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Salo Carvalho
Federal University of Rio de Janeiro (UFRJ); Unilasalle (RS)
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Professor Titular de Direito Penal (Graduação) e Criminologia (Mestrado em Ciências Criminais)
da PUCRS.
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tudo’, mas porque cada vez mais é possível afirmar que o Direito não tem
salvação sem as luzes do discurso psicanalítico”1.
Se o direito e a psicanálise possuem discursos evidentemente diversos
e qualquer aproximação deve ser realizada com extremo cuidado
(COUTINHO), a criminologia, ao realizar este desafio, não se inscreve no
universo das disciplinas propriamente jurídicas; sequer poderia ser referida
desde o ponto de vista dos modelos integrados de ciências criminais
tradicionais (ROCCO e LISZT) ou críticos (HASSEMER, FERRAJOLI e
ZAFFARONI).
É que a criminologia, diferentemente da dogmática do direito (penal),
possui natureza interdisciplinar, logo inegável a facilidade em promover
diálogos não ortodoxos, distantes da rigidez formal do jurídico. Se no plano
epistemológico, apesar das dificuldades, é possível identificar o local da
ciência jurídica e estabelecer os horizontes de discussão possíveis com a
psicanálise, no que diz respeito à criminologia as imprecisões são
amplificadas. Sobretudo porque a criminologia, a partir de séria
problematização sobre questões epistemológicas, passa a ser percebida
como locus de fala e de escuta no qual se encontram inúmeros e distintos
saberes acerca do crime, da violência, do criminoso, da vítima, da
criminalidade, dos processos de criminalização e das formas de controle
social. Assim, a própria identificação da criminologia como ciência resta
prejudicada ou, no mínimo, seriamente questionada.
A constituição da criminologia como espaço de convergência de
discursos não apenas possibilita o encontro de olhares plurais – inclusive
não científicos, como o olhar artístico –, mas fomenta a abertura e a
autocrítica destes saberes interseccionados. Trata-se, pois, de local de
encontro e de (auto)reflexão.
A história das idéias criminológicas permite verificar empiricamente
esta construção ímpar, mormente se a criminologia for pensada como
disciplina jurídico-penal. Em sua formulação primeira (criminologia
etiológica), estabelecida no campo jurídico como ciência auxiliar, ganha
autonomia e identidade própria ao se aproximar da medicina (em especial
da psiquiatria), da psicologia, da antropologia e da sociologia, ciências que
passam a ser adjetivadas pelo rótulo criminal. O processo de autonomização
objetivou, inegavelmente, a identificação da criminologia como ciência.
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COUTINHO, O Estrangeiro do Juiz ou o Juiz é o Estrangeiro?, p. 69.
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“Somente quando o discurso freudiano se desgarrou do ideal cientificista – promovendo o luto
trágico de não pretender mais ser uma ciência – é que se constituiu a condição de possibilidade
para que uma leitura crítica do mal-estar da modernidade pudesse ser realizada com
radicalidade. Somente então a psicanálise pôde se apresentar como discurso crítico sistemático
sobre a cultura” (BIRMAN, Mal-Estar na Atualidade, p. 40).
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BIRMAN, Mal-Estar..., p. 46.
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NIETZSCHE, Genealogia da Moral, p. 62.
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BARATTA, Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal, p. 60.
6
SUTHERLAND, El Delito de Cuello Blanco, p. 307.
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R EFERÊNCIAS B IBLIOGRÁFICAS
BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal. Rio de Janeiro: Revan,
1997.
BIRMAN, Joel. A Psiquiatria como Discurso da Moralidade. Rio de Janeiro: Graal, 1978.
__________. Mal-estar na Atualidade: a psicanálise e as novas formas de subjetivação. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2000.
COUTINHO, Jacinto. O Estrangeiro do Juiz ou o Juiz é o Estrangeiro?. in Direito e
Psicanálise: intersecções a partir de ‘O Estrangeiro’ de Albert Camus. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2006.
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BIRMAN, A Psiquiatria como Discurso da Moralidade, p. 28.
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NIETZSCHE, Friedrich. Genealogia da Moral (uma Polêmica). São Paulo: Cia. das Letras, 1998.
SUTHERLAND, Edwin. H. El Delito de Cuello Blanco. Madrid: La Piqueta, 1999.
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