar aconteceu de


maneira natural uma aproximação mais intensa com os EUA em função da ameaça do
avanço comunista ao longo da América Latina, e em função das intenções do Regime
Militar de seguir princípios mais liberais, de livre mercado, com foco desenvolvimentista.
Essa política econômica de cunho desenvolvimentista, liberal e nacionalista, junto a
um cenário econômico internacional favorável, trouxe como resultado vários anos
de crescimento econômico acelerado sob as condições de uma indústria nacional
protegida. Porém, também trouxe um aumento excessivo da dívida externa e que teve
sua crise na década de 1980.

Para começos de 1980 o Brasil, com uma dívida externa expressiva, ficou
vulnerável perante os riscos econômicos de uma instabilidade internacional, em função
de uma alta dependência do financiamento externo, de importações de insumos para
os processos de transformação de sua indústria protegida e exportações de produtos
com pouco valor agregado. Ou seja, em termos econômicos o Brasil de começos da
década de 1980 tinha uma altíssima dívida externa e vulnerabilidade às oscilações do
mercado internacional.

No ano de 1979 aconteceu a segunda crise no preço do petróleo, logo depois


as economias desenvolvidas tiveram recessões econômicas e pressões inflacionárias.
No contexto da América Latina, a crise internacional veio para ficar por um bom tempo
e o Brasil não foi exceção. Houve um aumento drástico no custo dos juros da dívida
externa e as perspectivas econômicas do Brasil não eram boas. Isso trouxe uma série de
consequências negativas, entre elas a forte desvalorização da moeda nacional, aumento
do processo inflacionário e uma crise econômica severa. Elementos econômicos
negativos que se acrescentaram, mais outros de cunho político, foram determinantes
para o fim do regime militar no ano de 1985, conforme iremos estudar aqui neste tópico.

2 A POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE (PEI) E GOLPE


MILITAR

Conforme foi estudado na última unidade para finais da década de 1950 muitos
acontecimentos no cenário externo vinham ocorrendo. No cenário regional das Américas,
a revolução cubana acabou com a ditadura de Fulgencio Batista e a partir de 1959 até
os dias atuais é o partido comunista quem governa o país insular. No cenário global,
a Guerra Fria estava se intensificando com uma competição geopolítica e ideológica
constante entre o bloco dos países da OTAN (Ocidente) contra os países da Cortina

156
de Ferro (Leste Europeu). Entretanto, na conferência de Bandung (Indonésia) nasce o
movimento de países “não-alinhados”, cujo objetivo principal foi manter a neutralidade
perante a Guerra Fria entre os dois grandes blocos de países liderados pelas duas
superpotências da época, os EUA e a URSS.

Embora o Brasil nunca tenha sido membro do bloco de países “não-alinhados”,


este acompanhava na sua qualidade de observador as pautas definidas nesse bloco
os quais teoricamente estavam nem a favor do “Oeste” nem do “Leste”. Todavia, a
partir do governo do Presidente JK (1956-1961) o Brasil começou a se afastar de um
posicionamento favorável aos interesses dos EUA, iniciando assim uma Política Externa
a favor da neutralidade e independente, posição que veio a se manifestar de maneira
mais forte como Política Externa do Brasil na Presidência do Presidente Jânio Quadros
(31 de janeiro 1961 até 25 de agosto 1961).

2.1 A POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE (PEI)

O Presidente Jânio Quadros, na sua curta presidência, proclamou a conhecida


Política Externa Independente (PEI), a qual queria sintonizar ao Brasil como país
líder perante a realidade do momento das economias em desenvolvimento. Os principais
objetivos da PEI, conforme os autores Lessa e Altemani (2014, p. 121) eram: “contribuir
com a política nacional de desenvolvimento econômico e social, diversificar os laços
internacionais do país, de maneira amigável e contribuir para a paz mundial”.

A PEI desejava também manter a tradição diplomática brasileira desde a época


de Barão do Rio Branco no que tange a “não-intervenção e da autodeterminação dos
povos, a tese da igualdade jurídica das nações, a fidelidade às normas de solução pacífica
de controvérsias etc.” (FGV CPDOC, 2021) No contexto dos interesses econômicos,
por meio da PEI o Brasil desejava aumentar o espectro de seu comércio exterior, ou
seja, desejava ampliar suas exportações para novos mercados internacionais, tais
como o Leste Europeu (países comunistas) e a os novos países da África, ex-colônias
europeias. Novos mercados que poderiam absorver produtos com maior valor agregado
(ou industrializados), os quais vinham aumentando na matriz produtiva do Brasil, fruto
do modelo de desenvolvimento da industrialização por substituição de importações
adotado desde a década de 1930 da Era Vargas. Nesse sentido, a PEI se adequava:

[...] à fase em que se encontrava o modelo de desenvolvimento


de industrialização por substituição de importações. Desde que a
economia brasileira se havia tornado mais complexa, era crucial
a diversificação das parcerias, ampliando o mercado para os
produtos primários e manufaturados em direção aos países do
bloco socialista e às novas nações libertas do sistema colonial
(FGV CPDOC, 2021, on-line).

157
ATENÇÃO
Sabe qual o objetivo do “Modelo de Desenvolvimento de Industrialização por
Substituição de Importações?

O modelo de substituição de importações foca na redução de


importações destinadas ao consumidor final. Em contrapartida, o país
incentiva o desenvolvimento industrial para suprir essa redução de
importações, gerando assim uma indústria fechada, e uma necessidade
de importar bens de capital e insumos destinados aos processos de
transformação dessa indústria nacional fechada. E para que isso possa acontecer
é necessário de políticas governamentais que visem proteger à indústria nacional
da concorrência dos produtos importados vindos do mercado internacional. Se
desejar saber mais sobre o tema, e como esse modelo aconteceu aqui no Brasil
e na Argentina, sugiro acessar ao artigo:

Industrialização e modelo de substituição de importações no Brasil e na


Argentina: uma análise comparada <https://bit.ly/3ucZHGb>

No contexto do momento, a PEI seria uma maneira de formalizar a nova


realidade da Política Externa, a qual não negava os laços tradicionais que o Brasil vinha
tendo com os EUA desde a época do Barão do Rio Branco e demais países do mundo
desenvolvido. Porém, desejava inserir ao Brasil com sua potencialidade de liderança
regional na realidade dos países em desenvolvimento, atuando tanto no contexto de
uma posição de neutralidade ante o aquecimento da Guerra Fria, como no contexto de
uma posição de potência regional exportadora de produtos com maior valor agregado
(industrializados) para os demais países em desenvolvimento e para os países Socialistas
do Leste Europeu. Nessa nova realidade das relações internacionais do Brasil, a PEI
apresentava 15 princípios que estariam em sintonia com as mudanças geopolíticas e
econômicas da década de 1960, sendo eles:

QUADRO 1 – OS 15 PRINCÍPIOS DA POLÍTICA EXTERNA INDEPENDENTE (PEI) DE 1961

1. Respeito aos compromissos e à posição tradicional do Brasil no mundo livre.


2. Ampliação dos contatos com todos os países, inclusive os do mundo socialista.
3. Contribuição constante e objetiva à redução das tensões internacionais […].
4. Expansão do comércio externo brasileiro.
5. Apoio decidido ao anticolonialismo.
6. Luta contra o subdesenvolvimento econômico.
7. Incremento das relações com a Europa, em todos os planos.
8. Reconhecimento e atribuição da devida importância aos interesses e aspirações
comuns ao Brasil e às nações da África e da Ásia.

158
9. Estabelecimento e estreitamento de relações com os Estados africanos.
10. Fidelidade ao sistema interamericano.
11. Continuidade e intensificação da Operação Pan-Americana.
12. Apoio constante ao programa da Associação de Livre Comércio Latino-Americana.
13. A mais íntima e completa cooperação com as repúblicas irmãs da América Latina,
em todos os planos.
14. Relações de sincera colaboração com os Estados Unidos, em defesa do progresso
democrático e social das Américas.
15. Apoio decidido e ativo à Organização das Nações Unidas […].

FONTE: RBPI, 1961 apud Lessa e Altemani, 2014, p. 122

Sobre esses 15 princípios descritos da PEI vamos ver as implicações de cada


um deles:

1. Respeito aos compromissos e à posição tradicional do Brasil no mundo livre. Isso


quer dizer que os compromissos de Estado Brasileiro transcendem aos governos de
turno, e que o Brasil mantém sua posição de respeito as decisões do outros Estados
que fazem parte do cenário internacional.
2. Ampliação dos contatos com todos os países, inclusive os do mundo socialista.
Isso implica que o Brasil tem interesse de abrir suas relações internacionais
independentemente da ideologia política dos outros países.
3. Contribuição constante e objetiva à redução das tensões internacionais […]. Isso quer
dizer que o Brasil procura mitigar possíveis tensões que possam vir acontecer no
cenário internacional. Um exemplo disso foi quando aconteceu a crise de mísseis
entre URSS, Cuba e EUA, conforme será visto mais adiante.
4. Expansão do comércio externo brasileiro. Isso implica expandir o horizonte das
exportações além dos países de destinos tradicionais.
5. Apoio decidido ao anticolonialismo. Isso implica ajudar aos processos de independência
das ex-colônias, principalmente das potências europeias, devermos observar que
depois de Segunda Guerra Mundial aconteceu um processo de independência
acelerado das colônias europeias na África.
6. Luta contra o subdesenvolvimento econômico. O Brasil como potência regional tem
a capacidade de articular um processo de desenvolvimento regional e inclusive inter-
regional.
7. Incremento das relações com a Europa, em todos os planos. Isso implica manter
e melhorar as atuais relações com o continente europeu, procurando aumentar as
exportações e importar nova tecnologia.
8. Reconhecimento e atribuição da devida importância aos interesses e aspirações
comuns ao Brasil e às nações da África e da Ásia. Isso implica reconhecer a importância
dos interesses comuns que possam ter esses países com o Brasil.

159
9. Estabelecimento e estreitamento de relações com os Estados africanos. Depois de
Segunda Guerra Mundial muitos países da África se tornaram independentes, logo,
o Brasil deseja estabelecer e estreitar as relações com esses países.
10. Fidelidade ao sistema interamericano. Esse princípio faz referência à fidelidade ao
Sistema Interamericano de Direitos Humanos.
11. Continuidade e intensificação da Operação Pan-Americana. Isso implica que o
Brasil mantém ativamente a intensificação da integração regional tanto no contexto
político como econômico.
12. Apoio constante ao programa da Associação de Livre Comércio Latino-Americana.
Isso implica ampliar o comércio inter-regional até iniciar acordos multilaterais de
livre comércio.
13. A mais íntima e completa cooperação com as repúblicas irmãs da América Latina,
em todos os planos. Isso implica uma maior cooperação socioeconômica com a
vizinhança.
14. Relações de sincera colaboração com os Estados Unidos, em defesa do progresso
democrático e social das Américas. Isso implica manter e melhorar a tradicional
colaboração existente com os EUA desde a época do Barão de Rio Branco.
15. Apoio decidido e ativo à Organização das Nações Unidas [...] isso implica que Brasil
está disposto a apoiar e participar de maneira proativa na gestão da ONU.

Os 15 princípios da PEI representaram na realidade as diretrizes para dar
continuidade à Política Exterior brasileira ao longo do tempo, nesse sentido eles são
um marco referencial para essa época até os dias de hoje. Inclusive o princípio nº 14,
(“Relações de sincera colaboração com os Estados Unidos, em defesa do progresso
democrático e social das Américas”) é uma aproximação bilateral estratégica que se
vinha tomando desde a gestão de Barão do Rio Branco de começos de século.

Em seu conjunto, a PEI conservava o principal da tradição diplomática


brasileira, redimensionava os elementos desenvolvimentistas que
tinham sido implantados a partir da década de 1930 e agregava as
novas diretrizes voltadas para as áreas então chamadas periféricas
(vizinhos latino-americanos, africanos e asiáticos), de acordo com
os conceitos de centro e periferia propostos pela Cepal (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 123).

Essa posição independente e de neutralidade perante a Guerra Fria ficou mais


evidente quando o Brasil por um lado se opôs a saída de Cuba da OEA na votação do dia
31 de janeiro de 1962, e por outro lado, logo depois em outubro desse mesmo ano, quando
estourou a crise dos misseis em Cuba, se colocou em defesa da ameaça aos EUA.

O voto de abstenção do Brasil na VIII Reunião de Consulta dos Ministros


das Relações Exteriores, em Punta del Leste, juntamente com a
Argentina, a Bolívia, o Chile, o Equador e o México − os outer six − foi
o ponto alto de uma política que afirmava o “interesse nacional” no
contexto da guerra fria. Os seis votos de abstenção foram derrotados
por quatorze favoráveis à exclusão de Cuba da OEA, em votação
realizada em 31 de janeiro de 1962 (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 125).

160
Em relação ao diálogo bilateral com os Estados Unidos, na crise
dos mísseis o Brasil já assumira o papel que dele se esperava em
Washington e que era condizente com o perfil pacifista da sociedade
brasileira. A crise atingira dimensões suficientemente graves para
que o Rio de Janeiro deixasse claro o posicionamento contrário à
ingerência extracontinental (soviética) nos assuntos americanos. Tal
comportamento honrava os acordos interamericanos das décadas
anteriores e era convergente com os interesses de Washington
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 125).

Assim, ante as mudanças drásticas que teve que passar Cuba no seu próprio
processo de transformação socioeconômico para uma sociedade comunista, o Brasil
se mostrou respeitoso, aplicando o princípio desde a época de Barão do Rio Branco da
“não-intervenção e da autodeterminação dos povos”. Contudo, quando essa posição
de alinhamento com a URSS por parte de Cuba ameaçou, por meio da Crise dos Mísseis
ao território dos EUA, o Brasil os se posicionou em favor aos norte-americanos, devido
seu território estar sendo ameaçado pelos mísseis soviéticos. Ambas as situações
mostraram na prática a posição de neutralidade e independência da Política Externa
Brasileira. Porém, esse mesmo posicionamento de independência e defensora da
“não-intervenção e da autodeterminação dos povos” deixou ao Brasil do Governo de
Goulart em uma atitude conflitiva ante as pressões e estratégias que tinha os EUA
perante a Guerra Fria.

Em princípio a PEI procurava deixar ao Brasil em uma posição formalmente mais


independente, de liderança tanto regional como com o resto países subdesenvolvidos
ao redor do mundo, mais aberta para relações comerciais com os países do Leste
Europeu (Cortina de Ferro), e sobretudo manter uma posição de neutralidade perante
a pressão dos EUA e da URSS diante o aquecimento da Guerra Fria. Porém, em termos
práticos a independência de ações da PEI na realidade era uma autonomia aparente, já
que o Brasil dependia da capacidade de acordos internacionais que estivessem ligados
a geopolítica do hemisfério ocidental e as questões financeiras de sua dependência da
dívida externa com os países desenvolvidos (EUA e Europa Ocidental).

Autoridades norte-americanas, com certo tom de ironia,


parabenizaram o Brasil pela adoção de uma política exterior
independente, o que eles não conseguiam ter, considerando-se a
interdependência entre os países. A autonomia real, consistente,
efetiva das nações, não depende tanto do discurso diplomático e sim
dos recursos de poder à disposição do Estado. O Brasil da PEI era um
país que tinha se modernizado nas décadas anteriores, que precisava
atualizar suas instituições, e que, em razão das divergências que
dividiam a sociedade, mergulhou em uma crise política cujo desfecho
foram os acontecimentos de 1964 (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 125).

Enquanto esse discurso de independência da Política Externa ia se mostrando


na realidade uma interdependência de fatores a serem considerados nas relações
internacionais, as tensões entre grupos de extrema esquerda e movimentos
conservadores da sociedade brasileira iam se esquentando. Tensões que eram um

161
reflexo da própria dinâmica que estava tomando conta de um cenário internacional
polarizado ante uma Guerra Fria, e que ia se tornando mais intensa tanto do lado dos
EUA como da URSS. No contexto nacional, os movimentos conservadores - com um
posicionamento mais a favor dos EUA perante o conflito da Guerra Fria - começavam
a ficar cada dia mais apreensivos perante as ações de ativismo social e perspectivas
econômicas e políticas do governo de João Goulart (1961-1964).

O Governo de Goulart tinha uma visão mais centrista e aberta ao diálogo com
diversos movimentos do espetro político, tanto de direita, liberais como de esquerda,
escutando e dialogando com especial ênfases sobre algumas das reivindicações dos
movimentos sociais, coisa que não era do agrado dos movimentos conservadores.
Inclusive um dos fatores que incentivaram ao Golpe de Estado foram as Reformas de
Base que iam se articulando mesmo desde o governo do Presidente JK.

Em 1958, ainda durante o governo de Juscelino Kubitschek, o


Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) começou a discutir um conjunto
de propostas que visava promover alterações nas estruturas
econômicas, sociais e políticas que garantisse a superação do
subdesenvolvimento e permitisse uma diminuição das desigualdades
sociais no Brasil (FGV CPDOC, 2021).

NOTA
Deseja saber mais sobre as Reformas de Base que colaboram para uma
sociedade brasileira polarizada prévia ao Golpe de Estado de 1964?
Acesse ao artigo histórico da FVG CPDOC: As reformas de base.
<https://bit.ly/3qkpQ4U>

Nesse sentido, as “Reformas de Base” procuravam criar um Brasil mais justo,


no qual poderiam caber os diversos espetros políticos representativos da sociedade
brasileira. Inclusive alguns trechos, ou propostas, da “Reforma de Base” foram
considerados na Constituição brasileira de 1988.

Algumas das pautas das Reformas de Base chegaram a ser


incorporadas no processo de redemocratização, como o voto dos
analfabetos, adotado em 1985, ou a inclusão de dispositivos favoráveis
à reforma urbana (artigos 182 e 183) e à reforma agrária (artigos 184 a
186 e 188 a 191) 31 no texto constitucional (REB, 2014, p. 7).

A princípio, as “Reformas de Base” estavam de acordo ao próprio processo de


diálogo e construção da democracia brasileira. Contudo, um pouco antes do Golpe de
Estado, o Governo de Goulart tinha tomado uma posição mais radical, especialmente

162
no que tange as reformas agrárias discutidas no projeto das “Reformas de Base”,
polarizando ainda mais as posições das lideranças políticas dos setores conservadores
e os setores de esquerda. Como resultado histórico, no ano de 1964, ante a crise e
perspectivas econômicas pouco otimistas, e um espetro político conturbado, os
movimentos conservadores junto com a liderança militar articularam o golpe de estado.

Diante os fatos históricos da época, podermos dizer que a partir de 1964


começa um novo momento da gestão política do Brasil sob um regime de governo de
cunho civil-militar, claramente mais alinhado aos EUA, mais liberal e nacionalista. No
contexto da Política Externa, talvez valha a pena perguntarmos, como foram as relações
internacionais desse Regime Civil-Militar de quase 20 anos? No seguinte subtópico
iremos abordar os começos da Política Externa sob o Regime Militar.

2.2 O GOLPE MILITAR NO CONTEXTO DAS RELAÇÕES


INTERNACIONAIS BRASILEIRAS

O Regime Militar veio para ficar por pouco mais de duas décadas (1964-1985).
Sobre esse período da história política do Brasil, existem diversos argumentos positivos
e outros nem tanto. Assim como existem severas críticas sobre a forte repressão social
que aconteceu durante essa época, questão característica de governos militares,
sejam esses de viés ideológico de extrema esquerda ou de direita. Neste livro didático,
independentemente das críticas ou elogios dessa época, vamos nos focar sempre
sob a ótica da Política Exterior. Assim, nas próximas páginas nosso objetivo será uma
análise objetiva e imparcial da política externa dessa fase da história recente do país.
Vamos começar nossos estudos dessa época a partir do primeiro governo civil-militar
do Presidente Castelo Branco (1964-1967).

FIGURA 1 – O GOLPE MILITAR DE 1964

FONTE: <https://bit.ly/3KYMdEH>. Acesso em: 17 de fev. 2022.

163
Na Figura 1, mostra-se a atuação dos limitares durante o Golpe Militar de
1964. Logo depois disso começou a governar o Presidente Castelo Branco, quem deu
a prioridade de mitigar o processo inflacionário que estava começando ficar fora de
controle. Além de melhorar as perspectivas dos agentes econômicos, equilibrar o
Balanço de Pagamentos (contas externas) e mais outros fatores de cunho econômico
que vinham causando uma crise socioeconômica severa no país. E no contexto das
relações internacionais, logo no início do Governo do Presidente Castelo Branco,
houve, como era de se esperar, uma aproximação natural aos EUA e a seu combate (a
Guerra Fria), visando mitigar a hegemonia da URSS e seus desejos de expansão, tanto
ideológica, quanto geopolítica na América Latina.

Contudo, o Brasil vinculou esse apoio aos EUA exigindo em troca ajuda para o
projeto desenvolvimentista no país, criando um laço de interesses de “interdependência”
entras ambas as nações. Assim, essa aliança com os EUA mostrou uma estratégica de
vincular os interesses liberais e de uma economia capitalista de mercado de ambas
as nações, para que o Brasil pudesse continuar sua política desenvolvimentista. Essa
interpendência, como pauta importante das relações do Brasil com os EUA, marcou
uma diferenciação com a Política Externa Independente (PEI) estabelecida poucos anos
antes do Regime Militar.

No entanto, o fato de ter vinculado a intensificação das relações com os EUA


para continuar com a política desenvolvimentista fez com que a Política Externa
do Presidente Castelo Branco tivesse um certo grau de semelhança com um dos
princípios da PEI. “Luta contra o subdesenvolvimento econômico” e mais outras
que iam se apresentar na atividade das relações internacionais. Ou seja, embora
se apresentasse uma drástica mudança de imagem na política exterior a partir do
golpe de estado e um posicionamento claro de interdependência com os EUA, o
que ia contra do princípio fundamental da Política Externa Independente (PEI) do
governo de Goulart, isto é, a “independência” nas relações internacionais brasileiras,
houve certos traços de continuidade no que tange aos objetivos da Política Externa
Brasileira, estabelecidos na PEI.

[...] evidentemente houve uma ruptura com a PEI, mas que os


princípios desta foram retomados em seguida, configurando apenas
um hiato na trajetória da política exterior brasileira. Visto em uma
perspectiva histórica, pode-se desprezar tal hiato e sustentar
a existência de linhas de continuidade da política exterior, que
sobreviveram às mudanças políticas provocadas pelo golpe (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 125).

Neste contexto, vamos ver algum desses princípios da PEI que continuaram
durante os primeiros anos do Regime Militar durante a década de 1960 até o retorno ao
regime democrático a partir de 1985.

164
• Projeto desenvolvimentista para o Brasil, e para uma integração inter-regional de
cunho desenvolvimentista entre países da América Latina, ambas ações expostas
nos princípios da PEI: nº6, Luta contra o subdesenvolvimento econômico; e nº 11,
Continuidade e intensificação da Operação Pan-Americana.
• Incremento do comércio e da cooperação com os países da América do Sul em
função de dois eixos geográficos, a Bacia da Prata (Argentina, Brasil, Bolívia,
Paraguai e Uruguai) e a Bacia Amazónica (Brasil, Bolívia, Peru, Equador, Colômbia,
Venezuela, Guiana, Suriname e Guiana Francesa). Estratégias de comércio inter-
regional e de cooperação que teriam vínculo com os princípios da PEI: nº 12, apoio
constante ao programa da Associação de Livre Comércio Latino-Americana; e nº 13,
a mais íntima e completa cooperação com as repúblicas irmãs da América Latina,
em todos os planos.

Nesse sentido, de apoiar ideais de livre comércio inter-regional, na década de 1960:

Tinha início, naquela década, o processo de superação da rivalidade


conflituosa com a Argentina para a rivalidade natural, processo
concluído em meados dos anos 1980 e que propiciou, consideradas
todas as mediações, o advento do Mercosul. No início do século
XXI, período em que o projeto sul-americano do Brasil ganhou novo
impulso, percebeu-se a continuidade em relação aos princípios
formulados em meados da década de 1960 (LESSA; ALTEMANI,
2014, p. 132).

• Interdependência de relações entre o Brasil e países desenvolvidos (EUA, Japão,


e Europa Ocidental), entre o Brasil e países em desenvolvimento (América Latina,
África, Oriente Médio e Ásia), e entre o Brasil e países do Leste Europeu (Cortina
de Ferro) liderados pela URSS. Estratégia que apontava alianças entre países em
desenvolvimento na procura de superar o desiquilíbrio de forças econômicas
e tecnológicas entre o Norte, sejam esses países do norte sob uma economia de
mercado (EUA, Japão e Europa Ocidental) e sejam esses países sob uma economia
socialista (países do Leste Europeu). Posicionamento de Política Externa que estaria
vinculada à PEI sob os princípios: 2, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 11.

Na percepção dos formuladores da política externa do governo


Costa e Silva, a controvérsia Leste-Oeste não mais animava
as grandes tensões internacionais, porque estas teriam sido
deslocadas, a partir da II Unctad, para o conflito Norte-Sul, ou seja,
entre países desenvolvidos e países pobres e em desenvolvimento.
É nesse sentido que a visão que vinha sendo alimentada no
âmbito do Itamaraty desde o início dos anos 1960 (PEI) − a da
clivagem entre Norte e Sul − contribuiu para contaminar a área de
segurança e justificar, de certo modo, o posicionamento contrário
do Brasil ao Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), em 1968.
A chancelaria brasileira interpretou o TNP como uma defesa
dos interesses dos Estados Unidos e da União Soviética, um
movimento no sentido de congelar o poder mundial e impedir que
países em desenvolvimento alcançassem o domínio da tecnologia
nuclear (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 134).

165
Assim, embora houvesse uma mudança drástica na gestão do Estado Brasileiro,
de um regime democrático para um regime civil-militar, as relações internacionais
marcaram um perfil de uma relativa continuidade, mas com algumas diferenças de
imagem que mostravam uma aproximação natural aos EUA, especialmente no que
tange na luta contra movimentos sociais de cunho socialista. Uma diferenciação clara
foi que enquanto o Regime Militar chamava para uma atuação de “interdependência”
nas relações internacionais brasileiras a PEI colocava uma imagem de “independência”.

Nessa diferenciação foi que o Presidente Castelo Branco iniciava uma Política
Exterior Brasileira de interdependência entre diversos blocos regionais (EUA, Europa
Ocidental, entre outros) com uma visão de criar uma posição de cunho nacionalista, de livre
mercado e desenvolvimentista, visando assim superar o gap econômico e tecnológico
entre o hemisfério norte (independentemente que seja dos países desenvolvidos ou
dos países socialistas da “Cortina de Ferro”) e o Brasil em conjunto com resto dos países
do Hemisfério Sul. Essa visão de atuação conforme a uma interdependência na Política
Externa deu início a uma gestão pragmática em função aos interesses nacionais.

3 POLÍTICA EXTERNA PRAGMÁTICA NO GOVERNO CIVIL-


MILITAR

O começo da década de 1970 foi marcado tanto pelo pragmatismo nas relações
diplomáticas brasileiras como pelo milagre econômico. Para finais de 1970 o pragmatismo
e universalismo da Política Exterior continuou sua própria dinâmica, mostrando um Brasil
mais próximo de sua vizinhança e mais aberto para manter seu comércio exterior para
países em desenvolvimento do resto da América Latina, da África e do Oriente Médio.

No contexto econômico, a década de 1970 foi uma época de altas taxas


de crescimento econômico, como também foi uma época que mostrou que o
país precisava melhorar sua segurança energética a raiz do choque nos preços
internacionais do petróleo de 1973, choque que causou um enfraquecimento no forte
crescimento econômica que vinha mantendo o Brasil. Logo desse ano, o governo
civil-militar para tentar voltar ter altas taxas de crescimento começou alavancar o
crescimento de maneira mais agressiva por meio do aumento da dívida externa além
da capacidade econômica. Resultado? Um aumento considerável da dívida externa
conforme veremos mais adiante.

A década de 1970 trouxe alguns elementos econômicos importantes. Nesse


sentido, antes de iniciar a análise da Política Externa desses anos do regime militar
vamos dar uma olhada ao contexto econômico. Assim, poderemos entender melhor a
dinâmica das relações exteriores até o final do regime militar no ano de 1985.

166
3.1 O MILAGRE ECONÔMICO (1967-1973) E O ENDIVIDAMENTO
EXTERNO AGRESSIVO

O Milagre Econômico foi uma consequência de acontecimentos tanto nacionais


como internacionais. Para finais da década de 1960 existia uma conjuntura econômica
internacional muito favorável, alta demanda pelas exportações brasileiras, juros baixos
e alta disponibilidade de empréstimos no mercado financeiro internacional, entre outros
fatores. Pelo lado nacional, graças ao desdobramento de políticas econômicas adotadas
desde 1964 pelo Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) o Brasil começou ter
taxas de crescimento econômico altas. Para o ano de 1967, o novo governo civil-militar
do Presidente da Costa e Silva daria continuidade no crescimento da PAEG, governo que:

[...] logo anunciaria uma estratégia bastante semelhante à do governo


anterior: a busca do crescimento econômico promovido pelo aumento
de investimentos em setores diversificados; uma diminuição do
papel do setor público e o estímulo a um maior crescimento do setor
privado; incentivos à expansão do comércio exterior e, finalmente,
uma elevada prioridade para o aumento da oferta de emprego e
outros objetivos sociais (FGV CPDOC, 2021).

NOTA
Deseja ter maior conhecimento sobre a PAEG?

Acesse ao estudo, PAEG: da Crise Nos Anos 1960 A Retomada Do


Crescimento Nos Anos 197: <https://bit.ly/3tptJr1>

A continuidade dos fundamentos da PAEG com o novo governo de 1967 e a


conjuntura econômica internacional favorável dariam seus frutos. Entre 1967 e 1973 o
Brasil teve um crescimento real de sua economia acima de 10% ao ano, crescimento que
ofereceu alta disponibilidade de novos empregos e expansão da demanda interna. “De
fato, nesta época, o país conseguiu crescer exponencialmente, cerca de 10% ao ano,
e atingiu, em 1973, uma marca recorde do Produto Interno Bruto (PIB), que aumentou
14%.” (EL PAIS, 2017). O milagre econômico tinha atingido seu ápice no ano de 1973, mas
nesse mesmo ano veio a primeira crise dos preços internacionais do petróleo que fez ao
mundo entrar numa crise econômica internacional. O motivo dessa crise foi que nesse
ano de 1973 aconteceu o conflito bélico entre Israel e Síria, logo depois houve uma
crise de possível escalamento do conflito para todo o Oriente Médio, região com a maior
exportação de petróleo no mundo, resultado?

167
Os maiores exportadores de petróleo dessa época e membros da Organização
dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) tiveram que reduzir drasticamente
a oferta de petróleo. Como resultado “os preços quase quadruplicarem em curto
período de tempo (o barril subiu de US$ 3,00 dólares para US$ 11,60).” (EL PAIS,
2017). Isso teve consequências imediatas tanto nos países desenvolvidos como nos
em desenvolvimento. Em países como os EUA e Europa Ocidental, dependentes das
importações de petróleo o impacto foi uma queda drástica da demanda interna,
disparando logo uma crise que se espalhou aos mercados financeiros. Nesse
sentido, o Brasil país dependente tanto das importações de petróleo como de fontes
de financiamento por meio de dívida externa teve uma forte queda na sua demanda
interna, dando início ao final de uma época com altíssimas taxas de crescimento e
de disponibilidade de crédito barato no mercado internacional.

Ou seja, no ápice de um crescimento econômico altamente dependente


de empréstimos internacionais o Brasil de 1973 teve que confrontar o “choque do
petróleo”. O resultado disso foi o fim de um modelo econômico altamente dependente
do endividamento externo. Contudo, o Governo de Médici considerava essencial a
estabilidade econômica – visando manter estáveis as condições políticas e sociais –
assim, seu governo optou por continuar com uma política de crescimento econômico
altamente dependente do endividamento externo, apesar do incremento no custo
financeiro que isso implicaria. Essa estratégia para manter o crescimento significou no
longo prazo alavancar a dívida externa além da real capacidade da economia brasileira.

Nesse contexto de continuar o crescimento econômico a qualquer custo, no


novo governo civil-militar do Presidente Figueredo (1974-1979) foi lançado o segundo
Plano Nacional de Desenvolvimento (IIPND) de 1974. Plano de desenvolvimento, que traz
a crise do preço do petróleo, focava mais em projetos de independência energética e
insumos básicos (novas usinas, etanol, petróleo, alumio, aço etc.), visando assim evitar,
ou mitigar, um forte impacto energético como foi o que causou o “choque do petróleo
de 1973”. Nesse contexto, houve fortes investimentos em empresas e projetos por parte
do Estado Brasileiro, tais como na Petrobrás, a grande usina binacional de Itaipu (Brasil
e Paraguai), o Programa Nacional do Álcool (Proálcool), entre outros.

Embora o Plano Nacional de Desenvolvimento (IIPND) de 1974 ajudou ao


Brasil a se projetar em termos de segurança energética para as próximas décadas, o
alavancamento para desenvolver a economia com dívida externa teve com resultado que
o Brasil ficasse extremadamente vulnerável a potenciais crises internacionais. O que de
fato veio acontecer a partir de finais da década de 1970 com o segundo choque no preço
internacional do petróleo. A raiz desse segundo choque foi a Revolução Iraniana de 1979 e
a Guerra Irã-Iraque de 1980, ambas as nações entre as maiores produtoras e exportadoras
de petróleo, eis um dos porquês desse segundo choque nos preços do petróleo. Como
consequência a oferta mundial de petróleo despencou e o preço por barril disparou,
acontecendo recessões econômicas e pressões inflacionárias nos EUA, na Europa e mais
outros países, espalhando-se assim rapidamente uma crise econômica mundial.

168
O segundo choque do petróleo afetou negativamente os
países importadores, entre os quais os Estados Unidos, que,
em 1981, para enfrentar a inflação doméstica e a concorrência
de produtos importados no mercado interno, elevaram os
juros do país, sendo essa medida a principal razão para que o
valor da dívida externa de diversos países, particularmente os
latino-americanos, dobrasse ou triplicasse em pouquíssimo
tempo (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 146).

Assim como mencionam os autores Lessa e Altemani, com a disparada dos


juros nos EUA e sua repercussão no aumento drástico da dívida externa nos países
em desenvolvimento, a AL teve o começo de uma longa década de crise dívida externa
e crise socioeconômica, enquanto os países desenvolvidos conseguiram se recuperar
mais cedo. Para a América Latina foi o começo da década perdida dos anos 80 do século
passado. Foram vários anos de uma queda drástica nas exportações de commodities
e uma disparada tanto no peso da dívida externa como no custo dos juros dela. Esses
dois fatores foram relevantes para uma severa crise socioeconômica ao longo da região,
inclusive logo de ter passado a crise internacional.

Para o Brasil não foi diferente, inclusive foram um dos fatores importantes para
o fim do regime militar em 1985. Devemos nos lembrar que na década de 1970, o regime
militar tomou a decisão de manter taxas de crescimento elevadas e dar conta do Plano
Nacional de Desenvolvimento (IIPND) de 1974, embora isso significaria aumentar a dívida
externa além de um risco aceitável. Nesse contexto, para começos da década 1980 o
Brasil tinha um alto risco de uma crise de dívida externa e pressão inflacionária, o que de
fato veio acontecer com o segundo choque do petróleo. Quando o Regime Militar deixou
o poder em 1985:

[...] a dívida representava 54% do PIB segundo o Banco Central, quase


quatro vezes maior do que na época que eles tomaram o poder em
1964, quando o valor da dívida era de 15,7% do PIB. A inflação, por sua
vez, chegou a 223%, em 1985. Quatro anos depois, o país ainda não
tinha conseguido se recuperar e ostentava um índice de inflação de
1782% (EL PAÍS, 2017).

Assim, quando o Brasil retornou ao regime democrático, embora o país tivesse


executado grandes planos de desenvolvimento e crescimento industrial considerável
a fatura econômica tomou conta com uma inflação fora de controle, uma indústria
nacional fechada (e sobre protegida) e uma crise de dívida externa que levaria décadas
para conseguir equilibrar seu peso. Para visualizar isso, a seguir vamos ver um gráfico
com o resumo estatístico do crescimento do PIB real e seu impacto no PIB Per capita
desde 1960 até 1990. Isto é, entre os primeiros anos antes de iniciar o Regime Militar e
os primeiros anos após do retorno ao regime democrático até 1990.

169
GRÁFICO 1 – CRESCIMENTO DO PIB REAL E PER CAPITA 1960-1990

Crescimento do PIB per capita décadas de 1960, 1970 e 1980

FONTE: <https://bit.ly/3L0KdMc>. Acesso em: 12 fev. 2022.

Desses gráficos, mostra-se o impressionante crescimento do milagre econômico


até 1973, logo a queda desse crescimento em 1974 depois de ter acontecido o primeiro
choque do preço internacional do petróleo. É a partir daí, 1974, que o Regime Militar para
continuar crescendo a taxas elevadas quiseram manter uma dinâmica econômica com
alavancagem de dívida externa além da real capacidade financeira do país, o resultado
como já vimos foi a década perdida de 1980. No segundo gráfico, é interessante observar
a drástica melhoria da renda média do brasileiro, na década de 1960, melhorando 37%;
e na década de 1970 essa renda média melhorou quase 80%! Fato positivo que trouxe
boas perspectivas aos agentes econômicos durante o regime militar.

Porém, a raiz do segundo choque do preço do petróleo (1979 e 1980) essas


boas perspectivas econômicas tinham acabado, alimentando o descontentamento
tanto dos agentes econômicos como da sociedade civil no governo civil-militar, dando
início ao final do regime militar e o começo do retorno à democracia com um Brasil
em crise de dívida externa e altíssimas taxas de inflação. Agora com essa bagagem
do desempenho econômico do regime militar teremos maior capacidade de visualizar
a conjuntura da Política Externa Pragmática da década de 1970 até finais do governo
civil-militar em 1985.

170
3.2 POLÍTICA EXTERNA PRAGMÁTICA E UNIVERSALISMO

Durante a década de 1970 até finais do regime militar em 1985, a Política Externa
foi uma continuidade do que se vinha fazendo durante os primeiros governos do regime
militar. Ela estava baseada no desenvolvimento industrial, agroindustrial, energético
do Brasil e aumento da demanda interna. Nesse sentido, o crescimento econômico
foi sustentado pela política desenvolvimentista e pelo forte financiamento externo por
meio de dívida externa e parcerias de investimento direto. O resultado disso foi um
forte crescimento, conforme foi visto nas páginas anteriores, que teve repercussões
importantes tanto no âmbito nacional como internacional.

Porém, além do foco no desenvolvimento nos governos dos Presidentes Geisel


(1974-1979) e Figueiredo (1979-1985) houve também uma especial ênfase em uma Política
Exterior que esteja vinculada ao Pragmatismo e Universalismo nas relações do Brasil e o
resto do Mundo. Esse Pragmatismo e Universalismo embora tivessem sido idealizados
sob um contexto diferente da PEI, mantinham traços de semelhanças com alguns de
seus princípios, os quais foram idealizados alguns anos antes do início do Regime Militar.

3.2.1 Diversificação das relações internacionais e do comércio


exterior

No Regime Militar houve temas de Política Exterior com assuntos semelhantes


aos Princípios nº 2, “ampliação dos contatos com todos os países, inclusive os do mundo
socialista”; e nº 4, “expansão do comércio externo brasileiro”. Nesse contexto, houve
ampliação das missões diplomáticas no Leste Europeu (Cortina de Ferro), Oriente Médio
e na África. Expansão diplomática que tinha entre seus objetivos ampliar o horizonte
das exportações brasileiras, especialmente de produtos com maior valor agregado.
Inclusive no Regime Militar houve expansão diplomática com alguns países africanos
que acabavam de ter revoluções socialistas e que estavam no radar anticomunista dos
EUA, como foi o caso de Angola e Moçambique, “cujos governos, sob o comando de
Agostinho Neto e Samora Machel, respectivamente, eram considerados socialistas, levou
a diplomacia norte-americana a acompanhar mais atentamente as ações brasileiras na
África.” (LESSA E ALTEMANI, 2014, p. 146).

3.2.2 Desenvolvimento e ampliação do horizonte produtivo


do brasil

Ao final do Regime Militar houve vários projetos que elevaram o nível de


desenvolvimento do país, como o Projeto Proálcool que ajudou ao Brasil reduzir sua
alta dependência do petróleo e mais outros de projeção nacional e internacional.
171
Essa procura pelo desenvolvimento em vários âmbitos das atividades econômicas é
semelhante ao princípio nº 6 da PEI: “Luta contra o subdesenvolvimento econômico”.

Um dos projetos mais interessantes no contexto de desenvolvimento agrícola


da década de 1970 foi o Acordo de Cooperação Técnica entre o Brasil e o Japão de 1974.
O Japão por meio da Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA) deu apoio
tanto técnico como financeiro para expandir de maneira massiva a produção de Soja.
Devermos observar que a Soja é uma leguminosa que é cultivada tradicionalmente em
climas temperados, sendo ideais os solos do Estado de Rio Grande do Sul (Brasil), a
Argentina e o Meio Oeste do EUA aqui nas Américas. Porém, graças a cooperação da
JICA e pesquisadores brasileiros se conseguiu que a Soja pudesse ser também plantada
em solos mais quentes, como é hoje nas vastas terras do Cerrado Brasileiro. Conforme
a Agência de Cooperação Internacional do Japão (JICA, 2009, n.p.):

Em 1974, o então Presidente Geisel promovia o desenvolvimento


agrícola dos cerrados. Em meio a essas circunstâncias, o Japão, que
havia sofrido um grande impacto com o embargo à exportação da
soja imposto pelos Estados Unidos em 1973, voltou seu interesse
para o desenvolvimento agrícola dos cerrados e, em 1974, c Primeiro-
Ministro Kakuei Tanaka ao Brasil, foi acordada, com o Presidente Geisel,
uma cooperação para o desenvolvimento agrícola dos cerrados.

Hoje, a agroindústria da soja e sua cadeia produtiva é parte essencial das


exportações brasileiras e faz parte importante da economia nacional. Por vários anos o
Brasil vem sendo o maior exportador de soja do mundo, seguido de EUA e a Argentina.

3.2.3 Coopeação e integração com os países latino-americanos

Embora o Brasil seja uma nação de dimensões continentais e com vastos recursos
naturais com o potencial de pertencer ao grupo das grandes potências mundiais, ainda
falta um longe caminho para atingir esse patamar. O Regime Militar estava ciente disso,
por isso de maneira pragmática foi feito uma estratégia para consolidar a condição
do Brasil como uma potência regional com capacidade de estreitar laços entre países
desenvolvidos do Hemisfério Norte e os do Sul.

Na consecução dos interesses econômicos do país, o governo


Geisel estreitou relações com os países da Europa Ocidental,
principalmente Alemanha e França, e o Japão, diversificou os
laços, ou aprofundou-os, junto às nações africanas e asiáticas, e,
ao mesmo tempo, procurou torná-los mais densos com os vizinhos
latino-americanos (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 141).

172
No contexto da América do Sul, o Brasil dessa época fez diversos tratados com
a vizinhança, entre eles: o Tratado da Bacia do Prata que deu apoio para a criação do
“Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata (FONPLATA); e o Acordo
Tripartite Argentina-Brasil-Paraguai em 1979, que viabilizou a finalização da Usina
Hidrelétrica de Itaipu. O Acordo Tripartite Argentina-Brasil-Paraguai abriu caminho para
uma maior integração regional, especialmente energética, por meio da viabilização para
finalizar a maior usina hidrelétrica do mundo dessa época, Itaipu, um grande projeto
binacional entre o Brasil e o Paraguai que está operando desde 1982.

NOTA
Deseja saber mais sobre o Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da
Bacia do Prata?

Acesse o site do FONPLATA: <https://www.fonplata.org/pt>

No contexto geopolítico, o Brasil deu seu apoio à Argentina durante a Guerra


das Malvinas de 1982 contra o Reino Unido, ainda que os EUA tivessem se posicionado
a favor dos britânicos. Isso mostrou uma grande autonomia das decisões da Política
Externa Brasileira, embora isso pudesse ter alterado nessa época as tradicionais e boas
relações do Brasil com os EUA.

Autoridades políticas e militares do Brasil, ao propor uma saída


negociada para a crise e defender os direitos da Argentina
sobre as ilhas, pautavam-se tanto na tradição pacifista e
jurisdicista do país quanto na certeza de que, caso o Brasil se
opusesse ao pleito argentino, inúmeras dificuldades surgiriam
no futuro relativamente ao relacionamento bilateral e às
possibilidades de se obter avanços na integração regional.
E ao apoiar a argentina em termos políticos-diplomáticos
e econômicos, os dirigentes brasileiros miravam o futuro,
pois o país adquiriria a confiança dos argentinos (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 147).

Como consequência desse apoio brasileiro, depois de ter finalizado a Guerra


das Malvinas, houve uma maior confiança nas relações entre a Argentina e o Brasil,
quebrando assim parte dessa longa rivalidade histórica desde os começos da
independência de ambas as nações. Essa aproximação e melhoria da confiança ajudou
em diversos âmbitos de integração econômica, comercial e política entre os maiores
países da Bacia do Prata, confiança que foi um dos primeiros passos para viabilizar o
processo de criação do MERCOSUL de 1991.

173
O pragmatismo e universalismo marcaram uma pauta positiva da Política Exterior
do Regime Militar da década de 1970 até os finais dele no ano de 1985. Essa pauta ajudou
a diversificar mercados internacionais, manter as boas relações estratégicas tanto com
os EUA como com a Europa Ocidental, fomentar o processo de integração regional sul-
americana, e ajudar no desenvolvimento econômico brasileiro em diversas áreas. Os
começos do retorno ao Regime Democrático em 1985 no que tange à Política Externa
marcou uma nova época de continuísmo do que se tinha já feito no Regime Militar, mas
com uma intensificação no processo de integração regional, conforme vamos abordar
no próximo tópico.

Estamos chegando ao final de nossos estudos deste tópico, revise os temas


mais importantes com a ajuda de Resumo do Tópico 1. Depois disso, não deixe de realizar
as autoatividades! Vejo você no Tópico 2, até mais.

174
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Durante os primeiros anos da década de 1960 foi promulgada a política externa


independente (PEI) como base dos princípios que iam nortear a Política Exterior
Brasileira durante as próximas décadas.

• Um dos fatores que incentivou ao Golpe de Estado de 1964 foi as “Reformas de Base”,
especialmente no que tange as reformas agrárias que vinham se discutindo no
projeto dessas reformas.

• A partir de 1964 começa um novo momento da Política Exterior do Brasil sob um


regime de governo de cunho civil-militar, claramente mais alineado aos EUA, mais
liberal e nacionalista.

• Um dos focos importantes da Política Exterior do Regime Militar foi marcado por uma
agenda de relações internacionais de “interdependência”.

• Durante a década de 1970 o Brasil teve um crescimento econômico forte e grandes


projetos de desenvolvimento em sectores estratégicos, porém, esse crescimento foi
pautado com altas taxas de endividamento externo que passou fatura na crise de
dívida externa da década de 1980.

• O Pragmatismo e Universalismo característico da Política Exterior do Regime Militar


embora tenham sido idealizados sob um contexto diferente da PEI, mantinha traços
de semelhanças com alguns de seus princípios.

175
AUTOATIVIDADE
1 Nos primeiros anos da década de 1990 foi promulgada a Política Externa Independente
(PEI), que marcou os princípios norteadores da Política Exterior para as próximas
décadas, embora da negação da PEI por parte da gestão governamental civil-militar
do Regime Militar. A seguir defina quais sentenças são verdadeiras, com relação aos
princípios da PEI.

( ) Boas relações com os EUA, procurando o progresso democrático e social ao longo


das Américas.
( ) Expansão do comércio externo brasileiro, exceto dos países da Cortina de Ferro.
( ) Continuidade e intensificação da Operação Pan-Americana e consolidação do
MERCOSUL.
( ) Manter a posição de apoiar ao programa de Associação de Livre Comércio Latino-
Americana.

Destas sentenças, quais são verdadeiras:

a) ( )F-V-V-F
b) ( )V-F-F-V
c) ( )V-F-V-F
d) ( )F-F-V-V

2 A partir da era do Regime Militar, isto é, 1964, começa um novo momento da Política
Exterior Brasileira sob a gestão governamental civil-militar, com uma clara alienação
aos EUA e combate ao avanço do comunismo. Nesse contexto, determine quais das
seguintes sentenças está correta. Durante o período do Regime Militar:

a) ( ) O Brasil negou quaisquer aproximação de cunho comercial com os países da


Cortina de Ferro, isto é, os países socialistas do Leste Europeu liderados pela ex-
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
b) ( ) Embora o Brasil estivesse alineado com os EUA teve aproximações de cunho
comercial com os países da cortina de Ferro. Pois o objetivo era de ampliar suas
exportações, especialmente de produtos com maior valor agregado.
c) ( ) Assim como houve uma negação de entrar em relações com os países da Cortina
de Ferro, o Brasil não entrou em relações com os países africanos que estavam
tendo revoluções de cunho socialistas, mantendo assim firme a sua posição de
país aliado dos EUA.
d) ( ) Nos anos da década de 1970 o Brasil enxergou a oportunidade de ampliar
suas exportações de produtos com valor agregado para os países africanos
que estavam passando por revoluções socialistas. Sendo isso uma questão
meramente comercial os EUA não ficaram apreensivos diante a atitude do Brasil.

176
3 Visando se diferenciar da PEI, os Governos do Regime Militar procuraram intensificar
uma Política Exterior marcada por uma agenda de relações internacionais de
“interdependência”. Diante disso, analise as seguintes sentenças:

( ) Embora houve uma marcada agenda de “interdependência” nas relações


internacionais brasileiras, houve certos traços de continuidade no que tange aos
objetivos da PEI.
( ) No decorrer da década de 1960 essa marcada diferenciação de “interdependência”
foi se mostrando na realidade uma Política Exterior de pragmatismo com os
países considerados estratégicos com o Brasil, mostrando assim na prática um
afastamento de todos os princípios da PEI.
( ) Durante os primeiros anos do Regime Militar houve alguns dos princípios da PEI
que mostraram uma continuidade na gestão da Política Exterior, entre eles a
intensificação do desenvolvimentismo tanto para o Brasil como o projeto de
integração inter-regional da América do Sul.

Destas sentenças, quais estão corretas:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.


b) ( ) As sentenças I e III estão corretas.
c) ( ) As sentenças II e III estão corretas.
d) ( ) Somente a sentença III está correta.

4 Entre finais da década de 1960 e primeiros anos da década de 1970 o Brasil apresentou
os anos de maior crescimento econômico do século XX, época conhecida como o
milagre econômico. Porém, a partir de 1973 houve mudanças drásticas no cenário
internacional que terminaram com o milagre econômico, principalmente houve o
primeiro choque dos preços do petróleo. A seguir exponha como os governos do
Presidente Médici (1969-1974) e Figueredo (1974-1979) conseguiram manter altas
taxas de crescimento econômico e qual foi o custo disso para o Brasil.

5 Uma das características na Política Exterior dos governos do Regime Militar foi o
Pragmatismo e Universalismo. Embora isso tivesse sido conceptualizada sob um
contexto diferente da PEI, mantinha traços de semelhanças com alguns de seus
princípios. Sobre esses traços de semelhança explique quais foram.

177
178
UNIDADE 3 TÓPICO 2 -
RETORNO À DEMOCRACIA E A CRISE DA
DÍVIDA EXTERNA

1 INTRODUÇÃO
Acadêmico, neste Tópico 2 da última unidade abordaremos a Política Exterior
dos primeiros anos após ter finalizado o último governo civil-militar do Regime Militar do
Presidente João Figueiredo. O repasse da presidência foi marcado pelo adoecimento
muito grave do Presidente eleito Tancredo Neves um dia antes da posse do dia 15 de
março de 1985. Em função disso o vice-presidente eleito José Sarney tomou posse
nesse dia como “Presidente Interino”. Logo após algumas semanas, no dia 21 de abril
de 1985, Tancredo Neves veio a falecer, logo, em termos práticos o período presidencial
do Presidente José Sarney foi desde o dia 15 de março 1985 até 15 de março de 1990.

Esses cinco anos no contexto da Política Externa Brasileira foram marcados


pelas negociações intensas para mitigar o agravamento da crise da dívida externa e
pela continuação do processo de integração regional com os países da América do
Sul, especialmente com os da Bacia do Prata que para 1991 iriam criar o MERCOSUL.
O Presidente Sarney, assim como seu antecessor, o Presidente Figueiredo, tinha uma
visão do Brasil como país continental com uma clara posição de potência regional que
poderia liderar a integração econômica e comercial entre os países da América do Sul.

Nesse contexto de aproximação e integração entre os países Latino-americanos,


especialmente da América do Sul, entre 1985 e 1990 existia um caminho de continuação
de mais de três décadas desde o Presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), da PEI
dos presidentes Jânio Quadros e João Goulart (1961-1964), e dos presidentes do Regime
Militar (1964-1985). Esse processo de integração abordava dois eixos de ação por parte
do Brasil, a região da Bacia do Amazonas e da Bacia do Prata.

O processo de integração dos países da Bacia do Amazonas conformou a região


norte da América do Sul, desde o nascimento desta Bacia na vasta cordilheira dos
Andes até os países que fazem parte da Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Porém,
esse processo de integração nunca passou de um acordo simbólico, conforme veremos
neste tópico. Por outro lado, o processo de integração da Bacia do Prata teve maior
concretização e deu como resultado a criação do MERCOSUL, cujos países fundadores
foram a Argentina, o Brasil, o Paraguai e o Uruguai, e como nações associadas a Bolívia e
o Chile. Hoje, o MERCOSUL além dos quatro países fundadores a Venezuela se integrou
desde 2012, mas foi suspensa em função da ruptura da ordem democrática. E como
países associados ao MERCOSUL está praticamente toda a América do Sul, exceto a

179
Guiana Francesa. E além dos países fundadores/membros - Argentina, Brasil, Paraguai
e Uruguai, e a Venezuela que pelo momento está suspensa -, toda o resto da América do
Sul estão no MERCOSUL como países “associados”, exceto a Guiana Francesa.


2 SUL-AMERICANIZAÇÃO

A Sul-americanização foi uma característica importante da Política Externa do


Presidente Sarney a qual aconteceu enquanto se apresentava o forte peso da crise
de dívida externa e pressões inflacionárias fortíssimas. Vale a pena observar que essa
fortíssima pressão inflacionária não era somente um problema do Brasil, praticamente
todos os países da América Latina tiveram que confrontar isso, uns mais outros menos.

Durante os anos de 1980 uma grande parte dos países da região viu suas dívidas
externas se duplicarem, inclusive triplicarem, em função do drástico aumento das taxas de
juros internacionais como desdobramento da crise econômica de 1980 nos EUA e do resto
do mundo. Os países da América Latina além de terem suas dívidas externas aumentarem
drasticamente também tiveram que suportar a queda dos preços de suas exportações, aliás,
maioritariamente commodities. Esses dois fatores, maior peso das obrigações financeiras
externas e queda nas exportações, implicou um aumento na saída de divas, para cumprir as
obrigações externas, e uma queda na entrada líquida do comércio exterior, menos entrada
de divisas das exportações. O resultado disso foi uma crise já crônica da dívida externa e
uma queda drástica no Balanço de Pagamentos ao longo dos países da região.

ATENÇÃO
Sabe qual a importância do Balanço de Pagamentos para a estabilidade do mercado de
câmbio de um país? O Balanço de Pagamentos é o saldo líquido da entrada e saída de
divisas, isto é, o saldo líquido da Balança Comercial (Exportações -
Importações) + Rendas (entrada de receitas do exterior – pagamento
de juros da dívida externa e lucros gerados por filiais de empresas
externas estabelecida no país) + Conta de Capital (entrada de capitais
financeiros e de investimento direto - saída de capitais) + Capitais
Compensatórios. Nesse sentido, se houver uma redução do Balanço de
Pagamentos (ou uma perspectiva disso), geralmente contabilizado em
US$, irá impactar na taxa de câmbio, acontecendo uma desvalorização
da moeda nacional.

O resultado de déficits constantes no Balanço de Pagamentos implicou uma


forte desvalorização das moedas dos países Latino-americanos e se acrescentar as
fortes crises econômicas internas destas nações com déficits primários constantes (os
governos gastavam mais do que entrava por conceito de impostos e demais receitas
públicas), o resultado foi uma forte pressão inflacionária espalhada desde o México

180
até a Argentina. Muitos dos países da região acabaram com processos inflacionários
sistêmicos que terminaram em hiperinflações, conforme a BBC BRASIL (2018): a
Argentina, 197% ao mês em 1989; o Peru, 397% ao mês em 1990; a Nicarágua, 261% ao
mês em 1986; a Bolívia, 183% ao mês em 1985; entre mais outros países. No Brasil não
foi muito diferente, segundo a G1 ECONOMIA (2021) no país o processo hiperinflacionário
atingiu seu ápice no ano de 1990 com taxas acima de 80% ao mês!

Foram cerca de 15 anos de inflação acima de dois dígitos e de


correção monetária. Comerciante remarcavam diariamente os
preços dos produtos, que sumiam rapidamente das prateleiras, já
que a população estocava alimentos por temer as sucessivas altas.
Preços e salários eram reajustados automaticamente assim que era
divulgada a inflação do mês anterior, criando o efeito 'bola de neve', em
que a inflação de um mês era imediatamente repassada para o mês
seguinte. Quem mais perdia com isso eram os mais pobres, que não
podiam se defender das perdas colocando o dinheiro em aplicações
que rendessem juros diários e acompanhassem a desvalorização da
moeda (G1 ECONOMIA, 2021, n.p.).

O resto dos países, não mencionados acima, embora não terem atingido o
patamar de uma “hiperinflação” tiveram inflações médias de dois dígitos durante essa
época e constantes desvalorizações de suas moedas. O resultado foi a conhecida década
perdida de 1980, época na qual os países tiveram taxas de crescimento medíocres,
empobrecimento da renda média, perda de competitividade, crises fiscais constantes,
falta de investimento etc.

Os anos 1980, na América Latina, ficaram conhecidos como “a década


perdida”, no âmbito da economia. Das taxas de crescimento do PIB
à aceleração da inflação, passando pela produção industrial, poder
de compra dos salários, nível de emprego, balanço de pagamentos
e inúmeros outros indicadores, o resultado do período é medíocre.
No Brasil, a desaceleração representou uma queda vertiginosa nas
médias históricas de crescimento dos cinquenta anos anteriores.
(IPEA, 2012, n.p.).

Embora desse fator muito negativo no contexto de desenvolvimento econômico,


durante esse mesmo período os países da região passaram por vários processos políticos
que consolidaram as suas democracias conforme as particularidades e conjunturas da
estrutura política e econômica de cada um deles. Algumas nações passaram de regimes
militares para governos democráticos, nesse sentido, a ditadura na Argentina finalizou
em 1983, a do Brasil em 1985, a do Uruguai em 1985, a do Chile em 1990. Como em
muitas coisas da vida, por um lado se perde e por outro se ganha, no livro “Os ganhos da
década Perdida” a cientista política Maria Izabel Mallmann procura ilustrar alguns desses
“ganhos” da década perdida.

Pode-se dizer que a democracia foi um dos ganhos políticos da


década economicamente perdida. [...] Outro ganho foi o surgimento
e consolidação de um espaço regional de coordenação de políticas,
cujos desdobramentos positivos ainda se fazem presentes. Apesar

181
das dificuldades, a década de 1980 foi marcada por acontecimentos
relevantes no que diz respeito à aproximação dos governos latino-
americanos (IPEA, 2012, on-line).

Conforme a autora as extremas dificuldades de cunho econômico que a


região passou, houve algumas consequências positivas, entre elas a necessidade de
“aproximação entre os estados latino-americanos” diante a severa crise espalhada na
região. O presidente Sarney tinha claro que o Brasil deveria intensificar esse processo
de aproximação que, aliás, teve seus fundamentos intelectuais lá na década de 1950
na operação Pan-Americana (OPA) durante o governo do Presidente JK (1956-1961).
Nesse contexto, desde essa época o Brasil já tinha aberto dois eixos de aproximação:
dos Países da Bacia do Amazonas, que não passou de uma boa intenção; e dos países
da Bacia do Prata, que foi além das intenções para uma integração real.

No contexto do eixo dos países que fazem parte da Bacia da Prata, o Presidente
Sarney estava ciente de que primeiro dever-se-ia afirmar ainda mais as boas relações entre
a Argentina e o Brasil, que, aliás, vinham melhorando desde o apoio do Brasil à Argentina na
Guerra das Malvinas em 1982. Essa necessidade de afirmar mais ainda as relações com a
Argentina veio acontecer com a declaração de Iguaçu de novembro de 1985.

A Declaração de Iguaçu marcou, assim, o início da integração


econômica Brasil-Argentina. O passo seguinte foi a assinatura da
Ata de Integração Brasileiro-Argentina, que estabeleceu, em julho de
1986, o Programa de Integração e Cooperação Econômica (Pice) e o
Protocolo de Cooperação Nuclear. Nesse mesmo ano, o Uruguai uniu-
se ao Brasil e à Argentina e, posteriormente, foi a vez do Paraguai
(LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 153).

Após da declaração de Iguaçu começou um processo da integração mais efetiva


entre os países da Bacia do Prata que se materializou com criação do MERCOSUL em
1991 durante o governo do Presidente Collor de Meio. Embora o MERCOSUL esteja ainda
longe de criar uma integração política e econômica do contexto da União Europeia, é
um processo integração que vem acontecendo e que já conta com uma integração de
livre comércio ativa há vários anos entre seus países membros. E no contexto do vasto
território da América do Sul o MERCOSUL conta como associados a todos os países da
região, exceto a Guiana Francesa.

A formalização do MERCOSUL em 1991 aconteceu graças a um longo processo


de aproximação desde antes mesmo do Regime Militar e da PEI conforme visto. Mas
com o retorno do regime democrático em 1985 e com a elaboração da constituição de
1988, vigente até os dias de hoje, se consegue observar de maneira mais efetiva essa
integração e continuidade da Política Externa Brasileira, independentemente do tipo de
governo que esteja no comando do Estado Brasileiro. Isso podermos observar nos 10
princípios descritos no artigo nº 4 da Constituição de 1988, inclusive ao final do artigo nº
4 há um parágrafo que valoriza a integração dos povos da América Latina.

182
QUADRO 2 – ART. Nº 4 DA CONSTITUIÇÃO FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos
seguintes princípios:

I. independência nacional;
II. prevalência dos direitos humanos;
III. autodeterminação dos povos;
IV. não-intervenção;
V. igualdade entre os Estados;
VI. defesa da paz;
VII. solução pacífica dos conflitos;
VIII. repúdio ao terrorismo e ao racismo;
IX. cooperação entre os povos para o progresso da humanidade;
X. concessão de asilo político.

Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica,


política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma
comunidade latino-americana de nações.

FONTE: <https://bit.ly/3toWoMO>. Acesso em: 15 jan. 2022.

Essa visão marcada oficialmente na Constituição de 1988 é mais um reflexo da


continuidade dos princípios da Política Exterior já abalizada desde a época do Barão
do Rio Branco de princípios do século XX. E no contexto dos países desenvolvidos,
especialmente com os EUA, como foram as relações tradicionais do Brasil após o
Regime Militar? Como resultado da crise econômica da década de 1980 e, em seguida,
a eclosão da crise da dívida externa as relações com a maior potência econômica do
mundo ficaram um pouco perturbadas e com interesses divergentes.

Nas relações com os Estados Unidos, o Brasil esperava o fim do


protecionismo a suas indústrias obsoletas, recursos financeiros e
transferência de tecnologia, apoio na negociação da dívida e acordos
sobre commodities. Os norte-americanos, por sua vez, aguardavam a
liberalização do mercado da informática, a redução do protecionismo,
a ampliação dos direitos às empresas estrangeiras, a privatização das
estatais, a eliminação de subsídios às exportações e a negociação
da dívida externa por meio de mecanismos de mercado (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 156).

Neste sentido, por um lado, o Brasil desejava apoio no processo de negociação


da dívida externa, e melhores condições tanto para suas exportações tradicionais de
commodities (que tinham sofrido uma queda forte a partir da crise de 1980) como para
alguns produtos com maior geração de valor que o Brasil desejaria ter exportado aos
EUA, mas que esse país não desejava em função ao protecionismo de suas indústrias
nas quais o Brasil pudesse competir. Ambas as questões – renegociação da dívida
externa e exportações – recebem críticas para estabilizar o Balanço de Pagamentos
(entrada líquida de divisas) e assim mitigar o processo inflacionário muito acelerado da
época. Por outro lado, o Brasil desejava melhores condições para importar tecnologia e
assim melhorar a competividade relativa do país.

183
Interesses semelhantes brotavam no resto dos países Latino-americanos. Nesse
sentido, a forte crise da dívida externa fez com que os países da região apresentassem
uma posição de interesses similares ante os EUA e o resto dos países desenvolvidos.
Daí mais um motivo para o Brasil se aproximar a vizinhança. Essa aproximação que
fez o Brasil com o resto da América Latina foi feita desde uma posição de liderança,
dado o fato de se identificar no cenário internacional como uma nação de proporções
continentais e de potência regional. Nesse sentido, o Brasil tinha bastantes interesses
comuns com seus vizinhos, tais como a exportações de commodities para os países
desenvolvidos e importação de tecnologia de ponta, mas tinha interesses próprios de
sua condição de ser um país que também tinha um setor industrial relativamente forte
com processos de transformação industrial com maior capacidade de geração valor.

Ou seja, o Brasil dessa época começou a executar uma Política Exterior


desde a perspectiva de uma potência regional e semiperiférica, que tinha uma forte
capacidade para exportar grandes volumes de commodities cujo destino seriam os
países desenvolvidos. Mas também tinha uma alta capacidade de exportar produtos
manufaturados com processos de transformação de pouco valor agregado (ao se
comparar com produtos de alta tecnologia dos países desenvolvidos ocidentais) para os
demais países em desenvolvimento, para os países socialistas do Leste Europeu, para
a Ásia dessa época (pouco desenvolvida ao se comparas com os dias atuais), para os
países africanos, e para o Oriente Médio. Essa seria a posição brasileira no contexto de
seu comércio exterior e aproximação com o resto da América Latina, e no contexto da
geopolítica mundial dessa época?

Para finais da década de 1980 o Brasil, como uma potência regional, era um país
que teve que se adaptar as novas condições da geopolítica mundial onde a URSS estava
começando a colapsar. Devermos nos lembrar que durante esses 30 longos anos após
a Segunda Guerra Mundial os países desenvolvidos (EUA, Europa Ocidental e Japão)
tinham crescido muito tanto em termos econômicos como na capacidade de gerar
inovações e novas tecnologias.

Enquanto isso, nesses mesmos 30 anos os países da “Cortina de Ferro” sob a


liderança e hegemonia da URSS vinham ameaçando e criticando à dinâmica da economia
capitalista, mas tinham se desenvolvido em termos econômicos muito pouco. Esse foi o
sutil equilíbrio da geopolítica mundial, entre duas superpotências (EUA e a URSS) e seus
aliados respectivos. Sutil equilíbrio que por meio da “Guerra Fria” mantinham ao mundo
numa paz relativa, mas assustadora ao mesmo tempo perante a possibilidade de uma
guerra nuclear que em teoria pudesse ter destruído nosso planeta.

Porém, esse sutil e perigoso equilíbrio mundial entre os EUA e a URSS estava
chegando ao final, e de fato para finais da década de 1980 essa constante ameaça
do comunismo estava diminuindo. Como desdobramento isso no contexto regional
das Américas, também estava finalizando a parceria estratégica que o Brasil e mais

184
outros países vinham mantendo com os EUA. Isto é, diante a diminuição de ameaças
do comunismo os EUA começaram diminuir também seu interesse de apoiar ditaduras
de direita na região, mudando sua visão para apoiar mais aos regimes com processos
democráticos e que tenham uma visão de economia aberta.

Nesse novo cenário, o Brasil de finais de 1980 teve que se adaptar e começou
ter parcerias estratégicas com diversos países da nova dinâmica internacional mais
globalizada e menos polarizada entre os EUA e a URSS, nesse sentido seria uma
Política Exterior mais de continuidade do “Universalismo” praticada durante o último
governo do Regime Militar do Presidente João Batista Figueiredo. Isso também
levou ao Brasil e demais países da região para consolidar a “Sul-americanização”
e assim fazer frente a nova ordem mundial, isto é, encarar a globalização como um
“bloco regional”, o MERCOSUL e demais blocos econômicos da região, tal como a
Comunidade Andina (CAN).

3 ABERTURA AO MUNDO E O FINAL DA HIPERINFLAÇÃO

O começo da década de 1990 foi marcado pela queda do poder geopolítico


dos países comunistas de Europa do Leste, ou Cortina de Ferro. O primeiro sintoma
disso foi a queda do Muro de Berlim (novembro de 1989), muro que dividia, literalmente,
a cidade de Berlim entre um mundo ocidental capitalista e um mundo socialista e
comunista liderado pela URSS. Esse muro representava a divisão política da Alemanha
logo da Segunda Guerra Mundial em duas nações, isto é, a Alemanha Ocidental (1949-
1990) e a República Democrática Alemã (RDA) que pertencia aos países da “Cortina de
Ferro”. Logo seguido da queda do Muro de Berlim em 1990 aconteceu a reunificação da
Alemanha, hoje a República Federal da Alemanha. Em termos históricos e geopolíticos,
essa reunificação marcou os começos do fim da hegemonia da URSS na Europa do
Leste e sua influência no mundo.

Depois disso veio o colapso da URSS, em 1991, significando a volta das


repúblicas que conformavam esse vasto território soviético, entre eles a Rússia. Aliás, a
Rússia era a república soviética que tinha o maior peso político, de recursos e territórios
dentro do contexto da ex-URSS. Ainda depois da desintegração da URSS sua maior
república, a Rússia, é o país mais extenso do mundo, mas quanto? Para que tenhamos
uma perspectiva disso, a Rússia é 2 vezes maior que o Brasil, e a ex-URSS era 2,6 vezes
maior. Enfim, essa dissolução da URSS marcou o final de um mundo que se mantinha
em equilíbrio geopolítico entre duas superpotências (EUA e URSS), e o desdobramento
disso significou que durante a década de 1990 e começos do século XXI os EUA
viraram a única superpotência mundial, resultado? A intensificação, sem resistência, da
globalização de uma economia de mercado.

185
Nesse contexto, o processo de globalização mundial que já se vinha intensificando
na década de 1980 veio para ficar. Nesse contexto, o Brasil do Presidente Collor (1990-
1992) começa seu governo perante a necessidade de iniciar uma abertura econômica
de um Brasil que em términos econômicos era bastante fechado e que estava em um
processo de hiperinflação praticamente já sistémico. É assim que começa a se estruturar
a Política Exterior da última década do século XX, década de abertura econômica e
de fortalecimento de blocos econômicos regionais para fazer frente à dinâmica dos
mercados internacionais, nesse contexto temos o fortalecimento da União Europeia
(EU), o nascimento do MERCOSUL, do North American Free Trade Agreement (NAFTA),
e mais outros blocos.

No contexto brasileiro, o processo da abertura do Brasil ao contrário de


outras nações da região foi muito abrupto, expondo em tempo recorde a economia
fechada brasileira à competitividade internacional. Diante disso, muitas empresas
nem conseguiram sobreviver e muitas pessoas perderam sua capacidade de gerar
renda, as consequências foram desastrosas, tanto no contexto econômico como no
político, aliás, foi um dos incentivos para o impeachment de Collor em 1992. Na prática,
a abertura econômica de uma economia que vinha se acostumando ao protecionismo
de sua indústria perante uma demanda doméstica relativamente grande, mexeu com as
estruturas socioeconômicas brasileiras dessa época.

O Brasil de começos de 1990 traz quase 60 anos de continuar com uma política
de desenvolvimento e protecionista da indústria nacional, desde a era Vargas (cujo
objetivo era desenvolver a indústria nacional), tinha produzido um forte setor industrial,
porém, era também uma indústria fechada e protegida diante a concorrência externa.
A dinâmica de protecionismo da indústria nacional estava em função da constante
desvalorização da moeda e da política de substituição de importações. O efeito de
ambos os fatores fazia que os produtos importados sejam extremadamente caros
diante as alternativas de produção nacional. Resultado? Produção industrial nacional
ineficiente que produzia mercadoria de qualidade inferior e mais “barata” ao se comparar
aos produtos importados bem mais caros e de melhor qualidade, que aliás existiam no
mercado nacional, mas que eram destinados ao mercado de alto poder de aquisitivo, ou
seja, a classe econômica “A”.

Nesse sentido, o consumidor brasileiro dessa época tinha se acostumado a


uma oferta de produtos de menor qualidade ao se comparar ao que existia no mercado
internacional. Essa era a estrutura do mercado nacional e se o país quitasse esse
excesso de protecionismo à indústria nacional, por meio da valorização relativa da
moeda, redução das tarifas de importação, medidas não-tarifárias, melhores condições
logísticas para importar etc., de maneira abruta o mercado nacional teria a opção de
consumir mercadorias importadas mais baratas e de melhor qualidade das ofertadas
pela indústria nacional que vinham acumulando um grande atraso tecnológico.

186
Porém, isso implicaria o fechamento de muitas empresas industriais e aumento
drástico do desemprego, o que de fato veio acontecer. E se somar a isso o Plano Collor
para combater a hiperinflação por meio do bloqueio da poupança e demissões em massa
dos servidores públicos, e mais outras medidas para reduzir a circulação da moeda, as
consequências foram catastróficas. Aliás, foram as bases para a perda de apoio político
que levou junto a escândalos de corrupção ao impeachment de Collor de 1992.

ATENÇÃO
Veja na reportagem: Planejado contra hiperinflação, plano Collor
deu início à abertura comercial como a abertura comercial estava
vinculado ao combate da hiperinflação de começos da década de 1990

Fonte: http://glo.bo/37EPwT7

3.1 O CONSENSO DE WASHIGTON

Entre 1990 e 1992, no contexto dessa abertura econômica, tanto de mercadorias


com do mercado de capitais, o Presidente Collor diante a sua visão liberal e pressões da
própria dinâmica globalizante do momento liderou as mudanças que há muito tempo
eram desejadas por alguns setores econômicos. Por um lado, o setor industrial – com
uma forte influência política – estava contra da abertura da economia e por outro lado
tanto o setor comercial como o consumidor em geral estavam almejando o aumento da
oferta de produtos importados.

Essa visão da abertura econômica refletida na Política Exterior do Presidente


Collor estava vinculada às diretrizes do Consenso de Washigton, em concordância a
onda neoliberal internacional da década de 1990. Basicamente o Consenso de Washigton
era uma nova visão liberal da economia que criticava as teorias de desenvolvimento que
se vinham aplicando desde a década de 1930 em vários países. Por isso, recebeu a
denominação de onda “neoliberal”.

O consenso de Washington formou-se a partir da crise do consenso


keynesiano [Hicks (1974) e Bleaney (1985)] e da correspondente crise
da teoria do desenvolvimento econômico elaborada nos anos 40 e
50 [Hirschman (1979)]. Por outro lado, essa perspectiva é influenciada
pelo surgimento, e afirmação como tendência dominante, de uma
nova direita, neoliberal, a partir das contribuições da escola austríaca
(Hayek, Von Mises), dos monetaristas (Friedman, Phelps, Johnson),
dos novos clássicos relacionados com as expectativas racionais
(Lucas e Sargent) e da escola da escolha pública (Buchanan, Olson,
Tullock, Niskanen). (BRESSER-PEREIRA, 1991, p. 5).

187
Na América Latina, o primeiro país em aplicar as teorias neoliberais foi o
Chile na década de 1980. Nessa época o ditador Pinochet – quem tinha uma equipe
de economistas de visão neoliberal, os “Chicago Boys” e quem estava alineado às
políticas neoliberais do Presidente Reagan (1981-1989) dos EUA e da Primeira-Ministra
Margaret H. Thatcher (1979-1990) do Reino Unido – aplicou um plano econômico de
cunho neoliberal que marcou o começo de uma onda de políticas neoliberais que seriam
aplicadas em vários países da América Latina no percurso da década de 1990.

Assim, durante o governo do Presidente George H. W. Bush (1989-1993), do


Partido Republicano, quem deu continuidade aos planos neoliberais do Presidente
Reagan, liderou a execução do “Consenso de Washigton” que partia de 10 princípios. O
Objetivo desses princípios visava reduzir o tamanho do estado e o controle da economia
por parte da gestão pública, como também procurava a liberalização do mercado
interacional (com economias menos fechadas). E se acrescentar a isso o colapso da
economia centralizada, fechada e comunista da URSS esses princípios foram a nova
maneira de enxergar a dinâmica econômica de finais do século XX.

QUADRO 3 – OS DEZ PRINCÍPIOS DO CONSENSO DE WASHIGTON

1. Disciplina fiscal;
2. Reordenamento nas prioridades dos gastos públicos;
3. Reforma tributária;
4. Liberalização do setor financeiro;
5. Manutenção de taxas de câmbio competitivas;
6. Liberalização comercial;
7. Atração de investimentos diretos estrangeiros;
8. Privatização de empresas estatais;
9. Desregulamentação da economia;
10. Proteção a direitos autorais.

FONTE: <https://bit.ly/3N5Jyen>. Acesso em: 18 jan. 2022.

Nesse contexto internacional “Neoliberal”, o Presidente Collor fez a mudanças


estabelecidas no “Consenso de Washigton”, porém, sua execução foi abrupta e com falta
de planejamento estratégico perante a severa crise de hiperinflação e dívida externa que
o Brasil estava passando nessa época. Logo após o Impeachment de Collor, seu vice-
presidente Itamar Franco, quem tomaria posse da Presidência da República em 1992,
ciente dos impactos socioeconômicos de uma mudança para uma economia mais aberta
liderou uma estratégia de articulação e gestão política discreta (baixo perfil). Ou seja,
conversando e negociando posições com os líderes tanto políticos como econômicos
para que o Brasil pudesse continuar com o processo de liberação econômica, mas de
maneira gradativa e sem muita atenção por parte da mídia.

No contexto das ações adotadas na gestão da Política Externa o Presidente


Collor teve dois eixos de ação sob um grande objetivo aprimorar a dinâmica do comércio
exterior brasileiro. O primeiro eixo foi afirmar as parcerias tradicionais com o mundo

188
desenvolvido (EUA, Europa Ocidental e Japão), e como segundo eixo foi continuar com
o processo de integração regional da América do Sul. Sobre as parceiras tradicionais
com o mundo desenvolvido, o governo do Presidente Collor procurou investimentos,
visando melhorar a competividade da indústria nacional, assim como tentou atingir
novos mercados para os produtos tradicionais brasileiros. E no contexto da integração
da América do Sul conseguiu a concretização do livre mercado do MERCOSUL.

3.2 A CRIAÇÃO DO MERCOSUL E A RIO-92


A aproximação comercial e econômica com os países que fazem parte da
Bacia do Prata vinha-se articulando há várias décadas, nesse sentido, o Governo do
Presidente Collor continuou com esse projeto. Porém, com um eixo de ação menos
de integração desenvolvimentista e mais para uma integração comercial para atuar no
mercado internacional como um bloco de países regionais abertos ao comércio mundial
diante um mundo mais globalizado.

Sob essa nova visão de um bloco abertos ao mercado internacional, tanto a
Argentina como o Brasil articularam o consenso entre os países da Bacia do Prata
(Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai) para desenhar um mercado livre inter-regional.
No dia 26 de março de 1991 esses países assinaram em Assunção o tratado do mercado
comum, estabelecendo a normativa do Mercado Comum do Sul, ou seja, o MERCOSUL.
A partir da criação do MERCOSUL foram estabelecidas as regras a serem aplicadas para
a execução de um livre mercado entre os países fundadores do MERCOSUL, isto é:
Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.

Essas regras de livre comércio foram normatizadas logo depois por meio da
Tarifa Externa Comum (TEC) no ano de 1995 e que, aliás, vem operando até os dias
atuais. Basicamente a TEC estabelece que entre os países membros do MERCOSUL não
deveria existir tarifas de importação no comércio inter-regional, isto é, entre Argentina,
Brasil, Paraguai e Uruguai. Exemplificando, se uma empresa brasileira importar
mercadoria fabricada na Argentina terá 100% de desconto da Tarifa Externa Comum
(TEC) estabelecida entre os países membros do MERCOSUL, o mesmo acontece com
uma empresa da Argentina, do Uruguai e do Paraguai.

Mas todos esses países membros deveriam aplicar tarifas de importação comuns
extrarregional, ou seja, qualquer mercadoria vinda fora do MERCOSUL deveria ter uma
tarifa de importação semelhante para todos os membros do bloco. Para termos uma
perspectiva do impacto disso, desde que foi implementado a dinâmica de livre mercado
entre os países do MERCOSUL o comércio intrabloco entre os países membros teve em
apenas 6 anos um “crescimento de cerca de 300%.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p.166).

189
Logo da criação do livre mercado entre os países membros do MERCOSUL os
EUA queriam atuar a favor da iniciativa negociando um acordo a favor da integração
comercial. Nesse sentido, os 4 membros fundadores do MERCOSUL firmaram o Acordo
“Jardim de Rosas” no dia 19 de junho de 1991 com o Presidente George W. Bush dos EUA,
acordo que visava aumentar o comércio e os investimentos entre as duas partes. Isto é,
acordo entre o MERCOSUL e os EUA, daí que venho seu nome histórico de “Acordo 4+1
do Jardim de Rosas”.

Conforme a Folha de São Paulo (2001, n.p.):

O processo 4+1 foi estabelecido no acordo do ''Jardim das Rosas''


de 19 de junho de 1991, quando os quatro países do Mercosul
firmaram com o então presidente norte-americano George Bush um
instrumento marco para promover o comércio e os investimentos.

O Acordo 4+1 poderia ser analisado como uma dinâmica de negociação positiva
sobre como os países da região poderiam negociar melhor “em bloque” ante as maiores
economias do mundo, neste caso os EUA. Isso é particularmente beneficioso para es
economias menores, no caso particular do MERCOSUL, para o Paraguai e o Uruguai. E no
caso das economias maiores do bloco, Argentina e Brasil, também permite melhorar suas
estratégias de negociação diante situações de interesse comum diante o competitivo
mercado internacional e novas tecnologias de interesse para o desenvolvimento dos
países membros.

No contexto das Américas a criação do MERCOSUL foi um exemplo para iniciar


mais outras iniciativas de blocos para o livre comércio. Os EUA logo de ter negociado o
“Acordo 4+1” lançou a iniciativa do Acordo de Livre Comércio da América do Norte
(NAFTA), o qual abrange os três países que fazem parte da América do Norte, isto é,
Canada, EUA e México. O NAFTA foi criado oficialmente em janeiro de 1994 atuando
como um dos maiores blocos de livre comércio do mundo até os dias de hoje.

Da mesma maneira, nessa onda de livre comércio de finais do século XX os


países da região andina de América do Sul formaram sua própria região de livre comércio
conhecida como a Comunidade Andina (CAN), e a zona de livre comércio da CAN tem
sua Tarifa Externa Comum (TEC) estabelecida desde 1994. Foram membros fundadores
da CAN todos os países andinos (Bolívia, Colômbia, Equador e Venezuela), expecto o
Chile que atua até os dias de hoje como membro associado. A Venezuela saiu do bloco
em 2006 em função de discrepâncias de interesses geopolíticos do Presidente Hugo
Chávez da Venezuela com os outros membros da CAN.

Além de focar na melhoria comércio exterior brasileiro, o Presidente Collor
teve a iniciativa para que o Brasil seja sede da Conferência das Nações Unidas sobre
o Meio Ambiente e o Desenvolvimento em junho de 1992, conhecida como RIO-92. A
Conferência foi sediada na cidade de Rio de Janeiro com a presença de mais de 100

190
chefes de Estado. No RIO-92 foi assinado os seguintes acordos: a Carta da Terra, a
Declaração de Princípios sobre Florestas; a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento; e A Agenda 21. Em termos de imagem internacional, o Brasil ficou
como uma das principais nações a terem uma iniciativa proativa ante o impacto ao meio
ambiente da atividade econômica das nações. Assim, a RIO-92 tornou-se um marco
histórico no que tange no processo de conscientização das nações perante os impactos
ao Meio Ambiente e Mudança Climática que estão ameaçando o planeta.

ATENÇÃO
Deseja de aprofundar sobre a RIO-92? Acesse ao artigo: ECO-92: o que
foi a conferência e quais foram seus principais resultados?

Fonte: https://www.politize.com.br/eco-92/

Depois da ECO 92, houve uma série de processos de conscientização global


dos impactos das atividades econômicas no meio ambiente. E o Brasil como país
de proporções continentais que tem a maior floresta tropical do mundo, a Floresta
Amazónica (60% dela fica no Brasil), vem sendo um país líder na luta contra a mudança
climática e proteção ao meio ambiente. Inclusive no Acordo de Paris do ano 2015, onde
o Brasil foi uma das nações que liderou as negociações, os países se comprometeram
para conter o aquecimento global entre 1,5 ºC até 2 ºC.

Porém, nestes últimos anos o Brasil sob a liderança do Presidente Bolsonaro


entrou no grupo de países que negam a existência de um aquecimento climático. Nesse
contexto, o Brasil, por enquanto, desistiu em avançar nesse grande desafio do Acordo
de Paris. Contudo, o Brasil apesar de desistir em avançar nesse processo de mitigar a
mudança climática é considerado um país com grande potencial, especialmente no que
tange à transição energética, conforme a revista MIT Technology Review Insights (2021)
o Brasil fica na posição 17ª. Posição catalogada, segundo a revista, como dos países
“green leaders”.

191
FIGURA 2 – O ÍNDICE DO FUTURO VERDE

FONTE: <https://bit.ly/3Jtx6TB>. Acesso em: 17 fev. 2022.

Levando em consideração esse bom posicionamento do Brasil e embora


haja discrepância no governo de turno em relação à mudança climática, o Brasil é
considerando um país com grande potencial, sob uma perspectiva de longo prazo.
No contexto econômico isso representa grandes oportunidades, especialmente no
que tange à transição energética para energias renováveis. E no contexto histórico
desde a Rio-92, que aconteceu durante o governo do Presidente Collor, o Brasil foi
referência mundial na iniciativa de acordos multilaterais em relação ao meio ambiente
e à mudança climática.

Em resumo, durante o curto governo do Presidente Collor houve acertos


e equívocos. Por um lado, Collor tinha prometido dar conta da Hiperinflação, mas
ela continuou seu percurso destrutivo sem uma clara perspectiva de como o Brasil
iria sair dela. Por outro lado, o Presidente Collor deu os primeiros passos para que o
Brasil possa abrir sua economia muito fechada ao mundo. Assim como no contexto da
integração comercial regional, durante a presidência dele aconteceu a criação formal do
MERCOSUL. E ocorreu a Rio-92, um grande evento que marcou um antes e um depois
nesse processo de conscientização global sobre os impactos ao meio ambiente. No
contexto do comércio internacional, além do MERCOSUL, o Brasil conseguiu se abrir
para o mercado global. No curto prazo isso trouxe desconforto do setor industrial e
aumento drástico do desemprego, mas no longo prazo permitiu ao Brasil entrar nesse
novo mundo mais globalizado e orientado a uma inter-relação comercial na cadeia
produtiva internacional.

192
Logo do impeachment, o vice-presidente Itamar Franco tomou posse da
Presidência da República, governando o Brasil desde 1992 até 1995. Sendo um governo
de transição, a gestão do Presidente Itamar Franco teve uma gestão de governo de
perfil “discreto”. Contudo, seu governo teve uma alta capacidade de articular assuntos
urgentes para a nação, exemplo disso foi a hiperinflação que durante sua gestão teve
seus dias contados.

3.3 O FINAL DA HIPERINFLAÇÃO

Provavelmente o assunto mais importante do governo do Presidente Itamar


Franco tenha sido o combate efetivo contra a hiperinflação e dar ao Brasil os começos
de uma era de moeda estável, o Real. Isso foi feito junto ao seu ministro de economia
Fernando Henrique Cardoso (FHC) e sua equipe de economistas que planejaram o Plano
Real. A execução do Plano Real, logo de uma intensa articulação política e econômica,
contou com o apoio da sociedade brasileira. Os efeitos positivos se sentiram no
bolso da família brasileira que aos poucos começou sentir que sua renda não perdia
drasticamente mais seu poder aquisitivo e que com isso conseguiria planejar suas
necessidades e desejos de curto e longo prazo. Vejamos a seguir um gráfico histórico da
pressão inflacionária do Brasil.

GRÁFICO 2 – INFLAÇÃO HISTÓRICA DESDE 1945-1995

FONTE: <https://bit.ly/3D0AO4K>. Acesso em: 21 jan. 2022.

193
GRÁFICO 3 – TAXA DA INFLAÇÃO (IPCA, 12 MESES, %) ANOS 1994 E 1995

FONTE: <https://bit.ly/3Ni6Xtl>. Acesso em: 21 jan. 2022.

No Gráfico 3, consegue-se observar o como a pressão inflacionária foi


aumentando até os começos da década de 1970. Porém, foi a partir do fim do “Milagre
Econômico” em 1974 que a pressão inflacionária aumentou bem mais do que se vinha
acostumando-se no Brasil até se converter em um processo hiperinflacionário durante
o Governo do Presidente Sarney (1985 -1990). Foi somente a partir da execução do
Plano Real que a hiperinflação, já sistêmica, começou baixar até chegar para patamares
adequados necessários para o processo de implantação da nova moeda brasileira
que, aliás, está vigente até os dias atuais, o Real. Essa inflação sob o controle deu a
estabilidade econômica necessária para executar uma série de medidas que deram
ao Brasil uma boa base de crescimento para começar o século XXI, conforme iremos
estudar no último tópico desta unidade.

Estamos chegando ao final de nossos estudos deste tópico, revise os temas


mais importantes com a ajuda de Resumo do Tópico 1. Depois disso, não deixe de realizar
as autoatividades! Vejo você no Tópico 2, até mais.

194
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• No processo de transição para o regime democrático de 1985, em vigor até os dias


atuais, houve uma continuação da Política Externa, mas com uma especial ênfase no
processo de integração regional.

• A maioria de países da América Latina passou por uma severa crise da dívida externa
na década de 1980, a conhecida década perdida da região. Crise que por um lado
levou ao empobrecimento da população, mas por outro, ajudou à consolidação do
processo de integração regional.

• No final da década de 1990, com o fim da Guerra Fria e da desintegração da URSS,


levou o mundo à intensificação da globalização.

• O Governo de Collor iniciou o processo de abertura econômica do Brasil. Mas isso foi
feito sem planejamento estratégico, sem consenso nacional e de maneira abrupta.
Isso resultou em uma severa crise econômica e continuação da hiperinflação,
contudo, propiciou o início do processo de abertura econômica e comercial.

• O Governo de transição do Presidente Itamar Franco continuou com o processo


de abertura econômica, mas articulando posições entre os agentes econômicos
e políticos na nação e assim viabilizar abertura econômica mais estratégica e
menos abruta.

• O Presidente Itamar Franco, junto a seu ministro de economia Fernando Henrique


Cardoso, iniciou a execução do Plano Real que finalmente deu fim a hiperinflação
crônica, permitindo entre outras coisas um processo de abertura mais articulado,
estável e menos impactante à indústria nacional.

195
AUTOATIVIDADE
1 Na década de 1980 o Brasil passou por uma severa crise de dívida externa, severas
crises que também aconteceram ao longo da América Latina, foi a conhecida
década perdida da região. Época na qual a maior parte dos países latino-americanos
passaram por processos inflacionários fortes, inclusive alguns iniciaram processos de
hiperinflação, como foi o caso da Argentina, o Brasil, o Peru e mais outros. Sobre essa
década perdida, é correto dizer que:

a) ( ) A maioria de países regrediram tanto no contexto econômico como político, pois


além da severa crise econômica muitos passaram de regimes democráticos para
ditaduras militares.
b) ( ) Embora da década perdida no contexto de desenvolvimento econômico, a
América Latina teve ganhos políticos. Pois houve consolidação da democracia
e alguns que vinham de regimes militares tinham recuperado o processo
democrático, exemplo disso foi a Argentina, o Brasil, o Chile e mais outros.
c) ( ) A década perdida não somente foi no contexto do desenvolvimento econômico, mas
também com intensificação da globalização muitos países da região não estavam
preparados para esse boom de um mundo globalizado que só ajudou a empiorar as
condições precárias do processo democrático das nações da América Latina.

2 No contexto internacional a década de 1980 é conhecida como o começo da


intensificação da globalização, que logo na última década do século XX foi espalhada
praticamente para todos os países do mundo, incluindo os da Cortina de Ferro. Sobre
a globalização, desse período é correto dizer que:

a) ( ) Na década de 1980 com a liderança dos governos conservadores tanto dos EUA
sobe a presidência do republicano Ronald Reagan como da primeira-ministra
do Reino Unido Margaret H. Thatcher houve uma mudança de perspectiva
econômica que intensificou a globalização.
b) ( ) O primeiro país em iniciar uma dinâmica de abertura econômica foi o Chile,
durante os anos 80, sob a ditadura de Pinochet, quem tinha uma equipe de
economistas de cunho neoliberal que estruturam as bases para um Chile mais
aberto ao mundo.
c) ( ) O Brasil começou sua abertura econômica desde 1985 no governo do presidente
Sarney quem começou o processo, porém, sem sucesso diante a crise da
hiperinflação que devorava o salário do brasileiro.
d) ( ) Embora os anos 80 foram o começo da intensificação da globalização, foi a partir
da virada desse década que começou esse processo a se manifestar de maneira
mais acelerada, diante a desintegração da URSS que abriu o caminho para que os
países da Europa do Leste iniciarem um processo de abertura ao mundo capitalista,
e dando passo a hegemonia dos EUA como a única superpotência desse período.

196
Destas sentenças, quais são verdadeiras:

a) ( )V-V-F-V
b) ( )F-V-F-V
c) ( )F-V-V-F
d) ( )V-F-F-V

3 O processo de abertura da economia brasileira começou durante o governo do


Presidente Collor. Isso aconteceu logo de mais de 6 décadas de que o Brasil passou
por um processo desenvolvimentista, que embora deu as bases para uma indústria
nacional forte, também deu um processo de sobre proteção dessa indústria, dando
passo para o que se conhece como uma economia fechada ao comércio internacional.
Sobre a abertura econômica iniciada pelo presidente Collor, é correto afirmar que:

I- Graças a abertura econômica iniciada pelo Presidente Collor o Brasil finalmente


começou uma época de estabilidade, pois foi no seu governo o fim da hiperinflação
que estava mantado o bolso do brasileiro.
II- Embora o presidente Collor deu os primeiros passos para a abertura econômica,
sua iniciativa foi sem planejamento e abruta, nesse sentido as condições
socioeconômicas do Brasil só ficaram pior e a hiperinflação continuou firme.
III- O custo político dessa iniciativa de abertura econômica abruta foi uma das bases para
o processo de impeachment do presidente Collor, porém, a abertura econômica já
tinha iniciado. Depois disso, foi sob a articulação do presidente interino Itamar Franco
e logo depois com a presidência de FHC que o processo de abertura econômica foi se
estruturando e se estabilizando graças entre outras coisas ao Programa do Plano Real.

Destas sentenças, é correto afirmar que:

a) ( ) Somente a sentença II é a correta.


b) ( ) Somente a sentença I é a correta.
c) ( ) As sentenças II e III são as corretas.
d) ( ) Somente a sentença III é a correta.

4 Após o impeachment do Presidente Collor, seu vice-presidente, Itamar Franco,


tomou posse da Presidência da República em dezembro de 1992. Seu governo deu
continuidade à abertura econômica iniciada pelo Presidente Collor, mas ele tomou
uma diferente atitude perante esse grande desafio. A seguir explique como foi esse
processo de continuidade tanto na abertura econômica como no plano nacional para
finalizar com hiperinflação brasileira.

5 O processo de integração dos países da Bacia do Prata levou décadas para que
pudesse se concretizar. Isso aconteceu de fato no ano 1991 durante a gestão do
presidente Collor com a criação do MERCOSUL. A seguir explique qual foi o foco inicial
do MERCOSUL em 1991, quais foram seus países fundadores e quais são os países
associados deste.

197
198
UNIDADE 3 TÓPICO 3 -
MULTILATERALISMO E CRESCIMENTO
ECONÔMICO

1 INTRODUÇÃO

Caro acadêmico, neste último tópico da Unidade 3, abordaremos o começo de


um Brasil menos fechado ao mundo, sob um cenário mais globalizado e com novos
mercados emergentes no final do século XX. Vamos começar falando sobre o governo
de transição do Presidente Itamar Franco e os efeitos positivos que trouxe o Plano Real,
tanto para acabar com a Hiperinflação, como para executar uma abertura comercial
mais planejada, articulada e menos abrupta, como a feita com o Presidente Collor.

Em seguida, abordaremos o multilateralismo como estratégia utilizada na


Política Externa do Presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) diante uma nova
ordem mundial mais orientada ao mercado internacional, tanto de bens de consumo
como de insumos da cadeia produtiva. Já no começo do século XXI, estudaremos a
Política Externa do Presidente Lula sob uma perspectiva de ativismo internacional e
conjuntura econômica muito favorável para o Brasil com uma inflação sob controle e
com um boom das commodities que perdurou ao longo da primeira década do século
XXI. Esse boom das commodities de começos do século XX resultou para a maioria de
países da América Latina uma década de alto crescimento econômico e diminuição da
pobreza, seja nos governos catalogados como de esquerda ou como de direita.

No contexto da abertura econômica, embora o Brasil de hoje seja ainda


considerado um país relativamente fechado ao comércio internacional, o Brasil de
antes da década de 1990 era ainda mais. Tal configuração é o resultado de décadas
de protecionismo à indústria nacional como estratégia para o desenvolvimento
industrial aplicada desde a Era Vargas da década de 1930. Cabe levar em consideração
que essa estratégia desenvolvimentista foi no seu contexto histórico necessária,
porém, as estratégias desse tipo têm seu tempo de vida útil e precisam se adequar às
novas dinâmicas. Em resumo, o Brasil por mais de meio século tinha se acomodado
ao protecionismo de sua indústria e para finais da década de 1980, o setor industrial
brasileiro, protegido da concorrência externa, precisava aprimorar sua competitividade.
E dessa maneira conseguir melhorar a qualidade do consumo interno e se adequar
a liberalização do comércio internacional, tanto de bens de consumo como da
comercialização mais globalizada da cadeia produtiva.

Para quem nasceu a partir da década de 1990 provavelmente não tem na sua
memória como era o mercado de consumo nacional altamente fechado a oferta de bens
importados, com pouca variedade de escolha, qualidade relativamente baixa e preço
199
relativamente alto ao se compararem aos ofertados no mercado internacional. Somente
as famílias de alto poder aquisitivo que conseguiam viajar para fora do país que tinham
acesso à diversidade de bens de consumo ofertados no exterior. No início da abertura
econômica, o Presidente Collor, “insatisfeito, por exemplo, com os nossos automóveis,
que, segundo ele, pareciam carroças, prometia aos brasileiros o ingresso no primeiro
mundo.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 164).

Porém, a falta de articulação política e planejamento não permitiram ao


Presidente Collor conseguir esse almejo durante seu governo, que, aliás, terminou
abruptamente com o processo de impeachment. Mas foi no governo de transição do
Presidente Itamar Franco e especialmente durante a gestão do Presidente Fernando
Henrique Cardoso que isso foi feito de uma maneira mais articulada e planejada.

2 ESTABILIDADE DA INFLAÇÃO, MULTILATERALISMO E A


NOVA ORDEM MUNDIAL

Durante a gestão do Presidente Itamar Franco a estabilidade nos preços deu


muito prestígio ao ministro de economia da época, Fernando Henrique Cardoso (FHC),
quem entrou no processo eleitoral para ser candidato à Presidência da República. FHC
foi eleito presidente já no primeiro turno e governou ao Brasil durante dois períodos
consecutivos, desde 1995 até 2003. Durante esse período o Presidente FHC afirmou mais
ainda o Plano Real e melhorou a institucionalidade brasileira, dois fatores importantes
para a relativa estabilidade macroeconômica das duas primeiras décadas do século XXI.

No contexto das relações internacionais o Presidente FHC deu continuidade


à abertura econômica, consolidação do MERCOSUL e atuou sob uma dinâmica do
multilateralismo conforme vamos ver nas seguintes páginas. Mas, antes de iniciar nosso
estudo sobre a gestão da Política Externa do Presidente Fernando Henrique Cardoso,
precisamos revisar o processo de transformação profundo na economia brasileira do
Plano Real e da abertura econômica já iniciada desde o curto período da gestão do
Presidente Collor

2.1 CONTINUIDADE DA ABERTURA ECONÔMICA

O objetivo de revisar a afirmação do Plano Real e o processo de abertura econômica


durante o governo do Presidente FHC é ter maior fundamento para compreender melhor
a Política Externa feita nesse período e inclusive depois disso durante o governo do
Presidente Lula, pois existem alguns fatores econômicos a serem considerados na gestão
das relações internacionais durante a primeira década deste século.

200
Conforme vimos nas páginas anteriores o processo de abertura econômica já
tinha iniciado desde o ano de 1991 com o Presidente Collor, porém, esse processo de
abertura ainda precisava de mudanças na estrutura institucional e econômica do Brasil
para que essa abertura pudesse ser bem-sucedida. Isso aconteceu, entre outras coisas,
por meio da a execução do Plano Real cujo objetivo principal era estabilizar a inflação e
continuar com o processo de abertura do Brasil.

Nesse sentido, a seguir revisaremos o Plano Real e seu alinhamento com o


processo de abertura econômica, e desse modo conseguirmos compreender melhor
a Política Externa feita nesse período e inclusive depois disso, durante o governo
do Presidente Lula. Pois desde uma perspectiva histórica, com o início da política
desenvolvimentista da Era Vargas (1930-1945) o Brasil foi estruturando um setor
industrial forte. Porém, em contrapartida para proteger essa indústria, a economia
brasileira foi se fechando à concorrência externa de produtos importados.

Isto é, uma economia baseada em um mercado de consumo bastante forte


(mais de 210 milhões de pessoas atualmente) onde a indústria nacional tinha um forte
protecionismo contra a concorrência internacional, conforme vimos anteriormente.

Nesse sentido, durante todas essas décadas de política desenvolvimentista, a


partir de 1930 até a década de 1990, a indústria nacional ia precisando atualizar seus
processos de transformação conforme iam se apresentando avanços tecnológicos
necessários para esses processos industriais. Porém, esses avanços tecnológicos iam
se incorporando à indústria nacional de maneira gradativa e não de maneira continua,
ou espontânea, como acontece no mercado internacional.

Ou seja, perante o fechamento da economia nacional a indústria nacional a cada


certo tempo precisava importar as novas tecnologias com o objetivo de adequar a dinâmica
protecionista da indústria nacional que, aliás, tinha uma forte blindagem perante a oferta de
produtos do mercado internacional que tinham avanços tecnológicos de maneira continua.

Essa foi a dinâmica industrial até os começos de 1990, mas a partir daí houve
uma enxurrada de oferta de produtos importados com preços mais competitivos ao se
comparar com os de produção nacional. Nesse sentido, a indústria nacional teve que
concorrer de um dia para outro com um leque de produtos importados. Perante isso,
houve a necessidade de planejar essa abertura do Brasil, processo de planejamento
desenhado durante os governos de Itamar Franco e FHC, ainda assim houve fortes
impactos sociais, perda de desempregos e muitas empresas fechando

Porém, foram impactos que iam se compensando com uma melhoria no


consumo (produtos importados começaram a concorrer coma oferta nacional), com
uma dinâmica de melhoramento da competitividade das empresas que conseguiram
sobreviver e com processos de abertura de novas empresas inovadoras que iam se
adequando a nova realidade.

201
Assim, a abertura econômica aos poucos ia criando mudanças estruturais nos
processos de transformação, tais como uma cultura de inovação e aprimoramento
contínuo, assim como ia aprimorando a própria dinâmica do comércio exterior brasileiro.
O governo de FHC para melhorar a competitividade da indústria nacional e para que
as empresas nacionais pudessem se adequar à concorrência de produtos importados
executou algumas políticas econômicas. Uma delas foi a Política de Competitividade
Industrial, a qual teve quatro importantes programas.

QUADRO 4 – OS QUATRO PROGRAMAS DA POLÍTICA DE COMPETIVIDADE INDUSTRIAL DE 1995

• FIDES (beneficia as empresas que criarem empregos e melhorarem as condições de vida


e de trabalho de seus empregados);
• FIDEC (estímulos para a criação de recursos visando o desenvolvimento econômico e
tecnológico);
• PITE (parceria entre institutos de pesquisa e empresas);
• PIPE (estimula pesquisas inovadoras e com alto potencial de retorno econômico em
empresas de base tecnológica com até 100 empregados)

FONTE: <https://bit.ly/3KTZK0i>. Acesso em: 24 jan. 2022.

O embasamento teórico desses Programas e mais outros, foram desenvolvidos


a partir dos conceitos das “vantagens comparativas das nações” assim como das
ideias do economista Schumpeter de começos do século XX. Nas suas análises,
o economista Schumpeter já visualizava há mais de um século as ameaças que
pudessem suportar setores industriais protegidos de empresas com maior nível de
competitividade relativa, segundo ele:

O impacto das inovações – novas técnicas, por exemplo – sobre a


estrutura de uma indústria reduz consideravelmente o efeito a longo
prazo e a importância de práticas que visam, através da restrição da
produção, à conservação de posições tradicionais e à exploração
ao máximo dos lucros que nelas se baseiam. Devemos admitir
ainda que práticas restritivas desse tipo, enquanto conservarem a
eficácia, adquirem uma nova significação na tempestade eterna da
destruição criadora, uma significação que não teriam num estado
estacionário ou numa fase de crescimento lento e equilibrado. Em
ambos os casos, a estratégia da restrição produziria apenas um
aumento dos lucros às custas dos compradores, exceto nos casos
de progresso equilibrado., em que poderia ser ainda o meio mais fácil
e eficiente de acumular meios para financiar novos investimentos
(JUNGMANN, 1961, p.114).

Em uma linguagem mais coloquial e adaptado ao contexto brasileiro, os


conceitos do economista Schumpeter queriam dizer que as indústrias protegidas ficaram
no seu canto de conforto por muitas décadas, se acostumando a ter margens de lucro
excessivos à custa dos consumidores, assim como tinham pouco incentivo para realizar
investimentos em nova tecnologia e inovação, pois a competitividade externa era

202
mínima. Nesse contexto, quando veio a abertura econômica da década de 1990 essas
indústrias acostumadas a seu canto de conforto tiveram que acordar e concorrer com
um leque de produtos de maior qualidade vindos do mercado internacional, produtos
importados que tinham maior variedade, melhor qualidade e preços competitivos.

Como o economista Schumpeter já refletia há mais de um século, a concorrência


entre empresas cria uma “tempestade eterna da destruição criadora”, “tempestade” na
qual algumas empresas fecham suas operações e aumentam o desemprego nacional.
Porém, em compensação outras se adaptam e conseguem sobreviver e ainda se abre a
oportunidade de criar empresas e novos empregos. Isso foi o que aconteceu no processo
de abertura da década de 1990 e, aliás, está acontecendo de novo nesta década do
2020 onde as rápidas mudanças tecnológicas estão abrindo muitas oportunidades
em diversos setores, porém, muitos negócios não estão conseguindo sobreviver. Eis a
necessidade de o “Estado” criar políticas econômicas que incentivem a competividade.

Em resumo, o governo de FHC queria criar um ambiente para que as empresas


tivessem que acordar, concorrer e sobreviver, porém, também queria oferecer ajuda às
empresas que desejassem se adequar às novas condições de um mercado nacional
mais aberto à concorrência externa. Nessa época, muitas empresas fecharam, outras se
adaptaram e melhoraram sua competitividade e outras novas foram criadas. Esse novo
ambiente empresarial com maior presencia da concorrência externa foi acompanhado
com uma taxa de câmbio estável, inclusive de valorização do Real.

A estabilidade da taxa de câmbio fazia parte de execução do Plano Real, fazendo


que as empresas nacionais não pudessem aumentar seus preços além dos preços dos
produtos importados. Nesse sentido, a abertura econômica fazia parte do programa
de execução do Plano Real, que ia projetando uma queda gradativa das tarifas de
importação e da inflação. No contexto da abertura econômica, na queda das tarifas de
importação no Brasil foi se incorporando à execução da Tarifa Externa Comum (TEC) dos
países membros do MERCOSUL, que a partir de 1995 entrou a normatizar as tarifas do
comércio exterior de seus países membros. Qual foi o resultado da TEC?

Além de ajudar na estabilização dos preços, trouxe um aumento significativo


de produtos, com 0% de tarifa de importação, vindos dos outros países membros do
MERCOSUL e produtos com tarifas de importação reduzidas do resto do mundo. O efeito
disso foi uma invasão de produtos intermediários - necessários para o melhoramento
da competitividade da indústria nacional – e de produtos destinados ao consumidor
com qualidade e preços altamente competitivos. Isso ajudou para afirmar ainda mais a
estabilização dos preços e a concorrência no mercado nacional entre produtos nacionais
e importados.

Apesar do grande sacrifício que o Brasil aprontou com a abertura econômica,


muitas empresas foram fechadas, mas para finais da década de 1990 o Brasil tinha
colocado finalmente a inflação sob controle e tinha se estruturado para entrar na

203
dinâmica de um novo cenário internacional bem mais globalizado e competitivo do
século XXI. Isso pode-se conferir com a melhoria da competitividade relativa do Brasil,
para começos do século XX no ano 2001 o ranking de competitividade global do Brasil
estava na posição nº 44, segundo a BBC BRASIL (2006), aliás, o melhor ranking de
competividade até os dias atuais, conforme iremos ver mais adiante. Uma posição muito
boa para um país que vinha de décadas de fechamento econômico.

Devermos observar que os países que conseguem melhorar sua posição no


ranking de competitividade são países que possuem uma competitividade relativa
melhor, melhorando suas probabilidades de ter sucesso em um crescimento econômico
firme e duradouro e terem menos chances de cair em recessões severas. Vejamos a
posição do Brasil em um período mais recente em relação a outros países das Américas,
conforme o Banco Mundial (WORLD BANK, 2021) no ano 2019 os EUA tinham a posição
nº 2, o Chile nº 33, o México nº 48, a Colômbia nº 57 e o Brasil nº71. Isso quer dizer que
desde a época de FHC o Brasil vem perdendo sua competividade relativa, passando
da posição nº 44 em 2001 para nº 71 no ano 2019. Aqui cabe perguntarmos, será que
existe uma correlação dessa perda de competitividade global do Brasil com as crises
e crescimento econômico medíocre do Brasil dos últimos anos? Para responder isso
vejamos um histórico da competividade relativa desde o ano 2007.

FIGURA 3 – BRASIL, RANKING GLOBAL DE COMPETITIVIDADE ENTRE 2007 E 2019

FONTE: <http://glo.bo/3Is0fNE>. Acesso em: 25 jan. 2022.

Se correlacionamos esse índice de competividade global brasileira com os


impactos que vem manifestando a Pandemia do Covid-19 e demais ameaças de a
economia global podermos refletir que o Brasil de hoje (terceira década do século XXI)
precisa melhorar e muito esse índice. Também podermos refletir que com a posição nº

204
44 no ano 2001, o Brasil entrou no século XXI com uma competividade muito boa, o
que permitiu aproveitar muito bem a carona do boom das commodities dessa época,
se refletindo isso, entre outros fatores, no crescimento econômico forte da primeira
década de começos de século durante o governo do Presidente Lula, ajudando a muitos
brasileiros sair da pobreza. Mas quais são os elementos ponderados no ranking de
competividade global? Segundo o Banco Mundial:

O Índice de Competitividade Global analisa a competitividade em


12 pilares: instituições, infraestrutura, ambiente macroeconômico,
saúde e educação primária, ensino superior e treinamento, eficiência
do mercado de mercadorias, eficiência do mercado de trabalho,
desenvolvimento do mercado financeiro, capacidade tecnológica,
tamanho do mercado, sofisticação e inovação nos negócios. Estes
são, por sua vez, organizados em três subíndices, alinhados com
três níveis principais de desenvolvimento: requisitos básicos,
potencializadores de eficiência e fatores de inovação e sofisticação.
Os três subíndices recebem pesos diferentes no cálculo do índice
geral, dependendo do nível de desenvolvimento de cada economia,
como proxy de seu PIB per capita e participação das exportações em
matérias-primas (WORLD BANK, 2019, n.p.).

Muitos desses pilares descritos pela definição da Competividade Global foram


melhorados durante o governo de FHC, se refletindo isso na internacionalização de
algumas empresas brasileiras e aumento drástico do Comércio Exterior Brasileiro. E no
contexto das relações internacionais, para finais da década de 1990 com um país mais
integrado à economia internacional o Brasil entrou na dinâmica de um mundo mais
globalizado, fazendo diversos acordos multilaterais como parte da Política Externa do
Presidente FHC, conforme estudaremos a seguir.

2.2 O MULTILATERALISMO

Durante os dois mandatos do Presidente FHC (1995 -2003) o Brasil fez vários
acordos multilaterais levando em consideração as mudanças internacionais que tinham
acontecido com o colapso recente da URSS e seus países aliados do Leste Europeu nos
começos da década de 1990. Assim, para 1995 no começo do mandato de FHC existia
uma nova ordem mundial baseada nos princípios de livre mercado e democracia. Essa
nova ordem mundial estava alineada aos planos de transformação para uma economia
mais aberta que buscava uma melhor inserção internacional e regional.

205
FIGURA 4 – OS 48 CHEFES DE ESTADO E DE GOVERNO DA UE, AMÉRICA LATINA
E CARIBE, NA CÚPULA DE MADRI, MAIO DO ANO 2002

O Presidente FHC junto ao Presidente chileno, Ricardo


Lagos; o Presidente francês, Jacques Chirac, e o Presidente
espanhol, José María Aznar.
FONTE: <https://bit.ly/3D543Du>. Acesso em: 17 fev. 2022.

Durante a cúpula de Madri desse ano, 2002, o Presidente FHC solicitou,


junto aos demais presidentes da região, a abertura de Europa para o comércio com a
América Latina e o Caribe. Essa cúpula foi um reflexo da gestão da Política Externa do
Presidente FHC fundamentada no multilateralismo. Bem no primeiro mês de mandato
do Presidente FHC, janeiro de 1995, a Organização Mundial do Comércio (OMC) tinha
surgido oficialmente. Coincidência histórica que refletia o momento de transformação
do Brasil para uma economia mais aberta na qual os acordos multilaterais começavam
a se intensificar. A OMC é um organismo internacional que nasce logo de mais de 4
décadas do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (1947-1995) (General Agreement on
Tariffs and Trade, GATT). O GATT visava promover o comércio entre as nações por meio
da redução das tarifas de importação e demais barreiras ao comércio internacional,
visando um comércio justo entre nações.

A partir de finais da década de 1980 perante a intensificação da globalização


houve a necessidade do que o GATT tivesse maiores atribuições além de apoiar a redução
das barreiras comerciais entre países. Assim, veio a necessidade de um grande acordo
multilateral mundial para criar um organismo internacional que pudesse normatizar e
criar mecanismos que sejam um instrumento para o livre comércio internacional, mas
com normas claras para mediar no comércio crescente entre as nações, nesse sentido:

A Organização Mundial do Comércio (OMC) é uma entidade


regulamentadora, responsável pela fiscalização e arbitragem de
questões relativas ao comércio internacional, tendo como objetivo
mediar as relações comerciais entre diferentes países (SUNO,
2018, n.p.).

206
NOTA
Deseja saber mais sobre a OMC? Acesso ao site oficial da OMC:
<https://bit.ly/3KYhIPs> no qual poderá encontrar diversos assuntos de
interesse sobre o comércio internacional e mediação deste, aliás, existem
algumas mediações da OMC em litígios comerciais a favor do Brasil.

No contexto brasileiro, a criação já oficial da OMC em janeiro de 1995 marca um


momento histórico da era dos acordos multilaterais muito característicos da Política
Externa de FHC. O Multilateralismo de FHC teve a característica de manter uma imagem
de autonomia das decisões da Política Externa brasileira a qual procurava os interesses
nacionais e ao mesmo tempo posicionar ao Brasil de maneira ativa e positiva em um
cenário internacional mais globalizado e de acordos multilaterais.

O Brasil se globalizava e era conduzido na área exterior por um


presidente convicto de que a adesão aos principais regimes
internacionais traria vantagens automáticas para o país. Assim,
o Brasil aderiu de forma automática − e entusiástica, em alguns
casos − ao Protocolo de Quioto (1997), ao Estatuto de Roma (1998),
que previa a instalação do Tribunal Penal Internacional, e apoiou o
Conselho de Segurança da ONU como foro apropriado para decidir
sobre as crises internacionais, como a do Kosovo, em 1999 (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 175).

No contexto da América do Sul o governo de FHC continuou com a aproximação


aos países vizinhos e houve uma intensificação no processo de consolidação do
MERCOSUL, especialmente no que tange à execução da zona de livre comércio entre
os países membros.

[...] os avanços foram significativos, como demonstram a entrada em


vigor da união aduaneira do Mercosul, com a adoção da tarifa externa
comum (TEC), em 1o de janeiro de 2005; a assinatura do Acordo-
Quadro de Cooperação Mercosul-União Europeia, em dezembro
do mesmo ano, prevendo a liberalização progressiva do comércio
birregional; o acordo de comércio entre o Mercosul e o Chile e a
adoção da cláusula democrática do Mercosul, em junho de 1996, e o
acordo de comércio entre o Mercosul e a Bolívia, em dezembro; e o
Protocolo de Ushuaia sobre o compromisso democrático do Mercosul
(1998) (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 176).

Esse processo de consolidação do MERCOSUL e acordos deste com países


próximos como Chile e a Bolívia mostram uma intensificação da integração regional que
tinha começado lá nos finais da década de 1950 do Presidente Juscelino Kubitschek
(1956-1961). E como mais um desdobramento desse longo processo de integração
da América do Sul no ano 2005 foi intensificada por meio da execução de projetos de
infraestrutura financiados pelo BNDES a Iniciativa de Integração da Infraestrutura

207
Sul-Americana (IIRSA). A IRRSA tinha como objetivo um plano de integração
intrarregional em eixos geográficos em questões de projetos para o desenvolvimento da
infraestrutura intrarregional em energia, transporte e comunicações. Esses eixos foram
desenhados em função da geografia econômica das diversas regiões da América do Sul,
se agrupando em Eixos de Integração e Desenvolvimento (EIDs).

FIGURA 5 – EIXOS DE INTEGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO (EIDS)

FONTE: <https://bit.ly/3Ikuaax>. Acesso em: 27 jan. 2022.

Esse processo de integração e multilateralismo mostra uma clara perspectiva


de longo prazo que tinha a Política Exterior de FHC que, aliás, teve continuidade durante
a época do Presidente Lula (2003-2011). Para finais do segundo mandato do Presidente
FHC o Brasil tinha passado por uma forte transformação que ajudou ao país a ter uma
posição proativa e de liderança como potência regional e semiperiférica, exportador de
grandes volumes de commodities e de manufaturados de baixo valor agregado, salvo
algumas exceções tais como a Embraer e a WEGE. Porém, esse processo de mudança
estrutural do Brasil teve um custo político para a gestão do Presidente FHC diante as
baixas taxas de crescimento econômico dos últimos anos de seu segundo mandato,
fator que ajudou àa eleição do Presidente Lula.

3 ATIVISMO INTERNACIONAL E O BOOM DAS COMMODITIES

Conforme foi visto nas páginas anteriores, ao final do segundo mandato do


Presidente FHC o Brasil tinha conseguido uma posição relativamente aceitável no
Ranking de Competividade Global, terminando na posição nº 54 no ano 2003 BBC

208
BRASIL (2006) ao final de seu segundo mandato. Essa boa posição, além de outros
fatores, permitiu ao Brasil pegar carona no boom das commodities da primeira década
deste século, ajudando em parte ao alto crescimento econômico que houve no país
durante os dois mandatos do Presidente Lula.

Esse crescimento econômico também teve como fator a continuidade dos


compromissos do governo do Presidente Lula em manter a estabilidade macroeconômica
atingida durante o longo processo de transformação do Plano Real, o melhoramento da
institucionalidade e demais políticas econômicas e políticas do Presidente FHC. Isso
pode ser evidenciado na “Carta ao Povo brasileiro” que o candidato Lula fez no dia 22
de junho de 2002, nessa carta se assegurava que: [...] o PT no governo preservaria o
superávit primário quanto fosse necessário para impedir que a dívida interna afetasse a
capacidade de o governo honrar seus compromissos, e que a estabilidade e o controle
das contas públicas e da inflação eram patrimônio de todos os brasileiros (LESSA;
ALTEMANI, 2014, p. 178).

Essa esperança positiva no contexto econômico de um eventual governo do


PT foi cumprida e inclusive superou as expectativas dos agentes econômicos logo
depois da posse como Presidente de Luiz Ignácio Lula da Silva, quem governou ao Brasil
durante dois mandatos seguidos, desde o ano 2003 até o ano 2011. No contexto das
relações internacionais, o país procuraria reduzir a grande diferença entre as nações
mais desenvolvidas e as menos desenvolvidas, assim como procuraria também respeitar
a igualdade de direitos entres os povos e os processos democráticos das nações.

Conforme à dinâmica de um mundo mais globalizado o governo do Presidente


Lula teve como estratégia aumentar os investimentos diretos e de longo prazo para o
desenvolvimento industrial e agroindustrial em função às novas tecnologias do momento.
Investimentos que iriam acompanhados de um melhoramento da educação, um
exemplo disso foi a formação de técnicos por meio dos Institutos Federais estabelecidos
nos diversos estados. Tanto os investimentos produtivos como o melhoramento do
nível educacional serviriam para melhorar tanto a oferta nacional como a capacidade
exportadora do país, melhorando a produtividade brasileira e a renda do trabalhador
brasileiro. E como parte da Política Externa e de Comércio Exterior esse melhoramento
da capacidade exportadora iria acompanhado por diretrizes diplomáticas procurando:

[...] negociações de acordos comerciais com vantagens concretas


para o país, o combate a práticas protecionistas e a ampliação dos
mercados consumidores de bens primários ou semielaborados, que
continuavam a ter papel importante na pauta exportadora. Assim, na
Alca, nas negociações Mercosul-União Europeia e na Organização
Mundial de Comércio, os agentes brasileiros dedicaram-se ao
aumento do mercado para os produtos e serviços nos quais o país
era − e é hoje – competitivo (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 178).

No contexto regional, o Presidente Lula deu continuidade ao processo de


consolidação que já vinha acontecendo de maneira mais concreta durante o governo
do Presidente FHC. Além, de estreitar as relações entre os membros do MERCOSUL e

209
demais países da América do Sul, o Brasil tinha como objetivo aumentar às exportações
de produtos manufaturados de maior geração valor à região. Entretanto, com os países
mais desenvolvidos, os EUA, Japão e os países europeus, se continuou com a política
tradicional de entendimento construtivo em função dos interesses das partes, por um
lado o Brasil desejava importar tecnologia e investimentos para o desenvolvimento
e assim melhorar a competividade brasileira e por outro lado desejava exportar
commodities para os mercados dessas nações mais desenvolvidas.

Ou seja, ambas políticas externas, tanto com os países da vizinhança como


com as relações tradicionais com os EUA, e demais países desenvolvidos tiveram um
processo de continuidade do que se vinha já fazendo nos anteriores governos, aliás,
fator de continuidade da Política Externa Brasileira desde os começos da República
lá nos começos do século XX. O que de fato dava uma imagem de estabilidade e
continuidade nas relações internacionais brasileiras. A grande novidade da gestão do
Presidente Lula foi a execução de uma Política Externa que visava aumentar os laços
e interesses comuns com as grandes nações emergentes da época, grupo de países
conhecidos como os BRICS, isto é: África do Sul, Brasil, China, Índia e Rússia.

FIGURA 6 – PRIMEIRA CÚPULA DOS BRICS, ANO 2009

FONTE: <https://bit.ly/3N8Mrew>. Acesso em: 17 fev. 2022.

A Foto exposta acima representa a primeira cúpula dos BRICS no ano 2009
sediada na cidade russa de Ecaterimburgo. Por meio dos BRICS, o Brasil além de se
posicionar com uma potência regional, no contexto da América Latina, entrou no jogo
geopolítico mundial por meio da consolidação das relações com os países considerados
potencias regionais e de grande potencial de crescimento, isto é, os BRICS. Devermos
observar que para essa época, meados da primeira década deste século, a China ainda
não era considerada uma megapotência e seu PIB era um pouco maior que do Brasil.
Conforme dados do Banco Mundial (2021), no ano 2003 o PIB da China foi de US$ 1,66
trilhões, dos EUA US$ 11,458, da Rússia US$ 0,345, e do Brasil US$ 0,558; e para o ano

210
2020 o PIB da China foi de US$ 14,723 trilhões, dos EUA US$ 20,723, da Rússia US$
1,483, e do Brasil US$ 1,445. Enquanto, o PIB da China aumentou 8,87 vezes entre o ano
2003 e 2020, se convertendo, aliás, na segunda maior potência econômica do mundo,
o PIB do Brasil aumentou 2,59 vezes.

FIGURA 7 – PIB DOS BRICS E DOS EUA EM TRILHÕES DE US$, DESDE O ANO 2000 ATÉ O 2020

FONTE: <https://bit.ly/36efs7U>. Acesso em: 28 jan. 2022.

Conforme a figura, podemos observar que a China em apenas duas décadas


passou de ser uma potência regional para se converter em uma megapotência. Aliás,
hoje a China entrou no jogo da geopolítica como uma superpotência rompendo a
hegemonia dos EUA desde o colapso da União Soviética. Esse avanço drástico da China
vem mudando o cenário mundial, se observarmos o jogo de interesses geopolíticos que
vem se manifestando nestes primeiros anos da década de 2020 entre os EUA, a China,
a EU (União Europeia), e inclusive da Rússia – que embora não seja uma superpotência
econômica é uma potência mundial no contexto de seu vasto território, recursos naturais
e tecnologia bélica – mostra uma clara trajetória de mudança de uma só superpotência, os
EUA, para um equilíbrio muito sútil entre várias potências com capacidade de influenciar
ao redor do mundo. Fatos da dinâmica histórica que seria interessante aprofundar, mar
fora do contexto desde cadernos de estudos, assim, vamos voltar à época da formação do
BRICS, ou seja, durante o primeiro mandato do Presidente Lula.

Desde uma ótica das relações internacionais, a estratégia do Brasil de se


posicionar com países e potências emergentes dessa época significou uma presença
proativa tanto nas relações regionais como internacionais. No contexto dos BRICS, o
Brasil entrou no cenário da geopolítica mundial, levando em consideração a crescente
influência econômica e política da China, e do poder geopolítico, bélico e vasta experiência
da Rússia como a maior nação da ex-Confederação de Repúblicas Soviéticas (URSS).

211
Em resumo, o Presidente Lula continuou com o processo de aproximação regional
tanto com o MERCOSUL como com o resto da América Latina, manteve as relações
tradicionais com o mundo desenvolvido e teve a iniciativa de posicionar ao Brasil com
o mundo emergente das potências regionais da época, os BRICS. E como parte de seu
legado de esquerda, também teve na sua Política Externa um foco ao ativismo social
atuando em diversos foros internacionais e de cunho regional procurando a cooperação
internacional para: a luta contra os impactos ao meio ambiente, luta contra a pobreza e
defensa dos direitos humanos.

Esse desempenho no cenário internacional colocou de novo ao Brasil no cenário


internacional como uma potência regional com grandes perspectivas de transcender
na geopolítica mundial. Desempenho que foi acompanhado pelo forte crescimento da
economia, o qual ajudava às perspectivas positivas do Brasil nesse novo cenário mundial.
Mas será que esse bom desempenho econômico foi uma particularidade específica
do Brasil, ou foi uma ótima época para os países da América Latina exportadores
maioritariamente de commodities?

3.1 A QUESTÃO DAS COMMODITIES



Para responder essa possível relação entre crescimento econômico e
desempenho das commodities no mercado internacional vejamos o crescimento do
PIB das maiores economias da América Latina entre o ano 2000 e 2020, excluindo a
Venezuela por questões da dramática depressão econômica que esse país vem sofrendo.

FIGURA 8 – DESEMPENHO DO CRESCIMENTO ECONÔMICO ENTRE O ANO 2000


ATÉ 2020 DA ARGENTINA, BRASIL, COLÔMBIA E MÉXICO

FONTE: <https://bit.ly/3qkuxf5>. Acesso em: 28 jan. 2022.

212
Conforme o gráfico, conseguimos observar um claro comportamento
semelhante entre essas nações, e se acrescentar nesse gráfico o resto dos países
da região veremos a mesma correlação. No contexto regional de toda a América
Latina e o Caribe (ALC), praticamente todos os países aprontaram severas crises
no ano 2000 e a partir do ano 2003 começou o crescimento econômico em quase
todas as economias da região até o 2008 (ano da grande crise financeira mundial).
Depois desse ano (2008) volta de novo o crescimento econômico na região graças
à forte demanda de commodities por parte dos países asiáticos, especialmente da
China. E curiosamente a partir do ano 2012 o crescimento econômico em todos os
países começa a desacelerar. No caso do Brasil essa desaceleração foi muito mais
significativa a partir do ano 2015 com uma queda do PIB de 3,56%.

O que pode levar para essa correlação no desempenho do PIB dos países da
América Latina? Guardando as particularidades econômicas, e governos sejam eles
de esquerda ou de direita, todos os países da região mantêm uma alta dependência
na exportação de commodities. Ou seja, apesar de que muitas nações da América
Latina vêm intentando gerar maior valor agregado nos seus processos industriais
ainda são países dependentes da exportação de bens primários sem geração de
valor (commodities). Em termas teóricos, essa alta dependência na exportação de
commodities faz que um país seja muito dependente às oscilações do mercado
internacional em um grau muito maior que os países desenvolvidos. Para conferir
essa correlação entre o crescimento econômico da América Latina e Caribe (ALC) e os
preços das commodities vejamos o seguinte gráfico.

FIGURA 9 – CRESCIMENTO ECONÔMICO NA ALC E AUMENTO DOS PREÇOS DAS COMMODITIES

FONTE: <https://bit.ly/3Is6j8T>. Acesso em: 28 jan. 2022.

213
Desse gráfico, fica claro a forte correlação que tem a região da ALC com os preços
das commodities. No contexto brasileiro a queda drástica no preço das commodities no
ano 2015 teve uma forte influência na queda de PIB (-3,56%), assim como na queda de
popularidade da Presidente Dilma Rousseff, quem entre outros fatores socioeconômicos
e políticos teve o processo de impeachment e afastamento de seu mandato. Levando
em consideração esse comportamento histórico entre crescimento econômico e preços
das commodities, talvez deveríamos nos perguntar, como os países da ALC poderiam se
afastar dessa alta dependência das commodities? Ou seja, da produção e exportação
de produtos sem geração de valor.

É uma pergunta que poderia nos levar para várias teorias de desenvolvimento
econômico, mas em termos de um referencial que consegue nos orientar a resiliência
de uma economia perante essa dependência das commodities seria o ranking de
competitividade relativa global de uma nação.

Nesse sentido, enquanto mais competitivo seja uma nação, maior a resiliência
desse país contra as oscilações do desempenho econômico da economia globalizada
de hoje. Exemplificando durante a crise financeira de começos do século XX a ranking
de competividade global brasileira estava no ano 2001 na posição nº 44, aliás, a melhor
posição do Brasil desde que existe esse ranking, resultado?

Embora o país teve um decrescimento de seu desempenho econômico - seu


PIB cresceu apenas 1,39% conforme o Banco Mundial (2021) – ficou longe da depressão
econômica da Argentina dessa época e crises severas de mais outros países da
região. E no ano 2008 durante a grande crise econômica mundial, quando o preço das
commodities teve uma queda de quase 2% a economia brasileira decresceu 0,13% e se
recuperou rapidamente, nesse ano o ranking de competividade global brasileira estava
na posição nº 56, ou seja, um bom ranking para o contexto de país em desenvolvimento.
E na forte queda dos preços das commodities dos anos 2014 e 2015, qual era ranking
de competividade global do Brasil? Tinha se agravado drasticamente, passando para a
posição nº 75, resultado?

No ano 2015, enquanto a queda dos preços das commodities tiveram uma
queda de quase 2% o PIB brasileiro teve uma forte queda de 3,56%. No ano 2016 a
economia brasileira continuava no vermelho com um crescimento negativo do PIB de
3,30%, e a partir do ano 2017 até os dias atuais (2022) o crescimento da economia
brasileira vem mantendo um desempenho medíocre, o resultado é uma queda drástica
da renda média do brasileiro.

O ranking de competividade global brasileira desde a crise econômica do ano 2015


vem mantendo uma posição de pouca competividade relativa, no ano 2019 estava ainda
acima da posição nº 70, muito longe do bom desempenho da competividade relativa do
ano 2001 que foi a nº 44. O que significa isso? Basicamente que o Brasil vem perdendo
competitividade em relação aos outros países que atuam no comercio internacional,

214
ficando cada vez mais suscetível às crises econômicas internacionais, e mostrando
que o gap tecnológico para sair de sua condição de exportador maioritariamente de
commodities está ficando cada vez mais longe.

Pode ser uma questão estrutural de economia brasileira, refletida no “Custo


Brasil” que, combinada com uma dinâmica de política adversa e crise da pandemia do
Covid-19, vem acumulando elementos para essa perda de competitividade até os dias
atuais, começos do ano 2022. Enfim, se tiver curiosidade de quais são essas condições
a favor para um bom ranking de competividade, voltar ao subtópico 2.1 deste último
tópico, aí tem uma citação do Banco Mundial que explica quais os elementos ponderados
no ranking de competividade global de uma nação.

Nesse contexto, desde o impeachment da Presidente Dilma Rousseff até


o governo atual do Presidente Bolsonaro o Brasil não consegue recuperar sua
competividade de começos do século XX. Caberá ao próximo governo que começaria
seu mandato no ano 2023 iniciar uma política econômica em junção a uma política
externa que visem melhorar a competividade relativa brasileira e assim ter um melhor
desempenho em diversos âmbitos, tanto no cenário econômico como no novo cenário
global. Aliás, cenário global bastante adverso onde a geopolítica mundial está mudando
para uma perda de hegemonia dos EUA e novas potências mundiais estão tomando uma
liderança, tais como a China e inclusive a Índia. Também nos próximos anos e décadas
a questão ambiental irá pressionar ainda mais às nações para iniciar um processo de
transformação para uma economia global e descarbonizada.

Assim, cabe à sociedade brasileira junto a seus líderes políticos procurar


melhorar seu ranking de competividade relativa para encarar melhor os desafios que
virão nos próximos anos. Uma vez que temos uma noção de como o Brasil destes
últimos anos vem se posicionando na questão de seu desempenho como país exortador
de commodities e seu baixo desempenho de competividade relativa vamos abordar a
Política Externa da Presidente Dilma Rousseff, o Presidente Temer o destes últimos anos
do Presidente Bolsonaro ainda em funções.

3.2 A POLÍTICA EXTERNA DE FINAIS DA DÉCADA DE 2010

Ao finalizar seu segundo mandato, o Presidente Lula conseguiu que seu


partido, o PT, continuasse no Poder Executivo por meio da candidata Dilma Rousseff,
quem ganhou as eleições e tomou posse em janeiro do ano 2011. A Presidente Dilma
governou o Brasil desde esse ano até o dia 31 de agosto 2016, data de seu processo
de impeachment que lhe afastou do poder. Sendo o governo da Presidente Dilma uma
continuidade de seu partido na gestão do Poder Executivo houve uma continuidade da
Política Externa. Porém, a Presidente Dilma fiel a seus ideais de militante de esquerda
teve uma dedicação maior nos foros internacionais sobre ativismo social.

215
Esse ativismo social e identificação ideológica de esquerda levou à Presidente
Dilma se aproximar ainda mais à Argentina que estava sendo governada pela Presidente
Kirchner. Nesse contexto, houve uma especial prioridade nas questões de interesse
mútuo entre as nações e que tivessem vínculo ao ativismo social e ao desenvolvimento
regional, tal como “a disposição em fortalecer o Mercosul e atuar em favor da consolidação
da Unasul e da Celac.” (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 184).

ATENÇÃO
Talvez você esteja se perguntando quais são os objetivos da UNASUL e da CELAC. A
UNASUL é a União das Nações Sul-Americanas – UNASUL, onde os países da América
do Sul conseguem articular questões culturais, sociais, e aproximações tanto
no âmbito econômico como político. E a CELAC é a Comunidade de Estados
Latino-americanos e do Caribe (CELAC), cujo objetivo e criar o diálogo
construtivo para uma integração política entre as mais de trinta e três nações
da América Latina e o Caribe.

Se desejar saber mais sobre esses organismos acesse aos sites:


CELAC: https://bit.ly/36AiAdS
UNASUL: https://bit.ly/3CWTnGQ

Embora houvesse uma continuidade nas questões de política econômica que


incentivavam o investimento direto estrangeiro (IDE), na realidade houve uma redução
expressiva dos IDE a partir do segundo mandato da Presidente Dilma, acabando assim
com quase uma década de aumento significativo dos IDE no Brasil.

Em 2010, o Brasil encontrava-se próximo à quarta posição entre os


países mais citados para realização de projetos de IDE − posição em
que permaneceria nos anos seguintes −, atrás apenas da China, dos
Estados Unidos e da Índia. Esta evolução positiva dos ingressos de
IDE no Brasil contrastava com o contexto adverso dos fluxos globais
desses investimentos. Não obstante, em seu segundo ano de governo,
diante das expectativas declinantes em relação ao desempenho da
economia brasileira, as incertezas quanto ao fluxo de investimentos
estrangeiros aumentaram (LESSA; ALTEMANI, 2014, p. 185).

216
GRÁFICO 4 – HISTÓRICO DO INVESTIMENTO ESTRANGEIRO DIRETO (IED), 2009 ATÉ 2020

FONTE: <https://bit.ly/3qkKeTc>. Acesso em: 28 jan. 2022.

Esse declivo dos IDE a partir do segundo mandato da Presidente Dilma, janeiro
2015, pode ser um reflexo da perda de competividade relativa do Brasil, ou seja, há
uma correlação entre a queda dos IDE e a capacidade competitiva do Brasil relativa
às demais nações. No ano 2014 o Brasil estava na posição nº 57 e em apenas um ano
tinha-se perdido 18 posições, passando para um ranking de competividade nº 75,
conforme podermos observar no gráfico do ranking de competividade global brasileira
do subtópico 2.1. Ou seja, no contexto de investimentos, o Brasil estava começando
perder seu atrativo como potencial de uma grande economia emergente, assim, as
oportunidades de inovar e gerar novos projetos de investimento direto perdeu força a
partir do ano 2015, se refletindo essa pouca atratividade até os dias atuais. Eis um dos
“porquês” é importante melhorar o ranking de competitividade, pois é um referente para
gerar investimentos.

Em agosto do ano 2016 a Presidente Dilma foi afastada do poder por meio
de um processo de impeachment e no dia 31 de agosto desse ano, o vice-presidente
Temer tomou posse da Presidência da República, governando o Brasil até o dia 31 de
dezembro 2018. O Presidente Temer focou seu governo no combate à inflação que
no ano 2015 tinha sobrepassado os dois dígitos pela primeira vez desde o ano 2002,
fato que ameaçava o legado do Plano Real. Para combater esse processo inflacionário
o Presidente Temer tomou uma série de medidas, entre elas: finalizou o subsídio aos
combustíveis e a energia elétrica, aumentou a taxa SELIC, entre mais outras medidas. O
resultado foi que no ano 2015 a inflação de 10,7% baixou para 6,3% no ano 2016 e para o
final de seu mandato (dezembro 2018) a inflação anual ficou em 3,8%, conforme dados
do IBGE (2022), voltando assim uma estabilidade inflacionária.

Em resumo, o Presidente Temer fez uma série de medidas para reestabelecer os


índices de uma gestão macroeconômica firme, essencial para manter os fundamentos
do Plano Real. No contexto da Política Externa o Presidente Temer fez uma aproximação
para iniciar um processo de entrada do Brasil à Organização para Cooperação e

217
Desenvolvimento Econômico (OCDE), processo que ainda hoje não foi finalizado
conforme veremos mais adiante. Essa intenção de entrar no grupo dos países membros
da OCDE representa as intenções do Presidente Temer de inserir de maneira mais
intensa ao Brasil no comercio internacional, assim como posicionar ao país com as novas
tendências de desenvolvimento econômico para uma economia global descarbonizada,
o que poderia melhorar a competividade relativa brasileira.

ESTUDOS FUTUROS
Saiba o que é meta para uma economia descarbonizada até o ano 2050 na
leitura complementar ao final desta unidade. Essa meta é uma questão muito
relevante, pois nos próximos anos e décadas os países terão que se adequar
a essa nova realidade econômica que visa mitigar o aquecimento global.

Outro reflexo das intenções de inserir ao Brasil de maneira mais intensa na


dinâmica comercial internacional foram as intensificações de aprofundar acordos
comerciais “com áreas econômicas relevantes: Estados Unidos, União Europeia e Ásia
“com ou sem a companhia do Mercosul, embora preferencialmente com ele.” (VIDIGAL,
2021, p. 132) Essas ações no âmbito internacional mostra uma mudança na Política
Exterior, querendo o Presidente Temer se afastar do ativismo social característico da Era
do Partido dos Trabalhadores (PT), 2003-2016, para uma gestão da Política Exterior mais
pragmática e de cunho liberal (ou centro direita).

Inclusive se tomou medidas para um distanciamento dos países amigos PT com


governos de esquerda que ainda estavam no governo, isto é, Venezuela, Cuba, Bolívia
e Nicarágua. No contexto da Venezuela o Brasil junto com a Argentina, sob o Governo
do Presidente Macri, articulou para finais do ano 2016 a suspensão da Venezuela do
MERCOSUL, marcando um precedente das intenções reais do Brasil de se afastar do
Governo do Presidente Nicolas Maduro da Venezuela. Assim como o Brasil foi um dos
países que apoiou a suspensão da Venezuela do OEA. Como referência, em junho 2018
o OEA aprovou a “resolução que considera ilegítimas as eleições presidenciais em que
Nicolás Maduro foi reeleito e ativa o processo para suspender ao país caribenho do
organismo interamericano.” (EL PAIS, 2018, n.p.):

A resolução de dez pontos foi aprovada pelos Estados Unidos, os


14 países do Grupo de Lima – entre eles, as principais potências
da América Latina, incluindo o Brasil – e República Dominicana,
Bahamas, Jamaica e Barbados. O documento declara “ilegítima”
a eleição presidencial venezuelana do último 20 de maio por não
ter, na visão dos diplomatas, contado com as garantias para ser
considerado um processo livre.

218
Essa estratégia de procurar mais acordos comerciais, investimentos e
afastamento dos países de esquerda foi complementada com ações para combater
os crimes transnacionais que vinham se intensificando ao longo da América Latina,
com especial ênfase no tráfico de drogas. No contexto brasileiro isso significou uma
intensificação ao combate desses crimes transnacionais ao longo da vasta fronteira
brasileira. Em resumo, a Política Externa do Brasil mudou de rumo para uma imagem de
capitalismo liberal se afastando do ativismo ativo do PT, e se manteve a continuidade
dos objetivos de multilateralismo, regionalização e abertura econômica, traços da
Política Exterior desde antes mesmo do Presidente FHC. Como também se manteve
a imagem de uma Política Externa respeitosa aplicada desde a época do Barão de Rio
Branco de começos do século XX.

Com a posse do Presidente Jair Bolsonaro, janeiro 2019, começou um novo


mandato presidencial que vai até o dia 31 de dezembro 2022. Nesse sentido, a gestão
do Presidente Bolsonaro ainda está presente enquanto estamos estudando os assuntos
de Política Externa deste caderno de estudos. Diante disso, não vamos entrar em
uma análise mais profunda da Política Exterior do Presidente Bolsonaro, pois ainda
não terminou a sua gestão, porém, vamos analisar algumas questões relevantes dos
primeiros anos de seu governo.

O primeiro ano da gestão do Presidente Bolsonaro deu uma imagem de


continuação da agenda liberal do Presidente Temer no que tange às intensificações de
aprofundar acordos com áreas econômicas relevantes, especialmente com os EUA sob
o governo do Presidente Trump. Assim, como o Presidente Bolsonaro intensificou ainda
mais o distanciamento dos países amigos do PT especialmente com a Venezuela e a
Argentina, país que voltou a ter um governo de esquerda sob o comando do Presidente
Fernandez, ainda em funções na escrita deste caderno de estudos. Esse distanciamento
de viés ideológico com a Argentina vem influenciando um distanciamento do Brasil
sobre a consolidação do MERCOSUL, rompendo assim décadas de um processo de
regionalização brasileira tanto com o MERCOSUL como com o resto da América do Sul.

Os primeiros anos da gestão Presidente Bolsonaro vêm sendo muito


conturbados, pois além da polarização interna entre posições de extrema direita e
esquerda, o Brasil vem aprontando uma crise sanitária de cunho global sem precedentes
desde a pandemia da Gripe Espanhola (1918-1921). A pandemia do Covid-19 desde seus
inícios, começos do ano 2020, vem causando muitas mortes aqui no Brasil e no resto
do mundo, até finais da escrita deste caderno de estudos o Covid-19 já matou a mais de
5 657,616 no mundo e no Brasil já são mais de 626,870 falecimentos. O país mantém o
segundo maior número de falecimentos depois dos EUA, conforme dados do New York
Times (janeiro 2022).

Em função dessa grande catástrofe global, a pandemia do Covid-19, tanto no


seu contexto sanitário como no seu contexto de fortes impactos na economia brasileira
e global é muito cedo para analisar a gestão do Presidente Bolsonaro, especialmente

219
nas implicações disso nas relações internacionais brasileiras. Porém, há elementos
que vem acontecendo que são importantes de destacar. Um deles é a aproximação
intensa, inclusive de amizade pessoal, que teve o Presidente Bolsonaro durante a
gestão do Presidente Trump dos EUA, se afastando do clássico ditado do ex-secretário
de estado dos EUA, John Foster Dulles, “não há países amigos, mas interesses comuns.”
(BRITANNICA, 2021, n.p.).

Hoje, os EUA têm um novo presidente completamente distante da gestão do


Presidente Trump, o Presidente Biden do Partido Democrata. Nesse sentido, a mensagem
no contexto da Política Externa é que por mais que haja uma amizade próxima entre os
presidentes das nações, neste caso o Presidente Bolsonaro com o Presidente Trump,
é imprudente considerar que os alinhamentos de viés ideológico irão transcender
os próprios processos democráticos que elegem os presidentes e os compromissos
adquiridos pelas nações.

Isso pode ser visualizado no “Acordo de Paris sobre alterações climáticas” do


ano 2015 – no qual o Brasil foi um dos países protagonistas – e desde esse ano o Brasil
vinha apoiando as metas do acordo. Porém, a partir da gestão do Presidente Bolsonaro
o Brasil se posicionou a favor da estratégia do Presidente Trump de “não aderir às metas
de neutralizar a emissão de gases do efeito estufa”. Esse alinhamento deixou ao Brasil
isolado da comunidade internacional e das grandes potências mundiais, exceto dos
países negacionistas da mudança climática dessa época entre eles os EUA e a Rússia.

No mesmo dia da posse do Presidente Biden, 20 de janeiro 2021, os EUA


voltaram aos compromissos do “Acordo de Paris” iniciando um retorno desse país na
procura efetiva para mitigar os efeitos adversos da Mudança Climática e liderando uma
agenda internacional para uma economia descarbonizada até a década de 2050. O
resultado dessa nova agente dos EUA deixou ao Brasil isolado na sua posição contra
as medidas da Mudança Climática, perdendo a oportunidade de se inserir de maneira
ativa na tendência global de criar uma economia mais descarbonizada. Inclusive com
esse posicionamento o Brasil tem a possibilidade de perder mercados já adquiridos para
a exportação de alguns produtos do setor agroindustrial brasileiro. Nesse contexto, a
União Europeia estaria preparando uma normativa que poderia condicionar a compra de
soja e carne de gado de áreas desmatadas.

Para que os itens consigam entrar no mercado europeu, os


fornecedores teriam que comprovar que os produtos não têm
qualquer relação com o desmatamento - trabalho que tende a elevar
os custos.
A União Europeia é a segunda maior importadora de soja em grãos
brasileira, responsável por 8% das compras do produto nos últimos
cinco anos. E é a maior compradora de farelo de soja nacional, com
52% das compras (GLOBO NEGÓCIOS, 2021, on-line).

220
Essa pressão da União Europeia poderia se espalhar para mais outras
nações que são abastecidas pelo Brasil com esses produtos. Provavelmente o
Brasil já esteja articulando gestões para defender seus mercados e iniciando uma
estratégia – sejam elas por parte do governo federal ou por parte do setor privado
– para se adequar a oferta exportável à pressão internacional sobre a questão do
desmatamento. Porém, recuperar a imagem de um Brasil a favor das políticas contra
a mudança climática levarão algum tempo. Inclusive com a presencia do Brasil na
Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021 na qual o
negociador-chefe do Brasil, o embaixador Paulino Franco de Carvalho Neto tinha
dito que “que o governo fez uma "reflexão cuidadosa" sobre sua política ambiental e
resolveu "corrigir" rumos.” (BBC BRASIL, 2021).

Os começos da terceira década deste século começam com uma série de
desafios internacionais que o Brasil terá que levar em consideração e tomar providências.
Começa uma era de novas potências ativas no jogo da geopolítica mundial entre elas a
China e a Índia, países que somente há três décadas pareciam longe de entrar no cenário
mundial como potências econômicas e políticas. A hegemonia dos EUA como a única
superpotência está mudando. Hoje, a China é a segunda maior potência econômica e
tem uma série de interesses econômicos espalhados ao longo de todos os continentes.
Além da China, há mais outras potências que desejam ampliar sua hegemonia regional
e global, exemplo disso é a crescente escalada de tensões entre a Rússia e a Ucrânia.

Se acrescentar nessas tensões geopolíticas a crise sanitária/econômica do


Covid-19, as mudanças tecnológicas, aliás, muito aceleradas destes últimos anos e
as metas para uma economia descarbonizada para a década de 2050 haverá muitas
frentes internacionais nas quais o Brasil terá que se posicionar para se manter ativo e
aumentando seu comércio internacional, para manter a sua liderança como potência
regional, para estabelecer alianças e acordos internacionais a favor dos interesses
nacionais presentes e nas próximas décadas.

Em termos gerais uma maneira de medir a capacidade do Brasil para competir


nesse novo cenário mundial é por meio do ranking de competitividade global do Fórum
Econômico Mundial divulgado pelo Banco Mundial, conforme já vimos nas páginas
anteriores. Por meio desse ranking cada ano o Fórum Econômico Mundial vai medindo
a competitividade relativa entree as nações conforme às novas condições econômicas,
tecnológicas, educacionais, institucionalidade, entre outros fatores. Infelizmente desde
o ano 2015 o ranking de competividade global do Brasil vem se mantendo em uma
posição não muito favorável, de nº 70 entre mais de 141 países. Cabe lembrar que houve
duas ocasiões que o Brasil conseguiu posições muitos boas, no ano 2001 na posição nº
44; e no ano de 2012, na posição nº 48.

Nesse sentido, cabe a sociedade brasileira e seus representantes políticos


melhorar esse ranking de competividade para assim ter a capacidade de inserir ao
Brasil no novo cenário mundial que se está formando e assim tomar uma liderança

221
regional e inclusive global nas questões da geopolítica internacional. Para finalizar
o último tópico desta unidade convido você à Leitura Complementar que aborda o
assunto da descarbonização da economia que em algumas ocasiões se falou ao longo
deste tópico. É um assunto muito interessante e um grande desafio para o Brasil e o
resto do mundo. Grande desafio que mais tarde ou mais cedo vai entrar nas atividades
econômicas brasileiras, boa leitura!

222
LEITURA
COMPLEMENTAR
POR QUE E COMO DESCARBONIZAR A ECONOMIA

FOLHA DE SÃO PAULO


14 setembro 2021

Será preciso acelerar contenção de carbono para diminuir aumento das


temperaturas globais.

O relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) da


ONU divulgado no início do mês passado não deixou margem a dúvidas. A julgar por
suas estimativas, será necessário acelerar o passo na contenção global de emissões de
carbono, caso queira-se que aumentos já esperados nas temperaturas médias globais
fiquem abaixo de 2 ou 1,5 graus Celsius e suas consequências climáticas sejam menos
desastrosas. Mesmo que as emissões de gases de efeito estufa sejam substancialmente
reduzidas nas próximas décadas, o aquecimento global vai continuar por pelo menos
mais um século.

Para que se tenha uma ideia do que está em jogo, vejam esses números citados
por Jean Pisani-Ferry em um trabalho também do mês passado para o Peterson Institute
for International Economics. Partindo dos níveis de emissão anteriores à pandemia
(durante a qual as emissões caíram), o estoque atmosférico de gases de efeito estufa
compatível com a contenção do aumento da temperatura global em 2 graus Celsius
seria alcançado em menos de 25 anos. O período encurta para sete anos no caso de o
limite ser reduzido para 1,5 graus.

Segundo projeções da Agência Internacional de Energia e cálculos do FMI


(2021), depois de declinarem durante a pandemia, as emissões globais de CO2 de
combustível fóssil tendem a aumentar em cerca de 20% até 2030. Isso contrasta com a
queda de 25% a 50%, necessária para a meta de aquecimento de 1,5 a 2 graus. Limitar
o aumento da temperatura exigirá menos suavidade e gradualismo do que se contava
até recentemente.

223
GRÁFICO 1 – EMISSÕES GLOBAIS DE CO2 VIA COMBUSTÍVEIS FÓSSEIS

O reconhecimento da urgência aparece no fato de que, segundo relatório da


Agência Internacional de Energia (IEA), países responsáveis por cerca de 70% das
emissões globais de carbono e do PIB mundial já se comprometeram com metas de
redução a zero até 2050 ou 2060.

Contudo, essa “descarbonização” corresponderá a uma transição plena de desafios:

A transição para “zero” emissões envolverá três processos econômicos


simultâneos (Pisany-Ferry, 2021). Antes de tudo, uma alteração significativa nos preços
relativos de bens e serviços, com estes passando a refletir a intensidade de uso do
carbono, cujo preço terá de subir de zero a patamares significativos. Gaspar e Parry
(2021), do FMI, propõem que, no plano internacional, medidas sejam tomadas para
atingir um preço de carbono igual ou superior a US$ 75 (R$ 391,4) por tonelada até 2030.

Tal preço do carbono poderá ser estabelecido e cobrado de forma tributária


explícita e/ou indiretamente mediante os efeitos de regulamentações contrárias ou
limites nos usos. A descarbonização será ínfima se o preço do carbono continuar sendo
o de um “bem livre” da natureza. Preços do carbono também terão de estar entre os
fatores influenciando o comportamento e o modo de vida das pessoas.

Adicionalmente, trabalhadores terão de ser realocados das atividades intensivas


em carbono para seus substitutos verdes. Haverá não apenas o desafio de requalificação,
como também o de assegurar que novos empregos sejam suficientemente criados
nas atividades dinâmicas. Sabe-se, por exemplo, que a produção de carros elétricos
demanda menos mão de obra que a de veículos com motor à combustão.

224
Terceiro, haverá obsolescência acelerada dos estoques existentes de ativos
físicos (máquinas e equipamentos, construções, veículos) e intangíveis associados a
atividades intensivas em carbono. A contrapartida terá de ser o investimento acelerado
nos novos ativos que lhes substituirão.

A boa notícia em relação a tal substituição é que a evolução rumo a tecnologias


mais limpas e com custos declinantes tem ocorrido. A má notícia são os obstáculos de
outra natureza a tais investimentos – particularmente no caso da infraestrutura verde
em países não avançados, conforme abordamos aqui há dois meses.

A transição da descarbonização terá possivelmente impactos regressivos de


renda. Basta observar que, por exemplo, imóveis e suas necessidades de reconstrução
ou adaptação correspondem a parcela maior dos patrimônios na parte de baixo da
pirâmide de renda. A taxação direta do carbono terá impactos diferenciados sobre
diferentes grupos urbanos. Do mesmo modo, há que não se perder de vista as
necessidades de requalificação e emprego de trabalhadores diretamente afetados.
Seria importante assegurar mecanismos de transferência de renda dentro de –e entre–
países associados à precificação do carbono, para mitigar impactos regressivos do
combate à mudança climática.

A trajetória de descarbonização trará consequências também para as contas


públicas (veja Zenius (2021), no caso da Europa). Além de gastos compensatórios
de impactos regressivos da precificação do carbono acima mencionados, despesas
públicas necessárias em infraestrutura para viabilizar a transição serão requeridas. A
não ser na hipótese pouco provável de cobertura total de gastos com alguma taxação
de carbono, a tendência será a de aumentos na dívida pública. No caso, sem injustiça
intertemporal, já que as futuras gerações agradecerão não ter que viver com um clima
permanentemente ainda mais adverso.

E quanto ao PIB e seu crescimento durante a transição? Aqui se repete a


dualidade acima abordada. Por um lado, haverá destruição de capital, além de um
choque de preços relativos que, como observa Jean Pisani-Ferry, guarda semelhanças
com o “choque de oferta” que aconteceu quando os preços do petróleo foram súbita
e drasticamente elevados nos anos 70, inclusive reduzindo temporariamente o
crescimento potencial. Com a diferença de que, enquanto os preços do petróleo foram
revertidos mais tarde, o preço do carbono não poderá fazê-lo se for para o mundo
ser descarbonizado. Caso a necessidade de maiores taxas de investimento no PIB
acompanhando a descarbonização se choque com limites de capacidade de oferta, o
consumo terá de adaptar-se para baixo ao longo da transição.

Por outro lado, é claro que as tecnologias mais limpas também oferecerão
oportunidades de elevação de produtividade. De qualquer modo, o retorno socioeconômico
da descarbonização tem de incluir evitar que ondas de calor, enchentes, furacões, secas,
inundações e temporais como os deste ano se tornem ainda mais intensos e frequentes,
até porque o custo disso seria perdas cada vez mais significativas para o PIB das nações.

Fonte: https://bit.ly/36iyN7M.

225
226
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você adquiriu certos aprendizados, como:

• Na década de 1990, perante a necessidade de competir no mercado internacional, o


Brasil precisava se adequar à liberalização do comércio internacional, tanto de bens
de consumo como da comercialização mais globalizada da cadeia produtiva.

• Durante os últimos anos do século passado, para melhorar a competitividade nacional


e para que as empresas nacionais pudessem se adequar à concorrência de produtos
importados, foram executadas algumas políticas econômicas.

• Em janeiro de 1995, a Organização Mundial do Comércio (OMC) surgiu oficialmente.


Coincidência histórica com a posse do Presidente FHC nesse mesmo mês, marcando
um momento de transformação estrutural do Brasil para a intensificação de uma
economia mais aberta e de acordos multilaterais.

• O Presidente Lula continuou com a dinâmica dos acordos multilaterais e consolidação


da América do Sul. Assim como houve um fator de continuidade para manter a
estabilidade macroeconômica fundamental para dar continuidade ao Plano Real.

• Além da continuidade, o Presidente Lula teve duas características diferenciadas


de sua gestão: O processo de aproximação com os grandes países emergentes, os
BRICS e seu ativismo social internacional.

• Durante o governo da Presidente Dilma houve uma evidente continuidade na


Política Externa Brasileira do Presidente Lula. Porém, houve um aprofundamento nas
atividades de ativismo social internacional, especialmente com governos da região
mais alinhados às ideologias socialistas da Presidente. Houve também uma redução
expressiva dos IDE a partir do segundo mandato da Presidente Dilma.

• Durante o governo de transição do Presidente Temer, houve o incentivo de aprofundar


acordos comerciais com áreas econômicas relevantes do mundo desenvolvido e
países emergentes da Ásia.

• O Presidente Temer também se afastou do ativismo social característico da Era do


Partido dos Trabalhadores (PT), e aprofundou o combate contra os crimes transnacionais
que se vem intensificando ao longo da América Latina, com especial ênfase no tráfico
de drogas. Estes foram elementos de continuidade do atual Presidente Bolsonaro.

• Durante a gestão do Presidente Bolsonaro houve um afastamento drástico das metas


estabelecidas no Acordo de Paris do ano 2015, ainda assim o Brasil é considerado um
potencial aliado ante os desafios da mudança climática.

227
AUTOATIVIDADE
1 A década de 1990 é conhecida pela intensificação de uma economia internacional
mais aberta ao comércio internacional tanto para bens de consumo como para bens
intermediários na cadeia produtiva. Diante desse cenário mais globalizado daquela
época, quais das seguintes sentenças é a correta:

a) ( ) Desde a Era Vargas (1930-1945) o Brasil vinha adotando uma política desenvolvimentista
que de certa maneira ajudou para o processo de abertura econômica da década de 1990.
b) ( ) Diante da necessidade de se adequar a uma economia mais aberta perante
um mundo mais globalizado, o Brasil teve que iniciar um processo de abertura
econômica logo de várias décadas de protecionismo de suas industrias.
c) ( ) O governo do Presidente Collor foi que iniciou o processo de abertura econômica, graças
a esse processo o Brasil conseguiu abrir seus mercados em um tempo recorde, assim,
como conseguiu acabar com a hiperinflação antes mesmo de seu impeachment.
d) ( ) Foi a partir do Regime Militar que por meio de sua Política Externa Pragmática que o
Brasil conseguiu desenvolver a indústria chave para seu desenvolvimento, ajudando
em grande parte a intensificação da abertura econômica da década de 1990.

2 Durante o governo do presidente FHC houve alguns programas para incentivar às


empresas melhorassem sua competividade para que pudessem competir com os
produtos importados e desta maneira pudessem se inserir no mercado internacional.
Sobre isso, é correto afirmar que:

I- O Baseamento teórico para melhorar a competividade das empresas foi desenvolvido,


entre outros fatores, a partir dos conceitos das “vantagens comparativas das
nações” e das ideias do economista Schumpeter de começos do século XX.
II- O Governo de FHC intensificou as políticas de desenvolvimento aplicadas desde a
Era Vargas, dessa maneira o Brasil afirmaria ainda mais sua indústria nacional diante
a concorrência externa.
III- Assim como houve incentivo para que as empresas pudessem melhorar sua
competitividade houve muitas empresas que tiveram que fechar, mas em
compensação outras foram criadas, reflexo da ideia do economista Schumpeter “a
tempestade eterna da destruição criadora”.

Destas sentenças, é correto dizer que:

a) ( ) As sentenças I e III estão certas.


b) ( ) As sentenças I e II estão certas.
c) ( ) Somente a sentença III está correta.
d) ( ) As sentenças II e III estão certas.

228
3 Independentemente do tipo de governo que iniciasse suas atividades sempre houve
no Brasil uma tradição de continuidade de sua Política Externa, com suas diferenças
da própria atividade no percurso do tempo e orientação ideológica do governo de
turno. Inclusive na época do Regime Militar houve traços de continuidade. O mesmo
aconteceu no início do governo do Presidente Lula do Partido dos Trabalhadores (PT).
Sobre a Política Externa do Presidente Lula, é correto dizer que:

( ) Sua Política Externa, além da aproximação aos BRICS, foi baseada na continuidade
do governo anterior do Presidente FHC, pois o multilateralismo estava dando certo.
Foi somente a partir do governo da Presidenta Dilma que sua ideologia de ativismo
social internacional teve seu momento de protagonismo internacional nos países
de esquerda amigos do PT.
( ) Uma das característica da Política Externa do presidente Lula, além de dar
continuidade ao processo de consolidação do MERCOSUL, foi o ativismo social e
sua aproximação aos países emergentes com grande potencial, os BRICS.
( ) A aproximação aos países do BRICS, característico da era do Presidente Lula,
permitiu ao Brasil se inserir mais intensamente no cenário global, pois cada um
dos países desse bloco (o Brasil, a China, a Rússia e a África do Sul) eram, e são,
potencias regionais, que juntas até os dias atuais conseguem contrabalançar os
interesses geopolíticos das potências mundiais.
( ) A aproximação aos países do BRICS, característico da era do Presidente Lula, permitiu
ao Brasil se inserir no cenário global, pois países membros desse bloco (o Brasil, a
China, a Rússia e a África do Sul) tinham grande potencial e representatividade
tanto regional como global, especialmente a China e a Rússia.

Dessas sentenças determine a sequência correta:

a) ( )F-V-V-F
b) ( )V-F-F-V
c) ( )F-V-F-V
d) ( )V-F-V-F

4 Em um mundo globalizado, onde a cadeia produtiva de um produto acontece em


diversas regiões do mundo e onde os países concorrem em diversos cenários
do comércio de mercadorias é relevante que um país possa manter uma boa
competividade relativa, tanto para seu desempenho econômico como para suas
relações internacionais. Nesse sentido, durante o processo de abertura da economia
brasileira durante a década de 1990 o país procurou melhorar sua competitividade,
tanto assim que para começos do século XXI, ano 2001, o Brasil estava no ranking nº
44 da competividade relativa global conforme dados da BBC BRASIL (2006). A seguir,
explique em que consiste esse ranking de competividade relativa global.

229
5 A Política Exterior do Presidente Lula, além de dar continuidade ao processo de
integração regional, como foi a consolidação do MERCOSUL, também se focou na
aproximação do Brasil com países emergentes que eram considerados potências
regionais durante os primeiros anos do século XXI, os BRICS. Sobre esse bloco,
exponha quais são os países que fazem parte dele e explique a importância destas
para a Política Externa do Brasil.

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